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ERMINIA SILVA AS MULTIPLAS LINGUAGENS NA TEATRALIDADE CIRCENSE Benjamim de Oliveira e 0 circo-teatro no Brasil no final do século XIX e inicio do XX Tese de Doutorado apresentada ao Departamento de Histéria do Instituto de Filosofia e Ciéncias Humanas da Universidade Estadual de Campinas sob a orientagio da Profa. Dra. Silvia Hunold Lara. Este exemplar corresponde & redagio final da Tese defendida e aprovada pelaComissio Julgadora em 24/02/ 2003 BANCA Profa. Dra. Silvia Hunold Lara (orientadora) S@ 5 Nowell dee Profa. Dra. Maria Clementina Pereira Cunha UC & A! Prof. Dr. Leonardo Affonso de Miranda Pereira |J? j Profa. Dra. Suzi Frankl Sperber A A i ny Vege ea cea Prof. Dr. Marcos Luiz Bretas da Fonseca Prof. Dr. Sidney Chalhoub (suplente) Profa. Dra. Silvia Cristina Martins de Souza (suplente) FEVEREIRO/2003 UNICAMP UNICAMP BIBMIOTErA nese . [ontoade ora Se NECKA FICHA CATALOGRAFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA DO IFCH - UNICAMP Sistim | | | | S Silva, Erminia As miltiplas linguagens na teatralidade circense - Benjamim de Oliveira ¢ 0 cireo-teatro no Brasil no final do século XIX e inicio do XX / Erminia Silva, -- Campinas, $P: {s.n.], 2003 Orientador: Silvia Hunold Lara, ‘Tese (doutorado) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciéneias Humanas. 1.Circo. 2, Circo - Historia. 3, Teatro - Brasil - Historia, I, Lara, Silvia Hunold, 1955- If, Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Filosofia e Ciéneias Humanas. III. Titulo. eee Resumo Neste trabalho pesquisa-se 0 processo de produgo © organizagio da teatralidade circense expressa pela conformagao do circo-teatro, no Brasil, considerando-se como fio condutor a vida artistica de Benjamim de Oliveira, da década de 1870 de 1910. Acompanhar a vida de Benjamim de Oliveira é perseguir a multiplicidade de interlocugSes que realizou, permitindo-se assim recuperar como os circenses enfrentaram os desafios e obstaculos para se constituirem, além de tirar proveito do fato de que Benjamim foi um dos importantes demarcadores das caracteristicas mais significativas daquela teatralidade. Entretanto, este trabalho mostra que © processo de insergo do circo-teatro na produgo de uma teatralidade circense ja ocorria no momento em que Benjamin iniciava sua vida no circo (0 estudo toma as produgdes circenses através das ages dos seus varios sujeitos ¢, desta forma, investiga como homens ¢ mulheres artistas de circo, ao mesmo tempo em que mantiveram uma especificidade, renovaram, criaram, adaptaram, incorporaram, copiaram experiéncias vividas © enfrentaram desafios e obstaculos decorrentes das continuidades ‘mudangas encontradas na sociedade, nas produgdes culturais e em si mesmos. Parte-se da idéia de que os circenses devem ser vistos como um grupo que articulava matrizes & procedimentos em constante reelaboragio ¢ ressignificagéo, bem como adequavam, incorporavam e produziam um espetaculo para cada piblico, manipulando elementos de outras variiveis artisticas ja disponiveis e gerando novas e miltiplas versdes da teatralidade. Abstract This study researches the production and organization process of circensian theatricality as expressed within the configuration of the Brazilian Circus-Theater. The mainstream thereto is Benjamim de Oliveira’s artistic life ranging from the 1870"s up to the 1910's. Keeping track of Benjamim de Oliveira’s life is the same as pursuing the multiplicity of interlocutions which he performed. This leads to a recovery of the ways followed by the circensian artists to face challenges and stumbling blocks in order to get themselves established. Moreover, Benjamim acted as an outstanding demarcator of the most meaningful characteristics pertaining to that theatricality. Meanwhile, this study remarks the fact that the process of insertion of the circus-theater into the production of a circensian theatricality already existed by the time when Benjamim started his life in the circus. This research regards circensian productions through the actions of varied subjects involved. Therefore, it investigates how circus artists, both men and women, at the same time as they maintained one sense of specificity, they were also able to renew, create, adapt, incorporate and reproduce experiences. In addition, they faced challenges and obstacles which arose from continuities and changes found in society, in cultural productions and in themselves. The primary idea of this study is that circensian artists should be understood as @ group of people who articulated matrices and procedures under permanent reelaboration and resignification. Furthermore, they adjusted, incorporated and