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a CRS 2 Imaginagio na cognigéo: 0 propésito da arte Arthur D. Efland* Tadugiode Leda Guimaries™* U problema e a proposta Neste trabalho, apresento uma visio de imaginagao por meio de uma perspectiva cognitiva. A imaginacio, assim como os senti- mentos € as emogdes, € um t6pico espinhoso, apresentando uma hist6ria de exclusfio no dominio cognitive. Meu objetivo € situar 0 papel da imaginagio na cognigao, explorar seu potencial para de- senvolver 0 conhecimento, a compreensdo ¢ a cultura e levantar questées sobre seu propésito na educacio. A auséncia de estudos psicolégicos sobre imaginacio nao é um esquecimento acidental. O tema foi amplamente discutido nos cir- culos literirios € nos de psicologia ao longo do século dezenove. Seu esquecimento por quase todo o século reflete a restritiva in- fluéncia do positivismo, legado do qual ainda temos que nos liber- * Universidade de State, Estados Unidos, *Doutoranda da linha de pesquisa em Ane/Edueagio da ECA — Universidade de Sto Paulo, Esteve em 2003 ¢ 2004 na The Ohio State University como bolsoa FubxightCapes. € ‘rofessora dt Universidade Federal de Gols. srurnucigio cone 8 tar, Os behavioristas evitavam o estudo de imagens mentais ¢ da imaginagZo porque nao tinham acesso direto as experiéncias inter- nas e as sensagdes dos individuos, a niio ser mediante clocumenta- Gao de impressoes subjetivas (Gardner, 1995, p. 324). Imaginacao na Filosofia Por muitos anos, no campo da psicologia, 0 preconceito ex- cluiu as imagens mentais do dominio cognitivo. Assim como o pre- conceito de Platio contra as artes, a imaginacao do artista (chamada por ele de inspiracio) foi considerada suspeita, uma vez que os artistas estariam sob o controle das musas, incapazes de comandar as proprias agoes.* sem esse controle, como esperar que os artistas tivessem co- nhecimento da fonte de seus poderes? Eram meros instrumentos do divino, mesmo que fossem reconheciclos como autores de suas cria- ‘goes. A genialidade — extra-humana em sua origer — era um dom atributdo pelos deuses. No século XVI, Descartes estabeleceu vinte ¢ uma regras para © direcionamento da mente como defesa contra as “enganosas cons- trugdes da imaginacio" (Jones, 1952: 662-663). A verdade no pode- ria ser encontrada nem nas alusdes poéticas da literatura nem nas fantasias das artes visuais, mas nas certezas da l6gica, da matematica ¢ da geometria. Nasce, entio, 0 Racionalismo: a crenga racionalista de que o mundo consiste de substincias fisicas (compos) € mentais (mentes) € de que a mente racional, como substincia mental niio- fisica, era essencialmente descorporalizada. ‘Além disso, um racionalista diria que 0 que nos torna humanos & nossa racionalidade, a qual € parte da mente, nao do corpo. A razio talvez use 0 material fornecido pelos sentides, mas nao é, em 1.0 ataque de Plato A doutina da inepiraco aparece no dilogo conteido como Jon. He tmbern se opts a credbilidade da arte como Fonte de contecimeato em A Rei fen porque a obra de arte € una dupa imiagto iso & ums inet da imiaglo, Pte fambem um tereeio srgumento contra 2 ane, que tas obras vielan o decoro pabco pata fexposicio de paixdes socialmente inaceltivets | | | | | | ™ sn ae, si mesma; um atributo de substincias comporais. $e idéias claras e distintas podem ser formadas pela natureza de objetos e eventos, centao refletem a estrutura da natureza por ela mesma. A natureza & Portanto, um mundo racional. Além disso, 0 status cognitivo da imaginago € suspeito, pois as imagens da imaginagio tém origem em encontros corporais e sensoriais em que © imperfeigées. Filésofos escrevendo na tradicao empitica, tal como John Locke, foram também cautelosos com o discurso figurativo como artificio que “nao serve para nada mais do que insinuar idéias crradas, mover paixdes, ¢, portanto, confundir o julgamento” (Lakoff; Johson, 1980: 191), No fim do século XVIII, a imaginagio alcangou status mais elevado com Immanuel Kant, que reconheceu como uma “faculdla. de procdutiva da cogni¢ao” (Kant em Hofstadter; Kuhns, 1964: 318) Usando a faculdade da imaginagao, a mente poderia criar “outra natureza” a partir de imagens dadas pela natureza real. No entanto, 4 imaginacao teria o papel de-distrair. “Quando a experiéncia toma. se lugar-comum, nés a remodelamos*. Kant também argumentou que a imaginayau nos permite “sentir nossa liberdade através des leis de associacto que organizam a experiéncia empirica, de manei. TA que o material fomecido pela natureza possa ser transformado cm algo diferente, algo que ultrapasse a natureza". Além do mais, a imaginacio € criativa; porque transforma © pensamento intelectual €m movimento, “vivificando a mente e/ou abrindo-a para possibil iades de um campo ilimitado de representagdes semelhuantes” (Kant em Hofstadter; Kuhns, 1964; 318 Ainda assim, a visio de Kant sobre imaginas20 foi perceptiva, Na sua concepsio, “o verdadeiro trabalho de cognicao” é fazer par. te da formacao de conceitos. Conceitos sao proclutos da nossa com- Preensio, a qual é formal e governada por regras, enquanto as per- cepsces sto corporais, materiais passiva’. Johnson, 1987: xxvii). ‘Mais adiante, neste trabalho, adoto a revisaio de Mark Johnson sobre 2, Eewas decliragdes sobre imaginagio foram tradas do timo tnbatho de Kant, A ‘rites do Wlgamerso.& esrsea da nagnagto ¢ encontada a Cries da rasta pur, 3. Os setidos foram pensidos como passvas desde ie sto receptors de sensevtes, ‘enquanto @ mente foi pensidla come ativa em sua procura de conhecinens nero comsronies mm © conceito de imaginacio de Kant." Dando lugar & imaginaglo na epistemologia contempordinea baseada numa visto que ele chama de “realismo experimental’, Johnson evita 0 dualismo corpo-mente que Kant herdou de Descartes. No fim do século XIX e comeco do século XX, o Fositivismg entra em guerra contra a imaginagio artistica, uma vez que esta opera sem regras ou aparentemente sem uma intengac racional. Entretanto, nao existe uma maneira de verificar a veracidade do insight antistico. Respeitados psicélogos, como Freud e Jung, embo- ra menos limitados pelo Positivismo, exploraram e investigaram as regiées subconscientes da mente, pautando-as em bases psicol6gi- cas dos sentimentos e emogdes, aumentando, assim, 0 fosso entre 0 cognitivo e 0 afetivo, Filésofos do século XX, como Emest Cassirer, Postularam que ao recordar de eventos passados ¢ antecipar even. tos futuros usam-se processos simbélicos que requerem imaginacao ara suas realizagdes. “Meméria simb6lica € 0 processo pelo qual o homem nao apenas repete, mas