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cee NO ATLARTICOS ao «CF 0 Trato dos Vivente A363 Tov S.REIP:, LUIZ FELIPE DE ALENCASTRO O trato dos viventes Formagiio do Brasil no Atléatico Sul Séculos xvi e xvi mt Copyright © amo Lai Felipe de Alene cape sore nen, cmm a piu da arta 0 centro (Gast Os ut cane) 8, le ie be dean van Kes. igo, ‘le Pirshotheknhen Ae Photek Inc matic Masi lana Carbo Malina enw cn none BIGLICTES# SEDO FEDERAL ene becta wos teen setieas eae fae hn Dantas Pig de Aug do ae de Si Pl ap «ea de ch etal ‘Gc 19h 198) ernie Mecano ge : : bev Tor oe dios Sets So eserados 3 a anc aa 25332 cugueca— So Palo “Tene sys Feu) usa ‘ew compminsltsscombr Sumario Preficio 1. Oaprendizado di colonizacao, Caminhosdos cslonos: Reparos da Metropole, Oescopo do comércio pormgues Instrumentos de politica colonial, Demand ¢ oferta, qual €0 "primum mobile” 2. Aficanos, “os essravosde Guin” Ventos negreiros : Sio"Tomé—Ladorat6rio tropical... Congnistaecatequese na Africa Central 5, Lisboa, capital negreira do Ocidente ‘Comescado thero-americana Cativoseeseravos Experimentos subatlinicos, Preadores, assertistas, governadores bangueitos » “ 44 x 6 7 Guerra e coméreio no Adlintico Sul Luanda, © Rio de Janeiro e 0 tio da Prata, Mercadoria aglutinante e mercadoria ancilar Um comércio triangular? -4-indios, os “escravos da terra” Otrabatho compulséro indigena Owificode indios, As duasfrentes militares portuguesas Entraves estruturais 20 trato continental dos indios A.unificagio microbiana do mundo. Doutares eempiricos A cescravidio africana e o desencravamento da Amazinia. (O desenraizamento do cativona Affica ena América A reprodugio social dos escravos. 5. Aevangelizacio numa s6 colénia. (Oantiescravisme dos santos sacramentos. Aceorianegreirajesuita ‘Descimento” de indios erafico de africanos A bipolaridade do escravismo luso-brasflico. 6, As guetras pelos mercados de escravos. ciclo do trato de indios Peruleiros ebancdeirantes. (Oespansionismo atlantico flurminense. Ocativeiro indigena e o autonomismo paulista A guerra pelos africanos. Nassau: “principe humanista” enegreiro, Produtores coloniais versus acionistas metropolitanos. Contra-ataque hiso-brasilicoem Angola Luanda, abatalha estratégica do Adlantico Quem reconguistou Angola? Refluso do trifico de indios Palmares ¢ paradioxo de Domingos Jonge Velho Adequacio espacial e adequaco social da colonizaca0 195 109 ng 16 a 5 ny 3 18 ma 8 5 162, 168 70 186 a5, aus 231 238 238 2 7-Angolalorastica A mandioca nos tumbeiros enasferasaficanas Zimibo, jimbo. Ocondominio husitano, angolistee brasilico na Affica Centeal Ajomada dos negreiros ‘Ajuda inaciana na reconquista de Angola Os sucessores de Salvador de Siem Luanda. Joo Fernandes Vieira em Angola, ‘A maravilhosa conversio da rainha nga ‘Congo cismitico Negreiros eo desbarato do Congo. Ambuila:abatalha tricontinental ‘Visicas brasilicas nas guerrasaficanas ‘Quartelada em “anda epuntaladas no Recife Continuidade basilica na Africa Cental ‘Onowo pacto politico entre a Corte eos guesteiros ultramarinos A.conquista dosmercados afticanos pela cachaca Ovinho,asaguardemtes europtiase o malaio, Avitoria da cachaca Ostumaleos dosjeribiteiros Ascontas do trato bilateral Brasi-Aftica : Concusio — Singslaridade do Brasil Areafirmaco a poiicade etorias ma Africa Central portuguesa © repovoamenta da América portuguesa O gado comtacsincios Ainvengo do mulato Apéndice r—LufsMendes de Vasconcelos e seus filhos Apéndice 2—O atastecimento das capitanias do Norte pelas capitanias do Sul durancea guerra holandesa Aptndice 3— A familia de Salvador Cotrea de Sé e Benevides, Apéndice 4A alegada proclamacio de Amador Bueno em 1641 Apéndice 5 —Notas sobre alguns expedicionarios portugueses e brasilicos da ferca-tarefa de 1648 que reconguistou Angola. 25 256 259 22 266 a BSey 294 207 302 307 au 3 a4 Bs 37 330 336 340 345 387 36 365 367 369 Apéndice 6 — Armas de fogo manuais no Atlintico sescentista portugues “Apéndlice 7 — Sobre o ntimero de escravos sidos de Angola e entrades 10 Brasil nos séculos3xv1€ XV Notas. Abreviaturas utilzadas. Fontes e bibliografia ciradas. Crbdito de iustragbes indice onomastico. Sobre o autor. ws 381 am ea} 50 5 535 Prefacio “Forma¢io do Brasil no Atlintco Su": oleitor que bates 0 lho na capa do lio estardntrigao com o subsitlo, Querdizerentio queo Braslseformou ora dio Bras F exatamente isso tléo paradoxo histérico que pretendo demonstrar nas piginasseguintes. Nossa histria colonial nif se confide coma continuidade do nosso terité= vio colonial Sempre se pensou o Brasil fora do Brasil, mas de maneiraincomplea: ‘pals aparece no prolongamentoda Europa, Ora, aidéiacxposta neste livro€dife- rente relativamente simples a colonizagio portuguese, fundada no escravismo, eu higara um espaco econdinico e socal bipolar, englobando uma zona de pro- dugoescravisa sua no litoral da América do Sul euma zona de veprodugio de cscrmoscentradaem Angola. Desde o final do sécato x, surge um espagoatert- torial, um arquipélago lus6fono composto ds enclaves da América portuguesa e das feitorias de Argola, £ da que emerge 0 Brasil no século xvi, N4o se trata, 20 longo dos capitulos, de estudar de forma comparativaascolbnias portuguesas no [Atlantico. O que we quer, a0 contro, é mostrar como essas duas partes unidas pelo oceano se conpletam num sé sistema de exploracio colonial cuja singular dade anda marca profundamente o Brasil contemporineo. Daas palavtas a mais sobre o método € 0 estilo, Por razbesexplicadasadhan- te, os nimerosdoteifico negrero so problemniticas para os sécules x4 xv. Na circunstincia,a andlise quantitativa da deportagiio de afticanos paraa América s6 _ganha verdadeiro alcance nos séculos ville xx, periodo que serd objec de um pré- ximollvro, Assim, asindicagSes estatisticas apresentadasrestringem se A distribui- ‘ko dos principais agregados ¢ &s evolugdes mais nitidas no tempo e no espaco atlintico. A propésito do modo de eserever, é preciso notar que o territério do historia dor da Coldnia deve abranger toda a extensao da lusofonia, da documentagio ultramarina onde esto registrados os contatos entre as culturas que nos forma am, Além do mais, numa cultura tradicionalmente oral como a nossa, rm meio privilegiado de patentear'a presenca do passado consiste em dar relevo a perenida- de daspalavras, Daspalavras, das cologuialismos — ainda vives agora—grafados nos textos, na linguagem das estradas, das ruelas e das praias brasileiras. Por isso, da leitura dos documentos e dos textos seiscemtistas, retomei expresses que enca deiam a narrativa das oito partes do livro. [Nas quebradas do mundo, hi um momento de verdacle em que muitas coisas se definem, Meu momento de verdade sucedeu em 1972-3, quando recebi no esteangeiro a noticia vinda do Brasil de que trés de meus companheiros de Universiclace (de Brasflia ede Aix-en-Provence) tinbam sido assassinadospela dita dura, Entendera sua morte, entender o Brasil era o que queria fazer dali em dian: re, €0 que tento fazer neste livro, dedicado 4 meméria sempre presente de Heleny Guariba, Paulo de Tarso Celestino e Honestino Guimaries Paris —Sio Pasilo Luiz Felipe de Alencastro 1. O aprendizado da colonizac¢ao' Lisboa, agosto de 149, D. Manuel esceeve ao papa anunciando 0 retorno de ‘Vasco da Gama da primeira viagem maritima 3 india e outorga-se um novo titulo “Rei de Portugal e dos Algarves ’aquém e @além-mar em Aifica, Senor de Guiné «eda Conquista da Navegacio e Comércio da Etipia, Arabia, Prsiae(.. In Respaldaconasbulsponsifcaisenascaravelas,¢-reipodiase trbuirosenhoriodos tratos teritrias longinguos que se conestavm a Europa. Tudo se cornari bem mais complicado quando a Metspoletentar pérem pritica apaliicanoulteamar [Ancorados em és continentes as voltas com comunidades exbticas, os con: aqustadores bérccs enveredam por caminhos vésios para se asegurar do contre le dos nativos e do 2xcesente econdmico das conquistas. Nem sempre esses carn hos entroncam ra rede mercantile no aparelho institucional reinol. Por isso, antes mesmo do término doséculo dos Descobrimentos (1450-1550), as metropo- lesteorientamas correntesultcamarinasa fim de colonizar seus proprioscolonos. “Entre gente remota edificaram, novo reino que tanto sublimaram’, canrava ‘Camies. Poréma, como 0 “novo reino” d'além mar se juntou a0 “velho reino ‘europeu? Comoa gente lusitana dominow a "gente remota” ea fez trabalhar para elie? “Mesmo nos lugares onde arelagio de forgas se afigurava favorivel 2osinvaso- ses europea, nio adiantava cair matando: a eseravidio e outras formas de traba- tho compulsbrio ficitavam o dominio dos nativos, mas podiam nfo resultar na exploracio das conquistas. Ocorriadeo excedente econdmico regional ser const ‘mido pelos proprioscolonos ou trocado fora dos mares singradios pelos navios das setrépoles, ossuire controlar nativos no garanta a transformacia da trabalho ‘extorquido em mercadorias agregadas aos flaxas metropoktanos, nem afiancava ‘o surgimento de economias tributirias no ultramar. Uma segunda cicunstancia sobrevém, agoranoplano politico. Anda que oeventualexcedente econémico das conquista fossecaptado pelasteias béricas, a expansio mercantil nfo conduzia necessariamente 20 relorgo do poder monarquico. As transagbes ocednicas ¢ © ascenso doscomerciances aziam emergirnovas forcassociaisnas metropolesenas conquistas, alerando o equilrio das monarquias européias. De maneira que © dlomsinio ultramarino nem sempre desemboca na exploracio colonial, como tam: bbém ndo nstaura deimediato a obediéncia do colonato edosnegociantesa0 poder meteopolitano. [Desse modo, oarrocho da Coroa nostertitériosulteamarinos, aagregacio do excedente daszonasconquistadasstrocasatlantcas eo enffentamento entre auto ridades, clero e colonos acerca do controle dos natvos eonfiguram problemas dis Lintosno teatro das Descobertas. No Peru, em Angola, em Goa, em Mogambigue, 10 Brasil, noutros lugares ainda, o dominio colonial desanda logo de sida CAMINHOS OS COLONES NoPeruenamaior parte da América espanhols, os confltos opondo colonos a0 clero ¢ 4 Coroa nascem da futa pelo controle dos nativos, Tendo em vista a influéneia doutrinéria hispanica na América portuguesa —o alvard de 1605 pres- reve o enquadramento dos fndios do Brasil “na forma que se usa nos indios de Castela” —,o caso peruano merece reflexio. Carlos v proclama, em 1542-43, a Leyes nuevas, que reconhecem a soberania, indigena, prevéem o fim das encomiendas, das concessdes de ind conquistadores,¢a passagem gradual de todos os nativos & dependéncia direta da nas feitas aos Coroa, aqual pagariam trbutos. De pronto, brota acontradigiomanente ao pro- {eto imperial espanhol. Para afirmarse como “emperador sobre muchos reyes", como escrevia 0 dominicana Las Casas, um dos inspiradores das Leyes nuevas, Carlos deveria reconhecerasoberaniadosindios, condicio paraoestabelecimen- todo ajénci, colons « ofc espanhbis estavamn instados a convaliar&autordade dos” senhoresnataais”indgenas? Porém, esa politica inovadorade gover indireto— vomente postaemprs sass silos mis tase ma Ain ena nia pele ngltervavitoiana — contra ‘ule de vassalagem, fator constitutivo da esséncia imperial. Em conse: riava concessbes rigias permitindo que os colonos levantassem, por sua conta as primeiras paredes do esifcio ultramarino, Desde logo, espoucam insurreigSes no Peru nas décadas le 15:40 21560." Investigando as causas do levante lerado por Hernandez Giror, 0 ouvidor do Tribunal de Lima resume o ponto de vista dos sebeldes:“Tinham compreendido que S. M. queria todo o Peru para si proprioe aque, nesse caso, o Peru nfo poderia deiar de fazerse senhoria de se governar livremente, coma Veneza’”’ No meio tempo, sropas feis 3 Coroa, mobilizadas e dlirigidas elo cero, haviam derrotado os colonosrebeldes. Assenton-se entaoum compromisso, Os conguistadores fieavam com os fndios dominados, mas aceta- ‘ama tributagio gia imposta ds oncomndas. De seu lado, a Coroa impediaactia «do de feuds heredivioseimpunha sua autoridade sobre as tetas e populacbes conguistadas e por conquistar* Maso essencial se desenrola em outras instancias. A partirde 1545 a prata de Potosi reorient os flaxos de trocas americanas e permeabibiza 0 Peru a pe- netrasio comercial metropolitana,’Desse modo, 0 poder imperial se habiliza para claborar umdiscusso global, coerente, associando a exploracao das minas de prata amesicanas 20 empreendimento politico e ideolbgico anquitetado na Europata Pax Christiana, Suzge o que Bataillon denominao "mito ustiicador” “Uma riqueza metilica prodigiosa tinha sido providencialmente escondida ¢ depois descoberts nessa parte da terra, para pagar o salirio de seus evangeliza- ores, para exaltar 0 Deus dos Catélicos contra 0 herege (0 luterano)¢ contra o infiel(o mugulmenoy"* Angola’ apresenta um confit poisico semelhante ao exemplo precedente, salvo que alia Coroa bate de frente com o colonato com osjesuitas.Aconquist fora concedidacnr 571 a PavloDias Novais, neto de Bartolomeu Dias, comovapi tania hereditris, conforme o métod praticado na ha de Sto Tomé e no Brasil. Aswoltascom grandes despesaslangado pela Metrépoleapdsodesastrede Alecer (Quibir (1578), 0 donatiria concede aos conguistadores a0sjesutas teres, nat vyos e rendas num sistema similar ao das encomiendas hispano-americanas." De- nominados amos, esses novos feuclatérios controlavam os chefes nativos—ossobas —e cobravam tributos da populagio local, os ambundos. Na maioria das vezes os tributos devidos pelos nativos costumavam ser quitados sob a forma de escravos que os amos— jesuitase capitdes — exportavam para a América Constatando que Angola nao tinha minas de prata, como se supusera até co de escravos emergia como a principal ativida de da rea, a Coroa retom a coldnia em mos. A capitania hereditiriaé extinta,e ‘entio, eque 0 trifico rransatl ‘um governador, depositirio direto da autoridade régia, recebe ordens para sustar a instituieZo dos amos.” Inconformados, os conquistadores eos jesuitas se amoti: ‘pam contra governador Francisco de Almeida (1592-93), encarregaco de aplicar asnovasdiretivas da Coroa. Interpelando o superior dos inacianos na conquista, 0 -governadorsedeclara “mui espantado” por ver desafiada a ordemrégia embargan- do as concessbes de sobas. No entanto, a faccao dos amos ganha momentanea- ‘mentea parada. Fxcomungado pelos missiondrios e posto a ferros pelos rebelde, o governador Prancisco de Almeida acaba sendo expalso de Angola, dez meses apenas apés sua chegada.” Pau-mandado dos jesuitas, seu irmao Jerdnimoassame ‘o.governo angolano e suspende & onem régia causadora do levante."* Ao ser informado do motim, Filipeit decidiu banira Sociedade de Jesus ter rit6rio angolano e entregar a guarda das misses a outra ondiem religiosa, Demo- vveu-o um amigo da Companhia de Jesus e um éos homens mais poderosos da pe- ninsula Ibérica, o cardeal-arquidugue Alberto, vice-rei ¢ inquisidor-geral de Portugal. Nao obstante, Filipe ttdeterminou aexpulsioc oimediato retornoiCor- tedo superior dosjesuitas em Angola, padre Barreira, personagem importante da hist6ria européia na Aftica, cuja atividade singular serd salientad2 mais adiante no texto." Alguns anos depots, um cronista jesuita procura justficar © motim dos mis. sionérios: "Nem pudera haver outro melhor modo para os conquistarem a todos [os natives] eos terem seguros que fazezem/nos sobas dos paces; pois oserem-no znem um s6 ponta diminufa na jurisdi¢io c do poder de S, Majestade”, Porém, 2 ‘monarquia fora de outro alvitre.