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pode ser feita durante o casamento, mas é claro que a disposigao também pode ser feita depois da dissolugao e, sobretudo, esta al- ternativa é totalmente indiferente e irrelevante, Nao interessa nada © momento em que a disposicao foi feita; o que interessa 6 a con- sequéncia juridica estabelecida pelo art. 1685.°, n.° 2, ¢ este artigo 86 tem sentido e eficai ‘a — 86 se assume, verdadeiramente, como uma norma juridica - no ambito da comunh4o pés-matrimonial, depois da dissolugio do casamento por morte do testador. $6 depois da dissolugao do casamento por morte é que operam os efeitos juridicos estatuidos pelo testador. Assim, 0 art. 1685.°, n.° 2, pode assumir-se como uma das normas ressalvadas pelo art. 1404.°: * sem prejuizo do disposto especialmente Cfr a Rel. do Porto, no ac. de 06.13.2013 (em www.dgsi.pd, seguindo outros acGrdaos do $.TJ., de 1979, 1999 © 1974, que « Subseccao IV. Responsabilidade por dividas dos conjuges Bibliografia portuguesa Brirza, Maria Leonor Pizarro, Os efeitos do casamento, in “Reforma do Codigo Civil’, Lisboa, Livraria Petrony, 1981, p. 91-135; Cauino, AntOnio, Sobre a participacao dos cénjuges em sociedades por quotas, Coimbra, 1986 (separata do mimero especial do Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra — “Estudos em homenagem ao Prof, Doutor Antnio de Arruda Ferrer Correia’, 1984); Carsio, Maria José, Pressupostos processuais gerais na acao execuliva — a legilimidade e as regras de penhorabilidade, in "Reforma da acio executiva", Themis, ano IV, n.° 7, 2003, p, 79-88; In., Ainda o artigo 825.° do Cédigo de Processo Civil: o alcance e 0 valor da declaragdo sobre a comunicabilidade da divida, in “Lex Familiae", ano 3, 2006, n.* 5, p. 57-63; CaRDoso, Augusto Lopes, 4 Administracdo dos bens do casal, Coimbra, Livraria Almedina, 1973, € Alguns aspectos das dividas dos cénjuges no novo Cédigo Civil, in “Revista dos Tribunais’, Porto, ano 86.°, Fev. 1968, n.” 1828, p. 51-63, € Mar. 1968, n.* 1829, p. 99-114; In., Da responsabilidade dos conjuges por dividas comerciais, 1985 (separata do Cielo de Conferéncias no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados); Cavz, Guilherme Braga da, Capacidade patrimonial dos cénjuges (Anteprojeto dum titulo do futuro Cédigo Civil), in "Boletim do Ministério da Justiga’, Lisboa, n.° 69, Out. 1957, p. 353-429; Diss, Cristina, Compensacdes devidas pelo pagamento de dividas 476 do casal, Coimbra, Centro de Direito da Familia, Coimbra Editora, 2003; Ip., Das compensacaes por pagamento de dividas do casal (0 caso especial da sua atualizasao), in “Comemoracdes dos 35 anos do Cédigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977", vol. 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II, p. 207-223, Coimbra, Coimbra Editora; Ip., Alteragao do Estatuto Patrimonial dos Cénjuges ¢ Responsabilidade por Dividas, Coimbra, Coimbra Editora, 2012; Piero, Rui, A a¢do executiva depois da reforma, Conselho Distrital da Ordem dos Advogados, Lisboa, Lex, 2004; Saiazax, Helena, Breves notas sobre a responsabilidade pelas dividas contraidas por um dos cénjuges no exercicio da atividade comercial, in "Comemoracdes dos 35 anos do Cédigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977", Coimbra, Coimbra Editora, 2004, p. 351-380; Suva, Paula Costa e, A Reforma da Acao Executiva, 3 ed., Coimbra, Coimbra Editora, 2003; Sovsa, Miguel Teixeira de, As dividas dos cénjuges em processo civil, in “Comemoragoes dos 35 anos do Cédigo Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977”, Coimbra, Coimbra Editora, 2004, p. 341-350; Vamta, J. Antunes, Direito da Familia, 1.° vol., 5.* ed., Lisboa, Livraria Petrony, 1999, p. 396-422; Xavnur, Vasco da Gama Lobo, 0 art. 10.° do Sdigo Comercial e as dividas cambiarias. Assento do Supremo Tribunal de Justiga, de 13 de Abril de 1978, n.* 4/78, Coimbra, 1980 (separata da “Revista de Dircito ¢ de Estudos Sociais”, ano XY, Jan.-Mar., n.° 1 € 2), e Responsabilidade dos bens do casal pelas dividas comerciais de um dos cénjuges, Coimbra, 1980 (separata da “Revista de Direito e de Estudos Sociais’, ano XXIV, Out-Dez., n.° 4) 164, Principios gerais A primeira observacio que merece ser feita diz respeito & propria necessidade de consagrar um regime especial sobre responsabili- dade por dividas dos cénjuges, para além do direito comum das obrigagdes Segundo o direito comum, cada cénjuge teria legitimidade para assumir dividas e responderia com o seu patriménio pelo seu cumprimento. Seriam utilizaveis as técnicas do mandato, com ou sem representacio, e da gestio de negécios, para que um dos cOnjuges pudesse obrigar o outro; e ainda o instrumento da soli- dariedade passiva, no sentido de fazer um dos coobrigados pagar mais do que a sua parte na obrigacao; e também o da fianga, para 477 que o patriménio de um dos cénjuges pudesse reforcar a garantia do cumprimento das obrigagdes assumidas pelo outro. Isto €, 0 direito comum das obrigacées dispde de instrumentos que pode- riam ser utilizados pelos cénjuges, na falta de um regime especial. Mas a comunhao de vida conjugal — comunhiao de pessoas e de bens — justifica a utilizagao de instrumentos especiais, mais complexos mas também mais adequados. Os t6picos mais caracteristicos deste regime especial encontram- -se no facto de, facilmente, um dos cénjuges poder obrigar 0 outro, sem este ter participado no ato de assuncao da divida e na auséncia de um acordo de mandato ou independentemente da verificagio dos requisitos da gestio de negécios; e ainda na circunstancia de, com frequéncia, o patriménio de um dos cénjuges, € 0 patriménio comum, serem chamados a pagar dividas para além da quota de responsabilidade que thes competia, sem prejuizo, é certo, de um direito de regresso. No fundo, o regime especial de responsabilidade por dividas dos cénjuges ocupa-se, fundamentalmente, destes desvios ao direito comum das obrigacdes. Cada um dos cOnjuges tem legitimidade para contrair dividas sem 0 consentimento do outro (art. 1690.*, n.° 1), entendendo-se, para a determinacao da responsabilidade dos cénjuges (p. ex., para © efeito do art. 1691.°, n.° 2), que a data em que as dividas foram contraidas é a do facto que thes deu origem (art. 1690.°, n.* 2). © principio j4 estava consagrado no Cédigo de 1966. Porém, atribuindo a lei a administracao dos bens da mulher ao marido, entendia-se mal que ela os responsabilizasse livremente pelas suas dividas. Assim, 0 principio do art. 1690.°, n.° 1, deveria porventura ser objeto de interpretacao restritiva que o harmonizasse com o art. 1678.°. A mulher poderia livremente contrair dividas e estas seriam sempre validas (ao contrario do que acontecia no direito anterior a 1966); mas o pagamento dessas dividas € que sé seria valido se fosse feito com bens de que a mulher tivesse a administragio, e 478 apenas a custa destes bens poderia ser exigido o pagamento ime- diato A mulher. Se devesse fazer-se esta interpretacao restritiva do art. 1690.°, n.° 1, 0 alcance do preceito seria afinal muito limitado. © principio de legitimidade expresso nesse texto s6 teria verda- deiro alcance, em relacao 4 mulher, quando, excecionalmente, ela estivesse na administragao dos bens ou de alguns dos bens do casal € em relagao aos bens que ela administrasse. A Reforma de 1977 manteve o art. 1690.°, n.