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+ © home, Que ee ment de anomple lo B. Mondin. + lund flo~ prota ema oe obi 3-Noodin * Hise da lia vol), G. Reale D, Anse 1 Gites é Dad lesen de waa flea, B, Mondin * 8 flame dens ae Pato, VAR A ete fem ead Pin ERB, Tet Meili Let de Maeda Ong. Kant + Glen flit cmnprine Osos ¢-VeL Sono Zac 1 Stee cols: Ui ind Psi, il Bal URBANO ZILLES TEORIA DO CONHECIMENTO E TEORIA DA CIENCIA PAULUS Dados Inerncionis de Ctalogacto na Publicaso (CIP) ‘(Chara Brailes do Live, SP, Beil) Zales, Ubano | “Teoria do conecimente teria daetnca/ Urbano Zilles Sto Palo: Paulos, 2005 — (Coleio Filoof) ISBN 978-85.349-2448.1 1. Chines - Aspect morse e cos 2. Cidncla Teoria "3 Canhecimento Teoria I. Se. 05.770 eop.21 nds par algo alter: Exitorapio PAULUS Impress escabamento PAULUS 2" edigéo, 2008 PREFACIO Este livro nasceu das anotagdes de aula da disciplina de teoria do conhecimento do curso ministrado aos alunos da Pés-Graduagio em Letras, da PUC-RS, durante o primeiro semestre de 2004. Com 0 objetivo de introduzir 0s alunos na reflexio filosofica, sto abordadas questées fundamentais do conhecimento em geral ¢, de modo especial, do conhecimento cientifico, na perspectiva atual, sem negligenciar a evolugao historica de conceitos e problemas no contexto ‘mais abrangente. Trata-se, pois, de uma introdugio sem pretenses de originalidade, Julgamos tratar-se de uma obra que também poderé ser itil a es- tudantes universitirios de outras éreas do conhecimento, numa época tem que eles sentem falta deste tipo de elaboragés orientagao dos estudos académicos. Esperamos que melhor avaliago do conhecimento cientifico a de, no decurso do tempo, ¢ abra portas para seu Urbano Zilles a 198 ‘Teoria do conhecimento eteoria da ciéncia ___. Conferéncias de Paris Lisbox: Edigoes 70, 1992. JANICH, Peter. Was ist Erkenntnis? Miinchen: C. 1, Beck, 2000, KANT. pura. Sao Paulo: Nova Culvaral, 1996. ‘ALMEIDA, G. A. de. Flosofia da Linguagem ¢ Logica entendimento bumano. (Colegio Os Pensadoves) MITTELSTRASS, Jrge szykloptdie: Philosophie wnd Wissenschafstheo- rie 4" Stuart Wear: Varig B. Meta, 198-196 MUSGRAVE, Alan, Alltagswissen, Wissenschaft und Skeptizismas. Tubingen: J. C,B. Mohr, 1993. PASCAL, Bt. Pnuements, So Paulo: Difusto Eutopia do Livro, 196. jan, 1987. PLATAG. A Repablica 5+ ed. Lisboa: Calouste Gulben __. Fédon. Sio Paulo: Ed. Martin Claret, 2003. — Fedro. Sto Paulo: Ed. Martin POPPER, Karl. The logic of sien jf gia da pesquisa defn. PRAUSS, Gerold. F in die Erkeminisheori 24 ed. Darmstadt: Wis- 197. 2 confit das merpreagiey, Riad Jans: Imago, 1978. losophische Theologie. Seuryart: Koblhammes, 2003. nschatstheorie fr Einsteiger, Wien: Facultas Verlag, 2002. SCHNEIDER, Norbert Evkemnoitheoriim 20, abrhandert. Sugar: Reclam, 1 SEDMAK, Clemens. Evkennen und Versteben: Grundkurs. Erkenntnistheorie und Hermeneutik. Innsbruck-Wien: Tyrolia Verlag, 2003. wn Einfibrung, nee lie Wissenschafistheorie. 4 v. Miinchen: C,H. _ Tractatns lgico-phil ZILLES, Urbano. Teoria 2003. 0 racional e 0 mitico em Wittgenstein Porto Alegre: EDIPUCRS, 1999. SQprobleme do conbesimento de Dens 2+ ol Bono Alegre! EDIPUCRS, {NDICE 5 Prefécio 7 Introdugio 15 L.A ORIGEM DO CONHECIMENTO HUMANO 17 1, Fundamentos do conhecimento cientifico 19 2, Conhecimento e opinizo 22 3, Ceticismo e duivida 26 © 4. Ciénciae fé 28 5. Conhecimento c origem da eserita 30 6. Esséncia do conhecimento 33. I, TEORIA DO CONHECIMENTO E EPISTEMOLOGIA 34 1, Epistemologia ou teoria da ciéncia 35 2, Teoria do conhecimento e teoria da 37 3.Caréter préprio da teoria do con! 39 4.0 conhecimento do empirico como verdadeiro ou falso 40 5. Conhecimento e linguagem 44 6, Obsticulos e virtudes 45.7. Caminhos do conhecimento ‘mento 50 Ill. PARADIGMA ONTOLOGICO 51 1. Adoutrina das idéias de Platio 55. 2, Aristoteles: uma filosofia a partir da observagio 60 3, Hegel: filosofia do Espirito do mundo (Welrgeist) 69 IV. PARADIGMA DA SUBJETIVIDADE 70 1. Deseartessa filosofia do racionalismo 77 2. David Hume: filosofia do empirismo =» 200 83 4 99 10 4 14 us. 121 123 125 128 130 133 134 136 139 139 141 142 150 153 162 162 166. 171 174 175 176 179 139 197 ‘Teoria do conhecimento eteoria da iéncla 3. Kant: a filosofia como limite 4. Schopenhauer: a filosofia como vontade V. PARADIGMA DA CRITICA LINGUISTICA VL PARADIGMA DA FENOMENOLOGIA VII. PARADIGMA DA HERMENPUTICA VII. © PROCESSO DO CONHECIMENTO 1. Qual o papel da experiéncia? 2, Como se formam e quais as caracteristicas dos conceitos? 3. As categorias 4. Conecito e juizo 5. A discussio dos universais IX. VERDADE E TEORIAS DA VERDADE 1, Teoria da adequacio ou correspondéncia 2, Teoria da coeréncia 3. Teoria do consenso 4, Teoria pragmatica X. TEORIA DA CIENCIA OU EPISTEMOLOGIA. 