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2402/2019 Por uma éica na saide:algumas re 108 sobre a ica o ser ico na aluagéo do psicélogo atticles —— articles search cipLO author | subject | form J home) alpha Psicologia: Ciéncia e Profissio Print version ISSN 1414-9893 Services on Demand Journal Psicol. ciene. prof. vol.22 no.1 Brasflia Mar, 2002 iy SCELO Analytics http://dx.éol-org/10.1590/51414-98932002000100005 Why Google Scholar HSMS (2018) ARTIGOS Article [5 Ati ine format Por uma ética na saide: algumas reflexGes sobre a ética e o ser ético na atuagao do psicdlogo ] How to cite this article iy SCELO Analytics <@ Curriculum ScienTI P Automatic translation Giane Amanda Medeiro: Indicators Endereco para correspondéncia Related links Share Morelia More RESUMO pom A ética ver sendo tema freqente de discusséo, abarcando vérias instancias da sociedade. Nas instituicées de satide sdo prementes as questdes referentes a parémetros ¢ limites na intervencao sobre os seres humanos. Neste artigo, proponho pensar a ética nna satide, bem como possiveis caminhos que sustentem uma postura profissional norteada pela/para a ética, Palavras-chave: Etica, Moral, Satide. ABSTRACT Ethics is becoming a frequent subject of discussion, in which several instances of the society are included. In the health institutions, the subjects related to parameters and limits in the intervention on the human bings are becoming more and more noticeable. his article concerns ethics in health, as well as possible ways that sustain a professional behaviour based on and turned to ethics. Keywords: Ethics, Moral, Health. © psicélogo, profissional presente nas instituicdes de satide, tem 2 sua pratica atravessada por vivéncias de grande significado na vida das pessoas: o nascimento, a doenca e a morte. A presenca ou iminéncia dessas situacdes geram ansiedades, angustias, medos, desencadeiam crises pessoais e familiares, configuram mudangas e impoem 08 profissionais vinculados aos cuidados com a sade inimeras dividas com relacdo a préticas que sejam coerentes com 0 propésito ético da ciéncia que representam. As dividas concernentes a esses temas agrego as geradas pelas biotecnologias. Reproducao assistida, planejamento familiar, esterilizacdo, aborto, transplantes de érgaos e tecidos, eutandsia, projeto genoma, experiéncias com embrides, entre outras procedimentos, esto sendo introduzidos direta ou indiretamente no hitp:liwwwscielo.briscielo.php7pid=S1414-08952002000 1000058scrpt=sc\_artext&ting=pt 18 2402/2019 Por uma éica na saide:algumas re cotidiano das instituigées de satide, trazendo beneficios, mas também gerando duividas, abusos ¢ culminando em questées éticas complexas. 108 sobre a ica o ser ico na aluagéo do psicélogo Além das questées éticas que emergem em decorréncia das biotecnologias, so inimeras as situacdes que constituem dilemas éticos na relagao do psicélogo com a pessoa atendida e/ou familiares desta, ou na relaco com a equipe de trabalho, Até onde manter 0 sigilo profissional? € possivel quebrar o sigilo? Em quals situaces? Como agir frente a atitudes anti-éticas de colegas de trabalho? Quais as informacées sobre o paciente que devem constar no prontuario? Deve-se quebrar o sigilo em casos de violéncia fisica, abuso sexual ou negligéncia contra menores? Qual a atitude do psicdlogo frente a um paciente portador do HIV positivo que esta contaminando deliberadamente seus parceiros? Além destas questées é possivel enumerar muitas outras. Autores como Herrero (1999), Chiattone e Sebastiani (1997), Berlinguer (1996) e Lepargneur (1996) fazem referéncia a faléncia dos principios morais em nossa época, alertando para a falta de direcionamento que muitos profissionais da satide enfrentam diante de préticas e intervengBes onde a moral vigente j4 ndo possibilita orientacdo. Frente a essa problematic, so muitas as questées envolvendo a ética, constituindo desafios constantes para a Psicologia e para as demais ciéncias. Questies essas que, para serem debatidas, nos obrigam a refletir sobre dois pontos centrais: O que é