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OECOLOGISMO DOS POBRES! ‘Juan Martinez ALIER. Tracusac: Francisco MENDONCA Protessor Adunto do Departamento. Geogratia - UFPR ABSTRACT “Ecologism’ has put in question the captalistc market laws, mainly nits Globalization period, as a consequence of the Irresponsible appropriation and exploitation of natural resources. At the same tie, Ecologism’ has shown that the environment doesn't reduce itself at the scientific approach of nature. The present paper discusses some important aspects of Ecologism such as the women’s tole, Marxism, the neo-narodnism, and shows some of the environmental problems that originated from the production relations. ‘Ecologism that focuses on the poor is one point of view necessary to the environmental struggle in the Third Worl. ‘KEY WORDS: Ecologism, Environment, Poverty, Marxism, Third World RESUNO: (© ecologismmo tem colacado em cheque as leis capitalistas de mercado, principaimente na sua fase globalizada, devido & apropriagdo & exploragao inconsequente dos recursos naturais. Ao mesmo tempo tem apontado que 0 meic ambiente néo se reduz ao tratamento somente clentiico da natureza. O presente artigo ressalta aspectos importantes do ecologismo como a participayao das mulheres, 9 marxismo, 0 neo-narodhismo, etc. e rico em exemplos de problemas ambientals decorrentes das relapdes de produgao, O ecologismo dos obres é apontado como uma perspectiva necessaria as lutas ambientais no Terceiro Mundo, PALAVRAS-CHAVE: Ecologismo - Moio-ambionte - Pobreza - Manismo = Terceiro Mundo. \_ALIER, JM. El ecologismo de los pobres. In: Revista WANI, n.125, abril 1992 (pg. 2-42 a 50). Publicacion mensuel de la Universidad Gentroamericana (Uca) de Managua, Nicaragua Existem pessoas que, coma alegria que sentam pelo tiunfo ocidental na guerra iria, ndo querem ver que as lutas sociais em um mundo cada ver mais dasigual vo continuar. Tampouco véem que os lamentaveis regimes da URSS © da Europa de Leste trelou mais que fomentou estas lutas, ao enganar durante tanios anos a uma parte dos pobres do mundo, ao dividtlos entre si: os fiels & Moscou e os que tem conservado uma maior lucidez e se inscrto em outras tradigdes socialistas ou continuado com rebelides expontaneas ou resistencias surdas. N&o véem que a laje dos partidos buroeraticas “comunistas” se levantou finaimente e que outros pequenos partidos - cuja referéncia tem sido a Revolueao de Outubro de 1817 -, compostos mullas vezes de gente honesta porém sectaria, Jd no tem nenhum sentido. Nao vem tampouco que as obstaculos ecolégicos ao ‘crescimento econdmico, negado tanto por liberais como pela malaria dos marxistas, sa fardo sentir cada vez mais, e sera dificil entrotor os povos com promessas do crescimento econémico para todos, do automével universal. Tanta coguoira voluntéria deveria ser acompannada de erelhas de burio. Hoje se exalla o mercado como mecanismo racional de aplicagtio de recursos, e pretande-se, inclusive, que os problemas ecolégices surjam da. auséncia de racinaldade mercantil privada, como no caso da mal chamada “tragédia dos bens comunais”. Pelo contrario, 6 ponto de vista ecologista nos leva € duvidar dos beneticios do mercado. O mercado impée uma busca de ganhos, 0 que leva a um uso mais eficiente dos recursos, tal como se vii depois do rescimento dos pregos do petioleo em 1973. Mas o mercado nao garante que a economia se encaixe na ecologa, jd que o mercado sub-vaioriza as necessidades futuras @ nao conta os prejuizos externos as transagdes mercantis. Entao, se 0 mercado prajudica a ecologia, 0 que ocorrou nas accnomias planiicadas? N&o somente deram suporte a uma exploragao dos trabelhadores em benelicio de uma camada burocrética mas, além disso, tiveram uma ideologa de crescimento econdmmico a tode custo, uma grande ineficiéncia rio usa de recursos (devido em parte a auséncia de incentivos que © mereado proporciona). ‘Além do mais, thes taltaram a possibilidade, por auséncia de libardades, de ter movimentos ecologistas que contribulssem, com suas agdes, para Incrementar 0@ custos que empresas ou servigos estatals devem pagjar quando degradam o ambiente, ‘Assim, pols, a desaparigao destes regimes abre boas perspectivas para outras correntes socialisias (donde socialigme quer dizer igualdade, visho mundialista, controle comune! - nao estatal - dos meios de prodicao) © ‘especiamente para 0 ecologismo dos pobros. Os marxistas da Velha Esquerda tem de reciclar-se, se ainda vivern, mas os liberais nao venceram. ‘A pimetia vista, parece que o ecolagismo ¢ um movimento da classe média de alguns paises nor-allanticos, que cresceu nos finais dos anos 60 © prinepios dos 70, j& que ao fina! da década dos 80 se implantou eleitoralmente na Europa. Assim, parece haver mais preocupagio pela destruigao do bosque tropical em Washington D.C. ou em Berim que no Tropico. Nao obstante, existe um seologismo dos pobres, tdci! de descobrir nos recentes e fortes movimentos ecologistas da India e do Brasil, mas também identificavel na historia européia o {de outros continentes. A existéncia de movimentos sociais tao conhacidos coma Chipko na india ou 0 dos coletores da caucho no Acra (Brasil) - do qual Chico Mendes foio lider e o martr- suscita questdes tedricas que tém um alcance muito ampio. (Os movimenios sociais dos pabres estéo trequentemente relacionados com sues jutas pela sobrevivércia, ¢ sao portanto ecologisias - qualquer que seja © idioma em que se exnressem - enquanto que seus objetivos $40 definidas em termos das necessidades ecolégicas para a vida: energia (incluindo as calorias da comida), Agua, espago para habitar, Também s80 movimertos ecologistas porque tratam de retirar os recursos naturais. da estera econtmica, do mercado generalizado, da racionalidade mercantil, da valoracao ct (reducao