também reconstr6i sua experiéncia Paseada. A imaginagao toumese um elemento necessario para uma Fecordagio verdadeira” (Cassirer, 1944: 75). Do ponto de vista de John Dewey, a imaginacao é “uma generosa mistura de interesses na medica em que a mente entra em contato com 0 mundo, cuando as coisas velhas e familiares se transformam em novas experiénci Ainda assim, a imagina¢2o permaneceu um livro fechado na psico- logia behaviorista, dominante durante a primeira metade do século pasado, Estudos psicolégicos da imagem mental Com o crescimento da perspectiva da ciéncia cognitiva, 0 card- ter cognitivo das imagens ¢ da imaginagao tomou-se novo candida- to as pesquisas psicolégicas, especialmente no trabalho de Roger Shephard (1987b, Stephen Kosslyn e outros (Shephard, 1978a; Shephard, 1978b; Kosslyn, 1980). Com o crescimento das explic Bes dle como dar conta da existéncia de imagens mentzis, esses Psicdlogos comeraram a levantar questoes fundamentais sobre a * adequacao dos modelos computacionais da mente que surgia ante- riormente nas ciéncias cognitivas e, como conseqiiéncia, seus traba- Ihos tém sido fonte de controvérsias (ver Pylyshyn, 1973). Trés tipos de estudo tratam do tema das imagens mentais: 0 primeiro sto compilagdes de estudos anedéticos, inclusive depoi- mentos pessoais de individuos que fizeram importantes descobertas cientificas ou artisticas ocasionadas por fortes atos de criatividade imaginativa. Em particular, Shephard (1978a, 1978b) colecionow um niimero de depoimentos de atividades imaginativas de cientistas. Fomecem interpretagdes draméticas do papel das imagens mentais no proceso reflexivo que conduziu tais individuos para seus mais importantes trabalhos ou para realizarem suas descobertas-chave. Shephard escreveu que Albert Einstein confessara que 0 pro- cesso verbal nao “parece ter desempenhado nenhum papel” em seu processo de pensamento criativo. Na verdade, ele afirma que sua habilidade particular também1do repousa em célculos matemati- cos, “mas, 20 contrétio, em visualizar [..J efeitos, conseqiiéncias ¢ possibilidades’, Ele vivenciou 0 que chamou de seu gedanken, ou Pensimenta experimental, em que imaginou a si mesma viajando a0 lado de um feixe de luz numa velocidade de 185 mil milhas por segundo. O que ele “viu” mentalmente no corresponde a nenhuma coisa “que possa ser experienciada perceptualmente, como a luz, nem algo que pode ser descrito pela equagao de Maxwell, a qual apresenta as relagdes entre as varias formas de energia eletromagné tica, Foram esas visualizacdes que o levaram a formular a importan- te teoria da relatividade” (Shephard, 1978a, 1978b). A segunda abordagem do estudo de imagens mentais envolve estudos empiricos, em que a utilizagao de imagens mentais foi com- parada com a atividade perceptiva comum (Shephard; Metzler, 1971) ou postas em contraste com a informagio apresentada verbalmente, na forma lingifstica (Kosstyn, 1983). Resultados obtidos por Shephard. € Metzler indicam que, em muitas instincias, as imagens mentais sio extraordinariamente capazes de substituir a percepgao teal, com sujeitos aparentemente capazes de fazer os mesmos julgamentos sobre objetos mentais da mesma maneira que fazem a respeito de objetos verdadeiros encontrados na percepgio. Johnson sugere que esses estudas sobre imagens mentais oferegam suporte empirico para a sarerovcgio conesPOR mm presenga de “imagens esquemiéticas” como uma base para 0 pensa- ‘mento imaginativo (Johnson, 1987: 25). Kosslyn ¢ seus colegas tam- bém tém delineado uma teoria abrangente que chamam de uma forma quase pict6rica de representagao mental chamada de imagery (i.e; um conjunto de imagens)". De acordo com Gardner, “esta for- ma de representacao mental é to importante para uma compreeh: sio de cognig&io como sio as formas mais usuais de proposigbes” (Gardner, 1987: 327). ‘A posigdo de Kosslyn em relagio a um conjunto de imagens foi contestada por Zenon Pylyshyn (1973) e outros*, Pylyshyn sustenta (© ponto de vista de que @ cogniclo € principalmente uma fung20 computacional, negando qualquer realidade mental independente para esse conjunto, argumentando que “qualquer imagem mental, estrulura esquemitica ou operagio nestas pode ser representada na forma proposicional” (citagao em Johnson, 1987; 129). Johnson concorda que, com certeza, podemos descrever imagens ¢ esque- mas de forma proposicional, mas a verdadeira questao conceme 2 realidade cognitiva destas em primeiro lugar. Gardner sugere “que © fato de os computadores poderem — o que usualmente fazem — transmitir informagio apenas de modo simbélico nao € razo para inferit que seres humanos o fagam da mesma forma’ (1987: 129). De fato, sua teoria das miltiplas inteligéncias nega agressivamente essa limitagao. Uma teiceita abordagem do estudo da imaginacio € baseada ro trabalho de lingiitstica cle George Lakoff, que com Mark Johnson (2980) estudow tanto as fundagdes cognitivas de certs atividades mentais aparentemente abstratas como categorizacdes © metéforas quanto as observou em estudos empiricos de comportamento lin- {galstico. Sustentam que existe um corpo crescente de evidéncias para a existéncia, que chamam de “nivel de operagées cognitivas de imagens esqueméticas". Como os esquemas piagetianos, estes exis- tem em um nivel de generalizacao e de abstracto que permite s rem repetidamente de identificadores de paclrdes em uma variedade {Um mimeo detalhado dessas controvérsias pote ser achado em Gardner (1987). The mins new sence: bstory of the cognlive revolution Ey oan tos, de experiéncias similarmente estruturadas de modos relevantes (ohnson, 1987: 26-28). No entanto, as imagem esquemiticas de Lakoff ¢ Johnson clferem dos esquemas piagetianos nas estruturas basea- ddas em imagens derivadas “naturalmente”’ de experiéncias corpo- rais € perceptuais. As imagens esqueméticas de Piaget, em contraste, tendem a dar mais importincia as estruturas simbélicas com base ‘em contetidos proposicionais. Mais tarde, tracarei as similaridades e as diferengas entre esses dois tipos de esquemas, em que um forne- ‘ce as bases para as estruturas proposicionais da mente (Piaget), en- quanto que 9 outro expande a cognigao para abracar estruturas nio-proposicionais do canhecimento, bem como um tardio forneci- mento de uma base para a imaginacio, empregando tanto os artfi- ios quanto as m Categorizagées da cognicéo— (© que vem a seguir € uma teoria geral estabelecida para uma explicacio cognitiva dla imaginagao. Entretanto, o leitor porter sen= tir que essa explicagao comeca a partir de ceita distincia da area da imaginagio, porque inicia com 0 t6pico de categorizacdo. Catego- ¥ias, no sentido formal, sio ligadas a regras, que definem as condi- 0es de objetos, eventos ou pessoas camo membros ou nao-mem- bros, segundo 2 maneira de a mente organizé-los e classificé-los em grupos, De muitas formas essas regras comespondem Aquelas do Pensamento I6gico © 2 operagio de formas propos samento, o qual to imaginativo. A categorizacao também & empregada num segundo sentido, quando se refere A forma de as pessoas agruparem coisas no dia-a. dia, na experiéncia do senso comum. Muita gente pensa em imagi- nagio sé em termos cla romantica definigao do século XIX — conotando criago artistica, descoberta cientifica, invencio, fantasia 5.0 termo “mural” foi cunhato por George Lakoff para refers 2s imagens deiva- las diretamente dos sentidos como opostas as experincias mediadas pelo verbal ou por ‘ucras formas de representacao simblica. Ver em Johnson, (1587. 