ética? O que é ser ético, ou, mais precisamente, em que o psicélogo que trabalha em instituigdes de sade deve pautar-se para que sua postura possa ser considerada ética? Tentando responder a primeira questo recorro a Chaui (1995) que compreende a ética como | [...] filosofia moral, isto é, uma reflexao que discuta, problematize e interprete o significado dos valores morais”i (p.339). Aqui deparamo-nos com outro ponto a ser compreendido: a moral. Segundo a mesma autora, moral consiste nos [...] valores concernentes ao bem e ao mal, ao permitido e ao proibido, e 4 conduta correta, validos para todost (p. 339), A moral, portanto, refere-se 3 normatividade oriunda da sociedade, refere-se aos costumes, normas e regras que permeiam o cotidiano e que visama regular as relacdes entre os sujeitos. A ética a reflexdo critica sobre @ moral, ou seja, pensar naquilo que se faz, repensar os costumes, normas e regras vigentes na sociedade. Ao refletir criticamente sobre a moral, o sujeito assume uma postura ativa - condic&o essencial para a existéncia do Sujeito ético - pois nao limita sua aco as circunstancias, 4 vontade de um outro ou aquilo que é considerado moraimente como sendo certo ou errado. O sujeito ético/ativo indaga, problematiza, avalia, debate antes de partir para a aco. Por outro lado, devemos considerar que as relagdes entre os sujeitos e entre estes e a sociedade néo é regulada apenas pelas normas morais vigentes. As normas juridicas também pautam as condutas que visam a regulamentar as relacdes dos seres humanos, cujo objetivo é garantir coes30 social Os tragos especificos que diferenciam a moral das normas juridicas evidenciam a adeso intima, caracteristica particular da moral, e a coacdo externa, pertencente ao ambito das normas juridicas. Ou seja, a moral implica a livre escolha do sujeito frente as diferentes possibilidades de solucdo de uma determinada situacdo. Diferente da moral, as normas juridicas no requerem convicco pessoal e liberdade no que se refere & escolha de possiveis alternativas de aco. As normas juridicas sao impostas pelo Estado e obrigatérias para todos. Mesmo considerando uma norma juridica injusta, o sujeito deve cumpri-la, pois a desobediéncia implica punicao. Para garantir 0 cumprimento das normas juridicas, estas encontram-se codificadas formal e oficialmente ~ cédigos e leis prescritos pelo poder legislativo, As diferencas entre moral e normas juridicas também apontam para a diversidade. Numa mesma sociedade podem existir varias morals, e estas podem ou nao se harmonizar com as normas juridicas vigentes. No entanto, na sociedade existe um Unico Estado, o que significa que ha um sistema juridico Unico para todos. No quadro das normas juridicas insere-se a Deontologia. Este termo foi criado em 1934 por Jeremy Bentham. & compreendida como ciéncia dos deveres, especificamente dos deveres profissionais (Doron e Parot, 1998). Constitui 0 que habitualmente é denominado de Cédigo de Etica Profissional, onde esto expressos os direitos, deveres e responsabilidades dos membros de determinada categoria profissional. As normas deontolégicas tem carter coercitivo eo nfo-cumprimento das mesmas implica sangdes que sdo garantidas pelo poder estatal. Nesse ponto, posso tentar responder & segunda questo: em que o psicélogo que trabalha em instituigdes de satide deve pautar-se para que sua postura possa ser considerada ética? Tentarei responder a essa questo considerando trés possibilidades: 1) 0 psicélogo deve pautar-se no Cédigo de Etica Profissional do Psicélogo, pois 0 seu cumprimento garante uma postura ética; 2) o psicélogo deve agir com base em suas conviccSes pessoais, guiado por seus valores e principios, construidos ao longo de sua formaco pessoal e profissional; 3) 0 psicélogo deve agir tendo como base principlos éticos que server a todos, ou seja, principios que nao priorizem crengas ou valores pessoais. A primeira e a segunda possibllidade citadas baseiam-se no resultado de uma pesquisa realizada com psicélogas que atuam em instituiges de sade. Essa pesquisa constitui parte