do valor a custos-beneticios) para mante-ios cu devolve-los a ciko- noma (no sentido com o qual Aristételes usou a palavra, parecido com ecologia humana, oposto a cromatistica). Assim, uma ‘economia: moral" vem a sor 0 mesmo que uma economia ecoligica. Para alguns, 0 ecologismo sena unicamente um novo movimento social monatematico, proprio de sociedades prosperas,tipico de uma sociedade pos- materiaista. Tem-se que rechagar totalmente esta interpretagao. Em primeiro lugar, 0 ecolegiemo - com outros nomes - nfo 6 novo. Em segundo lugar, as sociedades prosperas, longe de ser pds-materialistas, consomem quantidades enormes e inclusive crescentes de maieriais de energia e, portanio, produzem uantidades crescentes de dejatos. Assim pols, @ tese de que 0 ecologismo tem raizes sociais que surgem da prosperidade, poder-se-ia colocer, néo em termos de uma correlacao entre riqueza e interesse “pos-matarialsta” pela quatciads do ‘vida, mas precisamente em termos de uma correlagao entre riqueza e produgao. de dejetos ¢ esgotamento de recursos. © movimento antinuclear somente poderia nascer al onde o enorme consumo de energia © a militarizagao levaram & Construpio de central nucieares. O movimento pela coleta seletiva de liso urbano somente poderia nascer ai onde as lixeiras estavam cheias de pldsticos © papel, @¢ onde ha raz6es para inguietar-se pela producto de dioxinas ao incinerar tais lixeitas. De antemao, seria abourdo negar que existe eose ecologismo da ‘abundancia, Mas também existe um ecoiogis mo da sobrevwencia, um ecologsmo ‘dos pobres, para o qual poucos chamaram a atengao até que 0 assassinaio de Chico Mendes, em dezembro de 1988, introduziu-o por via televisiva nos frios fares dos paises do Alantico Norte, A POBREZA CAUSA DEGRADACAO AMBIENTAL? ‘A investigagao da existéncia do contetido do que eu chamo de ecclogismo dos pabres, poderia ser apresentado sob ttulos como “expansao do ccapitalismo e suas conseqhéncias para 9 meio ambierte & para as pabras” ov, am outro paradigma, "as conseqUéncias sociais e ecolégicas da modemidade”. Mas, nestas lormulagdes, ca pobres estéa presentes come seres passivos, mesmo que eles terham sido os atores principas das lula para manter ou ganhar acesso aos recursos nalurais. Podemos aceitar facimente que trequentemenie tem hevido movimentos sociais de pobres (rurais e urbanos) lutando pelo acesso aos recursos natura (tera para cultivar, bosques e trras para pastagem, aqua para regar 0 campo ou para usos doméeticoa nas cdades, zonas urbanas verdes, fic), mas 0 problema central a resolver é o sequinte: as lutas pelo o0ss0 aos recursos naturals implicam ura vontade de conservagao, ou sao em si mesmas 10 uma ameaga de destruigao? A hipdiese de trabalho na busca do ecologismo dos pobres ¢ que, se aceltamos que 0 sistema de mercado generalizado e/cu 0 Controle do Estado scbre os recursos natursis implica uma légica de horizontes temporais curtos e que ndo assumem 05 custos ecol6gicos, entio os pobres, 20 pedir acesso aos recursos, contra o capital e/ou contra o Estado, contribuem ao ‘mesmo tempo para a consorvaao dos recursos. ‘A ecologa da sobrevivencia toma os pobres conscientes da necessitade de conservar os recursos. Esta consciéncia é muitas vezes dificil de descobrit Porque nao utliza a linguagem da ecologia cientiica (aqui ha uma diferenga com © ecologismo nor-atiéntico), mas que utliza Inguagens politicas locals, ae vezoe religiosas, Tem havido e ha muitas lutas socials dingidas a manier o acesso popular aos recursos naturais contra a privalizagio (ou contra a estatizagan). O mercado (@ também por outras razdes 0 Estado) nao valoriza os custos ecologions, que sempre sto de tundo, de tipo macro. Portanto, as lulas socials dos pobres para manter 0 uso dos recursos naturals fora da economia mercantil (ou fora da administragao estatal) sio, a0 mesmo tempo, lutas pela conservagao da naturoza. ‘Assim como a ideologia machista patriarcal influlu na desatenggo que a clencia econdmica mostra face ao trabalho doméstico nao remunerado, que é realizado habitualmente por mulheres, da mesma fotma a ideolagia do progresso © 0 esquecimento da natuteza tem influenciado na desatengao que a ciéncia ‘econémica mostra face ao marco acolégico da economia, face & valorizagao dos senigos ambientais & economia, nao valorizados em dinhelro ou pelo menos subvalorizados. Podemos perguntar Se 0 ecclogismo dos pobres € caracteristico das mutheres @ por que é. Na india, as contradic3es sobre 0 movimento Chipko Suscitaram esta questi. A participagao das mulheres nas lutas ecologistas dos obres é mais importante que a des homens, ao contrario que na luta ealaril {Quai sao as razdes? Podemos supor que as mulheres estéo mais prévimas da Natureza, quo se identifica com ela, talvez devido ao seu papel tAo limportante fa raprodugao da espécie? Ou sera que seu papel na divisio social do trabalho, seus tranalhos especializados no ambito doméstico, fazem delas as agentes da satistagéo das necessidades ecoldgicas da vida, a0 abastecimento de alimentos, de égua e de combustivel? Por isto, para investigar 0 ecologismo dos pobres tem 88 que estudar as relagdes entre pobreza, degradagao ecolégica, lutas sécio- econdmicas, @ 0 trabalho na consciéncla das mulheres. ‘A lrragem difundiga pela comissao Erundiland (1987) é que a pobreza 6, tanto ou mais que a riqueza, causa da degradacdo do meio ambiente. O argumento no ¢ de todo desinteressado, pois fixa as bases para um eco- management tecnocratico interacional, quo tera sou céa de gloria na Conferencia ‘do Rio da Janeiro em junho de 1992, e que se prentende mais ou menos ‘neutro” ‘nos confites redistibuiives. Deixou-se de um lado 0 ecologismo redistributive dos ‘anos 70, por exemplo o de Barry Commoner e 0 de Georgescu-Roegen. que na conteréncia de Estocolmo de 1972, propés que se