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Capitulo 1 ORIGENS E CONSTITUIGAO CIENTIFICA DA CULTURA Pavto César ALVES’ Ortega y Gasset INTRODUGAO © presente capitulo tem por objetivo desenvolver uma pequens intro. ‘um importante e complexo conceite: 0 de cultura, O pro éapre- colocam discutem.o significado do termo “cultura”, Destinado prioritariamen: um piblico que se inicia nos meandros dos estudos sobre essa temética, 'xto € abrangente, de facil leitura e nao elabora maiores detalhes no trata dos tepicos apresentecos, Para um leitorinteressado em se aprofundar " assunnto, apresentamos no decorrer do texto uma lista de sugestOes para is complementares. Para formar a bibliografia ainda mais acessivel, tive. 0 cuidado de reduzir as citagdes em lingua estrangeira, priorizando textos es brasileiras Embora carregada de certa ambiguidade e generalidide, “cultur rmo amplamente utilizado a partir do século XVIII para denominar, em acepeio extiemnamente-geral, tudo aquilo que é feito pelo homem e que & ido de uma geragio a outra, Essa palavra também é aplicada.a diversas idades com sentidos diferentes (cultura fisica, cultura da terra, cultura em- cultura nacional, cultura r ‘a cultura, subcultura, cultura da le Média etc.). Nas ciéncias sociais, esse vocdbulo apresenta uma variedade ficados, podendo designar tanto 0 conjunto de valores que caracterizam io humana quanto a expressio da identidade nacional, es grupos socials. Ha certos fios condutores que sio-comu ficacios de cultura ou devemos tratar esse conceito con é ou sexual lacionado de significagoes? Afinal, como & possivel classificar diversos os da 3", como a religiéo, a arte, a ciéncia, os costuines, as institui- um 4 todas elas é uma 's premissas usualmente utilizadas para esto fundamentadas em pressupostos filo- n ent si, tanto em aspectos ontaldgicos como episte icos. Para alguns pensadores, nao haveria uma unidade sas conceituagdes do termo « propriamente humana se diferencia da sua base biolégice’, ‘Tendo em vista a massa de definicées atribufdas ao conceito de cultura, |quer tentativa de sirtese pode correr o tisco de grave simplificagio. As presente texto ndo procura reduzir esse termo a um ndmero limitado de significados e tampouco agrupar as v finigdes em categorias exclusivas. © presente trabalho recorre 4 constituigko hist6rica desse conceito, apresen cadlos, desde as origens greg até a AS GRANDES LINHAS INTERPRETATIVAS NA HISTORIA, DO SIGNIFICADO DE “CULTUTRA” bora a palavra “cultura”, tal como a entendemos atualmente, tenha criacio do século XVIII; 0 seu significado é antigo. Etimologicamente, vem m “colere”, que significa 0 cuidado dispensado ao camhpo, a0 gado, 20 “cul agricola”, Dentro dessa concepga0 semantica, 0 termo “cultura” designa; 9 sécutlo XIN, um estado da terra cultivada (algo, portanto, que jé est dado) 105 poucos, passar a se referir 4 agdo de cultivar a terra (algo que esta em racesso). Nos século XVI, comegam a aparecer algumas mudangas se \icas do termo, Cultura alarga 0 seu significado e passa a ser usada para se 2 A reducio do universo cultural exclusivamente a um sistema simbélico tem sido imente objeto ce ampla discussie (Ingold, 1996, 2006; Jackson, 2005; Weiner, Paris, 2002; nropoldgica sabre a ‘o-Gonzalez ne presente imes de "Nova dos das ciéncias, Nos meados do século XVII bastante expandido, designa o patrim6nio universal dos conhe- cimentos e valores humanos. Terry Eagleton observa que “colere” pode si jicar: babar «adore «protege, Sou signady aro contmparnes col meal na eri ligne a como a propia ida de culture ven a ldade Moderne acolo eho Aesranecente de dvindae etanscenénca 2)-A imponeted astrsade aligosa ms tombe ric apa evi e€ente ees des ple, pe ls deo nt lcd Cura Guna desss ares esque pur eager plica quant vis pore 4 icepinaiente conan ambiente O08, p11, roe negativo, A designagao grega para o cultive espiritual do individuo, o de educa- dd personalidade e 0 produto intelectual de um povo era a de -ideia’ Esse termo refere-se & capacidade ou poder individual de traduzir em qualidades pessoais 08 conhecimentos e valores transmitidos pela sociedade, s especificamente, paideia diz respeito ao esforgo individual para se alcan- rude ou perfeigao moral (areté)*. Cultura seria, portanto, educacéo para se adquirir areté, a qual deveria ser iniciada na infincia, estimtulando no sno o desejo de tornar-se um cidadio perfeito, Nessa perspective sancepgao de paideia ins f 5 raemnce yparem consigo mesmos e a ‘uo descurarem de si, Cultura, nesse sentido, adquire uma dimenséo subjetiva, pica uma certa maneira do individuo estar atento a “si mesmo” como rses mode ‘Cada WgeF © campo tel todos de uma (1989, p. orme Jaege in univers 8 concepgio do lugar do individu dos Gregos como educudores edad. E, com efe ico do antigo Orient, di Origans cana (0 conceito de paideia expressa algumas das mais importantes dime construgio ideal de vida superior para os homens (ou, melhor, para determinados ores da populagio), a formagio de uma polis democratica, a educagio se- ndo uma escala de valores ea pessoa hii Cultura para o mundo ctéssico greco levado de pessoa, alguém que impulsiona o espirito a se apropriare realizar a 'beleza” a mais alta perfeigao moral a que o individuo podia aspirar, orme Jaeger (1989), a expresso mais alta da educagao era dada pela forma scritica da espiritualizagio de um povo, na qual a virtude ou a perfeisio ibreza de espirito — se identificava com 0 altru- a amizade ea honra 4 pétria, Pars Homer, a formacio do tipo ideal de ssda sociedade grege, principalmente a partir do século Va. 1a como centro da rellexao. {ino estava associada a um concei- — atributo proprio da em surge do cutive das qualidades que sto inerentes aos nobres ¢ leais eas normas da cultura s20 dados pelos mitos e lendas histéricas. Nessa spectiva, os aristocraticos e guerreiros Aquiles Ulisses seriam modelos da {go moral, Homero exirai das narragSes imaginarias o significado da vida, intos para a legitimacao das leis ¢ da autoridade jude humaya, Lembremos que é 105 que surgem a literatura, a tragédia e a comédia gregas, fontes inesgo~ dle saber e de cultura para os séculos posteriores. {importante chamar a atengio que # nogio de cultura entre os gregos » se limitou aos ideais de uma sociedade aristoctitica, Hesiodo, no set livro s¢ 05 dias, apresenta uma outra importante fonte da cultura. Para idos pela vida camponesa constituiriam a + bumano, Nesse aspecto, a educagio popular, igdes, representaria os Valores € normas dda cultura, Mas tanto na vertente “homérica” quanto na de He- na uma dimensio prescritiva da cultura, isto & um conjunto ‘mas, principios morais e modelos de agZo que indicam modo ers m do cosmo, os fund «fundamentos morais que constituem a vi luos e coletividades devem se comportar. Assim, a tonica a recai sobre os valores ¢ modelos notmativos existentes” néria coletiva) que devem ser assimilados pelos jobreza”, 0 “pobre de es sgiam a capacidade ci los homens de espitito. Mesmo os sofistas que, ao longo do século V aC, acentuaram wma educagio voltada para a vida cotidiana, dando um carter insis profissional e espécializado & formacéo do “cidadao” (techné), tinham como mira 6 enriquecimento do edpirito humano (areté), a instrusio no do- jo politico e ético do homem enquanto membro da polis. A concepgao de paideia foi fundamental para que os gregos desenvol- vyessem uma reflexio sobre a unidade e vinculo entre cultura espiritual (areté) a cultura moral em seu sentido politico. Através dessa reflexao, tocaram em’ estes relacionadas a0 universalismd e 0 relativismo no tratamento com “os outros”, O cada sociedade ou cultura, enquanto um pensador como Aris gs procurava estebelecer semelhangas mais do qiie diferengas entre grupos le pessoas. Sécrates considgrava como uma missio politica luta do homem iberdade interior em meio a um mundo dominado por forgas A condigio humana. Para ele, a verdade, a moralidade e a justiga incipios que se encontram por detras da ordem social — deviam funda- toda.aconduta do cidadio, O pensamento platonico levou ainda mais o ideal de uma educecio para a areté, vindo posteriormente a se tornar \cepedo paradigmitica para a r ‘educativa, partia do principio de que o conhecimento da ver- :ndamentalmente um conhecimento para a conservagio e estrutu- fa e nao apenas para resolver os enigmas do mundo, Platao buscava oncepeio comum do bem através de fundamentos racionais (embora asse 05 costumes ancestrais), Por sua vez, Aristételes preocupou-se a com a exceléncia — — logos — é exercido em hatmor eté), Para ssirio separar ttido aquilo que é naturalmente dado (e que tem base mo as “paixdes” (emogdes come amor, ddio, alegria) e as “facul- stcidacles humanas para experimentar as emogées) da virtude, um 10, pelos exercicios de.casos ilustrativos e tava que os apetites e desejos sio fe- Ongentecs seniensacatora \s nem maus em si mesmos; as qualidades morais (virtudes) $6 se am na medida em que sio méduladas por hébitos apropriados. ‘A avaliagio € 0 tratamento que os gregos faziam dos costumes, da lis . da ocupagao, das instituigdes sociais e politicas de outros povos também im em grande medida subordinados aos ideais da areté, Herédoto é um ssemplo marcante, Nas suas narrativas de viagem a varias partes da Asia 0 1 do Egito, esse historiador des Guerras Persas atribui, em determina- nomentos, as distingdes pessoais ds questdes de diferencas contextuais, ado, assim como os demais gregos interessados no “outro” (como o ge- Estrabao), as descrigdes dos costumes, dos habitos, das se econdmicas de outros povos sio marcadas usualmente por pressupostos, ntricos e pelo desdém por tudo que é estrangeiro. A ténica dominante die caracterizar 0 outro como “moralmente deficiente tese, 0 pensamento grego sobre educagéo jé estabelecia alguns tos que caracterizam diversos aspectos das modernas discusses sobre ado de cultura, tais como: a) a modelagao do homem de acordo com (0 ideal preestabelecido; b) a formagao do individ: es considerados como imperativos (seja seja do m simples"); c) a desigualdade e diferenca dos greipos humanos como uéncia das diferengas dos valores espirituais (como a diferenga entre 0 10" € 0 “civilizado”) ‘deia como cultiva do espirito humano impregnou também o omano. Com os romanos, a educagio humana ¢ ini a agricultura, Para Cicero, Ima sem educagio nao d Em si mundo cortestd ‘sim como um campo sem c ivo do espirito refere-se & ideia de que para alcangar a-perfeigao 1a € necessério incorporar ao esforgo individual um saber especific. i” & 0 resultado da combinacio da personalidade de (que nao quer permanecer em um estado de ignorancia) com ho de um patriménio tradicional do saber. Assim, por ndo ter 0 ctual ¢ tampouco desejar “sair da ignordncia’, 0 “barbaro” 30 m componente essencial da cultura ani i é promover a tuais e, como © hierirquico de