° 1; mas, ao dar a am- bos os cénjuges os mesmos direitos de administracao e, por isso, os mesmos poderes para onerar bens responsabilizando-os por dividas, deu ao principio um alcance que ele nao tinha no direito anterior. Note-se, porém, que nao desapareceram as dificuldades de har- monizar o regime da responsabilidade por dividas com o regime da administracao dos bens do casal ¢ 0 regime das ilegitimidades conjugais. Na verdade, pode continuar a perguntar-se se um cén- juge, contraida uma divida, deve poder pagé-la com bens que nao administre, ou se 0 credor deve poder exigir o pagamento a custa de bens de que o devedor nao possa dispor livremente. A utiliza- 40, pelo devedor, de bens que nao administre, para pagamento da divida, constitui um ato de administragao ilfcita, contra © qual © cénjuge do devedor poderd reagir no quadro das regras do art 1681.°, n.° 3, CCiv. Tratar-se- ainda, provavelmente, da pratica de uma “ilegitimidade conjugal”, pois significar4 uma alienacao de bens que o devedor nao podia praticar sozinho 165. Dividas da responsabilidade de ambos os cénjuges Sao da responsabilidade de ambos os cénjuges as dividas men- cionadas nas varias alineas do n.° 1 e no n.° 2 do art. 1691.° 4) Dividas contraidas pelos dois cénjuges, ou por um deles com © consentimento do outro (art. 1691.°, n.° 1, al. a)) 479 Visam-se aqui quer as dividas anteriores quer as posteriores a0 casamento, € qualquer que seja o regime de bens, A lei nao faz exigéncias formais para a validade do consen- timento; assim, tem de valer o principio da liberdade de forma consagrado no art. 219.° CCiv, pelo que o consentimento meramente consensual € valido*. © consentimento nao formalizado pode suscitar, no entanto, dois problemas. Em primeiro lugar, pode ser dificil de provar, no caso de conflito entre credor e devedor, ou entre cénjuges; o 6nus da prova do consentimento cabera ao credor que pretender responsabilizar ambos os cOnjuges, ou ao cénjuge devedor que quiser partilhar a responsabilidade com o outro cénjuge. Em segundo lugar, no caso de os cénjuges serem casados em regime de separagao de bens, © consentimento informal do cénjuge do devedor — que o credor nao conheceu nem podia ter conhecido — pode traduzir-se numa responsabilidade parcidria pela divida (art. 1695.°, n.° 2, CCiv) contra a expectativa do credor, que contava com a responsabi- lizagao integral do devedor com quem contratou. Castro MeNpes recomendou que a falta de comunicagao prévia do consentimento torne a responsabilidade parciéria inoponivel ao credor’. Note-se que a lei s6 fala das dividas contraidas por um dos cOnjuges com o consentimento do outro € nao das que sejam con- traidas com o respetivo suprimento judicial. A razio parece ser a de que tal suprimento nao se admite, por desnecessario, dando a lei a cada um dos cénjuges, como da, legitimidade para contrair dividas sem © consentimento do outro. Claro que se concebia que a lei admitisse o suprimento judicial do consentimento, mesmo nao sendo este consentimento necessario, para 0 efeito de a res- % Contra, defendendo a necessidade da forma exigida para o negécio em causa, Axtunes Vantta, Direito da Familia, 1.° vol., 5. ed., Lisboa, Petrony, 1999, p. 398, nota 1 » Diretto e Justiga, vol. 11, 1981/86, p. 29-31 480 petiva divida ser havida como de responsabilidade comum. Mas a lei parece nao admitir aqui o suprimento judicial previsto no art. 1684.°. Alids, quando a divida seja contraida por um dos cénjuges nos limites dos seus poderes de administracdo sera normalmente de responsabilidade comum, nos casos em que o suprimento seria concedido se pudesse pedir-se, por ser contraida “em proveito co- mum do casal” nos termos do al. ¢) do n.° 1 do art. 1691.° Quando a divida seja contraida por um dos cénjuges e seja estranha ao Ambito da sua administracao, é que sera normal- mente de responsabilidade exclusiva desse cénjuge, mesmo que contraida em proveito comum do casal, no podendo o cénjuge nio administrador pedir o suprimento judicial do consentimento do outro para o efeito de responsabiliz 1 igualmente. Poder, porém, invocar o principio do art. 1679.°, se se verificar 0 condi- cionalismo deste artigo. 6) Dividas contraidas por qualquer dos cénjuges para ocorrer aos encargos normais da vida familiar (art. 1691.°, n.° 1, al. )) Trata-se das dividas pequenas, relativamente ao padrao de vida do casal, em geral correntes ou periédicas, que qualquer dos cén- juges tem de ser livre de contrair. E aqui que cabem as dividas de alimentacao, vestudrio, médico e farmacia, etc. Normalmente sao dividas contraidas por um dos cénjuges no ambito da parcela de administragio dos bens afetados ao governo do lar que Ihe cabera, ¢ em proveito comum do casal. Se for assim, j seriam de respon- sabilidade comum por forga do art. 1691.°, n.° 1, al. c); mas a lei nem exige a prova dos pressupostos requeridos nesta alinea, porque presume que eles se verificam. Ou entao trata-se de dividas alheias a administragao de bens, ou que nao tém intencio de proveito comum, mas que se integram num quadro normal de despesas, como a divida para o pagamento de uma viagem de um filho ou da satisfagao de uma necessidade de um ascendente a cargo. 481 Nao interessa que as dividas sejam contraidas antes ou depois do casamento, nem que o regime de bens seja um ou outro; a verdade € que se trata de encargos preparatérios do casamento ou derivados da vida familiar, a cuja responsabilidade nenhum cénjuge se pode eximir, ainda que nio tenha contraido pessoalmente a divida nem tenha consentido expressamente nela Em 05.11.2010, a Relacio do Porto afirmou que “a aquisicio de um veiculo automével nos dias de hoje, embora frequente, ndo pode ser considerada um encargo normal da vida familiar" (www.dgsi.pD, na sequéncia de deliberagdes anteriores no mesmo sentido, Parece razoavel que esta norma se aplique, por analogi (supra, n.° 27). A aparéncia de casamento, a tutela dos interesses do credor ¢ a facilidade na obtengio de crédito justificam a aplicagao analégica (contra, em face do art. 1319-2 do Cédigo Civil espanhol, Lacruz Berdejo et al., Derecho de Familia, 4.* ed., Barcelona, Bosch, 1997, p. 26). Nao havendo casamento, nao ha uniao de facto bens comuns; nem ha, em rigor, bens préprios. Responderio os bens pessoais dos devedores, parciariamente. ©) Dividas contraidas na constancia do matriménio pelo cénjuge administrador € nos limites dos seus poderes de administrac4o, em proveito comum do casal (art. 1691.°, n.° 1, al. ¢)). Na aplicagao pratica deste principio deve ter-se presente que a administragio cabe normalmente ao marido e 4 mulher. De modo que, para se saber se certa divida contraida por um dos cénjuges pode considerar-se de responsabilidade comum a luz desta al. ¢), € preciso comecar por averiguar se essa divida est4 conexionada com os bens de que esse cénjuge tem a administracao. A averiguacdo assentara na aplicacdo das normas constantes dos arts. 1678.° e 1679.° a0 caso concreto. Assim, nao preenche este requisito a divida contraida pelo marido com a intengio de pagar a construgio de um muro numa propriedade da mulher, de que ela € a administradora Em segundo lugar, importa que o devedor tenha agido “nos limi- tes dos seus poderes de administracdo”. Deve sublinhar-se, a este 482 propésito, que os poderes de administragao dentro do casamento so mais amplos do que os poderes dos vulgares administradores de bens alheios; assim, 0 cénjuge que esta a administrar um bem comum, ou proprio do outro, por forca de uma atribuigao legal (art. 1678.°, n.