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Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios

PJe - Processo Judicial Eletrônico

13/07/2020

Número: 0704569-79.2020.8.07.0018
Classe: AÇÃO POPULAR
Órgão julgador: 4ª Vara da Fazenda Pública do DF
Última distribuição : 10/07/2020
Valor da causa: R$ 900.000,00
Assuntos: Edital
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? SIM
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM
Partes Advogados
ALEXANDRE AUGUSTO BITENCOURT (AUTOR)
MATHEUS SEGMILLER CRESTANI PEREZ (ADVOGADO)
ANDRE CORREA TELES (ADVOGADO)
SESC-SERVICO SOCIAL DO COMERCIO-ADMINISTRACAO
REGIONAL DO DF (RÉU)

Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
67577174 13/07/2020 Decisão Decisão
18:15
Poder Judiciário da União
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS

4ª Vara da Fazenda Pública do DF

Número do processo: 0704569-79.2020.8.07.0018

Classe judicial: AÇÃO POPULAR (66)

AUTOR: ALEXANDRE AUGUSTO BITENCOURT

RÉU: SESC-SERVICO SOCIAL DO COMERCIO-ADMINISTRACAO REGIONAL DO DF

DECISÃO INTERLOCUTÓRIA

I – Recebo a emenda ID 67478048.

Retifique-se o cadastro processual para incluir no pólo passivo o PREGOEIRO DO SESC/DF e a empresa
BIO ADVANCE DIAGNÓSTICOS LTDA. EPP.

II – ALEXANDRE AUGUSTO BITENCOURT pede liminar em ação popular para que seja determinada:
(i) suspensão imediata do Pregão Eletrônico SRP n. 38/2020; e (ii) determinação de obrigação de
não-fazer ao SESC/DF para que deixe de realizar, irregularmente, teste de COVID-19.

Segundo o exposto na inicial, o SESC/DF abriu procedimento licitatório por meio do Pregão Eletrônico
38/2020 para aquisição de testes para COVID-2019, ao preço unitário de R$ 18,00, para realização de
diagnóstico da doença entre os comerciários. O custo da contratação alcança a quantia de R$ 900 mil. O
modelo adquirido é o de detecção de anticorpos IgM/IgG contra o Sars-Cov-2. Alega que o SESC/DF já
vem realizando testes nos comerciários, os quais não são assinados por responsável técnico. Aduz que a
qualidade dos testes é duvidosa, exemplificando com o caso de uma comerciária que testou positivo e em
seguida submeteu-se a outro teste em laboratório e obteve resultado negativo. Observa que os testes
somente podem ser comercializados por distribuidoras de produtos para saúde. Aponta ser vedada a
comercialização dos testes para o SESC/DF. Aduz haver indícios de irregularidades em razão da ausência
de autorização para funcionamento da empresa, falta de licença sanitária e exercício ilegal de profissão.
Assevera que os testes devem ser subscritos por profissional habilitado. Destaca que a atividade do
SESC/DF é classificada como serviço de assistência social sem alojamento, não desenvolvendo atividade
ligada à saúde. Afirma que a prestação de serviços que envolvam exames médicos laboratoriais pressupõe
licença sanitária. Aponta violação à RDC 302/2005 da ANVISA, que trata do funcionamento de
laboratórios clínicos. Outra irregularidade envolve a RDC 50/2002, que trata de estabelecimentos
assistenciais de saúde, pois o SESC/DF mantém posto de coleta de sangue de laboratório sem anotação de

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responsabilidade técnica. Acrescenta também ofensa à Nota Técnica 20/2020 da SES, sobre a utilização
de testes rápidos para coronavírus. Ainda, afirma que os laudos não são subscritos por profissionais
habilitados.

III – A CF, no art. 5º, LXXIII, garante a qualquer cidadão a legitimidade “para propor ação popular que
vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade
administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada
má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência”.