1.0 conceito antigo de ciéncia 2. O conceito medieval de ciéncia 3, O conceito modemo de ciéncia 4. Procedimentos cientificos 5. O caréter ético do conhecimento ciemtfico XI. NATUREZA, SUJEITO E CULTURA 1, Anatureza 2. O sujeito 3. Acultura Conclusio XII, A QUESTAO FILOSOFICA DA EXISTENCIA DE DEUS 1. Diferentes pers 3. Deus como origem da natureza moral do homem € como meta desejada CONCLUSAO BIBLIOGRAFIA Unsano Zuuss, nascido em 1937 em Nova Petr6pol doutorou-se em Teologia em 1969 em Minster, Alemi nha. Professor de Teologia e Filosofia na PUC-RS de de 1969, fol pré-reitor de pesquisa e pds-graduagao « 1988 a 2004. Recebeu o prémio de Pesquisa Destaqy 2002 do Governo do Estado do Rio Grande do Sul r area de Ciéncias Humanas e Socials, £ membro da Ac demia Brasileira de Filosofia. uu PARADIGMA ONTOLOGICO (Os homens sempre foram capazes de admirar-se da consciéncia de saber de coisas diferentes de si mesmos. De um lado, o pensar ¢ de ‘outro, o mundo do objeto parecem, nao apenas diferentes formas da texistencia, mas, se consideramos a oposigao entre sensivel e espiritual, pertencem, outrossim, a diferentes dimensdes. A questio complicads é tender como o espirito htumano consegue captar ou compreender em sua esséncia o que dele independe. Entretanto, para descrever a relagio entre consc pensar e objeto do pensamento, entre interior ¢ ex! Ne um lado, ¢ os objetos naturais, de outro, hé diferentes concepg5es, modelos ot paradigmas. Aqui nos limitaremos a0 paradigma onto- lgico. ‘A filosofia cléssica, determinada pela obra gigantesca de Platio ¢ Aristételes, até os tempos modernos, parte do ser objetivo, de uma ‘ordem racional dos entes. Isso significa que essa filosofia pressupde uma realidade que abrange, de maneira racional, as coisas singulares ¢ 0 ho- mem, As coisas ¢ o pensamento humano encomtram-se numa estrutura vacional do ser, A questao fundamental volta-se, pois, para aquilo que é que determina tudo e, por isso, é verdadeiro. Essa estrururaracional, na filosofia antiga, foi compreendida como estrutura do cosmo € no pensamento judaico-cristao, como criagio de Deus. ‘O mérodo da filosofia clissica consiste em perseguir a verdade do mundo, alei do universo,as leis enormas dos entes,liberrando © homem de tudo que o possa enganas, © homem participa essencialmente nessa ‘ordem do mundo. A razdo humana ésemelhante a realidade racional, pois s razfo subjetiva ea objetiva formam uma unidade, Basta que o homem “encontre o caminho que o conduza 4 visto da esséncia do mundo, que ia e-ser, entre aragigma ontolégico Slew étambém sua prépria esséncia, Sua tarefa consiste, pois, esencialmente em tornar-se racional. Sob esse aspecto, filosofia ¢ ontologia, f: um pensamento que par- te do ser, que pretende compreender. £ um saber pleno da realidade, Aprende a discernir entre verdade ¢ mera opinido, entre aparéncia ¢ realidade. Nesse sentido, Aristételes define a filosofia como “conheci- mento cientifico da verdade” (Met, 993b). 1, Adoutrina das idéias de Platao _A.relagio na acensio da déxa (opinito) para aepstéme (iéncs) Plato (427-347) precisa-a no mito da caverna (Rep.7) de maneira visual. O texto de Platio, em Repiiblica, inicio do livro VII, 6 0 seguinte: “Suponhamos uns homens numa habitagio subterineaem forma de caverna, aa abertaparealur, ques exendea todo. comprimento desta lédentro, desdea infanca,algemados de pernasepescogos, deta sles édado permaneser no mesmo lugar eolharem fre incapazes de voltar a eabeg, por causa dos grilhées; serve-Ihes de iluminagi0 um fogo que se queina ao Longe, numa emingnci, por detrs dele; ene a fogueira c 0s prisionciros hi-um camiho ascendente, 20 longo do construiuum pequeno moro, no genera dos diane do pablico, para mostaremas sua habilidades por i sionam também a0 longo deste muro, homens qu transpo deobjetos, que o ultrapassarn: etatuctas de homens ede a de madeira, de toda espécie d smo é natural, dos que os transportam, uns falam, outros seguem ealados “ Numa caverna, homens esto acorrentados de tal maneira que s6 podem olhar para a parede a sua frente e nela véem somente sombras, de objetos. Véem, pois, apenas imagens de objetos, que nio véem, a0 passarem na entrada da caverna, como também nfo véem a luz que ilumina essas coisas, projetando sombras contra a parede. Se, por um ‘acaso, acontecesse que alguns conseguissem virar a sua cabega e desco- briros objetos reais, constatariam que sua visio até entio era sombra de ‘uma realidade que lhes era oculta, Se, enfim, pudessem sair da caverna poderiam ver 0 fogo ow até 0 sol que so a origem ou causa das sombras as quais podem observar dentro da cavern. Platio prossegue a comparagio da cayerna: 0 52 ‘Teoria do conhecimento eteorla da céncia “Entdo, eels fossem capazes de conversar uns com os outros, nio te parece ue elt juaam ear nomeando objeto cx, quando devignaram o.que viam?~E forgoso.~ Ese prisio tivesse também um eco na parede do fundo? im dos transeunces falasse, nfo te parece que eles nfo julgariam Sendo que era a vor da sombra que passava?~ Por Zeus que sim. = De qualquer modo, pessous nessas condigdes ndo pensariam que arealidade {osse senio a sombra dos objetos. Impossivel.” (Rep. VIL, 515 b) O sentido da parabola 6 questionar o queaparentemente 6 evidente. ‘© mundo, no qual se move o homem, é imagem de uma realidade, da qual, no inicio, sequer suspeita. E prisioneiro de seus sentidos e de sua postura empitica. A experiéncia imediata dos sentidos ea correspondente linguagem ocultam o essencial. Sio apenas indicagiese ilusSes. 