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REPUBLICA DE ANGOLA. TRIBUNAL SUPREMO 1" SECGAO DA CAMARA CRIMINAL PROCESSO N° 22/18 “RECURSO AO DESPACHO DO JUIZ DE TURNO QUE ORDENOU A MANUTENCAO DA MEDIDA DE COACGAO PESSOAL DE PRISAO PREVENTIVA ARBITRADA PELO MAGISTRADO DO MINISTERIO PUBLICO” RECORRENTE: JOSE FILOMENO DE SOUSA DOS SANTOS. ACORDAO ACORDAM EM CONFERENCIA EM NOME DO POVO: RELATORIO O recorrente José Filomeno de Sousa e Santos, arguido constituido no proceso crime n.° 22/ 18 que correm seus tramites legais na Direcgdo Nacional de Investigagio e Acedo Penal (DNIAP) Devidamente identificado nos referidos autos, interpés recurso do despacho do Colendo Juiz de Turno que ordenou a manutengao de prisio preventiva arbitrada pelo Magistrado do Ministério Publico junto da Direcg%io Nacional de Investigagao e Acgio Penal (DNIAP) 0 que fez nos termos do n° 5 do art? 29°, n° 2, do art? 36%, n° 1 do art? 67°, todos da Constituigao da Repiblica de Angola, do art? 645°, do n° 2 do art? 647°, do n° 6 do art? 655°, todos do Cédigo de Processo Penal combinados com os n’s 1° ¢ 4° do art® 3° da lei n® 25/15, de 18 de Setembro (Sobre as Medidas Cautelares em Processo Penal) ¢ ainda em homenagem ao principio da justiga e da recorribilidade das decisdes judiciais. Alega, como se transcreve: “Nao estando satisfeito com a medida de coacgao de pristo preventiva que the foi aplicada, impugnou-a nos termos dos n’s 1 ¢ 4° do art? 3° da lei 25/15, de 18 de Setembro, mediante requerimento dirigido ao Colendo Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Supremo, 1 solicitando a intervengao do Jutz de Turno para apreciar a legalidade da medida de coacgéo arbitrada pelo Digno Magistrado do Ministério Puiblico; Tendo sido 0 requerimento de impugnagao distribuido ao Juiz de Turno, este apreciou o pedido do recorrente e, mediante despacho, decidiu manter a prisio preventiva, alegando perigo de fuga, mesmo sem que 0 Ministério Piiblico no seu despacho que aplica a medida tenha invocado tal fundamento ou pressuposto; No caso concreto, 0 Colendo Jutz de Turno violando o seu papel de Grbitro e equidistante fundamentou a manutenc&o da prisao preventiva néio com os fundamentos apresentados pelo Digno Magistrado do Ministério Piblico, mas pelas razées “inventadas por si”, colocando- se deste modo, no lugar e ao lado do Ministério Piiblico como se ambos fossem Juizes ou como de Superior Hierdrquico do magistrado que aplicou a medida se tratasse; Que a lei das medidas cautelares, no seu n°* 2 do art’ 19° estabelece que” nenhuma medida de coaceao pessoal deve ser aplicada, havendo fundadas razées para crer na existéncia de causas de extincao da responsabilidade criminal do arguido”. Que nao tendo 0 Ministério Publico, no seu despacho, com precisdo, aclarado ou separado que crimes em concreto foram cometidos no ano de 2015 ¢ no ano de 2017, tal situagao gera diividas e na diivida deve se aplicar 0 principio in diibio pro libertati; Que 0 Colendo Juiz de Turno, no seu despacho, reconheceu que 0 Dignissimo Magistrado do Ministério Piblico nao fundamentou com factos concretos as razies que 0 levaram a aplicar a medida de coacedo de pristo preventiva e que tal falta de fundamentacéo tem como consequéncia a nulidade ou revogagdo do despacho por falta de fundamentacdo e consequente néo manutengao da priso preventiva do recorrente porque a obrigag&o de fundamentacdo resulta do n° 2 do art? 36° da lei n° 25/15, de 18 de Setembro; O recorrente ainda refere que 0 Colendo Jutz de Turno contradiz- se na sua fundamentacéo e decisto, visto que no final decidiu pela manutengéio da priséo preventiva mesmo tendo reconhecido que o Ministério Piblico nao fundamentou com factos concretos 0 seu 2 despacho que culminou com a aplicagho da prisdo preventiva porque entende que o “alto prejuizo financeiro do arguide” nio sto factos que