instaurasse, por um determinado pariodo, a liberdade de imgracao sem restrigao no mundo 0 que, ‘sem margem de duvidas, levaria a concentrar os estorgos mentais e politicos para ‘Se chegar a uma maior igualdade enire os paises ricos e pobres, © ecologistno tecnocratico internacional evidencia a pobreza como causa de degradagao ambiental. Certaments, a imagem ecologista do n campesinato do Terceiro Mundo como good farmers (bons camponeses) (Wilken, 1987), @ muito oiferente da imagem da comissao Brundtland: camponeses © camponesas que queimam até o ultimo ramo da utima arvore do povoado porque no povoado nao tem gas butano disponivel para coznhat, ou camponeses que saciiticam a fertildads do solo porque nao tem tempo ou dinheiro para utlizar fertlizanies, Tanto no povoado como na cidade, as pobres nao tem agua, com os riscos para a sade que comporta 0 nido poder evacuar convenientements os excrementos humanos. Neger freqdentemente que a pobreza € causa de degradacao do ambiente seria ridiculo, A situagdo extrema seria a daqueles camponases ¥4o pobres que se véem obrigados a comer a semente necesséria para 0 ano seguinte. A pobreza pode reduzir radicaimente os horizontes Temporais e pode fazer subir drasticamente as taxas de rentabilidade. Nao obstante, tem-se que pensar de outra meneira. PARA UM ECOLOGISMO POPULAR OU ECO-SOCIALISMO. ‘Aceitamss que a pobreza ¢ uma causa do dogradagao ambiental, Ent, do ponto de vista cos pobres, podemos interpretar 0 desenvolvimento do Capitalismo (ou do sistema de mercado generalizado) como uma Reukbwirtschatt continuada e crescente para cobrit 05 gastos dos isos. Entendidos assim, 08 movimentos sociais dos ricos tém muitas vezes um contauido ecordgico (telvez somente implicito), jd que tratam de guardar os recursos naturais fora da ‘economia crematistice, mercantlista, sob controle communal. Em todo caso, tentam conseguir que a administragao econémica do estado assuma algumas responsabilidades como as ecol6gicas. Uma ampla confluéncia para o ecolagismo ‘popular ou eco-socialismo de diversas crigens, esta se manifesiando em diversos paises. Esta perspectva se opée a economia convencional, que vé uma causa de egradagio do ambiente na tragedy of the commons, e que propbe a stribuigo de direitos de propriedade sobre o meio ambiente ¢ 0 Intercémbio no mercado dos valores ecoligices ou a intervencéo do Estado com medidas reguladoras, ‘endo assim que os Estados, como agentes de industriaizagao e militarizegao, estio entre os maiores inimigos do ambiente. Em nossa perspectiva, pelo ccontrario, 0s movimertos radicais - explicitamente ecoiogisias ou nao - sé0 os que contribuem para a internacicnalizagao de algumas oxiemalidades, a0 fazor crescer 08 custos das empresas ou dos orgenismos do Estado, por sua oposi¢o a valoragao crematistca da natureza, pedindo que a natureza fique no terreno da economia moral, quer dizer, que a natureza fique no campo da economia politica popular, sem entrar na idgica do mercado nem na logica do servico ao Estado. Esta seria a perspectiva das lutas contra a contaminagio do ar nos bairtos populares das cidades, as litas por espacos verdes contra a especulacdo urbana, @ uta nos suburbios das cidades pobres para ter a 4gus polavel suficiente, a5 lutas contra 0 d6xido de enxotre no Rio Tinto, na Andauzia dos ‘anos 80, una Oroye, no Peru, contra a Cerro de Pasco Copper Corporation, ou fem lio, também no Peru contra a Souther Peru Cooper Coaporaton. Sao lutas Contra as empresas papeleiras para conservar os bosques, © para consenvar & terra contra as centrais hidroelétricas, pare salvar a pesca artesanal - considerando 0 mar sagrado, como em Kerala - contra a ulizagao abusiva da pesca industrial. S80 as lutas nos campos de aigodao da America Central contra a uilizagdo de pesticidas. So as lutas pela satide nos postos de trabalho, ¢ até ‘nossos dias sao todas as litas contra a mlitarizagao. Pode parecer que a incidéncia do ecoiogismo dos pobres 6 somante local, mas também compreende aspectes internacionais. Ha uma nova percepcao ‘2cclagica des contlitos intemacionais a partir dos paises em que os cidadéos nao podem emigrar faciimente para outros paises (0s mexicanos para os Estados Unidos, ou os argelinos para a Europa Ocidental) enquanto seus recursos sido ‘exportados a pragos que do muito pouco valor a necessidades futuras? Havera {orgas politicas que-reunam sob uma mesma perspectiva o nacionalismo @ a ‘economia? Podemos imaginar alguma colsa nova na historia? Sera que a politica de Gandhi era jd um nacionalismo ecologista? Por exemplo, a agricultura campesina mexicana 6, do ponto de vista da oficacia energetica e da conservacéo da biotiversidade do milho, superior & dos Estados Unidos, Entietanto, 0 México exporta petrdleo e gis barato para os Estados Unidos, que voltam a0 México, uma parte convartidos em milho dos ‘campos de lowa, um milho de impertagao de grande custo energético @ de débil interesse genético. Mas este miho pode aruinar facimente a agricultura campesina do México. Uma reagao nacionalista, pro-campesina, adotaria um horizonts temporal mais extenso, se negaria a exportar gas Ou petroieo salvo se. regos que incluam as necessidades das geracdes mexicanas futuras. Pode- Flamos assim chegar 2 uma teoria dos iniercaémbios ecologiamente desiguais. © ECO-SOCIALISMO E MAIS PROPRIO DO SUL QUE DO NORTE. Uma abordagem ecolégica poe na ordem do dia uma teoria do:sub- desenvolvimento como efeito da dependéncia. Esta dependéncia econdmica nado Se manifesta somente na infra-valorizacdo da forga de trabalho dos pobros do mundo, ou na deterioragao secular dos precos das matérias piimas exportadas, mas também no intercmbio desigual entie os produtes no renovavels ou lentamente tenovaveis - compreencidos os elementos fertlizantes do solo incor- Porados nas exportagoes agricolas - @ 0s produtos importados de escasso valor eco'égico. Esta ¢, por exemplo, a historia da exportagio da petrdleo e de gés, ¢ de outros minerais e metal, mas também a do guano e a farinha de pescado do Peru. Podemos acrescontar aqui também a reagéo contra as exportages de Fesiduos t6xicos @ os contlitos gerados pelas propostas eco-tecnosraticas para combater 0 "efeito-estufa” (cima mundial cada vez mais quente), Em algumas regides do mundo a questao da existéncia de um ecoogismo dos pobres cerece talvez de interesse. Por exemplo na historia do ambiantalismo norte-americano existe a ideologia Gifford Pinchot de que a Conservacdio dos recursos é compativel com sua exploragio, segundo um rendimento sustentével ao maximo, e a ideologla de John Mult € do Sietra Guub, de preservacao de alguns espagos naturais em seu estado selvagem puro (Yosemite Park). Nos Estados Unidos, nesta controvérsia dos primeiros anos do ‘século XX. era inutil perguntar-se de que lado estavam os pobres. Mas om ou'ras fegides do mundo, na historia e atualmente, podemos perguntar-nos qual tem sido © real vator da natureza para os pobies, ‘Sem duvida, a riqueza ¢ a causa principal da degradagao ambiental, j& ‘que 0 consumo derrocador de energia © materiais € maior entre os ricos, assim como 6 maior a produgo de dejetos que resulta deste consumo. E esta ecologia dda abundancia a causa da nova consciéncie ecadgica no:-atlantics. Mas tom-co que estudar a ecologia da scbrevivéncia, a nevessidade de conservagao dos recursos nalurais como pertencenies a esiera da economia moral, contra sua inclusao na valorizagdc crematistica, mercantiista. Frente & pobreza, & degradacdo ambiental, a exploragao interior e exterior, vivemos atuaimente 0 Inicio de um grande movimento de neo-narodnismo ecoldgico entra intelectual © ativistas, @ também entre os camponeses os pobres das cidades. A investigagao histérica deste tipo de fendmenos esta também se desenvolvendo. Os criticos ecologicos da ciéncia econémica que se identificam com os pobres do ‘mundo chegam & conclusao de que os custos ambientais nao sao ntemalizados fem por uma economia de mercado nem por um proceso de planiticacao centralizada. Houve uma intengao de introduzir a probiematica ecologica no debate sobre o calculo econémico om uma economia socializada, ros anos 20 ¢ 30, por obra de Otto Neurath e Wiliam Kapp, mas isso fol esquecido. As lutas s6cio-ecoldgicas so 0 veiculo para internalizar as externalidades negativas, para assumir 08 custos ecoldgicos, pelo menos alguns deles. Os custos ecolécicos aparecem na contablidade quando $0 assumidos por grupos socials: essa é a perspectiva dos pobres do mundo, muito diferente do ecologismo burocritico internacional. E no fundo uma perspectiva marxista porque vincula a critica ecolégica de economia com as lutas socials. ‘© movimento Chipko nos bosques do Himalaya © a luta contra as tepresas no vale do Narmada S80 conhecidos nos ambientes ecologistas da ‘América do Norte oui da Europa do Norte, mas no 0 Sa tanta no Méxzco, onde hha também lutas indigenas para a consarvacdo dos bosques contra as empresas papelciras. Nem no Brasil, onde em um contexto diferente, ha lutas contra a higrostetricidade, a mineragao de exportagao e a pecuana. O ecologismo intelectual tom crescido no Sul por influencia do Norle, mas recentemente estamos descobrindo os movimentos ecologistas expontineos do Sul, que so independentes da influéncla do Norte. Assim, na india est crescendo rapidamente 0 ecologismo atvista @ muito competente de muitos grupos, cujos trabalhos e esullados podem ver-se em forma resumida nos magnticos inioimes Intiulados The State of India’s Environnment. Ha um ecologismo socialista muito ‘vivo na india e também na América Latina estd crescendo, Entretanto, os autores @ ativistas latino-americanos raras vozes se citam entre si, © 0 quo so oscrove ou © que acorre na india nao repercute “nas indas”. O eco-secialismo & mais proprio do Sul que do Norte, precisamente porque no Sul as luias anticepitalstas S40 ‘muitas vezes, mesmo sem saber seus protagonistas, lutas ecol6gcas. Além do ‘mais, a perspectiva ecologica abre de novo a discussdo sobre o “intercambio desigual’, Cuba, por exemplo, tem sido na maior parte de sua historia um pais exportador de energia, -calorias humanas provenientes do agucar - , e, em troca de qué? Na historia do Peru, no século tual, ha movimentos sociais explicitamente diigidos contra danos ecoldgicos, contra a deposi¢ao acida. Em outros movimentos socials, © motivo ecoldgico nao € tao visivel mas também existe. Ele ¢ visivel nas iutas urbanas pela agua ou contra o lixo. Também no campo. Por exemplo no Peru, as tentativas de recuperagao dos pastos das fazendas polas comunidades, esto relacionadas com a complomentaridade econdmica de recursos da puna e de outros niveis ecoldgicos mais baixos, mas que também nascem do sentimento @ da realidade de uma usurpagao, © muitas vezes usavam argumentos juridicos mais que ecolégicos. A percepeao ecolégica se expressa as vezes na inguagem clentifica de fluxos de energia e materials, de recursos esgotaveis e contaminagéo. Essa é a linguagem de parte dos "verdes" ‘alemaes, além de ser a linguagem dos cientistas, Desta maneira, nao ¢ a Jinguagem utiizada por outros movimentos ecologistas atuais ol histéricos, ‘muttos dos quals estfo ainda por descobri. Por exemple, a luta dos pescadoros de Kerala, no sudoeste da india, que pescam com camataymaranes movidos a vela, contra os barcos forasteiros com motores a dleo, @ uma lua. ecologca que se opoe 20 esgotamento da pesca © ropde uma exploragdo desses recurses renovavels a uma taxa compativel com Sua reprodugdo. Ao mesmo tempo, apela para uma imagem co lugar como algo Sagrado. Néo houve uma luta parecida no Peru quando ae estava destruindo a pesca de anchova para