DOUTRINA
DIRELTO CRIMINAL
CRIME DE DAMND
aZ,damamierel, 0 crite, de
lamno provisto no art. $20 § 3°
{40 Codigo Penal?
Eze-vi da contextura do art. 407, n. 4 da excepgio abi
estabelecida, o crime de damno sémente 6 denunciavel na hypo~
these de pristo em flagrante delicto. A disposigao grammatical
@este artigo no eomprchende na letra o caso de tornar-se 0
crime de domno inafiangavel pela elevagio. do gréo. da pena
Aeterminada no art. 356, conforme a doutrina do art, 406.
Este crime, que ¢, ‘por natureza, afiangavel, converte-se
em inafiangavol pela circumstancia tlementar da gravidade da
pena. Mas, por este motivo, seri denuneiavel, como acontecia
com os crimes inafiancaveis’ no regimen antiga?
No tempo em que vigorava’o Codigo Criminal, 0 crime
finafiancavel era denunciavel, proviesse a inafiancabilidade da
ssua especie ou do maximo da pena. Era esta a regra. A lei nova
& omissa. Bo caso de lei duvidosa em relagdo a factos ocvor=
rentes, quaes os que se acham diseriminados no art. 329 § 3°
do Codigo Penal, qualquer dos quaes basta para transformar
a natureza do erime,
No tom aqui applicugto joridia o principio de dri, ou
melhor, a regra de hermencittica— interpretatio cessat in
claris. Nem sempre, a lei € 0 que esta eseripto ~~ Lew est
quod lex voluit: non enim len est quod escriptum est, sed
od legislator voluit, quad juditio swo probabil et recepil.
principio admittido na alta escola do direito.
Neste presupposto, tentemos perserutar 0 sentido da lei
(mens legis).
Entre a lei de 46 de Dezembro de 4830 (Codigo Criminal)
ea lei recente de 44 de Outubro de 1890 (Codigo Penal) decor-
reu o longo periodo de mais de meio seculo.
Durante este significante intervallo, a sciencia do direito
caminhou, reconstruindo sempre na inlerminavel provincia
das letras juridieas. Fez conquistas, que, em summa, honram a
sociedade moderna.
Dm. Vou. 6 2— 338 =
‘Na lucta ediffcante da aristocracia com a democracia vingott
a soberania da razo, harmonisando, quanto possivel, direitos e
interesses da communh&o com direitos 6 interesses da liberdade do
cidadao, criteriosamente, alada a reciprocas conveniencias d’estas.
supremas forgas sociaes. A corrupgao dos principios eeden o passo
& religido do dever, em homenagem a imperiosas reclamagies da
Juss que, sponlando para o passado das tras; em que 0
frente do accusador podia ser boa testemunha para a puniedo,
radava pela extinegao da pena de morte, como um triumpho
da civilisagéo actual, E a pena de morte foi riseada de nossa
legislagio criminal. Ainda bem 1...
‘A-expericncia juridica indicava com flemeza a conveniencia
de uma transformagio na legislacdo do Paiz.
‘Compulsemos 0 Codigo do Processy Criminal (lei de 29 de
Novembro de 1832), e veremos nos arts. 37 e 74a competencia
dos promotores publicos limitada a denuneia dos crimes publi-
cos, em euja nomenclatura estavam incluidos os particulares,
que se tornavain taes pela flagrancia da prisdo ou pelo gréo da
respectiva penalidade.
‘A reforma judiviaria (lei de 20 de Setembro de 1874) man-
teve o plano da legislagao ariterior.
Eniretanto, 0 legislador desenvolveu_ a compelencia do
orgao da justiza publica, obrigando-o a intervir nos julga-
menlog, dot crimes em gera, peranie 0 tribunal 20 jry
art. 16).
Bra um ensaio de reforma no systema da legislagao; era
‘uma providencia de boa justiga, equivalente 4 uma garantia
official introduzida em bem de interesses sacrificados pelo crime,
gue exige reparacio prompia e ellicaz,
legislador de 1890 adoptou systema essencialmente di
ferente do systema admittido no corpo da antiga legislagio, tra—
¢ando uma disposigdo nova, generalisada a todos us crimes,
salvas as exeepedes, que as circumstancias aconselharam., Tornou
denunciaveis todos 0 crimes, publicos e particulares, ampliando
eonsideravelmente a competencia do ministerio publico (que
rocurou ccnvenienteente organisa na Jorma do art. 407 § 2
Codigo Penal), @ consagrou as excepgies dos numeros 1 e 2
do § 2 deste mesmo artigo em homenagem a, preceitos mui
sagrados do lar domestico, dos brios do eidaday e conveniencias
poe, admittindy 0 procedimento official nos casos singulares:
io art. 274, easos dignos da prutecedo da sociedade.
No art, 407, §3+, o legislador consagron 0 procedimento
official da justiga’ nos crimes inafiangaveis. Mas, esta dispos
gio deve ser entendida em termos habeis, de direito. O proce-
dimento official sé pode ter logar nos crimes denunciaveis.— 339 —
Invocados os elementos da hermeneutica juridica, maxime 0
scientifico, examinadas as disposigGes_ das leis antigas e moder
nas, por uma bew dirigida confrontacéo, combinadas as disposi~
es do Codigo Penal entre si, bew eomprehendida a ligagao
existente entre estas disposigdes, e attengao feita 4 doutrna do
art. 1°, parte 2, deste mesmo Codigo, 6 logieo eoncluir-se quo 0
crime de damno revestido de qualquer das circumstancias men-
cionadas no art. 329, § 3¢, do Codigo Penal bratileiro nao 6 de-
nunciavel, féra do caso de prisdo em flagrante, sem embargo de
tornar-se crime de natureza inafiancavel, salvo melhor juizo.
Finalmente, cumpro um dover deelarando, que o movel
unico da publicacau do presente artign é o desejo de acertar,
provoeando a opinigo dos mals competentes, Nao me perturba 0
espirito a vaidade de celebridade juridica,
Escrevo para of bem intencionados.
Victoria, 45 de Janeiro de 1893.
“ José Cardoso da Cunha,