produced shows for each audience by manipulating elements belonging to other available artistic variables, which generated new and multiple versions of theatricality. iti iv Para ALCIR LENHARO que amava circo (in memorian) Para o EMERSON que esta historiadora circense ama vi “Teatro na porta de casa. O Rio é muito grande e o povo quer teatro na porta de casa. Teatro fixo poderé satisfazer uma parte, mas nio todos, Para que, de modo geral, fiquem satisfeitos ¢ necessdrio que o pavilhdo v4 a todos os lugares, em toda a parte, Dafa nossa instabilidade. Organizar companhia para um subiirbio apenas, no resolveria de modo algum, o problema de divulgagdo da arte cénica.” * Benjamin de Oliveira vii 1. Didirio da Noite, 21 de fevereiro de 1940. viii Agradecimentos Realizar uma investigagio como a desta tese exige muitos momentos de trabalho solitério, no qual o pesquisador fica aparentemente sozinho com suas visbes, seus didlogos internos, suas imagens. Porém, nada mais coletivo que uma pesquisa. Néo sé porque o investigador porta varios saberes, produtos dos didlogos com a construgio do conhecimento que a sociedade ¢ sua histéria Ihe ofertam, mas porque atravessam as suas atividades, o tempo todo, as relagdes pessoais que Ihe sto fundamentais, Nesta diregio, sou devedora do encontro com o professor Alcir Lenharo, que me orientou na dissertag&o de mestrado e deu inicio orientagdo do doutorado. Diante da sua Iamentével perda, pessoal e académica, agradego 0 apoio que recebi do Curso de Pés- Graduagdo em Historia, do IFCH ~ Unicamp, que me deu cobertura para a continuidade da orientagdo da pesquisa. Neste particular, a professora Silvia Hunold Lara por ter me apoiado nesta tarefa © percurso. ‘A banca de qualificagao que com a professora Maria Clementina Pereira Cunha ¢ Leonardo A. M. Pereira fez importantes sugestées. ‘Ao Emerson, mais do que companheiro, por ser alguém que nfo deixou de me incentivar a cada momento, desde 1988, quando retomei ao “mundo académico”, com seu afeto e (in)tensos didlogos. Os amigos que fiz ¢ tenho desta fase da minha vida foram © sto chaves para a realizagio do meu trabalho. Com destaque, agradego a Jefferson, Silvana, Claudia e Silvia Cristina, que me serviram de afeto, de “escutadores” ¢ parceiros no desenvolvimento de muitas das minhas idéias, Fizeram parte dos meus bragos. Sem querer sofrer a trai¢do da meméria, agradego 20 conjunto dos meus colegas de curso do doutorado. Ao pessoal do curso de historia que trabalha na Unicamp e cuida dos alunos, muitas vezes mais atentos que nés no trato com a burocracia, que nada soma na construgio do conhecimento, mas pode destrui-lo com suas normas. Aos trabalhadores do Cedoc/Funarte — Rio de Janeiro, que sempre se mostraram solidarios nos momentos de consulta as varias fontes, e em particular Marcia Claudia, Ela sempre foi, ¢ continua sendo, um apoio naquela instituigfio. E uma trabalhadora que te mostra © tempo todo a importancia das coisas piblicas, colocando-se como defensora ¢ servidora de ix modo efetivo. Neste mesmo sentido, quero agradecer em particular ao pessoal do AEL- Unicamp. ‘Ao conjunto de pessoas que me acotheram na cidade de Pari de Minas, onde Benjamin nasceu, particularmente aos trabalhadores do Museu da Cidade. Um dos momentos mais agradaveis que me aconteceu durante esta pesquisa foi ter conhecido Jaganan Cardoso Gongalves e seu irmio Juyragaba Santos Cardoso, netos de Benjamim, que desde © primeiro momento me receberam de forma muito carinhosa e me forneceram, sem restrigo, materiais e informagdes que tinham sobre seu avo. ‘Ao amigo Mauro Araijo Silveira pelo seu apoic e total disponibilidade de compartilhar comigo seus materiais e conhecimentos sobre a histéria da musica no Brasil. A Martha Costa pelas parcerias e longas discussdes académicas circenses. As varias pessoas que fizeram e fazem circo no Brasil, com quem cruzei durante a realizagao da tese € que, nos seus saberes, me iluminaram em questdes muito fundamentais. Assim, agradeco a meu pai Bary Charles, circense - ator, ginasta, domador, trapezista, palhago, empresirio -, que com sua memoria e capacidade de contar “causos" acabou por produzir em mim uma grande curiosidade sobre as questdes do circo-teatro. Ivone ¢ Ferreira sempre me foram fundamentais nisso. Aos muitos circenses, entre eles Marlene (Circo Spacial) ¢ Zé Wilson (Circo Escola Picadeiro), que esto em uma batalha didria para a permanente construgao do circo no Brasil, apesar da falta de politicas piblicas que nao o vé como importante componente dos processos culturais, Verdnica Tamaoki, uma outra circense, formada na escola de circo nos anos de 1980, vem sendo parceira e amiga nas pesquisas sobre as historias do circo. A Cristina Band, pelos instigantes bate-papos. ‘Ao pessoal do LUME-Unicamp, que sempre me acompanhou como parceiros nas pesquisas que envolvem as produgées artisticas, em particular 0 circo. Aos Parlapatdes (Alé, Hugo e Raul) que, além das boas risadas, me proporcionaram afetos e parcerias, Aos filhos do coragao Nathalia, Emi e Pedro. Aos sobrinhos Diogo, Vini e Isadora. Aos afilhados Juca e Ique. ‘Aos apoios afetivos incondicionais da Du, Esther, Shirley, Charles, Cleide, Rosicleir, Cleusa e Cleide (minhas livreiras preferidas), Solange, Cleusa, Fabio, Diego, Ive, Lu, Mau Pri. Capitulo 1 - Um Congresso de Variedades ......... 