produzir farinha de pescado para engordar os frangos do Allantico Norte? E em 1840-60, quando se estava destruindo o guano? © mesmo abe dizer do México e 0 petrcleo, da Bolivie e 0 estanho, da Araélia e 0 ads. Em Kerala, os pescadores apelam para a imagem sagrada que tem o mar. Que ‘social podria empregar-se no Peru, no México, na Bolivia, na Argéa’? NEO-NARODNISMO ECOLOGISTA. Na india, Ramachandra Guha tem identticado tres tendéncias entre os ativistas ecologistas: 08 gandhianos. os partidérios do "ecodesenvoWimento” e as “tecnologias apropriadas’, e os marxistes ecologicos. Guha chama a colaboracdo fentre epsas trés correntes. Mesmo que o "ecodesenvolvimento” © as “tecnologias apropriadas’ paregam uma mera adaptacdo do processo capitalista de produgao ‘a5 contradiqoes s0clo-culturais e ecologcas do Terceiro Mundo, a esquerda deve abandanar seus auspicios ao ecodeservolvimento @ as tecnologias apropriedas, pols estas estratégias de desenvolvimento podem inserirse nas jutas de classe ‘de nosso tempo. Assim, pode-se exempliicar um tal contexte com a lula dos setingueiros no Acre (Brasil). que culminou com o assassinato de Chico Mendes fem dezembro de 1988, ‘As Grandes correntes ecoldgicas se diferencia também pelas suas attitudes frente a ciéncia. Na India, por exemplo, os gandhianos sao menos favoré- Veils & ciéncia ocidental que as outras duras correntes, Em compensaga, os mar- xistas ecoldgicos tém freqdentemente grupos chamados “ciéncia para o pove", ‘que recorda o slogam dos narodniki russos da época de Piotr Lavrov: “Ciénela © Revalugao’, A idéia de que 0 conhecimento indigena trequentemente superior 0 oferecide pelos agronomos estrangeiros nao supde uma altitude ant-cientiica. ‘Ao conto, implica uma critica da insuficiéncia cientiica e da auto-suficiéncia ‘social desses técnicos estrangeiros ou desses vendedores de sementes @ Pesticidas. Freqdentemento, a8 intengdes de trocar as préticas camponesas em ome de uma facionalidade superior que se apresentava como centiica, mas {que era mé ciéncia, tem concidido com as tentativas de incluir na estera "econémica” uma produgao e uns recursos naturals que estavam, todavia, fora dela, © ecologismo néo é anti-cientifice. Porém, a perspectiva ecsidgica implica ‘uma integragio ou uma ariculagao dos conhacimentos de diversas ciéncia. Em todo 0 Terceiro Mundo crescera um novo ecologisme socialista, ou talvez neo-narodnista, 0 que teria agradado ao proprio Mark, jé que a0 final de sua vida simpatizava com a ala mais radical do narodnismo russo, Mesmo que os arodniki eram socialistas, pode parecer que um neo-narodnismo ecologista nao imolica somente uma atitude pro-camoonesa mas também uma atitude neutra frente & luta de classes, j4 que 0 populismo nao acentua nem a dlferenciagao social nom a juta do elascos. Nao obstante, na medida em que 0 neo-natodnismo ecologista é uma delesa de uma economia moral, de uma economia ecolégca, contra a penetragao do sistema de mercado generalizado, 0 enfocue populista pode ser ul para ‘entender algumas lulas sociais no Terosiro Mundo, e nao somente para entendé- as_mas também para apoidlas. & etiqueta de “populista” tem sido usada com ppleno conhiecimento do que significava na Russia na segunda meiade do século XIX: a crenga na transigao direta para o socialismo na base da comunidade ‘camponesa. Por isso 0 marxismo de Maridtequi foi qualificado de “populista’, 'Nos alt mos anos, a agricuttura medema 8, em geral a economia atual, tem sido criticada porque implica um gasto de combustiveis f6sseis. uma contaminagao do melo ambiente e uma perda de biodversidade maior que a agricultura ‘trackcional” © que a econcmia pré-industrial. De fato, e950 enioque ecoldgico da economia nao 6 novo: autores como Podolinsky (1895-1956), representaram uma corrente de pensamento cientifioo, ecologista, inclusive cientifico e ecologista-utdpico (Jose| Popper-Linkeus, 1838-1921), que crticau a economia 2:05: economistas. Essa corrente liga-se com a nova economia ecolégica # liga-se também com 0 ecologiemo expentines dos pobros. Em paisos com importante presenca camponesa, a critica ecolégica modema desemboca {desde 1985) num neo-narodnismo ecoldgico (aludindo aos citados narodniki russos). Mas também ha que constatar, as vezes, a auséncia de Iutas eoologicas, Inclusive de percepedo ecoldgica, apesar da existenca de problemas ecoldgios. LINGUAGEM POPULISTA? A linguagem populista, mals exatamente 0 narednik, no impade que 0 ecologismo dos pobres seja.compativel com a teoria eco-marxista de James ‘O'Comor, sobre “a segunda contradi¢ao do capitalismo’. Segundo James O'Connor, & “primeira contradi¢ao” entre a acumulacdo de capital ¢ a falta de der compra da. classe operdria metropoiitana explorada ou, om todo caso, a falta de poder de compra do proletariado e campesinato coloniais, ha que acrescentar uma “segunda contradicao". A expansao capitalista plore. suas préprigs “condigdes de produc” (partculamerte as condicoes ecolégcas), @ as tentativas do cepitalsmo para reduzir os custos da produgao extemalizando 03 gastos ambientais tam provocado em algumas ocasides reagées sociais, quer dizer movimentos ecologistas de protesto, Esta analse de O'Connor ~ também de Lett - , expica ao mesmo tempo a dnamica econdmica e ecoligica, ea dindmica social, Estes novos movimentos sociais se opdem ndo somente as empresas, mas também ao Estado, inclusive nos sistemas de economia de mercado, ja que as “condi¢des de produgao” s40 produzidas fora do mercado para converter-se depois em mercadorias. E 0 Estado o responsavel pela disporiblidade das “condigdes de produgao": zoneamento urbana, a égua potdvel, 0 ar respirdvel, minerais ‘© combustiveis fésseis produzidos por fenémenes geoldgcos que duraram mifheres de anos, e que devem ser mantidvos .a_bom prego o custo de uma guerra se for