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Codigo de Processo Civil Anotado Vol. PARTE GERAL E PROCESSO DE DECLARAGAO Artigos 12a 7022 2018 Anténio Santos Abrantes Geraldes Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiga Paulo Pimenta Advogado e Professor Universitario Luis Filipe Pires de Sousa Juiz Desembargador do Tribunal da Relacao de Lisboa ALMEDINA DAS DISPOSIGOES E DOS PRINCIPIOS FUNDAMENTAIS ART. * Pays-Bas). O TEDH considerou compativel com o principio da igualdade de armas uma disposicao que limita as possibilidades de recurso da parte civel, sem limitar as possibilidades de recurso do Ministério Puiblico, com fundamento na distingo dos respetivos papéis ¢ objetivos (Ac. Berger c. France). 6. Sobre o principio da igualdade cf. Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, vol. 1, 2? ed., pp. 109 e ss., e Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo, 2! ed., pp. 27 € 28. Na ética constitucional, cf. Jorge Miranda, Direitos Fundamentais, pp. 287-325. ARTIGO 52 Gnus de alegacao das partes e poderes de cognicao do tribunal 1- As partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pe- dir e aqueles em que se baseiam as excegdes invocadas. 2. Além dos factos articulados pelas partes, sio ainda considerados pelo juiz: a) Os factos instrumentais que resultem da instrugao da causa; b) Os factos que sejam complemento ou concretizagio dos que as partes hajam alegado e resultem da instrugao da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; ¢c) Os factos notérios ¢ aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercicio das suas funcées. 3 O juiz nao esté sujeito as alegagées das partes no tocante a indagagio, interpretacao e aplicagdo das regras de direito. Remissé rt. 186°, n® 2, al. a) (falta de causa de pedir); art. 5522, n? 1, al. d) (petigao; causa de pedir; factos essenciais); art. 5728, al. c) (contestagio; defesa por excegio; factos essenciais); art. $742, n® 2 (admissio de factos instrumentais), art. 581°, n° 4 (causa de pedir); . 590", n® 1 (gestdo inicial do proceso); art. $902, n® 4 (despacho de aperfeigoamento): art, $91°,n? 1, al. c) (insuficiéncias da matéria de facto); art. 607° (sentenca: factos essenciai complementares ou coneretizadores; factos instrumentais). 1. Nao basta a invocagio de um determinado direito subjetivo e a formulagio da vontade de obter do tribunal determinada forma de tutela jurisdicional (cf. anot. ao art, 3°), To importante quanto isso é a alegacao da relacao material de onde o autor faz derivar o correspondente direito e, dentro dessa relacao material, a alegacio dos factos constitutivos desse direito. Na verdade, na prépria definicao, a causa de pedir éentendida como o “facto juridico de que procede a pretenséo deduzida” (art. 581°, n° 4), cumprindo ao autor, que invoca a titularidade de um direito, fazer a alegacdo dos factos de cuja prova seja possivel concluir pela existéncia desse direito. 2. No art. 581°, o legislador fez uma opgio clara entre dois sistemas possiveis: 0 da individualizacao ou o da substanciagio da causa de pedir. Ao primeiro bastaria a 23 ART.5* — LIVROI~TITULOT indicagio do pedido, devendo a sentenga esgotar todas as possiveis causas de pedir da situagio juridica configurada pelo autor, impedindo-se, apés a sentenga, a alega- do de factos anteriores que, porventura, nao tivessem sido alegados ou apreciados. Jé.a opcio pela teoria da substanciagao implica para o autor a necessidade de arti- cular os factos dos quais deriva a sua pretensio, formando-se 0 objeto do processo ¢, por arrastamento, 0 caso julgado apenas sobre os factos integradores dessa concreta causa de pedir. Foi esta a opgio do legislador e, assim, 0 preenchimento da causa de pedir, independentemente da qualificagao juridica apresentada, supde a alega- ao do conjunto de factos essenciais que se inserem na previsio abstrata da nor- ma ou normas juridicas definidoras do direito cuja tutela jurisdicional se pretende. ‘A causa de pedir, servindo de suporte ao pedido, ¢ integrada pelos factos (por todos 08 factos) de cuja verificagao depende o reconhecimento da pretens4o deduzida, ‘hos termos dos arts. 5®, n® 1, e 552°, n® Lal. d), nao devendo confundir-se coma valo- racdo juridica atribuida pelo autor, a qual, de todo o modo, nao é vinculativa para o tribunal, devido ao principio da oficiosidade consagrado a esse respeito no n° 3. 