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DISTURBIOS DE OLHOS, ORELHAS, NARIZ E GARGANTA 39 Doengas oculares Jonathan C. Horton O SISTEMA VISUAL HUMANO © sistema visual € um meio extremamente eficiente de assimilagao de informagdes ambientais para auxiliar na orientagdo do comportamento. A visio comega com a captura de imagens focalizadas pela cérnea e pelo cristalino sobre uma membrana fotossensivel na parte posterior do olho denominada retina. A retina, na verdade, é uma parte do cérebro banida a periferia para servir de transdutor para a conversao dos padrées de energia luminosa em sinais neuronais. A luz é absorvida por pigmentos contidos em dois tipos de fotorreceptores: os cones ¢ os bastonetes. A retina humana contém 100 milhes de bastonetes e 5 milhdes de cones. Os bastonetes operam com baixa iluminagdo (visio escotépica). Os cones funcionam com a luz do dia (visio fotépica). O sistema de cones € especializado na percepgao das cores ¢ na alta resolugiio espacial. A maioria dos cones fica dentro da macula, a parte da retina responsavel pelos 10° centrais do campo visual. No centro da macula, ha uma pequena fosseta denominada fovea, preenchida exclusivamente por cones, em que a acuidade visual é maxima. Os fotorreceptores se hiperpolarizam quando expostos a luz, ativando as células bipolares, amdcrinas ¢ horizontais na camada nuclear interna. Esse complexo circuito processa os sinais dos fotorreceptores, e os sinais assim produzidos convergem para uma via final comum: as células ganglionares, que traduzem a imagem final incidente sobre a retina em uma sequéncia de potenciais de agao cuja intensidade varia continuamente. Esses sinais se propagam pela via ptica priméria até os centros visuais do cérebro. Cada retina tem 1 milhao de células ganglionares. Por isso, cada nervo Optico tem 1 milhao de fibras. Os ax6nios das células ganglionares seguem ao longo da superficie interna da retina na camada de fibras nervosas, deixam o olho no disco dptico e seguem através do nervo Optico, quiasma 6ptico e tratos épticos até chegarem a seus destinos dentro do cérebro. Amaioria das fibras faz sinapse com células do corpo geniculado lateral, um ponto de retransmissao localizado no télamo. As células do corpo geniculado lateral projetam-se até 0 cértex visual primdrio. Essa via aferente retinogeniculocortical fornece 0 substrato neural da percepgiio visual. Embora 0 corpo geniculado lateral seja o principal alvo da retina, diferentes tipos de células ganglionares se dirigem para outros nacleos subcorticais, responsaveis por diversas fungdes. As células ganglionares que medeiam a constrigdo pupilar e os ritmos circadianos sao fotossensiveis em virtude de um pigmento visual original, a melanopsina. As respostas pupilares so mediadas pelos estimulos aferentes ao nucleo olivar pré-tectal no mesencéfalo. Os nicleos pré-tectais enviam impulsos aos niicleos de Edinger-Westphal, que fornecem inervagdo parassimpatica ao esfincter da iris por meio de um interneurénio no ganglio ciliar. Os ritmos circadianos so coordenados por uma projegdo retiniana ao nucleo supraquiasmatico. Os mecanismos de orientagdo visual e os movimentos oculares recebem sinais de uma proje¢ao da retina ao coliculo superior. A estabilidade do olhar € os reflexos optocinéticos sio comandados por um conjunto de pequenas regides da retina denominado sistema éptico acessério do tronco encefalico. Os olhos precisam estar constantemente se movimentando dentro da cavidade orbitéria para posicionar e manter alvos de interesse visual sobre a fovea. Tal atividade, denominada foveacdo ou direcionamento do olhar, é orientada por um elaborado sistema motor eferente. Cada olho ¢ movimentado por seis musculos extraoculares, inervados por nervos cranianos vindos dos niicleos oculomotor (III), troclear (IV) ¢ abducente (VI). A atividade desses nticleos motores oculares é coordenada por mecanismos pontinos e mesencefalicos, _ possibilitando acompanhamento suave dos objetos, movimentos sacddicos, bem como estabilizagéo do olhar durante a movimentagao da cabega e do corpo. Grandes areas dos cértex frontal e parieto-occipital controlam esses centros de movimentos oculares do tronco encefalico por meio do fornecimento de impulsos supranucleares descendentes. AVALIACAO CLINICA DA FUNCAO VISUAL ESTADO DE REFRACAO Na abordagem ao paciente com redugdo da acuidade visual, o primeiro passo ¢ avaliar se a causa consiste em um erro de reftagao. Na emetropia, os raios paralelos com origem no infinito sao focalizados exatamente sobre a retina. Infelizmente, apenas uma minoria da populagdo é emétrope. Na miopia, 0 globo ocular é longo demais, ¢ os raios luminosos sao focalizados a frente da retina. Os objetos préximos sao vistos com clareza, mas para os objetos distantes é preciso usar uma lente divergente diante do olho. Na hipermetropia, 0 globo € curto demais. Por isso, usa-se uma lente convergente para complementar a capacidade refrativa do olho. No astigmatismo, a superficie da cérnea nao é perfeitamente esférica, 0 que exige uma lente corretiva cilindrica. Como alternativa as lentes de éculos ou as lentes de contato, os erros de reftagdo podem ser corrigidos pela realizagao de ceratomileuse in situa laser (LASIK) ou ceratectomia fotorrefrativa (PRK) para alterar a curvatura da cérnea. Com o inicio da meia-idade, surge a presbiopia, situago em que a lente do olho perde a capacidade de aumentar seu poder reftativo para acomodar-se aos objetos proximos. Para compensar a presbiopia, o paciente emétrope precisa usar éculos para leitura. Os pacientes que j4 usavam culos para longe geralmente passam a usar lentes bifocais. A unica excegdo é o paciente miope, capaz de enxergar bem objetos a curta distancia simplesmente tirando os éculos usados para longe. Os erros de refragdo costumam surgir lentamente e se estabilizam apés a adolescéncia, exceto em situagdes incomuns. Por exemplo, o inicio agudo de diabetes melito pode causar miopia stibita em razio do edema da lente induzido pela hiperglicemia. O teste da viséo por meio de um pequeno orificio é um modo util de pesquisar com rapidez a presenga de erro de refragdo. Se a acuidade