necessario. © neo-narodnismo ecoldgico poderia ter agradado a Marx, ¢ certamente ‘a Maridtegui, Marx recusou a perspectiva ecoldgica endo acrecitou nas virtudes sociais dos camponeses, mas por outro lado, fol no final de sua vida muito favordvel ao lado mais radical dos narodniki, que também eram socialistas © favoraveis as comunidades camponesas. Ha que usar a palavra narodnismo com suas conotagdes rurais, porque 08 trabalhadores.rurais ocupam um lugar realmente privilegiado no ecologismo dos pobres. Eies tem avesso direto a energia solar e se eles dispem de acesso a terra cuttwavel, elas também tem acesso aos elomontos fertilizantes do solo, & gua da chuva. Mesmo que os camponeses vendam no mercado a maior parte de suas cotheitas, eles podem retirar-se do mercado mais tacimente que os outros ‘rabathadores. Traduzindo narodniki por "populistas", como se faz habitualmente, a incluso dos pobres das cidade no ecalogisms dos pobres seria dbvia, Mas a palayra “popuiista” nao tem a significado socalista (Igualiterismo, controle social © comunal dos meios de produgao, viséo mundial, desaparecimento etetivo do Estado) que encontramos nos narodniki, assim como nas outras correntes da Primeira internacional. O uso da palavra narodniki no deve excluir a populagao urbana. © neo-narodnismo ecoisgico, tal e como apresentado aqui, responds a uma analise racional do conflito entre a economia ecolsgica © @ economia crematistica baseada unicamente em custos-beneficios. Também fornece argumentos para a critica de algumas economias modernas. Poderiamos erguntar se 0 neo-narodnismo ecolégico 6 simplesmente uma manifestacdo adicional do fenémeno geral de resisiéncias nativas e localistas contra a ‘expansao capitalista na periferia do mundo, ou entiio ¢o se trata de mais um exemplo do ceticismo com relagao a0 progresso da civilizagao, ceticismo que segundo os ideoldgos pds-modernos se manilesta na ressurrelgao as religioes, ‘nos nacionalismos de pequena dimensao, na desagregacao das ideologias. na derrota da visao da historia como uma analise universal do passado que leva a um projeto colativo para o futuro, A resposta a estas perguntas 6 negatva. O neo-narodnismo ecoldgico, 8 ideologia e a prética das lutas populares para a preservacao dos recursos naturals na esfera da economia moral, e é também uma defesa, que podemos apreciar em termos cientiticos, de uma economia que valoriza a biodiversidade usa fazcaveimente dos tluxos de energia e materiais sam esperanc: injustificadas nas tecnologias futuras. O neo-narodnismo ecolégico, nao é um ‘exemplo pés-moderno de falta de conflanga no pregreaso social ¢ cientiico, mas: uma via de modernidade alternatva, AS RAIZES DOS “VERDES”. Hé uma confluéncia entre 0 ecologismo popular ou eco-socialisme com cottentos foliticas do esquerda - cuje origem remota esta convencionaimente datada na época da Primeira Internacional, por volta de 1870 -@ com correntes de pensamento praticas slternativas, naturisias, pactistas e faminisias, desde o séoulo XIX até nossos dias. Estas sao as raizes dos "verdes’, que incluem nao somente as lutas indigenas para conservar os recursos naturals, nao somente _algumas lutas camponesas © operarias, mas também os pequenos nacionallsmos delensivos e anti-estatais. Por exemplo, 0 nacionalismo francés tem sido pré- nuclear, enquanto 0 nacionalismo bretéo ¢ anti-nuclear. As paiticas de esquerda, distantes do ecologismo popular ou eco-socialismo seriam dois ramos do ‘marxismo: o leninismo @ @ socal-democracia. E isto. porque simetricamente, por um lado © por outro, uma parte do pensamento ecologista, 0 ecologismo social-darwinista, esté distante de fato e é Contraria ao atual ecologismo popular eco-socialismo, Entre as pessoas mais destacadas por sua honestidade pessoal @ por suas constantes atividades em rol de um mundo mais justo, ha muitos miftantes de cortentes marxistas que se egaram a dar o paso facil e bem remunerado para a social democracia que muitos outros deram. ECOLOGIAE MARXISMO Agora que os Estados com planificacao econémica centralizada © ditaduras. burocréticas. esto mudanco de sisiema poltico e econémico, por reseao popular, hd que rocordar os velhos debates da Primeire Internacional Sobre os distintos modos de entender o socialismo, Assim, ha. que (econhecer que a critica de Bakunin contra Mare era adequada, e também que-os narodniki russos (como Lavrov) tiveram muito acrescentar, Os dos. ramos principals. de herdeiros do marxismo, a social- democracia - qua esteve disposta a paricipar na camificina som sentido de 1914 1918 © também nas guerras coloniais - e 0 Leninismo - que desembacou no desastie atual - no sao as tnicas corentes nascidas do movimento operario € radical do século XIX. E hora de recuperar as idéias do anarquismo © do populismo russo ao mesmo tempo que as idéias de Tolstol, Wiliam Morris. ¢ Gandhi. tanto mais que nestas correntes, houve uma maior sensibilidade ‘ecoldgica que ros marxismos predorinantes, Do outro lado, no liberalismo, 2 sonciblidads ecoldgica ectove também ausente. ‘Se pensamos que 0 estudo mais importante de economia ecolégica se Invwla The Entropy Law and the Economic Process (de Georgescu-Roegen, 1971) podemos entender os danos causados a relagdo entre o marzismo @ @ ciéncia ecodgica e a politica ecologista, pela incompreensdo que teve Engels - ue era 0 “assessor ciontiico’ do Manc- © @ significago do estudo dos fluxos de energia pata 0 estudo da economia humana, e sobretudo para o estudo do desenvolvimento das Produktivehraefie ou “forgas produtivas” na economia, A palavra Kraft significava “forca” no sentido tisico antes de 1860 mas fo| ‘substituida pela palavra Energie depois que comegou 0 estudo, nao mais das {orcas mecénicas, mas da conversio do calor om trabaihe @ viee-vera, matéria de estudos da termodindmica que poderia chamar-se