17 Capitulo 2 - Benjamin de Oliveira: a constituido de um circense . 69 Capitulo 3 - Benjamin de Oliveira: outras imagens para a teatralidade circense.. Capitulo 4 - Benjamin de Oliveira e a consolidagao do circo-teatro ..... 177 Conclusio .. Fontes e Bibliografia .. Crédito das Hustragées .... ANEXO 1 Relacao da pecas encenada pelos circenses 289 ANEXO 2 Ilustragoes e Iconografia ... 351 xiv .) A Europa mandava para cé as suas modas, as suas artes ¢ os seus clowns (Machado de Assis - 1850) "Os cavalinhos! A paixio desta terra, a alegria das criangas, 0 tormento dos amos, os cuidados da policia, cem mil réis didrios para os cofres municipais, eis 0 que representa esta palavra, os cavalinhos!" * (Correio Paulistano — 27 de dezembro de 1877) “E um caleidoscépio imenso aquela ccompanhia. que trabalha no S, Pedro de Alcantara! Cada dia uma volta; cada volta uma supresa. (...)" * (Propaganda do Circo Fernandes — 1894) xv 1. Machado de Assis apud Luciano Trigo ~ O viajante movel. Machado de Assis e 0 Rio de Janeiro de seu tempo. Rio de Janeiro/Sao Paulo: Editora Record, 2001, p. 74 2. Correio Paulistano, 27 de dezembro de 1877 — Folhetim, cronista assina E.P. apud Carlos Eugénio Marcondes de Moura ~ Notas para a historia das artes do espetaculo na Provincia de $0 Paulo _- A Temporada Artistica em Pindamonhangaba_em 1877-1878, Sao Paulo Conselho Estadual de Artes e Ciéncias Humanas (Colegao ensaio; n° 90), 1978, p. 144 3. O Paiz, 17 de maio de 1894. Introdugao Esta tese enfrenta o desafio de estudar parte da historia do circo no Brasil. Trata do processo de produgo © organizagio do espeticulo circense e, especificamente, de uma teatralidade propria, que se expressou na organizagao do circo-teatro. Para isso, segue 0 fio condutor da trajetoria da vida artistica do ginasta, palhago-cantor, ator € autor Benjamim de Oliveira, no periodo compreendido, aproximadamente, entre 1870 ¢ 1910. Quando se fala em espetéculo circense geralmente se pensa cm uma atividade artistica possuidora de uma "linguagem universal", assistida e apreciada em varios paises do mundo, que utiliza distintas formas de expresso corporal e pode ser entendida por qualquer cultura. Além da apresentago propriamente dita, identifica-se esta universalidade pelo espago fisico onde o espetdculo ocorre. Entretanto, s6 a partir do inicio do século XIX, 0 circo passou a ser identificado como um espetéculo com apresentagdes de animais, ginastas, acrobatas e cémicos, em um espago cercado por uma platéia pagante, sentada em cadeiras e arquibancadas dispostas em circulo, a principio em uma estrutura fixa de madeira, chamados hipédromos ou pavilhdes fixos, ¢, depois, movel e coberto por tecidos Portanto, os conceitos de circo, espeticulo e artistas circenses no so € nem podem ser considerados universais. Para além do que pode ser identificado como “inguagem universal” do corpo e dos espagos de apresentagio, ha entre as herangas culturais dos circenses e as dos lugares para onde migraram e se fixaram um cruzamento, uma mistura, um compartilhamento ov apropriagdo, que produz uma outra complexidade artistic, em cada periodo histérico. Isto & 0s circenses, a0 se apresentarem em varios espagos como acrobatas, ginastas, mégicos, domadores, cantores, miisicos e atores, vao realizando trocas de experiéncias, por isso, € preciso pensar o circo a partir de épocas e sociedades concretas, nas quais estabelecem relagdes especificas com tradigdes, valores, habitos e manifestagées culturais. Relagdes complexas, tensas, competitivas, harmoniosas, cooperativas, dinimicas, criativas e politicas, mantidas com os diferentes segmentos da sociedade, com seus préprios pares, com outros ramos da produgao de espetaculos teatrais, populares, musicais, Pensar as produgdes circenses através das agdes dos seus varios sujeitos pode revelar as distintas formas de fazer circo e as mais diferentes maneiras de ser artista circense, além de dar pistas sobre os didlogos que estabeleciam com os movimentos culturais da sua época. E possivel, entdo, investigar como homens e