3. Assumida a necessidade de alegacao da matéria de facto constitutiva do di reito invocado pelo autor de cuja prova seja posstvel inferir a procedéncia da agao, nem por isso fica facilitada a execugao pratica desta tarefa, até pela constatagio, frequentemente referida pelos autores que abordam a questao da metodologia na aplicacao do direito ou, mais concretamente, que se debrugam sobre o direito ad- jetivo, de que nao se torna ficil (ou possivel) estabelecer uma cisio perfeita entre questées de facto e questoes de direito. Em geral, os factos alegados ja indiciam, como € natural, uma determinada solugao juridica que 0 autor pretendera que faga vencimento no proceso, ou seja, ja vém carregados de alguma juridicidade, envol- vendo um determinado compromisso ou um pré-entendimento relativamente 20 direito aplicavel. Como refere Castanheira Neves (“Matéria de facto-matéria de di- reito”, RL] 129%, p. 164), “o direito aplicavel nao pode deixar de ser selecionado, determinado e reconstituido em fungi das exigéncias problematico-concretas do caso a decidir”. Dai que, mais do que encontrar um critério universal que estabelega a distingéo entre estes dois campos, o referido autor chama a atengao para as “ques- toes mistas”, propugnando uma distingao casuistica consoante as necessidades de resolugao dos problemas que em concreto se suscitam no ambito dos processos (p. 163). As mesmas dificuldades foram apontadas por Antunes Varela (RLJ 129°, p- 209), afirmando que “facto e direito sao, na verdade, elementos que continua- mente se interpenetram e que reciprocamente se influenciam em diversos pontos do percurso da ago civel, seja na selegao dos factos juridicamente relevantes, seja na qualificacao juridica dos factos verificados, seja na complexa elaborago Idgico- -emocional da decisao final da causa”. 4, Persiste naturalmente a distingao entre o que constitui matéria de facto matéria de direito (sobre a distingio e sobre o modo como essa distingao deve ser interpretada face ao atual CPC, cf. Abrantes Geraldes, Recursos no NCPC, 5* ed., on 4 ) 4 asorastan camatiranmancneicwini DAS DISPOSIGOES E DOS PRINGIPIOS FUNDAMENTAIS ART. s* pp. 597 ess.). Ao que, em concreto, seja de qualificar como matéria de direito apli- ca-se a regta do n® 3, que demanda a oficiosidade do seu conhecimento (desde que 9s factos tenham sido oportunamente alegados ou possam ser considerados), sem embargo do principio do contraditério imposto pelo art. 3°, n® 3, com vista a obstar 4 prolagio de decisdes-surpresa. 5. Opreceituado no n° 3, associado & eliminagao no atual CPC do que se previa non’ 4 do art. 6462 do CPC de 1961 (que considerava “nao escritas as respostas do tribunal coletivo sobre questées de direito”), implica que deva ser moderada a ideia tradicionalmente arreigada, posto que formalmente excessiva, de se estabelecer uma rigida delimitagao entre o que constitui matéria de facto e matéria de direito (cf. anot. ao art. 607? e Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, vol. I, 4? ed., pp. 238 € ss., ¢ Recursos cit,, pp. 613-615. 6. Assim, se em muitos casos ¢ possivel tomar uma afirmacao como feita clara- mente no campo da matéria de direito (vg. mé 8, abuso de direito, diligéncia do bom pai de familia, culpa, imprevidéncia, inconsiderag4o) ou no campo da maté- ria de facto (vg. terreno, edificio, arvore, carta postal), nao raras vezes se suscitam dtividas quanto ao estabelecimento da linha de demarcagéo entre os dois campos argumentativos, em virtude do uso de expressdes que tém simultaneamente um sentido téenico-juridico, do qual o legislador retira determinados efeitos, e um significado vulgar e corrente facilmente captado pelas pessoas comuns (».g. arten- damento, renda, inquilino, héspede, proprietario, possuidor, prego, lucro, emprés- timo, consentimento, etc.). Neste contexto, sem dogmatismos que j4 nem sequer encontravam apoio numa norma como a don? 4 do art. 646* do CPC de 1961 (que no transitou para CPC de 2013) e tendo em consideragio o modo