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MUSCULO Marcio M. Machado = Renato A. Sernik = Ana Claudia Ferreira Rosa INTRODUCAO ‘A ultrssonografia, como _método diagnéstico, apresenta importante papel na avaliagdo das lesdes musculares, possii- tando um exame dindmico da regio envoWida, definindo a presenga ou auséncia de ruptura, sea fascial ou muscular, suas Principas caracteristicas ecogrticas, dimenséo e extensso para estrutura adjacentes. Sua vantagem em relagdo a outros métodos de imagem reside no fato de ser um exame seguro, de execusa0 relativamenterépida, de baxo custo, ndoinvasivo, com pouco desconforto e dor para o paciente. Auxia, tam bém, no manejo das lesOes musculares extensas, servindo como guia nas pungées dos hematomas ANATOMIA (Os misculos so, ndvidualmente, a maior massa de tecdo corpo- ral, cortespandendo a 4045% do peso do indivduo,? podendo se dvidos segundo sua estrutura carciac, soe esqueltico.ou voluntfio) (Gardner etal, 1967), agd0(p. ex, adutox), localiza- 0 (pec, supaespina), forma (p. ex, detode), orgemyinser ‘ol. ex, estenodeidomastoideo), nimero de dvisbes (0.x, 3 ‘cabecas no triceps braquial) e dregao de suas fbras (p. ex. trans- verso do abdome) (Jacob et al, 1990; Gray etal, 1968) ‘A unidade bésica do misculo é a miofibria, Os misculos voluntiies, abjeto de nosso interese, apresentam aspecto es: ttiado ac exame microscépico, aternando bandas transversas cdaraseescuras. As miofiblas formam as fbras musculares, que se dividem em: a) fbras de contracaolenta ou tipo I (fibras ver- melhas),ricas em oxigénio.>presentes em maior porcentagern 10s miscuos posturas, mais profundos; b)fibras de contra 0 répida ou tipo I (fibras brancas) de metaboismo anaerSb- ©, locaizadas em masculos mais superidas, dos membros inferires, estando subdiviidas em 3 tipos (A, 8 e C). Tanto as fibrastipo | quanto as tip Ilse recnem para formar os fasiculos que, por sua vez, derBo origem ao miscuo. ais elementos, chamados de elasticos, so sustentados enutridos por estutu- ra inelsticas compostas por tecdos de conexao e por fésces, formando verdadeiras bainhas. Assim, envolendo cada fbra muscular, terse 0 endomiso, que consiste em uma extensa rede de tecido conjuntve ede caplres,Crcundando os facicu los, visualizase o perimisio (sept fibroadiposo), do qual azem parte vasos sanguineos, ners, tecdo adiposo e uma delgada lamina de fbr elstcas e de coligeno, 0 perimsio também retne os fasccuos em grupos maiores,formando septs fibro $05 através do misculo. Extenamente, 0 epimisio, composto or tec conjuntivo denso, separa cada ventre muscular, e em muitos casos misculosdstints, estando recoberto pela féscia, que encerra o mascule como um todo (Gray et al, 1986; Jacob etal, 1990, De Lee etal, 1994; Forage, 1995; Reid, 1992; Van Holsbeeck etal, 2001) (ig. 7-1) Cada misculo & composto por pelo mencs um ventre, que presenta uma origem e uma insercdo. A orger é a exremidade mai fia e proxiral, servindo como base para a ago do moxie to, que pode ser feitadetamente ou através de um tendo ou ‘aponeurase, no 0s50 ou no tecdo conjuntvo denso. A inserca0, dada também por um tendo ou aponeutose, corresponde & par- te mais mével e distal da uridade miotendines, onde sS0 produzk- os 0s efeitos da contragdo muscular. Tanto a oigem quanto a insergao estao em continuidade com 0 endomisio,o perimisio € 0 epimiso. A fxagso do tendo no osso 6 denominada de entse, dliida em 2 tpos: rosa e cartlaginosa, A entese fbrosa se fra no interior do periésteo, sendo encontrada nas metafisese diises dos 05505 (Benjamin et al, 1996). A