visual for maior olhando através do orificio do que a olho nu, o paciente necessitard de corregao visual para obter melhor acuidade visual. ACUIDADE VISUAL Utiliza-se a tabela de Snellen para testar a acuidade visual a distancia de 6 metros (20 pés). Um método mais conveniente € 0 cartéo de Rosenbaum, uma versio em escala menor da tabela de Snellen, mantido a 36 centimetros do paciente (Fig. 39.1). Todos os individuos devem ser capazes de ler a linha 6/6 metros (20/20) com cada um dos olhos usando corregdo visual, se a tiverem. Os pacientes que necessitem de éculos de leitura para presbiopia terdo de usé-los para que 0 teste com o cart de Rosenbaum apresente um resultado preciso. Se os dois olhos nao tiverem acuidade 6/6 (20/20), a deficiéncia visual devera ser explicada. Sendo inferior a 6/240 (20/800), sera necesséria a medig&o da acuidade em termos de contagem de dedos, movimentos da mio, percepgao ou nao da luz. O Internal Revenue Service define cegueira legal como acuidade maxima cortigida no melhor olho igual ou inferior a 6/60 (20/200), ou como campo visual binocular igual a ou menor que 20°. Nos Estados Unidos (EUA), as leis que regulamentam a diregdo de veiculos variam de Estado para Estado, mas a maioria exige acuidade corrigida de 6/12 (20/40) em pelo menos um dos olhos para que se tenha permissio sem restrigdes. Os individuos portadores de hemianopsia homénima niio devem conduzir veiculos. CARTAO DE BOLSO DE ROSENBAUM PARA RASTREAMENTO DA VISAO- 2 £6 ea gs Be 38 20 oD a 2 8S 4 £3 im 5 3 a3 2Be43 2 16 a 638 EWM xoo 4% 8746 SmwW OxO 07 8 63925 mea xox 85 ¥ 428365 Wem oxo 6 3 # grease ue xxe z § 2 % saree mms kee a 41 5 a8 DISTANCIA DE TESTE 36 cm COHTESIA.DE JG. ROSENBAUM, MD DILATAGAO DA PUPILA (mm) 20000 O08 8 9 23 4 5 6 x FIGURA 39.1 O cartéo de Rosenbaum é uma versao em escala reduzida da tabela de Snellen para testar a acuidade visual para perto. Quando a acuidade visual for registrada, a distancia equivalente para a tabela de Snellen deveré receber uma anotagdo indicando que a visto foi testada de perto, e no a uma distancia de 6 metros, ou entio o sistema numérico de Jaeger deverd ser usado para o registro da acuidade. PUPILAS As pupilas devem ser examinadas separadamente, em ambiente pouco iluminado e com 0 paciente olhando para um ponto distante. Nao hd necessidade de verificar a reagdo de perto se as pupilas reagirem rapidamente a luz, j4 que nao ha perda isolada da capacidade de constrigdo (miose) para acomodagao. Por isso, a abreviatura PIRRLA (pupilas isocéricas, redondas e reativas a luz e 4 acomodagao) indica desperdicio de tempo com a Ultima etapa do exame. Contudo, seré importante testar 0 reflexo de acomodagao se a resposta fotomotora estiver diminuida ou ausente. A dissociagao entre os reflexos fotomotor e de acomodag4o ocorre na neurossifilis (pupilas de Argyll- Robertson), em lesées do mesencéfalo dorsal (sindrome de Parinaud) e apés regeneragdio aberrante (paralisia do nervo oculomotor, pupila ténica de Adie). ‘A pupila de um olho incapaz de perceber a luz ndo responde a estimulagao luminosa direta. Se a retina ou o nervo éptico sofrerem uma lesao parcial, a reagdo pupilar direta sera mais fraca que a resposta pupilar consensual, provocada ao iluminar o olho contralateral saudavel. O defeito pupilar aferente relativo (pupila de Marcus Gunn) pode ser pesquisado com 0 teste da lanterna oscilante (Fig. 39.2). Trata-se de um sinal extremamente itil para o diagnéstico de neurite dptica retrobulbar e de outras doengas do nervo éptico nas quais talvez seja 0 tnico sinal objetivo de doenga. Na neuropatia 6ptica bilateral, no se observa defeito pupilar aferente se os nervos épticos estiverem igualmente afetados. ie FIGURA 39.2 Demonstragio de defeito pupilar aferente relativo (pupila de Marcus Gunn) no olho esquerdo, feita com o paciente olhando fixo para um objeto distante. A. Com baixa iluminagdo no ambiente, as pupilas ficam iguais e relativamente dilatadas. B. A incidéncia de um feixe de luz no olho direito provoca forte constrigao igual em ambas as pupilas. G. A oscilagao do feixe de luz sobre 0 olho esquerdo danificado produz dilatagio de ambas as pupilas, embora se mantenham menores do que em A. O retorno da luz.ao olho direito saudvel produz, constrigao simétrica igual & apresentada em B. Observe que as pupilas se mantém simétricas em todas as situagdes; a lesdo na retina-nervo dptico esquerdo é revelada pela constrigdo mais fraca em ambas as pupilas em resposta luz sobre 0 olho esquerdo em comparagdo com a mesma manobra sobre o olho direito. (De P Levatin: Arch Ophthalmol 62:768, 1959. Copyright © 1959 American Medical Association. Todos os direitos reservados.) Uma anisocoria discreta, de até 0,5 mm, & bastante comum em pessoas normais. Se tal diferenga nao se alterar com variagdes da iluminagdo ambiente, poderd ser feito o diagnéstico de anisocoria essencial ou fisiolégica. Uma anisocoria que aumente sob pouca iluminagdo indica paresia simpatica do musculo dilatador da iris. A triade composta por miose, ptose ipsilateral e anidrose constitui a sindrome de Horner; entretanto a anidrose nem sempre ocorre. Essa sindrome pode ser causada por acidentes vasculares do tronco encefalico, dissecgdéo da carétida e neoplasias que acometam a cadeia simpatica. No entanto, a maioria dos casos é idiopatica. Ja a anisocoria que se acentua sob iluminagao forte sugere paralisia parassimpatica. Nesse caso, a causa mais comum é a paralisia do nervo oculomotor. Tal diagnéstico poderd ser afastado se os movimentos oculares forem normais e 0 paciente nao apresentar ptose ou diplopia. Uma dilatagao pupilar aguda (midriase) pode ser causada por les&o no ganglio ciliar dentro da érbita. Os mecanismos comuns sio infecgdo (herpes-z6ster, influenza), traumatismo (fechado, penetrante ou cirtirgico) ¢ isquemia (diabetes melito, arterite temporal). Quando ha denervagao do esfincter da iris, a pupila ndo responde bem a luz, mas a resposta & acomodag&o muitas vezes permanece relativamente intacta. Quando se remove o estimulo préximo, a pupila afetada dilata bem mais lentamente que a normal, dai a expresso pupila tnica. Na sindrome de Adie observa-se pupila