36 quan- doo homem deles se liberta, reconheceri que as coisas percebidas pelos sentidos possuem existéncia aparente ¢ apenas existem em virtude de um mundo verdadeiro que as fundamenta. Mas esse mundo verdadeiro esti subordinado a um prinefpio supremo a quem deve sua existéncia. ‘No famoso quadro de Rafael, no qual sio representados os filsofos da Escola de Atenas, Platio esté no centro, ao lado de Aristételes, susten- tando em uma mio 0 Ti dicando com a outra para o eéu. Essa posigio e 0 gesto simb tram perfeitamente a importincia do fundador da Academia, na histdria cultural do Ocidente, eaidgia de que dela se formaram geragSes de pensadores e artists. O dedo apontando para o eéu evoca, sem diivida, o mundo das esséncias inteligi existncia o fil6sofo afirmou e que para ele constitui o tinico obj uma verdadeira cigncia. No Timeu, Platio escreveu que o homem “é ‘uma planta celeste e nao terrena” (90 a) € que o céu divino das idéias € sua origem e o fim ao qual aspira. ‘A comparacio da caverna manifesta alguns componentes funds- mentais da flosofia plat6nica, O mundo da experiéneia sensfvel é uma realidade derivada ou secundaria. Do ponto de vista subjetivo, nuncs saber empirico deve ser considerado universal: a) Em proposigdes sobre conteidos de vides singulares, o mundo, sensivel é referido a um coneeito universal; b) Quando se faz um bre um homem, uma ago ou uma constelagio, emprega-se um critério de natureza pré-empirica. Tal eri- tério no foi adquirido por meio da experigncia, mas a fundamenta, Na comparacio da caverna, 0 prisioneiro, s6 depois de liberto, poderd superar a mera opinio e conhecer o empirico. Somente depois Paradigma ontolégko Baw de abandonar a caverna, teria possibilidade de, pouco a pouco, trans cender o empirico, para chegar as idéias. Depois, o ex-prisioneiro po~ der conhecer a mais clevada de todas, a idgia do bem e do verdadeiro (cepresentada pelo sol): “Finalmente, jug eu, sera eapaz de olhar para o sole de o contemplar, no ja suaimagem na 4gua ou em qualquer sitio, mas. ele mesmo, no seu lugae wente. = Depois jf compreenderi, acerea do sol, que € ele que causa as estagies € 08 anos ¢ que tudo dirige no mundo visivel, e que € 0 responsivel por tudo aquilo de que eles viam um arremedo.~ E-evidente que depois chegaria a esras conclusdes.” (Rep. VII, 516 b) Para Platio, conhecimento verdadeiro 86 & possivel em relagio a0 mundo transcendente das idéias. © acesso para compreender as idéias é aexperiéncia sensivel, pois esta pode enganar. O conhecimento das idéias baseia-se no pressuposto de que a alma, num estigio anterior, jé as tenha captado. Por isso conhecer é recordar, Para tanto, o pensamento deve ser disciplinado e libertado do erro. Verdadeiro conhecimento independe da percepcio sensivel, porque se realiza na forma de visio da l6gica abserata das i Segundo Platio, as idéias sio as formas, arquétipos atemporais, perfeitas, imutaveis, imateriais, das quais as coisas materiais si0 reflexos ‘ou cépias imperfeitas. Sao as formas perfeitas, conforme as quais 0 de- ‘miurgo organiza a matéria. As idéiassio as esséncias ou formas perfeitas que, gragas 4 reminiscncia, a alma reconhece nos objetos materiais como reflexos, c6pias ou sombras; si0 os universais que se aplicam a mais de ‘um objeto, opostos a estes mesmos objetos. ‘Nio $6 0s juizos de valor, mas também os objetos eas coisas si0 determinados de maneira genérica, como se pode ver nos conceitos correspondentes. Quando, por exemplo, falamos de wma érvore, de um carro, referimo-nos, cada vez, nao 86 a uma arvore diferente, determi nada no espago e no tempo, mas também mutével, ocasional, melhor ou pior. Tudo isso € referido a um conceito universal. Podemos fazer isso, porque atribuimos a objetos semelhantes, mas nunca id2nticos, caracteristicas comuns. Uma arvore, por exemplo, tem tronco, galhos ¢ folhas. Subordinamos o especifico e individual a conceitos gerais, classificagao abstrata de caracteristicas, ¢ 0 definimos com ajuda dicadores conceituais. Expressam-se semelhangas observadas por mei de conceitos que, por sua vez, nao sao de natureza espacial e temporal, an 54 ‘Teoria do conheclmento ¢teorla da cléncia ‘mas de natureza ideal, abstrata e metaempfrica. A experiéncia sensfvel s6 nos permite perceber que ha um objeto, mas nao o que ele é, © contetido da experincia seria impensével sem conceitos. ‘A matemtica oferece os exemplos mais claros de conhecimentos da pura razio, Quando se define que a soma dos angulos internos de um triangulo é 180°, nao nos referimos a um triangulo determinado, mas ao triangulo simplesmente, & idéia do triangulo, A conclusio de que todos os triingulos tém 180° nfo resulta de uma demonstragio empirica. E, antes, a aplicagao de um conceito essencial de trifingulo a casos particulares. Em sintese, o saber objetivo nio se resttinge ao que pereebs ‘com os sentidos. Observagdes do sujeito sio limitadas pelos individuais, Somente conceitos descrevem as leis sob as quais pode ser subsumido que observamos. Segundo a visio platénica, conhecer é ordenar as coisas em conceitos essenciais. Platio atribui a esses conceitos 0 carter de objetos abstratos ou ias ¢ os retine num ambito proprio da realidade. Interpreta 0 geral ‘como algo dado, objetivo, como ser que subsiste de maneira aut6noma, Nio s6 opée as idéias ao Ambito da experitneia, mas as coloca acima da experincia Por isso Platio é 0 fundador de uma filosofia designada idealismo. ‘Na visio de Plato, as idéias nio sio apenas instrumentos do pen- sa, nem apenas conceitos abstratos, mas i nas quais as coisas singulares participam e, subjetivamente, objetos AAs idéias formam uma realidade transcendente prépria. Si0 algo que subsiste em si mesmo. Constituem um cosmo préprio, i ignifica subordinar coisas concretas 2 pois asidéias possuem um valor ontolégico superior ao visivel. Segundo Plato, as idéias sio eternas, imutdveis, perfeitas independentes das condigées do espago e do tempo, a0 contrério das coisas perceptiveis empiricamente. Nesse sentido, as coisas, como puras imagens, t&m um valor inferior de realidade do que suas imagens originérias. Seu valor cesta condicionado pelasidéias, que determinam todo o mundo empirico. © verdadeiro conhecimento, 0 