como em si- multineo na sentenga final serio abordadas as questées de facto ¢ as questdes de direito, podemos jé antecipar que a inclusio daquelas expresses numa ou noutra das categorias dependerd fundamentalmente do objeto da aco. Se este, no todo “pirein parte, estiver precisamente dependente do significado real daquelas expres- ses, tem de considerar-se que estamos perante matéria de direito, pois o signifi- cado a atribuir-lhes sera determinante para o desfecho da causa. Se, pelo contrario, 0 objeto da agao nao estiver diretamente associado ao significado a conferir a certas afirmagées das partes, as expressdes assim utilizadas (arrendamento, renda, hés- pede, outras de cariz semelhante) poderao ser tomadas no ambito da matéria de facto, sendo passiveis de apuramento por via da prova e de promincia em sede de julgamento, sempre encaradas com o significado vulgar e corrente, nao j4 com 0 sentido técnico-juridico que possa colher-se nos textos legais (a propdsito, cf. Paulo Pimenta, A Fase do Saneamento do Processo antes e apds a Vigénvia do Novo CPC, Pp: 306-308, e Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, vol. 1, 2* ed., pp. 196-197; cf. ainda anot. mais desenvolvidas aos arts. 1862, 552° e 607°). 7. O CPC de 2013 implica um maior esforgo de sintetizagio dos articulados, centrando a alegacao nos factos cuja prova seja imprescindivel para a integragao do 25 ART. 5" LIVROI~TITULOI direito ou das excegGes, sem a tradicional e excessiva descrigio de todos os porme- nores circunstanciais ou instrumentais. Nessa medida, nao est sequer afastado 0 recurso a expressdes de contetido mais genérico ou até conclusivo, desde que per- mitam percecionar a realidade que se pretende invocar e possam ser posteriormente objeto de uma maior concretizagio na sentenga. Por conseguinte, nao devem ser formalmente recusadas alegages que, embora reproduzindo termos que integram certa vertente juridica, sejam de uso corrente e permitam compreender facilmente o seu alcance, tanto mais que sempre existird a possibilidade de serem desdobradas na sentenga de modo a que seja conseguida uma melhor concretizagio da realidade subjacente ao litigio. Ponto é que a alegagio se apresente de molde a que seja subs- tancialmente acautelado 0 exercicio do contraditério e possa ficar circunscrita a realidade que ser objeto de apreciagio jurisdicional, para efeitos de delimitagio objetiva do caso julgado material (sobre a mateéria, cf. Abrantes Geraldes, Recursos -» pp. 599 € ss. € anot. aos arts. 552° e 607°). 8. Cf. ainda a reflexao de Teixeira de Sousa, em https//blogippe.blogspot.pt, & mar- gem de STJ 28-9-17, 809/10, apontando para um critério bem diverso daquele que vem sendo assumido em determinada jurisprudéncia, mesmo em arestos jé profe- ridos no ambito do atual CPC, rematando 0 comentario a esse aresto de um modo que é bem elucidativo da necessidade de se operar uma reflexao sobre a matéria: “a referida «proibicdo dos factos conclusivos» também nao corresponde as modernas correntes metodoldgicas na Ciéncia do Direito, que nfo se cansam de referir que a distingio entre a matéria de facto e a matéria de direito ¢ totalmente artificial, dado que, para o direito, apenas sao relevantes os factos que o direito qualificar como factos juridicos, Para o direito, nao hé factos, mas apenas factos juridicos, tal como, para a fisica ou a biologia, nao hé factos, mas somente factos fisicos ou biolégicos. Os factos sio sempre um Konstrukt, pelo que os factos juridicos sio aqueles factos que sao construidos pelo direito. Em conclusio: o objeto da prova nao pode deixar de ser um facto juridico, com todas as caracteristicas descritivas, qualitativas, quan- titativas ou valorativas desse facto”. 