t6nica, algumas vezes combinada com reflexos tendineos reduzidos ou abolidos nos membros inferiores. Supde-se que essa doenga benigna, mais comum em mulheres jovens saudaveis, represente uma disautonomia leve. A pupila tdnica também ocorre na sindrome de Shy-Drager, hipoidrose segmentar, diabetes melito ¢ amiloidose. As vezes, uma pupila ténica ¢ descoberta por acaso em um individuo normal e assintomatico. O diagnéstico é confirmado pingando-se 1 gota de pilocarpi diluida a 0,125% em cada olho. A hipersensibilidade pés-denervagao produziré constrigéo pupilar na pupila ténica, enquanto a pupila normal nao responderd. A dilatacao farmacolégica apés a instilagdo acidental ou proposital de anticolinérgicos (atropina ou escopolamina em gotas) no olho também pode causar midriase pupilar. Nessa situagao, a pilocarpina em diluigdo normal (a 1%) nao causa constrigao. Medicamentos sistémicos afetam ambas as pupilas. Elas ficam menores quando se usam nareéticos (morfina, heroina) e dilatam-se com anticolinérgicos (escopolamina). Os agentes parassimpaticos usados para tratar o glaucoma (pilocarpina, brometo de demecério) produzem miose. Nos pacientes com anomalias pupilares sem explicacao, 0 exame com lmpada de fenda ajuda a descartar traumatismos cirdrgicos da fris, corpos estranhos ocultos, lesdes perfurantes, inflamagio intraocular, aderéncias (sinéquias), glaucoma de Angulo fechado e ruptura do esfincter da iris por traumatismo contuso. MOVIMENTOS E ALINHAMENTO OCULARES Os movimentos oculares sdo testados pedindo-se ao paciente que siga com os dois olhos um objeto mével, tal como uma lanterna, até os pontos cardeais do campo visual. Os movimentos oculares normais so suaves, uniformes, simétricos ¢ percorrem todas as diregdes sem nistagmo. Avaliam-se os movimentos sacddicos (movimentos oculares rapidos de refixagao) fazendo o paciente olhar alternadamente para dois pontos estacionarios. Os olhos devem se mover com rapidez e precisdo entre os pontos. O alinhamento ocular € avaliado segurando-se uma lanterna bem em frente ao paciente, a aproximadamente 1 metro de distancia. Se os olhos se encontrarem retos, o reflexo da luz na cérnea estard no centro de cada pupila. Para testar o alinhamento dos olhos com maior precisao, utiliza-se o teste de oclusaio (cover test). O paciente é orientado a olhar fixamente para um ponto distante. Um dos olhos é subitamente coberto enquanto 0 outro € observado. Se este se desviar na diregao do ponto, ele estava mal alinhado. Se nao se mover, descobre-se 0 que estava coberto e repete-se o teste com o outro olho. Se nenhum deles se mover, sera porque ambos esto alinhados ortotropicamente. Estando os olhos do paciente ortotrépicos ao olhar para frente, mas havendo diplopia, deve-se repetir o teste com a cabega inclinada ou virada na dire¢o que provoque a diplopia. Com alguma pratica, o oftalmologista detectaré desvios oculares (heterotropia) tao pequenos como 1°-2°, Em um paciente com diplopia vertical, um pequeno desvio pode ser dificil de detectar e facil de passar despercebido. O grau de desvio pode ser mensurado aplicando-se um prisma diante do olho desalinhado a fim de determinar a refracdo necessaria para neutralizar o desvio da fixag&o provocado pela cobertura do outro olho. Prisma tempordrio plastico de Fresnel, éculos com prisma ou cirurgia dos misculos dos olhos sao meios usados para restaurar o alinhamento binocular. ESTEREOPSIA Para determinar a estereoacuidade, mostram-se imagens polarizadas com alvos que incidam sobre pontos diferentes da retina. Os testes mais usados em consultério medem uma série de limiares entre 800 e 40 segundos de arco. A estereoacuidade normal é de 40 segundos de arco. Se 0 paciente apresentar esse nivel, poder-se-d ter certeza de que os olhos estio ortotropicamente alinhados e que a visio em ambos ¢ integra. Os estereogramas de pontos aleatérios nio tém indicadores de profundidade monocular e sdo um excelente teste para o rastreamento de estrabismo e ambliopia em criangas. VISAO EM CORES A retina contém trés tipos de cones, com pigmentos de diferentes sensibilidades espectrais maximas: vermelho (560 nm), verde (530 nm) e azul (430 nm). Os pigmentos dos cones vermelhos e verdes sao codificados no cromossomo X, e os do cone azul, no cromossomo 7. Mutagées no pigmento dos cones azuis sdéo extremamente raras. Mutagées nos pigmentos vermelho e verde causam acromatopsia congénita ligada ao X em 8% dos individuos do sexo masculino. Os individuos afetados nao sao totalmente incapazes de distinguir cores; na verdade, eles diferem dos individuos normais na forma como percebem as cores e como combinam as luzes monocromiaticas das cores primarias para igualar uma determinada cor. Os tricromatas anémalos tém os trés tipos de cone, mas uma mutagao de um pigmento de cone (em geral, 0 vermelho ou 0 verde) modifica a sensibilidade espectral maxima, alterando a combinagdo de cores primarias necessdria para reproduzir uma determinada cor. Os dicromatas tém apenas dois tipos de cone, por isso aceitam combinagaio de cores com apenas duas cores primérias. Os tricromatas anémalos e dicromatas apresentam acuidade visual de 6/6 (20/20), mas tém dificuldade de discriminar tonalidades. As pranchas coloridas de Ishihara possibilitam detectar discromatopsia vermelho-verde. As pranchas de teste contém um numero oculto, visivel apenas para os pacientes que confundem o vermelho com o verde. Como a acromatopsia é quase exclusivamente ligada ao X, apenas criangas do sexo masculino devem ser rastreadas. As pranchas de Ishihara séo muito usadas para a deteceao de defeitos adquiridos na visio em cores, embora tenham sido criadas como teste de rastreamento para acromatopsia congénita. Os defeitos adquiridos da visio em cores frequentemente so causados por doengas da macula ou do nervo éptico. Por exemplo, os pacientes que ttm histrico de neurite dptica muitas vezes referem diminuigdo na saturagio das cores muito depois de sua acuidade visual ter voltado ao normal. Também pode ocorrer acromatopsia em casos de acidentes vasculares bilaterais que acometam a parte ventral do lobo occipital (acromatopsia cerebral). Tais pacientes veem apenas tons de