mulheres circenses no Brasil, ao mesmo tempo em que mantiveram uma especificidade, renovaram, criaram, adaptaram, incorporaram e copiaram experiéncias vividas no_ periodo, enfrentando novos desafios e obstéculos decorrentes das continuidades e mudancas encontradas na sociedade, nas produgdes culturais e em si mesmos. ‘Nesta tese, 0 conceito de teatralidade circense engloba as mais variadas formas de expresso artistica constituintes do espetéculo circense. Neste sentido, a representagdo de um malabarista, por exemplo, € expresso desta teatralidade tanto quanto a encenagao de um texto propriamente teatral, ou a representagio de um palhago Um nimero como 0 de malabares, em seu conjunto, é constituido pelo ato de controlar uum instrumento, por gestos, comunicagéo nao verbal (facial e corporal) com o piblico, roupa, maquiagem, misica, e sua relago com as outras representagdes no espetaculo. No periodo em torno de 1870 a 1910, as apresentagdes eram exibidas nos mais variados espagos, ou seja, nas ruas, nas feiras, nos tablados € nos palcos teatrais, Além de se apresentarem em espagos fixos, particularmente no Brasil, observa-se adaptagdes tecnologicas utilizadas na construgdo de estruturas fisicas, como 0 circo de pau-a-pique, pau fincado e americano,Quaisquer que fossem os modelos confeccionados: de madeiras € chapas, no inicio a céu aberto € depois com diferentes tipos de coberturas desde algodio @ Iona impermedvel, tinham como lugar de exibigio 0 centro do circo, conhecido como arena ou picadeiro. No entanto, apesar de também parecer que isto fosse uma caracteristica tipica do circo, por estar assaciada a idéia de que o picadeiro é que seria o lugar da expresso das gindsticas, acrobacias e malabares, entre outros - ¢ 0 palco a ele acoplado seria a agregagdo da representagdo teatral propriamente dita, proponho um novo olhar para este lugar de expressio da teatralidade circense. Pois, além do fato de que na Europa ¢ depois na América Latina, a construgdo de um paleo junto a arena ou picadeiro j4 fazia parte do processo de constituigo dos espetéculos circenses, considero que quando s6 ha picadeiro, por ser espago de realizagao do conjunto que representa 0 conceito de teatralidade, este seri denominado durante este trabalho como palco/picadeiro. E, nesta perspectiva, quaisquer lugares que eram 2 cocupads pelos circenses para comporem sua teatralidade tornavam-se palco/picadeiro, fossem eles palco teatral, uma rua, etc., ja que neles se realizavam as miltiplas linguagens artisticas circenses. Compor um espetéculo € uma maneira de compor 0 conjunto de expressdes da teatralidade circense. A sua conformagdo, como se afirmou até agora e se procuraré mostrar no decorrer deste trabalho, ¢ sem divida datada, colada a um contexto, demarcando 0 circo como um espago polissémico e polifonico, Desta forma, ao pensar 605 significados e mudancas do circo em sua prépria historicidade, um historiador poderd compreender a dinamica das experiéncias dos homens e mulheres que 0 produziram, estando eles no palco/picadeiro ou nao. Alguns dos agentes produtores do circo - entre os quais incluimos artistas. empresirios € pablico - podem constituir uma oportuna janela para o resgate dessa historia, um caminho para seguir 0 desenvolvimento do espeticulo circense, enriquecido pelo percurso especifico realizado por alguns circenses, representativos desta complexidade. Nesta direglo, optei por acompanhar a vida de um dos artistas de circo deste periodo, Benjamim de Oliveira, cuja multiplicidade de interlocugbes permite recuperar como os circenses enfrentaram os desafios obstéculos para se constituirem cenquanto tais. Além disso, Benjamim foi um dos demarcadores da caracteristica mais, significativa da teatralidade circense naquele periodo: a conformagao do circo-teatro no Brasil As primeiras fontes que me levaram a pesquisar as expressdes da teatralidade circense, nas quais 0 circo-teatro foi importante componente e que me permitiram definir © cireo como um espago polissémico € polifonico, foram as levantadas para a elaboragao de minha dissertaco de mestrado '. Realizei diversas entrevistas com artistas ¢ li textos de memorialistas circenses. Através delas, pude perceber a multiplicidade das inguagens dos espetaculos e um intenso debate, tanto entre os circenses quanto na bibliografia pertinente, que a0 mesmo tempo em que reconhece a existéncia do circo- 1. Erminia Silva - O Circo: sua arte e sens saberes ~ 0 circo no Brasil do final do século XIX a meados do, XX . Campinas, Universidade Estadual de Campinas, 1996. teatro, acaba por responsabilizé-lo pela distorgao do que seria um espetaculo circense puro’ Este debate em tomo do que seria um circo “puro” nio ¢ recente, jé ocorria desde 0 inicio do século XIX. Nesta época, “puro” era o espetéculo que apresentasse somente mameros gindsticos, acrobatics e de animais, com palhagos realizando mimicas e sem falas. O debate ndo se dava apenas na esfera circense: cronistas, letrados, jomalistas ¢ teatrélogos também apontavam que, quando aqueles artistas incorporavam elementos diferentes, comprometiam o tipico ¢ tradicional espetaculo do circo. No interior desta discussao, procurava-se diferenciar os circenses tradicionais dos chamados aventureiros. Naquele estudo, procurei mostrar que aqueles que se denominavam componentes do circo tradicional, partiam da idéia de que eram os descendentes dos primeiros artistas saltimbancos ou circenses a chegarem no Brasil, € aliavam isso a0 fato de que eles é que eram os portadores dos saberes e praticas implicados com a construgio do circo e herdeiros das memérias de seus antecedentes. No entanto, 0 que se analisou, naquele trabalho, foi que esta representago nao era suficiente para separar o tradicional do aventureiro, pois 0 acesso ao saber considerado tradicional era igualmente estendido a todos aqueles que ndo nasciam no circo. Os chamados aventureiros, quando entravam para 0 circo, necessariamente passavam pelo ritual de aprendizagem ministrado pelas familias que 0 compunham, como foi o caso de Benjamim de Oliveira, apés o que transformavam-se em artistas circenses, constituiam familias ¢ corroboravam a mesma forma de transmissio dos saberes e praticas, tornando- se, por sua vez, tradicionais. Sem pretender subestimar alguns conflitos ¢ tensbes geradas por estas questoes, na pratica, tradicionais e aventureiros confundiam-se nos palcos/picadeiros circenses. As Jinhas divisorias nfo eram bem definidas, assim como em relagao aos varios artistas dos teatros, dos cafés concertos, dos music halls, dos cabarés ¢ dos pagodes, que sempre tiveram no citco espago de trabalho. Este tema que se refere as fronteiras das manifestagdes culturais atravessou toda a elaboragdo desta tese, e exigiu a construgio de uma resposta que pudesse entender a diferenciagdo do espetaculo circense dos outros, principalmente pelo fato de que considero inadequadas as anilises que procuram fazé-la ou através da distingZo entre artista tradicional aventureiro, ou da defesa de um circo puro, ou idealizando a nogdo de que 0 paico no ¢ 0 picadeiro, pelo desconhecimento do 4 palco/picadeiro como expressio da teatralidade circense, ov por considerar somente a tenda como marcadora universal do que seria circo. No mestrado, ao tratar destas questoes, afirmei que, ao se falar de circo e de circenses, neste periodo sob anilise, & necessério fazer referéncia a um complexo modo de organizagao do trabalho € produgio do circo como espetéculo que nos permite reconhecé-lo na multiplicidade das produgdes culturais, que por diversas vezes se confundiam ¢ tinham coisas em comuns, Este modo - que analisei para entender a conformagao do circo familia no Brasil, do século XIX a meados do XX, que tem pertinéncia para este trabalho sobre a constituigdo da teatralidade circense do circo- teatro entre os anos de 1870 a 1910 — pressupunha certas caracteristicas definidoras e distintivas do grupo circense, como: = onomadismo, uma forma familiar e coletiva de constituigao do profissional artista *, baseada na transmissio oral dos saberes e praticas, que nio se restringia & aquisigao de um simples nimero ou habilidade especifica, mas referia-se a todos os aspectos que envolviam aquela produgdo e que implicava um processo de formagao/socializagao/eprendizagem, bases de estruturagio © identidade, - uma contemporaneidade do espeticulo através de um didlogo tenso constante com as multiplas linguagens artisticas de seu tempo ‘A organizagao do trabalho, o modo de produgdo do espetaculo e 0 processo de formacio/socializago/aprendizagem formavam um conjunto, eram vinculados ¢ mutuamente dependentes. Com isso, parto da idéia de que os circenses devem ser vistos ‘como um grupo que articulava uma estrutura, que a principio seria vista como um nucleo fixo com redes de atualizagio, envolvendo matrizes e procedimentos em constante reelaboragéo e ressignificagio *. Adotavam procedimentos que adequavam, 2. Mesmo que 0 artista circense resolvesse seguir carreira individual ¢ fora do circo, o seu provesso de formagio acontecia neste modo de organizacao e de transtnissio do saber coletivo. Os diferentes artistas ‘que trabalhiaram nos circos, no periodo estudado ~ como alguns atores ¢ autores do teatro, maestros, Compositores, cantores. dangarinos, coredgrafos, cendgrafos. entre outros ~ apesar de terem contribuido na Constituigao da tcatralidade circense no Brasil, viam no circo um excelente veiculo de promoao € divulgagdo de seu tratatbo. 