entese fibrocrtlaginosa € ‘composta por uma porGBo no mineraizade, continua 20 tend por outra mineralizad, que se fxa no osso. Sua principal fungao 6 a de promover uma transcao gradual de ura estrutura flv (tend) para uma rigda (0380), controlando a incinago ds bras tendineas e a distbuigao de forcas no osso durante a contragao muscular (Kraushaar et al, 1999). Eta, também, mudangas a area de seeqdotransversa de suainsercdo, durante o alongamento do tendo (Benjamin et al, 1998), Espacialmente, os fasciculos apresentam disposicao varié- vel, estando relacionada com a forga, resistencia € 0 tipo de movimento do miisculo (De Lee et al, 1994, Van Holsbeeck et al, 2001). A maiovia dos misculos apresenta os fasciculos paralelos a uma linha de tragio, orientada da origem a inser G80, Musculos com essa disposigo podem ser quadriliteros (plancs e curtos), em fita (planos e longos) ou fusiformes. As fibras também podem exibir uma orientagdo obliqua em rela- {G0 8 linha de tracio, frequentemente conectadas a um ten- do central, em umn arranjo em forma de pena, sendo subdiv didos em: a) unipeniforme — de apenas um lado do tendao; ) bipeniforme - ern ambos os lados do tendo; c) multipent. formes e circumpeniformes - quando se dirigem para varios tendées, num feixe complexo (Fig. 7-2). Erm outra forma menos comum de arranjo dos feixes musculares, as fibras con verge de uma érea ampla para um tendo comum estreito, ‘camo no caso do muisculo temporal (Jacob et al, 1990; Gray et al, 1988), ‘A unidade musculotendinea pode cruzar uma, duas ou mais articulagoes, caracterstca importante nos mecanismos de lesio. Os misculos que cruzam apenas uma articulagao, como séleo, localizarse unto a0 0550, S80 amplos,largos e planos. Apresentam baixa velocidade de contracao, gerando ppouca tensio, estando envolvidos princpalmente em ativida- des tOnica ou postural. Diferentemente, os que cruzam duas (ou mais articulagdes estdo dispostos mais superficalmente, ppossuindo maior velocidade de contracio € capacidade de Variagdo de comprimento. 467 468 | CAPITULO 7 Epimisio CULO Endomisio Fig. 71. Ikstragio mestand anatomia muscular Em relagao & maneira como os mii xistem aqueles que contribuem para a execucao de determi 0, realizando ¢or iment nado moviment ha redugo do con culagio e no controle da fase de des: Uslizando como crite lar, aveloc Pond da fi racio concéntr fa muscular. © comprimento da fibra muscu rago.e a cargaimposta Pers Fascioulo. ulos podem atuar, muscular pode ainda ser di 2002): |someétrica: na qual o comprimen altera ontragao & constante ragao excénttica e omprimento © conhecimento dessas caracterstcas seré importante ara a compreen: nismos fisiopatol dos nas lesdes musculares que s capitulo, TECNICA O equipamento ¢ e ultrassonogratia deve di de transduto alta resolugao com frequéncia variavel (de 5,0 a MHz). Rupturas em planos mais profundos ou em pacien: tes obesos requerem transdutores de menor frequéncia, com 1 2 a avaliacao de lesoes, $e utlizar um coxim de pele que, além de per: mitir melhor resolucdo espacial, corige evertuais ondulacoes € iregularidades em regides préximas de articlagdes ou de ficies Osseas. Para a realize confortavelmer acordo com a 30 do exame, 0 paciente é posicionado fe em dectibito dorsal, v gido de interesse. Executa-se uma var fem maitiplos planos, alia n em diferentes estados repouso e em contracao isomét x pois pode mascarar alguns tipos de leso, princ: palmente pequenos hematomas. A angulaco também é fator determinante, dev itase a compressao Ce Fig. 73. (A eB) Anatomia utvassonografica, TECNICA | 469 superficie do misculo. A comparacao com o membro conta: lateral é recomendavel, embora a simetria muscular nao sel uma regra. © aspecto ultrassonogratico dos misculos é caracteristico, (0s elementos eldstcos aparecem como estruturas hipoecoicas. 