energélica, Se Marx e Engels tivessem utlizado a expressio Produktiveenergion a unido entre a histéria energético-social marxista e a historia energético-ecoldgica teria podido estabelecer-se antes © por si mesma. A expresso Produktvekraette, pelo contrério, situou a historiogratia ‘manista, que s¢ supde materialista - mas no sentido econdmico, nao no fisico - ‘em um plano melafisico. Ha, portanto, um divérefo entre o maruiemo e a ecologia energética ha uns 120 anos. Néo scmente no pseudomarxismo de origem estalinista, hoje felizmente quase defunto, mas também os rriarxismos renovados da Nova Esquerda européia e norteamericana, que recusam ainda entrar nesta discuss40, mesmo que estejam ja a ponte de cair. A arrogdncia de origem leninista: que alguns grupos residuals marxistas exibem ainda frente ao ecologismo € hoje fraricamente ridicula. ESCASSEZ DE RECURSOS E CONTANINACAO Nao tem havido uma historiografia ecoléaica marxista. Também nao tem havido uma historiogratia ecolgica ‘burguesa’. Teria que comparar 0 emprego da ogo de Raubwirtschaft em algumas quaso acquocidas pagnas da geogratia humana de Jean Brunhes, ¢ a visdo da longue durée (logo prazo) na historia de F. Braudel, na qual a geogratia evolut lentamente, a economia val mais rApido, 6 poiltica é um assunto de curto prazo. Mas precisamente na época dos Habsburgo hha Espanha e de Felipe 1, a ecologia da zona americana do império espanhal procedenios - estudadas por A. W. Crosby, om Ecclogical Imperialism - , incluindo um grande colapso demogralico. As mudangas ‘eccldgicas nao se situam sempre na longue durée (0 longo prazo). Atuaimenie, o ccrescimento do consumo desnecessatio de energia e de materiais em alguns paises do mundo e @ acumulagdo de gases que provocam o efeito estula na atmosfera sio mudangas ecoligicas que acontecem rapidamente, mais rapido inclusive que as mudengas no sistema econémico. Sao questdes muito discuidas hd uns em anos, mesmo que seu impacto politico seja recente © mesmo que nao tenha felto parte da historiogratia marxista nem da historiografia econémica habitual Existem hoje economisias marxistas que se interessam pelas contradig6es entte a ecologia @ a economia Um deles, Elmar Altvater - em Die ‘Zukunft der Markias de 1991, ¢ também om seu kvro anterior sobre a exploregio da Amazénia - retoma as idéias de Frederick Soddy (1877-1956) sobre a Ccontradigao entre a lei da entropia e 2 llus4o de um crescimento continue da ‘economia. Insiste também na confusao cepitalista entre crescimento real da riquaza e crescimento ficticio do capital finenceiro, da divida privada e publica, Altvater estuda a dinamica da economia capitalista, particularmente a impossibilidade da econdmica fordista-reguladora nas grandes regides da pperileria econdmica do mundo. Nao basta dizer que as els da energética sao uma criagao do espirito humano, desenvolvidas a partir da introducao da maquina @ vapor na industria. Isto ¢ evidente. A questo seria se exisiem outros postulados, tiados evidentemente polo espiito. humano em outro contexte social, que [possam explicar os fenémenios termadinamicos nas experiénciasfisicas, quifnicas bioldgeas. Mesmo que se possa encontrar nos textos de Marc diversos indicios ‘ecolégicos, 0 marxismo e.0 ecologismo ainda nao se integraram. © ponto de inflexdo analitico dessa integragdo ha de ser a redefinigo dos contextos marxistas de forgas produtivas e condigSes de produgao. 0 enloque eco-socalista j€ nao destaca a contracigao entre a tendéncia ao crescimento da formagio de Capital e a exploragao da classe operdtia, mas ressalla as dificuldades que a ‘escassez de recursos @ a contaminagao criam para a acumulagao de capital. Até ‘agora o marxismo mais economicista que meterialista-energetista. Os valores ‘que nao fazem parte da economia, nem contam. nem saber como conté-los. Quer dizer, a crise do capital pelos danos decorrentes de suas condigies de produgéo somente se faria sentir através de valores de troca, pela elevagao dos precos. Efetivamente, nos anos 70 podia parecer que as taxas de beneticio do ‘capital dimnuiriam devido a elevacao cos precos de alguns recursos naturals que faziam crescer as rendas recebidas por seus proprietdirios. mas nos anos 80 a tend@ncia fol o contrério. Isto ndo nos diz nada de interessante sobre a articulagSo entre a ecologia © a economia capitalista, j4 que procisamente a problomtica ecoldgica nao se manifesta necessariamente nos precos, pois os pregos ndo incorporam custos como 08 ecologicos. Sao os movimentos socials e ndo 05 ppregos Os que fevelam 0s custos ecoddgicos. Que o peirdies tenha baixado de prego ndo significa cue seja mais abundante que ha quinze anos. indica somente que 0 futuro esta sendo infravalorizado, ‘© argumento ¢ particularmente relevante no México, um pais que exporta @ pregos baraios petrcleo © gés natural, que em parte retornam Cconvertidos - a baixo custo, porém com desperdicio energético - em importagdes de cereais que arruinam a agricultura camponesa. Neste caso, 08 pregos de ‘mereado podem ser questionados se se adota um horizonte temporal maior, que revalorize 0 prego dos recursos energeticos esgotaveis. A questo é, qual é 0 sujeito social cepaz de adotar esta estratégia do revalorizagio frente ao vzinho do Norte, que considera as importagées de peirdleo e gds natural nao mais em {ermos de vantagens comparativas - falsamente computadas -, mas fos termos inapeléveis de “seguranca nacional"? CIENCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE ‘As Sociedades ou 05 grupos socials atuam sobre 0 melo ambiente ‘segundo. as representagdes que se fazem de suas relagdes com ole, Estas Fepresentacbes faverecem ou, ao contrario, exercem um elo limtador sobre 25, ‘extragbes dovastadoras. A histéria da natureza, a nossa porcepcao dela, @ uma cconstrugdo socal, e por Isso pode