° 2), tem poderes muito amplos, que s6 terminam, grosso ‘modo, nos limites impostos pela necessidade de pedir consentimento a0 outro, para a pritica de certos atos, sob pena de ilegitimidade E também excede os seus poderes nitidamente aquele cénjuge que contrai uma divida com o propésito de subscrever novas acées, reservadas a acionistas, quando as acées anteriores sio um bem comum, administrado por ambos; ou quando decide fazer um muro na quinta que é administrada pelos dois. Por tiltimo, quanto 4 nogao de proveito comum ha varias ideias a salientar. A primeira é que o proveito comum nao se presume, exceto nos casos em que a lei o declarar (art. 1691.°, n.° 3). A segunda é que o proveito comum se afere, nao pelo resultado, mas pela aplicacao da divida, ou seja, pelo fim visado pelo devedor que a contraiu. Se este fim foi o interesse do casal, a divida considera- -se aplicada em proveito comum dos cénjuges, embora, na realidade, dessa aplicagao tenham resultado prejuizos. Assim, a divida que um dos cénjuges contrai para montar uma exploracao agricola ser4 comu- nicivel mesmo que a exploracao nao dé lucros ou até traga prejuizos, pois se trata de divida aplicada no interesse comum do casal. Interesse comum do casal que pode ser nao s6 um interesse mate- rial ou econémico, senao também um interesse moral ou intelectual Assim, sera aplicada em proveito comum a divida que um dos cénjuges contraia para fazerem os dois uma viagem, para irem a uma festa, etc.” Neste sentido, Pines 08 Liva ¢ Brac pA Cxvz, Direitos de Famélia, vol, 11, Coim- bra, Coimbra Editora, 1943, p. 125, e Cunuia Goncaives, Tratado de Direito Civil, t VI, Coimbra, Coimbra Editora, 1933, p. 393. 483 Resta acrescentar esta ideia: decerto que nao basta, para que uma divida se considere aplicada em proveito comum dos cénjuges, a intencao subjetiva do agente: exige-se uma intencao objetiva de proveito comum, ou seja, é necessario que a divida se possa consi- derar aplicada em proveito comum aos olhos de uma pessoa média ©, portanto, a luz das regras da experiéncia ¢ das probabilidades normais. Assim, por exemplo, uma divida que um dos cénjuges contraia para fazer em Coimbra uma plantacao de bananeiras nunca podera considerar-se aplicada em proveito comum, ainda que ele a tenha contraido nesse intuit. Determinar se uma divida foi aplicada em proveito comum implica, ao mes- mo tempo, uma questdo-de-facto (averiguar 0 destino dado ao dinheiro) e uma questao-de-direito (decidir sobre se, em face desse destino, a contraida em proveito do casal). Por isso, ndo deve quesitarse a divida foi ou nao contraida em proveito comum do casal; deve antes perguntar-se que aplicagio teve a quantia proveniente da divida. Ignorar-se esta distingao pode conduzir 0 autor a omitir a alegacao dos factos relevantes — alegag3o que mais tarde nao pode suprir. © autor pode perder a acio por esse motivo, como no caso julgado pelo ac. do ST) de 7.6.2005 (Col. Jur. 2005, t. Il, p. 118); eft. ainda os acs. do STJ de 11.11.2008 e de 01.14.2010, ida foi ou nio Foi muito discutida a questio de saber se 0 aval ou a fianga prestados por um dos cOnjuges responsabilizavam também 0 outro; se, numa primeira fase, se en- tendia que esses atos eram praticados pelo marido em proveito comum do casal, esta hoje mais firme a posicao contraria de que o aval ou a fianga nao satisfazem, em principio, os requisitos da al. c), sobretudo o requisite do “proveito comum’ A doutrina mais generalizada exige que 0 proveito visado pela constituiga0, da divida resulte imediatamente dela (quer isto se comprove pelo simples ato de constitui¢ao da divida, quer seja necessario averiguar de outro modo a intengio do cénjuge devedor), € nio apenas de um modo reflexo, indireto. Assim, nunca seria bastante como intengio de proveito comum o propésito do devedor que presta fianga a um arrendamento na esperanca de que inqu ino se torne seu cliente; ou a intengdo do gerente que presta um aval a sociedade de que nao é sécio, apenas com a expectativa de favorecer a solidez da empresa ¢ garantir deste modo o seu posto de trabalho, Esta corrente maioritéria acrescenta que a relevancia dos proveitos indiretos ou reflexos provocaria uma grande incerteza Pela opinido hoje vencida alegou-se que em certos casos a garantia prestada, embora sem contrapartida, produz uma valorizagdo de um bem comum tal como 484 se fosse uma “benfeitoria itil", Seria o caso do aval prestado pelo cénjuge sécio, que acredita econémica e financeiramente a sociedade e valoriza a quota comum. Acrescentou-se que esta valorizagao da quota sera mesmo um proveito direto, Ho direto como a valorizagao que resulta para qualquer bem da realizagao de benfeitorias™, Pints De Lima € Awruwes Vareia afirmaram, a propésito do aval e da fianga, que “sé em casos raros sera licito sustentar que o ato foi realizado em proveito comum do casal”™ Em 2.7.1998, 0 S.TJ. entendeu que agit em proveito comum do casal o ma- Fido que accitou uma letra ¢ foi este aceite que Ihe favoreceu certos descontos bancarios em beneficio da firma de que sio sécios o marido, a mulher ¢ 0 pai desta (Col. Jur. — $.TJ. 1998, t. 11, p. 164-7). A Rel. do Porto deliberou, em 23.6.2005, que nio se pode presumir o provel- fo comum na prestagio do aval pelo cdnjuge gerente (Col. Jur. 2005, t. IIL, p. 196). Podia pensar-se em aplicar as alineas ¢) ¢ d) do art. 1691.°, n.* 1, a0 caso da unio de facto. Na verdade, a al. ¢) aplica-se a cOnjuges casados em regime de separagio, em que cada cOnjuge administra o que & seu; 0 que nao € distinto do quadro patrimonial da uniao de facto. No entanto, a aplicagao desta regra a unio de facto implicaria uma opgao de equiparacio tendencial entre o casamen: to © a unio de facto que teria de ser ponderada ¢ explicitada pelo legislador. Quanto a alinea d), como ela nao pretende aplicar-se aos casais que vivem em separagio de bens, também nao se deve aplicar a pura auséncia de regime de bens da unido de facto, d) Di do comércio (art. 1691.°, n.° 1, al. d)). las contraidas por qualquer dos cénjuges no exercicio “O regime do art. 1691.°, n.° 1, al. d), visa a tutela do comér- cio: alargando-se o ambito da garantia patrimonial concedida aos credores daqueles que exercem o comércio (...) facilita-se a estes iltimos a obteng’o de crédito e, desta maneira, favorecem-se as Vejam-se Pints pe Lina, RLY, ano 100.", p. 9 s., € ano 102.", p. 16 s.; Lores Carnoso, Alguns aspectos das dividas dos cénjuges no novo Cédigo Civil, cit., p99 ° Cédigo Civil anotado, vol. IV, p. 332. 485 atividades mercantis”*. O regime completa-se com 0 disposto no art. 15.° do CCom: “As dividas comerciais do cénjuge comerciante presumem-se contraidas no exercicio do seu comércio’ © alargamento do ambito da garantia patrimonial, pela respon- sabilidade de ambos os cénjuges, corresponde a um sacrificio dos interesses do cénjuge do comerciante, que preferia ficar alheio aos riscos da atividade desenvolvida pelo comerciante; este sacrificio da corresponsabilizacao é-Ihe imposto em favor do credor ¢ do comércio. Mas pensa-se que este sacrificio acaba por reverter no interesse dos cOnjuges e da familia na medida em que da confianga aos credores, facilita a obtengao de crédito, favorece o exercicio do comércio que constituira uma parte relevante da sustentacio financeira da familia. © cénjuge do comerciante pode querer afastar a comunicabilidade da divida. O primeiro caminho para afastar a sua responsabilidade é o de mostrar que a divida nao foi contraida no exercicio do comér- cio do devedor, ao contrario do que a presungao do art. 15.