27, saxoucgio conten, a mesmo devaneios. Essa definigao ten pouco a ver com a vida do mundo do dia-a-dia, sugerindo as mentes céticas que ela nio € com- pativel com educagio. De fito, Lakoff ¢ Johnson tiveram a inteng20 de explicar que as imagens esquemiticas fomeciam tanto os funda- mentos para processos, tais como razo abstrata, metéfora, narrat va, quanto componentes da imaginagio na cogni¢io. Além diss, essas imagens esquemiticas ocorrem pela totalidade da cognico humana — da vida didria ao mundo das artes e das ciéncias. Aprendemos sobre © mundo natural por meio de nossos senti- dos, das multiplas sensagdes de lvis0es € sons, de calor ¢ frio, de aspereza délicaceza, de sabores e cheiros. Aprendemos também dentro do mindo social pelas mediagdes com os membros da fami- lia, amigos e mais amplamente com a comunidade. Nossa compreen- sio emerge desses encontros. Com a experiéncia, nosso retrato do mundo torna-se mais diverso €, para controlar essa vasta enumera- Ao de coisas, nbs as organizamos em categorias, por semelhangas € diferencas, amigos € estranhos — e até pelo que gostamos € pelo que nio gostamos. E 0 poder de selecionar, de incluir e de excluir. Organizamos nosso mundo com base em atributos comuns. E muito mais eficiente aprender sobre grupos de coisas pelas caracteristicas compartilhadas do que por cada uma isolada. A cate- gorizagio implica pensar as coisas em termos de comunalidade, no de unicidade ou de estados individuais. Esta ago é geralmente au- tomiitica € inconsciente, elevando-se para a visio de que objetos ¢ eventos no mundo vém em tipos naturais. No entanto, as catego- rias siio conquistas cognitivas, no propriedades do mundo como tal, Emergem do esforgo da mente para organizar o que € dado pela percepeio, no esforgo de assegurar significado, Se nao fos- se a capacidade de categorizar, cedo no tornariamos "escravos do particular”s As categorias também sao usadas para agnupar'coisas e pessoas e servem de base para o comportamento social. Piaclas sobre mulhe- res no transito € piadas de sogra supsem que os membros desses grupos compartilhem caracteristicas er! comum (nesse caso pejora- 6. Atribuo essa expressto 8 Jerome Bruner, Pa sna se m0 tivas). Tais categorias € suas cargas afetivas slo construidas na guagem do cotidiano; podem disseminar esterestipos sexuais ou racistas, Estas so aplicagdes negativas ce categorizages. Do lado construtivo, temos a classificag2o do senso comum de passaros, flo- res e peixes em grupos de coisas que fomecem a base para organi- zat 0 conhecimento usado nas tarefas didrias e no curriculo escolar. Categorias clésicas e suas alterativas ‘Tendemos a assumir que tais agrupamentos de categorias que formamos nas nossas tarefas difrias oferecem confidveis represent es das coisas como elas sio no mundo, lidando com uma confié- vel visto de realidade em si mesma, Lakoff (1987: 6) explica: Desde 0 tempo de Aristteles até Witigenstein, categorias foram pen- ssadas para ser bem entendidas e nao problematicas. Elas foram assu- ‘midas como containeres abstratos, com coisas dentro ou fora de cate- gorias. Coisas foram assumidas como sendo de uma’ mesma categoria 36) © somente se, elas tivessein Lereas propriedades em comun, © as propriedades que elas tivessem em comum fossem tidas como definidoras da categoria. A familia de categorias semelhantes de Wittgenstein Ludwig Wittgenstein (1953) comecou percebenclo que as pes- soas necessariamente nao organizam experiéncias nos molds clas- sicos de categorizagao € freqiientemente tendem a inventar sistemas alternativos para driblar os limites impostos por tais categorias. Exem- plificou isso com um conceito. Nao existe uma tinica colegio de propriedades das quais todos 0s jogos compartilhem, sendo, por- tanto impossivel elaborar ima defini¢ao que inclua todas as coisas chamadas jogos que simultaneamente excluam 0s nio-jogos. O que lune 0s jogos como uma categoria é o que Wittgenstein chamou de familia de semelhancas. De acordo com Lakoff, “|... jogos como familia so similares uns aos outros numa vasta variedade de modos. Isto € © que faz deles uma categoria e nao uma simples e bem definida colegao de propriedades comuns” (Lakoff, 1987: 16). Além sarin comtaroetn w disso, pessoas no diz-a-dlia nfo estio preocupadas com essa falta de definicao, Nao temos dificuldade em recoahecer objetos ou eventos chamados jogos. Arte como categoria ‘ Da mesma maneira, Morris Weitz (1956) argumentou que arte como um conceito também funciona como uma familia de catego- rias semelhantes. Nelas, nenhuma das definigdes existentes de arte aplica-se para todos os casos de arte. Arte também tem suas front ras estendidas na medida em que novos meios € estilos surgem € novos trabalhos so criados.” Quando a arte foi definida como uma ‘ordem formal, 0 curriculo estabeleceu 0 estudo dos principios for- ‘mais, enfatizando elementos e principios do design. Mas quando a ‘arte foi definida como expressto dos sentimentos dos artistas, a criatividade e a auto-expressio prevaleceram. Quando Weitz suge- riu que essas definigoes fossem, no melhor sentido, colocadas como recomendacdes para encarar a arte de determinado ponto de vista, arte/educadores comegaram a reconhece: a possibilidade de miihi- plas perspectivas no curriculo. Essa mudanca de uma concepgao tradicional e classica de categoriza¢io para o sistema de familia de ssemelhangas comegou a mudar as propostas para a produgo de um. curriculo edlético, aberto as varias idéias sobre o que arte pode ser*. Categorias baseadas em prot6tipos Na teoria classica, as categorias compartilham um conjunto de propriedades comuns possuidas por todos os membros, em que os “7. Resposts a questio “o que € ane" foram tradidionalmente entendidas como vert dirs defnipdes, no sentido de que eram avangos qu: se aplcavam a todos 0s casos de arte: Weits questionou que "o que € ate" ¢ uma questo erida seria mais aproprado que lgoém perguotasse: “que tipo de conceto € arte” ou como ela tem sido aplicada em determinado contexts? 