9. No que concere & alegacao e atendibilidade da matéria de facto, o regime atual pode condensar-se da forma seguinte: 4) Napeticao inicial, o autor tem o dnus de expor os factos essenciais que cons- tituem a causa de pedir; b) Na contestagio, 0 réu di cto por que se opde a tensio do autor e alegar os factos essenciais em que se basciam eventuais eececbes eee 7 ) Aréplica, que sé existe quando haja reconvencio ¢ nas ages de simples apre- ciagdo negativa, serve para 0 autor se defender do alegado pelo réu quanto a essa matéria (ainda que também possa ser aproveitada para responder & matéria das exceges invocadas pelo réu, apesar de o art. 584° nao se mostrar completamente explicito a este respeito); e- DAS DISPOSIGOES E DOS PRINCIPIOS FUNDAMENTAIS ART. §¢ d) Qualquer das partes pode trazer ao processo, nos termos regulados no art. 588°, os factos objetiva ou subjetivamente supervenientes; ¢) Na fase intermédia do processo, se nao houver motivo para considerar que a petigao é inepta, por falta ou ininteligibilidade da causa de pedir, mas esta padecer de insuficiéncias ou imprecisées na exposi¢io ou concretizagio da matéria de facto alegada, 0 juiz deve convidar o autor a aperfeigoar o seu articulado, aplicando-se critério semelhante a contestagio relativamente as excegbes deduzidas (art. $902, n’® 4); f) Na audiéncia prévia, de modo espontineo ou mediante solicitagao do juiz, as partes tém ainda a possibilidade de suprir as insuficiéncias ou imprecisoes da matéria de facto que subsistam ou se tornem patentes na sequéncia do debate (art. 591°, n? 1, al. c)); © Na sentenga, no segmento em que se pronuncia sobre os factos provados ¢ no provados (para além de integrar os factos notérios ou que tenham sido revelados ao tribunal por forca do exercicio das suas fungées), 0 juiz deve ponderar, mesmo oficiosamente, os factos complementares (constitutivos ito ou integrantes da excegao, embora nao identificadores dos mes- 108) € 0s factos concretizadores de anteriores afirmagoes de pei genérico que tenham sido feitas, acautelando substancialmente o do contraditério (arts. 607%, n®s'3 a5, e 5°, n® 2, al. b)); ‘h) Na enunciagao da matéria de facto na sentenga, sem embargo da atendibili- dade da prova plena que resulte dos autos, 0 juiz deve verter o que emergir da apreciagao livre ¢ critica dos demais elementos probatérios ¢ usar, se for 0 caso, as presung6es judiciais que as circunsténcias justificarem, designada- mente a partir dos factos instrumentais (arts. 607%, n? 4, ¢ 5°, n®2, al. a)). 10. E inepta a petigéo que nao contenha os factos que constituem a causa de pedir (art. 1868, n®2, al. a), o que implica uma distincao entre os factos que identifi- cam ou individualizam o direito em causa (0s factos essen cleares) ¢ aqueles que, nao desempenhando tal fungéo, se revelam, contudo, emer para que ago proceda, por também serem constitutivos do direito invocado (factos essen-_ ciais complementares). A falta destes tltimos revelaré uma peticao deficiente ou insuficiente, a carecer de convite ao aperfeigoamento que permita suprir as falhas da exposicao ou da concretizacao da matéria de facto (cf. Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, vol. I, 28 ed., pp. 207 e ss., Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo, 28 ed., pp. 155-156 € 239-241, e ST] 26-3-15, 6500/07), sem embargo da sua atendibilidade na audiéncia prévia ou da sua inserg&o na sentenga quando resultantes da instrucao da causa (cf. anot. desenvolvida aos arts. 186" ¢ 552). IL. A distingio torna-se inequivoca, por exemplo, em face do direito de indem- nizagao fundado em responsabilidade civil extracontratual (causa de pedir com- plexa): nem todos os factos respeitantes a cada um dos pressupostos normativos ae ilicitude, culpa, culpa presumida ou risco, danos e nexo de causalidade) 2” ART.5* LIVROI-TITULOI apresentam 0 mesmo relevo, de tal modo que, sem embargo da opgao pelo esgota- mento da alegacio de todos esses factos na petigio inicial, esta ultrapassar4 o filtro da ineptidao quando tiverem sido alegados aqueles que individualizam a origem do direito de indemnizacio, sem embargo da insergio posterior dos demais que, em ‘Face do caso concreto, se revelem complementares ou concretizadores, seja por via da resposta a um despacho de aperfeigoamento, seja em sede de audiéncia prévia, seja, enfim, através da sua recolha em fungao do que resultar da instrucao da causa (sobre as categorias que os factos essenciais encerram e com exemplos, cf. Paulo Pimenta, ob. cit, pp. 22-23). 