do Trabalho de Conclusdo de Curso de minha autoria. Na oportunidade da pesquisa, foram entrevistadas seis psicdlogas. O objetivo foi pesquisar, principalmente, o conceito dessas profissionais no que concerne a ética, e identificar quais principios servem como norteadores de suas praticas profissionais. A terceira possibilidade apontada constituiu a hipétese da pesquisa do hitp:iwwwscieo.briscelo.php?pid=S1414-088520020001000058script \_artextatingept 216 2402/2019 Por uma éica na saide:algumas re referido Trabalho de Conclusio de Curso. As consideracées apresentadas a seguir baseiam-se na fundamentacdo teérica, discussdes e conclusdo do trabalho. 108 sobre a ica o ser ico na aluagéo do psicélogo Considerando a primeira possibilidade, convém questionar: seré que a conduta ética pode sustentar-se unicamente no cumprimento do Cédigo de Etica Profissional do Psicélogo? E mais: 0 Cédigo est no campo da ética ou no ‘campo da moral? Anteriormente citei que 0 Cédigo de Etica Profissional ou Cédigo Deontolégico insere-se no quadro das normas Juridicas. Dessa forma, podemos consideré-lo como sendo um sistema de regras, externo ao sujeito, cuja finalidade é regular as ages dos profissionals da categoria, apontar suas responsabilidades e deveres, bem como demarcar seus direitos. Agir de acordo com as normas instituidas no Cédigo Deontolégico da categoria profissional no é evidéncia suficiente para demarcar uma postura ética, pois 0 Cédigo de Etica Profissional tem carter coercitivo devido as sancées a que séo submetidos aqueles que infringem alguma das normas que constituem 0 mesmo, A ética, quando entendida como sendo uma postura reflexiva sobre a moral, possibilita a compreensao de que 0 Cédigo de Etica Profissional é uma legislagéo com objetivos especificos, sendo assim, subordinado a ética Por ser a ética compreendida como uma reflexdo acerca das normas morais vigentes, esta ndo se encontra expressa em Cédigos, nao existe na forma de leis, nao implica sancdes, ndo normatiza quais sdo os ‘comportamentos adequados numa dada situacao. Portanto, 0 cumprimento daquilo que est instituido é da ordem da lei, da moral, e no da ética. N3o obstante, ser ético ndo implica cumprir o que manda a lei, mas refletir criticamente sobre as normas morais vigentes, sejam elas sustentadas por habitos, normas ou leis regulamentadas pelo Estado ou érgao fiscalizador da categoria profissional. Faz-se necessdria a compreensao de que o Cédigo nao traz, em seus cingiienta artigos, respostas precisas as questées éticas. Daf a necessidade de ndo limitar-se aos contetidos inscritos no Cédigo. Fica demarcado, portanto, © caréter referencial do mesmo, ou seja, que este serve como um relevante norteadar para as atividades dos profissionais da categoria, pois trata de direitos, deveres e responsabilidades. As particularidades de cada situacéo exigem uma ampla reflexo que inclui o Cédigo de Etica Profissional do Psicdiogo, mas néo se limita a ele A segunda possibilidade apontada refere-se & ago do psicélogo guiada por seus valores ¢ principios, construidos 20 longo de sua formagéo pessoal e profissional. Certamente devemos considerar que os principios do psicélogo 880 relevantes e devem ser considerados e respeitados. No entanto, na relacdo com a pessoa atendida, ndo cabe 20 psicélogo priorizar aquilo que ele, profissional da sade, considera bom e correto, aquilo que acredita e valoriza ‘Atuando baseado unicamente em suas crencas e valores pessoais, 0 psicélogo estaré trabalhando em prol da moralizagio, da adaptagdo da pessoa atendida a padres que ele julga relevantes e, consequentemente, estarg pondo em segundo plano os valores, crencas e principios da pessoa a quem esté prestando os seus servigos. E 2 postura ética que permite a coexisténcia de valores que podem diferir (valores do psicélogo e valores da pessoa atendida), pois 0 respeito permeia as relagdes onde hi a reflexdo critica sobre a moral. Nesse caso, a diferenca ndo & vista como desvio, mas como uma das multas possibilidades de ser e viver. A terceira possibilidade que apontei