“De fato,2instituicdo dos amos é de novo proibi- «da(1607), eossobados vassalizados passam 20 mando da Coroa, Emnbora continue ahaver encrencas entre os governadores, de um lado, ¢capitiese jesuitas queten «am restabelecer os privilégios dos amos de outro, os solavancos dos negociantes seingis ¢ da Coroa prxxam Angola para dentro das correntes atlanticas.” De 1594 1640, 0 Asento concede aos portugueses © monopdlio do fornecimento de aie nos para a América espanhola, Os préprios assentistasaparecem por vezes como srrematadores des Contratosfadjudicagdo para o recebimenco de diteitosrégios) dle Cabo Verde ee Angola, dispondo, desde logo de acess privilegiado is opera Bes ealzadas nes portosnegreros. Mais adiane volto ao assunto, Porenquanto,cabe notar que 0 cescimento dointercimbio maritime —ind zdo pelos negriros — desenerava aconquistaafficana e pod aasa dos colons. Aocontrisc do sucedidonoA‘lintico, apresengaportuguesa tem umimpac to amortecido nas margens do Indico.” Ali, os enropeus buscam se apropria de zonas devassadas por mercadores érabes cle Oman ¢ indianos islamizados do Guzerate,importante regio xl” Durante déeadasa Coroaprocuradrenar ese comércio para asfiguas Hboetas, através da ora do Cabo. Tal politica dé lugara desencontros ent-ea Metropole eos postugueses da Asi, os quai, atris de neg cios da China, navegavam por vezes “contra vento, contra mongao, contra maré © ‘contra razio", como escrevia 6 autor de Peregrinagdo (1614) Em Gos, os colonos-negociantes de portada, denominadas casados, em oposi ‘0 ao grupo dos soldados e comerciantes itinerantes, dos ster, apareciam como atacadistas que efetuavam transagées na rota da China edo Japo* Repre: sentados pelo Senado da Cimara de Goa, dietamente submetido a0 Consetho de Estado lisboeta, os casados impuseram embargo 20s crstios novos e os indiancs “tstanizados quese associavam aos funcionsirios portuguesesnostratosdos portos Asidticos" Em sogsida, os casados obtém vetas contra osagentes clos negoctanteslis bboetas que fia escambo na india, Para atalharalegado conluio entre 0s eristZos, novos de Gos ea antiga comunidade udaica de Cochim, centro do desvio da pimen. ta, jesuitaseautordades portuguesaslogram fundaro Tibunal da Ingusicfo de oa (2560), exemplo tinico no utramar luso."Ser tachado de eristo.novo na india sofa set “muito perigoso, porque todaapessoa que quiser angira outrodesse defeito, he nfo falta testemsunhas compradas’, prevenia Diogo do Couto” Enfrentande ainda os fidalgos (“filhos d'algo”) — aristocracia militar deten- tora da autoridade régia —, os fos tentam garfar toda a intermedinc2o euro péia na Asia, Apatentemente, a Coroa nio tirava proveito disso, ponquanto cance: 4e, em 1587, 0 monopélio do anil — principal tato de Goa — 2 um grupo de capitalistas sediadosem Lisboa." Lago eclodem revoltasentre oscasados, Goaserd 5 sacudida por motins sempre que a Corea aumentar ssa tfburacto ou tentar cap: tarastrocas como golfo Pérsico ea Asia, heratvasparaostratstas”regionaispor ‘ugueses indians, mas prejudicisisaosnegaciantes metropolianose 20 Tesouro Regio.” Michael Pearson, estudioso dessasrevolas, cone que os casados situa ‘vamos interesses desc coméscio acima de sua fidelidade & Coroa* [Em razio da opuléncia indo asitica, e das possbilidades de enriquecimen: toque ocontrabando eo comércio regional ofereciam aos oficiaisd'eh-rel, adm nistragao portuguesa caino destrambelho. £ precisamente em Goa que Diogo do Couto escreve 0 soldado price (1593), obra-prima do eeticismo histérico lusita no, no qual sio denunncladas as fraudes dos fumsciondsios régios: ens “nenlimas| parte € 0 rei de Portugal] obedecido menos que na india.” Contudo, pondera Magalhiies Godinho, mesmo se dispusesse de fartos meios navaise da “integers ‘ma honestidade” de seus Suncionérios, Lisboa nfo lograriasubstiuir mouros e gentios nos circuitos indo-asiiticos de comércio. Desde logo, em meados do Quinhentos irrompe um racha no Império do Oriente: “O complexo econdmico Jnso-oriental ope se doravante aos interesses de Lishoa eda sota do Cabo”.” Tal tém sucesso, Entretanto, desde meados do Seiscentos, se def nniaum fator fundamental da evolucio doimpérioe da América portuguesa: axeno “fogia da economia brasileira — isto €, sua propensio a agregar energia humana reproduzida forade sen espaco produtivo, Caracteristica que se apresenita, am s6, ‘tempo, como resultado da demand interna do colonato e da pressio dos negrei +08 no plano da oferta, Nos séculos xvi xix, com o surgimento de uma divisio inter-regional do trabalho no Brasil, a fome de estrangeiros decorze também da ‘opco geopolitica io governo central, o qual preferia manter o mercado de traba- Iho desterritorializado, a fimdlequeas diferentes capitanias, depoisprovincias, nao entrassem em competi¢io no mercado de trabalho interno." DEMANDA & OFERTA, QUAL & 0 “PRINUM MOBILE”? ‘Do cotejo das demandas ¢ dos memeoriais do colonato emerge o desenho das {orcas sociais que movimentam o sistema colonial ‘Seé certo que os calonas se queixam da “falta de bragos" desde o século xvt, tambémeé verdadeiro que eles protestam jana mesma época —coisa bem mais sur preendente —contraa "falta de verras’ Terra e trabalho no se apresentamaqui como dads independentes, mas como variaveis que sio resultantes das forcas mottizes do capitalismo comercial. O ssquecimento on a insuficiente avaliagso esse traco essencial da colonizacio deu azo a confusdes de que uma parte da his toriografia custa ¢ se desembaracar. Intencionais ou nao intencionais, os efeitos induzidos pelo tefico negreiro geram a acumulagdo especifica ao capitalismo comercial e4 "Pay Lusitana’” no Atlantico. Mais do que qualquer outro, o trato negreiro é um comércio administrado. ‘Como ficou dito, o controle metropolitano sobre a reprodugiio da producio ame- ica do sistema colonial — tem um papel deci- sivo na organizacio econdmica do Atlintico. Também ficou patente que o trato de icana—ou melhor, a instdncia po! mportantee, sobretudo, um alto grau de integracio a0 mercado atlantico, antes mesmo de estar conectado 3 agriculeura comexcial da América portuguesa. Submetido durante trés séculos & poténcia européia que ‘maneja omaior mercado de african ‘0 Brasilconverte-seno maior importador de eseravosdo Nove Mundo, como o demonstra escarpadamente o grifico 2 seguir Elo perdido de nossa histra, esse sistema avassalador de mercantilizagio de homens impede que se considere 0 trifico negreiro como um efeito secundario da obrigaa distinguiro escravisino luso- brasileiro de seus cong ‘canose impGe uma interpretacioaterttorial da formacio do Brasil 2 1526-1850" DE AFRICANOS NAS PRIN 2. Africanos, “os escravos de Guiné”* ‘O surgimenso do trato ocednicointensifica a acumulacio de bense atrocade mereadorias nas sociedades negras. Na Affica quinhentstaofator que, em ttima instancia, Favorece o trifico negreiro é 0 comércio continental de longo curso,' difizndido nas regides subsaarianas pelo avanco do isl os intercdmbios com 0 Magrebe.** Embora com menorintensidade que no Oeste ¢ no Norte do cont nente, esse modo de permuta também rolava na Africa Centralocidental antesdos Descobrimentos: ‘Carreiras maritimas européias reorientam o comércio a longa distineta, puxando as trocas terrestres para o movimento da economia-mundo, Sempre se enfinizou o papel do eseravismo moderno e dos produtos afficanos na formacio| ‘do mereaco mundial. Outros estudos tém evidenciado a importincia das trocas icanas ea variedace de produtos europeus,americanos eas ticos importados pelo Continente Negro.’No somatSrio das exportagses impor tages, no alcance de suas tocasinternas, nadensidade de sua economia domést- intracontinentai * "Cento, eduaestos eros da Geiné eda term rnham.amaiorsdosengeshos Babi. infoerna pate Ferxio Cari a penitima décads do stcao X91 F canvas, "Nats epistole de ums age ess jesus”, Trtado da terrae ere do Brat. 193, *"Poeate" nome Srabedospalsesdo Norte de Aca acrevo Magra, endo Mash transcigfo francesa do iabe),seuindo uso corcente em Portugal ca, o mercado subsaariano do século xvt se assemelha muito mais ao da Asia que ‘aga América. A propésito, 9 dito “negécio da China”, cunhado em Portugal e designando ‘uma transagdo muito lucrativa, enconcra significaco andloga no brasieirismo oito- centista decorrente do trato negreiro: “negécio da Costa da Mina" Asia e Affica, 2 (China ea Mina, as duas pontasda economia de eircula¢do portuguesa, fixaram-seno smaginério dos dois paises engajados nessa rede de trocas como sindnimos de nego- do muito vantajow e de pouco sisco. Resta que, no Oriente como no Continente [Negto,o rato ulteamarino envolvia operagiies de grande complexidade. De comeso, »trato negreito ocorve apenas em certas partes do litoral, por {quanto 0 comércin varava no sentido norte sul ou cortia pelas feitas do Sudio* “oriental. Catavancs de camelos trafegam “contra 0 mar" e “ainda nfo hao nenhw: ‘ma sabedoria” dascaravelas fundeadas na costa, refere Zurarana metade do secu Jo xv. Sua Crinica de Guiné (1455) deixa entrever « precatiedade do trifico, ainda baseadomnos assalias para “amarrar” enos “filhamentos” de cativos praticadosnas cescaramuas da Reconquista." Apropésito éaflotithaarribada em 1445 fox do Senegal, Zuraranarra.as atti- bulagGes do aprenniz de negreiro Estévio Afonso. Ancorado ao largo, um grupo de corsérios algarvios avangava de tocaia pela ribanceira do rio. De repente, Estévio escutou,e logo viu, um "guinéu” cortando lenha. “Comegou Estévio ‘Afonso de seguit seu caminho, ¢ entre o bom exguardo que pds no assossego de suas passadas, eo intento que o guinéu tinha em seu trabalho, nunca pode sentir a vvinda do outro, sendo quando se langou de salto sobre ele. E digo de salto, porque ‘oBstévdo Afonso ra de pequeno corpo e delgado, ¢ que o guinéu era muito pelo contririo, E assimlhe travou si pelos cabelos que, quando o guinéu quis se endi- reitar, fico Estévlo Afonso pendurado com os pés fora do chi.” Meses depois, ras Canarias, noutto lance do genero, Estévio se atracou com um nativo que pre- tendia escravizar, se deu male acabou sendo mortoporele.' Percebe se queapilha- gem (do Jatim pati piratas europeus rio daria conta, por sis6, la demanda escravistase avolumando na peninsula tbérica, nas Canarias, na Madeira, em Cabo Verde e Sao Tomé antes, = agasrar pelos pélos) das aldeias africanas por corsitios © + Sado: ion a Sade, “Tere dos Negro” zon masa da Aiea do Nowe, inezmediri entre ‘Sahel regio asco Scat} adrea das orestas, Ndosetataneseliven da excolinis eipto-b ‘nica cpsisdotesmo nome stsado na Aiea Oteral “ mesmo do descobrimento do Brasil. De fato, os portugueses no permanecem ‘muito vempo com os pés fora do cho na Alta Guiné." Geografia comercial ehistoriaafricanafavorecema penetracio européia, Rios ccursadlos pelos natives, eem particular o Senegal, 0 Cacheu ¢ 0 Gimbia, traziam os cescambos dos sertdes pars olitoral. Do io Senegal se ieradiava uma rede de trocas ‘coma bacia do Niger, formando um sistema mercantil de rotas luviaise terrestres que interligave a Senegimbia e 0 golfo de Guiné." De mais a mais —e aqui reside ‘uma diferenca basica entre a Africa ea América pré-europeias —, vériassociedades subsaarianas conheciam o valor mercantil da escravo, Nos lugares onde nfo exis tiam tais precondicbes, oencadeamento do trato se revela prodlematico. Document acerca de grupas ovimbundos, criadores de gado nas vizinhan. ‘casde Benguela, registra com todasas letras no ano de 1618: "Neste reino no hi resgate de escravas porque se no costumam a vender unsaos outros". Mais tarde ‘impasse permanece, “Néo quiseram nunca pagar baculamentes[sributos] nem fazer resgate de pecas de escravos, porque o ndo costumam, e somente tratam de suas sementeirase de criagGes de gado em que a Fazenda de VM, nZo interessa."" Entradas dos portugueses e dos jagas na segunda metade do século xv desestabi- lizam as comunidades nativas da rea, empurrando-as para o trato de escravos sucessivamente portugues, brasilicoe brasileiro. Nosanos 1820, buscando dar con- tinuidade ao trifico de escravos, portugueses de Benguela organizam um movi ‘mento sedicioso para aderit ao Império do Brasil Ostiimosparigrafos da CrcadeGuiné apontam.as mudaneasoperadasem certos porto afficanos. As cousasseguintes ndo foram tratadas com tanto traba Iho ¢ fortaleza como as passadas, que deste ano [1455] avante, sempre os fitas claguelas partes se trataram mais por ratose avencasde mercadaria que por forta Jeza nem trabalho das armas."” Sem que a rapina fosse abandonada, permutas regulates, com precos entabulados, conforme dacas ajustadas, em locas fixos sur gem nas enseadas pousos de encontro dostratistas, Assinalados por Leio Afficano, Ci Da Mosto e outros viajantes da Renas- cenea,ospostosde “tratoseavencas[ajustesprévios] eravadosnacartografiados Descobsimentos correspondem is instiuigdes definidas por Kas] Polanyi como “ports of trade’. Que passoa denominar "portos de trato” dolltoral, ou "eras de rwato” sertanejas, Aqui, o comércio permanece circunsetto, sem dar lugar a um mercado, "Trocasse desenrolam em locaisdeterminados,juntoa enclavestornados 4s ‘neutr0s por consenso mtituo, nos quais os precos sto arreglades entre os satistas ‘estrangeiros ea autoridade nativa.” Macau, euj estatuto capitalista tem sido res peitado, aproveitadoe represado por mais de quatro séculos pelos Ming, os mand chu, os Senhores da Guerra, Mao Zedong, a Camarilha dos Quatro, Deng Zise pinge Jiang Zemin, constitu’ exemplo paradigmatico de porto de teat. Porto feiras de tato conteibuem para ampliaro mercado negreiro nazona subssariana.” Mas no encontram similares na América porsuguesa, onde jamais -surgiram como pélos geradores do trifico de indigenas. Campos de Patininga —a fatura Sio Paulo —, “escala para muitas nagdes dos indios”,informava 0 padre Lis da Gr, consistia numa feira ce rato onde Joao Ramalho esua gente vendiam {dios cativos do Planalto Paulista para a Baixada Santista. Mas tarde areorienta ‘eo as carreras maritimas para o Norte da Colinia reduz a demanda vicentina, induzindo a muadanga dos moradores do litoral para © Planalto ea transformagio de Pitatinings emanticleo depreadores pata so direto, local, de cativosingigenss.” Jjalofos — i-portadores de cavalos mouros e primeira etnia negra a vender cescravos para os curopeus —, besberes, fulas, haucés, mandingas — “os maiores mercadores que hd em Guiné” (Donelha)— circulavam no entroncamento do Mediterrineo do Sudo, de permeio com desertos esavanas, pastores¢ agricul tores,negros e mouros " Cleulas aprosimativosindicam que a movimento tran ssariano de catives negeos,associado 20 transporte de ouro do Sudo, teve xo constante a0 longo da Idade Média. No século xv, cerca de 3500 indviivos esta ‘vam sendo annalmente deportados a Attica Ocidental através do Saara, enguan- 10 1340 dalisaiampor ano mediante o rato maritimo europen.” [Naesteira das descobertashenriquinas, barcosdos reinbisedosluso-afticanos de Cabo Verde fram asredes de trocaerrestre dos mouros, drenando a economia ‘meditertiica attayés do Aslintico.* Plas novas fetorias costeirashusitanas, “a terra de Guiné eresangrada do ouro que em sicontinhal...)Jcom que no iti ter is ios dosmouros os quais vinham buscar portantosdesertosemcafilasde came: Jos", argumenta Jeo de Barros na sua Primera déada (c. 1549)" Ao lado do our0, as “pecas das Indias” sobressaem como um investimento hucrative* Atenta 208 :movimientosde pregos no grande comércio ocednico, diretoriada Casa da Minae “Tratos da Guingirstrai seus agentespara adquirirem menos marfimemaisnegros, no ana de 1523, fise de alta do prego das "pegas” no Atlintica.* Para evitar os lon- {gos letais transbardos nos portes europens, a Coroa autoriza 6 embarque direto de escravos para as Antilhas a parti de Cabo Verde e So Tomé. Daf para frente avultao trato para 6 Novo Mundo, sobretudo apés levante dojinca Manco Cépac, em 1535. Respaldando os expanse pouco inclinados a fugas que os exporiam a {indios hosts, osescravosnegrosse cornam valiososno Peru." Paralelamente, decl ‘na 6 embarque de afticanos para a Metropole as thas atlénticas * Nosanos 1526-50, antes do deslanche do trafico para o Brasil, saia da Guiné- Bissau e da Senegimbia uma média cle mil cativos por ano, Citra representando 49% dos individuos deporcados do Continente Negro. Da Africa Central vinham ‘outros 34%, enquanto 3% eram provenientes do golfo de Guiné.* Versoscélebres de Garcia de Rezende retratam 0 lucto e os fluxos do traco de afticanos para Sevitha, Lisboa, Setibal, Cabo Verde, Madeira, Canérias, Sd Tomé. E para o Caribe on grmndcsoma org Cada tabi as, eoust queso al, ede cabotl cm ContelaenasAntthas (Dtsceons, 15547 Brancos e mulstos apelidados lansados* ou tangomaus varam rios da Alta Guiné perrmatando fazendasnativasc estrangeiras." Aventureiros, degredados ou istdos novosdeportados, oslangados—correndo por forado monopéliometto polirano— repercutem o impacto europeu para dentro das praias. Vestindo-se come nativos, entalhando no rosto as marcas das etnias locais, os lancados foram 0s primeiros portugueses —os primeiroseuropeus—aseadaptarem aostrépicos “Andam nase para mais se acomodarem, € com onatural usarem como os gentios ‘uwopea,que combate aca com lina pesdadeimpucto.edo pire amado deco poring) essa prtegereneassadeesde scabzrirare mosgcteim conta sscngodacavaiiainiigs, acentwando oimpulso armamentista no Sudo.” Armas de fogo portiteisepélvo ‘ra constituem itens importantes nas remessas européias para azona subsaarianaa pattir de meados do Seiscentos. De resto, no se fabricavam armas de fogo na [Africa negra." Como sucedia com as montarias, as armas importadas na Alta Gwiné se peemuravam por cativos e génerosregionas. Num pulo ripido para a outra margem do oceano, vale marca a diferenga nnenhuma das mercadorias escambadas por indigenas da América portuguesa ‘muna os traficants ndios ou caboclos de um cacife gual ao que as espingandas.e oscavalosassegurivam aosbandosnegeesosatficanos. Taboshouve, comoosjan duis do Rio Grande, que combatiam com armas de fogo no siltimo quartel do sécu- lo xvn.""Também é certo que os guaicurus do Mato Grosso viraram bons cava ros:no século xv." Aénda assim, posse cle tais armas nao converten essas etnias om trafcantes de esravos iis. ‘Nem sempreacavalri ow apOlvora decidiam aparada”Pelejando apé-com flechasenventnacas, os manes da Alka Gane consegiam rechacar os cavaleiros jalofos! Ha contrvérsi entre os hstoriadores a prepésito da eficicia dos mos quetes eda vantagem da cavalata nos combates ds povos da Afica Ocental” ‘io padece david, porém,ofato de que ovinculo entre a exportago de escrava ria ¢ aimportagic de cavalose outras ermas — espadas, mosques, escopetes espingantas — potencializou onegocio negreiro noma escala jamisatingida pelo ttifico de indiosno outro lado do ocean. Reflexodosconltos nics ereligiosos que sacudiom oSahel* eo Sudo,tra Ficantes mouros oferecem escavos pagios, em roca dos mugulmanos capturados pelos portnueses" Tal forma de escambo contre princpios evangetizadores 20 trafic, Zurara sentenciava a respeito dos cativos animisas “estes negros no vinham dalinhagem ce mouros, mas de gentios,peloqualseriam melhoresdetr- zeraocaminho dasalvacio"*Propaladopelo rei Afonso V, oagumentoedfcan- te seconverteem doutrina eligios