perturbam a instrucdo do proceso, muito menos a produgdo conservagao da prova; Entende ainda o recorrente que “o alto prejuizo financeiro provocado ao Estado ¢ 0 poder financeiro do arguido” resolver-se-ia com a fixacdo de uma caucio carcerdria em valor igual ou aproximado ao indiciado nos autos endo a manutengdo da medida; Alega também 0 recorrente que 0 arguido Jean Claude de Morais Bastos encontra-se detido no Estabelecimento Prisional de Viana desde 0 dia 24 de Setembro de 2018 ¢ 0 facto de ser amigo do recorrente e ter bastante influéncia no Pais, n&o sdo factos concretos que perturbam a instrugdo e conservacdo da prova, apenas considera um esforco anormal para justificar a manuteneao da pristo preventiva pelo Colendo Juiz de Turno; Que 0 Colendo Juiz de Turno violou o principio do respeito das motivacées das partes, no caso, 0 Ministério Ptiblico ¢ em excesso de proniincia decidiu inventar o perigo de fuga, perigo este que o Ministério Piblico que investiga e dirige a instrucao processual ndo percebeu, ndo viu, sustentando que 0 Ministério Publico sabe bem que este perigo, no caso concreto, nao existe, pois ao longo dos 4 meses o recorrente deslocou-se pessoalmente ao DNIAP, para responder aos interrogatérios, responder aos inquéritos na DNPCC, na sede da Procuradoria Geral da Repiblica, mas, ainda assim, 0 Colendo Juiz de Turno que interveio somente para julgar a legalidade da medida de coacedo aplicada pelo Digno Magistrado do Ministério Piblico face ao tnico fundamento apresentado “perigo da perturbag&o da instrug&o do processo”, nomeadamente, a produgio e conservagdo da prova, num acto que considerou de “magico” conseguiu ver “outros perigos”, Que o facto do recorrente ter outro processo crime e ter familias no estrangeiro, por si sé, nao sdo elementos suficientes para fundamentar o perigo de fuga, afirmando que essa invocagéo pelo Colendo Juiz de Turno sido meras suposigdes para justificar a pristo preventiva do recorrente; Alega, finalmente que, tendo direito @ tutela jurisdicional efectiva por um Tribunal conforme o disposto no n° 2 do art? 174° € 175° da CRA ndo se conforma com a decisdo contida no despacho do Colendo Juiz de Turno, considerando-o como uma “estigmatizacdo econdmica” que viola além da imparcialidade e a igualdade de tratamento nos termos do art” 23° da CRA, pelo que requere provimento ao recurso e, em consequéncia ordenar a restituigdo da liberdade do recorrente mediante outra medida de coacéo pessoal e ou patrimonial menos gravosa por entender que 0 Despacho do Juiz de Turno & ilegal e inconstitucional por violar os principios de fundamentagdo da decisto; violagdo da motivagao das partes e do poder de cognigéo do Juiz de Turno; independéncia, imparcialidade e isencdo; excesso de pronincia; legalidade; proporcionalidade, necessidade, adequacdo, solidariedade e precariedade das medidas de coac¢a0...”. Pugna a final pela alteragao da medida imposta. Os autos foram com vista ao Digno Magistrado do Ministério Pablico junto dessa insténcia, que emitiu o seguinte parecer: “Compulsados os presentes autos de recurso interposto pelo arguido José Filomeno de Sousa dos Santos, urge afirmarmos que os argumentos da manutengio da medida de coacgio aplicadas ao mesmo, evocadas pelo Juiz de Turno, no tém que ser necessariamente as que foram aduzidas pelo Ministério Pablico, pode oficiosamente decretar outras medidas que as circunstancias impuserem. Considerando a gravidade do crime praticado pelo arguido 0 receio de fuga do mesmo, nesta fase processual se afigura eminente, pois a capacidade financeira do arguido Ihe possibilita aleangar meios para o efeito, pelo que em nosso modesto parecer somos pela confirmagao do despacho recorrido”. OBJECTO DO RECURSO E jurisprudéncia corrente dos Tribunais Superiores que o mbito do recurso se afere ¢ se delimita pelas conclusdes formuladas na respectiva motivagdo, sem prejuizo da matéria de conhecimento oficioso © Recorrente, apesar de, no ter apresentado as conclusdes conforme determinado pelo art.’ 690.