conhecimento cientifico encontra-se no mundo das formas, das idéias, mundo perfeito, imutavel e fora do tempo. Paradigma ontolégico 55 ae 2. Arist6teles: uma filosofia a partir da observagio A figura de Arist6teles & notével. Entre os escolésticos, era conhe- cido pelo epiteto absoluto o filésofo. Por Dante, na Divina Comédia, & apontado como 0 mestre dos homens. Entre os modernos, é apreciado por sua postura realista ¢ naturalista. Na eélebre pintura de Rafael, A Escola de Atenas, a contraposigio entre oidealismo de Plato eo realismo de Aristételes certamente nio deve ser exagerada. Arist6reles (384-322 a.C.) pensa, como seu mestre Plato, a partir da ontologia. Quer conhecer a esséneia das coisas ¢ da realidade, o uni- versal, 0 imutivel, suas razes ¢ causas tihimas, sua verdade objetiva. Contudo, o caminho para atingirisso, para Aristételes, 60 da observagio. Nisso difere essencialmente de Platio, Retine material para conhecer, racionalmente, jos e estruturas do ser. Aristételes ndo procura a esséneia da realidade num mundo superior ¢ ideal, mas nas coisas concretas. Volta-se a0 mundo real ¢ cotidiano para esclarecer teoricamente como funciona. Desenvolve 10 modelo causal-I6gico elaborado da realidade. Aristételes também investiga a forma de captar a realidade. E possivel conhecen, a partir da percepcio sensivel, abstraindo seu conteddo conceitual, Deve descobrir-sea esséncia nas coisas mutiveis, na sua origem, nas mudangas eno seu desaparecimento. A esséncia 6 inseparavel da coisa, da qual € prinefpio conceitual e constitui sua realidade. teles, € aquilo que algo é no seu estado final, completo; é 0 prineipio interno de algo 6a todo ¢ qualquer momento do seu desenvolvimento teleol6gico, € © torna aquilo que finalmente vem a ser pelo processo da mudanga da poténeia para o ato. © pensamento dos antigos gregos, de modo especial ode Aristéte= les, é formador da cultura ocidental. © conhecimento, como um desejo natural, mostra, segundo Aristételes, que o homem necessita de algo para se completar e, por outro, a importéncia dos sentidos na formagio do saber e os diversos graus de conhecimento. Vejamos, por exemplo, ocomeco da Metafisica: “Todos os homens tém, por natureza, desejo de conhecer: uma prova disso é ‘© prazer das sensagbes, pois, fora até da sua uilidade, elas nos ageadam por si mesinase, mais do que todas as outras, as visuais, Com efito, nfo s6 para + 56 “Teoria do conhecimento e teria da cca 1mas até quando nio.n0s propomos 0} assim dizera vista aos de a selhor nos faz conhecer tif = imeméria que deriva aos homens a experitncia, pois as recordagdes reperidas {amermaoiaproduemeetet duma inca experiencia, como firma Plo, bem, eriou a arte, ea inexperiéncia, 0 acaso (..). Portanto, quem possua a hogio sem a experiéncis,e conhera o universal ignorando o particular nele ‘ontido, enganar-se-& muitas vezes no tratamento, porque o objeto da cura & de preferencia,o singular. No entanto, n6s julgamos que hi mais saber € fo na arte do que na experiéneia,e consideramos os homens de ‘que os empfricos, visto a sabedoria acompanhar em todos, de prefeténcia o sabe. Isto porque tins conhecem a causa, eos outros nio. Com ‘os empiricos sabem 0 qué, mas ndo 0 porgné, 20 passo que os outros sabem o porgué ea causa.” (Met © texto da Metafisica, do qual apresentamos pequena amostra, permite observar as relagdes que Aristételes faz entre saber, ou co- nhecimento, ea experiéncia, entre algumas formas de saber: a do saber fazer (a arte) ea do saber pelas causas (a citncia), Definigdes, distingBes e classificag&es sio operagdes mentais que esto na base de todo 0 co- rnhecimento te6rico ocidental. ‘Aristoteles nfo ¢ empirista, no sentido moderno da palavra. Instru- mentalizaa percepgio sensivel, mas esta experiéncia do mundo exterior o concduz a descoberta do ser como tal, a uma ontologia como visio de conjunto, Aciéncia das tlkimas causas do ente. Na procura dessa esséncia, deve transcender-se a pluralidade das coisas individuais, suas mudangas, os universais, das condig6es primérias, sem recorrer a um mundo externo. Segundo Aristételes, o universal da coisa consiste: a) no seu substrato, na sua substancia, sua existéncia auténoma, a0 contrario de ‘suas propriedades que nio existem independentemente, Uma arvore, por exemplo, € uma substincia, Suas propriedades sio determinagoes que the convém (folhas verdes); b) €0 suporte daquilo que é comum ¢ ‘essencial a todos os individuos de sua espécie. E aquilo que estrutura essas coisas singulares. (© método de Aristételes difere do de Platio. Plato postula a ascensio da déxa (opinizo) a epistéme (ciéncia) como desenvolvimento do mundo da matéria e dos sentidos para um mundo transcendente, Se Avist6teles parte da realidade, deve elaborar formas de pensamento por meio das quais o universal, que determina arealidade, se torne inteligivel. Paradigma ontolégico 57 ae Esse método, para Aristételes, é a légica como a doutrina que, pensando, se deve seguir, para chegar a conclusdes certas sobre novos resultados. A légica é a doutrina das formas do verdadeito juizo, In- dica o caminko a seguir, para concluir racionalmente 0 ser do mundo ambiguo. Umacontribuigio de Aristételes para o desenvolvimento cientifico 6a l6gica causal. Distinguiu as categorias causa-efeito-nexo, Definiu quatro categorias de causas:a) causa efciente: a causa que pro- luz; b) causa final: a meta para a qual se orienta 0 acontecimentoy €) causa formal: a forma a realizar no processo; d) causa material: a