enorma do dirctoinremacional ao serendos sado pela bula Romanus poniféx (1455). Documento tide pelo padre Brisio, ceminente missiologo€ aficansta contemporineo, como a “Magna Carta” do vltramar portuguts.” Na bula, o papa Nicolau v empresta apoio aos reis comba- tendo os mouuros ¢ formula a primeira justificago evangélica do trato negreito. + Sau emseube, "oral egies pmmas domarnaAngéine na Tuna plavtatamibém desig: naa zonafrsteeiga asl do Suara eS {A AFRICA OCIDENTAL ENTRE Os SECULOS XV & XVI Considerava sejutoo comércioea posse denegros visto que muitosdeles, epor- tados para Portugil, se tornavam cristis, “Muitos guinéus e outros negros toma ddospor forca ealguns também trocados por mercancias no proibidas, ou angaria ddos por qualquer cutro legitimo contrato de compra, foram levados para os dtos reinos [Portugal ¢ Algarve] onde um grande mimero deles foi convertide & FE Catolica, esperanéo-se que com 2 ajuda da cleméncia Divina seas coisas forem caminhando desse modo, ou aqueles povos se convertam. Fé, ou pelo menos se salvem em Cristo muitas de suas almas” [Narvatias sobre aestranheza da fauna eos rigores do lima ampliamo carter desantropomésfico e desnaturante das perversGes atribuidas as sociedades do Continente Negro. No Esmeralio vem escrito que negros comraho deco ecobrasde quarto de légua corriam soltos na Guiné.” Bestdvios repertoriavam, desde a Antiguidade, as extavagancias do reino animal na Africa. Com o advento dos Descabrimentosastransfiguracesdo imaginSri ocidentalse amplam, Eatretant, ojesuits Sandoval ssgere um determinism geogrifico, Noseutratadosobre aescra Vidéo negra, cle sustenta que os calorese 0s desertos da Aftica misturavam todas as cespécieseragas da natureza nas Vizinuaneas des pocos,ciandlo um ecosssterna par sicularcapaa de engendrarhibridacSes monsteuosas, Tal cicunstanciafazia da Aftca ‘ocontinente de toes as bestialdades,o ternit6rio de eleicio do deménio* No mesmo registro, canibalismo e guerras interteibais parecem justifiear @ twifico negreiro, Bom nas primeira linhas da soa Histria geal das guerras angola nas (L681), Cadornega o pai da hstoriografia angolist,agitao espectro da antro pofagia para numaso frase enunciar as vides redentoras do trafic. Do "resga tedepecas que servem de utilidade aocoméscio, ecomestesresgatesseevitam nia hnavertantos agougues de carne humana, einstruidos na Fé de Nosso Senhar Jesus (Cristo indobatizacos ecatequizados se embarcam para as partes do Brasil ou para ‘outeas que tém usocatélico’."Livradosde acabar esquartejadose pendurads nos “acougues” — fantasma reiterativo nas guerras escravistas nos dais lados do Antico Sul — o:psisioneirosafticanos podiam ser alcados aosnavios negreros para serem salvos, de corpo e de alma, na eseravatura cat6lica d'além-mar, Como sever maisadiante,o pade Anténio Vieira interpreta atrificanegreito comoum ~ grande milagre” de Nossa Senhora do Rosisio:extraids da Afeicapaga, osnegros podian ser salvos para Cristo no Brasil catélico.” ‘Quando se cowertemao negécionegreirono segundo quartel doséculo xv, osholandeses ado-am doutrina similar: o calvinismo reinante em suas col6nias americanas ivi resgatar a alma dos negeos para lf levados.” De seu lado, Lisboa ‘considerava que os afficanos deportados pelos traficantes heréticos incorriam em grande perigo espirtual, Ao firmar um tratado em 1690 como conde do Soyo (Sul da for do Congo) — zona varejada por inglesese holandeses —, o governador de Angola, d, Joo de Lencastre, negociante negriro ¢ depois governador-geral do Brasil inclu umaclausula em queorégulo se comprometiaa vender eseravos.uni- camente “a quem professe a lei de N.S. Jesus Cristo para que os instruam"." Note-seo salto categérico acorrido no proceso de legitimaco da atividade traficante, Num primeiro tempo, no quadro da guerra contraoissi—aguladapela queda de Constantinoplae osubseqtlente apeloa uma nova Cruzada langacto pelo papa Nicolau (1453}—, abla Romanus pontifex (1455) concebia o traro de escra- vyos como um efeito secundario do confito. Como uma seqiiela que “pelo menos” ajudava a salvar as almas dos negros, Duzentes anos mais tarde, a propria tarefa cevangelizadora passava a impor —a exigit—o comércio ¢ o monopilio uso nos portos africanos para empreender um wéfico milagroso, consoante a inteepreta- fo claborada pelo pate Antonio Vieira, No éeulo xvi, eonceitolaico de “civ lizacZo” complementa os beneficios pretensamente recebidos pelo africano na ‘Amésica. Ainda assim, na primeira polaridade (paganismo/ evangelizagio}, como na segunda (barbériecivilizagio), angumento ideolégico temo mesmo feito: 0 ‘tiico negreiro continua sendo apresentaclo comoa via de passagem que carrege ‘© individuo do pior para o menos raim, Da natureza nativa cercada de propalade ‘morte para a comunidad ultramarins aberta a slegada redencio espiritual." Malgeado a precedéncia obtida no trato maritime da segizo, o dominio huso nna Alta Guiné sempre pareceu aleatorio. Pacheco Pereira jd assinala na virada co século xva penda desse comércio por causa da “nn governanca quese tevenisto”. \Nofundo, Lisboa tentou armarum sistema de economia administrada que acabou slandlo paca tris. Cabo Verde, ¢ mais precisamente a cidade da Ribeira, nailha de Santiago —suposto porto seguro paraadefesa do monoplio régio —,agregava 0 centro administrative, missionério ¢ militar da costa ocidental afficana, Negros de Cacheu ¢ arredores deviam ser levados até a Ribeira, ali pagavam taxas e direitos seguindo para 0 Reino ou o estrangeiro.” Taisiniiativas — similares aos circuitos {que Veneza constinuira no Meditersineo, ao redor de Rodes, Creta, Chipre—pro. curavam obter um miiximo de exploragio econdmica com um minimo de ocupa: «go tetova, Sistema que funciona aos trancos no Império lustano do Oriente, mas atinge 0 znite no Caribe na segunda metade do século xv a0 ser posto em pricica pelos holandeses* Contudo, na Alta Guin, como no trngelo Lisboa— ‘Sio Tomé—Costada Mina, o modelo veneziano ensaiado pelos portugueses no -vingou por motives aos quais convém dar destaque rimeiradaenga. Assim se chamavamnas febres que acometiam osestrangeitos naguelas partes. Morsia-e ficilnas carreras ultramarinas. Tanto na travessia para co Brasil como parao Oriente, De cada trés missionarios enviados 4 China no sécu- Joxvu, um expirouantes de chegarli.” Todavia, os bitosse escalonavam aolongo de viagens demoradas,sujeitasa naufrigiose mongées adversas. Bem mais vizinha dda Buropa, a Affica Ocidental apreseniava, apesar disso, um perigo muito maior por causa do quacto epidemoldgico. Os padres caiam ce uma pancada $6. Casos célebres ficaram registrados na erdnica missionésia. Treze dos quinze religiosos chegados a Cacheu na virada do século xv logo pereceram de “primeira Goenga outa feta, nama missio formada por doze religiosos, sete expiraram enquanto conavio que os levera ainda estava ancorado no porto.” Viveiro da febre amarela e de pos letais de maliria, area, sobretudo a Costa da Mina —“aterra mais enfer: aque hé detodasas que navegam osportagueses”,diziaum missionério—apre- 3s proprios africanos oriundosde outras partes.” Provérbio cunhado pelos negreiros ingleses «daa medida do medo dos europeus: “Cuidado na baia de Benin, para um que dali sentava um meio cmbiente perigoso para os forasteiros. Incluindo af sai, vinte ali tém fim De suasbansls, o governatlor de Cabo Verde prevenia 2 Corte das baixas que as doengas locas provocavam nas tropas de rein6is, “Para se lograrem duzenios soldados vindos do reino ser necessivio pelo clima da terra mandar Vossa Majestade,oitocertos.”” Frase torneada do inaciano Fernio Guerreiro exprime a ‘pena eo precodas mortes que asdoencas da Africa causavam nastileiras de missio ‘ios laboriosamente preparados nos colégios curopeus. “Ainda que para cles {sse de tanto ganto morrer em seu oficio por obedignciae salvagdo das akmas, paraa Companhia é de muita perda, porquanto the custao fazé-os, € por quanta falta he faz perdé-os.”" Mais cruamente,o geral Acquaviva, superior geral das), avisou ce Roma:nioiria permitirque a Guine virasse 0 ‘agougue de seus padres e irmos".” Por essa € por outras, Acquaviva desvia seus esforcos do Continente ‘Negro para se empenhar mais fundoos dois grandes projetos de seu gencrala {9 (1581-1615) oapostolada de Matteo Riccina Chae a onganizao dasmissGes guaran no Paraguai* Mesmo a construgo de fetorlasnoItoral paecia aruda, Furada de ros, costa guineana davalivre acessoaos ladies, to nox outostratitaseuropeus Céneros franceses,ingleses, olandeses, em particular o ferro nome europe, conhectam ali grande demand,” Signticatvamente,reprodurn sea fea odesenconto verifiadona nda entre a cas estratgis dos Deseobsimentos: coméscio ot cong? dominara terra ouseguraro mar Adepto da ina cortente, 0 governadorde Cabo Verde critica efcacio da ortaleza de Cacheu, na terafirme,exprobrando—"onove modo de posse custoxssina” — no gual orcno enversdava* Sobretudostivalidadesintermetropolitanafazian dade Santiago do Cabo ‘Verde — plantada n ota dos mares do Sul—08ac0 de pancada dos inimigos euro: peus. Rndiam pouco os impostos reals, se deseupava o sargento-mor da th, “por ‘rw muitos aes [corsitos& cost” Na usr de rend prépras, obispado de Sio Tomé pasa ser sustenado, dee final do Seiscenton, pela rece négia da Rositios de queisas amentam a decadléncia da Guiné, Posta de pare a pre tensio de converter o oceano entre Cabo Vere, Serra Leoae Sie Tomé num mare rostrum lusitano, os ganhos foram consideréveis até Restavraco. Gragasao mer ‘ado garantido pelo Asiento, a cobertura das frotas de guerra fipinas,asmercado- as de escambo espanholas — em especial o ferro biscainho —, os negreiros e 0 Fisco Régio arrancam bens lucros daquelas partes. Contanco por baixo, no espa «co de 45 anos (1595-1640) desembarcaram, somente em Cartagena (atual Co Jombia), uma mada de 1320 eseravos porano,carregadosda Alta Guiné por assem tistas Iusos"" Dados mis precios para um periodo mais cuto, os anos 1609-12, indicam que o nlimero de deportados da Area iranteo contrabando,alcancava a ‘média anvalde 214 indwvidnos." Ama governanca” da Guiné ¢ isso a apesar dos azares da catequese edo dominio colonial, exploracio ultramarina prossegue. Execrado por fncionarios e missionérios alvo de corsirios, oarquipélago cabo-verdiano comesa a ser deizado de lado nas primeirasdécadas do Seiscentos, «em prowito de zonas mais protegidas de ataques pelo fato de terem ventos cor rentesadversas * Como erao caso da costa angolana, Na mesma época, tomando também em conta os quadrantes maritimos na prevencio das investidas da Ar 36 madaespanhola,alnglaterraescolhiaailha de Barbados, situadaaoabrigo dos ven: tos condutores dastrotas filipinas, para fundar uma coldnia acucareirano Caribe \Ventos ¢ marés ainda ajudarama fazer a diferenga enite 0 trato de indios € 0 tat0 denegros,naalturaem queo grande capital assentista ibérico abarca osportosalti- VENTOS NeGREIEOS Do aviio, viso de cima, o mar parece uma coisa s6, Vale, por isso, lembrar “conhecimentos nauticas corriqueirosno tempo dos nossos bisavés, no tempo das longas viagens maritimas: 0 oceano esti cortado por vias balizadas pelos ventos, ccanalizadas pelas correntese pautadas pelas estacGes, Para levar a cibo viagens regulares entre a Metropole ea conquista america nna, devia-se observar um calendario maritimo preciso, wma "janela” sazonal deli- itada. Largava-se de Lisboa entre os dias 15 ¢ 25 de outubro para lancar ancora em Recife cerca Ge dois meses mais tarde. Na volta carecia levantat velas em, Pernambuco, ot a Bahia, até ofim de abril para chegara Lisboa no més de julho. “Tais costumavam ser os parimetros ideas para essa viagem. Fora desses prazos, 0 tempo de cada uma das etapas da viagem dobrava —no minimo—, com oaumen. toexponencial dorisco da tripulagdo, exposta ds tempestades sazonais, a sede ¢ As doengas nas calmarias a0 largo da zona equatorial afticana.” Caracteristicas referidas nos livros seiscentistas de marinharia mapeiam a navegacio da costa atlantica sul-americana, Indo-se do Sul do Brasil para o Maranhao, ou para o Caribe, havia que evitar obaixio de Sao Roque (Rio Grande lo Norte), junto co cabo do mesmo nome. Ali, devia-se ganharo alto-mar para depois valver a costa, Na mongdo de setembro, resultante dos alisios de Nor- deste, as marés geram na Srea um quadro tio adverso “que fiz perder aestimati va do caminho”, adverte o cosmografo Manuel Pimentel na sua Arte de navegar (1699). Naalturado cabo deSanto Agestinho Pernambuco} cotrente Subequatorial sebifurca, dando Ingar corrente das Guianas, que deriva costa acima atéo Caribe, cea corrente do Brasil, cdescendocosta abaixo. Fendmeno que explicaointeresse dos holandeses, durancesua ofensivana Américado Sul, emganhar o controle do arqui- pélago de Fernando de Noronha, entrada de duas rotas estratégicas para osataques contra o Império filipino: a das Antillas e a que descia pela costa brasileira Correnteza mais répica de todo o bitoral brasileiro, atingindo velocidades de 2,5 n6s* no costo que vai do eabo de Sao Roque (Rio Grande do Norte) a0 cabo ‘Orange (Amaps),a corrente das Guianas facilitava granclementea navegacSo pata ‘Norte. Tamanha é forca das Aguas rolando nessa Srea que, mesmo com as velas ‘meio arriadas, navios grandes podiam cobrir em trés dias as trezentas léguas sepa, rando 0 cabo de Sde Roque do porto de So Luls!” Em contrapartida, a corrente reptesentava um obsticulo quase intransponivel 3 navegacio a velano retomno do Estado do Maranho a0 Estado do Brasil, Até 0 advento dos barcos a vapor, nos ‘meados do séeulo xi, s6 as sumacas — bareacas pequenascde dois mastros — con: seguiam sairda Bahia, de Pernambuco, ou maisdo Sul, cbordejarna tarna-viagem do Para e do Maranhio. Ainda assim, cudo dependia da sozt. Durante sua missio na Amazénia, o padre Vieira deixou informacdes sobre «esse fendmeno matitimo que, porsi so, exclula existéncia de um espago econdmi 0 unificado na América portuguesa do Seiscentos, “Uma das mais dificultosas e trabalhosas navegagdes de todo o Mar Oceano & a que se faz do Maranhio até 0 Gear’ porcosta, nfo sé pelos muitos cegos baixios, de que toda est cartada, mas ‘muito mais pela pertinacia dos ventose perpétua correnteza das iguas,” Noano de 1655, uma sumaca levando soldados e missiondrios de So Luis para Camocim, pont litorinea da serra de Ibiapaba, no Norte do Ceari, nio deu conta de ultra ppassar 0 litoral maranhense. Ao cabo de cingitenta dias de continua porfia com ventos emarés,o barco retornou a Sto Luis, desfazendo em doze horas quase dois meses de viagemn infil" Navios maiores ou menos manobréveis, menos manei- Roque. Navegarde volta maisao largo também dava certo, Na linha doequadorcome- ‘ca uma correnteza de compensagio, a contracorrente Equatorial, que gira forte para leste, De margo.asetembro a contracorrente est afastada, se fazendo sentir além de Fernando de Noronha, 2 20° de longitude oeste. Mas, de serembro a ‘margo, ela vem bem mais para oeste, até 50" de longitude oeste, altura da ilha de ‘Maraié, puxando as aguas da linha do equador para o golfo de Guin, Diante desse +0s,** se insistissem, fcavam entalados, “ensacado: “Um nd gusta oma ea moreno 852 menos por hora: 2,5 nbs = 4630 metos por hers 11 qudbmetrospordia, ** nareomareio = manobrivel: ata sede termo antigo de marinara, 8 _quadto, nfo tinha por onde: na regresso de io Lus ou do Para, os veleirosdeviam ‘uscarbordobemao norte, indo até a altura da Madeira, das Canarias ou de Cabo ‘Verde, para depoisrumar de volta 20s ortos do Leste ou do Sul brasileiro.” Entendem se, desde logo, oscondicionamentos politicos quea geografiaeco: nOmica impés cclonizaglo. Com efeito, a separaciio entre 0 Estado do Brasil eo Estado do Maranho (1621), cujs limites comecavam exatamente na altura do cabode Sio Roque, responde ao quadirode ventos e marés predominantes na costa lidade de comunicaches coma Corte etranstomno da navegagio litoranea sul-smericana levam a criagio de duas col6nias distintas no espaco da subamericana: faci América portuguesa. Na mesma perspectiva, uma das criticasfeitas ao estabele cimento do Tribural da Relacio na Bahia (1609) decortia da dificuldadede encami phar équele tsibunal os pleitos oriundos das outvas capitanias, dependents das mongies lavorive sinavegaciodecabotagem, “o que dilata muito odespachodos negécios", notava Brando, Mais valia enviar os requerimentos das outeas capita niasdiretamente aos tribunais do Reino." Exasperado com o seu isolamento amazénico, onde s6 de ano em ano chege- ‘vanavio de Lishos,o padre Anténio Vieira escrevede Sao Luis: “mais fuclmentese ‘vaidaindia.a Porte gal do que desta missio [do Maranho]ao Brasil.” Missionsrios ceautoridades civisdespachadas da Bahia para Sio Luis e Belém deviam primeiro it fazer bakdeagio em Lisboa, para depois viajar até o Maranhao co Pari.” Ha exem- plos célebres da dificuldade da naveyacio norte—sul e, vice-versa, ao longo do lito- ral brasileiro, Depois de cruzar o Centro-Oeste ¢ a Amaznia na maior € mais extraordindria expedigdo terrestre do mundo seiscentista, nos anos 1648-51, Raposo Tavares ¢ seus companheitos fizeram um percurso mais longo ainda para retornara Sao Paulo. Tendo chegado pelos matos e pelos rios a Belém, seguiram a ‘inica rota existente para reganhar suas casas: foram até Lisboa ede la voltaram até Santos, Nos tumultos da Independencia, quando o almirante Cochrane