° do C.P.C., € certo que, o Tribunal : também nao ordenou o competente despacho de aperfeigoamento, néo podendo agora inviabilizar 0 direito ao recurso. Por outro lado, resulta claro das alegagdes 0 que pretende o recorrente impugnar, concluindo-se da sua leitura, como tinica questo a decidir, a de saber se a medida de coaccio imposta no esta devidamente fundamentada e deve ser substituida por outra menos gravosa, FUNDAMENTACAO DE DIREITO Em primeira linha para referir que, contrariamente, ao alegado pelo recorrente € com o muito respeito que nos merega posigio contraria, o julgador que apreciou a medida de coacgdo imposta pelo Digno Magistrado do M°P®, pode ¢ deve reapreciar a prova constante dos autos verificar se os fundamentos invocados pelo MP para aplicar a medida cautelar existem de facto, bem como, da existéncia de outros. Dai que seja para o Juiz de Turno que se pode impugnar, sempre que se discorde do Magistrado do M®P® que aplicou a medida de coacgiio Se assim nao fosse, estariamos de facto a dar razéo ao recorrente quando escreve “.. @ por outro lado, claro manifesto sentido de solidariedade ao seu “ colega” Magistrado do Ministério Piiblico que no seu despacho ndo fundamentou com factos concretos as razdes que 0 | levaram a arbitrar a medida de coacgao pessoal mais grave de prisdo preventiva. Portou-se 0 Colendo juiz de turno como um “verdadeiro supridor de lacunas” do Ministério Publico, ao rebater, e bem, a ideia de perigo de perturbacao do processo e em compensagao, visando 0 mesmo objective — manutengao da medida de coacgdo- tirou da algibeira 0 perigo de fuga, pasmem-se...”. Naturalmente que nfo relevamos estas afirmagdes, seja porque, irrelevantes para a questo que se pretende conhecer e nada consenténeas com 0 respeito que ¢ devido & Magistratura, seja porque, o Juiz na sua fungdo de administrar a justiga, nfo s6 pode, como deve, suprir eventuais lacunas dos demais operadores judici Acresce que o Recorrente, cai no vicio de nfo sustentar com fundamentos sérios ¢ bastantes as suas alegagdes, com que pretende contrariar a medida de prisdo preventiva, chegando mesmo a afirmar que 0 Juiz. de Turno, e bem, exclui o perigo de perturbagao da instrucao, quando este apenas o sustenta de forma mais convincente. Porém, ¢ apesar de, também, nao extrair as necessdrias conclusdes: por imposigo do referido art.” 690.° do C.P.C., ainda assim, se percebe discordar da medida imposta e dos fundamentos aduzidos pelo Mmo. Juiz de Turno. Vejamos, Com interesse para a decisdo, passamos a transcrever o despacho do Juiz de Turno: “Sob o agasalho do art.° 3° da Lei n.” 25/15, de 18 de Setembro (Lei das Medidas Cautelares em Processo Penal), 0 arguido José Filomeno de Sousa dos Santos, impugnou judicialmente a medida de coacgiio pessoal que Ihe foi imposta pelo Dignissimo Magistrado do Ministério Puiblico, em autos de processo crime n.° 22/18, que correm os seus triimites legais na Direccio Nacional de Investigacio e Acgio Penal (DNIAP), alegando em resumo: Nao entender das razdes para agravagio das medidas de coacgao que anteriormente Ihe foram impostas no dmbito do processo crime 6 acima mencionado, quais sejam, oTermo de Identidade e Residéncia (TIR), Obrigag’o de Apresentagio Periédica as Autoridades ¢ a Interdigio de Saida do Pais, quando no decurso de mais de quatro meses, em momento algum violou tais medidas de coaccio. Pelo contrario, sempre compareceu voluntariamente a todas as diligéncias e colaborou para a descoberta da verdade material, tanto mais, a maioria dos documentos constantes nos autos foram trazidos pelo arguido. Assim, considerando 0 estatuido no art.’ 18° do citado diploma, donde resulta claramente que as medidas de