matéria do processo causal Uma causa sempre deve ser ci iderada sob esses quatro aspec- 6gica causal entre causa-efeito descreve a relagio com variantes las, Aristételes salienta-a, 20 elaborar um conceito-chave que é0 movente nao-movido como representante de toda a causalidade, como comego de toda corrente causal. A Idade Média vé nele Deus, embora em Aristételes no esteja claro se 0 movente ndo-movido é um ator ou um acontecimento, F o lugar onde comega a corrente causal. E sua fundamentagio siltima. b) principio da nao-contradigio do pensamento (nenhuma proposigio pode ser simultaneamente verdadeira e falsa);c) prinefpio de exeluséo do terceiro (uma proposi¢io é verdadeira ou falsa, no admitindo um tereeiro). Juntamente com 0 io da subordinago necesséria do especifico ao geral chega-se 20 silogismo: ‘Todos os homens sio mortais (premissa maior). ‘Socrates € um homem (premissa menor). Logo, Sécrates é mortal (conclusao) “Ambas as premissas devem ser verdadeiras e unidas por um termo (homem) médio, que formao nexo entre a premissa maior ea conclusio, O silogismo € 0 raciocinio em que, ditas cereas coisas, segue outra coisa diferente por necessidade I Aristoteles divide as ci s, poiéticas e teoréticas, As teoréticas, por sua vez, dividem-se em fisica, matemitica e teologia ou metafisica, 0 58 “Teoria do conhecimento @teorla da ciéncla Por ciéncias praticas entende aquelas referentes as agbes que tém ‘seu inicio e seu termo no proprio sujeito agente. Sao as agdes morais. Por cigncias poiéticas entendc aquelas ciéncias relativas is ages, que tém io no sujeito, mas séo dirigidas a produzir algo fora do proprio . Tais si0, por exemplo, todas as produgdes da arte: a agio de construir, a agio de curar do médico sobre o paciente etc. As cigncias teoréticas sio diferentes, porque nio se referem agio nem & produgio, ‘mas tém como fim o puro conhecimento como tal. A fisica trata da substincia que tem capacidade de movimento, ou seja, da substincia sensivel, A fisica aristotélica é uma ciéneia qualitativa, que pesquisa esséncias e formas. Enquanto a fisica aristotélica é uma metafisica do mundo sensivel, as matemiéticas ndo se referem a coisas sensiveis como tais, ¢ tampouco a entes subsistentes separadamente. A metafisica, por sua vez, investiga asubstancia que esté além da fisica. ‘A definigao aristotélica de metafisiea 6 ciéncia das causas e dos prin- cipios primeiros-e supremos. Por outro lado, para Aristoteles, a metafisica €accitncia do ser enquanto ser: “Este uma cigncia que considera o ser enquanto ser eas propriedades que ‘competem enquanto tal. Ela nfo se identifica com nenhuma das ciéncias particulares: de fto, nenhuma das outras ciéncias considera universalmente 6 ser enguanto ser, mas, delimitando uma parte dele, cada uma estuda as dessa parte. Assim o fazem, por exemplo, as matcmticas.” Aistoteles também define metafisica como “teoria da substincia” ow ainda como “cincia teolégica”. Esse componente teol6gico se revela como portador do sentido tiltimo da metafisica Para ele, existe “filosofia primeira” (uma metafisica) justamente porque € s6 porque existe uma “substancia primeira” (trans-fisica) ‘Como doutrina do “ser enquanto ser”, a ontologia € a base da filosofia de Aristoteles, Ele entende o ser, no como conceito univoco, pois expressa uma multiplicidade de significados. Mas também nao é equivoco, Citemos um texto célebre: “0 ser se diz em miltiplos signifcados, mas sempre em referéncia uma unidade e a uma realidade detzrminada. O ser, portato, nko se dix. por mera homon(mia, mas do mesmo modo como dizemos‘salutar’ todo. que se refere & side: seja enquanto a conserva, Paradigma ontolégico 59 we enquanto é sintoma dea, seja enquanto € capaz. de reeebé-Ia; ou também fenquanto € obra da medicina; e poderemos aduzir ainda outros exemplos de coisas que se dizem de modo semelhante 2 estas. Assim também o ser se diz em muitos sentidos, mas todos em referéncia 2 um inico principio.” (Met. IT, 2, 1003 a 33-b6) Portanto, 0 conceito de ser nio pode ser reduzido a um génera, menos ainda a uma espécie. Na Idade Média, os pensadores dizem, por isso, que é analégico, embora este termo nao tenha sido usado por Aristételes para se referic a0 ser, ‘No texto acima, as virias coisas que sio ditas exprimem significados diversos do sex, mas, ao mesmo tempo, todas elasimplicama referénciaa algo uno, que éasubstancia, Portanto, o centro unificador dos significa dos do ser é substancia (owsia). Nesse sentido, a ontologia i centra-se, fundamentalmente, sobre a substincia, que é 0 pri relagio a0 qual todos os outros significados subsistem. Para estabelecer a tbua das categorias, Arist6teles deve ter-se vali- do também de pesquisas logicas e lingiifsticas, pois oferecem nao s6 8 significados primeiros e fundamentais do ser. A tabua éa seguinte: 1~substincia ou esséncia; 2 ~ qualidade; 3 —quantidade; 4 ~relagao; 5 —acio ou agi; 6 ~ paixao ou padecer; 7 —onde ou lugar; 8—quando ou tempo; 9 - paixio ou passividade; 10 Sltimas 56 aparecem nas obras de log sendo sem maior relevancia ontoldgica. As categorias condicionam ontologicamente toda a compreensio que o sujeito tem da realidade. ‘Atiststeles define a diferenga entre metafsica ecigncias particulares: “Eexiste uma ciéneia que considera o ser enquanto ser, eas propriedades que ‘enquanto set, mas, delimitando uma parte dele, cada uma e: as dessa parte. Assim o fazem, por exemplo, as matemética.” 