singsava para forear os governos das duas capitanias nortistas a aderit ao Trono sediado no Riode Janeito, ocorreu um incidente revelador. Tantas voltas deu no mar o merce: ‘nétio inglés até topar com vento de feigdo para entrar em Sio Luis do Maranhio ¢ sai, que Lisboa dea rebate em Luanda, julgando ser aquele porto negreiro.o vend dito objetivo da investida da Marinha imperial brasileira Na sta Crénika sobre o Estado do Maranhao, o padre Bettendorf assinala um evento surpreencente acorrido em 1696: a chegada a Belém “dos homens do Brasil”, baianos vindos a cavalo pelo serto para pediran governador do Pati pas- i f2do. No seu retorno “para o Brasil’, osfazendeiros baianos foram acompanhados pelo ouvicor-geral do Para, i nomeado desembargador da ‘dade da Bahia.” Manuel Nunes Collares, assim se chamava 0 desembargsdor, preferiu cavalgar mais de 2 mil quilémetros pelo sertio bravo, semeado de indios hosts, aesperarum hipotético transporte maritimo entre Beléme Salvador. Muito rovavelmente teria de ir primeiro a Lisboa e de lt viajar para a Babia. A via pelo sero paraense propiciou a primeira rota ligando o Noxte amazénico ao restante «da América portuguesa. Existia um caminho mais eurto a0 longo do literal, mas areaise unas impediam que se fizesse 0 trajeto a cavalo, Foi por ai que transitou André Vidal de Negreitos, em 1656, quando deizou o posto de capitio-geral do Marathi para assumiro governo de Pemambuco, Por causa dos ventos das cor rentezas da costa norte, cle foia péde Sio Luisatéo litoraldo Ceatd, donde vigjou ate Recie ‘Outros embaragos surgem mais abaixo do litoral sul-americano, Area de densa instabilidade se movimenta entre a costa de Sergipe ea foz do Sio Francisco, “nela se tém perdido muitas embarcacées, pela qual causa convém passar dali :nuito desviado ao mar’, complerava Pimentel. Nas “mongSes de nondeste”, tam: ‘béan chamadas de “mongGes de setembro”, ventos NE e L-NE sopram até marco, formando um corrente norte—sul na costa, Movimenta inverso tem higer na “mongiode maryo” ou “moncio de sudeste”. Ventos SL, L-SLeS SL fazem as cor rentes cursarem a ditegZo norte, de abril até agosto, Tal € 0 regime dominante do cabo de Sio Roque (Rio Grande do Norte) até os Abrolhos (2 1740'S, ao largo do ‘Sul baiano), A partirdat comeca azona do "vento de baixo” soprando do Sul Cabo Frio, como o nome indica, assinala aponta noste da frente fia carreada pela corrente das Malvinas, que esbarra nos ventos quentestrazidos do Norte edo Sadleste na corrente do Brasil, Sobra por ali do cabo de S40 Tome (Rio de fanciro) até Santa Catatina, uma zona de turbuléncia que estorva a marinha @ vela Sobtetudo na “moneao de marco”, chamada no Sul de “moncio de sudoeste” Entre o Rio de Janeito €o Espirito Santo, obaixio de Sio Tomé, junto ao cabo do ‘mesmionome, obriga onavegantea ganar de novo olargo™ Por sso—"emnrezio ddas mongGes” —, a viagem Rio—Lishoa levava seis ou sete meses se fosse diteta. Mas tinha seu tempo dobrado quando passava pela Bahia, argumentava Salvador de Si, tirando dao motivo para tentar fazera capitania fluminense independente do govemo geral iano.” Anos depois, 0s moradores do Rio de Janeiro, em seu ‘nome e em nome das captanias anexas, ambém assinalam os problemas gerados pela dfculdide da navegagio 20 longo da costa brasileira, Pedram e obsiveram, proviso régia paraque os acusidos de erimes menores residents naquelas para gens comprissem psio preventiva em sas propria capitasias, em vee de serem transferidos para Bahia.” ‘Rem mais tatce, no nico da revoltada Baiada (1839-42), 0 Rertyger, um bt _gue (seleiro de dois mastros e gurupés) éa Marina de Guerra Imperial saido no més de dezembro do Rio de Janeiro com trapas e pettechos para o Mazanhao, topon com ventos contrinios que o fizeram arribar...em Montevidéu.” Prejaizos provocadlos no transporte da producto acucareira luminense pelo baixio de Sa0°Tom as ventanias da for do rio Parafbalevaram, nos anos 1840, 4 construcio da primeira grande obrade engenharia Gino Brasil: canal fluvial de Camposa Macat. loje.m dia, 9s ventos eas marés enviesadas da costa fluminense s6 preaca- pam duas comunidades estranhas uma outra: 0s pescadores pobes de Macaé ¢ ‘os esportista rcosdo Boc Challenge — corvida de veleiros de volta ao mundo em navegagdo solisiia—, que poral passam em abrina etapa final dotorneio, entre Punta del Este e Charleston. Mas, no passado, esses fendmenos aimasfésicos © rmaritimos emaranhavam o trinsivo do centro da Colonia, onsttuindo um entra ‘ve considerivel aotrifico de escravos indios pela costa do Atkintico Sul ‘Ainda assim, nos atios 1620 houve transporte de cativos “tapuias” do Mararhdo para Pe-nambuco, Provavelmente, parte do percursose faa por terra pata atingir portos mais acessveis no litoral do Ceari, No final do século xv, [Alexandre Rodrigues Ferreira aventou a possibiidade de se iniciaratransfes@ncia forcada dos povos indigenas da Amazénia para as capitanias mats ao stl Contd cabe deixar bem vincada a realidad esquecida da geografiahistrica [Aina que todas as tribos da Amazénia viessem entregar-se de mos atadas nas praias do Maranhio edo Para persisiiaoescolho dos ventosna ota maritima dos traficantes de indi de Pernambuco, da Bahia e de Sao Palo. Ao coninirc, as travessias Brasil Angola afiguravamse “quase sempre acompanhatlas de bonangas ou de mui pequenos incdmmodos do mar ¢ ventos", conforme observava umn governador daquela conguista africana.“ Lim dos eixos dabipolaridade eseravistaunindo a Aftica 4 América portuguesa gira, justamente, narotaaberta entre as das margens do mar porcorrentezas eventos complemen: tares, Na continuidade da cortente do Brasil da deriva Sul-Atkintica, da corrente de Benguela eda corrente Subequatoril. No giro —ao inverso dos ponteiros do or [ROTAS DE NAVEGACAO NO ATLANTICO SUL a covavecsie - @® snstonn zreldgio —dos ventos ocsie-leste, entre 0 Trépico de Capricérnio e 30'S, na ida, € nos aisios de sudese, absixo da linha do equador, na volta. O impulso do movi ‘mento circular dos ventos e das correntes ver de uma gigantesca roldana de altas pressées, uma engrenagem oculta da histéria do Atlintico Sul —o anticiclone de Caprieérnio—, estacionanclo no oceano entre 15"¢ 20" de latitude sul Na medida em que se zarpava com faclidade de Pernambuco, da Babia edo Rio de Janeito até Luanda ou a Costa da Mina, e vice-versa, a navegacio luso-bra siciraserd transatléntica enegreira, Em vezde vogarna cabotagem norte—sul no trato de indigenas, na descontinuidade mercantldlas trocas, no oco dasdepressBes atmosféticas, Na contramda dos ventos alisios. Depois chamados “ventos de comércio”, Trae Winds, pelos anglo-saxdes, mas que foram, primeito e sobretu: do, “ventas de comércio negreiro”, African Slave Trade Winds Constatando a regularidade atmosfisica e maritima da navegacao leste— este, o padre Antonio Vieira interpreta o fenémeno como um pressigio divino no seu “Sermio xvi: a “tansmigracZo", o transporte continuo de angolsnos nos mares do Atlintico Sul, permitia, por especial misericdrdia de Nossa Senhora do Rosirio, que cles fossem levadios a América portuguesa para se salvarem do paganismo africane, “Algum grande mistévio se encerra logonesta transmigragao, emais senotar- mos ser tio singalarmente favorecida ¢ assistida de Deus, que nio havendo em. todo 0 occano navegacio sem perigo ¢ contrariedade de ventos, s6 a que tira de suas patria a estas gentes eas raz a0 exercicio do cativeiro, ésempre com vento popa, esem mudarvela.""* sio Tomé — Lasonarénio TROPICAL ‘Ao encetar em 1471 0 contato maritimo com os povos aki, senhores do ouro dorio Volta, no golio de Guiné, Portugal atingia umdos objetivos do avango deses. cadeado com a conquista de Ceuta (2415). Elrei Afonso v descobria o mapa da ‘mina, contorvanddo 0 monopélio dos infiéis que transportavam o ouro guineano pelo Saara.""A este do cabo das Trés Ponta, promontério do golfo de Guiné, foi construido ocastel>de Sao Jorge da Mina 1482). Sistory dé forga legitimidade 20 senhorio da Coroa concedendo indulgéncia pleniria aos cristios que falecessem no castelo, base naval plantada no centro da Costa do Ouro (atual Gana). A muita 6 mportincia da Mina Ihe provinha do ouro obtido na feitoria. Captado por escam bo, scm demandar 0 deslocamento de europevs para a hinterléndia e a garimpa- gem (como sera o caso mais tare em Minas Gerais), 0 metal amarelo vatia duas vvezes mais 0 chegar& Lisboa." ‘Outeos europeus vém, entretanto, interpor-se na area. Ao mesmo tempo, feitor régio do castelo da Mina reclama do “estorvo" causado ao entreposto pelas permutassertanejasdosmandingos, compendoresde ouroe vendedorescie recidos afticanos apreciados pelos 2ki. Em contraponto, Lisboa monta transagdes com: binadas, rocando mercancia europti, asiticae aficana de foraa fora da costa. Usados como carregadares das mercadorias importadas, como garimpeiros.€ em. outrasativdades,escravos so freqilentemence comprados cos portugueses pelos aki na feitoria da Mina." De 1482, data da construcio do castelo, até meados éo século x01, quando engrena o teato para o Brasil cerca de 30 milindividuos oriun- osda Costa dos Bscravos* edo Congo foram vendidos na Mina. Em geralignora os, esses nlimerosilustram a precoce especalizaclo dos portugueses na cabot gem negreira da Africa Ocidental ‘Todas ascareirasque erwzavam a drea lancavam Snicora cm Séo Tomé, cups cdaem 1434 pararespaldar arora da india eas feicorias da Guiné, Doisvinculos uniam alla € 6 continente, Séo jorge da Mina e 0 porto de Pinda, na foz do Congo." “Transplantada do Mediterraneo e do Algarve para a Madeira, s Canérias e Cabo Verde, a sociedade escravista acucareira conhece ema Sio Tomé uma etapa decisiva de adaptagio no ulteamar. Antes ainda de 1500 — quando o Brasil nem estava no ‘mapa—, plantas, culturas,wenicas agricols,gadlo mitiloe grosso europe, mor ddozes brancos e mulatos haviam se ackimatado 20 meio ambiente topical das para gens."®No inicio do século xv, entusiasmaclo com o avango da economia agucare- ramadleirense,Valentim Fernandes pensive que Sio Tomé seria comoa Madeira do Quatrocentos. Na vera, Sio Tomé ser’ino Quinhentos como o Brasil uso-aica nodo Seiscentos, Em todoo caso, 0 complexo madeirense esio-tomense configura um vetor proprio de ampliagéo e adapracio da presenca pareuguesa na América [Nessa orcem de idéias,o longo século xvt constitu o period privilegiado de um. Juso-tropialismoatlintico quese desfaz mo final doSeiscentossob o efeito doluso- bbrasileiiamo, comose vers na conclusio deste live. * Conta Rar: regi do glade Guin tuadaenze orig Vollaeo canal de Lagos. Regimento manuelino para ofeitor de Sto Tomé estabelece,em 1519 —pela primeira ver na hisbria do Ocidente—, regras para tragem, embarque, alimento, transporte, marea¢ ferro em brasa, tratamento e treino do afficano para o escra- vismio moderno."*2roblemas de abastecimento das feitorias, dos armatdores e do pessoal debordo sesolucionam pela substituicfoalimentar.Inhame, banana, aze- rede-dendé, coco, pimenta malagueta —cultivados naquelas regides e de muito integrados dicta guineana —tomam o lugar dos biscoitos de rigo, do queijo, do azeite de oliva e doalho europeus na matalotagem dos marinheiros e do trfico negrei.'” No itimo quartel do século xvi, a mandioca sul-americana comeca a substituir o inhams de origem africana, gerando uma revolucdo alimentar no Adntico Sul ‘Mudancas brotadas na itha de So Tomé influem na politica ultramarina aseado no relatério do donatirio da capitania,d, Manuel amplia em 1500 as fran- quias dos moradores, autorizando-os a comerciar do golfo de Guiné até o Congo: “Por a dita ilha serio alongada destes nossos reinos, a gente nfo quer I ir viver seniio com mui graades libendades ¢franguczas’. © ensinamento sera incorpo- rado ao regimento das futuras capitanias sul americanas, Poderes amplos e rego tiasdiversascontemplamos donatiriosparalevéclosainvestirnaslonjurasda Terra de Santa Cruz, Colbvia acucareira ¢ plataformua giratbria da frota negreira, Si0 ‘Tomé reexporta pataa América portuguesaindividuos maisresistentesasdoengas ccuropéias ou oriundas do tora afvicano, versadosna’ a “lingua de Sio Tomé agiica.” Para o colonato sio-tomense, traficar negros torna-se mais interessante doqueplantarcana No inicio do sécuto xv1 ailha contava com 2milescravosfixos, de 5 mila 6 mit itierantes a espera de embarque para outros mercados.'* Nos anos seguintes, os sio-tomenses passam a fazer o trato entre Benin ¢ a Mina 20 mesino tempo que 2uxam os mercedos do Congo para osistenna elintico.'* Pinda desponta como oprimeiroescoadouro da Africa Central. Negros, mat fime cobre viramobjetode escambona costa.""Lutaspolitcase progressosda tee nologia bélica no Ocidente conferiam um valor estratégico ao cobre, Canhées de ‘bronze apareciam comoaarma decisiva paraderrubaras marathas feudaisno pro esso de centralizagio monarquica, No mesmo movimento, os exércitos cinast 0s € as milicias da aristocracia comecam a ser suplantados por exércitos reais a ‘mando das monarqaias européias. Na Silesia, em Guipuzcoa,fundidores de sins ddeigeejas se reciclar na fabricacto de canhies de bronze, mais egorose potentes igua geral luso-atricana — lioma negreito —e por vezesjé treinados no fabrico do. que os de ero ford ("ferro batido”) ou fundido ("erro condo"). Entre outros tycoons do capitalismo proto industrial os Fugger gana dinhciro nesseramo,"* Novas fundicdes de bronze fazem subir o preco do cobre europeu e induzem & bbusea do metal vermelho no estrangeiroe, em particular, no estufrio do Congo. Para escaparaosembaracoslevantados pelo reido Congo." ascaravelas cantor ‘nam oporto de Pinkdactocam mais ao sul, abrindo o mercado angolano.” Nos anos 1530, traficantes sfo-tomenses embarcam em Pinda e Angola cerca de 4 milindivt: ‘duos por amo: configura-sea maior punSo negrira até ent ocortida numa deter rminada frea do continenteafricano. Meia dia de navios fundeavam mensalmen. tene ancoradouro de Sto Tomé, onde resdiam 650 moradorese suas ani." Ealodem entdo 08 “alvorogos” que pem Sio Tomé perder. Lavradores ¢ senhores de engento brancos entrant er choque com os propzitirios mulatos {que conheciam wm processo de ascensdo social. No vécuo das brigas entre 05 fazendeitos rivals, espoucam a partir de 1545, numa escala inédta no altramar, Tevantes de escravos.” As coinas dailhsviram refigio dos rebelde. Mukambo, palavra do quimabundo que significa “cumeeira” e, mais precisamente, “a forqui Tha de encaise do sto da casa” —caractesizando a morada fsa da familia ou da conmnidade —, pasia a designar o refigio dos rebeldes de Sio Tomé. No Brasil o termo visasindnimo de “povoado de negrosinsurretos".™ Mais tare, ser subst tuido por ilombo — nome original do campo dos guerteios jagis dos reinos de Matambae Caganje! Abolda aescravidio brasileira, mucambo ou moctmbo passa aindicar lugares onde vivem negros, palhoyas,habitacBes populazes ese general zacomo sindnimo de "favela nontestina”™.%* Primeira revota escrava de grande monta no ultramar, os motins de $80 ‘Tomé despertam no colonato um pinico similar quele gerado dois sécuslos mais tarde pela Revolucdo do Haiti (1791), Ambas as lhas coatinham ingredientes potencializadores dos perigos do escravismo: isolamento geogrifico, Intas de fac + Oeinode Congo cobrino Norte testo aul de Angola pared Repbics Democritea do Congo e de Replica Poplar do Congo. Os historladores da Africa, e muitos outros, como, ernand Beau, adotinsgafi Kong, por cierneiae esse antigo Estado banka cas cotbnis hat sles poeriormente na dea pela Belgica e pela Franca. No ej Fundzasent isso: v terse ds inumateasevece ost io coresponde roa Dinamarcacrem porisoseu nome ¢alterado pelos Lbtoralares. Dese todo, continuo ast Coo, como esresarn oxscberanos daqusle rina 08 mcionitiosportugueses daépoca. A cyptldo Reino sesituavaem Manat Congo chamadade Sio Salvador aputirde 1986. ebrirad com seu none osginl, em 1873, pelo governe zavense de Mohutu.