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| (MPOSTO | SOBRE A COMKEM Eytan. Pos AT EXTO a 33 4 a 108 IMMPOSTO SOBRE A RENDA Em face dos conitantes abusos das autoridades administrati- vas, recordemos algumas nogies bésicas que regem esses proce- dimentos de apuracao. 4 PROCESSO ADMINISTRATIVO 41 Process e procedimento. 4.2 Prinelpios que informam o processo sciministrative: 42.1 Ampla defesa — 4.2.2 “Due process of lao”. 4.3 Process adrainistrativo ¢ verdade material. 4.4 Arbitramento. 4.1 Processo e procedimento Para fins de equalizagio terminolégica entendo necessério esclarecer que ha distingZo entre os termos processo e procedimento administrativos. Lucia Valle Figueiredo! ensina que o termo pro- cess0 deve ser empregado quando estivermos diante de hipdtese ‘na qual ha controvérsias ou acusagdo em geral, 20 passo que 0 termo procedimento deve ser utilizado para referiz-se & forma de se desenvolver a fungio administrativa, por meio da sucesso de atos. Procedimento seria, assim, o desencadear de atos praticados no desempenho da fungdo administrativa em geral, podendo ou ‘do envolver situagSes de controvérsia ou acusagOes. Jé o termo processo seria dedicado exclusivamente aos procedimentos que envolvessem essas tiltimas referidas circunstincias. No mesmo sentido é a ligio de Agustin Gordillo? 42 Principios que informam o processo administrative Versando 0 contencioso administrativo na érbita federal, Ge- raldo Ataliba® ensinou que o processo administrative em geral é 1. Curso de Direito Administratvo, pp. 284 ss. 2. Procedimientocy Recursos Administratves, p. 23. 3, *Princfpios Informativos do Coatencioso Administrativo Federal”, Jn Revista de Informapao Legislation, 1978, n. 58, pp. 123 ¢ 9s, 110 In 05T0 SOBRE A RENDA regido pelos seguintes principios:' (i) ampla defesa — que se des- dbmen (la) deta de petigéo, (ib) direito a certidto, (jc) direito a produgio de provas, (id) ciéncia dos atos processuais, (ie) direi- to de vista, inclusive fora da repartigdo, (If) moralidade e legalida- de das provas; (i) igualdade das partes; (ii) lealdade processual;, (iv) celeridade e economia processual; (v) dever de sigilo e veraci- dade; (vi) supletividade clas leis processuais civis e penais. Aeexplicitagéo doutr néria ¢ normativa dos prineipios que re gem processo administ ativo impde-se como necessétia, em face da confusdo — ora em boa-fé, ora nao — entre interesse piiblico primério e interesse piib ico secundério$ A diretriz basica para contencio de abusos e arbitrariedades por parte da administra,ao repousa no principio da ampla defe- sa. Sobre este preceito basico e sua aplicagio a0 processo adm nistrativo, Agustin Gordillo® escreve ligdes inexcediveis, ilumi- nadas pela estrutura consstitucional: “Bl principio constitucional de la defensa en juicio, en el debido proceso, es por supuesto aplicable en el procedimiento adininistrativo, y con criterio am- plio, no restrictivo".(..) “Ello se explica, segtin ya dijimos, por el Caraterfundamentalment axiologicoquela Constitucén daa este principio, y por constituir practicamente un principio general del derecho, consubstanciado con la esencia misma de derecho, y de Jo que a veces se ha dads en llamar ‘justicia natural”. E passa a discorrer specificamente sobre as implicagbes do direito de defesa, nos seguintes termos: ”(..) a) Publicidad del Se pn aaa cae ae PROCESO ADMINISTRATIVO nt procedimiento, en primer aspecto manifestada en,¢l leal cono- cimiento de las actuaciones administrativas, lo que se concreta en {a llamada ‘vista’ de las actuaciones;el‘secreto’ del procedimiento sélo se justifica en casos excepcionales y por decisi6n expressa de autoridad competente. b) Oportunidad de expresar sus razones ‘antes’ de la emisién del acto administrativo, y desde luego también despues. c) Consideracién expresa de sus propuestas, en cuanto sean conducenites a la solucién del caso. d) Obligacién de decidir expresamente las peticiones (..).e) Obligacién de fundar las decisiones, analizando los puntos propuestos por las partes. f) Derecho a hacer patrocinar por letrado, teniendo su asistencia y intervencién en todo momento; (..) el abogado también tiene necesario aceso al expediente y puede efectuar todos los actos procedimentales que corresponden a la defensa de su cliente. Derechoa ofrecer y producit la prueba de descargo de que quiera valerse lo que comprende: a) Derecho a que toda prueba razona- blemente propuesta sea producida aunque deba producirla la propia administracién (informes, etc.). b) Que la producién de la prueba sea efectuada ‘antes’ de que se adopte decisién alguna sobre el fondo de la cuestién. c) Derecho a controlar la producién de la prueba hecha por la administracién, sea ella pericial o testi- ‘monial, como otra manifestacién del principio de la publicidad” (pp. 82.a 84). Por representar a chave de abébada de todo o sistema no que diz respeitoa relagdo administragio versusadministrado, este prin- cipio merece mais especificas consideracoes. 4.2.1 Ampla defesa A Constituigdo prevé a obrigatoriedade de se conceder aos acusados (seja na esfera administrative, seja na judicial) a mais ampla defesa, com os recursos a ela inerentes, assegurando-lhes 0 devido processo legal e garantindo-lhes, outrossim, o direito 20 contraditério, conforme dispée o seu art. 5, incisos LIV e LV. Hely Lopes Meirelles” trata da questo nos seguintes termos: “A defesa, como jé vimos, é a garantia constitucional de todo 7.0 Processo Administrativo e em Especial Tibutério, p26. ma | APOSTO SOBRE A RENOA acusado (art. 153, § 15). em processo judicial ou administrativo, ¢ compreende a ciéncia da acusagio, a vista dos autos na reparti- fo, a oportunidade pera oferecimento de contestaglo e provas, a inquirigdo e repergunts de testemunhas e a observancia do devi- do processo legal (due process of law). £ um principio universal dos Estados de Direits, que nao admite postergagio, nem restri- «gdes na sua aplicagio. Processo administrative sem oportunidade de ampla defesa, ou com defesa cerceada, é nulo”. processo admir istrativo deve buscar sempre, por defini- ‘do, a real esséncia dos fatos — abrindo oportunidade a produ- ¢40'de provas, a levar tamento de informagdes consistente com a finalidade do procec imento administrativo tendente ao lanca- mento. O procedimento da fiscalizacio, assim, infringira o principio constitucional do contraditério sempre que nfo conceder ao par- ticular a oportunidade de interagir e influir efetivamente no le- vantamento de informagées, tudo conduzido sob metodologia adequada as finalidades do procedimento em questo. Caso con- trdrio ndo tera sido deferido ao particular, como lhe assegura a Constituigéo Federal, o acesso 20 devido processo legal, com os recursos inerentes & sua defesa Repita-se, a fiscalizagao fazendéria tem por escopo a busca da verdade material, a real existéncia e esséncia dos fatos rele- vantes para a apuracio e recolhimento dos tributos. Impoe-se, assim, a averiguacao exaustiva e imparcial des eventos ocorrides no r undo dos fatos para a afericéo de sua ever= tual subsungio & descrigao normativa corespondente. & que a tarefa de verificacao e anilise dos elementos do mundo dos fatos, para concluir acerca «Jessa subsungdo — conforme j4 exaustivir- mente demonstrado--, éplenamente vinculada, submetida irrestri'a @ severamente & lei, sendo inadmissivel qualquer interferénc a valorativa por parte clo agente administrativo. Daf por que Ihe € vedado langar mao de presun¢éo para arrecadar imposto ou int- por penalidade. Deve, pois, a auioridade administrativa proceder a todo & qualquer levantamer to e averiguagio necessérios & exata con\- preensio do fenémer 0 ocozrico no mundo dos fatos para aferir a PROCESO ADMINISTRATIVO us. sua eventual adequagdo a hipétese de incidéncia tributéria, e tudo isso mediante ampla possibilidade de interacio por parté do con- tribuinte intressado? so por pari docom Na medida em que ndo se defere A autoridade administrativa nenhuma atividade valorativa, conclui-se pela inevitével subor- dinagao do proceso administrativo ao principio da verdade ma~ terial ou real. Em outras palavras, ndo se admite o predominio da vverdade formal no processo administrativo. Daf a recessidade inexo- r4vel de se respeitar, da maneira mais irestrita posstvel, o princi- pio constitucional da ampla defesa, ‘Toda rigidez em matéria tribitéria (principios do consenti- mento, da legalidade e da tipicidade) estan sero contomada ss fosse admissivel qualquer tergiversacao com o principio da am- pla defesa no curso do processo administrative que tem por obje- to o esclarecimento dos elementos necessérios Apratica do ato de langamento do tributo? 8. E a ligio de Aliomar Baleeiro: “Omissio ou suspeiio do declarante — ‘Ae prova eo onto (eam ao proves es inaiesea0preungtea ‘yeementes), 0 Fisco aceita a palavra do aujelto passivo, em sua feclarasto, alyulosctlopotcte feiuttetacderdor ide ot em relagio ao valor ou preso de bens, direitos, servigos ou atos juridicos, 0 Sato sve pe tronte rtcatroa nrces Dotson ie prestar nformaes osc, por dpi, come, col dee, jo de nao desgostar o contribuinte etc., as vezes deserta da ‘verdade ou da Sadho Nees css urn et sveteate pares se ‘srs das dn acs ut ros ec one sono, undone ars ivscenie sine ee oe ited ered en er ne Sect ge i ce Oe sind roo ora incr For nes nates ef Car 0 arbitio puro e sinples, indo ato absurd ou Bs vziahangas dee, © procedinestoh deer ana ges ernatedo Aaa seria na Fanon ote Coane gore male nopaohomsivornapetn pia rntelara oy matiphSvuopas heap sem tomotneetaes do art, 148, que, na cldusula final, ele ressalva, emt caso de contestagio, a valiagio conta to ‘ Siete, seja na instdncia administrativa, seja na judicisl ror pecirmes ce rt, 153, § 4°, da CF de 1967" (g.n.) (Direito Tribu- 2 pee Apt Code, Paneey Rear Avinitsie 63 e Abert Xaver Do Langementon Dita Tibia Brest, p03.” ne [BIPOSTO SOBRE A RENDA Dafa utilidade didiitica da diego do art. 142 do c6digo tribu tério nacional, determirando que “a atividade do lancamento vinculada e obrigatéria sob pena de responsabilidade funcional”, dispondo que o agente fiscal que vai praticar esse ato administra- tivo deve fazé-lo de fo'ma vinculada aos critérios legais previa~ mente dispostos, calcul ando o montante do tributo devido e, sen- do 0 caso, propondo a wplicacao da penalidade cabivel, tudo com absoluta submissio a Iv. Estas consideracées —a exemplo do que,ocorre com a legali- dade ea tipicidade, que decorrem do principio do consentimento —nio sio gratuitas e inoladas imposigdes do sistema normativo. Sao verdadeizos desdo >ramentos instrumentais de outro princi- pio supremo de conten 0 do exercicio do poder, que se conven- Gionou chamar de due rrocess of lav. 4.2.2 "Due process of law” # sempre necessétia a referéncia ao estudo feito por A. R. Sampaio Déria,"® que sintetiza a evolucao historica do instituto, desde o Edito de Conrad Il, de 1037, passando pela Carta Magna. de 1215 — atrancada, do rei Joao Sem Terra, pelos senhores feu dais em extraordindria e violenta organizacao teivindicatoria— pela assimilac3o do principio pelo direito constitucional norte- americano — na Conslituicéo de 1787 e respectiva Emenda n. V — até atingira Constituicao brasileira de 1946, que acolheu o prin- cipio do due process of lato" e seus desdobramentes. O significado da expressic due process of law & 0 de referir a& garantias de aatureza processual tendentes a inibir ou eliminar ¢ arbitrio nas restricdes descrita por lei — consuma-se mediante procedimento administrativo. Suas caracterfsticas e parametros fundam-se diretament2 em principios informadores de rigid dis- ciplina constitucional, sendo defeso & administragio pretender, por qualquer forma ou meio, praticar ato que exceda tal imitada e rigorosamente vinculada competéncia administrativa. No pro- cedimento administralivo nao basta a interpretagio razodvel, para usar a expressio de Recaséns Siches,* impondo-se a descoberta da verdade material. , Nesse sentido, veji-se trabalho exaustivo de Geraldo Ataliba' no qual, tratando da defesa contra ato administrativo de imposi- cao de penalidade, sustenta: “(..) em matéria de dreito punitivo, pre- valece 0 principio da verdade material sobre o princfpio da verdade for- mal, 0 contraio do que acontece em matérias patrimoniais ou de realizagio de desfgnics econdmico-patrimoniais (.). O principio da ampla defesa tem equi cabal aplicagdo. Na verdade ele no se restringe & esfera do direito penal, mas a todo o campo do chama- do direito punitivo. Era outras palavras, toda vez que estivermes diante do Estado desempenhando sua fungto de punir a reendida sob a designacao genérica de jus puniendi— tem plené, Ebsolutae cabal aplicabllidade a disposigao do §15 do art. 153 ds Constituigio, que trata de assegurar a ampla defesa. Ampla sig- nifica lata, extensa, aborta, irrestrita. E causa de nulidade qualquer 17. Teoria Geral do Diveito Tributirio p. 60. 