cinza, podendo também apresentar dificuldade de reconhecer rostos (prosopagnosia). Infartos do lobo occipital dominante as vezes produzem anomia para cores. Esses pacientes conseguem distinguir as cores, mas nao denomind-las. CAMPOS VISUAIS A visio pode ser afetada por alguma lesdo em qualquer regidio do sistema visual: dos olhos aos lobos occipitais. E possivel localizar a leséo com bastante precisdo mapeando o déficit do campo visual por meio da conftontagio com dedos e correlacionando 0 resultado com a anatomia topografica das vias visuais (Fig. 39.3). O mapeamento quantitativo do campo visual é realizado por campimetro computadorizado no qual alvos de intensidade variavel sdo apresentados em posigdes fixas do campo visual (Fig. 39.34). Ao gerar um registro impresso dos limiares de luz, esses instrumentos representam um meio sensivel de deteccdo de escotomas no campo de visdo. Também sao extremamente Uteis na avaliagdo seriada da fungado visual em doengas crénicas, como o glaucoma e o pseudotumor cerebral. Na analise dos campos visuais, é essencial determinar se uma lesao esta localizada antes, no préprio ou atras do quiasma éptico. Se houver escotoma em apenas um dos olhos, sua origem estara em lesao anterior ao quiasma, podendo ser no nervo dptico ou na retina. As lesées retinianas produzem escotomas que correspondem opticamente a sua localizagao no fundo. Por exemplo: um descolamento de retina nasal superior causa perda temporal inferior do campo visual. Uma lesdo da macula produz um escotoma central (Fig. 39.38). As doengas do nervo éptico produzem padrées tipicos de perda dos campos visuais. O glaucoma destréi seletivamente os axénios que entram nos polos temporal superior e temporal inferior do disco éptico, produzindo escotomas arqueados, em forma de cimitarra turca, que surgem no ponto cego, curvam-se em torno da fixagdo e terminam chapados contra 0 meridiano horizontal (Fig. 39.30). A forma desse defeito do campo reflete a disposigo do feixe de fibras nervosas na retina temporal. Os escotomas arqueados, também chamados escotomas do feixe de fibras nervosas, igualmente resultam de neurite éptica, neuropatia éptica isquémica, drusas do disco éptico e de oclusao de artéria ou veia da retina. Uma lesao de todo o polo inferior ou superior do disco éptico produz um corte altitudinal no campo visual que acompanha o meridiano horizontal (Fig. 39.3). Esse padrao de perda visual é tipico da neuropatia éptica isquémica, mas também resulta de oclusdo vascular retiniana, glaucoma avangado e neurite dptica. Cerca de metade das fibras do nervo éptico se origina de células ganglionares que servem a macula. Lesdes das fibras papilomaculares produzem um escotoma cecocentral, que envolve o ponto cego e a macula (Fig. 39.35). Se o dano for irreversivel, surgira palidez na parte temporal do disco optico. A palidez temporal correlacionada a escotoma cecocentral também pode ocorrer na neurite éptica ¢ nas neuropatias pticas nutricional, t6xica, hereditaria de Leber e, além, na atrofia dptica dominante de Kjer e na neuropatia éptica compressiva. Convém mencionar que, na maioria dos individuos normais, 0 lado temporal do disco éptico é um pouco mais palido que o lado nasal. Assim, pode ser dificil determinar se a palidez temporal vista na fundoscopia representa uma alterago patolégica. A palidez da borda nasal do disco 6ptico é um sinal menos ambiguo de atrofia éptica, No quiasma éptico, as fibras oriundas das células ganglionares nasais decussam para o trato dptico contralateral. As fibras cruzadas sao lesadas por compressao com maior frequéncia do que as ndo cruzadas. Assim, lesées expansivas na regidio selar causam hemianopsia temporal bilateral. Tumores anteriores ao quiasma dptico, tais como os meningiomas do tubérculo selar, produzem um escotoma juncional, caracterizado por neuropatia éptica em um dos olhos e perda de campo visual temporal superior no olho contralateral (Fig. 39.3G). Uma compressdo mais simétrica do quiasma por adenoma hipofisdrio (ver Fig. 403.1), meningioma, craniofaringioma, glioma ou aneurisma produz hemianopsia bitemporal (Fig. 39.3). O paciente muitas vezes nao percebe o inicio insidioso da hemianopsia bitemporal, ¢ 0 médico também errard o diagnéstico se nao examinar os dois olhos separadamente. Defeitos pré-quiasmaiticos no campo visual mononuclear: ene” Racor” Gioamindnonose ciel SES: cerca pee Defeltos binoculares qulasmdticas ou pos-quiasmeticos: Oho sequen) (Oe sto ee: ¢ >. Heniancpsa btempars D> Henicnopoa hone ee Ce ericsia horn FIGURA 393 Visio inferior do cérebro, correlacionando os padrées de perda do campo visual com as localizagées das lesdes na via visual. Os campos visuais se sobrepoem parcialmente, criando 120° de campo binocular central flanqueado por um crescente mononuclear de 40° para cada lado. Nesta figura, os mapas dos campos visuais foram feitos com um campimetro computadorizado (Humphrey Instruments, Carl Zeiss, Inc.). O dispositivo plota a sensibilidade luz da retina nos 30° centrais, usando um formato em escala de cinza, As regides com perda do campo de visdo aparecem em negro. Os exemplos de defeitos pré-quiasmaticos no campo visual monocular mais comuns so apresentados no olho direito. Por convengdo, os campos visuais sempre so registrados com os campos do olho esquerdo & esquerda ¢ os do olho direito a dircita, exatamente como o paciente enxerga. E dificil localizar com precisio uma lesio pés-quiasmitica, pois lesdes em qualquer parte do trato éptico, do corpo geniculado lateral, das radiacdes dpticas ¢ no cértex visual podem causar hemianopsia homénima (perda da parte temporal do campo no olho contralateral & lestio e da parte nasal no olho ipsilateral) (Fig. 39.3/). Uma lesdo pés-quiasmatica unilateral nfo afeta a acuidade visual, embora o paciente as vezes leia apenas metade (8 direita ou a esquerda) do quadro visual. Lesdes nas radiagdes dpticas tendem a causar defeitos visuais bilaterais irregulares ou incongruentes. Danos as radiagdes épticas no lobo temporal (alga de Meyer) geram quadrantanopsia homénima superior (Fig. 39.3/), enquanto lesées das radia épticas no lobo parietal causam quadrantanopsia homénima