& de axsournque reas, Angle pp. 701 #1167 Bes entre os senhores, forte desequilbsio entre escravos e Livres, entre brancose gros. vadia-se as duas mangens do oceano o eco da implosio ameacando as sociedades engendradas pelo trifico, Naviradadoséculo xv, 0escravo Amador — usando recurso ttico mats tarde praticado em levantes de escravos no Brasil — deflagra uma insursicio mo vazio exiadona cidade pela dores. Quatro mil regros se alinham entre os insurretos € mais de setenta enge hos acabam sendodestruidosem Sio"Tomé.” esse contexto, uma junta deperitosse retine em Lisboa paraestudaramaté ria que dari lugar a0 regimento de 1596 sobre os indios, “o gento do Brasil” Aue altura, os enclaves brasileiosjédiscrepavam das conquistas baseadas 20 isadominicaldosmors avassalamento dos nativos — como Angola, Mocambique, Méxicoe Peru, ese aparentavam aos nicleos escravistas de Cabo Verde ¢ Sio Tomé, fundaclos na importacio dos inssrumentos de trabalho (0s africanos), da tecnologia (0 enge- sho} ¢ da planta cu produto seria exportado (acana-de-acticar), Sempre —desde essa époea até bem dentro do Impéto do Brasil —, o estatuto dos indios se define «em contraponto ao estaturo dos escravos negros, cornando assim inaperante o comentio da legiiaclo indian‘sta como se fora uma variavel aurénoma do pas sado colonial e imperial brasileiro. Quatro conselreiros especializados na América portuguesa compuniham a Junta: o padre Marca Beliate, ex provincial jesuita na Bahia (1587-94), errs ex- ouvidores-gerais doBrasil. No decorrer dos debates, apoiadio por seus colegas, um dos ouvidlores enfatiza a necessidadle de preservar os indigenas afim de utilizé-los para resistirds revoltas negras lentes nas capitanias do Norte. Num calculo ao prado, mas revelador do pinico existente naquela época, ele garantia existirem, uzentos negtos para cada branco naquelafranja do litoral™* Da propria Bahia, 0 paidte Pero Rodrigues da o secado 4 Corte: “Os primeisos inimigos [na Brasil] sio ‘os negros da Guin¢ alevantados, que esto. em algumas serras, donde vem a fazer assaltos,¢ io muito trabalho. E pode vir tempo em que se atrevam aacomever e lestruirfazendas camo faze seus parentesna ith ce So Tomé”. Frase conhe- ida doshistoriadores, mas insuficientemente contexsalizada, (Quem escrevie essas palaviasa Filipe ndo era um padreco palpiteiro, um enxerido qualquer, 2rovincial das jesultas do Brasil (2594-1603), Pero Rodrigues pparticipara da congregacdo da, reunida na Babia em 1592, na qual havia sida dis ‘cutida — de mancira abrangente ¢ complementar, como se verd em seguidda—a ‘cuestao do cativeire dos nativos do Brasil ede Angols. Nomeasio visitador(inspe 9 tor-geralitinerante) da Companhia em Angola, inquitiranasmissbes efazendasde Tanda e Magangano no anode 1583, nocalor do conflito emreo governador e os missionaries acerca dos sobados, quando ainda grassavam revoltas negras na viel nha Sio Tomé. Aparecendo como usm dos raros peritos que petcorrera o sistema angolano- brasileiro de ponta a ponta — das firas de rato de escravos do sertio afficano até ‘0s engentos baianos —, viajante a bordo de navios negreitos, é-bitro de litigios “sobre o cativeito eafticanos, negros¢ indios, o provincial granjeara grande auto- ridade nos assuntos do Atlintico Sui® Munido dessa experiéncia, padre Pero for ‘mula o comentario que sintetiza a paranoia do colonizador. Para ele, a guerraracial conduz 0 senhoriato a usara violéneia como 0 motor da economia, ratificando a relacdo de dominagao e de explora¢do imposta 20s escravos. Conseqiientemente, tantonna Affica coma na América, os egros parecem dotados de uma consangiiini dade insurrecional. Negros “alevantados", inimigos principais, “primeiros inimi- 208", do dominio luso na América, podesiam acometer as fazensdas, como faziam “seus parentes de Sio Tomé”, © escravismo transforma o conflito entre brancose ‘negros numa guerra atlantica que Snvade as duas margens do oceano, CO alvitre de padre Pero nio passa despereebido na Corte, Reagindo as ames ica indigenista incorpora (as que pairayam sobre os enclaves americanos, a pol nova diretriz: indios “mansos"* arrebanhados nos aldeamentos** comecam ser fixados a0 longo das zonas de povoamento para barraras fugas de negros ¢impe- dir surgimento de mocambos. Evidencia sea importéncia dessa primeira sociedade colonial ukramarina, que ‘Curtin itil o “primeiro sistema atlantico” — formada pelos enclaves ibero-afti- ‘canos nas Canatias, em Cabo Verde, na Madeira, nos Agores em Sio Tomé —, na adaptacio prévia aos tropicos e a0 escravismo de tenicas portuguesas eluso-ali canas desenvolvidls em langa escala na América portuguesa! * © esmo tinh sgnfeagio precise: “mansos' chamamos aos [inos] que com algom modo de sepia, ainda que ose, lo mais tataveisc persveriveis ence os portuguese, dean dors ins true valivat. Charms raves’ pela contri, osque vier sem mado alum de repibtiea so Innrtiveise com dificcldace sedeinam instru’ padre de vasconcts0s Notsascuisase neat rics dasconsne do Bred 152 1 sobre audierencs este a5"akdis” sto nementeescolhio pelos nativs para xtabelecerres: dencis e“aldesment, moradiasuelnesera compliment ada plat aucordades. cf cap. «a [ESTIMATIVA DO NEMERO DE AFRICANOS DESEMBARCADOS EM CADA REGHAO (BAC MILHIARIS De END i i Bpeed eso g2 PPfeTzeee soms veg? sonra Ras Ae waie has frist por Dold Es Ea owh nd Tc geal Fre sada nos ables de Pip Corn Te te 19, er mbtin Ape pars ope H Plantas (cana-de-acitear, banana, inhame, coco), métodos de culivo, criaga0 de gado grosso (bovino, eqilino ¢ muar), gado mitido (suino, caprino, ovino) gab inhas patos aclimatados, tipos de moendas agucareiras, homens forros ¢ escravos especializacios no trabalho colonial e imunizados contra as doengas tropicais, mécodos de trificonegreito, priticas curativas e alimentares,¢ até instituigbes de controle indireto, comoa Irmandade do Rositio dos negros de Sio Tomé, estabe- lecida pelo alvaré régio de 1526 —antes da fundacio de um oxganismo similar na Bahia (1581) eno Rio de Janeiro (1631) —, puderam ser empregados no Brasil por- «que haviam sido postos em pritica anteriormente nas ilhas atlanticas.* Com o declinio da demanda de escravos no Reino, na Madeira, em Cabo Vere € Sto Tomé, o trato negreito lusitano adguie 0 seu perfil transatlintico, ccaractetistico dos séculos vindouros, Nessa época, a maioria dos deportados ia para territérios nao portugueses. Parte dos afticanos despachados para o Brasil ‘deseimbarca nas Indias de Castela, Fraude comum consistia em declarar partida para a Bahia, Pernambuco au Rio de Janeiro de naus se dirigindo & América espa- inhola, a fim de pagar somente metade dos impostos devidos nas remessas para estes iiltimos partos.* Desde Ingo, a parte dos portos hispano-amerieanos ¢ pro vvavelmente superior ao que estd indicado na tabela I (p. 68). Por conseqténcia, os nnegreitos lusos pareciam maisativos nas mercados escravistasestrangeiros do que nas ithas atlanticas, em Sio Tomé e no Brasil, Por cause do contrabando para a América espanhols, 0 salto das remessas para o Brasil no tltimo quartel do século deve ter sido menos marcado do que sugerem as ciftas. Na realidade, 0 trato para ‘osportosbrasileivos sobe a um novo patamarnasprimeirasdécadasdoséculo xv, ‘quando aalianga entre os pormigueses os guerreirosjagas desencadeiaapillhagem macica dos ambundos CONQUISTA E CATEQUESE NA AFRICA CENTRAL “Ao eruzatem 1483 barra do Congo, na primeira expedigio européia chegada essa extremidadedo mundo, Diogo Caointentava encontraro reste Jose ocami- ‘ho paraasincias Topou como reino do Congo cab um dos capitulos mats dra rniticosda presenca curopéia na Afica, Ato kim qvare do sévulo xv quando se desagrega,depoisda guerra perdida paraas tropas de André Vidal de Negriros, 0 ‘Congo serio teatre das maniginciase contradicBes dosreisde Portugal, dos papas, dos caselbanos, hclandeses,jsultas,capuchinhos,reindis, angolisasebrasiicos. ‘Ouse, daseqiiénda de agentes que revolviam o Atlintico Sul SSuceden quevma parteda aristocraciado Congoabracou ocristanismo para "usa @ novo exedo somo um ariete contra as linhagens rvais animistas. “Vendo -Manicongo [o reid Congo|e os fdalgose outra gentea miss e todo 0 o0tro of cio divino, foram tedos muito contentes,elogo ee ..]e outroshomensprincipais se batizaram e fizeram crstios; e nao quis que outrem o foss, dizendo tio santa coisa e tio boa nio devia ser dada a nenhumn villo", narra Pacheco Pereira no Es mera.” De fato, mani (senhor) Neinga Nkuwu, © Manicongo, visou calico & recebeu o nome ded. Jofo Parte da nobreza do pfs o acompanha na convessio ena mudanga de nomes. Monarguia eletivae nio hereiivia, o Congo atravessa valuasde facg6es durante osperfodos de incerregno. Morto d,JoZ0:, 0 ono pas sot, entanto, para seu primogénito, d. Afonso t, Neinga Mumba (1506-3), depois de um combate em que as Iinhagens crstianizadas venceram os animnistas, Consoante o imaginario ibérico, que arributa as vitOrias ao arbievio divino, d. Afonso afirmor ter visto no campo de batalha “a cruz de Cristono céu € 0 apis tolo Santiago”. Titulos hierérquicos tradicionais, representados pelo vocabulo ‘mani, foram substiaidos pelos itulosmecievaislusitanos de “rei’, “duque’, “mar qués”, “conde”, "ber0", "dom", “dona Hesitantes sobte o sentido da colonizagio — sobre a necessidade de acoplar asmissbes ao dominio territorial —, Roma, Madi e Lisboa evitavamn fundardioce- sesem higaressuibmetidosa oberanosnativos. Desa sorte,a Mesa de Consciéneia de Lisboa — twibunal régio sobre matérias relativas A Igreja — questiona a conve- nigncia de se estabelecer bispados isolados entre os gentios do Oriente, comovosde ‘Cochim (india), Malaca (Indonésia), Macau (China)e, sobretudo, ode Funai atual ‘Oita, na ilha de Kyeshu), ctado em 1588 no xen6fobo Japao, Porém, alegitimida- de do bispado no Congo & explicitamente reconhecida pelo tribunal por se tratar de eino “muito antigo no cristianismo” “Na seqiiéncia, a capital Mbanza Congo passa a se chamar Sao Salvador e recebe o titulo de sede da diocese do Congo & Angola, em 1596, Depois do bispado da Rabia (1550), masbem antesda criagdodas dioceses do Rio de janeiro ¢ ée Pernambuco (1676). © assentamerto do poder politico por intermediétio do credo religioso se presenta como elemento constitutive de monanquias, tanto no Ocidente cristo como no Oriente islmico, No Congo ocorreram outros desdobramentos.” Reis de Sao Salvador do Congo também lizeram uso da hierarguia rligiosa como uma alavance exteraa do poder, atraindo o apoio dos papas , mais tarde, dos eapuchi nos italianos, para contra-arvestat hostilidades da Coroa e do colonato, Por esses outros motives, a histéria do Congo extrapola a regido para inserirse no quadro dos contlitos do Aclantico. Inguieto com a gana dos negreiros, buscando também guardar para si o ‘monopélio do comércio com os europeus, d. Afonso 1 anuncia em 1526a eb-rei de Portugal sua vontade de acabar com o trifico para dar um jeito naquela zona, Pedimosa V. Ad. Joio ni) nos queira ajudare favorecer neste caso, em mandara seus eitores que niio mandem ci mercadores nem meteadorias. Porque nossa von- tade & quee neste reino nfo haja traro ce escravos nem saida para eles.""" De moto proprio, ou induzido por portagueses mais inceressados em preservar seus prb- prios ganhos do que manopélio metropolitano, d. Afonso solicitaralicenea para comprar um navio em Portngal. Pretendia escapar aos intermedistios e praticar intercimbio diteto coma Europa. Depoisde entolardurante doze anos el-reires: ponde ad. Afonso. O documento merece lugar de destaqae nos manuais de his t6ria econdmica ~Dizeis em vossascartas que quereisem vosso reino hala tegate de escra- ‘vos, sto porque se vos despovoa a tera... amim nome parece honra vossanem de vosso reino, porque mais de louvar Ihe € tirarem-se cada ano de Congo 10.000 cesczavos ¢ 10 mil manilhas (de cobre] e outros tantos deates de marfim, que dizer se [que] jé em Congo nda ha resgate nenhum.” A respeito da compra do navio, el tei sentencia: “Mandais me mais pedir navio, de que muito me espanto, pois 0s ‘mous so vossos ... para o que vos quiserdes, cendes meus navis como se voss0s fossem, Concluindo, d, Joao m faz apologia da liberdade do comércio. Do comér- io metropolitan, bem entendido! "O no quererdes v6s que se levern mercado- riasa Congo contra condigdo de todasasterrss, porque a Portugal vem de todas aspartidasdo mundo e compra e vende quem quer." Noentanto,¢, Afonso recu- pera o.conirole sobre otrato e em 1540 escreve novamente a el-tei para fazer pro- paganda do comércio — incluindo o trato negreiro —do Congo.” Talada a porta maritima que podia permitir a autonomia comercial do Congo, Portugal tenta bloquear a via diplomatica aberta ao reino african: suas relagies privilegiadas com a Santa Sé. D. Manu! jétravara em Lisboa uma embai xxada do Congo em trinsito para Roma, onde deveria encontrar o papa. Apesar de tudo, os entenimentos entre o Congo ea Santa Sé prosseguuem em 1518, Leiox consagrad. Henricue,filho ded. Afonso Neinga Miuemba,como bispode Utica Houve, da parte de el-rei d, Manuel e do papa Leto x, o intento de praticer no Congo uma estrategia“constantinista’, como escreve Boxer, de promovera euro peizacio pela via politica ereligiosa, mediante batismo das linhagers dominan- tese do efeito de cascata que deveria empolgar toda a hierarquia da sociedade ‘bacongo- Cinco abos depois, \fonso rmomeia embaixadaresdo Congo junto 20 papa Clemente va. Ato eiterado em 1547 por d. Diogo Nkumbia Nzinga, que des pacha outros enviedos junto 20 papa Paulo." Aquela altura, po “atlintico” — matcado pelo dorainio territorial, 0 repovoamento e a economia escravista de produgio agucazeira —, engloba Madeira, Cabo Verde, Sa0"Tomé, ¢ osenclavesda América portuguesa. Osegundo, de tipo “asisico” —caracterizado pelo dominio indiero, economia de circulacSo ¢ 0 envolvimento mercantl — toma corpo nas fetorias fincadas nos terminais das zonas ce comércio desecber tasna Guiné, no Congo, em Angola, Mogambique, na Asia e, em boa medida, na Amazénia, Na india e na Insuindia, Afonso de Albuquerque imprime um rumo belicist expansin, osencadeando uma politica de dominio imperial que leva de ‘cambulhada os panos mercantisinseritos nas viagens de Vasco da Gama e Pedio Alvates Cabral ao ndico.% Mas no Congo estratéiga de dominio inditeto, pela via do comércio, prdurou durante um século ¢ meio. Regimento dado por d. Manuel 20 seu embsixador junto ao soberano do ‘Congo formula pe-guatasprecsas, ercucientes,acereado potencial donovo mer «ado, do quadro econdmico vigente no pas. Para comecas, ebei determinou 20 seu enviado que impedisse hostlidades do colonato e dos comerciantes reinbis -aultramarina se encaixaem doissistemas. O primeiro, contra aqueles poos.O objetivo erao cométeio, Endo. conquiss, “Trabalhareis de saber Go trato qu li pode haver.” Cobre, marfim, exravos “eouteas mescado rias que na Ferra houver” constitulam monopelio do Manicongo? Ou havia uma «asta de negociant:s natives? Qual o volume e oarranjo das trocas correndo entre ‘0s povos baconsgox! “Que soma da ditas coisas se pode haveretirar cada ano e por ‘que metcadarias” Estara o Manicongo disposto a pagar um tributo regular a Coroa portuguesa?” Movidos porcuidados emelhantes, funclonériosinglesesredigem nos sécu Tos svn e x4 a respeito da india, densos relatoros, eyo suco ser extraido por Mars, Henry Maire e outros pensadores sociais."*Na india oitocentista da rainba n ‘Vitoria como no Congo quinientista ded, Manuel, fazi-se necessirio entender 0 modo de circu das mercadoris, as caractersticas da propriedadefumdiria, as relagBes ce patentesco, o sistemade poder, economia nativa para que os adminis tradores coloniais pudessem tributé-laeficazmente." Até porque 0 dominio metropolitano, no Congo como na India, se exerceu durante muito tempo por ‘meio de tim governo indiretono qual a aucoridadle nativa permanecia de pé Contencioso de século e meio entre o Congo e Portugal —resolvio 3 bala ern 1665 pelosespingarceiros de Andvé Vidal de Negreivos—nasceu da isputater ritoial sobre minas pertencences ao reine bacengo. Coisapropriamenteinimagt vel no outro lado do mas, onde no passava pela cabeca de nenhum moradordo Brasilqueoschefestibaisindigenaspudessem deter soberaniasobrequalquerpar- cela do tersi6rio americano. Bem mais restito se apresenta, ce fato, odominio eto ustanona Asiaena maior parte da Aftica, Determinadamente, se buscava penerrar,tornar acessve, * descobrit” —no sentido proprio da palavza no Renascimento —, umn mercado cocluso. Zona mercantil is vezes pressentida (Congo), as vezes bem eonhecica (Inia), masaéé entaocerrada as europeus." Nessas partes, oenvovimentodeve siaserlevadoacabopor cima, mediante asliangacomoschefesnatives.Dafosbens ostentatériosofertados aos eis do Congo, Cavalos, asnos,lebres,galgos, flees, “algum espelho destes de Veneza dourado”. "Uma capa aberta sada pespontada toda seda”, “um capuz rosado pespontado de sedamento.” “Dois pares de calgas, ‘amas roxas contras pres.” “Um frisado debruado de veludo e maisum pelote do _mesmo pano [1 as mangas forradas de tafets.” Lencos de cetim, chapéus, Toga.” Outros pesentes ainda, & primeira vistainsbites, como as cadeirasforra das owas tas “bacias de mijar” doadasaoreidosassis, vizinhodo casteloda Mina.” Simbolos do aperato real, os bens ostentatérios ofertados encaminhavam 0 contrat inicial, a abertura do porvo ou da eiade rato. Muitas vezesasoferendas, para além do valor monetirio,representavam 0 trbuo politico que os curopeus prestavam aos soberanos natives." [No entanto,«rapina —"o trabalho das armas", no expresso reveladora de 7Zorara—munes srt descartada, Ao contrrio, Saque e comércio se substituem, se alternam, se complementam. D.Jofo i enuncis 0 lugar ea functo ds pilhagem 20 oarem 1532asihas Bijagés(@olangoda Guiné-Bisau) aoinfanted. Lis, seuitmio “"Nio querendo os negros que ora vivem e em diante viverem eestiverem nas dias ithas fazer por sua vontade resgate[..Ihes possa fo Infante) fazer guetta e 0s man- dareatvare como cativosos mandar venderem meusreinosouforadeles, onde ms Theaprouver pagandosme dosque assim porgucrrasetomarem,oscteitos quepara sim seartecadar dos escravosqutese cago’. Nasconjuntorasemqueasmes- adorns cxropias se desvalorizavam ou as irocas pareciam blogueadas pelos nat- vos osiqucintervisha comomecsnismo de regula mercant Noingcio dos anos 1540, nccentes em Sofia, a sul de Mombaca, revelavam {que aabertur eum feiroria numa izeapromissora podia muitobemniodarem nada.” Esse entreposto da Afiea Orentl fora conguistado aos érabes pelos por cugueses que contavam ali captaro auto exportada pata o Indico pelo imperador do Monomorapa Was feicoria de Sofa entupiu, na seqiéncia de um jogo de somazeronoqualnenhuma ribo sualedeixavaa vizinhasefortalecer com otrato europeu. “A guerra [que fazem entre sos suailes]€ sobre se defenderem [proibi- rem]uns aos outros que no ventamn resgatar nem levem mercadorias da feitoria, porgque qucm as tiver sed logo mais poderoso que os outros”, informava um ex- feisor de Sofala.