5 inelésticos mostrarnse hiperecoicos. Dos inelésticos, apenas ‘endomisio nao é visbilzado a ultrassonografia,impossbiltan- do, portanto, a individualizagio de cada fibra muscular. O perk 'misio, ou septo fibroadiposo, é observado em corte longitudinal ‘como miitiplas imagens lineares hiperecoicas, paralelas entre si separando 0s fasciculos, cujaorientagao sera variével de acordo com a arquitetura do misculo em estudo, Em corte transversal, (0 septos fibroadiposos se mostram como mitiplas linha irre gulares hiperecoicas, de tamanhos variados. 14 0 epimisio € visto como uma linha hiperecoica externamente, paralela a0 maior exo muscular, semelhante a féscia (Fig. 73), Armadithas podem ser encontradas, especialmente du: rante 0 exame dindmico. Na contragSo isométrica, os fascicu los musculares se espessam e mudam de orientacéo, reduzin: do sua ecogenicidade (Fig. 7-4). Outra armadilha possivel refe- rese ao artefato de anisotropia, presente, principalmente, em individuos com muita massa muscular ou com subcuténeo escasso (Fig. 7-5). Fig. 74. Estado dindmico do misculo. (A) Repouso. (B) Contagia lev, (© Contragdovigorosa. Obserar a heeragenedade da ecotertura ‘ssocada Jo aumento das cimensses do musculo com contrasso vigorosa, 470 caPITULO 7 = MUSCULO Fig. 7-5. Efeto de ansotrana (A) secundio a indinagao do vansdutor,determinando hiperecogencidade ifusa do masculo assocada 8 are0 hipoecoica em seu interior (eta), smulando ruptua, Em (B) mesmo rs perpendicularmente a 250 DOENGAS MUSCULARES Diferentes doenas musculares podem ser avaliadas pelos méto- dos de imagem (traumatica,inflamatéria, infecciosa, tumoral, clstrOfica isquémica ou por desnervacdo),identifcadas ao exa ‘me ultrassonografico por alteracSes na arquitetura, na ecogeni- cidade ou no tamanho do misculo. O aumento da ecogenicida de é 0 achado mais frequente, sendo, entretanto, inespecifco, ccomum a varias condigGes, que serdo descrtas a seguir Desnervacao/atrofia A desnervagio pode ter viras causa, relacionadas a doencas do sistema nervoso central (p. ex, doengas desmielrizantes) cu perifrico, acarretando dor e fraqueza muscular. ‘Aressondncia magnética € 0 método de imagem mais ser sivel para detectar as prmeirasaterages,geralmente apés 2 a 3 semanas do insulto neural, identifcadas por hipersinal em T2 do misculo (Fig. 7-6), Na fase crbnica, caracterizada por subst ‘uigdo gordurosa na intimidade do miiscul, tanto a ressondn Ga magnética quanto a uitrassonografia sao capazes de fazer 0 diagnéstico (Fig. 7-6). € importante ressatar que exstem outras ‘ausas, além da desnervacso, que podem levar, também, & atrofia, como as rupturas tendineas/musculares, 0 desuso @ as ‘de aspecto normal, onde o fie lassie inci doengas musculares primérias, sendo essencial o conhecimento da historia cnica do paciente (Fig. 77) Na ultrassonografia,inidalmente observase uma hipere cogenicidade heterogénea, conferindo um aspecto moteado dentro do misculo supride por determinado nervo periérico. Se houver um tendo intramuscular, como no supraespinal, seus limites tornamse borrados. Esses achados geralmente 0 acompanhados por diminuiga0 na definigao da cortical ds 22, sem, no entanto, interferirem sua somibra acistca, que & preservada mesmo nos estgios fina de substituico gorduro- a. Progressivamente, ha aumento da ecogenicidade do mis