8. Por exemplo, o testo amplamente wsado, de Laura Chapman Approaches fo art education, adoso wm pont de visa ecltico, Mew algo Concedes de ensino tea una sucesso de orienughes em Are/Educagio proeminenss durante séeulo XX a ams sn atributos definem a categoria. Conseqiientemente, nenhum membro deveria ter alguma espécie de status (Lakoff, p. 40). Ainda no inicio de 1970, Eleanor Rosch comegou identificando certos efeitos que ela chamou de efeitos protottpicos dentro das categorias, tais como cores, passaros ou cadeiras, Quando pedi as pessoas que agru- assem cores que parecessem pertencer A mesma familia, todos os vermelhos € todos 0s azuis foram colocados juntos, por exenyplo. Quando solicitou que fosse selecionado um exemplo mais tj de azul ou de vermelho, muitos também fizeram 0 que foi pedido sem dificuldade. Essa criteriosa escolha de cores age como proté- tipos especificos freqiientemente baseados em familias de seme- thangas pelas quais os individuos marcam sua experiéncia com as cores. Visto que 0s protétipos sugerem que alguns membros de um grupo sejam mais representativos da categoria que outros, a idéia de protétipos € uma variagio da teoria clissica, em que todos 08 casos deveriam ter o mesmo comportamento como exemplares de uma categoria. Os prototipos revelam outra faceta da categorizagio. Lakoff (1975) descobriu. que individuos usam modificadores ou “esquiva- ‘mentos” para contornar a rigidez e a nao-flexibilidade das categorias classicas. A expressio par excellence é um dos tais esquivamentos, ‘enquanto outro € a expresso “estritamente falando". Por exemplo, Para as pessoas que vivem em zonas temperadas da América do Norte, 0 passaro tordo representa 0 protétipo de passaro par excellence, visto que apresenta atributos de passaros mais conhe dos no lugar. No entanto, pingilins ou galinhas so menos provivei de desfrutar esse status. “Estritamente falando”, também so passa- os, mas sto casos menos prototipicos da familia dos pissaros. Pen- sar dessa forma abala as camisas-de-forca mentais impostas pelas categorias. Categorias de nivel basico Semelhantes aos prottipos baseados nas categorias so 0 que Roger Brow tem inicialmente chamado de categorias de ‘niveis bi- sicos" (Brown, 1958; 1965: 317-321). Assim como Rosch, ele desco- snrezovegio corenonint ” briu que existem niveis de participagio dentro das categorias, Para exemplificar, quando criangas aprendem sobre flores como uma categoria, devem ser envolvidas em ages como plantar, colher € sentir certos aromas; a0 mesmo tempo, aprencer’o que so chama- das de flores, estabelecendo uma relaglo mental com elas como uma categoria de coisas vivas. O aprendizado, mais adiante, potle acrescentar conhecimento de mais tipos de flores, como as rosas, € de que plantas que dao flores so membros de um grande grupo do reino das plantas. No entanto, nessa instincia, o nivel bisico ainda 0 de flores. As categorias de niveis bisicos parecem ter as seguintes caracteristicas sumarizadas por Lakoff: * so aprendidas em conexdo com distintas agdes tais como cheirar flores; ‘+ so aprendidas cedo, quando as coisas comecam a ser no- meadas; ** esto em um nivel no qual nomes sto curtos ou usados com mais frequéncia; ‘+ categorias de nivel bisico so niveis “naturais” de categor zagao. ‘A “naturalidade” do nivel basien é atribuida as agdes fisicas € corporais realizadas enquanto a categoria esti sendo estabelecida mentalmente (Lakoff, 1987: 32-33) De acordo com Lakoff, com a aprendizagem adicional, a cate- goria torna-se mais elaborada € prossegue crescendo para formar um “nivel superordenado” feito de categorias genéricas. Assim, 0 reino das plantas toma-se uma categoria mais ampla que compreen- de as flores. A categorizacio também pode ser processada para bai- xo, para formar niveis “subordinadas” de categorias. Por exemplo, as varias espécies de rosas. As categorizagbes em subniveis e super- niveis sao menos provaveis de ser aprendidas em conexto com agdes naturais, por essa razo tais niveis adicionais so os que Brown chamou de “conquistas da imaginagio” (Lakoff, 1987: 32-33). Essas conquistas estendem e elaboram a categoria flores. Em suma, 0 ni- vel basico de uma categoria age corio 0s protétipos de Rosch des- critos acima. a nan 054 Algumas implicagées © estudo sobre categorizagao em Filosofia, Lingiistica e Psico- logia tem desafiado a concepgao classica, em que as categorias da mente foram pensadas para conter as categorias do mundo e em que elas operam como inatas, a prion, idéias formais construidas na mente. Em seu tempo, Kant acteditou que esse era 0 caso. Recente- mente, tem-se tomado claro que as categorias sio estruturas do co- nhecimento, abstraidas a partir de miiltiplas experiéncias de carater perceptual € que silo “naturais”, no sentido de que surgem de distin- tas agdes corporais tais como tatear, tocar, ou ver, Embora abstratas, nao so descorporalizadas. Segundo Lakoff e Johnson tém observado ¢ documentado, o fato de que “as categorias de nosso pensamento diario sto ampla- mente metaf6ricas € nosso raciocinio ditio envolve relagdes meta- fricas e inferéncias, portanto a racionalidade comum € imaginati- va por sua propria natureza” (Lakoff; Johnson, 1980: 193). Eles acrescentam: ‘A metéfora € uma das nossas ferramentas mais importantes para ten- tar compreender parcialmente 0 que no pode ser compreendido na totalidadle: nossos sentimentos, experiéncias estéticas, priticas mo- ‘ais, € consciéncias espirituas. Estes esforcos da imaginacio nao 50 derivagBes la racionalidade; visto que ao usar metaforas esses esfor- ‘908 empregam uma racionalidade imaginativa No livto Metaphors We Live By [Metaforas pelas quais vivemos] (1980), Lakoff e Jonhson comecam a elaborar uma teoria de conhe- cimento para explicar 0 modo de a mente operar. Essa teoria con- toma 0s limites da categorizacio formal pelo desenvolvimento do “nivel basico", pelas “categorias prototipicas” e pela criagao do sig- nificado por meio do uso de metéforas. No decorrer desse trabalho, exploraram o papel de imagem-esquemas como uma estrutura de conhecimento que fornece o fundamento para uma concepgio de cogniclo, na qual a imaginagio desempenha papel decisive de mudanga no