coaceo mais gravosas, mormente, a prisio preventiva, sé podem ser aplicadas se nao forem Suficientes ou adequadas as menos gravosas, conelui-se pelo anteriormente exposto, que aquelas outras medidas sempre se mostraram bastantes, pelo que, a aplicagio agora da prisio preventiva, nao tem sustentacio legal ¢ foi imposta ao arrepio das leis vigentes no Pais. Pugna por isso, pela revogagiio da medida de prisio preventiva e de todas as outras medidas de coacséio anteriormente aplicadas, por nao se verificarem quaisquer dos perigos tipificados no art.’ 19° da referida Lei das Medidas Cautelares. © arguido, vem ainda neste mesmo documento proceder uma descrigio factual do que é 0 Fundo Soberano de Angola ¢ 0 que se propunha fazer com os diversos projectos, bem como, a revisio de contratos ¢ pagamentos antecipados, factos que para a impugnagao desta medida de coacgao niio sio relevantes. De igual modo, o arguido vem referir que os crimes por que esta indiciado estarfo amnistiados, porque praticados entre 22 de Janeiro de 2015 e 5 de Novembro de 2015, situagiio que, para apreciagao desta impugnacio, também nio releva. Mas diga-se, desde ja, que podemos constatar da descrig&o dos factos imputados pelo Ministério Pablico, que também constam situagdes ocorridas em 2017, sendo que estes mesmos factos integraram diversos crimes na forma continuada (negritado nosso). Vejamos: © Dignissimo Magistrado do Ministério Piblico depois de transcrever os factos que entende tipificar os tipos legais de crime imputados aos arguidos refere que, e, por nos parecer relevante passamos a transcrever: “(..) Face ao exposto, fica clara a existéncia de fortes indicios (sublinhado nosso) de que os arguidos com as condutas supra descritas incorreram na pratica de varios crimes (...). Dada a gravidade dos crimes investigados, tendem a intencdo as infraccoes cometidas bem como as penas em abstracto aplicdveis, 0 alto prejuizo financeiro aplicado ao Estado e ao poder financeiro dos arguidos, susceptivel de influenciar terceiros no sentido da perturbacao da instrugdo preparatéria, no que tange a recolha, produgdo, conservacao e integridade da prova jé recolhida nos autos e por recolher, conforme dispde al. b) e c) do art.” 19° da Lei n.° 25/15, de 18 de Setembro — LEI DAS MEDIDAS CAUTELARES EM PROCESSO PENAL, embora tenha sido aplicada aos arguidos, a medida de coacedo de termo de identidade e de residéncia e proibicio de saida do Pais. Considero estas medidas de ter sido insuficiente ¢ inadequadas pelas razdes jd mencionadas, por isso, aplico-as, nos termos das disposi¢ées combinadas da al." g) do art." 16° ¢ dos n.°s 1 ¢ 2 do artigo 36° da Lei n° 25/15, de 18 de Setembro ~ LEI DAS MEDIDAS CAUTELARES EM PROCESSO PENAL, a medida de coacgao de pristo preventiva, Notifique-se”. Como se pode constatar, o Dignissimo Magistrado do Ministério Pablico fundamentou a aplicagao desta medida, unicamente no perigo de perturbagao da instrugiio do processo, nomeadamente, a produgao e a conservagio da prova. Sobre a existéncia deste perigo, importa citar 0 professor Germano Marques da Silva, Curso de PP Il, 2" Ed. Pag. 245, onde se pode ler “(..) cuidado na aplicag&o de medidas de coacgdo com fundamento no perigo para 0 inquérito ou instrugdo do processo, pela invocacao de perigo para a aquisi¢ao, conservacéo ou veracidade da prova, pois & necessdrio evitar 0 risco de que com tal pretexto se confunda e prejudique a legitima actividade defensiva do arguido, traduzida nomeadamente na investigagdo e recotha de meios de prova 8 para a sua defesa (..), deve ainda considerar-se que, em geral, o perigo de perturbagdo de instrucio do processo é maior nas fases preliminares do processo ¢ nestas sobretudo na fase do inquérito e ainda quando sao poucos os meios de prova que indiciam a responsabilidade do arguido”. Ou seja, relativamente a este requisito no