determinados estratos da populagio. Mas os 's também desenvolveram uma outra concepgio mais ampla de s vitae — para designar as formas originals de vida (us0s e © uma sociedade da outra. O trabalho de T’ n exemplo, De nitido sabor antropotdgico, © termo como 0 de “cultura”. eure tumes) sobre as tribos 0 res A Idade Média no desenvolveri um coneeito de cultura que ultrapasse significativa a paideia grego-romana, Mantém a ideia de “espi ule", de uma busca de préticas © experiéncias,tais como purificagio, asce- ., como condigdes para o aperfeigoamento do espirito. Portanto, esmo" como o preso pelo qual o individuo page para ter ‘issica, Brh primeizo lugar, € importante sali cesta ar que a clivagem na separacdo entre os clérigos € os laicos. Ou seja, a0 passar lio da Igreja, a cultura intelectual deixa de ser um fendmeno te relacionado com questées de classe social ou de iobre2: existéncia humana. Nessa concep¢ao, 0 homem é visto como todo, ao mundo entendido como cosmos criado e ordenado mente imerso nesse univers, cabe ao homem contemplar a das coisas criadas, I da Idade Média, a stuagao religiosa tornou-se problemética. A {gout a perder o Status que até entéo manteve; houve uma maior ticas as mages comegaram a se 1m declinio do poder da Igreja; houve um soerguimento € maior preocupacio com a descoberta da natureza. O Hu- {o terminaram por reviver o cultivo espiritual (deno- ”, Para Elias (1993), 0 desenvolvimento das convencoes, individual sobre a vida emocional (a re- como a luta pela aparéncia e prestigio te social eo retorno aos clé to da ide’ £ importante tambér se A concepcao de individualismo, O « hhomem singular) era expresso na convi nobreza do métito pessoal, Em segundo, a importancia adquirida pela cidade, «qual traz.o germe de uma nova culture (atestada no estilo de vestr, nas for do comportamento e do falar e nas relagaes sociais). Junto com a corte de cipes ¢ altas dignidades eclesiasticas, a “cultura urbana” passa ivamente a medida pela qual sio aval rma de vida ideal que distancia o homem da natureza “ori selvagem’ - A partir do Renascimento, a relagao do homem com 0 cosmos adquie as bases existenciais que diferem daquelas legadas pela Idade Média (JO NAS, 2004). Até entéo concebido como um ser tragado pelo universo organ lo por Deus, nd qual contempla & criagéo divina, o homem renasceni se como um ser “aparte” desse mundo’. f nesse momento histérico que inguea “mente divina” da “mente humana”; que o hémem toma consci penetravel (Nicolau tusa dira que a verdadeira filosofia & a docta ignorantia em que consiste is alto sabeg)'. A natureza passa a ser considerada como dotada de uma 0s, foram fatores importantes para o soerguimen- das as demais manifestagées humanas, nalmente ta erda" de Deus significa fandamentalmente a importancissima -muckinga de concepeio de Deus, em que a concepefo de que Deus estaria na base dle todo conhecimento humana sobre ¢ mundo cede lugar para'uma 0 ido pela razio humana € za. Com essa subst imano no contaré mals com a ideta de Deus para fundamentar 0 seu co- hecimento sobre o mundo e & natureza, Terd-agora que buscar novas bases q cem esse conhecimento. E, mais do que iso, provar sto, capar de desvendar 0 mundo exterior. Ass ‘separado" nao apenas de Det is dada pela geaga divina, fimica propria (deyconhecemos seus principios ¢ causas iltimas ¢ s6 pode- os contentar-nos em medit o curso dos fendmenos’), ¢ o conhecimento da rez no ¢ mais dado pela contemplagdo, mas por uma initerrogagao cons- a (aprioristicamente) por uma hipdtese e parcialmente confirmada (pos- mente) pelo experimento”, No século XVII, Descartes levard a remincia ‘mundo a um plano altamente filoséfico, quando afirma que a alucinacio, 0 1no dos sentidos e os erros fazem com que nio seja mais possivel se achar a enor seguranga neste mundo, Dispondo-se a pensar que tudo pode ser falso, ‘que somente a existéncia da divida escaparia a falsidade (logo, o eu ie pensa € algo verdadeiro). Assim, Descartes separa a realidade do sujeito te (res cogitans) do mundo (res extensa). So duas esferas da realidade no tém contato nem semelhanca algyma entre si. Em sintese, objet onhecimento volta-se cada vez mais para finspréticos, para superar as ne widades ¢ misérias da humanidade, para aperfeigoar e administrar melhor & 1, Conlbecimento torna-se poder e dominio sobre 6 mundo. 0 ho- ado nao & mais aquele que busct a mera (elicidade da especulacio, onhecimento pelo prazer espiritual, f iss 4 constituir um bem cultural que possibilita uma intense “comut tepassados e contempordneos, facilitando a divalgagao d veres incompativeis sobre um mesmo assunto, A Jeitura forna-se ndo ape- mpo privilegiado, mas também um instrumento para adquirir iduo cultivado e eradito. ctisté de que o homem participa dos fins e ob- 180 eriado por Deus, no qual ha uma hierarquia interna do 1 asrdlugoss, posteriormente, no nove em se descobri os Segeedas teenicas para mel 10 de desenve wese, paryueas Ores sero ser humano gradualmente se distancia da natureza. Agora, visto como m ente superior e distinto de todos os outros “seres buscar sentido em si mesmo, estabelecendo um lugar distinto de t fais — 0 “mundo h *. século XVIII representard 0 triunfo des- nova convicgao que foi lentamente gestada nos séculos anteriores. Foi o scctilo que criticou muitas das conviegdes tradicionais, desde a fé cristé até arquia absoluta de origem divina, que afirmou a histéria e as normas, s