5, Parte desta andlise foi estimulada pelas reflexdes de Beti Rabetti (Maria de Lourdes Rabetti) sobre as ‘pesquisas “em toro do chamado ‘teatro popular’ no Brasil” sob sua coordenacio, realizadas no Projero Integrado de Pesquisa (Al) na Universidade do Rio de Janeiro. Ela apresentou suas idéias no texto de 5 incorporavam e produziam um espetaculo para cada publico manipulando elementos de outras variaveis artisticas ja disponiveis, gerando novas e milltiplas versdes da teatralidade. Compor um espetaculo circense nesta situagéo era refazer de modo permanente estas mesmas propriedades de constituigdo e a sua distingao em relagao aos outros modos de construgdo dos espetdculos artisticos. Desta forma, mesmo que se possa identificar diversos elementos constituintes naqueles outros modos, como por exemplo, © teatro, que também podia organizar suas produgdes baseadas na diversidade tanto do espeticulo quanto do piblico que o assistia, assim como havia um certo nomadismo praticado por alguns grupos, 0 modo de organizagio do trabalho, a produgZo do espeticulo circense € aquele processo acabavam por diferencié-lo daqueles grupos, inclusive na sua capilaridade. eee Outro tema que sempre apareceu era o da decadéncia e crise do citco *. Para parte da bibliografia sobre 0 circo * e alguns relatos de circenses °, em varios momentos da historia da produgdo do espetaculo, a introdugio de uma nova técnica — na representagio, na confecgo de um aparelho, na condugdo do espeticulo, ou até mesmo na presenga de um novo artista, ou de um novo ritmo musical ~ torna-se responsével abertura do Grupo de Trabalho: Teatro ¢ Brasilidade, no I Congreso Brasileiro de Pesquisa ¢ Pos- Graduagao em Artes Ciéncias/ABRACE, realizado em Sao Paulo em setembro/1999. 4. Historiadores curopeus que escreveram sobre o ciroo, como o francés Henry Thétard, jé analisava, em 1930, a decadéncia ou a perda da "pureza". Em pesquisa na biblioteca da Funarte do Rio de Janeiro, localize uma pasta, com varios recortes de jornais, etiquetada com os dizeres: "Circo Problemas/Crises", tais recortes eram de jomnais de varias cidades brasileiras, que datavam desde 1964 até 1997. somando quase 70 com reportagens cujos titulos expressavam a “agontia” ou “extingo” do circo. 5. Ver: José Cliudio Barriguelli- "O teatro popular rural: circo-teatro", in Debate e Criticas. Sao Paulo. no 3, 1974. Maria Liicia Aparecida Montes — Lazer e Ideologia: A Representacao do Social e do Politico na Cultura Popular. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciéncias Humanas da Universidade de Séo Paulo, 1983, Tese de Doutorado. Maria Liicia Aparecida Montes — “Cultura Popular/Fronteiras de conhecimento: cespetaculos populares, formas de teatro, dramas e dangas draméticas”, palestra proferida em 10.07.1978 ppor ocasido da 200 Reunio da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciéncia (SBPC) Apud Paulo Ricardo Meriz ~ espaco cénico no circo-teatro: caminhos para 2 cena comtemporiinca. Rio de Janeiro Universidade do Rio de Janeiro. Dissertagdo de Mestrado, abril/1999, Roberto Ruiz - Hoje tem espetdculo? As origens do circo_no Brasil. Rio de Janeiro, INACEN, 1987. Henry Thétard = La Merveilleuss Histoire du Cirque. Paris: Prisma. 2 Tomes - exemplaire no, 931, 1947, Roland Auguet ~ Histoire et Légende du cirque. Paris: Flammarion, 1974, p.97, : 6. Ver: Antolin Garcia - O Circo (a pitoresca turne do circo Garcia através a Africa e paises asiéticos). Sto Paulo, EdigSes DAG. Escrito em 1962 e publicado em 1976, Waldemar Seyssel - Artelia e 0 Circo - ‘Memérias de Waldemar Sevssel. Sd0 Paulo. Edigdes Melhoramento, 1977, Dirce Tangara Militello - Picadeiro, Sto Paulo. Edigées Guarida Produgdes Artisticas, 1978, Erminia Silva ~ op.cit, 6 pela alteracdo ou deformagao do que deveria ser 0 tipico espetaculo do circo ¢, conseqiientemente, também por suas crises e decadéncias ‘Uma outra parte destes estudos ” sobre o circo no Brasil, que tomou 0 circo como objeto, trabalhou com algumas informagdes histéricas sobre a produgo do espetaculo circense, priorizando em particular nas suas andlises o circo-teatro. Estes pesquisadores tinham como objetivos discutir os processos culturais a partir de uma dtica que os enquadrava em polos antagénicos como elite e popular, centro e periferia, rural ¢ urbano, permeados pelo embate entre cultura popular ¢ cultura de massa. Tendo como pano de fundo o tratamento do campo da cultura a partir da oposigo dominantes versus dominados, procurando entender, através das ofertas de lazer, 0 lugar, o modo de ser € 0 que era dito pelas classes populares, escolheram o circo