° CCom indica; ou seja, que a divida, embora comercial, nao foi contraida no exercicio do comércio do cénjuge comerciante. Sera o caso, p. ex., da letra de favor, que embora seja um titulo comercial nao faz parte do exercicio do comércio do cénjuge comerciante, nao passa de um favor a terceiro sem beneficio direto para a exploracao do aceitante Ja se discutiu se bastaria um ato ocasional de comércio para desencadear © regime previsto na al, d) do art. 1691." CCiv. A maioria da doutrina defende, porém, que regime previsto sé se justifica quando se tratar de dividas comer- ciais integradas no exercicio habitual do comércio do cénjuge comerciante™ Aal. d) estabelece uma verdadeira presuncao legal de proveito comum, em favor do credor. Assim, a0 contrario do que se passa * Vasco Xavier, Responsabilidade dos bens do casal pelas dividas comerciais de um dos cénjuges, cit., p. 8 3: Cristina Dias, Compensagdes devidas pelo pagamento de dividas do casal, Git, p. 63, nota 84 486 no regime da alinea anterior, o credor nao tem de fazer a prova do proveito comum A presuncio, todavia, nao é absoluta. Ao contrario do Cédigo de 1966, que considerava de responsabilidade comum as dividas contraidas por qualquer dos cénjuges no exercicio do comércio mesmo que nao houvesse proveito comum do casal, a Reforma de 1977 veio alterar esta alinea no sentido de se poder provar que nao houve intengao de proveito comum da parte do cénjuge que con- traiu a divida, sendo esta, portanto, de responsabilidade exclusiva do cénjuge devedor. Nao se quis levar tao longe a protecao dos credores comerciais, com sacrificio dos interesses do casal, como a levara © Cédigo de 1966 ‘A circunsténcia de os cénjuges viverem separados de facto nao é suficiente para mostrar a auséacia de proveito comum. Na verdade, a separagio de facto ndo obsta a que o comerciante exerga a sua atividade com uma intencio de pro- veito comum, supondo, por exemplo, que retira dos proventos do comércio uma pensio de alimentos para o conjuge. Ha até quem pense que, mesmo quando o comerciante nao presta qualquer auxilio econémico ao seu cénjuge separado de facto, este acaba por parti- cipar necessariamente no esforco comercial, através dos lucros que entram no patriménio comum, que sera partilhado mais tarde ou mais cedo; deste modo, 0 exercicio do comércio nao deixaria de ser praticado no interesse de ambos. Embora esta afirmacio seja compreensivel, tem sido afastada. Em pri meiro lugar, uma coisa € impor ao cénjuge do comerciante uma participacao quotidiana nas responsabilidades quando el das vantagens da atividade comercial; outra coisa é oneré-lo com a respon- sabilidade a troco de um aumento eventual futuro da sua meacao nos bens comuns, Em segundo lugar, se esta expectativa do aumento da meagao fosse bastante para sustentar que as dividas comerciais eram contraidas em proveito usufrui também regularmente comum, nao haveria maneira de aplicar a segunda parte da al. d); de facto, nos regimes de comunhao (0 caso da separacao de bens esta previsto 4 parte) quando é que se poderia provar que nao tinha havido intengao de proveito comum, sendo certo que os proventos da atividade vao sempre incluidos no patriménio comum?*** 1% Vasco Xavusn, Responsabilidade dos bens do casal pelas dividas comerciais de um dos cénjuges, cit., p. 7, nota 3. 487 Também nao havera comunicabilidade se vigorar entre os cén- juges o regime da separacao. Trata-se de uma aplicacdo da ideia de que os cénjuges sao es- tranhos um ao outro, do ponto de vista patrimonial; os riscos e insucessos de um nao afetam o patriménio do outro. A consagracio das duas excegdes a regra da responsabilidade de ambos os cOnjuges pode suscitar diividas. Na verdade, pode perguntar-se por que raz4o a inexisténcia de proveito comum, num regime de comunhao, afasta a responsabilidade do outro cénjuge, mesmo quando os frutos se integram na massa patrimonial comum; enquanto a existéncia de proveito comum, num regime de separa- 40, nao € suficiente para sustentar a responsabilizagio do segundo cOnjuge, porque os frutos sao bens proprios ¢ os patriménios estao separados™. Esta verificagdo leva a pensar que o legislador usou dois critérios: nos regimes de comunhio, 0 critério decisivo foi a inexisténcia de proveito comum, enquanto no regime da separacio © critério decisivo foi a natureza de bens préprios dos frutos do estabelecimento, que primou sobre a existéncia de proveito comum. Ha quem pense que o regime do art. 1691.°, n.° 1, al. d), con- sagra um sacrificio demasiado para o cénjuge do comerciante, exposto as consequéncias de uma atividade que implica um risco econémico consideravel; € mesmo concebivel que se recorra ao di- vércio simulado para se poder partilhar os patriménios e separar as responsabilidades, na falta da possibilidade de modificar 0 regime de bens no sentido da separagio. H4 boas raz6es para propor que as dividas contraidas no exercicio do comércio sejam consideradas como dividas préprias do comerciante". Sugestao compreensivel, ‘A. Lopes Cannoso estaria a pensar nisto quando escreveu: "nao ha hipétese de proveito comum mesmo que o casal viva desse estabelecimento, 0 que ser excessivo", Da responsabilidade dos cénjuges por dividas comerciais, ci deixa de +p. 191 Awrosio Cauino afirmou que o regime € “excessivo”, “iniquo” e “historicamente situado”, Sobre a participagao dos cénjuges em sociedades por quotas, cit., p. 36-7. 488 mas que deveria ser completada com a proposta de que os frutos do exercicio do comércio sejam tratados como bens préprios do comerciante e nao como bens comuns; de outro modo o cénjuge do comerciante evitava os riscos e os prejuizos para guardar s6 a sua parte nos proventos da atividade Também pode perguntar-se por que razao a lei persiste em consagrar um regime especialmente favoravel para 0 comércio € no estende o mesmo favor a empresa agricola ou a industria; ou ainda ao exercicio de profissdo liberal. Também estas atividades costumam ser exercidas no interesse da familia, de tal modo que podiam fundamentar uma presungio de proveito comum; mas os credores nao beneficiam deste regime especial, para ficarem apenas com 0 recurso da al. ¢) No ac, de 15,3,2005, o STJ discutiu se a prova do casamento entre o comer- ciante © 0 seu cénjuge devia fazer-se por documento auténtico ou se este meio é dispensivel quando se debatam direitos disponiveis e 0 estado de casado nao seja impugnado (Col. Jur., tI, p. 132-137) ¢) Dividas que onerem doacées, herancas ou legados, quando os respetivos bens tenham ingressado no patriménio comum (arts. 1691.°, n.° 1, al. e), € 1693.°, n.° 2). O ingresso dos bens no patriménio comum resultar4, naturalmen- te, de os cénjuges terem estipulado o regime da comunhao geral ou uma clausula de comunicabilidade de certos bens adquiridos a titulo gratuito. Note-se que a responsabilidade por estas dividas é comum ainda que 0 outro cénjuge nao tenha dado o seu consentimento 3 aceitacio da liberalidade'™ Mas 0 cénjuge do aceitante podera impugnar 0 Leonor Brtezs, Os efeitos do casamento, cit., p. 133-4; Diez-Picazo € Gvitor, Sistema de Derecho Civil, .., p. 183 * Consentimento que aliés nio & necessirio (art. 1683.°, n.° 1), 489 pagamento das dividas com o fundamento de que valor dos bens nao € suficiente para a satisfacao dos encargos (art. 1693.°, n.° 2). f) Dividas contraidas antes do casamento por qualquer dos cOnjuges em proveito comum do casal, vigorando o regime da co- munhao geral de bens (art. 1691.