De acordo com o art. 1º da Lei 4717/1965, a ação popular é destinada à anulação ou a declaração de
nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de
entidades autárquicas, de sociedades de economia mista, de sociedades mútuas de seguro nas quais a
União represente os segurados ausentes, de empresas públicas, de serviços sociais autônomos, de
instituições ou fundações para cuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou concorra com
mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita ânua, de empresas incorporadas ao patrimônio da
União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades
subvencionadas pelos cofres públicos.

O art. 2º, por sua vez, estabelece que são nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas
no art. 1º, nos casos em que praticados por autoridade incompetente, com vício de forma, com objeto
ilícito, sem motivação ou com desvio de finalidade.

Para além da lesividade ao patrimônio dos entes públicos, a CF também admite, como se vê no
dispositivo da CF transcrito acima, o emprego da ação popular para controle dos atos no que diz respeito
à preservação da moralidade administrativa.

No caso em tela, o autor pretende obstar a compra, pelo SESC/DF, de um lote de testes rápidos para
detecção do COVID-2019.

A contratação é prevista no edital de Pregão Eletrônico n. 38/2020. O item 3.1 define como objeto do
certame “a aquisição de teste rápido de diagnóstico da Covid-19, lancetas e máscaras de tecido,
conforme Caderno de Especificações Técnicas (Anexo I) e Modelo de Proposta Financeira (Anexo II)”.

No anexo I, são indicados os seguintes quantitativos dos produtos:

“1) Teste rápido SARSCoV-2 Anbody test®, LTD para detecção de anticorpos IgM/IgG contra
SARS-CoV-2.

50.000 Unidades

2) Máscara de proteção respiratória para uso não profissional de tecido personalizada

250.000 Unidades

3) Lanceta pulsão digital p/ exame glicêmico

Equipamento automático, sistema preciso, dotado de dispositivo de segurança que impede a reutilização
da lanceta, evitando risco de contaminação.

Observações:

- Apresentação: caixa c/ 200 unidades;

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- Diâmetro da agulha: 21 g / 0,8 mm;

- Profundidade de penetração: 1,8 mm.

50.000 Unidades”

O autor questiona a legalidade da contratação com base nos seguinte fundamentos: qualidade duvidosa
dos testes; impossibilidade de o SESC/DF adquirir os testes; ausência de Autorização de Funcionamento
de Empresa - AFE; falta de licença sanitária para a realização de atividade laboratorial e
operacionalização de posto de coleta para o manuseio do produto; e exercício ilegal da profissão.

Em relação à alegada baixa qualidade do produto, não há informações seguras a esse respeito, por ora. O
autor traz como evidência desse fato o exame de uma paciente que teria acusado falso positivo. Todavia,
um caso isolado de erro de diagnóstico, apenas, não é suficiente para por em dúvida a qualidade técnica
dos testes. Não há informações suficientes, por ora, sobre a acurácia do teste a ser adquirido, pelo que
esse fundamento se mostra insatisfatório para se decretar a suspensão do procedimento licitatório, até
porque não consta que os testes em questão sejam proibidos pela ANVISA.

No tocante ao segundo fundamento, relacionado à proibição de venda dos testes a empresas que não
atuem no ramo de saúde, apresenta-se como relevante.

De fato, nota-se que dentre a regulamentação da ANVISA sobre a comercialização de testes rápidos para
COVID-2019, não há permissão para que esses produtos sejam adquiridos por particulares ou empresas
que não tenham sua atuação voltada à área da saúde.

É o que consta no informativo divulgado pela ANVISA em 14/5/2020, em formato de perguntas e


respostas, que consta em ID 67453023, página 14:

“As distribuidoras de produtos para saúde podem comercializar testes para Covid-19 para qualquer
estabelecimento? Podem ser comercializados testes para pessoas físicas?