nos devemos bastar com a mera probabilidade, sendo também obrigatério que se demonstre em concreto os factos que indiciam a actuagio do arguido com 0 objectivo de obstar a essa perturbagao, embora o despacho do Ministério Publico coneretiza de forma pouco sustentada e até lacénica estes factos, ao referir, repita-se, “o alto prejuizo financeiro provocado ao Estado ¢ o poder financeiro do arguido”. De todo 0 modo, entendemos, na verdade ser real 0 perigo de perturbagao de instruco do processo para a recolha e conservagio da prova, haja vista que ainda nao findou a fase instrutora dos autos sendo notéria a amizade existente entre ele e 0 arguido Jean Claude de Morais Bastos, bem como, o enorme poder de influéncia que o mesm goza no Pais, tudo isso, prejudica a recolha de mais elementos de prova. Por isso, acompanhamos 0 Ministério Pablico no sentido de que o Termo de Identidade e Residéncia (TIR), as Apresentacées Periddicas e a Proibigao de Auséncia do Pais, sio medidas de coaccio insuficientes, termos em que se justifica 0 agravamento das mesmas operado através do despacho ora reclamado, embora nfo se tenha especificado com profundidade, como deveria, a existéncia do perigo de perturbagao da prova. Nao temos diividas que a aplicagao e manutengao das medidas de coaccio obedecem A principios como os da _necessidade, proporcionalidade ou adequacao (ex vi do art.’ 18° da Lei das Medidas Cautelares), onde se pode ler no seu n.° 1. :“As medidas de coaccdo a aplicar pelo magistrado do Ministério Publico devem ser as necessdrias e adequadas as exigéncias do caso concreto e proporcionais d gravidade da infraceao.” Também refere 0 mesmo professorGermano Marques da Silva, em Curso de Proc. Penal Il, pig. 345: “4s Medidas de Coaccao sé devem manter-se enquanto necessérias para a realizagéo dos fins 9 Processuais, que legitimam a sua aplicagao ao arguido e, por isso, podem Ser revogadas ou substituidas por outras mais ou menos graves sempre que se verifiquem alteragao das circunstancias que determinaram a sua aplicagao”. Com efeito, 0 art.” 36.° da CRA, consagra o principio geral do direito A liberdade e seguranga, que sé pode ser excepcionado em circunstdncia muito restritas. Daqui resulta claramente que a nossa lei fundamental encara a prisio preventiva como uma medida excepcional, tanto que contém diversos afloramentos de principios que apontam num direito penal mais ressocializador do que punitivo, porém, cada caso é um caso. No caso em anilise, vamos entio verificar se se justifica a manutengio de prisio preventiva. Na yerdade, 0 contexto actual que se vive em Angola consente que 0 arguido venha efectivamente perturbar a recolha de prova numa altura em que segundo se Ié no despacho do Ministério Pablico, existem fortes indicios do cometimento das infraegées que Supostamente tera cometide, 0 que fundamenta a alteragio das medidas menos gravosas aplicadas na fase inicial, por outras que oferegam melhores garantias de acautelar essas finalidades. Porém, nesta fase e como julgadores nada nos impede de ir mais além e perceber se existirio outros perigos relativamente ao arguido constante do art.° 19° da citada Lei das Medidas Cautelares. Primeiramente, o perigo de fuga. A verificagio deste requisito reporta-se ao facto de existirem Processos com especial gravidade, 0 que revela a possiblidade do arguido se querer subtrair & acgao da justica, Com efeito, extraem-se dos autos, factos concretos evidenciados no processo que indiciam uma Preparagio para a coneretizagio deste objectivo, quais sejam, ter familiares a residir no exterior do Pais e pender contra si um outro Processo crime ja introduzido em juizo, sendo que a possiblidade de fuga se torna mais premente. 