inferior (Fig. 39.34). Lesdes do cértex visual primério produzem defeitos de campo densos, congruentes ¢ hemianépticos. A oclusao da artéria cerebral posterior, que irriga 0 lobo occipital, é uma causa comum de hemianopsia homénima total. Alguns pacientes que apresentam hemianopsia apés acidentes vasculares occipitais tém a mAcula poupada, pois essa regitio, que fica na ponta do lobo occipital, ¢ irrigada por ramos da artéria cerebral média (Fig. 39.31). A destruigao de ambos os lobos occipitais produz cegueira cortical. Esse quadro pode ser diferenciado da perda visual pré-quiasmatica bilateral pelo fato de as respostas pupilares e os fundos de olho permanecerem normais. DISTURBIOS OLHO VERMELHO OU DOLORIDO Escoriagdes da cérnea Essas lesdes sdo mais bem visualizadas com a instilagao de 1 gota de fluoresceina no olho seguida por exame sob lampada de fenda com luz azul- cobalto. Uma lanterna com filtro azul sera suficiente se ndo houver lampada de fenda. Os danos ao epitélio da cornea sao revelados pela fluorescéncia amarela da membrana basal exposta sob o epit E importante procurar corpos estranhos. Para pesquisar os fornices conjuntivais, deve-se baixar a palpebra inferior e everter a superior. O corpo estranho pode ser removido com um aplicador de ponta de algodao umedecido apés pingar no olho uma gota de anestésico tépico, como a proparacaina. Alternativamente, é possivel lavar o corpo estranho do olho irrigando-o com soro fisiolégico ou com lagrimas artificiais. Se houver escoriago do epitélio da cérnea, deve-se aplicar antibidtico em pomada e cobrir o olho. Uma gota de cicloplégico de agao intermediaria, tal como o cloreto de ciclopentolato a 1%, ajuda a diminuir a dor ao relaxar 0 corpo ciliar. Deve-se reexaminar 0 olho no dia seguinte. As escoriagées pequenas talvez nao necessitem de curativo, antibidtico ou cicloplegia. Hemorragia subconjuntival Decorre da ruptura de pequenos vasos com extravasamento para 0 possivel espaco entre a esclera e a conjuntiva. O sangue disseca esse espaco, produzindo vermelhidao ocular marcante. Mas a visio ndo é afetada, ¢ a hemorragia cede sem tratamento. As hemorragias subconjuntivais so em geral espontineas, mas as vezes surgem apés traumatismo contundente, esfregagio dos olhos ou tosse vigorosa. Podem ser também sinais de doenga hemorragica subjacente. Pinguécula Consiste em um pequeno nédulo conjuntival elevado, localizado no limbo temporal ou no nasal. Essas leses séio extremamente comuns em adultos ¢ tém pouco significado, a menos que inflamem (pingueculite). Ocorrem com maior frequéncia em trabalhadores com atividade ao ar livre. O pterigio é semelhante 4 pinguécula, mas atravessa o limbo e avanga sobre a superficie da cémea, Sua remogao justifica-se quando surgem sintomas de irritagao ou borramento visual, No entanto, a recorréncia & comum. Blefarite Trata-se de inflamagao das palpebras. A forma mais comum ocorre associada a acne rosacea ou a dermatite seborreica. As bordas das pdlpebras sao, em geral, intensamente colonizadas por estafilococos. Vistas de perto, mostram-se gordurosas, ulceradas ¢ crostosas, com restos de escamas presos aos cilios. O tratamento consiste em higiene estrita da palpebra, uso de compressas mornas e lavagem dos cilios com xampu para bebés. O hordéolo externo (tergol) é causado por infecgao estafilocécica das glindulas acessérias superficiais de Zeis ou Moll, localizadas nas bordas palpebrais. O hordéolo interno ocorre apés infecgdo supurativa das glandulas de Meib6nio secretoras de gordura na face tarsal da pélpebra. Pomadas oftalmicas t6picas a base de antibidticos, como bacitracina/polimixina B, podem ser aplicadas. A meibomite grave e a blefarite grave recorrente podem exigir 0 uso de antibisticos sistémicos, geralmente tetraciclinas ou azitromicina. O caldzio é uma inflamagao granulomatosa crénica e indolor da glandula de Meibénio que produz um nédulo em forma de ervilha dentro da palpebra. Pode-se incisar e drenar esse nédulo ou aplicar nele injegdes de glicocorticoides. Diante de lesées ulcerativas das palpebras que nao cicatrizem, deve-se suspeitar de carcinomas basocelular, espinocelular ou da glandula de Meib6nio. Dacriocistite Constitui a inflamagao do sistema de drenagem lacrimal, podendo causar epifora (lacrimejamento) ¢ hiperemia ocular, A pressao ligeira sobre 0 saco lacrimal causa dor ¢ refluxo de muco e pus pelos pontos lacrimais, A dacriocistite surge em geral apés a obstrudo do sistema lacrimal. O tratamento consiste em antibidticos tépicos e sistémicos, seguidos de dilatagao, intubagao com stent de silicone ou cirurgia para restabelecer a perviedade. O entrdpio (inversio da palpebra) e 0 ectrépio (eversio da palpebra) também podem causar epifora ¢ irritago ocular. Conjuntivite A conjuntivite é a causa mais comum de vermelhidao e irritagdo oculares. ‘A dor é minima, ¢ a acuidade visual reduz-se ligeiramente. O agente etiolégico viral mais comum é 0 adenovirus. Nesse caso, ha secreg%o aquosa, fotofobia e leve sensagao de corpo estranho. A infecgio bacteriana tende a produzir um exsudato mais mucopurulento, Os casos leves de conjuntivite infecciosa so tratados geralmente de maneira empirica, com antibidticos oculares tépicos de amplo espectro, como sulfacetamida a 10%, polimixina-bacitracina ou a associagao trimetoprima-polimixina. Esfregagos ¢ cultura ficam, de modo geral, reservados as conjuntivites graves, resistentes ou recorrentes. Para prevenir 0 contégio, deve-se orientar 0 paciente a lavar as méos com frequéncia, niio tocar nos olhos e evitar contato direto com outras pessoas. Conjuntivite alérgica Trata-se de um problema extremamente comum, muitas vezes confundido com conjuntivite infecciosa. Prurido, vermelhidio e epifora sao caracteristicos. Pode haver hipertrofia das conjuntivas palpebrais com grandes protrusées, denominadas papilas gigantes. A irritagdo por lentes de contato ou outro corpo estranho crénico também pode levar A formagéo de papilas gigantes. A conjuntivite atépica ocorre em portadores de dermatite atépica ou de asma. Os sintomas de conjuntivite alérgica podem ser aliviados por compressas_ fias, vasoconstritores tépicos, anti-histaminicos e