refere-se aco do psicélogo baseada em principios éticos que servem a todos, portanto, principios que nao priorizem crencas ou valores pessoais. Aqui interroguei-me acerca da existéncia de principios éticos que orientem os psicdlogos frente as Intervencdes em instituicdes de sade. Pautar o agir em principios sustentados pela ética talvez fosse o recurso para uma ago profissional livre de padrdes fundamentados ‘em regras, normas ou valores pessoais, No entanto, nao foram encontradas, através de pesquisa bibliografica, referéncias a principios éticos que pautem, especificamente, a Intervencdo dos psicélogos nas instituigdes de sade. Porém, foram encontrados principios que norteiam o trabalho de todos os profissionais vinculados aos, cuidados com’a satide. Estes principios, desenvolvidos pela Bioética, constituem campo de reflexdo para enfermeiros, médicos, psicélogos, nutricionistas, fisioterapeutas, assistentes socials, entre outros profissionais. Nos paragrafos a seguir faco uma breve explanacao acerca destes principios. Conforme indica Lepargneur (1996), em 1978 a ~Comissdo norte-americana para a protecdo dos sujeitos humanos na pesquisa biomédica e comportamentall) publicou o Relatério Belmont. O relatério surgiu com o intuito de propor principios que orientassem a solugdo de problemas concernentes a pesquisa com seres humanos, Foram elencados pela comissao: 0 principio da autonomia, 0 principio da benefic&ncia e o principio da justica. Esses mesmos principios so apontados como principios que fundamentam a Bioética, dando suporte as questdes, referentes as condutas e formas de intervencao dos profissionais voltados ao atendimento a saiide. A Bioética, buscando desenvoiver e compreender esses principios, “utiliza um discurso pluralista, onde deverao estar presentes todos esses elos da corrente do pensamento humano: a Filosofia, a Teologia, o Direito, a Sociologia, a Psicologia, a Biologial (Cohen e Marcolino, 1995, p. 52) A palavra autonomia ver do grego autos, significa “leu mesmat), (isi mesmati, e nomos significa lei, norma, regra. ‘Aquele que tem o poder para dar a si mesmo a regra, a norma, a lei é auténomo e goza de autonomia ou liberdade’ (Chaui, 1995, p. 338). Autonomia refere-se, portanto, a autodeterminacao, a escolha individual, 20 poder que a pessoa tem para tomar decisdes que afetem sua vida, ou seja, suas relacdes, seu bem-estar, sua integridade fisico-psiquica. Ao decidir o que é bom, o que é seu bem-estar, a pessoa age de acordo com seus valores, suas necessidades e prioridades, demarcando qual a sua vontade frente & realidade que vivencia. hitp:iwwwscieo.briscelo.php?pid=S1414-088520020001000058script \_artextatingept 36 2402/2019 Por uma éica na saide:algumas re 108 sobre a ica o ser ico na aluagéo do psicélogo A possibilidade de escolha ¢ 0 alicerce da autonomia. Para que exista uma acdo auténoma é preciso que existam alternativas de aco, pois somente assim o sujeito poder escolher o que considera melhor para si. Se existe uma nica opgéo, um Unico caminho a seguir, nao existe possibilidade de exercer a autonomia. Por outro lado, a autonomia individual nao é sindnimo de liberdade total. 0 sujeito, vinculado @ um contexto econémico, politico e cultural tem, nas suas relagbes, fatores condicionantes e restricBes 4 sua agdo. Os fatores condicionantes so inerentes & candico de sujeito moral, inserido em um meio cuja organizacdo prioriza a observancia das regras e normas instituidas. No entanto, dentro de uma certa margem, é possivel ao sujeito decidir e agir conforme sua vontade, seu desejo e interesse, ou seja, é possivel que o sujeito exerca a sua autonomia. Chaui (1995) nomeia de deliberacdo a escolha feita diante da situacdo que é apresentada. IN3o deliberamos e nem decidimos sobre aquilo que é regido pela Natureza, isto é, pela necessidade, Mas deliberamos & decidimos sobre tudo aquilo que, para ser e acontecer, depende de nossa vontade e de nossa ago | (op. cit, p. 341) Conforme Mufioz ¢ Fortes (1998), ‘la pessoa auténoma tem o direito de consentir ou recusar propostas de