°, n.° 2). Pode exemplificar-se com “a divida dos doces, vinhos ¢ outras iguarias, servidas no Junch ou jantar nupcial aos convidados para a boda; ou com as “despesas de mobilidrio e de decoragao da futura casa, despesas com enxovais (...) dividas contraidas para custear as despesas com os papéis, etc.” Sendo outro o regime de bens, a divida sera da exclusiva res- ponsabilidade do cénjuge que a contraiu, nao obstante ter sido aplicada em proveito comum do casal. Compreende-se que seja assim. No regime da comunhio geral, os bens que pertenciam ao devedor e garantiam a divida integram-se no patriménio comum, no momento do casamento; 0 outro cénjuge passa a participar por metade no valor dos bens que garantiam a divida, ¢ por esta razao € justo que partilhe também a responsa bilidade. Mas nos outros regimes tipicos os bens que garantiam a divida continuam a pertencer apenas ao devedor e, portanto, € justo que a responsabilidade fique s6 com ele”, Podia pretender-se que, comunicando-se todos os bens do devedor, no re- gime da comunhio geral, também se deviam comunicar todas as dividas, © nao apenas aquelas que tivessem sido contraidas “em proveito comum do casal"; esta pretensio destinar-se-ia a proteger os credores pessoais do devedor solteiro, que aparentemente perdem a garantia natural dos seus eréditos, ao verem os bens do devedor transformar-se em bens comuns, na data do casamento. Mas estes * Cunua Goncatves, Tratado de Direito Civil, t. LV, p. 503 € 504. © A Lores Cannoso, Alguns aspectos das dividas dos conjuges no novo Cédigo Civil, cit., p. 53, Beaca ba Cavz, Capacidade patrimonial dos cénjuges, cit., p. 388. 490 credores estavam protegidos sobretudo porque os bens levados para o casamento, embora se tivessem tornado comuns, j4 respondiam logo a0 mesmo tempo que 95 bens proprios do devedor; e hoje, eliminada a regra da moratoria prevista na antiga redagio do art, 1696.°, n.” 1, esses credores podem executar imediatamente a meagao do devedor no patriménio comum. &) Dividas que onerem bens comuns (art. 1694.°, n.° 1) Parece natural que sejam comunicaveis as dividas que oneram bens comuns ~ p. ex. dividas de IMI, de taxas de saneamento ~ que assim acompanham os bens como encargos sobre eles; talvez nem fosse necessario afirma-lo. Mas, na verdade, a qualificacao destas dividas nao resultava das outras regras sobre a responsabilidade dos cénjuges e, portanto, valeu a pena enunciar 0 preceito. O legislador impés 0 regime mesmo as dividas vencidas antes do casamento, a0 contrario do que resultaria das regras gerais enunciadas atras. Alegadamente", o interesse foi o de “evitar que a comunicagao dos bens possa prejudicar os interesses dos credores das dividas que 0s oneram’, como aconteceria quando um nubente devedor, casando em comunhio geral, transformando todo o seu patriménio em bens comuns, eliminava a garantia normal das dividas vencidas antes do casamento. Pode parecer discutivel a necessidade que o legislador sentiu de tutelar assim, de um modo especial, o interesse destes cre- dores, quando o mesmo receio seria fundado relativamente a todas as dividas pessoais anteriores ao casamento, a todos os credores dos nubentes que casam em comunhio geral e ficam sem bens préprios para garantir as dividas ja vencidas. O remédio geral, para todos os credores nestas circunstincias, reside na possibilidade de fazer res- ponder certos bens comuns ao mesmo tempo que os bens préprios (que nao existirao), nos termos do art. 1696.°, n.° 2, designadamente os bens levados para o casamento; e também no facto de ter sido eliminada a moratéria que protegia o patriménio comum, o que Beaca ba Cavz, Capacidade patrimonial dos cénjuges, cit., p. 404. 491 permite ao credor executar, subsidiariamente, a meagao do devedor (art. 1696.°, n.° 1, desde dezembro de 1995) h) Dividas que, nos regimes de comunhao, onerarem bens pré- prios, se tiverem como causa a percecio dos respetivos rendimentos (art. 1694.°, n.° 2) Na sequéncia de uma norma semelhante do Cédigo de Seabra™, a lei vigente da relevo a distincao entre dois tipos de dividas que podem ser suscitadas por bens proprios. Ha pois que ver sem- pre se as dividas esto relacionadas com os bens em si (imposto sobre sucessdes e doagées, taxa de incéndio ou de saneamento) ou com a percecao dos rendimentos desses bens (impostos sobre © rendimento, etc.). $6 neste segundo caso é que as dividas serao de responsabilidade comum, por também serem comuns, nos regimes de comunhio, esses rendimentos (art. 1733.°, n.° 2). 166. Bens que respondem pelas dividas de responsabilidade comum Pelas dividas da responsabilidade de ambos os cénjuges res- pondem os bens comuns e, na falta ou insuficiéncia deles, os bens proprios de qualquer dos cOnjuges (art. 1695.°, n.° 1). © mesmo art. 1695.°, n. 1 € 2, esclarece que a responsabilida- de dos cénjuges (no caso de a divida vir a ser paga com os bens proprios) é solidaria nos regimes de comunhiao e parcidria no regime da separacao. Mas é claro que nao est aqui excluida a so- lidariedade convencional (cfr. os arts. 512.° e segs.). Também deve acrescentar-se que a parte de cada cénjuge na responsabilidade nao € necessariamente de 50%; ao menos quando as dividas visaram ocorrer aos encargos normais da vida familiar, a responsabilidade Art 1115, n° 2. 492 de cada cénjuge deve corresponder 4 medida do seu dever de con- tribuir para os encargos, nos termos consagrados pelo art. 1676.°, n° 1, isto &, na proporgao das possibilidades de cada um. Nos termos do art, 34.° CProcCiv , devem ser propostas contra ambos 0s cOnjur ges as acdes emergentes de facto praticado por ambos os cOnjuges, como € natural. ‘Também devem ser intentadas contra ambos os cénjuges as ages de que possa resultar a perda ou a oneragao de bens que s6 por ambos possam ser alie. nados, ou de direitos que s6 por ambos possam ser exercidos, incluindo as ages que tenham por objeto, direta ou indiretamente, a casa de morada de familia — 0 que nos remete para o regime das ilegitimidades conjugais Por diltimo, devem ser intentadas contra ambos os cénjuges as agdes emer- gentes de facto praticado por um dos cénjuges mas em que 0 credor pretenda obter decisdo suscetivel de ser executada sobre bens préprios do outro. Neste caso, a demanda dos dois cénjuges esta na disposig@o do credor, Este parece ser © caso de divida que responsabiliza ambos mas em que o credor sabe que nao hd bens comuns ¢, portanto, vao responder os bens proprios de qualquer deles, solidariamente; ou entao ha bens comuns mas, por forca das normas gerais sobre administracio e sobre os poderes de disposicio dos cOnjuges, o conjuge deve: dor pode dispor sozinho desses bens comuns (eff. 0 art 1682.°, n° 2). Nestes casos, 0 credor pode escolher demandar apenas 0 cénjuge que praticou 0 facto de que emerge a divida, se the bastarem os bens préprios deste cénjuge, ou os bens comuns que ele administra; se, pelo contrario, pretender vir a executar os bens préprios do outro cénjuge, entdo deve demandar os dois, A necessidade de demandar 0s dois também se verifica quando a divida responsabilizar ambos, casados em separacao de bens, se 0 credor pretender, como € natural, executar 0s bens préprios de ambos, parciariamente; mas 0 credor pode nio querer, por qualquer razao, executar bens do cOnjuge que nao contraiu a divida, Se 0 credor demandar apenas um dos cOnjuges, numa aco condenatéria, quando a divida é da responsabilidade de ambos, o réu tem a possibilidade de provocar a intervengio principal do outro cOnjuge (art. 316.