10 Nesse sentido, o professor Cavaleiro Ferreira, diz que o perigo de fuga deve ser real e iminente e nio meramente hipotético ou longinquo € resultar da ponderacio de varios factores, 0 mesmo € dizer, que se deverd atender se 0 arguido tem razdes ou meios para se subtrair a accao da justiga ou se existe um perigo sério de que isto venha a acontecer. Na verdade, tendo o arguido familiares a residir no estrangeiro, situagio que acaba por facilitar essa auséncia, atentos A gravidade e a0 impacto dos crimes em que o mesmo esté supostamente implicado e uma vez que ja correm em juizo tramites legais de um outro processo crime que Ihe foi instaurado, cuja acusagio j4 Ihe foi notificada, ¢ nitida a existéncia de um perigo conereto de fuga, apesar de, na fase inicial do proceso e quando em liberdade, nao 0 ter feito. Finalmente dizer que o arguido, agora esta confrontado com a existéncia de um despacho em que o Magistrado competente, fala de “fortes indicios”, sendo que as circunstancias sio diferentes, 0 q torna, no nosso entendimento, mais objectivo o referido perigo, pelo que, se afigura judicioso manté-lo em prisio preventiva, com base no perigo conereto de fuga ¢ na gravidade da infracg4o, olhando também para a sua solvente situagao econémica que permitir-the-ia viver em conforto em qualquer parte do mundo... DECISAO Nestes termos e pelos fundamentos expostos, nego provimento 4 presente impugnagao judicial e em consequéncia, mantenho a prisio Preventiva imposta pelo Dignissimo Magistrado do MinistérioPablico, ao arguido.” Entre 0s requisitos gerais de aplicagiio das medidas de coacgtio, 0 Exm? Juiz de Turno, contrariamente ao alegado pelo recorrente, considerou verificado 0 perigo de perturbagao da instrugio do processo que motivou a medida imposta pelo Digno Magistrado do M.P., discordando apenas dos fundamentos. a Com efeito, refere e bem que, “o despacho do MP. concretiza de forma pouco sustentada e até lacénica estes factos, ao referir repita-se “0 alto prejuizo financeiro provocado ao Estado e 0 poder financeiro do arguido”, © sustenta a existéncia do mesmo na relagdo de amizade existente entre 0 recorrente e o arguido Jean Claude, bem como, na influéncia que goza no Pais. Seguindo uma outra vez os ensinamentos do professor Germano Marques da Silva “a lei ao consagrar este perigo de perturbagdo do processo, ndo pretende referir-se a instrugdo enquanto fase processual, mas sim & actividade instrutéria de recolha de elementos de prova, independentemente da fase processual em que a mesma ocorra: inquérito, instrugdo ou julgamento” devendo assim, a expresso ser entendida em sentido amplo, pelo que, a influéncia do recorrente no Pais e também no estrangeiro, 6 bastante para se poder concluir em conereto pel possibilidade de poder perturbar a recolha da prova. Por outro lado, considerou ainda verificado, também em concreto, 0 perigo de fuga, atendendo ao facto de ter familiares a residir no Estrangeiro, a existéncia de um outro processo crime e, 0 impacto dos crimes em que supostamente esta implicado, bem como, a solvente situago econémica que Ihe permitira viver num qualquer outro Pais ¢ eximir-se & acgdo da justiga. A propésito deste perigo, o Prof. Germano Marques da Silva refere que importa ter bem presente que a lei ndo presume o perigo de fuga, exige que esse perigo seja concreto, nao bastando a mera probabilidade de fuga deduzida de abstractas ¢ genéricas presungdes, mas sim, devem-se fundamentar os elementos de facto que indiciem concretamente aquele perigo, nomeadamente, porque revelam a preparagdo da fuga, como por 2 exemplo, o facto de o arguido ter na sua posse um bilhete de aviao para outro pais, ou ser de um pais estrangeiro e ter um compatriota a sua espera com uma viatura no momento da sua detengdo (vide, Curso de Processo Penal, vol. II, 3a Edigao, Editorial Verbo, pag. 265). Também o Prof. Cavaleiro de Ferreira defendia que “ndo deve apreciar-se_unilateralmente o interesse fundamental de assegurar a execucdo da sentenga