caréter preventivo, diagnéstico ou terapéutico que afetem ou venham a afetar sua integridade fisico-psiquica ou social” (p. 63), Para que o sujeito possa escolher aquilo que acredita ser o melhor para si, é preciso que tenha sido esclarecido acerca da situacao, das alternativas de escolha, das implicagées, beneficios e possiveis consequéncias. Dessa forma, cabe aos profissionais de satide, dar informacées de modo adequado, evitando expressdes técnicas que dificultem a compreensao, além de repetir as informacdes quantas vezes forem necessérias. € preciso que a pessoa compreenda o sentido das informacdes; que Ihe sejam apresentadas alternativas de tratamento; que seja orientada a respeito dos procedimentos diagnésticos, terapéuticos ou preventivos; que saiba das possiveis complicacies e sequelas decorrentes de determinada intervenco; que Ihe sejam dadas informacées quanto & eficdcia do tratamento, dores, desconfortos, custos e durago do tratamento, entre outras informagées relevantes. © principio da beneficéncia, conforme a tradicao hipocrética, & a regra bésica na relag3o com a pessoa atendida, pols orienta o profissional a atender a pessoa procurando fazer-lhe o bem e evitando que ocorram prejuizos decorrentes de sua intervengdo. Essa é regra norteadora das praticas de todos os profissionals vinculados aos cuidados com a satide. Esse principio esté diretamente vinculado & ndo-male-ficéncia, “primeiramente ou acima de tudo nao causar danos (primum non nocere)" (Kipper e Clotet, 1998, p.47). © terceiro principio elencado pela Bioética, o principio da justia, também chamado de principio da equidade por alguns estudiosos, tem o propésito de orientar o debate em torno da distribuigao dos recursos na satide. Confor- me demonstram Garrafa, Oselka e Diniz (1997), a escassez dos recursos alocados a sade em paises ditos, subdesenvolvidos ou em desenvolvimento revela um quadro de abandono onde a pobreza e escassez de recursos figuram como as principals causas de morbidade e mortalidade entre a populacdo mais carente, © modelo de assisténcia & satide que predomina em nossa atualidade evidencia que o atendimento é farto para aqueles que tem condicées financeiras de arcar com os custos das intervencdes. Numa segunda classe’! esto aqueles que podem acrescentar s suas despesas mensals os custos dos planos de satide; mesmo assim, em muitos casos no Ihe & garantida a assisténcia integral. E em terceiro estdo os pobres, aqueles que dependem da assisténcia gratuita e, na maioria das regides do pais, escassa. € em decorréncia desse modelo que o principio da justiga prima pela idéia de que a satide deve ser compreendida como sendo um bem fundamental que contemple a todos e nao apenas a uma pequena parcela da populacdo. Ha muito o que discorrer a respeito do principio da justica ou eqiiidade, principalmente por este estar diretamente envolvido com questées politicas, econdmicas, sociais e de distribuicgo de renda. A complexidade do tema abarca um universo que ultrapassa os limites propostos por este artigo. Frente a essa breve explanagdo acerca dos principios elencados pela Bioética, cabe questionar se o cumprimento desses principios configura uma atuacao pautada na ética e, portanto, responde a questo proposta no inicio do presente artigo. Se nos ativermos & leitura de textos daqueles que se propéem escrever sobre Bioética, podemos constatar que os autores, ao mencionar os principios da autonomia, beneficéncia e justica escrevem frases semelhantes a estas: Lo principio da beneficéncia tem como regra norteadora da pratica...11, 16 obrigacao do profissional de satide...1, ‘@ pessoa atendida tem o direito de ... e, portanto, o profissional de satide deve...'