estabilizadores dos mastécitos, tais como © cromoglicato sédico. As solugdes tépicas de glicocorticoides oferecem alivio acentuado das formas imunomediadas de conjuntivite. Nao se deve, no entanto, usd-los cronicamente em razo dos riscos de glaucoma, catarata e infeccao secundaria. Os anti inflamatérios nao esteroides (AINEs) tépicos (p. ex., cetorolaco trometamina) sao alternativas melhores. Ceratoconjuntivite seca Também chamada de olho seco, produz queimagao, sensagao de corpo estranho, hiperemia ocular ¢ fotofobia, Em casos leves, o olho se apresenta quase normal, mas a produgao de lagrimas, medida pela umectagao de papel de filtro (teste de Schirmer), € deficiente. Diversos firmacos de uso sistmico, como anti- histaminicos, anticolinérgicos ¢ varios psicotrépicos, reduzem a secregao lacrimal, causando ressecamento ocular. Distirbios que envolvem diretamente o saco lacrimal, como sarcoidose e sindrome de Sjégren, também causam olhos secos. Os pacientes podem evoluir com olhos secos apés radioterapia se 0 campo de tratamento incluir as 6rbitas. O ressecamento dos olhos também é comum apés lesdes dos V e VII nervos cranianos. A anestesia da cérnea é especialmente perigosa, pois a auséncia do piscar reflexo a expée a lesdes indolores que o paciente nao percebe. O olho seco é tratado com aplicagao frequente e copiosa de légrima artificial e lubrificantes oculares. Em casos graves, podem-se ocluir ou cauterizar os pontos lacrimais para reduir a drenagem lacrimal. Ceratite Essa patologia ameaga a visio porque traz riscos de opacificacao, cicatrizagdo e perfurag’o da cérnea. Em todo o mundo, as duas maiores causas da cegucira por ceratite so tracoma (infecgao por Chlamydia) e deficiéncia de vitamina A decorrente de desnutrigdo. Nos EUA, as lentes de contato sio uma grande causa de infecgao e ulceragao da cornea. Elas ndo devem ser usadas por individuos que estejam com infecgdes oculares em atividade. Na avaliagao da cérnea, é importante diferenciar entre infecgdo superficial (ceratoconjuntivite) e processo ulcerativo mais profundo e mais grave. Esse ultimo é acompanhado de maior perda visual, dor, fotofobia, vermelhidao e secregao. O exame com lampada de fenda mostra ruptura do epitélio da cérnea, infiltrado leitoso ou abscesso do estroma, e reagao celular inflamatoria na camara anterior. Em casos graves, observa-se actimulo de pus no fundo da camara anterior, produzindo hipépio. Deve-se instituir antibioticoterapia_ empirica imediatamente apés a obtengao de raspado da cérnea para exames de Gram, Giemsa e culturas. Os antibidticos tépicos mais fortes sao os mais eficazes ¢ podem ser suplementados com antibisticos subconjuntivais, de acordo com a necessidade. Deve- se sempre suspeitar de etiologia fiingica em pacientes que apresentem ceratite. A infecgao fiingica é mais comum em climas quentes e timidos, principalmente apés penetragao da cérnea por plantas ou matérias vegetais. Herpes-virus simples Os herpes-virus so uma causa importante de cegueira por ceratite. Nos EUA, a maioria dos adultos tem anticorpos séricos contra o herpes simples, 0 que indica infecgao prévia (Cap. 216). A infecgao ocular priméria costuma ser causada pelo herpes-virus tipo 1, e nao pelo tipo 2. A doenga se apresenta como blefaroconjuntivite folicular unilateral, facil de ser confundida com a conjuntivite por adenovirus, exceto quando aparecem vesiculas herpéticas tipicas na pele periocular ou na conjuntiva. Um padrao dendritico de ulceragao ocular ao exame com fluoresceina é patognoménico de herpes simples, mas tal padro é observado apenas em uma minoria das infecgdes primérias, A infecg’o ocular recorrente ocorre com a reativago de herpes-virus latentes. A erupgao viral no epitélio da cérnea pode produzir 0 dendrito herpético tipico. O acometimento do estroma da cémnea produz edema, vascularizagiio e iridociclite. O tratamento da ceratite herpética ¢ feito com antivirais tépicos, cicloplégicos e aciclovir oral. Os glicocorticoides tépicos sao eficazes para reduzir a formagao de cicatrizes na cérnea, mas devem ser usados com cuidado em razio dos riscos de liquefagao e perfuragdo da cornea. O uso de glicocorticoides t6picos também estd associado a risco de prolongamento da infecgao e de indugdio de glaucoma. Herpes-zdster O herpes-zdster, causado por reativagao de virus latente da varicela (catapora), produz uma dermatite vesiculosa e dolorosa distribuida sobre um dermétomo. Podem surgit sintomas oculares apés erupgéo por herpes-zéster em qualquer ramo do nervo trigémeo. Os sintomas oculares so mais comuns quando hé vesiculas no nariz, indicando acometimento do nervo nasociliar (V1) (sinal de Hutchinson). O herpes-zéster oftalmico produz dendritos corneanos, que podem ser dificeis de distinguir daqueles causados pelo herpes simples. Outras sequelas comuns sdo ceratite estromal, uveite anterior, aumento da pressdo intraocular, paralisia dos nervos motores oculares, necrose aguda da retina, cicatrizagdo pds-herpética e neuralgia. O herpes-z6ster oftdlmico ¢ tratado com antivirais e cicloplégicos. Em casos graves, podem-se acrescentar glicocorticoides para evitar perdas visuais permanentes por formagao de cicatrizes na cérnea. Episclerite Trata-se da inflamagio da episclera, fina camada de tecido conectivo localizada entre a conjuntiva ¢ a esclera, A episclerite manifesta-se de modo parecido com 0 da conjuntivite, porém é um processo mais localizado e nao produz secregao. A maioria das episclerites ¢ idiopatica, mas alguns casos ocorrem no contexto de doengas autoimunes. A esclerite constitui um processo inflamatério mais intenso e mais profundo, com frequéncia associado a doengas do colageno, como artrite reumatoide, lapus eritematoso sistémico, poliarterite nodosa, granulomatose com poliangeite (de Wegener) ¢ policondrite recorrente. A inflamagao ¢ o espessamento da esclera podem ser difusos ou nodulares. Nas esclerites anteriores, 0 globo ocular adquire um tom violaceo, e o paciente faz referéncia a hipersensibilidade e dor ocular intensas. Na esclerite posterior, € possivel que dor e vermelhidao sejam menos intensas, mas muitas vezes ocorrem proptose, efusdo coroidal, redugao da mobilidade