como um de seus mediadores, 2 fim de demonstrar 0 quanto as manifestagdes populares ¢ as relagdes sociais “simples” da zona rural foram “invadidas” ¢ “aniquiladas” pelas relagdes econdmicas dominadoras da “cultura de massa” ¢ pela “indistria cultural Este tema da cultura de massas, que me parece nao conter a possibilidade de uma discussio conclusiva, tem suportado uma gama ampla de abordagens. No Brasil, predominam os enfoques considerados “apocalipticos”, como apontado por Umberto Eco ®, sobretudo em muitos estudos realizados sobre os processos culturais a partir dos anos sessenta, particularmente em relag&o ao circ, como os citados acima, Por isso, procurei entender a necessidade de considerar mais 0 processo de massificagzo da cultura que se vivia no periodo de andlise desta tese, do que propriamente me dediquei a discutir e adotar um conceito especifico de cultura de massas. Além disso, nos estudos apontados, © circo aparece tratado de modo estatico, tomado em si mesmo, sem que esteja articulado a uma historicidade dos proprios modos dos circenses se constituirem como grupo social ¢ histérico. Este no se mostra um caminho analitico produtivo para as perspectivas do meu trabalho, pois este angulo nao permite compreender a articulagao dos circenses enquanto sujeitos inseridos em um movimento historico de conformagéo da multiplicidade de produgdes culturais ¢ artisticas, em cada periodo vivenciado. Nesta dirego interessa procurar abordar estas questées sob 0 angulo dos processos de 7, José Claudio Barriguelli, op. cit. Maria Liicia Aparecida Montes, op.cit. Pedro Della Paschoa Jr. -*O Circo-Teatro popular" in Cademos de Lazer 3. Sio Paulo, SESC-SP/Brasiliense, 1978, pp. 18 a 28. 8, Umberto Eco, Apocalipticos e Integrados, Sto Paulo: Ed. Perspectiva, 1990 7 massificag&o da cultura, por permitir acompanhar © movimento de homens ¢ mulheres protagonizando a constitui¢ao do circo enquanto espetaculo Neste sentido ¢ que afirmo que no se pode acompanhar as perspectivas do estudo de José Cléudio Barriguelli, pois isso implicaria adotar a sistematizagao que este autor faz de alguns aspectos da realidade artistica do meio rural brasileiro, ¢ a sua analise do teatro popular rural, que, no Brasil, seria veiculado através do circo-teatro, ¢ com isso afirmar que este tipo de espeticulo seria um “processo alienador”, que mistificaria as relagdes conflitantes entre cidade ¢ campo”, Do mesmo modo, pouco me iluminam as afirmagSes de Maria Lucia Aparecida Montes sobre sero circo antes de tudo uma “arte profissional de palhagos, acrobatas domadores”, que se encontrava em decadéncia, pelo desdobramento que teve a representago teatral da comédia e do drama, Estes, ao conviverem com aquela arte do picadeiro, acabaram "quase que por elimini-la do espetéculo, dando origem aos circos- teatros que se especializam unicamente nesta forma de apresentagao” "° Entretanto, como nesta investigagdo me proponho analisar a constituigao da teatralidade do circo-teatro no Brasil, no final do século XIX e inicio do XX, ha componentes destes estudos que interessam considerar para um diélogo mais preciso Em primeiro lugar, menciono a maneira pela qual estabeleceram a relago entre surgimento do circo-teatro, cultura de massa e industria cultural, como parte do processo de descaracterizagao do circo como o espeticulo “mais popular". Esta perspectiva influenciou ou mesmo reforgou algumas anilises que seguem este tipo de compreensao sobre a historia do circo e sua “desagregacao” enquanto produgo artistica, como é 0 caso de algumas pesquisas historicas na rea teatral realizadas mais recentemente '', Em segundo, pelo fato de fazerem uma conexio historica sobre a formagao deste circo- teatro, que assume e reafirma uma certa memoria oficial, gerada de modo quase 9, José Claudio Barriguelli, op. cit, p. 18. 10. Maria Licia Aparecida Montes — “Cultura Popular/Fronteiras de conhecimento: espetaculos populares, formas de teatro, dramas e dangas dramiticas”, op. cit. 11. Os trabalhos, por exemplo, de Paulo Ricardo Meriz, op. cit. ¢ de Eliene Benicio Amancio Costa - timbancos U A influéncia do circo na renovagdo do Teatro Brasileiro de 80 € 90, Siio Paulo: Universidade de Sao Paulo/Escola de Comunicagao ¢ Artes, 1999, que fazem uma pesquisa histérica importante, apontando inclusive a presena da multiplicidade de linguagens na formacao do espetdiculo circense, nao deixam de incorporarem nas suas andlises as pesquisas € conclusdes daqueles autores 8 uniforme pelos memorialistas, que adota a nogio de fundagio da teatralidade circense do circo-teatro como resultado do ato individual de Benjamin de Oliveira Ha trabalhos sobre a historia do circo no Brasil que assinalam