desenvolvimento do poder de categortzagao, racioci- nlo, formas proposicionais e naio-proposicionais de pensamento pela aplicagao da metéfora e da narrativa. saiovcacf contents a ‘Todas as disciplinas utilizam essas formas de cogn pareca que raciocinio preposicional seja mais provavel de ser experenciado na Filosofia, na Fisica € na Matemitica do que em ‘Arte, embora seja principalmente nas artes que se encontram a me- tafora e a imaginacio. Quando a metéfora aparece na linguagem dos cientistas, parece permanecer escondida, como nas seguintés declaragdes que repousam na metifora que feorias so construgdes: Este € 0 fundamento para sua teoris? ‘A teoria quantica precisa de mais syponé ‘Voce nunca construiria uma teoria sélida com esses argumentos. Ainda nao percebi que forma nossa teoria tomari, Aqui esto alguns fatos a mais para amparar sua teoria. {A teoria evolucionéiia no se sustentard nem caird com a forca desse argumento. ‘Ate agora apenas colocamos a estritura da teoria Sustentou a teoria com sélidos argumentos (Johnson, 1987: 104). Cada uma dessas expresses claramente entatizam a metafora de teorias enquanto construgées. No entanto, membros da comuni- dade cientifica nfo as discutiriam como metaforas. ‘A discussto a seguir sobre Marc Chagal demonstra como 4 metifora tem papel diferente na arte O relbgio de Chagall Em varias pinturas de Chagall feitas em torno da década de 1920, uma imagem recorrente € a do relégio com asas, que pode ser visto voando. Sabemes, literalmente, que rel6gios nao va nem tém asas para voar. Isso € um senso comum baseado no conheci- mento da realidade. Por que, entio, essa imagem aparece em suas pinturas? Seria seu rel6gio com asas uma referéncia @ popular meté- fora de que 0 fempo vod? Seria uma maneira de Chagall comentar 2 passagem do tempo, talvez relembrando sua juventude na Réssia? O rel6gio alado também sugere que se trata de um mundo de fantasia na imaginagao do artista, em que as leis naturais esto suspensas, sinensis om ue eas, Alguns estudiosos que escreveram sobre Chagall referiram-se a esse rel6gio como emblemitico do batimento do coragio humano, da passagem da vida. Nao existe meio de saber com certeza qual dessas conjecturas interpretativas é a mais plausivel, Por essa razio, obras de arte estimulam 0 que David Perkins chama de *inteligéncia reflexiva" (Perkins, 1994). © relogio alado tem-se tornado objeto «{gipensaménto e de interpretagao. A metifo- ra € ativa, Permite a atividade cognitiva. © objetivo dessas ilustra- Oes € mostrar que, nas dlscussées cienfificas, as metiforas parecem trabalhar encobertas, enquanto na arte sao explicitas, Estruturas cognitivas na teoria do desenvolvimento de Piaget © conceito de imagem esquiematica € o principio bésico da teoria de Lakoff € Johnson. Contudo, para entendé-lo, comparo-o com 0 conceito de esquema de Jean Piaget. Esquemas nao si0 con. ceitos novos nas teorias de desenvolvimento cognitivo e tém sido o principal objeto de investigagio de Piaget ¢ outros. Para Piaget, 0 Gesenvolvimento cognitivo tem inicio quando criangas comegam a reconhecer certas regularidades em suas experiéncias. Mais ¢ mais, essas regularidades dispdem da meméria de enconiros anteriores, das agdes nas quais foram iniciacas, resultando em respostas e for, necendo um guia razodvel Para a¢des futuras. Piaget atribuiu o cres- cimento dessa habilidade a formagao de especificas estruturas cog- nitivas chamadas esquemas (schematta), Usou esse conceito para ajudar a explicar por que indlividuos desenvolvem relativa estab dade, mesmo nas respostas previsiveis aos estimulos. Esquemas sio ‘struturas simbélicas que organizam os eventos percebidos pela ‘mente. Sio estruturas abstratas que sumarizam informages prove- nientes de muitos casos diferentes. Ligada a essas estruturas est a consciéncia de operagées particulares ou de agdes realizadas pela mente para entender 0 que € daclo na percepeio, Piaget descreve o desenvolvimento dessas estruturas cognitivas Como crescentemente mentais, abstratas e menos dependentes dos Sentidos. Suas operacdes cognitivas tornam-se menos fisicas ¢ mais formais, na medida em que 0 organismo amadurece. O desenvolvi- sreanvcxgo conteonves a ‘mento cognitivo também ocore por meio de varios estigios marca- dos pelas mudangas nessas estruturas. Nos estigios das “operagdes fornais’, Piaget descreve o poder da mente para organizar estrutu- ras simbélicas em proposigées I6gicas e cientificas que descrevem, explicam € confiavelmente predizem eventos na natureza. Os es- quemas, como concebidos ror Piaget, evoluem para estruturas 6Bi- cas, cientificas e proposiciorais. Seu trabalho principal consistiu em mapear a evolugdo dessas estruturas a partir das primeiras acoes desenvolvidas pela crianga, como tocar objetos, até a formacao de estruturas simbélicas abstratas, Estas incluem nimeros e letras que, ‘embora sem significado em si mesmas, sdo entendidas como repre~ sentagdes do mundo real Piaget nao discutiu a possibilidace de que os esquemas pudes- sem tomar a forma de imagens mentais resultantes da percep¢ao. De fato, ndo considerou a percep¢io como uma forma de inteligéncia, 20 contririo, definiu-a em termos de agdes ou de operagdes que a mente emprega em suas proprias percepgdes, a fim de entendé-las (Flavell, 1968: 31-23) A fungiio do desenvolvimento cognitivo na teoria de Piaget, no € produzir entendimento intelectual que oferega uma visio mais confiivel da realidade, “mas produzir, mais € mais, poderosas estru- turas l6gicas que permitam que o individuo atue no mundo de ma- neiras mais flexiveis e complexas". A descrigio de Flavell dos esque- mas de Piaget também detalha essas estruturas como tipos de con- ceitos, categorias ou estratégias subliminares com as quais 0 grupo retine uma colecao de acdes distintas, mas similares (1963: 54-55). O importante é que essas estraturas, em sua fase inicial, inchem se- qiiéncias de agdes realizadas pelas criangas para explorar ¢ enten- der © meio ambiente, As imagens esquemiticas de Lakoff e Johnson Embora Lakoff e Johnson nao discutam Piaget diretamente, suas exploragées filosoficas ¢ seus trabalhos em lingiifstica tentam ca- racterizar significado em termos de comporalizacao, isto é, de pré- conceituais, de experiéncias corp6reas (Lakoff, 1987: 267). Postu- nseiteatererincenioors a sna wast lam um tipo de esquema que comega com imagens ¢ experiéncias corpéreas adquiridas dlretamente na percepsao.? Essas imagens € experiéncias funclamentam a categorizago, a razo abstrata, as for- mas preposicionais € nao-propasicionais de pensamento, a metafo- ra