que regulam as sociedades como condigdes necessérias para o estabe ca a especi avra no mais se refere A “formagio do * do individuo, mas ao conjunté objetivo de representagdes, padrées ores e normas enguanto patriménio comum seja da dade ou de uma dada sociedade, Designa a soma de saberes acumula nnidade, Considerada como um fendmeno dis- = cultura refere-se a ideia de pr de evolucao, ave do pensam ea dimensio “objetiva” da cultura: as formas minista. Com isso, 0 Tlu is enquanto um conjunto de artefatos e meméria'coletiva (tradig2o) da no tempo. Nesse sentido, o Huminismo relega a um lano a.dimensio “subjetiva” da cultura até entao hegeménica (cul ivo espiritual do individuo, portanto, um “cuidar de si mesmo”) ‘cultivo espiritual” & agora de ordem coletiva. Serve para designar tural dos costumes. Contrapée-se & pretensa selvageria ou povos “nao civilizados” mbém nesse século que é gestado 0 conceito de “civilidade” e “ci vilisation” em francés; em inglés; "kultui” em a designar 0 refinamento cultural dos costumes, contrapondo- reria ou harbériedos povos que nao tém tais refinamentos eacumu ization ura” € “civilizagio” sio duas palavras seméntico, refletem as mesmas concepgbes 0, no entanto, equivalente ivilizagio” expressa a ideia de afinamento ituigdes, usos e costumes da humanidade, As- tura”, somente aqueles dotados de refinamento posstem “civilidade", Ou seja, civilizagio é um movimento coletivo resultante do desenvolvimento da cultura, Em outras pala j2agio” transpée para o plano coletivo certos aspectos do terme latino enquanto “cultura” guarda o significado latino de “cults vitae” no “cultura” no se restringiu exclusivamente a ideia de um patri da humanidade (port fico que caracte: idade do género bh hema, cul adguiriu também uma nogao particularista para significar a consolidacio diferengas nacionais. Foram inicialmente os alemies que desenvolveram epgbes come o de “génio nacional” c “espirito do povo” para se referirem ularidades ou especificidades culturais de uma comunidade, Dai ex- “cultura brasileira” etc. Tal concepgao estaré cessdes do tipo “cultura al ‘A expansio do significado de “cultura” reflete uma complexa transfor- dia percepsio sobre aalteridade ou lade ¢ inaugurada a partir do século quando intelectuais iluministas (como Voltaire, Diderot, Rousseau, squieu, Mirabesu — s6 para citar os franceses) comegam a conceber . um ser cosmopolita e passam a tomar consciéncia da importén- licas na constitui¢ao da vida humana, Contratiahdo os pios teolégicos, a preocupacio com a dimensio histérica e 0 continuo hhumanidade ¢ trago marcainte da época!2. Com o aumento da ia de que cada cultura tem sua prdpria validade, os filsofos desse mos germes para a ideia de “relativisme eultur iminista de diferentes ordens c nocentrismio, Adm ar que todas seja 8 1s de sociedade, Uma nova sensi formas jurais néo eliminow a percepcio ir a existéncia de uma enorme variedade de do mesmo tipo. Afinal, para { necessirio reconhecer as diferengas entre as leis da eture cculturas de uma sociedade tribal ¢ uma “civilizada”. A diferenga é estabelecida pela ideia de progresso: um processo de refinamento cultural dos costumes, 0 crescimento do ideal racionalista, o controle dé forgas irracionais ¢ e1 or I. Dai o etnocentrismo que, revestido d vas Xdelo idealizaclo de progresso & reflexo da sociedade europeia ou ociden- “eurocentrismo” ou “ocidentalcen mo”, dificulta 0 reconhecimento do “relativismo cultural’ ‘A ideia de progresso — termo téo caro'ao Iuminismo — introduz de a maneira peculiar uina periodizagdo (que ndo deixava de ser uma hierar- a) entre as diversas culturas, Assim, as mais “primitivas” estariam situadas, nem es- conceita de progresso recoloca, em iimensao coletiva, o significado de cultura como "formago espiritwal”!. orcet, por exempio, propés uma periodizacio da histéria universal em v7 estigios, beseado na ideia de que as sociedades evolufam constantemen. ‘ango do conhecimento ¢ da ciéncia, Giambattista Vico (1668-1744) “Ciencia Nova” para se referir & busca de regularidades necessarias ria universal. K dade indivi 1, por sua vez, defin 8 A his progresso como mento da al combinado com o avango da virtude. (ese, a Ideta de progresso concebida pelo Lluminisrho pressupée que a neidade das culturas é convertida, pelo desenvolvimento tinico e tem fe ordenado de todos os povos, em homogeneidade, a qual é iden la pelos valores e estruturas das sociedades “civilizadas”, cujo exemplo Mivo seriam a sociedade i centuar as formas cul esa, a francesa ou a al enguanto compostas por um conjun ores, principios e técnicas acumulados no luminista fundamentou o conceito cientifico de cultura, ido a partir do século XIX, de comportamentos, reas cultwrais como © CONCEITO CIENTIFICO DE CULTURA O congeito cientifico de cultura nasce da pi set estudada de forma objetivae sistematica, pois se trata de um fendmeno que ) natural do ser humano; b) dotado de causas ¢ regularidades; b) capaz de sporcionar a formulagao de leis. Composta “objetivamente” pelas crencas, tradigdes e costumes adquiridos pelo homem enquanto a sociedade, a palavra “cultura” adquire uma dimensio “des- iva” que se diferencia da sua di ss0 &, aquela que se missa de quea cultura pode PI, 1997)", © conceito cientifico de cultura & formulado inicialmente pela “teoria sta”. Herdeira do Iluministno, a teoria evolucionista classica desen- feu uma concepgao universal Ido, 08 tedricos