18, Nueoa Filosofia dela Interpretacion del Derecho, p. 176. _ 19. "Prineipios do P; ocedimento Tributério", in Revista Fisco ¢ Contr’ buinte, janhov75, p. 464. PROCHSSO AUMINISTRATIVO 119 tipo de constrangimento ou restricto que reduza, de qualquer forma, a ppossibilidade que tem os acusados de deduzirem todas as provas teste- ‘urhais, documenta, perciais e outras,em seu beneficio, em defesa de seus direitos. Com relacéo ao termo ‘acusado’, empregado pelo § 15 do art. 153 da Constituicio, nao hd diivida que se refere nao s6 aos acusados perante a justica criminal, como todo e qualquer tipo de acusado de infragko de toda e qualquer norma juridica, inclusive na esfera administrativa” (g.n). Como desdobramento do principio da ampla defesa, salienta Geraldo Ataliba,® no citado estudo, a 6tica a partir da qual deve @ questo do Snus da prova ser analisada: “Nao pode Ser aplicado qualquer tipo de punigio com base em presungées. Por olitro lado, tam- bém ndo pode — sem ampla comprovagio, convincente aos olhos do julgador — ser reconhecida a existéncia ou autoria de qual- quer fato ilicito. Na verdade, em matéria punitiva, todo émus da Prova incumbe & Administragto, ficando ao acusado simplesmente a prova das circunstancias ou fatos que sejam excludentes, eli- dentes ou de quaisquer atenuadores das circunstancias que o pre~ juudicam (..).A aplicagio desangdes depende de prova que deve ser exas- fivamente promovida pelo fsco, de tal forma a convencer, por meios nfo indiciétios, mas diretos, 0 julgador, quanto procedéncia do alegado. Trata-se de uma protesao estabelecida em favor da liberdade ¢ do patriménio do contribuinte, que ndo pode ser punido com base em ppresungdes, Por isso se afirma que a verdade material prevalece, sempre, nesses casos, sobre a verdade formal” (g.n.). Entdo, demonstrada a ocorrincia de qualquer restrigfio a0 direito de ampla defesa do contribuinte acusado de ter cometido iregularidade, deve-se concluir pela nulidade do procedimento fiscal, desconstituindo-se o evertual titulo executivo nele las. treaclo.™ Essa afirmagio no deco-re de formalismo na andlise do aleance do prinefpio da ampla defesa, mas sim do necessario res- peito ao alcance do principio da verdade material, que nada mais faz do que garantir a adequada constatacio da ocorréncia, ou nao, de fato impontvel tributério e o correto enquadramento do fato imponivel constatado, nos termos do ordenamento juridico vi- 20. Idem, ibidem, 21. Vejase José Frederico Marques, “A Garantia do “Due Process of Law” no Direito Teibutério”, in RDP 5/28. val id no IMIOSTO SOBRE A RENDA gente! £ que, repita-se, toda a rigidez constitucional em matéria tributéria (principio da egalidade, princfpio da tipicidade ete.) estaria sendo contornada se fosse admissivel restrigéo ao princt- plo da ampla defesa no transcorrer de processo administrative que visa o langamento de tributo e/ou a aplicagao de penalidade, Deveras, a tinica mzneira de assegurar a plena eficécia dos princfpios constitucionais da legalidade, da tipicidade, isonomia, ‘capacidade contributiva etc,” é excluir de maneira eficaz qual- ‘quer intromissao volitiva dos 6rgéos da administragao na tarefa de apuracio e langamenio de tributo devido. Em outras palavras, repita-se, a tarefa administrativa consiste na verificagio da ocor- ‘réncia e das caracteristicas dos fatos ocotridos para, a partir dai, implementar a eplicagio da norma jurfdica. Se ao contribuinte no for deferidoo direito & ampla defesa, a administracao estaré decidindo o objeto do processo administrativo (verificagéo da ocor -xéncia do fato imponivel e suas caracteristicas) de forma eventual- mente divorciada da reelidade, o que, por via obliqua, ofende 22. A correlagto entre empla cefesa no processo administrative eres- peito ao principio consttucional da legalidade também nio passou desper- Cebida por H. W. Kruse que ensinow: La proteccin del particular contra Inedidas antijuridices de la 1dministracin, establecida especialmente me- dliante el principio de tipicicad de la imposieln, se considera actualmente como obvia, pero nunca se | egara a valorarla en grado suficiente.(.) Con ello (procedimiento) el debec oF impositivo, ya ena fase administraiva, que snormalmente lleva a tramitecin et caso impostivo, std perfectamente en situacin de hacer valer aus derechos y pretensiones frente alas autoridades finanéieras; con ello, a su vez, es deber oficial de éstas no pasar por alto simplemente el ejexicio de tales derechos y pretensiones, sino presiar alos imistnos la atenciér debida” (in Derecho Trbutari, p. 503). Dal o vigor da smanifestagdo de Agustin Gordillo, que sustenta que "Sila decisi6n adminis- ‘rativa no se sjustaa tales hechos reales, aunque elo resulte de una falta de informacion no subsanada por el particulay,el principio de la verdad mate- ssl lleva de todos modos 4 igual conclusion: el acto que no se ajuata Is YVerdad de los hechos se encuentra viciado” (in Procedimientoy Recursos Ad- aministrativos, p. 330). Vale, ais uma ver, invocar a lilo de Alberto Xavier, ‘que, tratando do principio da veedade material, esereveuo seguinte:”A ins. trusio do processo tem como finalidade a descoberta da verdade material Ro que toca a0 seu objeto; ela a ei fiscal conceder 203 seus 6rgéos de apli- «cago meios instrut6rios vas:ssimos que Ihe permitam formar a convicss0 ‘da existéncia e conteido do ato trbutétio” (in Do Langamento no Dieta T- ‘utério Brasileiro, p. 108). E novamente esclarecedora a lisio de Agustin PROCESSO ADMINISTRATIVO, m2 compromete os principios constitucionai ji tpiidade fastand a Seguranga unica” “ESSA © 2 A experiéncia prética no trato de questées submetidas a pro- essos administrativos impde um esclarecimento, visando a com: bater um preconceito— de conveniéncia ou por pura ignorinca, ‘io importa — que se ver formando no seio da admitistragio ‘Tem as autoridades administrativas considerado que o direivo & ampla defesalimita-se a0 direito do particular de alegar e com- Provar de plano a imprestabilidade de levantamentos, arbi. framentos etc,, como se 0 due process of law se limitasse a conferis 830 patticularo dreito de manifestarsua inconformidade’ Tal pri ia os sequne ermc:“Por hin nti ui con el rin deinen ate mencoar a pincpo deleted eae ees poscin al picipio dela verdad oral Exo es fundamental respeches 2 dec go ilies aot i sdninsinaen cod eerie mera ut ol pee dee one necoareeretfeee Sega ef is prbe apo pore pares aria ee restinilondhiniatvocegmoquedecroareren fee iis ipo dea verdad mates, debe enconseeenci juste noe hethnn [stninda de ge ls Sayan a sper) be pro ee Hr ont 2) Sia econ admnintavaseaederr is nes eo seat verdadeoy su avo esr vic poroot tes eet ae {ardamenain del pci ae sire pact seta dessin adminis deve serinepenene ek whaeo ee Yau por emo ncuron presse eis gu el ota ci puede er sligtoro pa tye nee sn clr prac adinadar gd cpio one lida dlosechona niente ergoerpnae ee pode aminitesivad volt de adminatng de no opera vr i de se snare more sila ies scart, tendo ata sere, Co Arai Bandi de Melo tsenoa a ren“) dad ue eh poder toned eae podem ar gaan depo bane cone taende een eee jin apelin ms avn melange forma pnp nda una de tvinesee henge EVES Gime ates Bp ‘Steriores de Riqueza”, in RDT 23-2491), ne ne m IMPOSTO SOBRE A RENDA io entendimen'o néo cesiste a superficial andlise e reflexéo fobre o alcance do dire A ampla defesa. A manifestagio contestat6ria do contribuinte é apenas o incio do procedimento contraditério a ser nstaurado no curso do proceso administ oo ‘vo, cuja conducio «leve pautar-se pela busca da verdade material acerca dos fatos envolvidos, sem nenhuma economia ou. restr.¢ao aos meios de prova disponiveis. Acontestacao, longe de esgotaro direito a ampla de‘esa, com todos os recursos a ela inerentes, mero pressuposto ‘le inicio do exercicio desse direito constitucio- nalmente conferido e assegurado ao particular. Yejamos pois, como essasndsGesinserem-se na dndmicn do procedimento adir inistrativo de apuracao da ocorréncia do fal imponivel e suas c rcunstancias, visando ao langamento. 4.4 Arbitramento Sea fiscalizacéo tiver alguma razio fundada para pretender cogitar desconsideras os esclarecimentos prestaces pelo contri, buinte, deve ela, fiscelizagao, pautar seu comportamento na lei que ~ ainda que a fiscalzagio nfo aprece esa realidade — seu comportamento esta inexorével e completamente limitado ao dis- posto na lei Ea lei fornece 2s mecanismos para solucionar eventuais difi- culdades na obten380 de documentos ou informagées idéneas; trata-se do procedimento de arbitramento.* Este instituto, toda- Jberto Xavier, tratando das investigagbes que devem ser reliza das no uo de provedimento administrate teente ao lananen 9, xplcnou suas ligbes anteriores. “Aeste questo a exporta do Diceto Tru tot bem clr: Dorinado todo ele por ur pip dengan fe lea poy snes ponds tn ps slp oer sa de consti em submeter a nveigngio 3m prs Inquisitrio ea valorasto dos éatosa um principio da verdad materi. Com tlatto, de entre oscaracteres gerais que se podem individualizar nest ipe de procediment sobressl dese oo, sun patureza mareadament | Siti po que toc is provas eo objeto process Por foxga dst ict ios oFaco nto et liitado as mele de prova acalados peo contin Icenem pe presided igen probate previ a0 necestiras ao pleno sonkecimento do objeto do proceso, salvo quai do 3 Ink excepclonalmente 9 autorize. © procedimentotibutilo de langamenta PROCESO ADMINISTRATIVO m3 via, deve ser analisacio e compreendido nos termos da lei e pauta- do por todas as exigencias sisteméticas da Constituigéo. Nao se trata de procedimento arbitrério. * Como se recorda, 0 art. 148 do cédigo tributério nacional, matriz legal das hipéteses de arbitramento, declara textualmente Oseguinte: “Quando 0 célculo do tributo tenha por base, ou tome em consideragéo, o valor ou prego de bens, direitos, servicos ou atos juridicos, a autoridade langadora, mediante processo regular, arbitrard aquele valor ou prego, sempre que sejam omissos oundo. merecam f€ as declaragées ou esclarecimento prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro le- galmente obrigado, ressalvado, em caso de contestagio, avaliagio con- tradit6ria, administrativa ou judicial” (g.n.). Nao hd como argumen- tar em sentido contrario. Como decorréncia das exigéncias siste- maticas da Constituicdo, a didatica norma jurfdica nao esté acon- selhando ou sugerindo; a lei — e o sistema — determina e impoe 05 apressados agentes fiscais o tinico comportamento que po- dem adotar na hipétese de pretenderem desconsiderar documen- tose esclarecimentos do contribuinte. Fora desse padrao sistemé- tico e legal, qualquer ato do agente administrativo é nulo; sua vontade ¢ irrelevante; seu poder, nenhum. O subsistema constitu- clonal tributério brasileiro proscreve o atalho facil do arbitrio e da presungio, Sobre o art. 148 do c.t.n., Rubens Gomes de ‘Sousa,* com sua habitual elevada densidade conceitual, merece transcrigio, pela autoridade e capacidade de sintese: “Langamento é 0 procedimen- reveste, pois, as caracteristicas de um verdadeiro processo inguisitdrio, ten~ do por objeto o fato tributériona sua existéncia histériea, de cuja verificagto 8 lei faz depender a pretensfo tributdria, A instrugSo do processo tem: como finalidade a descoberta da verdade material no que toea 20 seu objeto; © dat a lei fiscal conceder aos seus érgios de aplicagio meios instrutdrios \yastissimos que Ihe permitam formar a conviegio da existéncia e contetido do fato tributatio, Essa convicgao é, porém, uma livre conviegso, no sentido Ge que nio esté limitada a existéncia de regras legais de prova, onde os meios prebatérias tem, em principio, o valor que Ihes result da sua idone dade como clementos da referida conviccSo” ("LR. — Langamento por srbitramento — Pressupostos e Limites”, in RDT 31/174), 25. E prossegue: "Explicadas assim a natureza e as finalidades do lane famento, fica claro quea Norms doart, 148 do CTN regea ‘wloraoto quantita. m4 MIPOSTO SOBRE A RENDA to vinculado e obrigat6-io, privativo da autoridade administrati- va, tendente & constituiséo do crédito tributério pela verificagdo da ocorréncia do fato gurador da obrigasao correspondente, pelo célculo do montante de sido, pela identificagao do sujeito passivo @, sendo caso, pela prozosta de aplicacdo da penalidade cabivel (CIN, act 142). («) 01a rgamento (..) tem por fim.a constatacio ¢ aaloragdo qualitative esuantiatioa das situagBes que a lel define Gomo pressupostos da inposisio e, como conseqiéncie a cracio da obrigagao tributéria em sentido formal.’ (.)’A palavra valoragio é aqui usada no sentide de exame, anélise, verificagao: nao deve ser confundida com ava iagto, que apenas uma forma ou moda- lidade de anélise, como veremos adiante. A valoragao, neste sen- tido, pode ser qualitative: ou quantitativa. Por valoragio qualitativa entende-se o exame da qualidade do fato gerador, isto'é, da sua natureza (...). Por sua vez, a valoraefo quantitativa (..) consiste en apurar o valor em dinaeiro do fato gerador jé analisado pela valoracao qualitativa, pra 0 efelto de calcular 6 montante do tii- buto devido em fungao iesse valor, Pode ser uma simples opera- s80 matemética, quand» 0 valor resulte do simples exame (por exemplo: 0 valor de uma venda ou de um contrato), ou pode ser 2 que é um dos elementor integrantes do langamento, através dos quais este constata o prévio nascimento da obrigagio tributéria pela ocorréncia do {ato gerador e, mediante es a constatagio, cria o crédito tributério corres pondente (CIN, art. 142). Muito embora essa conceituagio juridiea do len ‘amento, adotada pelo CIN, zomo ato ao mesmo tempo declaratdrlo da obti- sacio tributéria e constitutio do crédito que lhe corresponde seja contro vertida em doutrina, ela ndo sessencial para dor aolangamento. cardter de um procedimento administratioo vinculado, ist é ndo-discriciondri. Por outras pa. lavras, olangamento € um piocedimento desta tltima natureza, e sempre 0 seria qualquer que fosse a texe doutrindria adotada quanto aos seus efeitos: de resto, o CTN é expresso em assim o definir (art. 142, parigrafo nico). A londisericionariedade dos aias da administraho tributaria em geral,e do lange ‘mento ex particular, decorre da natureza “ex lege” da prdpria obrigagto tibuséria, Ou Seja, da circunstincis de ser a obrigagio tributéria uma telagdo juridien derivada exclusivamente da lei como expressio do poder de soberania do Estado, Quando a Constituisto diz que nenhum tribute seré exigido ou au mantado em que a le oestubclesa (art. 180§29) ela ndoesth apenas procla- mando, no plano po'stico, uma garantia individual, mas tambem definindo, fo campo téenico, o meio de atuagio do Estado no caso particular. (.) No mesmo sentido que Vanoni, conclui Angelo Dus que, em matéria de langa- PROCESSO ADMINISTRATIVO ps uma operagio técnica mais ou menos complexa (por exemplo: a avaliagao de um imével)’, Eextraordinariamente feliza “utilizagao das locugdes “valora- sto qualitativa” e “valoragéo quantitativa”, feita por Rubens Go- mes de Sousa, pois trata de apartar, completamente, a ingeréncia de uma na outra. A valoragio qualitativa, adstrita A verificagio da ocorréncia do fato impontvel, precede a quantitativa e, mais importante ainda, nao é por esta (quantitativa) influenciada. No segundo momento, isto verificada a ocorréncia do fato imponivel © 9 conseqiiente nascimento da obrigacio tributaria respectiva, por meio da qualitativa, é que tem lugar a valoracdo quantitative, tendente & tradugao em ntimeros da obrigagao cujo nascimente foi outrora detectado, Entao, os limites de atuagto desta valoracio quantitativa circunscrevem-se ao escopo da sua funggo. quantificar. E-lhe vedado intrometer-se na questo atineite a0 nascimento da prépria obrigacao tributéria, cujo contéudo vise a guantificar. - Dai por que a garantia do contraditério, no caso de impugna- S30 de arbitramento (art. 148 do .t.n), 6amplae irestrita, asse gu Fando-se que 0 ato de quantificagio — objeto da obrigacio — nao mento, nto se admite discricionariedade administativa, podendo-se, quando sito, olerar una raargen de ero téenieo. De resto, a disericionariedade sini, istrative, como conceito juridico, exige premissas que, como adiante vere, imos, esto ausentes no processo de langamentotributirio, O preceito const, tusional da legalidade tributétia 6 atuado na lei complementar atraves da chamada ‘reserva da lt, isto &, da definicdo normativa de quais os eemen {5 $a relapdo jurdica tributaria cuja regulamentago é privativa da lel ere jtalda stricto sensu como ato votado pelo Legislativo e sancionada pelo Jexftutive. Esses elementos reservados lei ste: a instituigio, majorspto, ieduio ot extingio do préprio tibuto, a defnigto do fato gerador da res, pectiva obrigagio, a fxagio da sua alfquota e da sua base de cdleulo, [picdade das infragdes e a cominagto de penalidade, ea enumeragio das ipoteses de exclusio, suspensio e extinglo do ertitotributicio (CaN, ave 22, No tocante a majoragio do tributo, o dispositive esclarece, para ester, er a norma da ‘reserva da lei’ também & hipétese, que ela equipo modifieasio da base de cflculo, que importe em tomar o tribute, eerie Fars, mals oneroso (CTN, art 97, § 19. Por outras palavras, a majorasio Sp ibulo, pivativa da lei, nfo € somente a que decorce da sgravevie da stiquota” ("Um Caso de Fcsl0 Legal no Direto Thbutsrio: pasta ce ales es como base de efleulo do ICM", in RDP T1/19). 26 IMFOSTO SOBRE A RENDA esteja transformando-se em verdadeiro ato de pretensa criagio da propria obrigacdo. A quantificagao da obrigacio tributaria é tarefa absoluta e severamente submetida a lei e ao amplo contra- ditétio. Endo basta que ce defira oportunidade para apresenta- 0, pelo particular, de dé fesa. ImpSe-se a verificagéo dos elemen- tos probatérios trazidos pelo particular, abrindo-se a avaliagao contraditéria reclamada 2a lei e assegurada pela Constituicio. Neste contexto, imptese a consideracdo das presungGes ¢ fic- Ges legais, tdo largamerte utilizadas, especialmente em matéria de imposto sobre a rence, no direito brasileiro. Recordemos, pois, as nocdes de presungao ¢ fiecéo legais. 5 PRESUNCOES E FICCOES EM MATERIA TRIBUTARIA 5.1 Pensamento alienfgena (e antecipacio de algumas considerages): 5.1 Referéncia a doutrina italiana — 5.1.2 Referbnca dt doutrina espa- hole — 5.1.3 Referéncia a doutrina argentina, 5.2 Doutrina brasileira 5.2.1 Na Teoria Geral do Direto— 5.2.2 No chamado dretotributdria. 5.3 Cousiderapdesterminolégicas:5.3.] Presungioe fegio-—5.3.2 Elio eva, 5.4 Consileragho eric. 5.1 Pensamento alienigena (e antecipagao de algumas consideragées) L ‘Sem nenhuma pretensio de proceder a uma compiligio exaus- tiva, relacionamos alguns estudos estrangeiros dos quais podere- mos extrair elementos que contribuirdo para a formatagdo de con- siceragdes criticas sobre a questo, no sistema brasileiro 5.1.4 Referéncia @ doutrina italiana No cédigo civil italiano! ha definiggo de prestungio, nos se- guintes termos: “art. 2.727. le presunzioni sono le conseguenze che la legge o il giudice trae da un fatto noto per risalire a un fatto ignorato”. Trata-se de disposigao legal meramente didatica, limi- tando-se a explicitar a estrutura do procedimento intelectual de- tivo, que parte de fato conhecido para alcangar um fato desco- nhecido. art. 2.728 do mesmo e6digo civil italiano dispoe:“Le presun- 2ioni legali dispensano da qualunque prova coloro a favore dei Quali esse sono stabilite, Contro de presunzioni sul fondamento 1.G.Cian eA. Trabucchi, Commentario Breve al Coice Civile. 150 IMPOSTO SOBRE A RENDA sume-se a postura que apenas consiste em concluir, mesmo sein evidéncia concreta in ecusavel, que no caso a realidade coincidi- 14 com os precedents conhecidos. Ha um juizo de verossimi- Ihanga, que prepondera, mesmo sem qualquer comprovagao. Na ficgao, entretanto, salve-se que a coisa em presenga nao é como sea define ou configs ra, mas conceitua-se como se o fosse,a fimn de se obter um resultado que em condigdes normais nao ser a atingido. Em algumzs hipéteses de presungio, 0 que se faz. ¢ aplicar uma lei de freqiiéncia para se dar como provado o que é provavel; costuma-se dizer que a hipétese tem a ver com a pro- va de sua existéncia e nao com a natureza mesma das coisa, pelo que é chamada cle presunio-prova, servindo freqiientemen. te como recurso para a demonstragao de fatos no curso dos pret cessos judiciais. Diferente é a presuingio plena, ou legal, ou, aindi, Juris et jure, que ndo admite contraprova, 20 passo que as pre- sungdes relativas ou juris fantumt podem set desfeitas mediante demonstracdo concreta de quena realidade as coisas nao se mi- terializaram como se havia previsto. Embora a presungio legal se aproxime mais dat: ficg6es, em verdade delas continua a dife- rir, porque naquelas »xiste probabilidade do resultado presumi- do, ao passo que nesia essa probabilidade ndo se verifica, jé que 6 elemento integrante da figu:a que o resultado da ficsdo seja definir a coisa como na sua realidade fética ela nao 6. Embora sejam amplamente utilizadas como recursos validos de concei- tualistica juridica, por muito tempo as presungGes e as ficgoes nao foram objeto de exame no campo do direito tributério. No direito privado as relagdes jurfdicas comportam melhor as duas figuras, visando, como geralmente visam, & solucéo equitativa de problemas ou a certeza de determinadas relagées juridicas. No direito penal as presungdes servem, muitas vezes, para mitig © tratamento a ser dado ao réu, muito embora também se conhe- ‘gam casos em que el1 é prevista em seu desfavor, como a pre- sungdo legal de violéacia nos crimes sexuais em que a vitima é menor. No direito consstitucional e no administrativo hé empre- Bo de presungdes e f cqdes, dados os ambitos naturais do pro- ‘cesso formativo das normas e de sua aplicagao. No direito tribu- trio, entretanto, a maior ou nienor faixn de utilizagto das duns figuras cestardi necessariamente na depencéncia do sistema de direito positive que na sua disciplina prevalece” (pp. 216 e 217) & kb 53 Consideragées terminolégicas PRESUNGOES E FICGOES EM MATERIA TRIBUTARIA 1st Em outro trabalho Ulhoa Canto” resume as duas figuras nas seguintes palavras: “As presungies e as ficgdes fazem parte do processo gnosiol6gico figurativo. Por ambas chega-se a uma rea- lidade legal que nao coincide com a realidade fenomenolégica conhecida através dos meios de percepsao direta”(..) (p. 3). “Na {ficglo, para efeitos pragméticos a norma atribui a determinado fato, coisa, pessoa ou situacdo, caracteristicas ou natureza que no mundo real niio existem nem podem existir. Na presungio, a regra é& estabelecida dentro dos limites da realidade possivel, inferida de fa- tos semelhantes ja ocorridos, e que, portanto, sto ndo s6 posséveis como até proviveis” (gn). E mais adiante conclui: “Portarto, mesmo quando se trata de construgao indutiva da verdade especifica pela qual se traduz.0 valor da base de céleulo, a presunsao — prova formulada pela autoridade fiscal — somente prevalecerd se nie encontra oposi- sao por parte do contribuinte; se este se opuser, proceder-se-é & avaliagao contradit6ria, cujo resultado configuraré a verdadeira base de célculo no caso concreto” (p. 16). ‘Ve-se que Ulhoa Canto sugere redobrada cautela no que diz respeito a utilizagéo das presungGes e ficgdes em matéria tributé- ¥ia, afirmando que “a maior ou menor faixa de utilizagao das duas figuras” depende da consideracio cas exigéncias sistematicas do direito positivo (do “sistema de direito positive”, diz ele). E sugere que essas figuras sejam admitidas como ensejo para inicio de processo administrativo tendente ao langamento, no qual, ocorrendo oposigio por parte do contribuinte, seré instaurado 0 contraditério (que pressupde possibilidade de exercicio do direi- to A ampla defesa, com todos os recursos a ela inerentes). “ 5.3.1 Presungio e ficgio Parece néo haver maiores diividas quanto ao fato de ser a chamada presungéo relativa um expediente normativo tendente 25. "PresungBes no Direito Tributario”, in Cadernos de Pesquisas Tbuté- ria. 9, p.5. 132 |MPOSTO SOBRE A RENDA a dar ensejo & instauragio do contraditério no curso de um p:o- cesso. Como elemento ensejador de infcio de processo no cuiso do qual sera desenvolvido 0 contraditério, assegurando-se 0 3i- reito de ampla defess, com todos os recursos a ela inerentes, e:sa categorizacdo cientifica nao oferece maiores dificuldades. Sua tti- lizagio abusiva encontra simples e eficazes remédios no seio 4o sistema de direito positivo, da propria invalidade da norma, ata invalidagdo de ato sdministrativo com a responsabilizagao 10 agente (e/ou Estado) que atuou com desvio de poder. O tema — das p esungées relativas — adstringe-se ao pla10 dos fendmenos processuais, que s6 nos prendem —aqui—aaten- 40 como pretexto para recordar a supremacia do contradit6r 0, da ampla defesa, coin os recursos a ela inerentes, e da irrestr:ta possibilidade de, na hip6tese de qualquer abuso ser praticato contra o particular, responsabilizacio do Estado efou seus prepcs- tos. Jd as presuncdes absolutas e as fiegSes, estas sim, respeitam a0 direito material, d:zem com as préprias normas de direito po: tivo material. Aliés, a0 menos sm matéria tributéria néo vislumbramos uti- lidade em criar duas categorias distintas, ficgdo e presungio a>- soluta, pelo simples fato de que ndo encontramos, no direito posi tivo, regimes juridiccs distintos aplicaveis a cada uma destas ca- tegorias. Arazdo de ser dis classificagées cientificas est na respectiva utilidade — que consiste na identificagao do regime juridico pré- prio de cada uma das categorias criadas. Uniforme o regime juri- dico, inttil a classificacao, cuja idealizagdo nao passa de nonsense Ensinou Celso Ant6nio Bandeira de Mello: “As classificagoes juridicas assim também se realizam e agruparao seus objetos se undo elementos de direito. Em outras palavras: ao separar gé- eros, espécies e sub:spécies t8m como critério regimes norma- tivos. Por conseguinte, no topo da classificaggo estarao 0s elemen- tos que permitem isoar um complexo relativamente vasto de re- gras e princfpios juriilicos. Em graus sucessivos, as subdivisses posteriores iro sepacando regimes normativos cada vez mais articularizados. Toda sistematizacao, em direito, s6 pode ter como 26. Natureaa e Regime Jurdico das Autarquies PRESUNDOES E FICGOES EM MATERIA TRIBUTARIA 153, objetivo identificar ‘complexos de normas’, porque o que interes- 5a ao jurista é saber quais as regras aplicdveis a tal ou qual hipte- se” (p. 88). (..) “Em direito, 2 operagao de classifica, por forca ha de se ater 8s caracteristicas de ‘direito’, isto é, dos institutos e ca- tegorias, cujos ingredientes componentes sao sistemas de normas, rocessos que definem um conjunto de efeitos imputaveis a de. terminadas situacées e relagdes” (p. 361). E que o regime constitucional aplicdvel assim as presungdes absolutas como as ficgdes ¢ 0 mesmo, razdo pela qual nao julga- ‘mos itil separd-las em categorias distintas. As razdes pelas quais, a doutrina tradicional tem feito a disting&o dizem respeito a fend- menos alheios ao sistema de direito positivo. Ora sdo elementos do plano fenoménico, ora elementos psicologicos e pré-legislativos. Carnelutti” entrega o servico, resumindo que as razées para tal listingio sao hist6ricas: “Pero, en cualquier caso, aquella vinculaciént hhistériea con la materia procesal obliga a distinguir presunciones legales absolutas y ficciones de Derecho” (g.n,) Utilizaremos, simplesmente, as denominacées (i) presuncéo ® (ti) ficgéo, conforme o contetide normativo diga respeito a (a) inicio de prova ou (b) qualificagao material de fatos/atos ou atri- buigdo de efeitos, respectivamente. 