decidir-se que a histéia natural também & historia Social, Alé @ grande experiénca colonial que comega um pouco anes de 1492 @ até a industhalizagio massiva da Europa, a relagéo com 0 melo ambients nido fol pensada como dominagdo e transtormagao da natureza mas-como intercambios com as foreas naturals frequentemente sacralizadas. em mitos ct cosmologias relgiosas. Talver algumas religibes, como o cristianismo, estavam jé predispostas a0 abuso ca natureza, mas de qualquer modo, a predispesigéo nao pode manifestar-se na escala’ atual. "Nenhuma civilizagao tem sido ecologicamente inocente’, escreveu Jean Paul Deleage com uma grande frase a francesa. Isso inclusive pode aplicar-se a civilzacées antigas. A salinizacdo de terras de irrigagao ¢ um fendmeno pré-industial © nao-ocidental. Nao somente faltou a inocéncia mas pode se também colocar em duvida a eliciéncia de ‘lgumas formas tradicionais de uso da natureza, Assim, @ agrcultura de roga (razatumbe-y.quems), sie provocave 4 rae ignores doe adictradore coloniais na Alrica € outros lugares spresentou-se posteriomente como modelo de conhecimento agrondmico e botinico indigena e inclusive elogiado como referéncia de eficiéncia energética. Recentemente, outros autores tem assinalato © fato evidente que, se no input energético da agricultura intinerante incluimos a Vegelacio qusimada, sua eficiéncia energética seria inferior inclusive @ da agricultura moderna, baseada em combustivels féssels. Se as calorias da vegelagdo queimada ndo se tem incluido em tais estudos dos fluxos snergéticos ‘na agricutura, 6 porque se suporia a regeneragao do bosque, mas Mc Grath, que trabalna no Para, na Amazonia brasileira, nao esta disposto a conceder fal presungao de inocéncia e de aficiéncia ecolégicas. Assim pois. talvez soja verdade cue nao haja chilizagéo ecologicamente inocerte. Mas a atual civilizapao Industral vivo de recursos armazenados em épo- ‘cas geol6gicas remotas, como so 0s combustiveis fOsseis. Em um ano de produ- ‘g80 econdmica comsumimos varios anos de reservas. AS cvilizacoes anteriores nao fzeram isso. Portanto, pode-se afirmar com J. P. Deleage, que nas civiliza- ‘ges “nas quais os humanos S80 a forga produtiva principal, a adaptagao ao eco- sistema 6 0 pencipio fundamental do funcionamento da socisdads", @ pode espe rar-se, portanto, que a mesma atencao que nossa civilzacao fem dedicado a0 desenvohimento de novas iecnologias baseadas irequantemente na expoliagto ‘dos recursos naturals, se haja dedicado @ se dadique nessas outras cilizagoes & ‘ebservagao e ao conhecimento do ambiente com vistas ao seu uso sustentavel. Essa 6 a razo para pensar que os camponeses ¢ camponasas s80 por si me mos bons conhecedores das condigoas ecoldgicas, sem necessidade de apelar a enhum romantismo a respeito das vitudes do homem primilvo ou ristico. © neo-narodnismo ecciégico aceita 0 fato evidente de que existe um ‘sonhecimento tecnico indigena ou camponés que com frequéncia ¢ superior & ciéncia oficial, Mas isto do supe, de modo algum, somar-se alegremente & flosofiairacionalisa para a qual dé mais ou menos no mesmo a astrcfisica que a astroiogia, Nao se dove despreciar 0 conhecimento popular que s@ expressa na agroecologia expontanea, ou na tradicao vegetariana popular, ou na medina alternativa, em nome do gremialismo cientfico de agronomos @ mécicos, Todas estas tradicdes naturistas - muito vinculadas, além de tracicbes do movimento operério de raiz anarquista -, nao devem ser despreciadas, mas ao contra. {As questdos ecol6gicas apresentam caractaristicas que as fazom pouco trataveis com 08 métodos cientilico-técnicos habituals. Por isto, a desconfianga, ecologista para com os cientistas estd justiticada sem necessidade de apelar filosefias irracionalistas da ciéncia, Em efeito, 08 problemas ecolégicos so complexos, interdiscipiinares. Alem do mais, multas vezes so novos - ao ter sdo ctiados pelas novas industiais -. Nestes terrenos, os cientistas, cujos métodos ‘80 reducionistas, movemn-se mal. Por isto, diante da grande incerteza de muitas quosi6es ecolégices, observames um fendmeno pouco freqdente em outres car- os: nas discusses sobre o risco nuclear, sobre 0 perigo das dioxinas e turanos, sobre 05 efeitos do aquecimento global, participam em pé ce igualdade os ativistas ecolegistas com os “experts” das universidades ou das empresas. Isso ‘no ocorre - talvez deveria ocorrer - nos debates sobre economia ou sobre medi- Cina ou sobre arquitetura, onde os experts néo dialogam com os aficionados Por qué ocorre isto em muitas discusséee ecolégicas? Por um lado 0° politicos habituais nao tem ccupsdo ainda este espaco, mesmo que estejam tratando de fazé-lo © a Conferéncia do Rio de Janeiro de junho/92 esta desenhada precisamente para promover a imagem de dirigentes paiticos estatals ‘como experts ou pelo menos interessados em ecologia. Por outro lado, traia-se de questoes muito incertas, multo complexas, de conseqiéncias a longo prazo, mas que precisam de decisdes urgentes. Isto da a oportunidade, nao para uma afronta entre ecclogistas e cientistas, mas pelo coniréo, pelo trabalho em comum onire ecologistas que respeitam os avangos reais da ciéncia em terrenos bem deimitados - onde cabe contrastar hipoteses - @ cientstas que, mals que “ciéncia para © povo" fagam ‘ciéncia com 0 povo", dispostos a confessar sua ignorancia ou melhor dizendo, os limites do seu saber - sobre os grandes e incertos problemas futuros que 0 ecologismo aprosonta, Quem pode hoje, honestamente, atacar a agroecologia em nome do avango cientifico-’écnico das biotecnologias? ‘Quem pode pronunciar-se contra os ecologistas em nome da energla de {usA0, claro, nfo a “fia” mas a quente? Nao seria esta certeza mais extravagante que a maior extravagancia de um curandeiro?

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