™ Para romper 0 bloqueio dos nativos da costae reativar o comés- cio interiorano, os portuguesestiveram de lancarinvestcas Zambézia dentro.” Conforme as etapas observadas no século xv na Guiné, eno século x91 na India, a fortaleza vem depois da fetoria.Primeiro,atase 0 escambo native num escosdouro dolito:al,depoisse enguem asmmuralhasparasalvaguandar o monopé- lo gio na érea.** Passos decisis para enquadramento mercantl sitano © europeu ocorreran nas pracas aséticas, nas quais se procedeu @ equivaléncia dos pesos e medidas as diferentes cultusas. Caso ce Cochim, na coste do Malabar (Kerala) onde o vice rei Francisco de Almeida logrouharmonizarasbalancasindia nase curopétas criindo 0 “peso nava”.* Noutros lugares as trocas maritimas-vao comperrare 0s ports io incorporads 3 forca na economia-mundo, abe dar relevo i ambivaléncia da interveneio armada portuguesa, Os arca Inuzesservem paraaroteger osenclavesultramarinosdasinvestas.dos concorren- tes singrando nas vizinhaneas. Mas podem ser também usados para fazer 0 tato sertancjo pir, pgar no tranco, Por si s6, a feitora nao assegura a itradiacio do comércio costero 9arao interior das terras,Catapaltados pela fortaleza os reides de rapina ajucam arelancarapermata nas conjunturaseenaszonasem que os ati vos refugam mercadorias importadas, “Convém porse guerra em campo para remediate prevenir que se nao impida a pregagio do Evangelho, nem o resgate © comércio [..] que [08 sobas) nfo fardo com tanta felicdade, se o temor nfo os obrigar” Tal era aviso expedido no ano de 1658 a0 Conselho de Guerra lsboeta, por um dos organizadores da co-gestdo lusitana ¢ brasilca no Atlantico Sul, 0 senhor de engenhos, comandante da lua anti holandesa em Pernambuco e entdo governador de Angola, Jofo Fernandes Vieira." Arededle fortinsinterioranos que —desatravancavao teatosertancjo renan- do-o para Luanda e Benguela — ser um trunfo decisive para o dominio multe calar de Portugal no Atlantico Sul. Tera sido, de fato, no territério angolano quea mbricagioda plhagem direta como comércio uhtramarino tinge uma intensida- ddesem paralelos, Parte da istoniografia deixou se impregnar pela intexpretacio que concebe 4a conquista de Angola como uma seqdéncia de combates visando 0 daminio de suma regio sia em minerais tess ppriaspasa colonizacio. Enfoque propria mente survealista que ocula o essencial a egio fi o teatro de uma devastadora caca de homens no movimento constiative do mercado mundial na Epoca Moderna. [Nas primeirasclécadas do Sescentosa regio angolana jd se incorporava a0 imaginério de comunidades indigenas do htoral da Améica como um dos txts ‘componentes do universo colonial que se exguia no Atlintico, Naguele tempo, Caraibebé:guacu, 0 “Grande Anjo”, um prestigioso pajé caijé do Sul do Brasil, ‘ensinava que os caminhas para 0 Céu seguiam somente t8sitineritis: 0 prime: 0 teanspusnha os Patos, zona em que ee viva, o segundo atravessava Portugal ¢ cenfim o verceiro, passando por Angola." 3. Lisboa, capital negreira do Ocidente Plantada 20 maior esturio europeu, Lisboa destacase como a maior cade Scie na cartograa filipina do Seiscentoscpltaform giratéradastrocas entre ropa ea Aften Cliusulas do Tratado de Toresias —reiteradas no Acondo de “Tomar (1581 slanio a uniaocindsticasbéries — garantam a Porcupal 6 senhoxio sobre o comeérco itor aficano, Mads campreaparte que Ike cabe no acordo, perseguindo os vas de Lisboa nosportosds Aca das Candriase do Caribe Paulatinamente os negretos portugueses ganham o controle dos mercados hispano-americanos, esbancando os traficantes genoveses no sim quartel éo. século xv’ Em segtida, os portugoeses conseguem segurar portosefeitorias africanas,¢ obtéme quase-otalidade dastizercias —uma espéciede guia de expor ‘agio —expediéas sor Mads para aprovstonara América espanbola de "pecasda inca" « Enquanto a ihasatnticas (Canisis, Madeira, Agores, Cabo Vee e So “Tome eapeninsul béricaformavam o maior mescado consumidor de affcanos, divas zonas do Continente Negro atraiam os armadores: a Guiné Cabo Verde origem de 31% do escravos, regio Congo-Angols, de onde safam 34%! Nas ikimasdécadasdoQuinhentos,quando.o mercasloamericano firma sua preem: néncia nademanda negra, ogrosso do trifico se desloca paraabacia do Congo e para Angola, saqeeada por Dias Novats 7 Segundo otestemunho de um missionsrio, uma “infiidade’ denativosestava sendo cativada em Angola os anos 1580, Capitaneando 10 mil arqueirosnativos— “oschombaris—, Novais contava ainda com 150 arcabuzeiros europeuse agua car valaria, em parte composta de montarias vindas de Pernambuco ¢ da Bahia, € cingjienta edes de fila temiclos “como a morte" pelos ambundlos. Desde ento, 0 nimero de africanos deportados para as Américas ultrapassa o volume do trafico tansaariano de escravos para o Magrebe, assim como 0 trfico maritimo para os portos europeuseasihas atlinticas.”A partir dai, 0 comércio negreiro deixa de ser ‘apenas uma entre viriasatividades ultramarinas iniciadas com os Descobrimentos ‘econverte-se no principal esteio da economia no Império do Ocidente. (© MERCADO IBERO-AMBRICANO Autor do memorial que convenceu Filipe 11a inaugurar os Astentos, 0 sertanista portugués Duarte Lopes concebia 2 Africa Central como uma imensa reserva de esctavos, ¢ via no trafico negreiro o instrumento da conquista por ruguesa de Angola! Juiza seiterado na mesma epoca por outro perito do “Atlantico Sul. De fato, no seu relatério sobre o Brasil e Angola, encomendado pela Coroa filipina, Abrew ¢ Brito lanca sobre os povos angolanos o olhar obje tivo de um madeireiro que divisa pela primeira vez a floresta amaz6nica: “Buscando no dito reino [de Angola] todos os modosnecessirios que convinham para crescimentto de Vossa fazenda, achei que a coisa dos escravos era uma di imaiores escalas que se hoje sabia, a qual nio cansatia até o fim do mundo pela terra scr muito povoada" ‘Madi possua seus proprios motivos para pdr em pregio os contratos dos _Asientas de escravos, Desprovida de capitai, sem feitorias na Africa negra, Jidando com um sistema de frotas inadaptado ao transporte de mercadorias vivas, a Espanha carecia de alternativas." Desde logo, os Habsburgo praticam somente umn monopéli sca, instaurandocs Asientas sistema uniicado decom cessdes de aprovsionamento de afticanos & América espanol, lsloado pela Coroa por tempo determinado, segunda certas modalidades.* Arrematando + No dieitopblica espanhol dos séuloexwavato Ait configara ums contrat entre a Comoe e tam patel on uma compania segundo o qual monarqua cemecde a asses certos Pit zB todos 0s Asientosleiloados durante a unio ibérica, negreiros, armadores ¢ grandes negoviantes portugueses ganham manda e mio sabre 0 mercado escravistahispano-americano, Decorréneia da mortalicade da populacio in ena usada no trabalho das minas, a importagio de afficanos por intermeédio da “Asiento passa a ser um fator determinante da economia hispano-americana. © {ato de os desembarques asentistas concentrarem-se obrigatoriamente em Vera Ceuz, Cartagena, por vezes, também em Buenos Aies,levava 20 transborode alicanos para outras zonas. Peitosatravés de Cartagena 4 Venezuela, ao Caribe, Lima (pelo istmo de Panams),e depoisao Equador, a0 Chile e ao resto do Pera porterra, aredistribuico eotransporte regionalde aficanosterio.causado mais rortes do que a travessia até a América." Tais cizcunstincias explcam 0 forte cerescimento do trifico negreiro para a América espanhola no periodo 1601-25 (Wer tabela 1, p68, Definem:se asvariaveis macroeconBmicas afunilando os imivesdo trabalho {ndigena na América portuguesa. Deftonce &crescente procura de mio-de-obra compulsoria nos engenhos brasileiros, 4 proximidade da carreira macitima movida pelo grande capital mercanti, numa rota mais sipida ¢ mais ativa que 0 porcurso costero sul-americano, porsugueses, sovafticanos ¢ braslicos labo: ram o maior mercado de escravos do Adantico. Numa conjuntura de recuo das rendas régias ¢ de aumento de despesas militares no ultramar, os nvestimentos privados do grance capital comercial ibérico ampliam o dominio portugués na ‘fica Central As duas fortalezas do litoral —em Luanda e Bengucla—e aseés ‘outras do interior — Muxima, Magangano e Cambambe— garantindo a sobera- nia de Lisboa na Atica Central nas guerrasseiscemtstas contra os holandesese 08 teinos natives, foram construidas € reforcadas no period dos Asienzas arremsata- dos pelos portugueses." Apos a ruptura entre Lisboa e Madi (1640), parte das redes de troca, do equipamento negecio ¢ da infraestruvura geraéa pelo capital assentista encaixa no sistema de tréfico integrado ao Brasil. A quantidade © 4 os geraimentesobstorma de mozopio comer Signe também contrat dae com ra sneer banaue nedante ilo ma adn 0 primer sms cera sms em cri 3 noes erenregenimadeterminad cae, obo corpromssa dese omosatespagadcpsn pal muconjurotet. Porcomoditde, so agulaplavaaseiseacisiament parame refer aos contrats zégis relaivos a0 fornecimento de aficaros & Amerie, “Ariety”, G. FLERE, Dieionare de hitora de Esp, vp 3948 a escotha de escravosdestinados aos poztos braieios si incrementades, medida que desaparece de Luanda a demanda dos assentista,fornecedores da América espanhola." Paradoxalmente,atransformaciodo periodo filipino queters maiorimypacto ‘na América portuguesa ocorre fora do teritério ameicano, no outto lado domar, snoapéndice angolano da economia brasileira Oprimeito leilfo do Asiento negro foiarrematado em 1595 em Madi por um lisboeta, Pedro Gomes Reyncl.* Bem introduzido na corte filipina, Reynel detinha ainda o Contrato de Angola (teferente i cobranca dos direitos régios), Circunsténeia ‘que 0 ajudou a adguinir © Asiento, dando-the vantagem sobre as propostas concar- rentes. Ao fim ¢ ao cabo, o assentista segurava as duas pontas do negécio. Ar rendatiio fiscal da Coroa e principal compraclor de cativos em Angola, ele se apre: sentava ainda como fornecedor quase exclusivo de afticanos para a América cespanhola,” Como observou Magalhdes Godinho, trata se de um esqueia ipico dos primeiros Asientos arrematados pelos portugueses: pelo menos até 1624, osasventis: tasaparecem como titulares ou sécios do Contato de Angola.” ‘0 segundo assentista, Joo Rodrigues Coutinho, conserva 0 posto de con: tratador de Angola, mais importante ainda, ganba a governadoria (1602-03) da conquista, Cavaleiro da Ordem de Cristo, ex-membro do Conselho de Portugal, ex-governador de Sio Jorge de Mina (como o fora seu pai), aparentado a mer- cadores e guerreiros engajados no ultramar, Coutinho tracau planos ambi ciosos." Nao por acaso, o cargo de governador Ihe foi emprazado pelo mesmo periodo do Asienie — nove anos —, configurando a mais longa governangs atribuida no ultramar. Antes de deixar a Europa, Coutinho encomendou em Hamburgo naviose ferragens destinados a Luanda. Do Prata edo Panamé, onde vivera fazendo negécios com eseravose gado, tencionava trazes 2500 cavalos par formar companhias de cavalaria, importante arma titica nas guertas de Angola. © alilevantar novos fortis." ‘Sem buscar parcetia com os capitalistas habitualmemte interessados nesse tipo de empreitada, Coutinho associou-se a pequenos acionistas espanhdis — proviveis testas-de-ferro de mereadores ctistdos-novos —, e empenhou seus préprios bens para garantit as caugGes € os investimentos necessirios ao arrenda mento do Asien.” Dispuitha ainda de alvaré outorgando aos oficias da Africa Central privilégiossimilatesiqueles consentidos aosservidoresrégiosna Afticado ‘Norte, na india enas armadasimperiais. Estudiosa do asunto, Enriqueta Vila con sera que Coutinho bancou quase sozinho o Astenta como fito de aleancar gloria s6 pata si almejads: a conquista de Angola" Acompanhaclo de soldados ibésicos ‘eteranos das uerras do Marrocos, o nave governador desembarcouem Luanda logo atacou os schados da regifo de Quicama Recluto de sobas que detinham o sl de gema das minas da Demba, fonte de umaativa rede natva de comércio a longa distancia, Quicama —origem do desig native quigamid —ergue-seentreosrios Cuanza e Longa, 20 ul de Luanda.” Cedo, ‘o papel estratégico do trato salineiro fora detectado pelos conquistadores. Do- cumento jesuitico — um dos muitos textos sobre a economia ea politica africana redigidos por miss onsrios para facitar aconquista—revelava n final do século xt "Se potia conquistar grande parte do reno [de Angola] sem guerra, somente com tolher a saca do sal [de Quigamal, que nfo corresse pera outras partes”. Ouvidos os comandantes mais prticos nas campanhasafticanas, Coutinho fe de Quicama sua “nta principal’. No marchou to longe quanto pretendia, der ruivado que foi peas febres tropicals." Com a morte de Jofo Coutinho, seuirmio e s6cio, Gongalo Vaz-Coutinio, diplomado em lets pela Universidade de Coimbra e geno do tesoureito-mor do Reino, assume o posto de asentisa até 1609.” Temeroso das febres angolanss — ‘a calamidade da terra” — que haviam consumido seufilho, Luis de Sousa, eeu inmdo governador, Gongaloenjetou a chefia da conguista,Preferiu assur mais, tarde 0 comando da feitoria de Mazagio, no Marrocos.* Durante seu tempo de assentista, outro de seus irmsios, Manuel de Sousa Coutinho, ex-militar, morou e fez negocios em Cartagena, no Pratae,talvez, no Rio de Janeiro. Atuando no lucra: tivo citeuito Buenos Aires—Rio—Luanda, ele negociava com a prata, cavalos & eseravos, Retiradomais tarde no mosteito dominicano de Benfica, Manuel orde- nox: adatou onomedo sobrinho morto em Angole, Luisde Sousa, eredigiu sua notivel obraliteriria ehistérica, Aocomentarolivro de frei Luis de Sousa sobre as crigens da ordem dominicana em Portugal, o padre Antonio Vieira aduz a vida movimentada do ade escritor antes de seu recolhimento monistico, fazendo observar que ele estudou historia nfo “nas academias das Ciéneias”, mas "na Universidade do Mundo”, Aomorrer, frei uisde Sousa egou parte desualheranga a outro sobrinho, « Francisco, irmao do defunto Luts.” a Filho de assentista Goncalo, Francisco de Sousa Coutinho serio mais impor tante diplomata da Restauragio, Angola —terra onde sua familia fizera grandes snegécios, onde baviam perecido seuirmio eseutio—tevedestaquena suaestraté gia diplomitica de asentamento da soberania bragantina, Outto filha do ass: tista Goncalo, Lopo, casou com Joana, filha de Manuel Pereira Coutinho, mais tarde goveenador de Angola (1630.05). 0 ilho de Lopo e Joana, Gongalo Vaz, Coutinho (o moo}, uniu-se a Barbara da Veiga, filha de Diogo da Veiga (1575 1640).* Memabro de uma familia que entroncava nos eons6rcios de banqueios cristios novos da corte de Mads, instalado em Buenos Aites etransitando por Lisboa e pelo Rio de janeiro, Diogo da Veiga controlava negécios no Brasil, no Peru, em Angol, Portugal e Flandres. ‘Ainds no tempo dos Asientas dos irmios Coutinho, instalor-se em Luanda e aliresidiu por vinte anos Gongalo Nunes de Sepiilveda, um importante mercador empresiio do Atlintico, Filho de um negociante ligado aos tratos da [nd Goncalo preferiu explorar o comércio negreiro. Ganhou muito dinheiro e atuou como intermediério em transagbes por conta dle banqueiros portugueses de [Antuérpia e Lisboa, No final dos anos 1620 transferiu-se pare Madi, naturalizou se espankol e passou a operar como banqueiro da Coroa. Outro mercador ceapresériocuja careireseassemelha precedente, @Simio SoaresPeres, Vinculado ao consércio dos banqueitos Peres de Andrade, ee eirculou entre Lisboa, Luana, Bula e Venu Crus wgeuciando exceavos ¢ aptcar: Denunelade & Inguisigio por judaismo, presoctorturado ema Lisboa, Simo foi deportado para a Bahia. Gracas ao capitalacomuladoe aos seusngluentes conatos, conseguiumudar-se para Vera CruzedepoisparaSevilha, Naruralizado espanhol(1639),passouaserumdosban- queicosde Filipe.” Na mesma época, o Contrato de Angola (1607-11) pertencia a Duarte Diss Henriques, ligado a Diogo da Veiga escio do governadorangolano Mantel Forjes| (1607-11), 0 iatermediio entre Duarte eo governadorera Manuel Drago, feitor e procuradorde Henriques em Angola, e agente do cicuito negrero Lisboa—Rio de Janeiro—Luanda—Buenos Aes. Duarte Dias Henriques (1570-2633) eraneto dlo potriarea jadeu portugues Duarte Dias (ali, Abraie Aboab) e comegou sua catreira em Pemambuco, onde investi em engenhos de agiicar € no trato negreiro. Sua familia tinha parentes ¢ representantes nas principals pracas da Europa e da América, No final dos anos 1620, Dias Henriques & também um dos banqueitas da Coroa espanhola.” _Agregando consorcios familiares enegécios da cortede Madriatéosportosda periferiaultramarina, ai redescosmopolias derivam da forma segmentada ass ‘mia pela cistalizacio do capitalsmo comercialna peninsula Ibrica. Resta que, de etagio em geracko, valendovse de matsimdnios, testamentos e sociedades, per sonagens importants ds financas eda politica ibérica se envolvem no comérciode escravns de Angola, fazendo transparecer a dimensio globalizante do negécio nnegreiro no periodo dos Asint. Equipado coma cavalaria eos soldacostrazidospor}oao Rodrigues Coutinho, Manvel Cerveira (1603-07), seu lugar tenente e sucessor no governo angolano, ataca de novo Quigama ea zona de llamba, Libolo ¢ Cambembe.” Desfechando as estocadas rematadas meio século mais tarde pela ofensiva uso -braslica,” o novo governador assedia 0 sobado de Ambuila, entroncamento dos caminhos entre a costae a hinterlandia, No término de sea governo, entre 12 mil € 13 mil escravos estavam sendo exportados anualmente da congnista." De janeiro a abril as chu vvaradas atvasavam a marcha dos libambos ** — colunas de cativos amarrados — pparaasfeiras os portos (numa ariantereveladoradia traceléneia do quadro socal brasileiro, bombo designa ainda hoje no Nordeste as levas de sertancjos que smigram para o Sul em inisca de reahatho), Mato, jtnh julia comvinham At ppartidas por causa das empestades sazonaisda rota este—oeste no inicio do verso boreal Meseshavi, portanto, em que 1500 ndividuos deixavam para sempre sua gente, sua aldeia, sua terra, empurradospara dentro dos tumbeiros. Outrostantos {ndividuos aguandavam encurralados nas cercanias da cidade, sendo escolhicos, alimentados e, muitas vezes, sepoltados ali mesmo. Cansago fisico, mau trata ‘mento no percurso terrestre, subnutica favam boa parte dos escravos forasteiros,arrancadios do plat6 Ovimbundo ¢ de nas Jonge. Durante quase trés séculos, multides de gente em pinieo eram Je ‘cas doengas do porto luandense cei vvadasacorrentadas do interior para serenfiadasnosnavios que partiam de Luanda, Em acordo como gue asa no capt 1, se Basico sercfete, um s6 tempo, aosineresses poruguests eluso-brasletos, **Nopetodo colonia aleve devecer sido usd no BrasiIn sentido original que haem quis bbundo:paranomearierasdeeseavosrectm dhegads,em vagemparaasfazendase engenboedo DPRINCIPAIS ROTAS ANGOLANAS DE TRATO TERRESTRE NO SECULO X¥m pe, OCEANO Si ATLANTICO combo : : Te Poros negroes "Foie, fae, povondas 9 nleoe coonie ss Princpas ras riaiorporto negreiro de toda hist6ris, sem que os curopeusali presences tenkam deixado testemunhos esses fatos. 