5.3.2 Elisio ¢ evasao or A questo da legitima ou ilegitima atuaclo“do particular no sentido de furtar-se a incidéncia da norma de tributagdo tem sido tratada pela doutrina sob as mais diversas cenominacSes, adver- te. R Sampaio Déria* Adotamos a definicéo do referido autor Para 0 conceito de evasio, como sendo “a ado ou omissio te, Gente a elidis, reduzir ou retardar o cumprimento de obrigagio tributéria’.” J4 para elisio, muito embora Sampaio Déria® tenha atingido extraordinaria sintese.com a famosa definigéo: “..) agio tenden. 27 Aid Jose Lute Pérez de Ayala, Las Fccionesen el Derecho Tibutri, P. 28, Elisio e Evasio Fiscal, pp. 31 ess, 43 ¢55. 29. Ob. cit, p. 21 30. Ob. cit, p. 46, 184 IMPOSTO SOBRE A RENDA te aevitar, minimizar ou adiar a ocorréncia do proprio fato gera- dor (..)”, consideramos mais completa a definigao de Diva Ma- Jerbi, nos seguintes termos: “(...) comportamentos que os parti- culares manifestam perante a tributagdo, e que se fundam num Ponto referencial comurt a todos: comportamentos tendentes a evitar uma incidéncia trizutéria ou a obter uma incidéncia tribu- tdria menos onerosa, mediante a via juridica Iicita que lhes pro- porcione tal desiderato”. E arremata: "Expressa-se, assim, 0 com- portamento elisivo na pidtica de atos ou negécios jurfdicos que sio fundamentalmente riotivados pelos efeitos tributérios (mais benéficos) dela decorren es. A escolha de tais atos ou negécios é essencialmente determinada pela intencdo de evitar-se determi- nadas incidéncias tributérias, equiparando-se o resultado pratico obtido aos daqueles atos ou negécios juridicos sujeitos ao regime tributdrio desfavordvel”, © que nos basta, aqui, para os fins deste trabalho, é saber que os atos ilfcitos de fuga dos efeitos da norma de tributagéo serio referidos como atos de ¢vasio, 20 passo que os atos licitos ten- dentes & reducdo ou elir inacdo da carga fiscal denominaremos de atos de elisio. 7 5.4 Consideragao critica Parece que todas ess.is categorizacées e classificagées (ficcao, presungio absoluta/relativa, fato processual etc.) foram criadas pelos cientistas/sistematizadores do direito posto, buscando uti- lidade operativa, organiz gio harménica dos elementos em siste- ma coerente, e nada alé:a disso. Para fugir da balbirdia criada pela promiscua amontoavao de (i) elementos do plano fenoméni- co, dos eventos, com (ii) elementos do plano normativo, esses pio- neiros acabaram mudando apenas de endereco (talvez procuran- do, inconscientemente, alsrigo em outro manicémio, este sim, jé lum pouco mais organizaco). Passaram a agrupar —de forma acri- teriosa e inconscientemer te, com certeza — (fi) elementos do pla- Fo normativo com (iii) el2mentos do plano da ciéncia do direito (metelinguagem em relag io a linguagem objeto das normas posi- tivas) 31, Elisdo Tributdria, p. 1S PRESUNGOES E FICCOES EM MATERIA TRIBUTARIA Iss, Percebe-se que a andlise dos fendmenos das ficgdes e presun- ses tem seu nascedouro na doutrina civilista, a partir de ques- {es relacionadas & capacidade para ser titular de direitos e obri- 2966s, da protecio dos direitos do nascituro, da organizagio do direlto das sucessées, etc, Criou-se, sobre — a respeito das — estas normas de direito positivo, e a pretexto de se fazer ciéncia do direito, uma série de roposigées pretensamente descritivas e consideragées pré-legis- lativas — metajurfdicas — acerca dos fendmenos psicolégicos que envelvem o processo mental do agente criador da norma juridi- ca $6 que — esqueceram-se 0s incautos — as normas juridicas especificas sobre as quais foram construfdas aquelas proposigSes descrtivas no eram incompatives com o sistema constitucional rasileizo, Deveras — com a licenca dos especialistas —, em nada ofen- de o sistema constitucional a norma que atribui Aquele que ainda ‘ndo nasceu certas protegdes, certos direitos; o mesmo se diga da comoriéncia; idem relativamente A quitacko de prestacdes perié- dicase assim por diante — mediante o pagamento da titima par- cela; ete . Sobre tais normas, que nada tinkam, e nada tém, de incom- pativel com o sistema de direito positivo, construiu-se sélida ela- borasio doutrinaria. E esta sélida e util — posto que condizente com 0 sistema que visava a descrever — doutrina foi simples- mente transplantada para tentar descrever elementos do subsi tema constitucional tributirio brasileiro “ E dai passaram a raciocinar a partir da imagindria regra de estrutura segundo a qual o funcionamento do sistema normativo (objeto) estaria sujeito as “regras” do sistema de proposighes des- 32. This confuses anderam ocorendo também no esto da melo dologis de citnca do aie, e foam deectades eancndce Sen: dose quedascogiaoespaclogcs no seacups,anbem seencin ‘jess avertni de Alehoutén¢ Buygln(.) ro key ee vita ques metdologta nse oapa dela deseripcnde br eerseae ‘lg que onsen enacted Cetico oa aah eee jell rds nedatlosclrel cents at Socindes, p. 112, enieateaskr viens y 156 IMPOSTO SOBRE A RENDA critivas (metalinguagem), que, sobre o sistema normativo, desen- volvea ciéncia do diteito. Daf pretenderem que as categorizagdes (do plano metalin- giilstico da ciéncia do direito) “presungio absoluta” ou “fiecio legal” possam infirmar, contornar ou superar exigéncias postas. de modo peremptério, pelo sistema normativo. Assim, antes de explicas, organizar, sistematizar os elementos do plano normative, pretendem esses autores que as proposigdes descritivas sobrepo aham-se s proposig6rs prescritivas. Referindo-se a habitual confusdo entre os planos normati descritivo — da ciéncia que sobre aquele formula proposigSe:: descritivas —, vale recordar Paulo de Barros Carvalho:® “Os au cores, de um modo geral, néo se tém preocupado devidament com as sensiveis e profundas dessemelhangas entre as duas re gides do conheciment» juridico, o que explica, até certo ponto, i enorme confuséo de conceitos e a dificuldade em definir qual quer um daqueles setores sem utilizar notagBes ou propriedad do outro. S40 comuns nesse sentido, definigées de ramos do di relto, que comesam por referencias ao conjunto de regras juridi «as e terminam com alusdesa principios e composigdes que a Cién cia desenvolveu a par ir da anélise do direito positive” Nao é porque a ¢ éncia do direito, em um dado momento por certas razdes, criou as figuras pedagégicas da presungio ot da ficgao juridica que norma de cunho tributério veiculadora, po: exemplo, de ficgdo de cxisténcia de renda encontraré guarida pare sua valida — no ambito do sistema normative constitucional br sileiro — aplicacdo, er face de situacio (agora jé do plano feno- ménico) na qual rend. tributavel (de acordo com as presericdes do sistema normativo positivo) inexiste. O instituto da fiegao néo se insere no repertério do subsistema constitucional tributdrio brasileiro, 20 menos n> que diga respeito & deteccéo da ocorrén- «ia de fato imponivel e quantificagao da base de célculo de tribu- to, E-lhe — ao subsistema constitucional tributério — alheia, Tais instrumentos podem ser titeis para o legislador, ilumina- do pelo que Misabel Derzi™ chama de principio da praticabilidade, 33. Curso de Direito Tibutirio, 1. 34. Direito Tributério, Direito Penal Tipo, p. 108 PRESUNGOES E FICCOES EM MATERIA TRIBUTARIA 1s ena busca de instrumentos de agilizasdo e/ou simplificagio da tarefa de aplicacéo das normas, em diversos aspectos, menos no seconhecer a ocorréncia do fato impontvel einfluirna quantificagzo da base de célculo. Quando a Constituigdo outorga competéncia ao legislador ordinario da Unido para instituigdo, por exemplo, de imposto so- bre a renda, esté o sistema constitucional — e o respectivo subsis- tema tributdrio— impondo limites severos ao destinatério desta regra de competéncia. A ligao de Josaphat Marinho™ ¢ oportuna: “A ampliacdo ex- cessiva de normas tributérias nas Constituicées mutila a compe- téncia do legislador ordindrio (...). A Constituigéo brasileira 6 ‘manifestamente ampla e rigida na disciplina do sistema tributd- io, e por isso mesmo testritiva da competéncia do legislador or- dindtio (..)" Nada que escape ao que cenominamos de conceito constitu. cionalmente pressuposto de renda pode ser alcangado pela nor ma de tributagio respectiva. O destinatério constitucional tributario da regra-matriz de incidéncia do imposto sobre a renda s6 pode ser quem tenha ex- perimentado (no plano dos fendmenos féticos, realizado o fato impontvel) a percepgio de renda tributavel —e a norma juridica do pode — porque o sistema positivo assim nfo autoriza — “su- Por” ou “criar”, como categoria da realidade (evento fenoméni- 0), a ocorréncia daquilo (fato) que nao existe. Fora daf a regra- matriz é invalida; nfo encontra fundamento no sistema positive constitucional; nao é admitida & categoria de elemento.integrante do repertério que compée o subsistema constituciorial tributario, encabecado, iluminado, estruttirado, contido e condicionado pe. Jas normas constitucionais.* 35, "Principios Constitucionais Tributérios”, in Estudos de Direito Pt c0.em Homenagem a Aliomar Baleciro, 36. Hé quem sustente, a partir de anélise eficacial, que as normas in- ‘alias integram o sistema até serem dele formalmente expulsas (ver Mars celo Neves, Teoria da Incbasttucionalidade das Leis, pp. 52 e 79, dentre ou tra). 138 |IMPOSTO SOBRE A RENDA Impde-se uma nova meditagao sobre o tema. A questio que deve ser colocada — e adequadamente respondida — é: ha fun- damento, no sistema constitucional brasileiro, para a criagio vali- da de ficgdes (e presungées absolutas) em matéria tributaria— no que diga respeito a constatagao de ocorréncia do fato imponive! e quantificagao do tributo devido? Entendemos que a resposta deve ser dada com base no sist2- ma positivo vigente, mesmo que isso implique a conclusdo de que as centendrias constragbes doutrindrias sobre o tema —e que f>- ram tio titeis para o ¢studo do direito privado — tenham que ses, simplesmenie, abandonadas. Por mais argutas e intelectualme + te extraordindrias qu? sejam as ligSes de Pontes, Clovis, e tantos outros, sobre os institutos da ficgdo e presuncao, essas licées néo servem de fundamento de validade para a recepcio, pelo sistema constitucional brasileiro, de toda e qualquer norma juridica que veicule ficgdo ou pre: ungio. ‘Todas — e no nienos que todas — as normas juridicas que pretendam, por meic de ficgdo, imputar os efeitos de fato impo- nivel a evento fenoménico que nao se caracterize como tal, cu manipular ocontetid > patrimonial de obrigagdo tributéria, ou al- cangar particular nc inclufdo na categoria de contribuinte (en- tendido este como o siestinatério constitucional da carga tributi- ria), deverdo, simplesmente, ser descritas como normas invalidas, alheias ao sistema cor stitucional, inompativeis com o subsistera constitucional tributério. Concordando co:n nossa afirmagéo de que as presungées s6 podem servi: de pon‘o de partida a ser sucedido por amplo cor traditorio, veja-se Alessandra Picardo:” “Il contribuente che non concordi con le ricortruzioni dei fatti e le interpretazioni delle norme avanzate dal ‘accertamento deve proporre tempestiva- mente ricarso, ovverc deve iimpugnare I'atto di accertamento (per ‘evitare che diventi desinitivo) e dimostrare la erroneit’ in fatto 0 in diritto” E tal conclusio no s6 pode — como deve — ser sacada com ‘a maior tranqiilidade e serenidade. 