e perda visual. A episclerite ¢ a esclerite devem ser tratadas com AINEs. Se esses farmacos nao fincionarem, poderdo ser necessirios glicocorticoides tépicos ou até sistémicos, principalmente se houver um processo imune ativo subjacente, Uveite A inflamagao das estruturas anteriores do olho também ¢ denominada irite ou iridociclite. O diagnéstico requer exame com lampada de fenda para identificagao de células flutuando no humor aquoso ou depositadas no endotélio da cérnea (precipitados ceraticos). A uveite anterior ocorre em doengas como sarcoidose, espondilite anquilosante, artrite reumatoide juvenil, doenga inflamatéria intestinal, psoriase, artrite reacional e doenga de Behget. Também est associada a infecgdes por herpes, sifilis, doenga de Lyme, oncocercose, tuberculose e hanseniase. A uveite anterior pode estar associada a varias doengas, mas, na maioria dos casos, nao ha causa definida. Por esse motivo, a avaliagao laboratorial fica em geral reservada aos pacientes que apresentem uveite anterior recorrente ou grave. O tratamento visa a reduzir a inflamagdo e a formagao de cicatrizes por meio do uso cauteloso de glicocorticoides topicos. A dilatagdo da pupila reduza dor e previne a formagdo de sinéquias. Uveite posterior E diagnosticada observando-se a presenga de inflamagao em vitreo, retina ou coroide 4 fundoscopia. Esté associada a doengas sistémicas com maior frequéncia do que a uveite anterior. Alguns pacientes apresentam pan-uveite ou inflamagao dos segmentos anterior ¢ posterior do olho. A uveite posterior é uma das manifestagdes de doengas autoimunes, como sarcoidose, doenga de Behget, sindrome de Vogt-Koyanagi-Harada e doenga inflamatéria intestinal. Ocorre também em doencas, como toxoplasmose, oncocercose, cisticercose, coccidioidomicose, toxocariase e histoplasmose; em infecgées causadas por microrganismos, como Candida, Pneumocystis carinii, Cryptococcus, Aspergillus, herpes © citomegalovirus (ver Fig. 219.1); € em outras doengas, como sifilis, doenga de Lyme, tuberculose, doenga da arranhadura do gato, doenga de Whipple e brucelose. Na esclerose miltipla, podem surgir alteragdes inflamatérias crénicas na periferia extrema da retina (denominadas pars planitis ou wveite intermediaria). Glaucoma agudo de Angulo fechado Trata-se de uma causa incomum e frequentemente subdiagnosticada de eritema e dor oculares. As populagdes asidticas tém risco particularmente alto de glaucoma de Angulo fechado. Os olhos suscetiveis tm camara anterior rasa, seja porque 0 olho possui um comprimento axial curto (hipermetropia), seja porque 0 cristalino cresceu em razio do surgimento gradual de catarata, Quando a pupila fica semidilatada, a periferia da iris bloqueia a saida do humor aquoso por meio do Angulo da cAmara anterior, ¢ a pressio ocular sobe rapidamente, 0 que causa dor, hiperemia, edema da cérnea, obscurecimento e visdo turva. Em alguns pacientes, os sintomas oculares so menos evidentes que outros, como néuseas, vémitos ¢ cefaleia, 0 que pode levar a uma investigago improdutiva para doenga abdominal ou neurolégica. O diagnéstico é feito medindo-se a pressdo intraocular durante uma crise aguda ou procedendo-se gonioscopia, um procedimento que permite observar o Angulo estreito da cémara por meio de uma lente de contato espelhada, No tratamento do fechamento angular agudo, utilizam-se acetazolamida (VO ou IV), betabloqueadores t6picos, andlogos da prostaglandina, agonistas «,-adrenérgicos e pilocarpina para induzir miose. Se essas medidas nfo forem suficientes, pode-se usar laser para perfurar a iris periférica ¢ aliviar 0 bloqueio pupilar. Muitos médicos temem dilatar a pupila rotineiramente ao fazer a findoscopia, pois receiam provocar glaucoma de Angulo fechado. Nao obstante, esse risco ¢ minimo e mais que compensado pela possibilidade de descobrir uma lesao oculta no fundo de olho, visivel apenas com a pupila bem dilatada. Além disso, é raro que uma crise de glaucoma de Angulo fechado produza dano permanente aos olhos. Assim, a crise acaba servindo como teste provocativo para identificar os pacientes com Angulos fechados, candidatos 4 iridectomia a /aser profilatica. Endoftalmite Trata-se de infecgao bacteriana, viral ou parasitaria das estruturas internas do olho. Geralmente adquirida por implante hematogénico a partir de um ponto remoto. Os pacientes crénicos, diabéticos ou imunossuprimidos, sobretudo aqueles com histérico de uso de cateteres IV ou hemoculturas positivas, estdo sob risco mais elevado de endoftalmite. A maioria dos pacientes apresenta dor e hiperemia ocular, mas a perda de visao pode ser o tnico sintoma. Embolos sépticos originados de valvula cardiaca infectada ou de abscesso dentario podem se alojar na circulagio retiniana e causar endoftalmite. Hemorragias retinianas com centros brancos (manchas de Roth) (Fig. 39.4) so consideradas patognoménicas de endocardite bacteriana subaguda, mas também podem surgir em alguns casos de leucemia, diabetes ¢ varias outras doengas. A endoflalmite também pode complicar cirurgias oculares, especialmente filtragem de glaucoma, as vezes meses, ou até anos, apds o procedimento. Deve-se considerar a possibilidade de corpo estranho penetrante oculto ou de traumatismo do globo ocular em todos os pacientes que se apresentem com infec¢do ou inflamagao intraocular nao explicada. FIGURA 39.4 Mancha de Roth, exsudato algodonoso e hemorragia retiniana em paciente de 48 anos de idade submetido a transplante de figado com candidemia por imunossupressao. PERDA VISUAL SUBITA OU TRANSITORIA Amaurose fugaz Esse termo refere-se ao ataque isquémico transitério na retina (Cap. 446). Como 0 tecido neural tem metabolismo intenso, a interrupgao do fluxo sanguineo para a retina por alguns segundos produz cegueira monocular transitéria — outro termo usado para descrever a amaurose fugaz. Os pacientes descrevem a perda visual como uma cortina caindo, 4s vezes em apenas uma parte do campo visual. A amaurose fugaz geralmente decorre de um émbolo aprisionado em uma arteriola retiniana (Mig. 39.5). Se 0 émbolo se partir ou passar, o fluxo sera restaurado, ¢ a visio voltaré rapidamente ao normal sem lesdo permanente. Se a interrupgao