ea narrativa, O significado € incorporado diretamente aos sent: dos adquiridos na experiéncia € nao tem de esperar agdes adicio- nais produzidas pela mente para compreender suas experiéncias, Johnson exemplifica isso com a imagem-esquema de equilibrio como base para a estrutura que se aplica em muitas instancias desse fend- ‘meno. Inicialmente, 0 equilibrio adquire significado pela experién- cia cm que nos orientamos fisicamente em nossd-ambiente. Vive~ ‘mos num campo gravitacional € resistimos & pressio da gravidade conforme aprendemos a manter o equilibrio. Johnson, 1987: 74) escreve: F crucialmente importante que vejamos que equilbrar é uma atvida- de que aprendemos com nossos corpos e nio pelo entendimento de uma serie de regras ou conceitos. Equilibrar € a primeira coisa mais imporante que fazemns. O hehé levanta-ce, equilihea-ce e rai nn chio. Tenta de novo, ¢ de novo, até que um mundo novo se abra — © mundo da postura ereta equilibrada. A imagem esquemitica de equilibrio adquirida mediante ati- vidades, tais como aprender a ficar em pé e caminhar, experiéncias aprendidas no curso do desenvolvimento antes mesmo de existirem palavras para nomeé-las ou descrevé-las, em razto de seu cariter nilo-proposicional. Uma vez estabelecida, € potencialmente dispo- nivel para elaboragées metaféricas, de maneira que o equilibrio pode se referir a coisas tais como personalidade equilibrada, equacao ba- lanceada em matemitica, equilbrio da justiga nos trabalhos do siste- ma legal etc. No caso de equiltbrio, por exemplo, vimos como certos concei- tos muito abstratos: eventos, estados, instituigdes, € principios (tais como estados psicolégicos, argumentos, direitos morais, e opera- 9. Imagens exquemiticas nto devem see confundidar com imagens que recordamos das rossis primeiss percepsbes. Ao contro, slo estruturas comuns em varias imagens selembrads arrgoveigio comrawosien * ‘gdes mateméticas) sio metaforicamente estruturados como entida- des ou eventos fisicos. E € através da virtude das estruturas metafo- ricamente impostas que ns podemos entender € pensar sobre rele vantes entidades abstratas. F a projegio de tal estrutura que estou identificando como a fungao criativa da metéfora, pois esta € um dos meios principais para pode:mos gerar estrutura na nossa expe- rigncia de um certo modo que possamos compreender (Johnson, 1987: 98). Projegao metaférica Lakoff € Johnson argumentam que a ordem mais alta, o pensa- mento racional pode ser acessado pelas dle extensdes dessas estrutu- ras de imagens esquemiticas mediante a projecdo metaforica. A exis- téncia dessas estruturas da imaginagao ndlo somente sugere que a imaginagio seja cognitiva, mas também que seja 0 fundamento da cognig2o. Para entender a natureza dessas estruturas ¢ de suas agbes, desereva a estrunura da metifora como colocada por Lakoff. Para-Lakoff, a metifora deve ter trés partes: um dominio das fontes, um dominio dos objetivos e um recurso de mapeamento desses objetivos (1987: 276). Para entender a metéfora, terlamos de ver como esses elementos sio intelectualmente conectados. Em muitos dos exemplos de Lakoff ¢ Johason, o dominio das fontes é usual- mente baseado em alguns aspectos do pré-conceitual ou em niveis, Dasicos de experi@ncias corp6reas. Lakoff ilustra isso com uma me- tdfora baseada na imagem-esquema que ele chama de “mais-€-para cima, menos-é-para baixo’. Isso é visto em expresses como, “a taxa de crime continua crescendo’, “O nimero de livros publicados a cada ano continua subindo’, “O estoque caiu de novo” (akoft, 1987; 276-277). Em cada exemplo, o dominio das fontes é a verticalidade, enquanto 0 dominio dos objetivos € quantitative. A verticalidade serve como um bom dominio de fonte, desde que seja diretamente entendida a nossa experiéncia corpérea de gravidade. ‘Mais 6 entendido como para cima porque “qualquer acréscimo numa ‘substancia, digamos, agua num copo— o nivel vai pata cima”. Quan- do adicionamos objetos a uma pilha, seu nivel cresce. Se remover- we ne 29, mos objetos de uma pilha ou agua de um copo, o nivel decai.” Portanto, verticalidade e quantidade tornam-se conectadas por cor- relagdes estruturais comuns que permitem & vertcalidade represen- tar a quantidade. (Lakoff, 1987: 278) conclui: esquemas que estruturam nossas experi@ncias corpéreas pre- ‘conceptuais tém uma base légica. As correlagdes de estruturas pre~ conceituais na experiéncia motivam metiforas que mapeiam esta 16- agica no dominio abstrato. Assim, © que tem sido chamado de nizao abstrata tem uma base corpérea no nosso funcionamento fisico dis rio. Isto nos permite formular uma tearia de significado e racionalida- de com base nos aspectos do funcionamento corpéreo. As metiforas estabelecem conexdes entre objetos ¢ eventos aparentemente nao relacionados; silo encontradas em todos os cam- pos de estudo, inclusive em arte. A projecao metaférica € 0 meio pelo qual o pensamento abstrato aparece. Isso & importante porque explica como © pensamento abstrato, na cogni¢o humana, pode emergir de experiéncias corpéreas € sensoriais. O principal argn- mento de Lakoff ¢ Johnson € que as imagens-esquemas que emer gem de sensagdes corpéreas € de percepcdes podem alcangat 0 dominio mental, epistémico ou légico da cognicao. O que é tipica- ‘mente referido como a mais alta ordem do pensamento, os grandes entendlimentos chamados abstratos e razao descorporalizada, tém origem na formagao de imagens esqueméticas na experiéncia corpérea, Em particular, Johnson descreveu imagens-esquemas como es- truturas nao-proposicionais da imaginagao, conceito que herdou da Critica da razdo pura de Kant. Kant elaborou uma teoria da imagi- nago baseada em quatro divisbes chamadas de imaginagdo repro- dutiva, imaginacéo produtiva, imaginacao como fungdo de esque- matizagéo e finalmente imaginacdo criativa (Kant, 1997: 273-274). © trabalho de Johnson deriva, principalmente, de sua interpretagio de imaginagao, em que a esquematizacio tem um papel de mudan- a crucial. Imagens-esquemas sto mais precisamente descritas como “padres incorporados de experiéncias significativamente organiza- das", isto 6, estruturas de movimentos corpéreos ¢ de interagdes perceptivas. -serxoucgi conto » E aqui que as diferencas entre Johnson e Piaget aparecem. Nessa questio, para Piaget, agdes so operagées da mente que trabalham nas percepgdes entendidas como opostas as agdes do corpo, como aprender a caminhar. Visto que os esquemas de Piaget sio mentais, conduzem & formago de estruturas proposicionais, enquanto as imagens-esquemas que interessam a Johnson so as do