37."L’accertamento ei reddit in basialleseritture contabile”, in Diritio « Pratica Tributaia, extrat» do v. LXV, p. 100 PRESUNGOES E FICCOES EM MATERIA TRIDUTARIA. 159 A manifestacio de Geraldo Ataliba™ a respeito do tema é, mais uma vez, consistente com a andlise sistemdtica do subsistema constitucional tributdrio: “Ora, se, de modo geral, as leis civis, comerciais, administrativas podem prudentemente estabelecer presungbes e ficgBes, a Constituicio veda que isso sea feito emt maté- ria penal e tributdria (nullum crimen, nullum tributo sine lege. Isto intogra o art. 5 e estd protegido pelo § 4" do art. 60”. Nenhuma dificuldade operacional ou impedimento prético servird para justificar — & luz do vigente sistema constitucional — atropelo das exigéncias sisteméticas impostas pela Constitui- Sao. A necesséria praticabilidade pode operacionalizar ou justifi- car tanlas facilidades quantas queira— no trato da dinamica da aplicagio das normas juridicas —, sem, no entanto, pretender so- breporsse as exig@ncias constitucionais maiores, atinentes ao con- sentimento, legalidade, tipicidade, ampla defesa ete. A presungao e a ficgHo, no sistema constitucional brasileiro e respectivo subsistema tributério, servirgo, tinica e exclusivamen- te, como instrumento ensejador do inicio de procecimento admi- nistrativo tendente A apuragio de eventual ocorréncia de fato imponivel e imputagao dos respectivos efeitos. $6 que esse proce- wento administrativo seré conduzido, por forca de outras exi- géncias do sistema, de forma tal que o acusado tenha ampla opor- tunidade de defesa, veja garantido, de forma irrestrita, 0 contra- dit6rio na formagéo de cada uma das premissas que se irdo esta- belecendo, e assim por diante, ' Allorio” também nao admite a utilizagao das presungSes absolutas em matéria tributéria, Diz ele: “Estranea dal diritto tributario mi sembra che sia la presunzione legale assoluta, non controvertibile mediante la dimostrazione del contrario(..)” Ha algo muito mais relevante — interesse puiblicc‘na estabili- dade e prestigio da sistemética constitucional — a ser perseguido © atingido, do que a infalibilidade do sistema de combate A eva- sao tributéria — interesse fazendério, A necessidade de coibir a 38, "Fato Futuro e Tributasao, art. 150, § 7%, Constituigio Federal 1988, Redagio da Emenda Constitucional 393”, in Revista de Programa de Pés-Gra- ‘duagao em Dirsto — PUC-SP, v1, p-. 39. Ditto Processuale Tributaro,p. 488. eo IMBOaT0 SOBRE A RENDA evasao tributaria — nteresse fazendério, legitimo, diga-se de pas- sagem — no pode taldar a visdo a ponto de admitirem-se sacrifi- cios e redugdes & iniperiosa necessidade de manter-se integra a sistemética constitucional — interesse puiblico —, consagradora de conquistas seculares dos povos civilizados. Essas consideragdes tratam de elementos que se conjugam harmoniosamente para compor o principio da seguranga jur‘di- ca, que traduz e assegura ao particular o direito de prever as con- seqiiéncias decorrentes do direito posto, contendo a atuagao do Estado, sob pena de responsabilidade (inclusive, veremos, clos agentes administrativos). 6 SEGURANGA JURIDICA 6.1 Prevsiblidadeestaale seguranga jurtdica dos contribuintes: 61.1 Direito adquirdo, 6.2 Responsabilidade do agente piblico 6.1 Previsibilidade estatal e seguranca juridica dos contribuintes ‘Todas as exigéncias sisteméticas da Constituigao brasileira fornecem ao particular as gatantias insitas ao principio da boa-fé e da previsibilidade da acio estatal. Acerca da referida previsibilidade, no contexto de nosso sis- tema constitucional, Geraldo Ataliba’ manifestow-se, nos seguin- tes termos: “A previsibilidade da ago estatal decorrénte do es- quema de constituicao rigida, e representativa do érgio Legislative asseguram aos cidadios, mais do que os direitos constantes da tabua do art. 153 (hoje art. 5°), a paz eo clima de confianga que lhe io condigbes psicolégicas para trabalhar, desenvolver-se, afit- ‘mar-se e expandir sua personalidade (..) © quadro constitucional que adota os padrdes do constitucionalismo — 0 ideério francés e norte-americano instalado no mundo ocidental, nos fins do Sécu- lo XVIII — e principalmente a adosao de instituigdes républica- nas, em intimeros Estados, cria um sistema absolutamente incom pativel com a surpresa. Pelo contrério, postula absdliita e com- pleta previsibilidade da agto estatal, pelos cidadaos e administra~ dos. E que o legislador atua representando 0 povo e expressando seus designios (..) O estado rifo surpreende seus cidadtos; nko ado- ta decisbes inopinadas que os aflijam. A previsibilidade da agao estatal é magno designio que ressuma de todo o contéxto de pre- ceitos organicos e funcionais postos no Amago do sistema consti- tucional (..) © legislador e — com maior razio — o administra- dor nio surpreendem o povo. (..) A leuldude & tomada como trago 1. Repilbica e Consttuigzo, pp. 142 ess. (g.0) 7 APLICACAO DAS CATEGORIZACOES PROPOSTAS AO IMPOSTO SOBRE A RENDA 7.1 Questo eminentementeconstituctonal.7.2 Imperative ligicoda exit- tencia do conceto pressuposto. 7.3 Concelto consttucioralmente pre: suposto de renda: 7.3. Conceitos préximes — 7.3.2 Conceto pressir posto: 7.3.2.1 Saido positivo — 7.3.2.2 Entradas e saflas — 7.3.2.3 Pt- Plodo: 73.2.3.1 Verfodo cOnstitucionalmente pressuposto — 7.3.3 Sw {ito passivo (uma referéncia). 74 Relagto delerminante entre eritérios 4uantitatvo e mc terial 75 Conteddo do conceited rend, ra doutring, 7.6 Necessiria re eréacia a elementos componentes da base de cdlulo d) ‘mposto sobrea ronda, 7.7 Correglo memeléria: 7.7.1 Adverténciaprévis 7.7.2 Aumen o € reduio da carga — 7.7.3 Correcto monetéria * indices — 7.7.4 stflexta. 7.8 Alguns exemplos, 7.1 Questiio eminentemente constitucional A Constituigio, ne- art, 153, Il outorga competéncia & Unisc para instituir imposto sobre a renda. Limita-se ela a esta singele referéncia: “renda e prventos de qualquer natureza”. Como jé tivemos os0rtunidade de ressaltar, considerando que © texto constitucional serviu-se da técnica de referir-se ao critéric material da regra-matiz de incidéncia tributéria para o fim de proceder & reparticao d2 competéncia tributéria impositiva, o con ceito “renda e proventos de qualquer natureza” foi utilizado para esse fim, sendo intuitivo que o respectivo ambito néo poder fi- car & disposigio do legislador ordindrio. Admitir o contrérity implica conferir ao legislador infraconsti- tucional competéncia para bulir com o ambito das préprias com- peténcias tributérias ir positivas constitucionalmente estabeleci- das, 0 que é— para quem aceite v pressuposto basico do escalo namento hierdrquico da ordem juridica — impossivel APLICAGAO DAS CATEGORIZAGDES PROFOSTAS AD IR ™ A prépria Constituigao fornecerd, portanto, ainda que de for- ma implicita, haurivel de sua compreensio sistemética, 0 conte do do conceito de renda por ela — Constituigao — pressuposto. 7.2 Imperativo légico da existéncia do conceito pressuposto Nao hé outra solugio légi¢o-sistemética para essa questio. Admitindo-se que € a Constituigto que confere ao legislador infraconstitucional as competéncias tributérias impositivas, 0 Ambito semantico dos vefculos lingiifsticos por ela adotados para traduzir o contetido dessas regras de competéncia néo pode ficar 8 disposigio de quem recebe a outorga de competéncia. A.questio de direito colocada, portanto, s6 pode ser compre- endida e analisada em face das normas constitucionais que re- gem a matéria, Xavier de Albuquerque’ demonstrou a natureza constitucio- nal das regras definidoras das competéncias impositivas, no Bra- sil: “Esse cardter rigido e fechado do nosso sistema constitucional tributério provém da Emenda n. 18, de 1965, & Constituigao de 1946, cujo art. 6 o explicitava sob a formula categérica de que ‘os impostos componentes do sistema tributério nacional so exclu: sivamente os que constam desta Emenda’. Mantiveram-no as Constituigées subseqiientes, com a tinica excecdo de posstveis Outros impostos, passiveis de instituigo no Ambito da competén- cia residual da Unido, Desse modo, os impostos integrantes do sistema continuaram a ser os ‘previstos nesta Constituigao’ (art. 18, caput, da Constituigso de 1969) ou ‘discriminados nesta Cons- {ituigdo’ (art. 146, I, 2, da Constituicéo de 1988). (..) Os conceitos que correspondem as diferentes espécies deimpostos — preleciona Pontes de Miranda —, se constam da ConstituigSo, s80 conceitos de diveito constitucional, e nio de legislacao ordindria. O legislador ordinério somente pode trabalhar com as variveis que determi- ‘nam o valor do imposto, ou de algum dos elementos do suporte fatico (eg, tantos por cento, se a renda excede de, x); nfo pode alterar, de modonenhum, o conceito do imposto; imposto de trans- missio de propriedade imobilidtia, como imposto sobre circula- 2. "18S e Planos de Savide", in RDT 62/17, m [MMPOSTO SOBRE A RENDA a0 de mercadorias, € ¢ que se considera tal na Constituigéo: a ‘evelacio do que ele é e xtra na classe das questdes de interpreta- ga da Constituigao”. Daf que, segundo o nesmo autor, “(...) a regra juridica, que se diz sobre o imposto ‘2’, lescreve, como seu suporte fatico, o.que a Constituigao previu”. E arremata: “Assim é, porque, como anota Aliomar Baleeiro,'a primeira fonte do Direito Tributario, no Bra- sil, ‘brota da prépria Constituigdo’. Esse mesmo Mestre disserta em outa passagem: “Fato gerador e base de calculo sfo conceitos constitucionais (Emenda n. 1/1969, arts. 18, §§ 2%e 5%, 21, § 1°) indissocialmente vinculados a legalidade, porque fornecem o ele- mento fundamental para a identificagdo, a classificagio e a dife- renciagao dos impostos, que a Constituicdo, nos arts. 21 a 26, dis- criminou e distribuiu & Unido, aos Estados-membros e aos Muni- cipios”? Oplano desta andlise —a exemplo do que ocorre com os pres- ‘supostos anteriormente vistos — também é constitucional. Prin- cipios e normas consti:ucionais informam substancialmente a matéria e devem norte: sua intelecgéo, E que s6 assim estardo sendo prestigiados os p-incipios; e repita-se, o sentido, conteido ¢ alcance dos principics constitucionais da legalidade, da igual dade, da anterioridade, da capacidade contributiva, da inde bilidade de funges, da seguranca juridica etc. s6 podem, eviden: temente, ser perquirido; a partit das normas constitucionais, sis- tematicamente consideradas. Seria absurdo — nao se pode admi- 2. f escrevemos, em conjunto com Geraldo Alalibi: “Por isso tudo & «qe, jf a Constituigdo, se lecuzer eritrios iddneos pars eleisio (pela les Sediniri) da base deealew'o dos trloutos. Ta le, de resto, 6 ers consti “Gional quando se comporte nos lindes dessa exfera de atuasio sutorizads onstiticionalmente,absten So-se de indicar —eomobase — fatores que nada tema ver como cbjetivo fat» submetide tributasio. Dai que, respettando e obedecendo essas exigincie, em gers, indiquem as les tributéras como base decileulo,grandezss instas anatureza essencial do ato tributado (og o valor da operasio, no xs do ICM; prego do serigo, no caso do impos- to sobre servgos;o montane da renda, fo exs0 doimposto sobre a rend; ¢ assim por diante). Do mesiao modo € possvel verificar que, sempre que 2 Tel seeastadess exiginci implicit do sstema,aatuacto do leslador em certas hipgtesee, da prcpriaadministragic) vem sendo, sempre e fal mente, condenada pelo Poser hudieisrio" (Paecer inet). [APLICAGAO DAS CATEGORIZAGDES PROPOSTAS AO IR roy ‘tir —que a pesquisa do sentido ealcance de principios constitucio- nais pudesse ficar sujeita a prescrigSes da legislacao ordindria ou de atos administrativos. Tais principios fundamentais devem ser compreendidos a partir de sistema de normas igualmente funda- mentais, da Constituigdo Federal Ada Pellegrini Grinover’ enfatiza essa exigéncia meto- dolégica: “(..) é importante notar que todos os dispositivos cons- titucionais devem ser interpretados a luz dos princfpios adotados pela prépria Constituigio”. E util, também, a transcrigao de trecho de voto do Minisiro Leitéo de Abreu,‘ no qual ficou assentada, com extrema felici- dade e precisio, a légica do raciocinio hermenéutico necessério a solugdo de conflitos dependentes da interpretagdo da Consti- tuisdo: “Em primeiro lugar, néo vale argumentar com-normas de direito comum para estabelecer limites a principios funda mentais, a normas, por isso mesmo, universais, normas necessé- sias, reconhecidas como tais pelo nosso pais. Em lugar de se ar- gumentar da lef ordinéria para a norma fundamental, a fim de limitar-Ihe o sentido e a eficécia, o que cumpre é argumentar dos prinefpios estabelecidos na declaracéo de direitos para os preceitos de lei ordinéria, para subordinar estes tiltimos aos primeiros”. ‘Como jé vimos, exaustivamente, boa parcela da doutrina afir- ‘ma que sistema jurfdico é 0 conjunto harménico, unitério ¢ orde- nado dle prinetpios e normas. Organizado a partir de critério hie- rarquico — no qual as diversas regras (elementos) so providas de diferentes fungées e intensidade eficacial —, a primeira tarefa do intérprete é reconhecer quais os principios que se sobrepdem aos demais, para assim compor um todo harmdnico e ordenado. O ensinamento de Tércio Sampaio Ferraz Jr° é uma vez mais esclarecedor: “Partimos do principio hermenéutico da unidade da Constituigao. Este principio nos obriga a vé-la como um arti- 3. "O Contencioso Administrative na Emenda n. 7/77", in Revista da Proeuradoria-Geral do Estado de Sao Paulo, juno de 1977, pp. 247 ess. (esp. p. 267), 4, Trecho de voto exarado no acérdio do RE 86297-SP, STF Pleno, in ROP 39/200, , 5. Interpretagioe Estudos da Constitigao de 1988, p. 59. 