1H lacunas mais significativas ainda na documentacio, Bernard Bailyn st blinhow a “vastidio de nossa ignorancia” a respeito das grandes migragBes mo. demas de povoamento da América.” Mas o desconhecimento que envolve 0 fico negreiro é de outra natareza, Aproximadamente 12 mil viagens foram feitas dos portos africanos ao Brasil para vender, 20 longo de 8s séculos, cerca de 4 mi InGes de eseravos aqui chegados vivos.* Afora os traficantes ¢ os marinheitos, ot tras pessoas livres viajaram nesses navios,tinico transporte entre os dois cont nentes, Existiam poucas eabinas nos tumbeitos. A noite e no mau tempo, no se podlia correr orisco de permanecer no primeiro convés, Dessa forma, alguns mi Iharesde funcionstiosrégios, comerciantes, colonose padres viajandoda Africa a0 Brasil —para aguificar ou buscar transporte atéa Metropole —, virame ouviram ‘© martirio dos deportados muito de perto, durante seis semanas on mais tempo ainda. Nao obstante, as refer tamnapalma de uma s6 mao, ‘Um dos rarostestemunhos, 0 do frei Sorrento, capuchinho italiano, deixa centrever a tragédia dos novecentos escravos embarcados de Luanda para a Bahia ‘em dezembro de 1649: “aquele bareo 1 pelo intoleravel fedor, pela escassez de cas diretas sobre as travessias seiscentistas se con- espaco, pelos gritos continuos e pela infinitas misérias de tantosinfelizes, parecia uminfemo”." outro relato feito poucosanos depois, também de autoria de wm capuchinho italiano, que dé detalhes sobre a distribuicia dos escravos a bordo. Para prevenir revolts durante a travessia, os homens vinham acorrentados no porio, as mulheres no segundo convés, as mulheres grividas no castelo de popa e ascriangasno primeiro convés.* "sta navegacio éa mais dolorosa que existe em todo 0 mundo", escreve 0 fei Piacenza." Constam mais algumas natrativas no século avi € um niimero maior na primeira metade da século xx, 4s vezes com, pulsoriamente transcritas em inguéritos. Ao todo, os testemunhos eonhecidos sobre os tumbeiros portugueses, braslios ebrasileiros (durante o Império) no dlewem passar de trés dezenas, Muitos provém de estrangeitos, mas nenlusn deles| dlos padres que mais viajaram no percurso, os jesuitas portugueses. Por que? * Apart onda da tbe accent morale mda po trove cada seul © culms média de treentoscactmos/naviaté 1700, e350 escravo/ avin 1701 ©1900, ede ‘quatrocentos exces! navio de 18011850, ver. Sx, The Atantlae ae. pp. 189, 1449. Porgue exis, certamente, instrugdesda orem no sent de evitar ais asta: vivas Eo tnico motivo que encontro para expicar o aberrant silncio des fontes sobre o assunto:a igre, os mssionirios, os curopeus, ox brasticos sabiam que o drama do tific atlantico se desmedia numa épocaentretanto marcia por ger 1a efomes ma Europa, Sabiam eescondam Repetido ao longo das décadas na mesma Luanda, na mesma rota, para cinegar aos mesmos portos brasileiros, 0 quadro dantesco do tefico de afrcanos distingui se do cenit fragmentado ebrevhoso do trato de cativos inios Tal contraste merece seranalisado. CATIVOS B ESCRAVOS Como ¢ sabido, o Acozdo de ‘Tomar (1581), pelo qual as Cortes portuguesas reconheciam Filipe dle Espana como rei de Portugal, assegurava a autonomia administrativalusitanano Reino enassuas coldnias. A tal ctulo que historiogragis portuguesa recente, num exagero que subestima a dimensGo nacionalista do evento, chega.a considerara Restauracaode 1640 como um conflitosuscitado entre difecentesmodelos de exercicio de poder. Endo comoo “restabelecimento” deuma independéncia usuxpada," Conrado, a influéncia doutrinSria bispanica também ‘pesou sobre a politica imposta 20s nativos do Atlintico Sul no inicio do século xv, Pouco suspeto de condescendéncia com Madr, 0 pace Ant6nio Vieira admit, entretanto, que a constincia dasleisde proteso aos nos da América portugues havia sido maiorno period lipino que no pesiodoragantino.* [No Atiea Central, intento filipino de submeter os sobados a aucoridage ségialevou a Corona entrar em chogut com os jesitas¢ 08 capities que extor guiam "pecis” dos ambundos, Resultoudaio motim de 1592, no qual os congui tadozes eos inacianos expulsaram ogovernadorde Angol, Francisco de Almeida “Todo um outro jogo de aliangas se desenha na América portuguesa. Aqui. a Merrdpote aliase aos jesutas para romper conloio entre autoridades e roradores que exploravam o cativeio indigens.L4, ela enfrentaos mssionsros, red atutela dos jesus sobre a aldeiasnatvase estima 0 trifico negreto, Qual omotvo dessa diferensa? ‘Ao contri do Brasil, hava em Angola comunidades nativasenvolidas no comérciopré-cotoial alongadistincia, quepermitiaaextracio,porpartedosmis- sionarios, de tributos pagos sob a forma de escravos e outras mercadorias.” Aboletacos na chetia dos sobatlos, os jesnitas colidiam com os funcionavios régios ‘na medida em que apareciam como atravessadores de rendas tiradasdos nativose devidas 4 Coroa. Na América portuguesa, onde no vingara o trato fumdado na ‘roca continua de escravos indigenas, a captura de cativos mangeava a ilegalidade sendo regularmente denunciada pelos missionarios e, is vezes, pelas autoridades régias: as bandeiras preadoras uso braslcas, baseadas numa logica de dominio e de exploracio regional, imediata, no se adecuavam a estratégia da politica régia e da Companhia de Jesus no Atlantico Sul. A despeito disso, autoridades locas, afeitas a0 uso da méo-de-obra indigena em beneficio do servigo régio e dos _mosadores, propugnavam pelo controle dos aldeamentos. Malgrado.ssa oposicioregional, um primeiro tempo Madriestende Terra de Santa Cruzo preceito libertador instaurado na América espana pelas Leyes Nuevas de 1542: os indios, todos 0s indios, quer vivessem pagios nos matos quer batizados nos aldeamentos, nasciam e permaneciam livres, “Declaro todos os gen tos daquelas partes do Brasil por lives, conforme a dirvto ¢ seu nascimento na tural’ sentencia Filipe mno alvaréde 1608." Ademais,alei ampliava ospoderesdos §esuitas sobre os indios aldeados, Proclamada na Bahia, a noticia desencadeou um rmotim contraasautoridadese, sobretudo, contra os nacianos.* Proximo dos reciamos do colonato, ¢ hostil 0 controle dos missionacios sobre 0s Indios, @ governador geral do Brasil, Diogo de Meneses (1608-12), denuncia opapel dos inacianos no levance de Angola, apontao sentido aparente- ‘mente contradit6rio da politica régia numa e noutra margem do Atlntico, “De 6s eclessticos se meterem em governo vem a estas desventuras. Pogue # causa principaldo alevantamento de Angola foram os pasresda Companhia”, escreveo governador & Corte.“ 0 pleito parece ter surtigo efeito, porquanto a Coroa volta atrise autoriza certas formas de escravizacio de indigenas, nos termos da lei de tet [Na mesma ordem de idéias, consagra-se o sistema de aldeamento, que con- sista na transferéncta, mistura e sedentarizacao forgada das tribos, Nosaldeamen tos, o comércio ¢ 0 ensino de artes mecinicas deviam ser introduzidos entre os ingigenas:* De todo modo, o preceito filipino da reconhecido a0s aftéeanos —continuou presente na doutrina portuguesa relativa aos indios. Nenhum documento régio concebe os indios como energia humana emestadlo bruto, fat de produgio ou mercadoria pronta para ser vendida, mar liberdade natural” — jamais ae cada a ferro, comprada, embarcada, herdada e — sobretudo — tributada pela Coroa, donde ierecusavelmente legalizadano seuestatuto reificado. Contrastando ‘os decretos expedidos as feitorias aftcanas, nos quais os cermos fiseis e mescantis esas ¢ escraves aparecem amitide, os indios constam nos éditos reais como No vocabuliti indo-curopeu em geral, emo vocsbuléso latino em particu Jar, catvo define oinviduo feito risioneiro(ptivas= prisioneiro), ainda detido por seu captor ow pelo traicante. No século xvi, quando corsiris €pirstas "ouros singravam o Meditestineo,olitoral de Portugal eas costas atlanicas do Norte ca Affica,seqdestrando crstios clevando-os para as pracas do Magrebe, cativo designa um estatuto transtério, acidental, de privacto da iberdade.* Patenteia um acasoazatado a vid de alguém que podia maitobem no serqua quer um, Acé que ses familiares, os alfaqueques, 0s mamposteiros ou a oxdem dos padres teinicirios conseguissem pagar o regate em Argel, ins, poli ou Malta, muita gente fina experimenton o ative nas mos dos mouros. "Gente fina e menos fina: indios brasileiro, embarcados em naus portuguesas, foram capturadosporcorsiios eacabaram cativos em Argel O casomaisespetacular da histéraibrica rer sido ocativeira e o posterior resgae pelos tintaios de 2 mil portugueses, entre os quais muitos nobres, fttos pristoneiros na batalla de Aletcer Qubir. “Tem mourona cost nna América espanhola e no Nordeste do Brasil para assustar crianeas, embra 0 sobressalzo ancestr] do beira-maribérico diante dos reides magrebinos." frase ainda usada na peninsula Ibérica, Sipmifieao diverso tem, porn, para excrave, caracterisca de um estado juridico de reiticago permanente do indiviguo adquirido para uso do seu pro- Cokwe, umbundo, quimbando kcongo, nig, macua — idiomas dos powos {a Aifica Oeidental, Centra c Oriental deporacos para o Brasil —, também pos suem sigpiicantesdstintos pra “esravo"e “cativ" *Subjetvando a contingén ciada ibendade humana, literatura batroc instalos una identidade polisémica entre as dua palavtasnalingvaportuguess. Todavia, ao coificaro vernéulo sels cents, Bluteau reitera 0 core socal ejurico separando os dos conceit: catv:"prisioncro de guerra, ou presopelospitats”, eescraw“aguelequenasceu cativ, ou foi vendido, es debaino do poder de senor” "Naalrura em que reconkecia a liberdade dos indios “conformea direito eseu nascimento natural”, a Coroa reitera o primado negreiro em Angola. Ordens régias sustam a busca de minas de prata no terrtério e estimulam o negocio de c/scravos, “comércio e resgate antigo da terra’. Apzoveitando a conjuntura favoravel ao trafico e passanclo por cima das ordensrégias, osjesuitas guardam o controle sobre os sobaclos e continuam arece: ber escravos como tributo. Antes, “comer-nos-iam o bofe, mas agora com medo cou vergonha, fazem [os governadores] o gue queremos”, compraaia-se em infor ‘mar Roma um jesuita de Luanda.” Desafiada, a Coroa incluiu no regimento do governador Forjas(1607) ordens para invalidar de vez a instruicio dos "amos", ou seja, as concessbes de sobados — de aldeias nasivasafticanas — aos capitaes ¢ aos padres, Doravante, a Coroa recolheria diretamente os tributos devidospelossobas subjugados.” EXPERINENTOS SUL-ATLANTICOS Veteran da regio, haueao* — como se comecow a dizer em Angola dos moradores aclimatados ¢ se diz ainda no Brasil dos sertanejos nordestinos e mato- grossenses —,ocapitae-mor Bento Banharecebeu o pos de governador( 1613-15) eeampliow o teretéro da conguista, Para cagar mais gente, Bana ateglow um pacto com osjegas os mais tems guerreits a Africa Central.” Oriundos do povo imbangala, osbandosjagasincorporavamnassuasfleias ospisioneiros mais aptos, na segiiéncia de win ito iniiatério,avohumanclo seu extrcito depois de cada compan, Provacavam grande pavornos outros coma tentesnativos quando investinms com o sex gto de guerra “pute pure”. Como testemunhou o bspo do Congo:”temem oxjagas de [tl] manciraque, de ouvir * Nos textos angoitas tage rm o sentido de “homem experiente dos serges",“sertanciode Angolt”, HGGA, val, p. 600, No Bras Gagueme no Norte « no Nowdeste, ¢vigueste 19 Sul no Cento- Oeste ees Minas Geri) osubntantivo sige "rico, "conhecedor de ma reo" (Dicioniio Aurelio € BA. de vasta ince, GB, vl. 1p. 200). A palavzs vem do esparbol portenho, eter si difiida em Lands por negreos vindos do Prat, come o peboso pai de ‘Cadornege felarneles, se desordenam efogem” Também eram temidospelospormgueses, entre outras raz6es, por causa da habilidade no uso das suas machadinhas de ‘guerra, arma de combate corpo a corpo que era pareo duro para as espadas eu- ropéias, Embora dois capities que os combateram e conbeceram bem — angolsta Cadornega e, um século mais tarde, oTuso-luminense Silva Correa — tivessem deixada claro seretn osjagastuma “profiss50" mi garam, equivocadamente, que se tratava de uma ribo como as outras." Na reali dade, gente de guerra organizada em torno do kilombo — campo militar ¢ con- fravia de iniciacio dos novos guesreiros —, 0s jagasformam umn rolo compressor rmultiémico que sacode o Congo ¢ Angolaa partic da segunda metade do século 11. Usilizandoc ferro defundicioaficana para fabsicarzagaas, pontasCeflecbas ¢, sobretude, machadinhas de combate, 0: jagas organizados em songo — esquadio de ataque — consttuiram para os europeus uma ameaga bem mais perigosa que aquela epresentada pelos iroqueseseaimorésna Américado Norte edoSul” Resta que certs facsbes de jagas bandeiam-se para o lado dos portugueses por voltade 1910, como demonstrou Josep Mile." Aliado a esas hordas, Bento Banha lancou ofensivas sobre o reine do Dongo, preando quantidade de gente © avassalando dezenas de sobados. Um cadastco oficial passou 2 fixar 0 méimero amualde esravor que eadasobade devia page A Cana * Jagase traficantes Tasos continuatamaliados:no segundo governode Manuel Cerveita (2615-17), 0 qual tentou abrir em Benguela uma via de exportaczo do plato Ovimbundo, encontrando viva resisténcia dos intereses estabelecios em Landa.” Trta-se de um comico clissico na geografiaevondmica, tantora Aca comona Asia eno Brasil A abertura de um novo porto de rato drena circitos de trocainterioranose deslocaas carreiras masitimas, em detrimentodos mercadores sar muitos autores jul dos portos mais distantes, mais antigns Aquela altura comesatna aparecer nos nvios negreirosescravos das parcia lidadesjagas que combatiam os portagueses. Como todos os agus —o& grupos inbangala bangaic ou banguela—essesindivicwos traziamadvisaditinnvadesses gucrsizs: dois dentes arrancados da frente da arcacadentira superior” Dai, 0 substantivo do portugués do Brasil, ngela* Experimentos coloniais intercambiavanyse entie as duas margens do mar coceano. Mandioea, batata-doce ¢ milho sul-americanos haviam enttado ma al mentagio dos moradores do Brasil de maneira gradual e quase compulstia Armazéns régiosnclufam, desde os anos 1550, amandlioca eo “milhoda terra", bai dos tupis, entre os mantimentos fornecidos a funcionarios¢ rligiosos.” ‘Manuel ca Nobrega, ecém-chegado & Bahia, refere que da farina da mandioca “comem todos”.” Comparados as raros viveres europeus que podiam set con servados inediumes nos teépicos, as qualidades de preparo, manuscio e conserva dlomilho, da batata-doce—ajetca dos tupis —eda farina de mandioca arairam o interesse do colonato.” Tanto mais que esses géneros provinham do trabalho cativoindigena, sistema entZo dominante na Terra de Santa Cruz Aexcecfo do Planalto Paulista, onde predominava o milo, farinha de man idas ou adquisidas pelos mssionéviosinclufam um nde- ro erescente de escravos, Nas alta esferas da Companhia 0 envolvimento dos padres as transagGes negreitas provocava mal-esta. A ponta deo geral Francisco «de Borja (1565-72) se manifestar contra a posse de escravos pelast. Nessecontexto, surgem reagdes antiesc-avistas no colégio da Baia e, em particular, os incidentes arece nfo devia V.R. ter escriipulonisto. Porque ito € coisa {que a Mesa de Consciéncia em Lisboa nunca condenou, sendo homens doutos de boas consciéneias.Ademais, os bispos que estiveram em So Tomé, Cabo Verde € ‘nesta Luanda, sends homens doutos evireuesos, nunea o condenaram. E n6s est ‘mos aqui hd 40 anes ¢ estiveram aqui padres mui doutos,e na provincia do Brasil, loncle sempre houve padres da nossa teligiio eminentes em letras, nunca