culo, com redugao de sua espessura e perda da diferenciacao entre os elementos inelasticos. ‘Aumento paradoxal do volume muscular, decorrente de uma pseudoripertrofia ou de uma hipertrofia verdadeira, tem sido descrito em raros casos (Swartz et a, 2002; De Beuckeleer et al, 1999; Petersige et al, 1995; Drazdowski et al, 1994; Mattle et al, 191; Pareyson et al, 1989; de Visser etal, 1986; Mielke et al, 1982). Na pseudchipertrofia, identificase acimu: lode gordura e de tecido conectiva intramuscular. Na hipertro- fia verdadeira, fibras musculares sinérgicas, que permanecem inervadas, aumentam de tamanho, DOENGAS MUSCULARES | 471 Fig. 746, Desnervagio. (A) Subaguda, decorete d ‘doen fibular corum. Os masculos dos compartment lateral apresertam alto sinal em 2 (etas continues). (8) ren Secunda lesa do revo ciico por ferimenta por arma def eno cidteo esquer co (Seas continua) 5 ventresm ram hiperecoicos, com dimensées reduzdas (***) tanto na irassonogratia quanto na ressoninc magnétca. Comparar com o contralateral normal. Seta ‘raced = vajeto do prot na face posteror da coxa, Pee) Ca Fig. 77. (AB) Atofa do ventre muscular da abeca longa do bce 473 DOENGAS MUSCULARES Pod braquial(*) lacionada com ls tendinea, que se mostra preenchida por liquide. A hiperecogenicidade 6 to intensa que impossibiltaadstingSa dos seposfbroadiposos entre sie com a propria éscia muscular, tlo = Tendo da cabesa langa do biceps brani Pés-exercicio CO exercicio provoca uma série de reages metabslicas naintim- dade do misculo,levando & produgao de lactato, provocando aumento da osmolaridade local. Nos exercicios moderados, ‘acumulase somente gua extracelular, J4 nos esforcos exage- rados, hd aumento tanto da 4gua intracelular quanto da extra- celular (Fajadet eta, 2003). A cistribuigao da Sgua intra/extra celular seria mais relevante que o aumento do fluxo sanguineo pparenquimatoso (Sjogaard etal, 1985; Fleckenstein et a, 1988; Shellock et a,, 1991) pela hiperecogenicidade (Reimers et al, .995) e pelo hipersinal difuso em T2 do misculo pésexercicio, Fig. 78). Miosites As alteracées inflamatérias dos musculos apresentam um ppadrao semelhante ao exame ultrassonografico, apesar das vé- Fias causas possiveis como: infeccdo, vasculites, trauma, doen- 2s autoimunes e paraneoplasicas (Reimers et a, 1996). Au: mento da espessura e da ecogenicidade do misculo, perda da arquitetura habitual associada a hiperfluxo a0 Doppler colorido $80 05 achados principais (Teh, 2005). 0 Doppler colorido, sm de auxilar na escolha do methor local para arealzaco das biopsias, também tem importancia na diferenciagao entre as colesGes inflamatdrias e nao inflamatérias (Fig. 79). Dor muscular de inicio tardio A dor muscular de inico tardio é uma condigao bastante mum, com inido dos sintomas 12-24 horas apds 0 exercico, 1m pico em 24:72 horas, associada a elevacao das enzimas ares (creatinaquinase), Nao ha historia de trauma, A dor rre de uma carga excessiva de trabalho em um muasculo nao habituado ao exerccio, piorando com a contragao excén- (Armstrong, 1984; Newham, 1983; Zebatakis, 1986). Tal éverificada em individuos sedentarios que niciam at es esportivas ou mesmo em atletas profissionais, quando condi © treino & intensificado apés uma les8o (Robinson, 2005). Ao lexame microscépico, hé ruptura de miofibilas na juncao mio- ‘endinea, entretanto, o mecanismo fisionatolégico ainda no esta claro, Geralmente os sintomas desaparecem em 1 sema: 1a, sem tratamento especific, © exame ultrassonogréfico pode ser normal. Nessas

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