174 IMPOSTO SOBRE A RENDA culado de sentido. “al articulado, na sua dimensio analitica, € dominado por uma idgica interna que se projeta na forma de uma organizagio hierdrquica, (..) Perdendo-se a unidade, perde-se a di- mensio da segurang. e da certeza, o que faria da Constituigao um instfumento de arbfirio” (g.n.). ‘A luz dessas premissas deve ser efetuada a andlise a que nos propomos. 7.3 Conceito constitucionalmenite pressuposto de renda Sedimentado, por um lado, que 0 conéeito de renda ndo pode ficar ~e nao fica — a disposigio do legislador infraconstitucional e que, por outro lado, o conceito de renda nko esta explicitado no texto constitucional, impde-se deduzir tun conceito de renda pres suposto pela Constituigao. Antes de qualquer outra cogitacio, saliente-se que, para nés, 0 conceito de renda ¢ género que encampa a espécie ‘ proventos de qualquer natureza”, razdo pela qual referiemos agi apenas o género, sem preocupagao de ra- tar'separadamente sla espécie,* ‘Advertiu J. L. Bulhées Pedreira:” “A nogio de renda que 10s interessa nao é a utilizada pela ciéncia econémica nem a que tev- ricamente seja a mais perfeita para as finangas publicas, m:s que se ajusta ao sistema tributério nacional definido na Corsi: tuigdo Federal em vigor. Esse € 0 conceito que permitiré conhe constitucionalmente p essuposta de tributo—conceito fundamer- tal, na.linguagem de Terdn, ao redor do qual se organiza > subsistema constitucinal tributério — como prestages coativa:, patrimoniais e pecuniérias, unilaterais, postas por lei, de form! genérica’ em decorréricia de ato tipico e Iicito, para custeio das despesas do Estatjo em beneficio do interesse comum, entende- mes que € posstvel delimitar o conceito constitucionalmente pres suposto de renda, A técnica utilizada pelos que se desincumbiram da tarefa de circunscrever o conceito constitucionalmente pressuposto de tr buto foi a de estremé-'o de entidades préximas, porém nao com pletamente com ele ilentificadas. Procuremos seguir 0 mesm« caminho. APLICAGKO DAS CATEGORIZAGOES PROFOSTAS AO IR 7 7.3.1 Conceitos préximos Identificamos, no texto constitucional, alguns conceitos que, de um modo ou de outro, aproximam-se, fangenciam ou influem no conceito de renda, Tal ocorre com “faturamento”, “patriménio”, “capital”, “lucro”, “ganho”, “resultado” etc. Vejamos alguns deles. “Faturamento” é referido pela Constituigéo no art, 195, 1 ‘Faturamento” & nogdo descompromissada com qualquer resul- tado comparativo, “Faturamento” é mero ingresso; é a soma dos valores das faturas; 6a grandeza do conjunto de ingressos decor. rentes do conjunto de faturas emitidas, Ensinou Geraldo Ataliba:"* “Nao se registram divergéncias fa boa doutrina, soja comercial, sea tributéria, a respelto do cor. ceito juridico de faturamento, (..) Ora, faturamento é soma de faturas, Estas sfo ‘contas’ ou ‘notas’ que o comerciante expede 20 realizar vendas mercantis. Logo, a soma das faturas (faturamento) a soma dos precos das vendas mercantis”, E, portanto, na dindmica da vida das sociedades empresétias, lum dos elementos que, na qualidade de ingressos, devem ser con. siderados para compreensio da mutaglo pattimonial (para maior u para menor) ocorrida em um determinado periodo. E é devido a e8se seu inerente descomprometimento com a idéia de eémputo a mutacao do patriménio das pessoas, que a nogao de faturamento Eneutra e imprestavel para a significagao de capacidade contribu. tiva. Deveras, isoladamente considerado, o faturamento nao é ele. ‘mento id@neo para a avaliagko de capacidade contributiva, posto gue, confrontado com eventuais saidas, pode ter sua aparente vo- faslo para “signo presuntivo de riqueza” (na expresso de Becker) totalmente aniquilada. , Ea razao é simples: é que nio se “titula” de forma definitiva oproduto do faturamento. Somente a parcela do faturamento que fmanesa na ttularidade da sociedade empresérla apés a cons deracao das safdas relevantes & que passa a manifestar cela’ ca pacidade contributiva. Antes dessa operagio (de deducao) o faturamento é neutro. E todo fator neutro em relagad as situacées, solsas ou pessoas consideradas ¢, por definiclo, inidéneo para 11. "Venda de Minérios — Faturamento — PIS", in RDA 196/316, 78 IMPOSTO SOBRE A RENDA distingui-las,”* umas das outras, como se dé na identificagéo de capacidade contributiva para imposigéo de Onus tributével pro- porcional e isénomo. Para fins deste estude basta, no entanto, concluirmos que @ expresso “faturame 1to", utilizada pelo art. 195, I, da Constitui- do, tefere-se a ingressos, de forma descompromissada em rela- g40Anogdo de resultedo (positivo ou negativo), o que jé é suficien- te para estremé-la da idéia de renda “Capital” aparec no texto constitucional nos seguintes arts. 156, § 25 I, 165, § 1%,§ 2°e § 5, IL, 167, II, 170, IX, 172, 192, I, 222, § 1" e§ 2%, e, no Ato das Disposicdes Constitucionais Transit6rias, a expresso aparece no artigo 52, I. Acxpressdo “capital” é tomada pela Constituigao ria acepgdo de investimento permanente, de titulagao de um patriménio, em nada relacionando-se & natureza dindmica ¢ relativa (comparati- va entre dois estaéos patrimoniais) que caracteriza a nogdo ile renda (voltaremos a vssa nocio) “Lucro”, por sua vez, é expresso que aparece nos seguiint2s, artigos da Constituicdo: 7°, XI, 172, 173, § 4° e 195, I. Nas Disposi- goes Transitérias, surge no artigo 72, ID. Em todas as referéncias.a expresso “lucro” étomada como resultado positivo de atividaiie empresarial, de mais-valia obtida por sociedade empresaria. 6, portanto, nogao parcial em relacao a renda; 6, por assim dizer, espécie do género tena. Lucro 6 nogdo menos ampla que renda. Alocugdo “ganho” surge nos arts. 201, § 4° 218, § 4*da Cors- tituigio, para referir ingressos, de forma descompromissada ila nogao de saldo positivo. Alheia-se, portanto, de conceito signi i- cante de aptidao pera contribuir para os gastos pulblicos. “Resultado”, por sua vez, é utilizado nos arts. 7, XI, 20, § 4, 71, VIL, 77, § 3%, 109, 1, 111, § 2%, 176, § 2, 195, § 8, 231, §3%e 225, TX, todos da Constituigdo, e 12, § 1° do Ato das Disposigdes Cons- titucionais Transitérias. Em todas as referéncias, “resultado” é tomado como situagiio terminal de um processo, sem qualifica- <8o valorativa relativ.mente A manifestacao de capacidade contii- butiva. 12, Veja-se CelsoAn fnio Bandeira de Mello, O Contes Juridica do Prin- cpio da Igualdade, p. 30. APLICAGAO DAS CATEGORIZAPOBS PROPOSTAS AGIR 19 “Patriménio”, a seu tumo, surge ios arts. 5%, XLV e LX, 23,1, 24, VIL, 30, IX, 49,1, 129, II, 144, 145, § 18, 150, VI, “a” e"c", §2, §3%e§ 48, 156, § 2%, |, 213, I, 216, § 1"e § 4, 219, 225, § 19, Ile § 48, 239, § 2%, da Constituicio, e 36 e 51, § 3 do Ato das Disposi- bes Transitérias. ‘Todas as referéncias a patriménio objetivam significar con- junto estético de bens ou direitos titulados por uma pessoa, pi- blica ou privada. _ linportante salientar que no mesmo sentido (de conjunto es- tético de bens ou direitos) a Constituigao faz referéncia & exp: sio “fortuna” (no artigo 153, VIN), para o fim de outorgar A Unio competéncia tributéria impositiva, o que jé bastaria para concluit, de forma peremptéria, que fortuna e, em nossa opinifo, patri- ménio sao conceltos que a propria Constituigao tratou de diferen- ciar do conceito de renda (lembre-se que nossa proposta é a de localizar e identificar na prépria Constituigao os elementos que permitam delimitar 0 conceito de renda por ela pressuposto). 7.3.2 Conceito pressuposto Identificados e apartados esses conceitos préximos, encon- traremos pardmetros minimos que, muito embora genéricos e car- regados de incertezas — que servirdo de pretexto para abusos do legislador ordindrio e, até mesmo, da administragao —, consti- tuem 0 contetido semantico minimo do conceito constitticional- mente pressuposto de renda. E traduzimos esse contetido da seguinte maneira: (i) saldo positivo resultante do (ii) confronto entre (iia) certas eiitradas e (ib) certas safdas, ocorridas ao longo de um dado (ii) periodo. Desdobremos a conceituacao proposta em seus elementos essenciais, para cabal esclareciniento, 73.24 Saldo positivo Em primeiro lugar, vejamos a nogéo de (i) saldo positive, Ve- vemos, mais adiante, que a doutrina — seja a nacional, soja a alienfgena— é tio exuberante quanto repleta de diferentes posicio- namentos acerca do significado desse saldo positivo. 180 IMPOSTO SOBRE A RENDA iv Aidéia de saldo positivo traduz a nogio de plus, de extra, de algo’a mais, de aciéscimo. Facil perceber, preliminarmente, que esSas nogées repres antam dados felativos, dados que pressupoem, a sua comparacdo ‘om outro ou outros. Deveras, nao sujeito passivo seja veiculada por lei. Essa indicagéo é limitadi, ‘em nosso entender, pla propria Constituigdo. Esse diploma, de maneira mais ou men?s flexivel, indica os possivels sujeitos pa: sivos, ou as possibilidlades que o legislador infraconstitucion: | tem para elegé-los, sempre sob a sombra do principio da isonc- 22. “Prineipios Informadores do Critério Pessoal da Regra-matriz de Incid@ncia Tributéria”, in RDT 23-24, [APLICAGAO DAS CATEGORIZAGOES PROPOSTAS AOIR 19 “Essa afirmagio ndo é pacificamente aceita, mas acreditamos ina sua exatidio em face da premissa de que, nos tributos no vin- culados, a norma tributéria sempre descreve no seu antecedente uma agdo ou um estado que tenha contetido econdmico, que tra- duza certa capacidade econdmica. Por via obliqua, se admitirmos essa premissa, temos que ligé-la, inexoravelmente, a um (ou mais de um) ente titular dessa capacidade econémica. Esta capacidade pertence a alguém, e esse alguém deve ser o eleito para sujeito passivo da obrigacdo tributéria pelo legislador infraconstitucional Essa 6 a tarefa desse Poder Legiferante, descobrir o'titular da ca- pacidade econdmica indicada pela Constituicé6” (p. 261). Esta afirmagio desdcbramento da seguinte proposigdo de Amilcar Falcdo “Os pressupostos estabelecicios para a incidén- cia em cada caso, tradtizem conseqiientemente indices de capaci- dade econémica adotados pelo legislador para que a prestacio tributéria ocorra. J4 se vé que o fator relevante para a instituicéo do tributo nao é a forma juridica por que se exteriorize o fato ge- rador, mas, a realidade econdmica, ou seja, a relagio econémica que se efetua sob aquela forma externa. A alusio & forma juridica, Portanto, representa uma fSrmula eliptica através da qual, por motivos de concisdo léxica, se pretende exprimir a relacao econ6- ‘mica nela subjacente”, E, com a costumeira objetividade, Geraldo Ataliba e Cléber Giardino™ esclarecem o Amago da questio: “Na propria designa- co constitucional do tributo j4 vem implicitamente dito ‘quem’ ser4_0. S84 sujeito passivo. No quadro dos contornos fundamen- tais da hipétese de incidéncia dos tributos — que estabelece a Constituicao Federal ao insiituir e partilhar competéncias tribu- ‘arias, entre Unido, Estados e Municipios — esta referido, inclusi- ve sujeito passivo do tribulo, aquela pessoa que, por imperativo constitucional, teré seu patriménio diminufdo, como conseqiién- cia da tributagéo”. A desconsideragao desta pressuposigdo constitucional relati- va ao destinatério da carga tributaria do imposto sobre a renda dé lugar a sérios equivocos, especialmente em matéria de reten- 23. Introdupo co Direto Tiberi, p. 134 24. “ICM — Diferimento”, p. 53. 