final ou de assegurar a presenca do arguido no processo, mas deve também atender-se 4 efectiva probabilidade do risco eventual de inseguranea”’, e, sobre o perigo de fuga, afirmava que “néo é de exagerar, ampliando-o, 0 perigo de fuga. E um perigo real, mas relativo; pode o arguido ausentar-se para o estrangeiro ou esconder-se no territério nacional. Mas a coordenagao internacional da repressdo criminal e 0 instituto da extradig&o tornam cada vez menos seguro um meio de fuga, que alids, ndo esta a disposi¢ao de todos” (cf. citado autor’ in Curso de Processo Penal, II, 1981, pagina 419), Regressando & decisio recorrida, j4 verificamos que 0 despacho recorrido evidenciou varios argumentos para concluir pela existéncia do perigo de fuga e, por essa via, manter a prisdo preventiva, em consonancia, dizemos nés, com a exposigao doutrindria acima referida, Com efeito, a existéncia de um outro processo, no momento em que foi proferido 0 despacho, onde estd também indiciado pela pritica de crimes graves, 0 facto de ter familia a residir no estrangeiro e uma situagdo econémica que the permite viver em qualquer lugar, densificam esse Perigo, tanto mais que, como diz o citado Prof. Cavaleiro Ferreira, faz com que a fuga " que ndo esté a disposigéio de todos” esteja, a disposigao do aqui recorrente. Acresce ainda, a multiplicidade de fronteiras existentes no nosso Pais e, a evidente escassez de meios para as controlar e impedir a saida ou 3 entrada c, a fragilidade da cooperacdo judicidria, justificam um olhar menos rigoroso para este perigo de fuga. Concluimos, por isso, no nos merecer censura a decisdo recorrida quando realga o perigo de perturbaglo da instrugao o perigo de fuga, na medida em que, também para nés, pelas razdes amplamente expostas, entendemos estarem patentes. ‘ Quanto aos alegados principios constitucionais, apenas para referir que, a decisio de aplicagdo de uma medida de coacgao tem sempre de respeitar os principios da necessidade, da adequagio e da proporcionalidade e, se for 0 caso, da subsidiariedade da pristio preventiva. Respeitar o principio da adequagao significa escolher a medida que poder constituir 0 melhor instrumento para garantir as exigéncias cautelares di caso, ou —seja,_—ppara’—salcangar. «=o fim—_visado. Deste ponto de vista, dtvidas nao existem que a medida de coacgio detentiva constitui um meio adequado para corresponder aos particulares receios de fuga ¢ de perturbagdo da instrugao. Para respeitar o principio da proporcionalidade, a medida de coaceao escolhida, dever manter uma relago directa com a gravidade dos crimes ¢ da sangao previsivel, cabendo ponderar aqui, elementos como o juizo de censurabilidade da conduta, 0 modo de execugio, a importincia dos bens juridicos atingidos Considerando a gravidade dos crimes indiciados ¢ sem que se revele qualquer circunstancia que dirima a culpa, afaste a ilicitude, permita uma excepcional benevoléneia ou uma atenuagao extraordindria e mesmo tendo em conta, a auséncia de antecedentes criminais, nunca se poderia concluir que a pristio preventiva seja uma medida de coacgio desproporeionada no caso em aprego. 14 respeito pelo principio da subsidiariedade impde considerar sempre, a priséo preventiva como uma medida de natureza excepcional, que s6 pode ser aplicada como in extremis , quando nenhum outro meio se anteveja como adequado ¢ suficiente. Neste quadro concreto, a prisao preventiva revela-se efectivamente como a medida de coacgdo imprescindivel para garantir as exigéncias cautelares do caso, pelo que, improcede a pretensto do recorrente e 0 despacho recorrido tera de ser mantido. | DECISAO Was Miter) ee rode om \eeeBs de beso de Erawac Count) bs ( Velbad Soprewse hea Coser | tice CippaiLecin 7 he 4 Rule an eon. A Pttonaece- . Mle an 4 /izfuaip X J5> Be QZ) Shae haven 15

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