1003 2025) Para Aristételes,adiferenga é que a metafisica considera 0 todo do sen, as citncias consideram apenas algumas de suas partes. = 60 ‘Teoria do conhecimento ¢teorla da lenis 3. Hegel: filosofia do Espirito do mundo (Weltgeist) Georg W. F. Hegel (1770-1831) deve ser considerado como o re- presentante mais significativo do pensamento ontol6gico nos tempos modernos, A tese de fundo da logica hegeliana € que pensar e ser coin cidem e que, portanto, a l6gica coincide com a ontologia. Também ele quer conhecer estruturas da realidade global, sua esséncia interior, quer descobrir o fundamento ontoldgico do visivel. Pressupde que o pensar pode abranger 0 ser: © pensamento de Hegel é radicalmente idealista, isto 6, no cen- tro de sua teoria esta a idéia. Seu conceito fundamental soa como uma teologia secularizada, O mundo deve seu surgimento auto-alienagio de um “Espirito absoluto”, e 0 desenvolvimento da realidade global é impulsionado pelo automovimento do espitito no caminho de retorno a si mesmo, ou seja, a uma forma nova e perfeita. Hegel parte do pres- suposto de que o mundo representa uma unidade, embora dividida, e esta unidade é espiritual e se realiza no mundo. ‘caracterizar-se o pensamento de Hegel com ‘A concepgio de que tudo 6 idéia vincula a doutrina hegeliana 3 inspiracao da filosofia grega quanto ao dinamismo de seu pensamento, Dizia Heréclito: “Tudo flui”. Tudo é devir. Tudo ¢ parte de um processo € como tal deve ser pensado. Hegel admire que o mundo é acessivel 4 razio. Para ele, hi iden- tidade entre pensar e pensado, entre certeza subjetiva e realidade obje~ va, entre afirmagio racional e realidade. Hegel concorda com o velho Parménides, que dizia: “O pensar ¢ 0 ser sio a mesma coisa”. Para isso, Hegel distingue, dentro da consciéncia humana, entre razio e intelecto. 2) O imtelecto abrangea percepgao senst tidiana ou nas sulares, quando el Analisam-se, pois, partes ou aspectos parciais, isolando as diferentes coisas coneretas de seu contexto. Assim o intelecto fundamenta o que precede todo 0 conhecimento da razio, o saber necessirio de objetos ‘como a capacidade representada, nas ciéncias, de filtrar nos fendmenos as forgas eas leis da narureza. O intelecto éa faculdade que abstrai conceitos determinados ¢ que se detém em sua determinagio. Ele distingue, separa define. Escrevena Grande Enciclopédia:" A atividade do intelecto, em Paradigma ontolégieo 61 we geal, consiste em conferir ao seu contetido a forma da universalidade: mais precisamente, o universal posto pelo intelecto é universal abstrato, que, como tal, é mantido solidamente contraposto 20 particular, mas que, desse modo, ao mesmo tempo, também é determinado, por seu tumo, como particular: A medida que opera em relagio aos seus objetos, separando e abstraindo, o intelecto é 0 contririo da intuigio imediata e da sensagio, que, como tal, rel: ceiramente com o conereto € permanece parada nele”, Para Hegel, o intelecto é a poténcia que dissolve e afasta do parti~ cular, elevando ao universal. Mas o intelecto permanece encerrado n0 finito, no abstrato cristalizado, tornando-se vitima de oposigdes que ele préprio cria, Por isso 0 filésofo deve ir além dos limites do b) Na razdo, ao contrario, as impressdes sensiveis, as coisas singu- lares, so unidas ao que penetra sua visio imediata, os conceitos. A razio realiza-se como unidade do especifico edo universal, como compreensio da realidade em si, do todo, na consciéncia finita, Razo €conhecimento do Absoluto através da consciéncia humana, é conhecimento abrangente e compreensivo. Ir além dos limites do intelecto ¢ peculiaridade da razo, que tem um momento negativo e um positivo. O momento negativo Hegel cha- ma de dialético, em sentido estrito, ¢ consiste em remover a rigidez do intelecto e de seus produtos. Com isso a razio torna-se as ecto. re. © homem eleva-se acima de sua dependéncia da natureza, enquanto conquista a visio do universal. Li- berdade é visio da necessidade, do universal, do objeto, Hegel interpretou essa diferente dimensio de razio ¢ como hierérquica: cto a) Na percepgio sensivel, véem-se os fatos coneretos em sua plu- ralidade de propriedades e relagdes, Essas constatagBes empiricas sf0 colocadas através dos con 0 ambitodas determinagdes universais, Tal capacidade do homem, para Hegel, deve ser vista como capacidade do intelecto, Na Fenomenologia do Espirito, dedica um capitulo certeza sen- sivel. Escreve: "0 comtetido concreto da certeza sensivel faz com que ela apsrega imediata- ‘mente como 0 conhecimento mats rico, e mesmo como um conhecimento de infinitariqueza para o qual nenhum limite pode ser encontrado, seja quecami- = 62 ‘Teoria do conhecimento e teoria da cénla hemos fora espago eno tempo, pea division inti de um fragmento tirado dessa plenitude. Além disso, a certeza sensivel aparece como a mais verdadeira, is ‘ela nto abandonou ainda nada do objeto, mas o tem diante desi em toda a sua completitude. Na realidade, porém, esa certeza se mostra ‘como a verdace mais abstrata emais pobre. Do objeto que ela conhece,enuncia apenas intoele eau verdade cons soment ser da ota. orseulado a conseiéncia 6 nessa certeza, apenas como puro Eu, Ou se, Eu sow af somente como puro este, €0 objeto igualmente apenas como puro ito.” (pp. 347-348) ‘Em outras palavras, certeza sensivel é algo seguro, mas niio é co- nhecimento por conter apenas uma relagio conereta entre um objeto € em determinada situagio, Tal verdade 6 limitada e no pode dar apoio ao conhecimento. Diz Heg “Para examinar a verdade desea certeza sensivel asta uma experiénca simples Anotamor ex vers por nro, Una verdade ad pre sex ant wr escrito ¢ tampouco pelo fato de a conservarmos. Olhemos novamente 2 a, a verdade anotada, e entio devemos dizer que clase tomnou insipida. O agora, que éa verdade que 0 agora como tal se conse: 5c, é conservado, isto 6, tratado tal como se apresentou, te. Mas ele se mostra, antes, como um nio-existente. 