490 “MPOSTO SOBRE A RENDA do.na fonte e da tribe taco de negécios internacionais (particu larmente aqueles contratados sob condicdo de “pagamentos If quidos de impostos’™, rifo podendo ser pacificamente admitida 74 Relagio determinante entre critérios quantitativo e material Retomando a nocfo preliminarmente abordada neste t6pico, a Constituigo — ao re rir os fatos tributaveis (no caso, aludindo a renda) — preestabel ce, prefixa (de forma inafastvel pela le- gislagao infraconstituc'onal) a definiggo legal da base de célculo do tributo, A lei nao pode adotar outra dimensao como base, sob pena de desviarsse do padrao constitucional. # que o critério quantitativo da regra-matriz de incidéncia tributéria — no pertinente a base de céleulo — tem a virtude de descaracterizar 0 préprio critério material, quando com ele for incompativel. A licao de Paulo de Barros Carvalho é terminativa, pela objetividade e exiustao; diz ele: “Demasiadas razdes exis- tem, portanto, para quo pesquisador, cintado de cautelas diante dos freqientes defeites da redagio legal, procure comparar a medida estipulada como base de célculo com a indicagio do cri- tério material, explicite na regra de incidéncia. A grandeza have- ¥4 de ser mensurador adequada da materialidade do evento, constituindo-se, obrigatoriamente, de uma caracteristica peculiar a0 fato jutidico tributério. Eis a base de célculo, na sua funcao comparativa, confirmando, infirmando ou afirmandoo verdadeiro 25. Interessante notar que essa questéo evidencia a faldcla das importa $63 actiticas de nogSes do direito comparado para solucio de questoes in , submietidas 20 sistema constitucional brasileiro, Vejam-se, a propési to Continental Ilinois Corp. x Commissioner (docket n. §.931-83, US Tax Court), Nissho Iwai American Corp. x Commissioner (docket n, 4598-85, US Tax Court) e Riggs National Corp. x Commissioner (docket n.24.368-89, US Tax Court), que, tratando das repercussdes da retengio doiimposto so a renda brasilelzo (sobre juros de empréstimos concedidos por instituigbes Snanceiras nortesamericanas) no imposto sobre a renda norte-american, evidencia o contflito entre a prevalancia da assungso do encargo econdmico do tritiuto— sob a ética do ristema constitucional dos EUA —em contrapos ‘do & predeterminagdo de (estinatdrio constitucional da carga tributéria — 4500 a otica do sistema cons:itucional brasileiro, 26, Curso de Diteito Trivmtério, p. 204, [APLICAGKO DAS CATEGORIZAGDES PROPOSTAS AO IR I critério material da hipétese tributéria. Confirmando, toda vez que houver perfeita sintonia entre o padréo de medida e o miicleo do fato dimensionado. Infirmando, quando for manifesta a in- compatibilidade entre a grandeza eleita e o acontecimento que 0 legislador declara como medula da previsio fética. Por fim, afir- mando, na eventualidade de ser obscura a formulaggo legal, pre- valecendo, entéo, como critério material a hipétese, a agao-tipo que estd sendo avaliada, Introduzimos uma nogio de induvidosa operatividade, para a qual convocamos todas as atengées: haven- do desencontro entre os termos do bindmio (hipétese de incidén- cia e base de cflcuto), a base & que deve prevalecer. Por isso,tem 0 condao de informar o critério material oferecido no texto, queseré. 1 substitudo por aquele outro que percebemos niedido”. Destarte, quando o legislador pretender instituir imposto so- bre a renda, estard constitucionalmente obrigado a prever que o céleulo do tributo se faca exclusivamente sobre o montante da ren- da efetivamente verificada. A base de caleulo é elementoessencial e decisivo para a plenae correta cefinigio do tributo. Na verdade, é por meio da base que se pode verificar — dado o necessario liame ou nexo l6gico que deve ela manter com o chamado critério material da regra-matriz, de incidéncia tributéria (o fato tributado) — a verdadeira consis- téncia da situagdo submetida a tributacao. A circunstancia de estar-se na presenca de efetiva tributagéo de renda — critério material da regra-matriz respectiva — 36 6 verdadeiramente afirmada quando o critério legalmente eleito (base de célculo) para conversdo desse fato em cifra econdmica revela-se compativel com a consisténcia material do fato dado como “pressuposto” pela Constituigao e “posto” pela lei: a renda efetivamente auferida ou percebida. Negar isso seré admitir que a Constituigo se tenha desdo- brado em preceitos e formulacées imiteis, que o Legislative e 6 Executive, por via obliqua, podem trangiiilamente desprezar, ins- taurando a inseguranca, o casufsmo e o arbitrio nas relagdes tri batérias. Por isso tudo é que jé na Constituigo deduzem-se crité- ri05 idéneos para eleicéo (pela lei ordindria) da base de célculo dos tribiitos. [MAISTO SOBRE A RENDA Daf que — para tespeitar e implementar essas diretrizes — devam as leis tributétias indicar, como base de célculo, grande- zas {nsitas A natureza essencial do feto tributado (0 valor da ope- ago, no caso do ICMS; ¢ prego do servico, no caso do ISS; 0 va- lor do imével, no.caso do IPTU; 0 montante da renda, no caso do imposto sobre a renda; et::), desvendando o que Geraldo Ataliba denominou de “perspectiva dimensivel da materialidade da hi- pétese de incidéncia’”.” Qualquer que seja 0 vonceito de renda adotado, diivida néo pode haver, repita-se, quanto a necessidade de que ocorra um ga- ttho patririonial (acréscime patrimonial) efétivo pelo sujeito passi- vo; sob-pena de nao se configurar a hipétese constitucional do imposto sobre a renda, 7.5 Conteiido do conceito «'e renda, na doutrina Construgdes doutrindrias acerca dessa questdo néo faltam, convergindo, todas elas, para os elementos essenciais que acima foram expostes (saldo positivo decorrente de confronto entre ele- mentos verificados dentre de um periodo). Horacio Garcia Belsunice* depcis de referir diversas concep- ges econdmicas,” sinteti: a os pontos em comum nelas encontra- dos, afirmando que essas 10;des fornecerdo a “fuente de inspira- cién o de referencia de los sistemas ributarios positives” (p. 74) Segundo o autor, as diversas opinides econdmicas convergem nos seguintes aspectos: (a) renda é sempre uma riqueza “nova”, seja ou nao consumida; (b) essa riqueza nova pode ser “material ou imaterial”; (c) essa riqueza deve derivar de uma “fonte produto- 1a”; (4) €irrelevante se a riqueza nova tenha ou néo sido realiza- da e separada do capital ou fonte produtora; (e) renda é renda li- guida, obtida depois de certas dedugdes (que variam de autor para autor, sendo predominante a necdo de que sio dedutiveis os 27. No mesmo sentido, veja-se Aires Barreto, Base de Céleulo, Aliquota e Prinetpios Constitucionais, pp. 37, 38 e 83 128, El Concepto de Rédlito. 29. Adam Smith, David Eicardo, Thnen, Jean Say, Thomas Malthus, John Stuart Mill, Bcroack, Roveher, Adolf Held, Hermann, Adolf Wagne, ‘Weiss, Alfred Marshall, Neum nn, Irving Fisher e Giuseppe Ugo Papi. [APLICAGAO DAS CATEGORIZAGOES PROPOSTAS AO IR 13 gastos necessdrios para obtengéo e produgio da renda); (A) a ren- da pode ser moneldria (dinheiro), em espécie (bens ou direitos) ou real (poder de compra, dimensionado pelo poder aquisitivo da renda monetéria ou em espécie). E propbe uma sintese de todas as opiniées econdmicas que analisa, nos seguintes termos: “Rédito es la riquesa nueva, mate- rial o inmaterial, que deriva de una fuente productiva, que puede ser periédica y consumible y que se expresa en moneda, en especie © en los bienes 0 servicios finales que pueden adquirirse con la conversi6n del metélico o bienes recibidos como renta inmediata” (ob. cit, pp. 84 € 85). Em seguida, Garcia Belsunce passa a analisar a opinifo de diversos estudiosos do direito, dividindo-os em dojs grandes blo- 08, (a) 0s adeptos da chamada teoria da “renda-produto”, vincu- lada as doutrinas econémicas, que considera a renda como um produto derivado do capital, e (b) os adeptos da chamada teoria da “renda-incremento patrimonial” (ou “tenda-ingresso” ou “en- ‘rada”), que procura apartar-se das concepcdes econémicas, alar- gando a amplitude do conceito de renda para nele incluir todo incremento patrimonial, ingresso ou entrada. Depois de analisar as propostas de diversos juristas® adep- tos da doutrina de “senda-produto” Belsunce sintetiza o conteti- desse pensamento, da seguinte maneira: (a) renda é sempre uma riqueza nova e material; (b) a riqueza deve derivar de uma fonte produtiva e duravel (que resista ou subsista A producgo da senda); (c) ariqueza nova deve ser periédica (ou suscetivel de sé- lo), como conseqiiéncia da subsisténcia da fonte produtora; (d) ‘nao € indispensvel que a riqueza nova soja realizada (passivel de permuta por moeda) e separada (independéncia ou autono- ‘mia fisica da renda em relacdo a fonte) do capital; (e) renda é sem- pre renda Ifquida, resultante da dedugio, da renda bruta, de to- dos os gastos necessérios para sua obtencio e para conservacio ¢ manutengfo (reposigo) da fonte produtora; (f) a renda pode ser .30. Na ala dos adeptos da doutrina da “renda-produto”, analisa as opirises de O. Quarts, Gerbino, Edwin Seligman, Batistella, Jacopo Tivaroni, Chatles A. Colin, Edgard Alix e Marcel Lecercle, C, Plehn, Antonio de Vit de Marco, Henry Laufenburger, Ramon Valdés Costa, ob. cit, pp. 88 a 119. 14 INPOSTO SOBRE A RENDA monetéria ou em espéci2 (ainda que, nesta hipétese, deva expres- Sar-ée'em moeda). ‘ovliSintetiza as manifestagdes dos adeptos da teoria da “renda- produto” nos seguintes. termos:*\."Rédito es la riquesa nueva material (peri6dica o suiceptible de serlo) que fluye de una fuente productiva durable y que se espresa en términos monetarios”. -#"2'Em seguida, passa 1 analisar a opiniao dos adeptos™ da teo- ria da“renda-incremenio pztrimonial” ou “renda-ingresso”, que resume nos seguintes as pectos principais: (a) renda é todo ingres- so'proveniente de coisiis materiais, bens imateriais ou servicos; (©) 0 ingresso pode estat acumulado ao patrim6nio ou haver sido consumido, tudo dentro de um periodo determinado; (c)oingresso pode ser periédico, transitério ou acidental, e nao € necessézio que se mantenha intacta a fonte produtora, que pode, inclusive, desaparecer com 0 ato de producio; (d) no é necessirio que 0 ingresso esteja separado ou realizado; (e) o ingresso deve ser li- guido, ou seja, deve deduzir-se o patrimonio acumulade no ini dio do periodo, bem co:no os. gastos que tenham sido necessérios ‘oi Gtdis para ober o ingresso ou conservar a fonte produtora; () 6 iRgresso deve ser sen pre expressado em moeda, Sintetiza as manifestagdes dos que pregam a teoria da “ren- da-ingresso” nos seguintes termos:® "Rédito es todo ingreso neto oti bienes materiales, inmateriales 0 servicios valuables en dinero, eriddico, transitorio o accidental, de cardcter oneroso o gratuito, que importe un increm mto neto del patrimonio de un individuo en un perfodo determinado de tiempo, esté acumulado o haya sido consumido y que + exprese en términos monetarios”. ‘Rubens Gomes de Sous:™ adota a perspectiva segundo a qual érenda aquilo que a lei disser que é: “Nao seria, portanto, exage- rado ampliar a definicio para dizer que o imposto de renda é aquele que incide sobre o que a lei define como renda”. Desneces- 31, Ob. cit, p. 132. 132, Na ala dos adeptos da doutrina da “renda-ingresso”, analisa as opi: ides de Georg Schanz, F. Gartner, Robert Murray Halg, V. Gobbi, Benvenuto Gsiziotti, Henry C. Simons, Achille Donato Giannini, Luigi Einaudi, Ezio ‘Vanoni, John F. Due, ob. cit, pp. 133 a 181. 33. Ob. cit, p. 186, 34, "Evolugdo do Conceito de Rendimento Tributdvel”, p. 399. [APLICAGKO DAS CATEGORIZAGOES PROPOSTAS AO IR os sfrio salientar que esta opinido do pioneiro mestre é absoluta- mente,incompativel — note-se que a Constituigao de 1946 jé se ervia do conceito de renda para outorga de competéncia isnpo- sitiva — com as premissas estabelecidas neste trabalho. Tendo sido formulada em 1950, no entanto, possuia a virtude de — muito embora viciada pelo excesso natural do pioneirismo — buscar crtitério tendente a abandonar o manicémio juridico tributario que Becker denunciou no inicio da década seguinte, o que jé basta para, uma vez mais, engrandecer o respeito que merece a obra de Gomes de Sousa. Impde-se, todavia, o dever de afirmar sem me- suras que esta permissividade — manifestada na opiniao de ‘Rubens Gomes de Sousa — da doutrina legalista da nocdo de rer da é incompativel com o subsistema constitucional tributdrio bra~ sileizo. lids, na sua obra de 1969, J. L. Bulhdes Pedreira® ja denun- ciava o primarismo deste entendimento, fixando diretriz s6lida e coerente, nos seguintes termos: “Mas alei andinéri, an definir os, rendimentos ou a renda sujeitos ao tributo, ndo ¢ livre para her qualquer base imponivel,e hd de respeitaro conceito de ‘renda e proventos de qualquer natureza’ constante da Constitwigao: 35 definigoes adotadas pela lei ordinéria devem ser construfdas e interpretadas tendo em vista a discriminagio constitucional de competéncias tributérias, e estdo sujeitas ao teste de const tucionalidade em fungao de sua compatibilidade com essa disci minagio. (...) © conhecimento do conceito de renda é, portanto, indispensdvel para o julgamento da constitucionalidade da lei fe- deral que define a base de célculo do imposto de ‘renda e proventos de qualquer natureza’ que a Constituicéo atribui & Unido; ou das leis estaduais e municipais que instituam impostos ou taxas que, sob outras designagGes, incidam realmente sobre a renda. E para esse efeito, nem 0 legislador nem o interpret é livre para adotar o con- ceito de renda de sua preferéncia: deve procurar aquele que melhor se Aajuste ao sistema de distribuigto de competéncias tributdrias constante da Constituigto” (g.n.). E, mais adiante, agrega: “(...) ao definir a renda tributdvel 0 Congresso Nacional temo seu poder limitado pelo sistema constitucio- 35. Imposto de Renda, 2.10.02). 