° CProcCiv), para que a condenacio seja extensiva aos dois, de acordo com o regime substancial da lei civil No que respeita ao titulo “diverso de sentenca” pode haver desarmonia entre 0 titulo ¢ o regime substancial de responsabilidade previsto no Cédigo Civil; designadamente, o titulo pode apresentar-se subscrito apenas por um dos cénjuges, embora a divida exequenda seja da responsabilidade a execugao tem de ser intentada contra 0 cénjuge subscritor e 86 poderd pretender-se a penhora dos seus bens préprios © da sua meagio nos bens comuns; ¢ esta regra tende a ignorar a eventual responsabilidade do patriménio comum e do patriménio proprio do outro conjuge, nos termos do art. 1695, n° 1, CCiv. art. 741", 0.9 1, de ambos. Nos termos da norma geral do art, 53.° CProcCi 493 Esta questao pode suscitar respostas diferentes. Pode haver quem pense que © subscritor do titulo tem o énus de colher a assinatura do seu cénjuge, quando entender que a divida deve responsabilizar os dois, sob pena de ficar sozinho na execucio € de poder pretender apenas uma compensacio pelo que pagar a mais do que ele proprio devia, na partilha, Esta ideia, porém, nao respeita o re- gime substantivo que expressamente admite que um sé cOnjuge assuma a divida embora esta responsabilize os dois, Assim, parece razoavel que o novo regime processual tenha previsto um meio para suscitar a discussao sobre a comunica bilidade da divida. Os art. 741° © 742.° CProcCiv, na redagio conferida pela Lei n.* 41/2013, de 26 de junho, tratam da questio da comunicabilidade, consoante seja susci- tada pelo exequente ou pelo executado, prevendo a sua apreciacao através de incidente™ Se for o exequente a alegar que a divida é comum, no requerimento execu- tivo ou até ao inicio das diligéncias para venda ou adjudicagio (art. 741°, n." 1), © cOnjuge do executado pode declarar que aceita a comunicabilidade, ¢ 0 siléncio vale aceitagao (art. 741.°, n.° 2). Quando a divida for considerada comum, os bens proprios do subscritor do titulo que tiverem sido inicialmente penhorados podem ser substituidos por bens comuns (art. 741.", n.* 5). Se 0 cOnjuge do executado impugnar a comunicabilidade, a recusa da natureza comum da divida dé origem a um incidente destinado a determinar a natureza da divida Se for o executado a alegar que a divida é comum, na oposigao a penhora (art. 742.°, n° 1), © seu cOnjuge € igualmente convidado a declarar se aceita a comunicabilidade ©, no caso afirmativo, a execucao prosseguiré sobre os bens comuns. No anterior regime, se 0 conjuge do executado jé tivesse pedido a se- paragao de bens (com o que daria um sinal de que achava a divida propria do executado) ou se 0 exequente se opusesse a essa discussao (art. 825.°, n.° 6, parte final, do CProcCiv anterior) a execugao prosseguia apenas contra 0 subscritor do titulo. A luz do novo CProcCiv, a alegacao da comunicabilidade pelo executado nao depara com estes obsticulos, Prevé-se que, se houver oposi¢ao do exequente ou impugnagao da comunicabilidade pelo cénjuge, a questao seja resolvida pelo juiz no ambito do incidente de oposig’ a penhora (art. 742.°, n.* 2). Em sintese, estas solugdes, emergentes da Reforma de 2013, possibilitam uma maior harmonizagio entre o regime substantivo da responsabilidade pelas dividas dos conjuges e regime processual das dividas, constante de titulo diverso de sentenga, subserito por um s6 conjuge™. Na apreciagio critica do anterior regime do art. 825.° CProcCiv, Mana Jost Cartio tinha proposto, de lege ferenda, solucio semelhante (eft. Pressupostos pro- cessuais ... p. 85, 87 © 88). "4 Sobre o tema, vejase também M. Terxeia o€ Sousa em http://www.cej.mj.pt/ cej/recursos/ebooks/ProcessoCivil/M_TEIXEIRA_DE_SOUSA_A_execucao_das_di vidas_dos_conjuges.pdf, p. 10-12; J. M. Lanes be Faevtas, A acdo executiva a luz do 494 167. Dividas da exclusiva responsabilidade de um dos conjuges Estao mencionadas quase todas no art. 1692.°. 4) Dividas contraidas por um dos cénjuges sem o consentimento do outro (art. 1692.°, al. a). Nao havendo circunstancias especiais como as que a lei refere na parte final desta alinea — circunstancias que se prendem com o modo de vida matrimonial — valem as regras gerais do direito das obrigagdes € cada um dos cOnjuges fica responsavel pelas dividas que contrai A lei ressalva, porém, o caso de as dividas terem sido contraidas para ocorrer aos encargos normais da vida familiar ou pelo cénjuge administrador em proveito comum do casal. Neste caso as dividas sio de responsabilidade comum. Visam-se aqui quer as dividas anteriores quer as posteriores a0 casamento. b) Dividas provenientes de crimes ou outros factos imputaveis a um dos cénjuges (art. 1692.°, al. b)). Consideram-se aqui nao sé as dividas provenientes de crimes considerados como tais (penas de multa, custas do processo crimi- nal), mas também as “indemnizagdes, restituigdes, custas judiciais ou multas” devidas por factos imputaveis a cada um dos cénjuges Nesta f6rmula quer a lei abranger, segundo parece, todos os factos constitutivos de responsabilidade civil, conexa ou nao com a res- ponsabilidade criminal, quer se trate de factos ilicitos ou de factos licitos, de factos culposos ou nao culposos Declarada a nulidade de um negécio em que o marido interveio desacompa- nhado do seu cénjuge, a restituicdo das quantias recebidas ¢ da responsabilidade exclusiva do marido, disse STJ no ac. de 01.14.2010. Codigo de Processo Civil, 6° ed., Coimbra, Coimbra Editora, 2013, p. 253-260; Rui Pinto, Manual da Execugdo e Despejo, Coimbra Editora, 2013, pigs. 559 a 561. 495 Ressalva-se, porém, 0 caso de esses factos, implicando responsabi- lidade meramente civil, estarem abrangidos pelo disposto nos n 1 ou 2 do art. 1691.° Sera sobretudo 0 caso das indemnizagées devidas por factos praticados pelo cénjuge administrador, dentro dos seus poderes de administragio e em proveito comum do casal (supra, n.° 165, al. ¢)). © STJ, no ac. de 14.4.2005, determinou que devia ser restituide 0 valor do gozo locativo, na sequéncia da nulidade do contrato de locagio celebrado entre © locador € © marido comerciante; a mulher do comerciante também responderia pela divida da restituigao, desde que nao provara qualquer das excegdes previstas no art, 1691.°, n° 1, al. d) (Gol. Jur. 2005, t. Il, p. 42-46) Se o facto de um dos cénjuges implicar responsabilidade crimi- nal ou, importando responsabilidade meramente civil, nao estiver abrangido pelo art. 1691.°, n 1 ou 2, a responsabilidade sera ex- clusiva do cénjuge autor desse facto. © ac. da Rel. do Porto, em 11.18.2013, apreciou um caso em que havia responsabilidade civil conexa com a criminal ¢ decidiu pela responsabilidade exclusiva do devedor, ainda que 0 cénjuge infrator tivesse agido em proveito comum do casal Gurisprudencia.no.sapo.pt) Havera casos em que a responsabilidade pelo pagamento de custas judiciais criminais devia caber aos dois cénjuges — custas devidas pelo cénjuge assistente em proceso de crime de abuso de confianga ou de furto de bens do casal, ou em processo de difamagio ou injiria contra o casal". Pode discutir-se se 0 “proveito comum” que justifica a aplicagio da ressalva prevista na parte final da al. b) tem de ser um proveito direto ou se basta um proveito indireto. © proveito sera direto quando, p. ex., um cOnjuge conduz um veiculo, pertenca de um dos cénjuges, ao servico do estabelecimento comercial deste, ou circula por ordem de ambos os cénjuges, ou se desloca para a realizacio de uma tarefa A. Lorus Caxooso, Alguns aspectos das dividas dos cénjuges ao novo Cédigo Civil, cit., p. 108. 