12. Oque se referiu quanto a petigao é aplicavel, mutatis mutandis, & contestagao, inscreva esta ou nao um pedido reconvencional. Especificamente quanto matéria de excegao, o énus de alegacao implica, no minimo, a invocagao dos factos em que se baseiam as excegbes ({sto é, os factos que individualizam as excegbes), sem pre- “julizo do posterior aperfeigoamento integrativo ou até da consideracio oficiosa de determinados factos que, exercendo uma fungéo complementar ou concretizadora de outros que tenham sido alegados, resultem da instrugao da causa (cf. Paulo Pi- menta, 0b. cit., p. 241). 13. Os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excegdes (isto é, todos os factos de que depende o reconhecimento das pretens6es deduzidas) devem ser vertidos nos articulados das partes, a isso respei- tando o énus de alegagio imposto pelo n? J, No entanto, a eventual incompletude no cumprimento desse dnus relativamente a factos complementares ou conere- tizadores dos i legadc tem efeitos preclusivos, jd que os factos ‘omitidos podem ainda ser introduzidos nos autos, seja através de um articulado de aperfeigoamento (art. 590%, n° 4), seja em face do que resulte da instrugao (art. 5°, n®2, al. b)). 14. A consideracio dos factos complementares ou concretizadores em resul- tado da instrugdo tem agora natureza oficiosa. Se isso nao afasta a iniciativa da parte interessada, nao é exigida a sua concordancia para 0 efeito. Para Teixeira de Sousa, a solugao de prescindir da concordancia da parte “é orientada pela busca da verdade em proceso, entendendo-se que nada pode justificar que a parte possa impedir 0 tribunal de utilizar na sua atividade deciséria um facto de que o tribunal tem conhe- cimento” (https://blogippe.blogspot.pt). Os factos que sejam confessados por alguma das partes (em depoimento de parte ou em declarag6es de parte) sero obviamente considerados, tal como o devem ser os resultantes de outros meios de prova. Unica mente se exige que sobre os mesmos ou sobre a sua atendibilidade na sentenga seja exercido 0 contraditério, atento 0 disposto nos arts. 3°, n®3, ¢ 5%, n® 2, al. b) (con> tra: Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC anot., vol. I, 3! ed., p. 18, realgando 0 principio do dispositivo). Com efeito, a ndo ser que o autor desista do pedido ou da instancia ou que o réu confesse o pedido, os factos de que depender a procedéncia da agao ou da excegio hao de necessariamente interessar-lhes, nao fazendo sen- 28 DAS DISPOSIGOES E DOS PRINCIPIOS FUNDAMENTAIS ART. 5° tido desconsideré-los com fundamento na auséncia de uma posi¢ao concordante da parte a quem aproveitam, A alteragao da previsio legal aponta, alids, no sentido de a assungao dos factos complementares e concretizadores nao depender de requeri- “mento da parte interessada em deles se prevalecer (STJ 10-4-18, 16/14, STJ 1-10-15, “903/11, RP 15-9-14, 3596/12, RC 23-02-16, 2316/12). 15. No que concerne & densificacao da concessao as partes da possibilidade de se pronunciarem nos termos da al. b) do n® 2, ndo existe consenso. Ramos de Faria e Ana Luisa Loureiro, Primeiras Notas ao NCPC, vol. I, pp. 41 ¢ 521, sustentam que “para que a parte tenha a possibilidade de se pronunciar, nfo é necessirio que 0 juiz despache no sentido de The ser dada 2 palavra para o efeito’, uma vez que 0 nosso sistema processual assegura a0 mandatirio a possibilidade de formular re~ querimentos a qualquer momento. Em contraponto, pode afirmar-se como mais consentinea com os prineipios processuais e designadamente com a proibi¢ao de decisdes-surpresa a posigio que defende que o juiz deve anunciar as partes, antes do encerramento da audiéncia, que esta a equacionar utilizar esse mecanismo de _ampliagio da matéria de facto. Conforme se refere com pertinéncia em RP 30-4-15, 5800/13, “trata-se, no fundo, de salvaguardar a confianga que € necessério ter quanto ao contetido dos atos do processo e de nao impor aos mandatérios graus de dili- géncia e atengio absolutos, exigindo-Ihes que a todo o momento prevejam todas as hipdteses ¢ levem o esforgo probatério aos limites, apenas para evitar que se o tribunal vier a considerar relevantes outros factos os mesmos resultem provados ou nao provados. $é perante esse alerta se poderao imputar As partes as consequéncias do esforgo probatério que entenderam produzir e a responsabilidade por nao terem levado esse esforgo ao ponto que seria eventualmente necessirio.” Mais pacifico parece ser o entendimento de que, na eventualidade a que se reporta aquela al. b), assiste quer & parte beneficiada pelo facto, quer 4 contraparte, a faculdade de _requererem a produgio de novos meios de prova (ou a reinquirigéo de testemu- nhas) para, consoante o caso, fazer prova ou contraprova desses factos (Ramos de Faria e Ana Luisa Loureiro, ob. cit, pp. 41 ¢ 521, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC anot., vol. I, 3* ed., p. 18, e RP 30-4-15, 5800/13). 