corpo, eni- bora na concepgao metafisica de Johnson, corpo ¢ mente sejam indivisiveis."” A compreensac de Piaget sobre cognicao foi mais di- namica do que a visio kantizna, com suas estruturas mentais inatas. No entanto, Piaget permaneceu retratando 0 curso do desenvolvi- mento como uma jornada fora dos fundamentos sensbrios do co- nhecimento. Apesar de sua formagio anterior como bidlogo, Piaget, assim como Kant antes dele, concebeu as operagoes formais da mente como menos dependentes, se nao completamente separadas, do corpo. Em contraste, a jornada intelectual de Johnson e Lakoff revela um nivel basico de experiéneia corporea € perceptual como funda- ‘mento de cognicio ¢ recurso de significado. Como Piaget, também almejaram construir uma altemativa para a visio kantiana na qual ‘uma alta ordem dle estruturas logicas emerge "a priori como a essén- cia universal de racionalidade” (Johson, p. 99). Afirmam, também, que as estruturas cognitivas dessa alta ordem emergem de nossa corporalizagio experienciade concretamente. Ampliam a definicao de cognigao para incluir os esquemas proposicionais de Piaget, mas também imagens-esquemiatiaas, estruturas n’o-proposicionais. A concepgao kantiana de imaginagao era problemitica, porque dividia 2 mente em dois aspectos. O fisico, orientado por leis natu- rais deterministicas, que se referiam a nosso ser corpéreo, inclusive as sensagdes € 05 sentimentos, € 0 dominio formal da compreensio. Um abismo separava a comp-eensio das experiéncias perceptuais, a mente do corpo, numa dicotomia que retrocedeu’ ao racionalismo de Descartes e que sobrevive na tendéncia de Piaget de separar 10. Tanto Lakoff como Johnson eejesaram o que chamaram de mitos do objetvisma subjeivismo em favor de uma meafscr que chamam de realsmo experimental, Ver Cap- Jo 1 no liv de Lakoff Mulberes, ego cots prigosas. Ver também Capitulos 25 2 28 ex Lakoff; johnson, Metaphors we le by (Metéoras nas quais vivemos. ou mt 05. pensamento de sentimento, Ainda assim, a imaginagao esquemitica, como concebida por Kant teve o potencial de consteuir uma ponte sobre esse abismo. Johnson (1987: 102) adiciona: Bu sugeriria que, embora Kant jamais admitisse isso, sua notivel ex- plicagao de imaginaglo na verdade mina a rigida dicotomia que defi- ne seu sistema, mostrando muito fortemente que elas mito sie separt- ‘ges metafisicas © epistemoldgicas absolutas. Portanto imaginagio € uma estrutura pervasivamente construida pelos significados nos quais és adquirimos representagbes coerentes, padronizadas e unificadas, ‘A conclusto é, por conseguinte, que a imaginagdo é absolutamente essencial para a raclonalidade, isto é, para a nossa capacidade racional de encontrar conexdes significativas, de desenhar inferéncias € de re~ solver problemas. Kant, com certeza, nlo aceitaria esta conclusio por {que minaria as dicotomias nas quais seu sistema esté baseado. © problema de Kant desaparece quando negamos 0 abismo entre compreensio, imaginagio € sensacao. Johnson pergunta: “O que aconteceria se, segiiinda 0 consenso da filosofia analitica con- temporfnea, negéssemos a estrita separacio do dominio formal do material". Se pudéssemos olhar esses pélos como um continuo, nao haveria necessidade de excluir a imaginac3o do cognitivo. Kant re- conheceu um amplo dominio de estruturas de significados compar- tilhados na imaginacio, mas no poderia, ele mesmo, atribuir esse status & dimensio cognitiva. fim direggo a uma teoria da imaginagdo Johnson (1987: 171) sugeriu que “uma adequada explicagio de significado e racionalidade, tais como compreensao € comunicacio, ‘espera por uma teoria mais compreensiva de imaginac2o. Tal teoria complementaria influenciaria nossas atuais teorias cle conceituali- zacio, conteides propocisionais € atos de discursos. Num sentido ‘mais amplo, esta teoria propiciaria uma explicagaio compreensiva de estrutura na experiéncia humana € na cognicao", Johnson lista va- tias possibilidades de como uma explicacao cognitiva de imagina- ‘ao exigiria alguns dos t6picos abaixo relacionados: recone comtewouen » Categorizacio Nao se refere a uma visio clissica de categorizacdo, mas a uma visio que descreve 0 modo de os seres humanos “transformarem suas experiéncias comuns em padrdes compreenstveis.” A categori- zagio prototipica é preferida a outros modos que procuram fixat condigbes necessirias € suficientes (p. 171). Esquemas Ele cita a necessidade de uma teoria de esquemas mais abran- gente, isto é, “o conhecimento geral ou estruturas de eventos. Ne- cessitamos pesquisar os tipos basicos de esquemas, para ver como eles podem ser desenvolvidos metaforicamente, para investigar suas complexas inter-relagdes e explorar suas conexdes com estruturas proposicionais” (p. 171. Estrutura narrativa Quando esia surge para explicar como os seres humanos do sentido ao seu mundo, ‘deve haver um lugar central para a nogio de unidade narrativa. Nao apenas nés nescemos dentro de narrati- vas complexas ¢ coletivas, como também nés experenciamos, en- tendemos € organizamos nossas vidas como histérias que estamos vivenciando” (p. 171-172) Interpretagdes como narrativas Embora Johnson identifique a estrutura da narrativa como um dos componentes de uma teoria da imaginacto abrangente (1987: 171-172), nao elabora o modo de a capacidade narrativa ser relacio- nada a outras partes da imaginacao, tal como a metifora. Mas a cestrutura narrativa compartilha certos pontos comuns com a estrutu- ra metaforica, de modo que esses pontos tenham sua fonte de recur- + sos na experiéncia humana, da qual tém origem a partir de algum a0 ne w8I054 ‘ipo de problema ou situagao. Jerome Bruner usa 0 termo “proble- ma” para identificar os pontos iniciais de muitas narrativas (Bruner, 1996: 94); uma narrativa tipica comecaria com uma frase do tipo: “Bu esava descenclo rua, preocupado com 0s meus préprios pro- blemas quando...” A aco desdobra-se lidando com uma pausa, uma violagdo de uma expectativa legtima. O'que se segue € tanto uma restitulsdo da legitimidade inicial ov uma muclanga revoluciondtia do assunto com uma nova ordem de legitimidade, Existe também um ponto-alvo (algum tipo de resolucao, desfe- ‘cho ou moral da hist6ria) e, finalmente, caminhos que mapeiam as conexées imprevisiveis. Narrativa, na visio de Bruner, € também um modo disciplinado de pensamento na construgio do presente, do Passado e de possiveis condigées humanas (Bruner, 1996; 100). As narrativas nao forecem explicagdes; de preferéncia, lidam com 0 Entendimento, 0 qual é definido como “desfecho da organizagao e contextualizaco essencialmente contestavel, le