496 de interesse comum, decidida pelo cénjuge administrador, no Ambito dos seus poderes de administracao; a responsabilidade também se alarga ao outro quando um dos cénjuges se torna responsavel por um acidente de trabalho sofrido por um empregado da casa, ao servico do cOnjuge administrador ou em servigo doméstico. O proveito sera indireto quando os resultados da atividade se imputam, em primeiro lugar, a outra entidade, ¢ os cénjuges apenas beneficiam de uma forma reflexa No acérdio de 6.7.1993, 0 8.TJ. discutiu este tema Um homem casado, conduzindo um veiculo de carga ao servico da empresa para que trabalhava, provocou um acidente e foi considerado culpado. A firma quis obter a condenacao do empregado — e da sua mulher — no pagamento do sulo © dos lucros cessantes. valor dos danos sofridos pelo v As instancias entenderam que a mulher do motorista também seria respon- sivel porque o facto de que resultou a responsabilidade fora meramente culposo € ocorrera no exercicio da profissio de motorista, de que 0 réu retirava os pro- ventos para o sustento do casal — isto €, ocorrera no ambito de uma atividade de interesse comum para a familia © S.TJ. julgou diversamente: entendeu que o motorista praticou um facto ilicito culposo no ambito da sua atividade exercida no interesse da firma para que trabalhava — € nao no interesse do casal. A diver incia entre o $.T'J. € as instancias esteve, pois, na aplicago daquela res- salva — “salvo se esses factos, implicando responsabilidade meramente civil, estiverem abrangidos pelo disposto nos n.o 1 ou 2 do artigo anterior.” Para as instincias, 0 in teresse do casal, o proveito comum que justificaria 0 alargamento da responsabilidade a0 cénjuge do autor do facto poderia ser o mero proveito indirelo que cle tirava da atividade de motorista — o salario que auferia ¢ que entrava para o patriménio comum. Ao contritio, para o S.TJ., 0 interesse comum capaz de alargar a0 cOnjuge a responsa- bilidade pelo facto ilicito culposo teria de ser um proveito comum direto — prosseguido pelo autor do facto no quadro de uma atividade exercida no interesse direto do casal. Em qualquer caso de responsabilidade exclusiva de um dos cOnjuges, pela pritica de qualquer facto, ficara em aberto, porém, a possibilidade de uma agao de enriquecimento sem causa no caso de a comunhio ter beneficiado da respetiva atividade™* “ Neste sentido parece terem-se orientado os acs. do $.TJ. de 45.1962 e de 6.11.1964 (BM n.° 117, p. $32, € n° 141, p. 344, respetivamente), podendo ainda 497 ©) Dividas que oneram bens préprios de qualquer dos cénjuges (arts. 1692.°, al. ¢ bens do casamento, os rendimentos forem comuns, as dividas que |, © 1694.°, n.® 2). Mas se, por forea do regime de tiverem como causa a percecao dos rendimentos sao de responsa- bilidade comum (supra, n.° 165, al. b)). 4) Dividas que onerem doagdes, herangas ou legados, quando os respetivi s bens sejam préprios (art. 1693.°, n.° 1). A incomunicabilidade da divida subsiste ainda que a aceitacao da doacao, heranga ou legado tenha sido efetuada com o consen- timento do outro cOnjuge — consentimento, alias, desnecessario (art. 1683.°, n.° 1) ‘Assim como a autoriza¢io ou 0 consentimento dados nao the permitem participar no ativo da doagao, da heranga ou do legado, também nenhuma res- ponsabilidade Ihe devem acarretar quanto ao respectivo passive" 168. Bens que respondem pelas dividas de exclusiva responsabilidade de um dos cénjuges A regra geral € a do art. 1696.°, n.° 1: respondem por estas di- vidas os bens préprios do cénjuge devedor e, subsidiariamente, a sua meacao nos bens comuns. Responderio, porém, pelas dividas de exclusiva responsabilidade de um dos conjuges os bens do cénjuge devedor cuja administragéo pertenga ao outro? Os anteprojetos de Pires de Lima ¢ de Braga da Cruz continham disposigdes no sentido de impedir que “por exemplo (...) sendo 0 marido administrador de certos bens da mulher, esta pudesse, sem outorga dele, onerd-los livremente, contraindo dividas""”. A solugio encontrada por aqueles autores foi a de sujeitar ver-se sobre a questio em sentidos diferentes, 0 ac. do S.J. de 8.10.1957 (BMY n.° 70, p. 327) € os dois acs. do S.TJ. de 11.4.1962 publicados no BMY n.° 116, p. 308 e 316. Braca oa Cave, Capacidade patrimontal dos cénjuges, cit., p. 409. 498 a execugao desses bens préprios a uma moratéria semelhante a que valia para a meagio dos bens comuns, salvo se 0 cnjuge dono dos bens recuperasse antes a administracio destes. Mas, como notam Pires de Lima ¢ Antunes Varela, esta solugdo nao ficou no Cédigo e, portanto, se “os credores exigirem o cumprimento da divida, parece nao restarem diividas, em face dos trabalhos preparatérios da disposicao legal, de que por cla responderio todos os bens préprios do cénjuge devedor, incluindo os subtraidos A sua administragao..."". A solucao negativa, no entanto, parece ser a mais razoavel, pelo menos onde se trate de bens cuja administracio a fei tenha confiado ao outro conjuge (p. ex., bens que ele utilize como exclusive instrumento de trabalho): a ser deste modo, o art. 1696.*, 2." 1, devera ser objeto da correspondente interpretacao restritiva Na falta ou insuficiéncia de bens proprios do cénjuge devedor, podem ser imediatamente penhorados bens comuns do casal, con- tanto que o exequente, ao nomed-los 4 penhora, peca a citacio do cénjuge do executado para requerer, querendo, a separacio de bens; nos vinte dias posteriores 4 citagao, deve o cénjuge requerer a separacao ou juntar certidao comprovativa de outro processo em que aquela ja tenha sido requerida. Se o cénjuge do executado nao requerer a separacdo nem juntar a mencionada certidao, a execucao prossegue nos bens penhorados; apensado o requerimento ou junta a certidao, a execucio fica suspensa até 4 partilha e tudo depende de saber a qual dos cénjuges venham a ser adjudicados os bens penhorados. Se os bens forem adjudicados na partilha ao proprio cénjuge devedor, a execugio prosseguira, naturalmente, sobre esses bens; se os bens penhorados vierem a caber ao outro cénjuge, pode © exequente nomear 4 penhora outros bens que tenham cabido ao proprio cOnjuge devedor, contando-se 0 prazo para a nova nomea- sao a partir do transito da sentenca homologat6ria da partilha. S40 as solugdes do art. 740.° CProcCiv. Antes do regime imposto pelo Decreto-lei n.* 329-4/95, de 12 de dezembro, © cumprimento pelas forgas da meag3o s6 era exigivel depois de dissolvido, * Cédigo Civil anotado, vol. IV, p. 351-2. 499 declarado nulo ou anulado o casamento ou depois de decretada a separagio ju- dicial de pessoas ¢ bens ou s6 de bens (n." 1). Continuava a admitir-se a doutrina Gintoduzida no § 1.° do art. 114° do Cédigo de 1867 pela Reforma de 1930) de que “na execugio movida contra um s6 dos cénjuges a execugao dos bens comuns fica suspensa, depois de penhorado 0 direito a meagio do devedor" (CProcCiv, art, 825.°, n.* 1, anterior 2 1995). A regra de que a meacao do cénjuge devedor nos bens comuns sé respondia com a moratoria do art. 1696.*, n.° 1, comportava todavia varias excedes: as dos n.o 2 € 3 do mesmo artigo, a do art. 10.° do Cédigo Comercial (se estivesse provada a comercialidade substancial da divida exequenda)"” ¢ ainda a do art 56.*, n° 11, do Cédigo da Estrada (Decreto-lei n.