dessa “esc: 0s principios norteadores do estudo ciemtifics meno". Por isso, so considerados por muitos historiadores rndadores da etnologia cientifica; principalmente britinica. ‘A teoria evolucionista classica ¢ resumida por L. H. Morgan quando, ‘oun seu famoso livro A Sociedade Antiga (publicado em 1877), afirma que: 1 que a designagio “A “preseritivo”. Desde o inicio da interpret inte da sociologia e da antcopologia — esse termo traz consigo essas duas es, embora priorize 0 eu primelre aspecto, Oamericano Le 1881), rico ‘cultura (1832-19) ongens so ipals instituicdes da humanidade foram desenvolvidas a partir de une Lalas p fe pensamento; e que o curso e o modo de ea de ‘os germes primar sendo produzidos por causas especiais. O argumento, quando desenvaivido,tendea estabelecer a unidade de origen’ da humanidade (apud CASTRO, 2005, p. 63°64, ido do pressuposto de que toda a humanidade deveria passar pelos ssica (a) redutia a diversi inho evolu- P: 1esmos processos evolutivos, @ teoria evolucionista, clade cultural a uma questio de estigios histéricos de um mesmo ca 0; (b) partia do principio de que haveria uma unidade psiquica de toda a espé- amana; ¢ {c) identificava em cada sociedade “sobrevivéncias” ou “reliquias” crengas ecost wodernas”) de estagios anteriores". Nessa perspectiva {ins € 0s ritmos evolutivos dos grupos humanos mediante uma escala universal lamento da concepgio do “método comparativo” proposto por Tylor)". De acordo com a tendéncia epistemoldgica dominante na época, os evo- +s (comoas rendices esuperstigbes populares nas sociedades é “medic” os es- Zo cultural do homem. Assim, a principal tarefa do pesquisador a dissocate classificar os itens culturais de uma sociedade e, mediante com- ntificar e caracteriz Tylor observa que 1s diferentes esti- ss Com outros grupos soci nspirado pelas ia de “sobrevivencias” eul wa ease antropdlogo, através delas seria possivelreconstitoir aco fade que 6 possivel pois of Ao argumentar que a humanidade teve uma s6 origem ¢ trajetoria uni (a natureza homogenea da bumanidade), a teoria evolucionista classica os diversos grupos humanos. Mais na igualdade natural ent especificamente, a ideia de igualdade esta na concepgio de que qualquer set nano é um ser de cultura e a contribuigao de cada povo para o progresso nano é digna de estima, A diversidade cultural é resultado da desigualda estigios existentes no processo evolutivo ou de “escala de civilizagio”. ividades e valorativas (tidas como, objetivas), as quais refletem, e instancia, caracteristicas dos paises desenvolvidos, usualmente ociden- mento” recupera, a outra dimensio, 0 aspecto prescritive da cultura (conjunto de valores 8 ideais @ prosseguir pelas colctividades). iclonista formulada no século XIX nao desfruta atualmen- ssm#-aceitacio”. Contudo, como jé observado, ela inaugurou un dle pressupostos tedrico-metodolégicos para os estudos sobre cultura, o fundamental a ser observado diz respeito a0 fato de que as teorias tropoldgicas, desenvolvidas a partir do século XIX ¢ até a segunda me iculo XX, tenderam a considcrar as unidades sociais como sistemas de leis proprias e como realidades “sui generis” que perseguem as finalidades, relativamente autonomas das percepgdes individu- nos denominar essa tendéncia analitica (au perspectiva) nas ciéncias is como “sistémtica” ou “estrutural™, ipalmente nos Es feward{conhecido como o fundador dando as devides proporcde, até a segunda metade do século XX, dominaram nos igicos sobre cultura duas grandes concepgies nos gerais, las para a organizacio so ficagao e comunicagao simbélica, Ambas com preocupagoes holisticas ¢ uni versais na definigao de cultura, sendo que, no primeiro caso, a andi estruturas (¢ transformacées) materiais das sociedades e nasinteragées sociais, expressas pelas teorias neoevolucionistas, ecologia cultural, funcionalismo es- trutural, teoris dos sistemas; no segundo, no entendimento das estruturas de ib das “gramaticas cultu- rais”, como no caso do estrutu ial eas dirigidas a signi- ise recai nas significado, nos “sistemas si as descriga smo. Em ambas, @tese subjacente era a de ativo tiltimo dos fendmenos socioculturais. Nessa perspectiva, embora consideradas como empiricas, as ciéncias sociais, a abstracio € o recurso expli pretendem se situar distante de qualquer nogio derivada imediatamente da percepcia. © postulado cientifico dominante era de que a explicacao de casos particulares, empiricos, requer do pesquisador um mover-se para o an is abstragdo, Essa tese ~ de nitide sabor kantiano — parte do pri jalquer que seja a objeto de andlise, para que ela seja cientifica, & Id a partir de um ponto colocado fora dos fenomenos, isto 6, 0 plano conceitual . Mais espécificamente, preocupando-se em estabelecer tim c jetivo” que seja capaz de aprender a tealidade saciocultur: hecimento ituidos de uma realidade espet nposta de estruturas temas de relacBes independentes das vontades ou consciéncias individuais, as de regularidades, tais “estruturas” podem ser apreendidas (e verifica- fade de explicagio do fendmeno humano presiupée um ponto 19 — um ponte colocado fora da experitneia a partir do qual seja isar 0 mundo social. Ou seja, a tesc fundamental é de que, qual ¢ seja 0 objeto de-andlise socioantropolégica, para que ela seja cientifica acontecimentos mundanos a partir de um ponto colocado da concretude desses fendmenos (como eles aparecem n ‘entedo” proprio. Todas as