tiveram este trato por ilcto:e asim nis, ¢ os padres do Brasil, compramos estes eseravos para nosso sereco, sem escrpulo algum. E digo mais, que quando algém posta cescusar de ter escrpulos, sio os moradores dessa partes, porque como os merca- dlores que levam estes negeos os levam com boa fé, ui bem poxlem comprar a tas smezcadotes sem escripalo nenhum, e eles os podem vender: porque é comum opi nfo, que « postuidor da coisa com boa, a pode vender, ese pode compréla[.] EE perderse tantas alas, que dagudsaemn, das quais mutase salvams, or ie alguns ‘mal cativados, sem saber quai so, parece nfo ser tanto servigo de Deus por serem poucas [mal cativadas}, eas que se salvamn serem muizas” Sandlovalinchuiu no seu livro esse manifesconegreiro. Decerto,Sandovaleon. A demand escravista gerada em Minas Gerais fornece 0 metal precioso e conduz.a0 abandono gradual da Coténia do Sacramento, Bastou, entretanto,o imi mineiro se desativar no tiltimo ‘quartel do século xv para que os negreiros fuminensesrestabelecessem o tian _gulo comercial Luanda—Rio de Janeiro—-Buenos Aires." ‘Outro elo com o Pita eo Baixo Peru se amarra em Sio Paulo, Aoinverso do eixo “peruleiro” Rio—Buenos Aires, de feitio maritimo e negreito,o vinculo pau lista-platino baseia-se nas perrmutas terrestres eno tifico de indios usados pro dugio regional 203 © CATIVEIRO INDIGENA 5 © ADTONOMISMO PAULISTA Nas décadas de 1620 ¢ 1630 castelhanos da Espana e familias do Paraguat, algumas das quaisligadas 20s paulistas, convergem para Piratininga. Aos poucos os hispinicos unem-se a familias de cepa vieentina.” Associados a0 Paraguai por parentescos ¢ negécios, os paulistas — para assombro da Coroa e do clero caste- © Thano — também agregam espanhéis quando lancam assaltos &s educefones." ustcando o cariter instrumental da Inquisi¢fo no exercicio do poder imperial, agentes do Santo Oflciolancam a partir dosanos 1620 acusacdes ce judaismo con ‘ra.os pula." O episodio inserese no quadro mais amplo da perseguicio ant judaica desencadeada na Asia e na América, em represilia& ctescente influéncia dos bangiieirs crist3as navos em Madi." ‘No final da década seguinte, esuitas eautoridades batem ijoma conexio sub versiva entre preadotes e produtores escravistas dos dois paises. A Coroa filipina decreta oencatceramento de Raposo Tavares e outros paulistas que haviam atact- do 0 Guar, Determinada a incutir “mas werror, autoridad y respecto y eficacia” nas les contra ocativeiro incligena, a Coroa propugna a abertura de um Tribunal do Santo Oficio no Rio de Janeiro, ainda que a escravizaco de indios nfo configu- rasse crime passivel de ser julgado pelos tribunaisinguisitoriais." ais decisSesnndo podiam ser interpretadas como um despropositado arreganho fiipino. Tramitava ‘em Lima, aterrando os comerciantes portagueses do Pers, 0 sinistro processo da Complicidad Grande(1635-39),coneluide num grancle auto de-fé. Entre outros act sados, 57 portugueses, em geral comerciantes, foram sentenciados por crime de jjudaismo.” Apertava-se ocerco espanhola Sio Paulo: as autoridades diabolizavam, ‘os bandeirantes, acusando-os de judaismo, enquanto o Santo Oficio pretendia montar um tribunal nas paragens. ‘Veio logo orevide paulista. Em julho de 1640, amanobra dos jesuitas paraefe tivara enciclica contra o eativeiroindlgena,lograda pelos mesmos pacires junto ao papa Urbano vil, desencadeia levantes no Rio, em Sao Vicente e Sio Paulo, Nas de suas fancbes, Salvador de S4, mediante alguns subornos ‘ea ajuda dos jesuitas, consegue comutar uma pena de degredo para a Affica em {nternamento num conventolisboeta, Quatro anos mais tarde, em 1671, elelogrou reassumir sua cadeira no Conselho Ultramarino, O homem precisava, portanto, mostrarservico. Bo que ele faz durante a discussdo do projeto para abriruma vere daentre Angolae Mocambique, sobre o qual falareiadiante. Desaida, ele insisteem tomarasio comandodessa expedicio. * Consulted Cosa, 2/7/1649, AA, 26,1144, 9p. 1759, Schwarzangumentaquea Jornada os Vassos” que reconicou «Babi abr de 1625), 6 ima grande empresado mundo iirico ‘cm que as obrigagesfeucais 08 valores mites da nobreza foram mobiizades pela Coro3.8.B. scatvaure, “The voyage ofthe vassal, Acro Historia Review jun, 1991 p.748.Mas 0 ansco lm d np, vist coma ums espanholads, fo sublinhado porumcontemporineo, Delt, ‘de Cabo Verde, onde viu yassaraexpediefoojsiaSebasiio Gomes asous“o gue me espa desea nova arma vir Wo florete de ialgua, eto pobre de plows, porquenfohéquemsaiba porondecanishs",Cartade 6/2/1625, MMA v,p,75.Se€verdadequealornada das Vasslosmnarca fend concep esponkola da lg eda guerra, Jornada dos Negeirosmosira, aseu tno, ‘orumodanowa cra ragantinaSltado:deSd, ocomandanteduexpedicso mercantllso-Dursine se que hava resonquistade Angola, pede ques Coroareconeca seus mésos de resturador ul marino eo incorporenoseza. 2 ara dar mais forca 4 sua pretensio, Salvador recorda a reconquista de [Angola nasessio de 21 de agosto de 1672, diaexato do 24*aniversirio do seu feito ‘dearmas. Segunclo Salvador, o aval d'el-reino preparo da foreaexpedlcionstia de 1648 fora obtido a duras penas, gracas’ sua tiniea insistencia, contra am vonta- de dos miniscros e conselheiros régios. Fora ee, Salvador, quem batalhata soz rho por isso desde 1645. “Andando primeiro por S anos continuos perseguindo ‘osministros, até que 0 senbor rei D.Jofo, o quarto... quase de mote proprio 0 ‘mando restauri-lo (0 teino de Angola] dando em homenagesn no mesmo dia [Jum govemo no Brasil e outro em Angola.” Nas crcunstincias melindrosas de sua reabilitacko politica, na frente dos membros do Conselho, de testenmahas dos eventos de 2648 e de gente bem 20 coreente do assunto, Salvador atribuase sem ser contestado o mérito quase exclusivo da operago que resultow na recon. ‘uista de Angola Sucede que aexploracdo da agricultura eseravista pressupunha ocomando dos dois pélos do sistema: os portos de erifico africanos ¢ as zonas escravistas| americanas. Desde logo combarentes holandeses e portugueses consideram 0 Brasil e Angola como um campo estratégico unificado, Testemunhos espa nhdis, lusos, holandeses ea seqiéncia geogrifica das batalhas demonstrat que os tiros trocados na Africa no se apresentam apenas como ricachetes da guer- ra travada no Brasil, Forgas eindis e luso-brasilicas obtiveram em agosto de 1648 uma vita estratégica na Attica Central. Luandase destacava no horizon- te milicar do Atléntico Sul como um alvo prvilegiaco para o contra-ataque aos hholandeses ‘Dado 0 monopélio portugués sobre as portos de trifico no século xvIl 38 zonas do Continente Negro abertas 20 trato de escravos ainda pareciam relativa- ‘mente restricas. Para explorar suas col6nias da América, as poténcias européias esbarravam com os portugueses nos portos de tific afticanos Vale insistir: a abereura de uma frente de combate na Aftica, deslocando for ‘asnavais einfantata do Reino edo Brasilpara Angola —quandoa maior partedo [Nordeste estava ocupal ereides navaisholandeses ameacavam a Bahia ¢ Rio—, itastea espetacularmence o papel-chave desempenhado pelo controle dos merca- dos de escravosaftieanos. Fazendeiros, mercadores e peruleiros do Rio de Janeiro ‘empenham se no preparo da expediéo, em ait contraste comarecisa dos pat- 26 Listas, igualmente instados a participar da empreitada.* De resto, quando a arma da de Salvador de Sé levantava Ancora na Guanabara, Raposo Tavates iniiava a bandeira a0 Norte — depois chamadla de “bandeira dos limites” (1648-51) — que durante trés anos dis meses atravessa o Centro-Oeste.Revelava-se aos paulistas queomiolodo terrtério brasileiro no encerrava concentragoesindigenas sil ROTEIRO DA BANDBIRA DOS LIMITES DE RAPOSO TAVARES (1648-1651) ocEANO ATLANTIC * Div. 1925 9p. 421-1¢4328, Raposo Taaresesuacolunatabetivesse aio de Si Psulo no finalde 1647. Mas osec gir tenents, Anco Peseca de Azevedo, comandanéo cite p= Tits mais de oitcenosindos da segunda coluna da expen, comecou asubio Tier om abril ‘ouside 148, evataaltura em que Salvador de i esforga se em recrutarhomens pant a expe- «gf deans, tendo ainda que deisarsoldados para garantra dees do Rio de Janeiro contsum possvelarsqueholandés,CORrESKo, Rayo Tanien Vo, ppIT5-6 Eo 1es 4s que haviam sido pilhadas pelos bandeirantes no Guairé no Tapes. Nesse sentido, a longa jornada instil de Raposo Tavares marca um limite histérico as grandes expedigbesbandeirantes. Seajelas do conflito Inso-holandes eclodem noutros higares. Numa cortida de pula pula, as poténcias européiasassenhoreiam-se das feitarias do golfo de Guiné Aina alo revide mais conseqilenteviri do outro lado do Atlantico, do lado luso- brasileiro, Depois ce terem sido botados para fora de Luanda pela concorréncia negreira pernambucana¢ fluminense,traficantes baianos tomam orumo do golf ‘de Guin c entram de vez na Costa da Mina, Abonados com o prestigio das menea- dorias de escambo brasileras, sobretudo o tabaco. Com o ascenso dos impérios negreitos Achanti ¢ Daomé, os baianos consolidam sua hegernonia na rea Investidas Iuso-brasiicas alargam as bases da exploragio colonial na Africa, a0 _mesmo tempo que reaprumam — para olado americano do oceano— osistemade ‘dominio uso montado no Atlintico. Aexemplo dos eventos ranscorridos no Estado 4a india, onde lao orientais se opunham dese meados do Quinhentos aos interes ses metropolitanos, na costa ocidental da Afica se cristliza, em detrimento de Lisboa, umaaliangaconcreta,incontornsvel,unindo luso-brasileroseluso-africanos. AAs guetras do periodo também remodclam a geografia econémica da América portuguesa. Ainvasio do Norte pela wic ievara senhores de engenho da regiio a se transferirem para o Rio Depois de desembarcarem 1652 um impor- tante butim de eseravos arrancados de Angola, Salvador de 58 beneficia os cinco engenhos © as quarenta fazendas de gado que possuia no recdncavo da Guanabara.** Novamente governador do Rio (1660-61), ele retomaa administra do de suas fazendase das suas terras de Campos, de once conseguira expulsaros guerreiros goitacas, devastados pela varfola."* Terras ferteis de facil acesso se abrem aos fazendeiros flaminenses, ciando os pré-tequisitos para a expansio da agricultura comercial ea entrada crescente de alricanos no Centro-Sul do Brasil, REFLUXO DO TRAFICO DE INDIOS Palmares ¢0 paradoxo de Domingos Jorge Velho Afomede cativoslevou ospaulistasaescravizarindios pelos sertGes. Quaisos motivos de sua ulterior sedentarizacio? Documentos do processo opondo 28 Domingos orge Velko as autoridades, apos odestrogo de Palmares, ajudamacom- preencler as metamorfoses dosbandeirantes, Souto Maior, governador de Pernambuco (1685-88), relata as circunstincias ‘que deram lugar 20 engajamento dos bandeirantes: secebi agi uma carta de uns paulistas que andam nos sertOes,escrita a mew ante ‘cessor [. em que Ihe pediara umas patentes de Capitia:mor e capties pata con |quistarem aqueles gentios,e como isto encontrava[contrariava] as orden de V.M. Thas nio mandei,E, por estes homens serem os verdadeirossertancjos, © s¢ ac rem com 400 homens de armas, os requeri para esta conguista dos Palmares, man- slandoshes patentes de conguistadones dee [. ehegon o tempo de verem estes [negros] evantados a sua ruina, Impedidos de c1gar indios, os paulistas topam a empreitada. Com outros bandeirantes, parents, parceiros e servos le guerca, Domingos Jorge Velho stia ‘os quilombolas. “Servos de guerra” eram escravos indios, gevalmente temnimi- 16s, treinados para as expedicdes preadoras.”* Conforme as uiticas da guerra fonga paulista — oposta a guerra curta indigena —, Jonge Velho evita batalhas frontais, bloqueia as aldeias rebeldes, captura individuos isolados, atravanca as trilbas, tala os campos, incendeia rogas, envertena pocos, monta cercos prolong clos na serra da Barriga, Ao cabo de virios anos de combates, escaramucas¢ ter- +rorismo os bandeirartes desbaratam em {694 a resisténcia organizada dos com: batentes afto-brasilicas * Masem seguida os vencedoresnio vio poder saborear os frutos da vitoria, Depressa, ex-proprietirios retomam suas sesmarias abandonadas por causa dda guerrilha palmarista* eaté entio prometidas aos bandeirantes, Surge uma nova “querelados engenhos’,ansoga. queirrompera em Pernambuco depoisda guer- ra holandesa, A disputa sobe a Corte dando origem a protestos, requerimentos e 'memoriais que os paulistas enviam 20 Reino. Jorge Velho se mostra sagaz na defe- sa de seus interesses. Os manifestos nos quais ele e seu procurador, Bento Sorrel 1 Sigo os documentos daépoca que vtlizam a paavrapaaria para defnir os habitenses de Pilates, "Relacio das gucrasetasaosFaleares de Pernambnconotempodogrernadord, Pedro de Almeida, de 167521678’, em Lamers (ong), Alga documentos aaa hire da esa, pal ‘Camiglio,sesaltam os sacrifcios praticados no aff de seevir a Metropole, se apre: sentam bem escritos, perspicazes,irdnicos. Num resto de grande vivacidade — documento exemplar do didlogo entre os braslicos ea Metrépole sobre o sentido da colonizagio— eles redigem para ehrei uma “breve digressio” sobre a natureza os objetivos do bandeirantismo, Conchuindo, o comandante pavlista desenvolve ‘uma audaciosa defesa do cativeiro dos indios, prética novamente proibida pela vitéria proviséria dos inacianos em 1693." [Nossss tropas com que {amos & conquists do gentio bravo dese vastisime ser tio, mio é de gente matriculads nos livros de V. M, nem obrigada por soldo, nem [por plo de munigla, SGo umas agregagtes que fazemos alguns de nds, entrando ‘cada urn com os servos de armas que tem e juntos famos|...] nao a cativar, como alguns hipocondriacos pretendem fazer crer a V. ML, sento [a] adquirir 0 Tapuia -gentio bravo e comedor da carne humana pare 0 reduzir ap conbecimento da ‘urbana humanidade e humana sociedade & assoctagio ¢ racional trato, para por ‘esse meio chegarem a ter aguels Leis de Deus e dos mistéris da FE catélica que thes Beate para sua salvacio, Porque em vio trabalha quem os quer fizer anjos, antes de os fazer homens, ¢ desses assim adquitides e reduzidos, engrossamos rnossus tropas ¢ com eles guerteamos a obstinados e renitentes a se redusivem: € se 20 depois nos servimos deles para as nossas lavouras, nenhuma injustga Thee fazemos, pois tanto € para os sustentarmos a eles e a seus fils como a nds e aos nossos.£ sto hem longe de os cativar, antes se Ihes fiz um irremnunerivel serv em os ensinar a saberem lavear, plantar, colher e trabalbar para seu sustento. CCoisa que antes que os brancos Iho ensinem, eles nfo sabem fazer. Isto entendi 4o, senior? Bandeiras constituem empresas privadas, particulares. Nada devem a inicia ‘iva metropolitana ou ao Tesouro Real. O cativeiro dos indigenas os incorpora & “umana saciedade” incutindo:lhes a pritica do trabalho social, da agricultura comercial. indios forgados ao “racial rato” se tornariam sensiveisa religiao. Correlacionando a promocio sociale religiosa dos nativos ao trabalho colonial- ‘mente Gti, esses argumentos invertem 0s postulados doutrinirios dos Desco- brimentos: Jorge Velho sugere que a catequese devia suceder, e nfo preceder, a soializagio compulséra dos indios. arrazoado dosbandeirantes se compraz.em afirmar seu mérito esua valen: tia, Mas num torneio de frase ransparece o verdadero alvo do ataquea Palmares. conereta, que lancou os sulistas a fazer das tripas coragio* no Arran material, “mais 4spero caminhe, agreste, ¢feminto seréfo do mundo”, para matar e morrer na marcha mais trabalhosa, “e desemparada que até hoje houve no dito sertio, nem quid havera”. Ao enumerar documentos que lhe prometiam a posse das ter as tomadas pelos quilombotas, Jorge Velho ressalta: “a no ser assim, que razo paveria, que largassem os suplicantes(paulistas] as terras maiorese melhores sem ‘comparagio, ss lhestirara longitude das pragas martimas, cua posse logravam sem nenhum impesimento nem oposicio, para virem conguistar outras?” Do meio da quersla juridicae das juras de patriotismo,saltao detalhe revela- dor da gana dos paulistas embrenhados nas Alagoas. Alhures eles possuiam terras “mnaiores e melhores sem comparaco” com ase Palmares, assim como numero 08 servos” indigenas, Mas essa propriedades continham um grande empecilho: co afastamento das pragas maritimas. Pée-se a mu o fator-chave do uso do solo no Brasil, Pensada fora desse contexto, a disponibilidade de terras— variavel usada 3 torto eaditeito na hissria econdmica brasileira — perde todo sentido, A no ser ‘assim, que azo havera para os paulistas transmigrarem para o Norte? rece ocioso demonstrar que oterrtério da América portuguesa nao cons- tituia um mercado unificado, Esparsas manchas econdmicas se conectavam aos portos comerciais. Colonos vivendo no interior dessa dreas eam captados pela zedeultramarina de tracas, Porém, os que permaneciam ihacos pelo mardo ser- to se descasavam do Atlantico, Daf o surpreendente argumento de Jorge Velho: “Os suplicantes tém muita parentela na capitania de So Paulo, em a qual jé nfo ‘ém rerras para se esteaderem, ese querem vir ajuntar com os suplicantes”. Outro documento reitera:“Atencio dosditos sam paulistasé de convocarem outros mi- tos moradores seus patticios, que desejam de enxamear; porque em Sao Paulo jé ‘no hé aondte lavrem eplantem: ¢essatransmigragao ser coisa de grande wtilida de aestascapitanias do Nortel". iso enorme parsdoxo, Dando-se féao seu eaosoutrostestemunhos dos bat-

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