proposicdes incom pletamente verificéveis num movlo disciplinado" (p. 90). © modo narrativo de fazer sentido conta-nos a histGria sobre alguma coisa. “Entender, ao contririo de explicar, nfio é restrtivo. Uma mancit de construir a queda de Roma narrativamente nao exclui outras in- terpretagoes". “Algumas narrativas sobre ‘o que aconteceu’ sio sim- Plesmente certas, no somente porque elas so enraizadas numa factualidade, mas porque sao melhor contextualizadas, retoricamen- te mais ‘elaboradas’ e algo mais" (p. 90-91). Bruner (1996: 40) também identifica as amplas implicagées da narrativa na educaglo, lamentando a tendéncia de, na escolariza- Slo, trati-las como mera decorag2o em vez de um modo, talvez 0 melhor modo, de os individuos construirem significados, ‘Tem sido uma convencdo na maioria das escolas tratar as aites da harrativa-cangio, drama, cco, teatro, seja 0 que for — mais como “decoracio" do que como necessidade, algo do qual se obtém beleza © prazer [.] Apesar disso, enquadramos as explicagées das nossas ‘Origens culturais ¢ das nossas mais caras crengas em formas de hist6- tia. Nossa expetigncia imediata, o que aconteceu ontem ou no dia terior, € apresentada ‘da mesma forma historiada. Mesmo de uma snserovesfoconrennonia uw ‘maneira mais restrita, represcntamos nossas vidas (tanto para nds ‘mesmos como pari os outros) na forma de narrativa Lal A importincia da narrativa para a coesdo da cultura é provavelmente {o grande, quanto é na estruturagao da vida individual. (J “narrati- vas problemas” aparecem cle novo na literaturs mitica e novelas con- temporaneas, melhor formatadas em narrativas do que em proposi GOs logicas coerentes. Parece evidente, entin, que esta habilidade de construir € compreender narrativas € crucial para construicmos ‘nossas vidas e um “lugar” para nés mesmos no mundo que possivel- ‘mente encontraremos. Relevancia da Arte/Educacéo Para a maioria das pessoas, 0 termo imaginagdo “conota criati- vidade anistica, fantasia, descoberta cientifica, invenco e ni de’, tendo pouca ou nenhuma correspondéncia com o mundo das ‘ovonréuciay comuns. Tais crengas sio remanescéncias do Romantis- mo do século XIX, Johnson tentou explicar que as imagens esque- miticas, a’metifora e a narrativa operam como componentes da cogniao imaginativa por meio de toda a escala da cognigao huma- ra e, como tal, nio sio limitadas &s artes. la- Mas desde que coloca a imaginagao como componente quintessencial das mais altas formas de cognicao, inclusive a raz30 abstrata, isso tem inequivocas implicagées para a atte, como espaco em que saltos metaféricos de imaginaca0 sio valorizados por seu poder € exceléncia estética, Além disso, na are, a experiéncia, a natureza € a estrutura da imaginagio deveriam tornar-se o principal objeto de estudo. Isso acontece nas atividades em que individuos criam trabalhos de arte, e a imaginagio desempenha um papel na interpretagao desses trabalhos. Aprofundar 0 campo da imaginacio € do papel que pode ter na criagio de significados pessoais e na transmissao da cultura toma-se 0 ponto e 0 propésito para se tet artes na educa¢ao, Estabelecer um lugar para as artes nao significa apego as fran- * jas ornamentais do conhecimento nem abandonc dos duros fatos da a anne 0034 realidade. Antes que a metifora possa tomar-se ativa na mente do aprendiz — como uma metafora! — ele ou ela deve entender a realidade subliminar ou © contexto em que a natureza metaférica da imagem ou da expresso é ativa. Permitam-me enfatizar, mais uma vez, que a arte é o lugar em que os construgdes da imaginagio deveriam tornar-se o principal objeto de estudo. A imaginagio é necesséria para entender que a imagem visual ou a expressao verbal ndo sto literais, mas sim incor- poragdes de significados a serem percebidos de outra perspectiva. & somente na arte que a imaginacao € encontrada e explorada em completa consciéncia —, em que esta se torna o objeto do inquitimento, Ciéncias, € como se a imaginagio estivesse escondida. Entender a metéfora como estratégia ornamental da imagina- do € de secundaria importancia. Proponho que o aprendiz com- preenda a metifora, nos trabalhos de Arte, relacionada ao papel que desempenha na construgio do mundo — dando-lhe esse significa- clo. Uma Arte/Educagio que deixe de reconhecer o cariter metaf6- rico do significado na arte nao tem sério propdsito educativo, Implicagdes para a educagio em geral Para a maioria dos estudantes, a escolarizagio ocorre dentro de lum curriculo em que © conhecimento é experencizdo como uma série de fatos selecionados e isolados. Essa compartimentalizaglo do curriculo reflete a longa tradigao da filosofia ocidental, tendo ‘como conseqiiéncia a divisio mente/corpo. De um lado, a proprie~ dade da cogni¢&o, a provincia da raz, da conceitualizagao, da logica € do discurso formal proposicional. De outro, a natureza compérea, perceptual, matérica, emocional e imaginativa. Segundo Johnson, 1987: XV: A conseqiiéncia mais significativa dessa divisto € que toxlo significa- do, conexio W6gica, conceitualizagao 'racionalizaga0 estio alinha- dos com 0 mental ou com a dimensio racional, enquanto percepcio, imaginaclo € sentimentos est2o alinhados com a dimensio corpérea. Como resultado, as formas nio-proposicionais e figurativas de expe- arveeoucagio cnseonien Py riéncia sto vistas como nao tendo lugar no significado e no esbovo de inferéncias racionais, Essas polaridades tém se autotrans‘ormado em estruturas da consciéncia. Se pensar € cognitivo, entio seu contrario, sentir, € mio-cognitivo. Se cogni¢ao envolve 0 uso de simbolos verbais’e matematicos na construgio da racionalidede ou de proposigées for- ‘mais, entdo as imagens perceptivas sao tides como nao-proposicionais €, portanto, nao-cognitiva. Essas dicotomias relegam metade da vida mental a0 dominio do afeto, Portanto, essa estrutura de crenca tem-se tomado a estrutura do curriculo, A Ciéncia € colocada no deminio cognitive, enquanto as artes sto despachadas para 0 domfnio dos sentimentos e das ‘emogoes. Com certeza, as artes foram altamente valorizadas como fonte de recursos de encantamento, maravilhamento, delicadeza, como emblema de embelezamento (0 glacé do bolo), mas raramen- te sto consideradas fontes ativas de percepgdes, de conhecimento ou de compreensio. A educagio deveria ter como propésito funda- mental a potencializagio da capacicade cognitiva nos individuos pelo do uso da imaginagio — em todas as disciplinas, principal- mente em arte, A Ante é educacionalmente importante porque equipa indivi

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