coisas séo exemplifi- jos gerais que reinam em toda a ordem natural. Apreendemos seo mundo fosse dotado de um ordem’ A atengio é voltada, portanto, para configuragdes conceituais ou \odelos analiticos: para principios cognitivos que guiam o conhecimento. Tal procedimento transforma a multiplicidade das coisas, por mais desordenada, icoerente e conflusa que seja, em certos padrées e configuragées. Néssa pers iva, como observa Bruno Latour (2005), 0 termo “social” designa um status um conjunto de lacos que, mais tarde, pode ser nos. £ uma forga especifica que explicaa Feito de algo (forga, poder lade das relagdes husna capacidade) perduravel Em uma concep§ao “sistémica” ou “estrutural a preocupagao com a cul esté voltada para analisar o impacto de "modelos culturais constituidos” (como modelos de comportamento, definigbes de papéis, orientagdes de valores, mas vigentes com base etn ume tradigio cons smagoes institucionais) sobre os a tern um cardter relativamente aul momo (uma logica interna e \egragao, a coesio e o consenso social; apoiada em sangées e recompensas que zmentam 0 agir dos individuos; (b) é uma dimensio constitutiva da perso lade dos individuos, a qual € vista como Construida pela interiorizagdo dos damente a década de 1970, q ver, de uma maneira geral, uma crescente preocupagio em repensar os pres- 105 tedrico-metodoldgicos sobre os quais se assenta o seu entendimen. cientifico do mundo, Como exemplo dessa preocupagio, basta observar 0 mero de autores clissicos que sio atualmente objeto de releituras (como Mead, Durkheim, Simmel e, principalmente, Weber); 2 multiplicidade de pa- e de referéncias tebrico-metodolégicas; as tentativas de integ} ses tedricas propostas; as tentativas de superacio de uma série de pa pt coeréncia semantica prépria), pois: (a) exerce uma fungao de estabelecer a, iva, autores mais alinhados & como Alfred Schutz, Gada- fazem usualmente parte dos programas de teoria social, Por is como Bourdieu, Giddens, Luhmann, Jeffrey Ale- ler esctevem artigos de carter eminentemente filosdfico. Assim, um pon- ndamen Castoria no processo de tfansformagdo que ocorre nas ciéncias sdciais respeito as trocas multidisciplinares que realimentam novas problematicas campo das cigncias sociais (WALLERSTEIN, 1996). Como resultado desse — e al talver esteja uma das grandes novidades das cigncias mporneas.— comesou,a haver uma dimimuigio do nivel de consenso 1 das linhas de demarca¢ao entre as disciplinas do mundo social, com pulsionando o estabelecimento da reconciliagao e-hovas aliangas entre 8 até entéo tidas como antindmicas entre ciéncias da natureza, ciéncias osafia. O didlogo —e mesmo a intersecdo — dessas ciéncias com storia, a psicologia, a linguist 1s tentados a indagar se est fatura sio atualmente tio svezes realmente diante de classicamente definida (como a sociologia ou a " uma determinada disciplina antropologia) ou uma outra que esté se configurando no cenérlo As transformagbes de ordem cognitiva e institucional levam a refor- 1ulagGes nos estudos sobre cultura, fomentando um conjunto de teorias que podemos agrupar com o nome de “perspectiva construtivista”, na qual as rea. lidades sociais sio apreendidas como construgdes historicas e’cotidianas dos que colocavam ¢ cul lectual ores indi duzis¢ coletivos*., As teorias“sistémica a perclem seu cariter hegeménico € ssam agora a conviver coi diferentes teorias que redimen como unidade selativarente au! como algo diretamente relacionado com a aigdo social. Ou seja, as novas inter rogagdes sobre o'vinculo social, como as questoes relacionadas & ago e & his- toricidade, implicam uma outra escale de anélise, mais mandana e, portant, proxima dos atores sociais, Os estudos voltados para a compreensio do 23 Essa anilise seprodus literslmente teechos do trabalho desenv’ (2009) 28 O termo “cupstrutivista” € retirado de Corciulf (2001) para des 4e teoriassaciais como as “teorias de base fenomenolbgice” (a “sociologia existen Josepi Kotarba ¢ Jack Douglas; antropdiogos e soc x, Kul a Rabinovs, Gecrr),slém das mais coahecios, como a "prexcologia” ou smo estrturlists” de Pierre Borie ea “tora da estruturagio® de hony Giddens. E importante chemer a atencio para fato de que = chamada do desaparece.Apenss dete de set hegéin iva site inua até os nossos plos significativs sa0 a Charles Camic), 0 "marxismo analitico” (Jon Por outto lado; noves concepgbes e construsées tedrieas que estavam i marge das tendencias hegeménieas en 8 1980 € 1970 en t, “quanto maior ia entre @ homer ‘©0 seu ambiente, o mundo ou a terra, mais ele pode observar e medir, e menos terreno lhe restari” (2000, p.263). Ou sea, quanto mais nos des- iano tém o papel de alavancar metodologias mais sensiveis & percepeao stituinte do que do fo. As anélises socioculturais passam grada- 'vamente a.reformular os modelos interpretativos fundamentados na log nterna de instituigdes culturais manipuladoras e redutivas, sem com isso cast 1m um modelo oposto de “divinizar” (ou dissolver) o individu e suas capa- cidades estratégicas ou taticas". A teoria social cada vez mais leva em devida sideragio a complexidade crescente dos problemas socioculturais ¢ recusa Iquer forma de dogmatismo ou de reducionismo, passando a lidar mais yximamente com os grilhies da experincia terrestre, Com isso, reconhece npossibilidade ¢ a inutilidade de encerrar o ser humano numa légica exclu: I. fisica ou genética ‘Ao centralizar a anélise em