6 IRM OSTO SOBRE A RENDA nal de distribuigio do poder tributétio, e fica sujeito A verificagao, pelo Poder Judiciério, de conformidade dos conceitos legais com 0s prinefpios da Constit igo. © Congresso pode restringir ow limi- tar 0 conceito de renda i: proventos de qualquer natureza cons- tante da Constituigao, mus nao amplif-lo além dos limites compati- yeis com a distribuicé constitucional de rendas” (g.n.) (p. 2.11.(20)) Todas as premissas ¢stabelecidas no presente estudo, que ini- cia com a anilise de um exemplo — o dos EUA — de sistema juridico alienigena, exatimente para estremi-lo do brasileiro, re- algando-se e evidenciar do-se as pecuiliatidades decorrentes da rigidez do sistema nacicnal, conduzem a firme e inexordvel con- cltusdo de que o conceit» de renda — tendo sido utilizado para implementagio de repatig&o constitucional de competéncia tri- butéria impositiva— é constitucionalmente pressuposto, nao po- dendo ficar (por exigéntia !égico-sistematica) & disposicao do le- gislador infraconstitucicnal. Da andlise do direils comparado, constatamos que o subsis- tema constitucional tributério brasileiro revela inéditos exaus- tividade e grau de detelhamento, nio encontrando paradigmas em outros sistemas. Jé invocamos as ligdes de Geraldo Ataliba, que, pioneiramente, algou a questéo aoseu plano apropriado, que € 0 constitucional, apartando o sistema brasileiro, por suas pect liaridades, dos sistemas alienigenas, Bulhdes Pedreira, com sua habitual lucidez, tambét. ressalva o plano constitucional da ques- to — alids, em matéria cle imposto sobre a renda, ele € dos poucos que, quando se defront:, com as intrincadas questdes legais e re- gulamentares, contabei: e societérias que cireundam a matéria, néio perde a visio globa, e mantém o respeito as exigéncias siste- miticas da Constituigac. io h4, portanto, como pretender sustentar, seriamente, que © conceito de renda possa ter sido deixado a disposigao do legis- lador infraconstitucional, no Brasil.* 36. f ilustrativo invocarmos a ligdo de Mizabel Derzi, reiterando tudo {quanto jé dissemos sobre as peculiaridades do sistema constitucional brast Ieiro: “A Constituigio brasileira ¢ a mais minuciosa e rica das Cartas Cons: titucionais, em matéria financeira e tibutéria, Uma transposigfo epressada [APLICAGRO DAS CATEGORIZAGOES FROPOSTAS AO IR 191 Retornando ao conceito derenda, J. L. Bulhdes Pedreira” tra- ta da questao nos seguintes termos: “Fé quatro conceitos basicos de renda — trés econémicos 2 um financeiro. (..) O financeiro pertence ao plano em que o Direito distribui entre as pessoas po- der sobre os recursos, a moeds eo resultado da atividade econd- mica” (p. 167). (..) “O objeto do imposto ndo é renda consumida nem produzida, mas renda de pessoas, ou sujeitos de direito. O conceito fiscal de renda corresponde, portanto, a0 conceito eco- ndmico de renda individual ou repartida; mas com este no coin- cide nem se confunde porque pertence ao plano financeiro, no qual o Direito organiza — mediante a definicio dos direitos e obri- gacdes patrimoniais — a atividade econémica social” (p. 172). (..) "Pexcebemos e medimos a renda das pessoas como fluxos de di- reitos patrimoniais que acrescem ao seu patriménio. A renda fi- nanceira no consiste, entrétanto, nos direitos, mas no objeto des- ses direitos. Os direitos sto instrumentos para distribuir a renda entré as pessoas, ¢ no a prépria renda. Renda é a moeda, ou 0 valor em moeda do objeto dos direitos” (p. 176). - E arremata: “A nosso ver, 9 CTN nio define o conceito constitu- ional, mas conceito diferente — de ‘acréscimo de poder econémi- de instituts ou téenicas de presungio e simplificagio usuais em outros pat ses, esbarram, via de regra, em cbstéculos consitucfonaisintransponiveis. Basta considerar que a maior parte das Cartas atuais no contém wm rol ‘expresto das limitag6es ao poder de tributar,excesto feta ao principio da legalidade. Algumas, como a italian, ainda mencionam o principio da ca- pacidade contibutiva ea proibigfo dese erartrlbuto novo, ap6s a aprova- ao dale orgamentétia, Mas outas so silentes em tudo, o que ndo impediu como nfo poderia deluar de ser — que a doutrina ea jurisprudéncia d= dduzissern o principio da legalidade, diretamente da necessiria subordina- G0 dos atos administrativos do Estado & lei e o principio da capacidade Contributiva, dicetamente do mais amplo prinefpio da igualdade, E 0 caso dda Constitugao alem (art. 20, § 9). No obstante, a nossa Constituicdo, além de conter wma segdo pr6pria, enumerativa das limitagdes 20 poder de tributar, ‘sem prejuizo de outras garantias aseguradas aos contribuintes’ (art 150), estabelece a mais rgida das diseriminagées de competénciatribu- téria entre os entesestaais. Asima confusdo entre 0s conceltos de lucro e patrimOnio, ou lucro receita, aarreta graves conseqitncias”(p. 112), in "Tributasio da Renda “versus” TibutagSo do Patriménio", in mpostode Renda = Questies Atuas e Emergentes. 37. Imposto sobre a Renda —Pssos Jurtdcas. 198 [IMPOSTO SOBRE A RENDA co! A constitucionalidade dessa definico ainda ndo foi submeti- da.a-qualquer teste” (gat) (p. 176). ori Como se vé, qualqt.er que seja o conceito de renda adotado, piesentes estio as nog62s de (i) ganho patrimonial resultante de (i) Conifroaito entre elementos (ingtessos e safdas) verificados (ii) 26 loiigo de certo perfoclo. As definigdes podem variar em diver- 50s'aspectés (fenda auferida, renda consumida, aumento patri- mionial, ganko de capital etc), mas nao resta — de toda a gama de ebtuidos até hoje elaboredos sobre o conceito de renda — nenhu- mia diivida quanto & necessidade de ocorréncia de (a) ganho efeti- ‘Vo, (b) dentro de um determinado perfodo. Deveras, a Constitt gio somente admite a incidéncia de im- Posto sobre a renda quando tenha havido alteragio positiva no patriménio do contribuinte, no perfodo. Fora daf, no se admite (a Constituigao nao tole-a) incidéncia de imposto sobre a renda: E tal constatagio s6 é possfvel ao cabo de um perfodo de tempo determinado, dentro do qual a renda tenha sido auferidae ao cabo do qual ela possa ser quantificada. 7.6 Necesséria referéncia a elementos componentes da base de célculo do imposts sobre a renda Aliberdade do legislador infraconstitucional é, portanto, bas- tante restrita. A Constiluicio jé tratou de delimitar, em largas li- has, o critério material da hipétese e, por via oblfqua, jé circuns- cxeveu a base ea sujeicio passiva, definindo o destinatério cons- titucional da carga tributéria e a medida desta. E dentro desta apertada moldura que o legislador ordinario pode movimentar-se. A base de céiculo do imposto de renda das pessoas juridicas resulta de procedimenty complexo, integrada que é por ingressos e saidas de recursos, ac-scimos e decréscimos no valor intrinse- co de bens, tudo computado dentro de certo periodo — cremos, anual — pressuposto pila Constitui¢ao, de modo insuperavel. Por meio da contabilidade comercial — registros dos valores de cada um desses elementos — elabs tir de determina es da lei societéria, obtém-se jo exercicio” (ca- tegoria definida na chamada lei POF agbes). O In APLICAGAO DAS CATEGORIZAGDES PROFOSTAS AO IR 199 cro liquido do exercicio, assim obtido, sofre a incidéncia da lei tributéria que prescreve certos ajustes — por adigdes, exclusdes ou compensacées —, resultando na categoria definida como “Iu xo real”, esse sim, representativo da base de céleulé do imposto sobre a renda da pessoa juridica. Pois bem. Essa cadeia de eventos, a que devem corresponder rigorosos langamentos contébeis, que se sucedem ao longo do perfodo, é traduzida — segundo a técnica contébil — em langa- mentos numéricos significantes de unidades de moeda corrente nacional. Os valores desta forma estocados na contabilidade — em unidades de moeda — correspondem a langamentos hist6ricos, imutveis e indiferentes & eventual perda de poder aquisitivo da moeda, representativos dos diversos fenémenos que a lei repuitou. relevantes para efeito de integracéo, com fungdo positiva ou ne- gativa, na base de célculo do imposto sobre a renda. Apesar dos esforgos do governo federal tendentes a encobrir este fato, nao é supérfluo relembrar que, na presenga de inflacio, as unidades historicamente langadas na contabilidade deixam de refletir o poder intrinseco de compra da moeda, que tem sett po- der de troca emasculado em proporgao inversa ao ritmo do fené- meno inflacionério. Ela (moeda) vé comprometido seu poder “aquisitivo” e sua aptidao natural de servir como instfumento de troca. Com isso, a contabilidade perde sua qualidade de espelho de uma realidade e sofre deformagtes caricaturais monstruosas. A contabilidade deixa, assim, de atender & sua funcéo primordial, tio bem definida na feliz expressto de Fabio Comparato™ “As regras de contabilidade t#m natureza técnica, existem para a con- secugio de determinada finalidade: a informagao exata do estado gcondmico de uma entidade”. Hist6rica, sucessiva e cronologicamente armazenados, 0s lan- ‘gamentos contabeis de per si considerados resultam, na presenga de fendmeno inflaciondrio, em um aglomerado disforme, incoe- rente, insignificativo e inuitil de elementos heterugénevs, posto que cada valor langado (conjunto de unidades de moeda corrente na- 38, "O Irredentismo da ‘Nova Contabilidade’ e as Operagées de ‘Lea- sing”, in RDM 68851. 200 IMpOSTO SOBRE A RENDA —em determinado momento dentro do perfodo de apu- neo base de céleulo—terd natureza (medida da aptidio pari servir como instrumento de troca) distinta. Logo, o que deveris ser umsistema harmé.xico e coordenado de elementos, organize- do de acordo com regras constantes, transforma-se em genuin balbiirdia numérica. . assim, a coregio monetiria como técnica tendente 1 nies efeitos cue o fenémeno inflacionério produz sobr: as unidadés de moed: corrente nacional. Visa a tomar homogé- ‘eos os montantes lan;ados na contabilidade, ao longo do peric- do de apuracio da base de célculo do imposto sobre a renda, Ist> de-forma tal que — cuando os elementos homogeneizados 68> reunidos para (elacioando-se entre sl, de acordo com cerlasr- gras) comporem um resultado — terminem por configurar valor coerente, com significedo fielmente espelhador de uma realidad Portanto,na presenca de inflacio, sea corregaemonetéria dos langamentos contébeii: inexistir ou for distorcidamente efetuad diversos efeitos daf decorrerdo, e dessas distorges podem advi conseqiéncestibut is em matéia de amposty sobse.a rend AO: (a) redugao da base de célculo; (b) aumento de.base di 1, (c) extrapolacdo da competéncia impositiva constitucio- nalmente outorgada 4 Unio, etc. [77 comszo moet 2.7. verona pri ‘Antes que algum incauto seja tomado de perplexidade pelo fato de estarmos abordando a questo da corregio monetéria em momento no qual ela iba de Ser “expurgada’ do dissito posit= vo," salientamos que — conforme se verd a seguir —, tendo ela —corregio monetéria — influéncia direta na quantificagao da base 38. Voj-seo att da Le 924995, que ape o sogulnte: “ica rev0- gad a corregfo monetiia dss demonsraoes financing de que trlam 3 Leja, 7.788, de 10 de juni de 1889, e0art 144s Le 8.200, de 28 de jun de 1991 Pardgrafodnica Hien vedada a ullzacto de qualquer sistema de corregio monetdria de demonstracGes financeiras, inclusive para fins soci térios” APLICAGKO DAS CATEGORIZADOES PROPOSTAS AO IR 201 de céleulo do imposto sobre a renda,a sua aplicagio — da corre- ‘do — nio esté a disposicio do legislador infraconstitucional. Sua manipislagao pelo legislador federal — de forma comis- siva ou omissiva —é posstvel quando acarretar redugio do tribu- to, devido a caracterfstica— jé analisada — da facultatividade do exercicio da competéncia tributéria impositiva, Todavia, quando servir de elemento incrementador do tributo devido, estaré a manifestagdo limitada a que néo acarrete a deturpacdo da materialidade—no caso, auferir renda— constitucionalmente f- xada, Entio; ¢ juridicamente irrelevante a eventual pretenso do legislador ordindrio de desprezar os efeitos do fenémeno inflacio- nario sobre os elementos que influirdo na base de cfleulo do im- posto sobre a renda a pagar. Se essa pretensio acarretar aumento da carga tributéria, ou desvirtuagio da materialidade, o particu: lar terd direito de ver tais efeitos reconhecidos. E que esse direito é assegurado aos particulares diretamente pela Constituigao Fe- deral, podendo qualquer interessado recorrer ao Judiciério, as- sim na ago como na omissio do legislador ordindrio. Annecessidade de tratamento doutrindrio da questo decorze dos efeitos do fenémeno inflaciondrio e seus reflexos sobre o con ceito de renda constitucionalmente pressuposto, e nao do even- tual tratamento legislativo (infraconstitucional) da questo. Nao importa a intensidade do fenémeno inflacionério, bas- tando que ele exista para que o particular tenha’o direito —- que pode oundo ser exercido, de acordo com suas prépri

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