As distribuidoras de produtos para saúde podem comercializar os testes para Covid-19 a pessoas
jurídicas ou profissionais, para o exercício de suas atividades em serviços de saúde destinados à
execução dessa atividade. Assim, por se tratar de produtos para uso profissional, não é permitido o seu
comércio à população em geral.

Os testes podem ser comercializados para pessoas jurídicas cujas atividades são destinadas à prestação
de serviços de saúde à população, como laboratórios, hospitais e outros estabelecimentos de saúde,
públicos ou privados.

(...)

As distribuidoras de produtos para saúde podem comercializar testes para Covid-19 para empresas que
não sejam da área da saúde e desejem fazer testes em seus funcionários (como do ramo da construção
civil, automobilísticas etc.)?

As distribuidoras de produtos para saúde apenas podem comercializar os testes para Covid-19 a pessoas
jurídicas ou profissionais para o exercício de suas atividades. Assim, por se tratar de produtos para uso
profissional, o seu comércio apenas é permitido a pessoas jurídicas cujas atividades são destinadas à
prestação de serviços de saúde à população, como laboratórios, hospitais e outros estabelecimentos de
saúde, públicos ou privados.

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Dessa forma, às distribuidoras de produtos para saúde não é permitido comercializar testes para
Covid-19 a empresas que não se enquadrem nesta hipótese.”

Como se vê, a compra desse tipo de produto é restrita a empresas que atuam no ramo de saúde, não sendo
permitido que entidades particulares, tal como o SESC/DF, integrante do denominado Sistema “S” e que
tem sua atuação voltada ao atendimento dos profissionais do comércio, que pretende disponibilizar os kits
de testes para melhoria das condições de trabalho dos comerciários.

Tem-se, então, ao menos em caráter preliminar, a existência de restrição técnica e objetiva a que o
SESC/DF adquira diretamente os testes. Tal fundamento se apresenta como suficiente para evidenciar a
probabilidade do direito alegado pelo autor, na medida em que há indicação de irregularidade no contrato
em questão, pois o SESC/DF não tem a devida habilitação para tanto, o que pode ocasionar lesão ao
patrimônio da entidade.

Quanto à urgência da medida, tem-se a informação de que já houve a abertura do pregão eletrônico, com a
vitória da empresa BIO ADVANCE, sendo imprescindível intervenção imediata para suspender
provisoriamente o certame, como forma de garantia da eficácia da tutela final.

A respeito dos demais fundamentos trazidos pelo autor, esteiam-se na vedação do SESC/DF à realização
dos testes. É certo que a aplicação dos testes não é permitida a leigos, sendo atividade restrita a
profissionais de saúde devidamente habilitados.

Contudo, é bem de ver que essa atividade não é objeto do procedimento licitatório em questão, o qual
trata apenas da compra dos testes. Por outro lado, não há qualquer informação mínima, por enquanto,
sobre o modo como os testes serão realizados, o que impede, por ora, qualquer medida judicial
interventiva.

É possível presumir que o SESC/DF promoverá a contratação de profissionais especializados para


realização da testagem e avaliação dos resultados, mas esse ato, se for o caso, desafiará ação própria.

Por isso, o pedido liminar para que seja imposta ao SESC/DF proibição de realização dos testes rápidos
para COVID-2019 deve ser negada, visto que o Pregão Eletrônico 38/2020 abrange apenas a compra dos
kits de testes, mas não trata de sua aplicação.

III – Pelo exposto, DEFERE-SE EM PARTE a liminar apenas para determinar a suspensão imediata do
Pregão Eletrônico n. 38/2020 do SESC/DF, vedada a celebração do contrato objeto do certame.

IV – Cite-se a parte ré para apresentar a contestação no prazo legal, observado o art. 7º, IV, da Lei
4717/1965.

Em relação ao SESC/DF, observe-se o art. 6º, § 3º, da Lei 4717/1965.

Dê-se ciência do Ministério Público.

BRASÍLIA, DF, 13 de julho de 2020 18:15:06.

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Juiz de Direito

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