outras possibilidades de anilise. E 0 caso de Regina Horta Duarte que traz um recorte temporal e uma abordagem teérica ¢ metodolégica diversos dos estudos anteriores. Ao considerar ‘os espetéculos circenses como manifestagdes importantes da vida cultural mineira do séoulo XIX, esta autora no os analisa como manifestagdes populares ou eruditas, recusando conceitos pré-fixados relativos a cultura © @ vida cultural. Esta historiadora apontou um caminho que contribuiu para pensar os circenses como sujeitos histéricos que devem ser vistos a partir de suas praticas e significagdes, de modo a nfo perder a riqueza e a complexidade do conjunto das realizagdes daqueles sujeitos. Entretanto, quando se volta para analisar a introdugao do circo-teatro, afirma que este havia se tomado, no final do século XIX e inicio do XX, uma saida para a crise econdmica que as empresas circenses enfrentavam, principalmente para ocuparem 0 lugar dos mimeros de animais, que representavam um gasto invivel. E, diferentemente dos autores anteriores, pensa 0 circo-teatro como solugdo de possiveis crises econdmicas e nao como responsavel pela decadéncia do circo tradicional; contudo, mesmo demonstrando que jé havia representagio de pantomimas no periodo que analisou, como os trabalhos que ja citamos, também identificaré a “idéia inicial” do circo-teatro com a presenga de Benjamim de Oliveira, a partir de 1910 , fato que partilhei na elaboragdo da minha dissertagdo de mestrado Embora ndo seja seu objetivo discutir a historia do circo-teatro, José Guilherme C. Magnani traz questdes que consideramos bem pertinentes para o seu entendimento, Ele nao vé a introdug&o do teatro no circo pelo viés econdmico ou pelas influéncias “nefastas” dos meios de comunicago de massa; ao contrario, analisa uma série de vinculos entre eles que precisam ser levados em consideragao. Para o autor, interpretar qualquer transformagGo apenas como resultado da “influéncia descaracterizadora do sistema capitalista sobre um costume tradicional constitui, indubitavelmente, uma simplificagao do fenémeno” '?, Sua analise sobre a produgdo dos espetéculos circenses € 12. Regina Horta Duarte - Noites Circenses — Espeticulos de cireo ¢ teatro em Minas Gerais no século ‘XIX, Campinas (SP): Editora da Unicamp, 1995, pp. 203-204 13, Jose Guilherme Cantor Magnani ~ Festa no Pedaco. Cultura Popular ¢ Lazer na Cidade. Hucitec/UNESP, 1998, p. 33 9 realizada a partir do contexto de seu processo de produgao e circulagdo; assim, a estrutura do teatro citcense nfo pode ser vista como “réplica anacrénica ou sobrevivéncia grotesca” de qualquer género teatral, bem como no se pode pensar 0 cireo “como ponto final e desfigurado na evolugo de alguma forma de teatro em particular”. Bricolagem, para ele, seria o termo que mais se ajustaria ao resultado de um processo que, “com fragmentos de estruturas de diferentes épocas e origens, elabora um novo arranjo no qual so visiveis, no entanto, as marcas das antigas matrizes, e de algumas de suas regras”. E este carater de bricolagem que permite ao circo “transformar- se € 40 mesmo tempo conservar, em meio a sucessivas e aparentemente destruidoras influéncias, seu estilo caracteristico” '*. Partilho da perspectiva deste autor na anilise que faz sobre a produgZo do espeticulo circense e sua contemporaneidade com as diversas expresses culturais; sem nomeé-la, considera a singularidade da teatralidade circense e reconhece sua multiplicidade, adquirida em seu permanente proceso de encontro com a produgao e expressio artistica de seu momento, No conjunto destes debates, considero importante pesquisar as artes circenses nas tramas que iam tecendo as relagdes dos varios sujeitos implicados. O que se vé, naquele periodo, é que os artistas, empresarios, autores do teatro ¢ da misica, que faziam parte das mais importantes formas de entretenimento e dos empreendimentos culturais no Brasil, encontraram na teatralidade circense, nos palcos/picadeiros ¢ nos seus artistas um excelente meio de se tornarem visiveis para o piblico. eee Benjamim de Oliveira possibilita observar o didlogo criativo e permanente entre circenses e as outras produgdes culturais na passagem do século XIX para o XX. Através de sua trajetéria, & possivel compreender © circo como espago que permitia a seus integrantes tomarem-se produtores culturais e considerar as complexas relagdes estabelecidas entre os distintos agentes envolvidos na construgio do espeticulo: os circenses, os artistas ndo-circenses que se apresentavam nos picadeiros, 0 piblico empresarios dos veiculos de comunicagao e dos distintos espagos da produgio cultural 14. Idem, p. 67, 10

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