questées da agio social, a perspectiva “cons- tivista” retoma a ideia de historicidade, cujo ponto de partida refere-se a0 de que é propriedade humana a faculdade de agir (em tempos e espagos spectficos), de iniciar processos novos ¢ sem precedentes (embora necessaria- ie assentados em “contextos” preexistentes), cyjos resultados podem ser ncertos ¢ imprevisivels®. Mais especificamente, a ideia de historicidade nos ' para o carter processual (temporal) ¢ essencialmente situado da a¢io, ia como a condigao ontolégica do ser humano, a nodio dé historicidade menta todas as tebrias de base “construtivista” A nogio de historicidade pressuposta na teoria social contemporanea sui trés importantes aspectos: a) lide com construgdes passadas (a idela de pluratidade humana, as dstingSes, diferencase alteridades que maream as ndos socials . 26 vento” do sujeito, para 's uma expressio de La 2 um dos pontos mats probleméticos na perspectiva “sistémica’ a « tampouco com histor tado pelo cardter histérica do homer, Em cle que a compreensio adequa- ‘em devida consideracioa in processo de desenvolvi que © mundo sociocultural se constréi a partir das condigdes diretamente da: das e herdadas do pasado); b) essas construgdes séo atualizadas nas préticas € mas interagoes da vida cotidiana dos atores (as formas sociais passadas si0 apropriadas, reproduzidas e transformadas enquanto outtas s tui abertura de campos de possibilidades no futuro (a heranga passada e alho cotidiano sempre abrem perspectivas para o futuro)". Assim, con ceito de historicidade apresenta simultaneamente aspectos de “objetivagdes” € zagdes” da realidade social. Se por um ledo, remete a mundos objeti: jos (os individuos e os grupop se servem de palavras, objetos, coisas, regras, nstituigdes etc. do novas formas) por outro, se inscreve em mundos si (construidos de formas de sensibilidade, de percepgao, de conhecimento}”. Em sintese, uma caracteristica fundamental de andlise constn de quea cultura nao se coloca como uma realidade jé dada perante os indi inventadas jegados pelas geragées anteriores, transformando-08 ¢ cri eriorizados ista a duos, mas é constituida na relacdo com os agentes sociais, Em outras palavras, a cultura € 0 resul valores, principios, que os individuos desenvolvem nas suas relagdes ¢ condigdes materiais e sociais do mundo em que vivem. O ponto de part dessa concepgdo sublinha @prioridade do “ser-no-mundo” como elemento constitutive da tomada de conscitncia dos sujeitos®, Dai decorre que todo conhecimento: (a) s6 se deserivolve como interpretagao a partir da insergao do o de processos ativos de producio de comportamentos, as sujeito em um contexto histérico concreto jé culturalmente mediado: (b) &ort- 8 toda 2 defini¢ao de realidade s6 pode ser compreendida através da referéncia amente constituido na relagao reciproca entre os atores sociais. Assim, 28 Ver Corcuff (2001, p. 26-27). 29 Na perspectiva *s sem, os seus germes de marte, dest [| Quando nio morre de morte natu a perspectiva “construivista”, 0 € uma realidade externa e impestoal qu so mundo de significados a que pertence aquele que (CRESPI, 1997, p. 112). C oca em evidlencia o cardter a /0 dos processos de constitu social ea dimensio interativa (agdes) que Ite esta na base. Ao estabelecer intimas ligagdes entre cultura eo agir social, a perspectiva istrutivsta recuperou, em uma nova dimensio, a nogéo de agente ou sujeito wocial, Trata-se agora de um sujeito encarnado, dotado de senso pritico tos do corpo) localizado em t Bourdieu) e'ndo um “idiota cultural” (como chamou hiperconformado com as normas sociais preestabelecidas, wente reflexivo € muito menos um individuo racional e wil do 0 “mundo externo” eas condutas humanas ao crivo da racion Ao privilegiar o estudo da aco, a perspectiva “constrativista” rec prioridade da pritica (ou prdxis), da ¢sfera do fazer e agir, sobre o pensa- nto ea reflexdo, Bssa concepgio conduz alguns autores a voltar sua atencéo sta, subme- » corpo, partindo do princi mundo que s6 pode ser compreendida quando recupero a mediagao do Nesse sentido, 0 corpo torna-se fundamento de nobsa inser¢io prética indo. Mais do que uma simples ferramenta a servico de um individuo, 0 € visto como condigio e possi 5 ou objetos para o sujel Para um rapido exemplo de como a tematica do corpo ocupa um plano jo de que hi uma relagao origindria entre consci- lidade para que as coisas se convertam ‘con trutivistas”, basta observar a importincia ibui a0 conceito de habitus, definide como a “histéria en. corpos” sob a forma de sistemas de disposigées duriveis”, Para © encontro da *histéria feita corpo” (habitus) ¢ da “histéria feita mento que adquiro love compreender met ‘esse duplo movimento construtivista de inte *), Um outro exemplo & que no seu estuda sobre 0 surgimento do sistema prisional ida na sua famosa frase, fzagao do exterior ¢ de exterio: Michel Foucaul ago do interior © conceito de disciplina como uma eoria social, Assim como habitus, disciplina & estru poder que foram impressos no corpo, formando disposigdes permanentes. Assim, em vez de situar a culttara no universo ja construido de objetifi- 1 “construtivista” problematiza 0 processo mesmo em que 1s normas, os valores, os costumes ganham sentido para os atores socials. A is identificar o momento em que a cultura se faz presente nos po e atitudes dos sujeitos (pois todas as experiéncias humanas ja soem si cultura), mas 0 de considerar