16. Quanto aos factos instrumentais (aqueles que permitem a afirmagio, por indugio, de factos de cuja prova depende 0 reconhecimento do direito ou da exce- gio), ndo se mostra imprescindivel a sua alegacao, isto é, nado ha énus de alegagao quanto aos mesmos, nao havendo também qualquer tipo preclusao, pelo que pode- rio ser livremente averiguados ¢ discutidos na audiéncia final em torno da produ- ao c valoragao dos meios de prova e em face dos temas da prova enunciados, Sobre ‘0s mesmos nao tem de existir necessariamente uma proniincia judicial, na medida em que sirvam apenas de apoio a formagio da convicgao acerca da restante factua- lidade, mdxime quando, a partir deles, se possam inferir outros factos mediante pre- sungées judiciais (arts. 607%, n® 4, 5°, n® 2, al. a)), situagdes em que basta que sejam enunciados na motivagio da sentenga (cf. anot. aos arts, 186°, 552° e 607°). ART.6* — LIVROI~TITULOI 17. Mas a aludida caracteristica da instrumentalidade abarca apenas os factos que possam servir para a formagao da convicgao sobre os demais factos (designa- damente por via do-uso de presuncoes judi), devendo distinguir-se dos que “essenciais”, devendo ser alegados em conformidade (art. 5%, n® D ¢ ser objeto de prontincia positiva ou negativa na sentenga (sobre a matéria, cf. Abrantes Geral- des, Recursos no NCPC, 4? ed., Apéndice sobre “Sentenca Civel”, pp. 601 e ss., Paulo Pimenta, ob. cit., pp. 360-361, ¢ Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, ob. cit., p. 16). 18. O principio da oficiosidade no que respeita 4 indagagio, interpretacao aplicagio das regras de direito tem como limite as quest6es cuja apreciagio dependa da iniciativa do interessado, como acontece com a caducidade reportada a di disponiveis (art. 33°, n® 1), a prescrigao (art. 3032), a anulabilidade (art. 289%, n® 1) 1) ou a compensagao (art. 8488, n® 1, do CC). Esta ainda condicionado pela necessidade de ser respeitado o contraditério, por forma a evitar decisdes-surpresa, isto é, contra a corrente do que as partes alegaram (art. 3%, n® 3). 19. Segundo 0 Ac. STJ 19-1-17, 873/10, incumbe ao tribunal proceder a qualifi- cago juridica que julgue adequada (art. 5°, n° 3) mas dentro da fronteira da factua- _lidade alegada e provada e nos limites do efeito pratico-juridico pretendido, sendo- vedado enveredar por uma medida que extravase aquele limi 20. Para maiores desenvolvimentos, cf. ainda Paulo Pimenta, “Onus de alegacao e de impugnagio das partes ¢ poderes de cogni¢ao do tribunal”, em II Coléquio de Processo Civil de Santo Tirso, pp. 89-123, e Teixeira de Sousa, “Algumas questées sobre 0 6nus de alegacao e de impugnacao em processo civil”, em Scientia Juridica, Tomo LXI, n® 332, pp. 395-412. Sobre a articulacao do art. 5%, n® 2, al. a) com o art. 574%, n® 2, designadamente sobre a impugnagao do facto instrumental versus impugnagao do facto principal correspondente, cf. Teixeira de Sousa, “A fungio dos factos ins- trumentais e a possibilidade de considerar no provado um facto essencial admitido por acordo”, em comentario ao Ac, do STJ de 28-9-17, 809/10, em https;//blogippe. blogspot.pt. ARTIGO 6° Dever de gestao processual 1- Cumpre ao juiz, sem prejuizo do énus de impulso especialmente im- posto pela lei as partes, dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligéncias necessarias ao normal prosseguimento da aco, recusando o que for impertinente ou mera- mente dilatério e, ouvidas as partes, adotando mecanismos de simplificagio ¢ agilizagdo processual que garantam a justa composi¢ao do litigio em prazo razodvel. 30

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