. As palavras grifadas so as mesmas contidas nos cédigos que visam a normatizar controlar a atuacao dos profissionais ou a vida dos, cidadaos. "Regra, “Tobrigacdo™, "devert’ so termos que constituem 0 campo da moral, daquilo que esta instituido e deve ser cumprido porque assim diz a lel, as regras sociais ou a moral vigente. Por outro lado, no campo da ética ndo hd demarcagao de regras e normas, pois a mesma nao se encontra expressa em cédigos ou representada em forma de leis. Sua existéncia é determinada somente a partir da reflexao critica sobre a moral, ou seja, a reflexo critica sobre a regra, a norma, a lei, sobre aquilo que constitu o direito e o dever. © fato de os principios constituirem regras ou normas no diminui a relevancia destes na relacdo do profissional de salide com a pessoa atendida, familiares desta ou com a sociedade em geral. E inquestionavel a virtuosidade expressa nos principios, pois estes visam a preservar a dignidade e a valorizar a autonomia da pessoa. No entanto, no devem ser compreendidos como absolutes, pois dependem do ponto de vista com que s8o enfocados, bem como variam de acordo com a situacao em questéo. hitp:iwww cielo briscielo.php?pid=S1414-088520020001000058script \_artextatingrot 418 2402/2019 Por uma éica na saide:algumas re 108 sobre a ica o ser ico na aluagéo do psicélogo Podesse concluir que a postura ética exige muito mais do que uma consulta ao Cédigo de Etica Profissional do Psicélogo, ou a observancia dos principios elencados pela Bioética. Exige reflexdo, Mas essa é uma resposta ampla certamente no satisfaz a questdo proposta: em que o psicélogo deve pautar o seu agir para ser ético? Acredito que a resposta possa residir na reflexdo critica baseada na inter-relagdo de fatores constituintes do dilema ético, bem como de recursos morais para a solucdo dos mesmos. Portanto, essa reflexao pressupée a inter-relacao de varios instrumentos ou fatores que precisam ser considerados: 1) o Cédigo de Etica Profissional do Psicélogo; 2) 08 principios elencados pela Bioética; 3) os valores e principios do psicdlogo; 4) os valores € principios da pessoa atendida; 5) os conceitos morais que permeiam a sociedade e determinam os conceltos de certo e errado, bern e mal; 6) os principios, regras e ideais da instituic3o na qual o psicdlogo esta inserido, pois quando vinculado a uma instituigdo 0 psicélogo tem responsabilidades morais e éticas frente ndo somente & pessoa atendida, mas também frente a instituigéo que o emprega. Considero que é a inter-relacio de todos os fatores citados que possibilita a reflexao critica visando ao encontro de aces pautadas na postura ética, possibilitando, dessa forma, acdes que vo ao encontro das necessidades daquele que, frente ao nascimento, a doenga ou 4 morte iminente, busca no profissional de satide o auxilio, bem como 0 reconhecimento de si como pessoa, Uma postura baseada unicamente na regra, na norma, naquilo que 0 psicélogo valoriza ou considera verdadeiro, sem considerar o que 0 outro acredita e valoriza, contribuem unicamente para a moralizacao, opressao e marginalizacao daqueles que esperam ser tratados com respeito e dignidade. Referéncias bil jiograficas Berlinger, G. (1996). Etica da Satide. S80 Paulo: Hucitec. [ Links ] Chaui, M. de S, (1995). Convite 4 Filosofia, So Paulo: Atica. [ Links ] Chiattone, H. 8. de C. & Sebastiani, R. W, (1997). Etica na Sade, Algumas reflexes sobre nossos desafios para o século XXI. Em Camon, V. A. A. 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[Links } fEndereco para correspondéncia Giane Amanda Medeiros Rua Dr. Penaforte Mendes, 86 apto 32 - Cerqueira César 01308-010 Sao Paulo - SP E-mail: gianepsico@terra.com.br Recebido em 14/03/01 Aprovado em 18/05/01 * Psicéloga, Especialista em Psicologia Hospitar pelo Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da USP, hitp:iwww cielo briscielo.php?pid=S1414-088520020001000058script \_artextatingrot 36 2402/2019 Por uma éica na satide:algumas rellexSes sobre a éica © 0 ser ico na aluagdo do psicélogo |All the contents ofthis journal, except where otherwise noted, Is licensed under a Creative Commons Attribution License SAF/SUL, Quadra 2, Bloco B Edificio Via Office, térreo sala 105 7070-600 Brasilia = DF - Brasil (85 61) 2109-0100 Auait revista@cfp.ora.br hitp:liwwwscielo.briscielo.php7pid=S1414-08952002000 1000058scrpt=sc\_artext&ting=pt 36

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