como os atores desenvolver um modo lc cclocar-se frente aos fenémenos culturais. © interesse pela dinamica de stituigdo e transformagio da experiéncia humana coloca a atengfo sobre neios, recursos e, sobretudo, os processos que conduzem A sintese corpo- ndo, Nesse sentido, cultura é, antes de mais,0 horizonte a partir do qiial os jundo, Antes de se constituir como 1es socials se engajam praticamente no ura & experiéncia, um processo constante de formasao humana, CONCLUSAO Pela répida andlise historica do significado de cultura acima apresentada, vel identificar duas grandes dimensbes desse termo: a “subjetiva” & a “ob- ° Elas estio presentes desde as origens gregas do conceito dda sua concepgao cientifica, Na primeira dimensi6, cultura diz respeito propriedade ou capacidade do individuo de desenvolver suas “faculdades is” através da educagao, da filosofia, das artes. Portanto, a um cresci » progressive da pessoa. Paideia, cultura animi, coltura e bildung sio va: ygicas que indicam a formagao intelectual e moral do individuo, r do’ século XVII € principalmente com o advento da con s de costumes, valores, princ{plos, téenicas existentes em uma determi la época, Na 1a dimensdo “objetiva”, tanto no seu aspecto “universalista a como patriménio da humanidade) como “particularista” (para iden- ficar determinados agrupamentos socia etc,), cultura é concebida con come “cultura brasi “realidade esp m “sistema”, composta por um conjunto de elementos: ida sociedade ou comunidade, © €colocado como primeiro plano de anilise é o cariter de organicidade da tura (que nao sio necessariamente totalidades harmoniosas, inteiramente gAnicas ou supersistemas), Nessa perspectiva, cultura é algo a ser “descrito”. ‘Com isso, a concepcio cientifica de cultura parece ter perdido — sgado a um segundo plano — a dimensio “subjetiva” desse termo. Mas mnportante enfatizar que a colocagao da dimensio “subjetiva” em uma posigio secundéria no & uma caracteristica necesséria ou essencial da concepgio de lacionados dentro de uma deter as sociais. Essa premissa existe porque a perspectiva “sisté- a” nao leva em devida consideracao o ator, a aco e o conhecimento prati 0 que, na sua atividade cotidiana, 0 individuo desenvolve em tempo, espaco ages concretas, Contrapondo-se a essa perspectiva, as teorias tas” tém se voltado para a construcio de an: as que procuram ibelecer intercémbios entre o ponto de vista exterior do pesquisador sobre percebem e'vivem 0 que: 10 decorrer de suas ages. Ao restituir a posigio do ator, da aco e do scimento pratico, a perspectiva “construtivista” abre espaco para com- ler (em nivel “cientifico”) a dimensio “subjetiva” da cultura, :m outras palavras, as teorias “construtivistas” propéem rediscutir trés \damentais que esto presentes historicamente na conccituagio a cultura: (2) a preocupagao pelo “cuidado de si mesmo”, um ocu- se de si mesmo, uma certa maneira de estar atento consigo mesmo (isto é, © individuo apropria-se de regras i rogredit” — a se apro- do ideal, como a “formagao intelectual e moral”, tude"); (b) a ago, isto &, sequencla de ‘constru- ‘observa € as maneiras como os atores soci positivamente, Foucault exprime bem esta dimensio de autoformagao quando nota: “O cuidado de si é uma espécie de aguilhio que deve ser implantado na dos homens, cravado na sua existéncia, esconstitui um principio de agi tago, um principio de movimento, um principio de permanente inquien no curso da existéncia” (2004, p. 1 Ao enfatizar o cardter de historicidade que esta subjacente ao fendmeno cultaral, a perspectiva “construtivista” nos fornece pistas bastante significat ‘vas para que possamos associar, em maior ow menor grau, a dinamica, varia ‘gées, mudangas e desenvolvimento com a certa“fixidade” e “homogeneidade” da ideia de cultura como “estrutura”. Ao ocupar-se com a ago soc perspectiva resss cde imanente do fends ral algg tao presente nosconceitos originais de paideia, areté e cultu mas carente visio objetivista-sistémica da cultura, de essa historic REFERENCIAS ALVES, P. C. A teoria sociolégica contempordnea: da superdeterminagao pela teoria & historicidade, Salvador, BA: UFBA, 2009, Mimeografado,, ARINO, A. Sociologia de la cultura, Barcelona: Ariel, 1997, ARENDT, 1. A condigao h 2000, BENETON, P. Histoire des mots: culture eci tion Nacional des Sciences Politiques, 1975. jana, Rio de Janeiro: Forense Universitéria, lisation, Paris: Presses de la Fun- LLINGTON, R. Culture and society: a sociology for culture. London: Mac: Millan, 1991. RIGGS, As BURKE, P. Uma histdria social da midia: de Gutenberg & Inter et. Rio de Janeiro: J: Zahar, 2004, - BUENO, G. El mito de la cultura, Barcelona: Prensa Tbérica, 1996. CASSIRER, E. Ant México: Fondo de Ci logia fitoséfica: introccién a uma filosofia de la cultura, a Econdmica, 1992. 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Rio de Janeiro: Civilizagao Capitulo 2 NATUREZA E CULTURA ATRAVES DA HISTORIA DA ANTROPOLOGIA ELENA Catvo GonzAtez! de Franz Boas e seus discipulos, as teorias estrutura- rauss, a discusses nos anos 70 do século passado sobre sexo & 40 dos estudos sobre a Ciéncia a Tecnologia em pesquisas igicas mais recentes, Estes estudos nos mostram a centt 10 da Antropologia da diade natureza/cultura enquanto categoria indo além de logicos se apresenta, portanto, como um campo anhar € mapear.algumas continuidades e rupturas tedricas

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