* 39 672, de 20 de maio de 1954), segundo o qual “se o responsavel pela indemnizacao for casado, poderé executar-se a sua meaglo nos bens comuns do casal, mesmo antes de dissolvido matriménio ou de decretada a separagao judicial de bens, embora o outro cénjuge ndo esteja conjuntamente obrigado”. Podia ler-se também 0 art. 95.° do Cédigo de Processo do Trabalho, para a execucio por dividas provenientes de acidentes de trabatho ou doengas profissionais, € o art. 195.° do Cédigo de Processo das Contribuigdes e Impostos, para as multas fiseais. Por outro lado, 0 art. 1696, n.° 3, admitia que a meagio do cdnjuge devedor fosse executada sem moratoria se a divida proviesse de crime ou outro facto imputavel 20 mesmo cénjuge. Era a solugdo que melhor protegia os interesses das conforme a hipétese de que se tratasse. itimas desses factos, ou o Estado, De harmonia com o art. 1696.°, n.° 2, respondem ao mesmo tempo que os bens préprios do cénjuge devedor “os bens por ele levados para o casal ou posteriormente adquiridos a titulo gra- tuito, bem como os respectivos rendimentos” (al. a)), “o produto do trabalho e os direitos de autor do cénjuge devedor” (al. b)), € “os bens sub-rogados no lugar dos referidos na alinea a)” (al. ¢)). Se se tratar de sub-rogacio de bens que se tornaram comuns, por forca do regime matrimonial, a prova da sub-rogagio faz-se por qualquer meio; nao ha qualquer razio para aplicar aqui o regime especial do art. 1723.*, al. ¢). Embora os bens referidos possam ser comuns por forca do regime matrimonial em vigor, e os bens comuns nao respondam ‘WAssento do S.TJ. de 13 de Abril de 1978, publicado no BMJ n.* 276, p. 99. 500 senao subsidiariamente por dividas préprias, a lei sacrificou neste caso o patriménio comum do casal em favor das expecta- tivas do credor que confiara na solvabilidade do devedor tendo em conta os bens que ele levara para o casamento™, os que adquirira mais tarde por heranga ou doa¢io ou os proventos, porventura muito elevados, que auferia do seu trabalho ou de direitos de autor™ A expresso usada pela lei e as razdes do preceito levam a concluir que o credor pode penhorar, indistintamente, bens préprios do devedor e estes bens mencionados no n.° 2 do art. 1696.° Nao parece haver motivo para respeitar, neste ambito, a subsidiariedade que a lei prevé no n.° 1”, Por outro lado, 0 texto nao parece limitar a responsabilidade ao valor de metade dos bens comuns penhorados; 6 que pode dar lugar a compensagao, no momento da partilha Deverd 0 exequente que nomeie a penhora bens referidos no art. 1696.°, n° 2, pedir a citagio do cénjuge do executado para requerer, querendo, a separacao de bens? Embora o ponto ofereca diividas em face do art. 740.*, n.° 1, CProcCiv, propendemos para a solugao negativa. A partilha sé tem sentido quando se torna necessirio determinar os bens que vio compor a meacao do devedor, para que a execusio prossiga sobre eles; 0 canjuge do devedor, por seu turno, pode ter interesse em fazer incluir certos bens comuns na sua propria meacio. No caso presente, a0 contrario, os bens mencionados pelo art. 1696.*, n.° 2, estdo identificados ¢ a lei permite a sua penhora sem reco- nhecer o eventual interesse do cénjuge do executado em fazer incluir esses bens na sua propria meacio. A citagio para requerer a partilha nio parece, assim, justificar-se. W*._. pois € perfeitamente justo que os credores nao fiquem prejudicados com © facto de, pelo casamento, se comunicarem os bens levados pelos cénjuges para © casal, mantendo-se incomunicaveis as dividas.” (Braca pa Cxvz, Capacidade patri- ‘monial dos conjuges, cit., p. 408) “Contra a justificacao deste alargamento para além do caso da al. a) vejam-se Pinks DE Lia e Awrunss Vania, Cédigo Civil anotado, vol. IV, p. 352. ! Contra, Caisrina Dias, Compensacdes devidas pelo pagamento de dividas do casal, cit., p. 99, € Do Regime da responsabilidade por dividas..., cit., p. 353-355. 501 169. Compensagées devidas pelo pagamento de dividas do casal © art. 1697.°, n° 1, prevé o caso de os bens de um dos cénjuges terem respondido por dividas de responsabilidade comum para além do que Ihe competia. £ indiferente que tenham respondido porque, sendo © regime de comunhao, a responsabilidade dos cénjuges era solidaria, ou porque, no regime da separagdo, um dos cOnjuges tenha pago v luntariamente uma divida comum para além da parte que lhe tocava, Em qualquer caso, surge um crédito de compensagao a favor do cOnjuge que pagou mais que a sua parte, sobre 0 outro conjuge, crédito que sé é exigivel, porém, no momento da partilha dos bens do casal Podia esperar-se, neste caso, que a lei fizesse nascer, a favor do cénjuge que pagou, um crédito sobre o patriménio comum. Mas, se © legislador tivesse consagrado apenas um crédito sobre © patriménio comum, havia 0 risco de o credor nao obter © pagamento, se nao houvesse, pura ¢ simplesmente, patriménio comum (caso de separa de bens) ou se © patriménio comum fosse insuficiente. Estabelecendo, pelo contrario, um crédito do cénjuge que pagou sobre 0 outro, nao 86 viré a responder a meacao do devedor no patriménio comum, quando a houver, nos termos do art. 1689.°, n.° 3, mas também os seus bens préprios, Tudo se passar4 como se 0 credor fosse “credor do patriménio comum e, a titulo subsididrio, credor do outro cénjuge”™ Sobre 0 momento da exigibilidade dos créditos de compensagao veja-se infra, n.° 173, © n° 2 do preceito regula a hipétese inversa: a de terem respon- dido bens comuns por dividas da exclusiva responsabilidade de um dos cénjuges; € 0 que se passa, p. ex., nos casos do n.° 2 do art. 1696.° A lei determina que os bens mencionados respondam por dividas proprias do cénjuge devedor, em atengao as expectativas do credor; mas nao se pode esquecer que os bens sao comuns, “sBaaca pa Cavz, Capacidade patrimonial dos cOnjuges, cit., p. 419. 502 que 0 outro cénjuge tem meacao neles, em correspondéncia com a meacdo que dé nos bens que levou ou faz entrar para o patriménio comum. Nao se pode, pura ¢ simplesmente, *... deixar que estes sejam retirados da comunhio — como que voltando a ser bens pré- prios do seu anterior titular ...”, sob pena de frustrar as expectativas © “prejudicar seriamente 0 outro cénjuge”™. » ste caso surge um crédito de compensagao do patriménio comum sobre 0 patriménio do cénjuge devedor, a tomar em conta no momento da partilha Poderia esperar-se, neste caso, que a compensacao se operasse através de um crédito do cénjuge nao devedor pelo montante de metade dos bens comuns usados para o pagamento da divida. Se o legislador tivesse seguido este caminho, teria satisfeito o interesse do cénjuge credor em receber integralmente 0 valor da meagao no patriménio comum. Mas a lei estabeleceu um crédito do patrimé- nio comum pelo total pago porque, antes de pretender garantir o interesse daquele cOnjuge, pretendeu restaurar o valor integral do patriménio comum que, antes de se destinar a dividir-se entre os cOnjuges, serve de garantia das dividas comuns, em face dos credores de ambos, com prioridade sobre outras dividas (art. 1689.°, n.° 2)" Para mais desenvolvimentos leia. e, infra, n.° 173. Subseccao V. Termo das relagdes patrimoniais. Partilha 170. Generalidades. Operagoes da partilha: enunciado geral As relacées patrimoniais entre os cénjuges cessam com a dis- solugao, a declaragao de nulidade ou a anulacao do casamento PeBRaGA Da Cae e5dem, p. 419. , 0b. cit, p. 416, 503

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