4 noite, Igualmente se conserva, com relagao ao dia que lum agora que no é dia, ov sja, como um agora ques contro Gum agri ae feterminado como algo que permanece ¢ se conserva porque Outro, os disc a ois noe Jusament por is se agora € ainda to simpies con 26 idade €indiferente em face do que se joga em to dele, Assim como a noite nfo € o seu ser, tampouco cle € a noite © 0 ‘nfo €afetado por esse ser-outro. Tal ser simples, que é por meio da negagio, io & ner étambém indiferentea ser isto ou aquilo,chamamos um ‘o universal 6, defato,o verdadeiro da certeza sensive.”(p.349) }b) Além disso, como mostram as eiéneias, o entendimento & capaz deordenar objetos no ambito complexo das leis ea partir dai compreen- der também os processos dinamicos do devir, de acordo com essas | Dessa maneira, contudo, o intelecto ultrapassa o plano do constatavel. ‘A redugio do empfrico a processos e forgas, no interior das coisas, antes 6 ato da consciéncia, O intelecto pensante realiza um monélogo ‘0 esclarecer os feadmenos. A consciéncia objetiva é transeendida. O sujeito experimenta-se a si mesmo. —m ) Mas o Espirito quer mais. O intelecto s6 se coloca como sujeito em oposigao & percepgio dos objetos. Contrasta a consciéneia com 0 Paradigma ontol6gico Bae mundo, que existe independentemente da consciéncia. A razio, por sua ‘vez, quer superar a oposigao entre sujeito e objeto, entre pensar eaconte- cer, entreideal ereal. Quer compreender, nfo apenas os fendmenos, mas as prOprias coisas. Quer unir o mundo, que existe independentemente da consciéncia, com esta. Quer pensar totalidades e atingir a identida~ de entre eu e mundo, sujeito e objeto, entre subjetivo ¢ objetivo. Nio ‘quer refletir sobre o material dado, mas desenvolver conceitos num ato constituinte, criador, que possa abranger 0 mundo dos objetos. A au- ‘tonomia do mundo das coisas deve ser superada em favor da mediagio do pensamento e da realidade, ‘Afirma Hegel: “Torna-se claro que a dialética da certeza sensivel nfo € outra coisa senfo a simples historia do seu movimento ou da sua experigncia, a prépriacerteza sensivel nfo é outra coisa senio essa histria. Por essa razio, a conseiéncia natural chega sempre também a esse resultado que énela o verdadeiro, sobre isso faz a. ‘Mas sempre oesquece de novo e recomega o movimento desde o principio” (p.353). Enquanto 0 Absoluto e divino estiverem presentes no finito, ambos so mediados, podem formar-se conceitos que em si sfo racionai ¢ objetivos, que, a0 contririo do ent nas experincias univers subjetivos, mas, como idéias, reais imento, representam nao ape- las, Conceitos verdadeiros nao sio, pois, lénticos com a prépria coisa. Razao é a elevacio acima do finito, que parece eaético e difuso, pata o infinito, isto é, para o Absoluto e para 0 que dé sentido, A razio corresponde a exigéncia do pensamento humano em busca de verdade como presenga do Absoluto na consciénciafinita, como compreensio da unidade e do sentido do mundo. A causa primeira de toda a experiéncia e do mundo é a razdo; ela constitui a prépria substincia do universo. O Absoluto nko transborda nem as coisas (pois esté totalmente nelas), nem a capacidade intelectiva do homem (que é também uma das suas manifestages). Hegel, por parte dos objetos, distancia-se do dualismo moderno, isto 6, da constatagio de que 0 objeto é algo que difere da razo, Para cle, razio € realidade sio a mesma coisa, vista sob dois angulos dife~ rentes. No ato de pensar realiza-se razio objetiva, O dentro (o sujeito, a consciéncia) ¢ 0 fora (0 néo-eu, o mundo do objeto, o pensado) sio unidos. A razdo inclui realidade compreendida em si. Eessa identidade 4 “Teoria do conhecimento eteoria da ciéncia no ato de pensar, essa correspondéncia de razfo e realidade, esse saber soberano que Hegel também chama Espirito, ‘A premissa dessa ontologia é a afirmagio de que a razio domina ‘0 mundo, A razao é 0 principio do mundo, pois a realidade é racional. A razio existe no presente real Para comprovar essa tese, Hegel a histéria, sendo sua filosofia essencialmente uma filosofia da histéria. Hegel, todavia, no afirma que na hist6ria as coisas aconteceram racionalmente. Para ele, ‘o motivo essencial dos acontecimentos hist6ricos antes foram interes~ ses humanos, paixées ¢ desejos, impostos sem consideragao da lei, do direito e da moral. Apesar disso, parte da concepgio bil desse progresso histérico, para Hegel, nfo é 0 Deus razio que domina 0 mundo. Do ponto de vista formal, © proceso da hist6ria é semelhante ao pensar judaico-eristio. Do ponto de vista do contetido, a forga motora no é 0 Deus pessoal, mas 0 abstrato Weltgeist (Espitito do mundo). Por isso, a histéria é um processo de superagio, no om diregao ao reino de Deus, mas em diregio ao reino erdade e da razao chegada a si mesma. Hist6ria é um processo racional de libertagio, De maneira concreta, disso segue a divisio da hist6ria universal: no Oriente havia um livre, 0 déspota; na Antiguidade o: ppoucos, os cidadaos plenos; com o cristianismo comeca a liberdade de todos, que, na modernidade, éinstitucionalizada e realizada no Estado de Direito com a divisao de poderes. Hiegel mostra-se como o pensidor da erenga moderna na forca da razio. Em principio, a razo pode tudo. Tem a capacidade de pensar, sabe unificar-se com o mundo exterior, surgindo entre ambos uma equi- valéncia, Segundo Hegel, atinge-se 0 conhecimento méximo quando a razdo souber a si mesma como absoluta, Dessa maneira, o verdadeiro saber é autoconhecimento do Absoluto que toma consciéncia de si no pensamento finito. (O Espirito absoluto, a Razdo absoluta, a Idéia absoluta designa aquela poténcia que retine em si todas as limitagbes (a empiria, a hist6- ria, a oposigao de conceito e ser) ¢ as supera. No conhecimento pode captar-se ¢ compreender a realidade, a verdade. No saber absoluto, a certeza para mim ea verdade em si coincidem. ivres eram Paradigma ontol6gico 65 we © método de Hegel, que corresponde ao seu pensamento, de sintetizar contradig6es e oposiges, para conduzi-las a identidade, é a dialética. Tem 0 propésito de nio climinar incompatibilidades (tese, antitese), mas superd-las enquanto uma nova proposigio é mediada, assumindo € conservando aspectos certos ¢ positives das oposigées, para superar suas unilateralidades ¢ contradigdes. A sintese, que resume e transcende tese e antitese, realiza isso de maneira triplice: a) Deixa de lado 0 que deve ser superados b) Mantém o positivos ¢) Com isso eleva o conhecimento a um nivel superior, em uma, unidade superior. O método da dialética hegeliana éuma visio do mundo, do homem, eda historia. Enfatiza o desenvolvimento através do conflito, o poder das paixdes humanas que produzem resultados surpreendentes. Mas antes de ser um método de descoberta, a dialética é um método de expor A dialética é uma das di as filosdficas mais antigas, na na antiga Grécia, Significa a arte de discutir. Era 0 método usado por Sccrates, ao introduzir 0 diglogo em breves perguntas ¢ respostas, A ‘maiéutica socrstica, como meio para dar i uz, era precedida da famosa ironia, oposta aos sofistas para.os esvaziar da auto-suficiéncia cultural. ‘Apés essa fase negativa, deixa o interlocutor consciente de sua ignorén- cia, comego real de toda sabedoria, Os 8 de Platio representam a reivindicagio da sua dial Suprema na conquista daverdade. ‘A grande revoluco da dialética deve-se a Hegel. Identificando lética do campo do ser. Com isso tenta solucionar o velho problema do uno ¢ por meio do processo dinimico da Aufhebung, que signi= fica simultaneamente supressio, conservagio ¢ elevagio. Tal processo jocinio em si, regressos e voltas. O devir do novo inclui o desapar tente. Por isso, por um lado, hd sempre evolueio progressiva e, por outro, decadéncia, que possibilita a evolugio continuada, Esse processo evolutivo esté cheio de contradigdes e conflitos. Hegel resumiu a logica desse tipo de evolugio no conhecido mo- delo dos trés momentos: + 66 ‘Teoria do conhecimento eteorla da céncia, 1) Afirmagio (ow tese): um determinado grau da evolugio do ser; 2) Negagiio (ou antitese): sua destruigio ou eritica; 3) Negagio da negagao (o# sintese): desenvolvimento de uma nova afirmagao, assumindo pontos importantes e permanentes da posigio original, ampliando-a. Segundo esse esquema, a Escolistica medieval seria a forma de ‘conhecimento da época feudal. Seu mérito foi a conservagio e di do pensamento; seus limites, 0 compromisso com a teologia. Para que a teoria do conhecimento pudesse evoluir, teve de criticar primeiro a ica. © Renascimento ¢ o Humanismo superaram os limites da ica, colocando novas metas. A sintese de ambos representa a filosofia do conhecimento burgué: Hegel concebe 0 processo dialético global como composto de muitos processos parciais, todos conexos direta ou indiretamente centre si. Esses processos sio os meios através dos quais se desenvolve © processo global. Hegel usa 0 conceito de mediagio para designar a conexio e substituibilidade entre processos parciais e, por outro lado, a necessidade para que temas se possam desenvolver em novas formas € processos, Esse conccito de processo é chamado ver a realidade como processo dinamico e contra condicionam e determinam mutuamente. Karl Marx assumiu esse modelo, substituindo o Espiri como motor da evolugio pelas condigSes materiais, de modo especi mnomia. A dialética do Espirito tornou-se dialética materialista, que Engels, parceiro de Marx, ampliou para o sistema do materialismo \ético. Recentemente, Adorno protestou contra o otimismo do pro- {gresso de Hegel, levantando a hiptese da possibilidade de uma dialética hegativa. De certa forma, a dialética esté sob a suspeita de apenas ser uum balo com ar quente, mas no deixa de ser um método para pensar principio que exclui o terceiro, central na logica de Aristoteles, fcado profundamente. © absoluto do Espirito nao consiste fagdo das contradigées, mas na transcendéncia, ou seja, na ascensio para graus sempre superiores. Hegel parte do pressuposto de que a dialética nao é somente um método de reflexao filosofica, mas, simultaneamente, um momento do processo do devir da realidade. Ao automovimento e dindmica do pensar corresponde o automovimento Paradigma ontolégico 67 as darealidade. Razio e mundo semprede novo se corrigem edesenvolvem para mais alto. Mundo e pensamento se elevam sempre mais. A verdade éuma espiral. ‘Hegel contradiz o pensamento moderno como seimp6s no campo das ciéncias da natureza. Af, ao sujeito investigador ¢ analisador se opoe ‘0 mundo dos objetos (processos orgiinicos, sociais e politicos). Conhe~

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