do fluxo se prolongar, a retina interna sofrerd infarto. A oftalmoscopia revela zonas de empalidecimento e edema na retina, que acompanham a distribuigao das artérias retinianas. A oclusdo completa da artéria central da retina causa interrupgao do fluxo sanguineo, e a retina torna-se leitosa e com févea vermelho-cereja (Fig. 39.6). Os émbolos podem ser compostos por colesterol (placa de Hollenhorst), calcio ou restos de plaquetas ¢ fibrina. A origem mais comum sao placas ateroscleréticas na artéria carétida ou na aorta, embora os émbolos possam se originar no coragao, sobretudo nos pacientes portadores de doenga valvular, fibrilagao atrial ou anormalidades cinéticas das paredes. FIGURA 39.5 A placa de Hollenhorst, alojada na bifureagéo de uma arteriola retiniana, comprova que 0 paciente esta liberando émbolos a partir da artéria carétida, dos grandes vasos ou do coragdo. FIGURA 39.6 Obstrugao da artéria central da retina em paciente do sexo masculino com 78 anos de idade que se apresentou com redugdo da acuidade visual no olho direito para contagem de dedos Observe a hemorragia em chama de vela sobre o disco 6ptico e 0 aspecto levemente leitoso da macula com fovea vermelho-cereja. Em casos raros, a amaurose fugaz decorre de redugdo na pressio de perfusio da artéria central da retina em pacientes que apresentam estenose critica da artéria carétida ipsilateral associada a deficiéncia do fluxo colateral pelo poligono de Willis. A amaurose fugaz surge quando ha queda da pressio sistémica ou ligeira piora da estenose carética. E possivel que ocorram déficits motores ou sensoriais contralaterais que indicariam isquemia cerebral hemisférica concomitante. A oclusdo da artéria da retina também ocorre, ainda que raramente, associada a enxaqueca retiniana, lipus eritematoso, anticorpos anticardiolipina, estados de deficiéneia de anticoagulantes (proteina C, proteina $ ¢ antitrombina), gravidez, uso abusivo de drogas IV, discrasias sanguineas, disproteinemias e arterite temporal. A hipertensdo arterial sistémica grave causa esclerose das arteriolas retinianas, hemorragias em chama de vela, infartos focais do feixe de fibras nervosas (exsudatos algodonosos), bem como vazamentos de lipideos e liquido (exsudatos duros) sobre a macula (Fig. 39.7). Nas crises hipertensivas, 0 vasospasmo das arteriolas retinianas pode causar isquemia com perda visual sibita. A hipertensdo arterial aguda também pode provocar cegueira decorrente de edema isquémico do disco éptico. Os pacientes com retinopatia hipertensiva aguda devem ser tratados com redugdo da pressio arterial. No entanto, essa redugdo nio pode ser abrupta, uma vez que a hipoperfusao siibita pode causar infarto do disco éptico. FIGURA 39.7 Retinopatia hipertensiva com borramento do disco dptico, hemorragia em chama de vela, exsudatos algodonosos (infarto de fibra nervosa) e exsudato na févea em paciente de sexo masculino de 62 anos de idade com insuficiéncia renal crénica e pressao sistélica acima de 220. A oclusdo iminente da veia central da retina ou de seus ramos pode produzir episédios prolongados de obscurecimento visual semelhantes aos descritos por pacientes com amaurose fugaz. As veias ficam ingurgitadas e flebiticas com numerosas hemorragias retinianas . Em alguns pacientes, 0 fluxo sanguineo venoso retorna de maneira espontinea, mas outros evoluem com obstrugdo franca e sangramento retiniano extenso (aspecto de “sangue e tempestade”), infarto e perda da visdo. A oclusdo venosa da retina é muitas vezes idiopatica, mas ha alguns fatores de risco importantes, como diabetes melito, hipertensdo arterial e glaucoma. Fatores capazes de produzir hipercoagulabilidade, como policitemia ¢ trombocitopenia, devem ser corrigidos. O tratamento com acido acetilsalicilico talvez seja benético. FIGURA 39.8 A oclusao da veia retiniana central pode produzir hemorragia retiniana maciga (“‘sangue ¢ tempestade”), isquemia ¢ perda da visio. Neuropatia dptica isquémica anterior (NOTA) E causada por insuficiéncia de fluxo sanguineo pelas artérias ciliares posteriores que abastecem o disco éptico. Causa perda visual monocular indolor, em geral siibita, algumas vezes seguida por agravamento progressivo. O disco éptico encontra-se edemaciado e circundado por hemorragias lineares do feixe de fibras nervosas (Fig. 39.9). Existem dois tipos de NOIA: 0 arteritico e o no arteritico. O nao arteritico é o mais comum. Diabetes melito ¢ hipertensao arterial so fatores de risco comuns, mas geralmente nao se identifica uma causa especifica. Uma arquitetura de disco comprimida com pequena escavagao éptica so fatores predisponentes ao desenvolvimento de NOIA nao arteritica. Nao ha tratamento. Cerca de 5% dos pacientes, sobretudo aqueles com idade > 60 anos, apresentam a forma arteritica de NOIA associada a arterite (temporal) de células gigantes (Cap. 385). E urgente identificar a NOIA arteritica para que se inicie de imediato o tratamento com doses elevadas de glicocorticoides, objetivando evitar perda visual no olho contralateral. E possivel que estejam presentes sintomas de polimialgia reumatica. A velocidade de hemossedimentagao ¢ a proteina C-reativa costumam estar elevadas. Nos pacientes que apresentam perda visual sob suspeita de NOIA arteritica, a bidpsia da artéria temporal se impde para a confirmagao do diagnéstico. O uso de glicocorticoides deve ser iniciado imediatamente, sem que se aguarde o resultado da bidpsia. O diagnéstico de NOIA arteritica dificilmente se sustenta diante de bidpsia temporal negativa, mas tais casos, ainda que raramente, podem ocorrer. E importante a bidpsia de um segmento arterial com no minimo 3 em com exame de um nimero suficiente de cortes de tecido a partir da amostra. FIGURA 39.9 Neuropatia dptica isquémica anterior a partir de arterite temporal em uma senhora de 67 anos com edema agudo do disco, hemorragia em chama de vela, perda da visio e velocidade de hemossedimentagao de 70 mm/h. Neuropatia éptica isquémica posterior Trata-se de causa incomum da perda visual aguda, induzida pela combinagGo de anemia grave ¢ hipotensdo. Foram descritos casos apés perdas sanguineas significativas em cirurgia (especialmente em pacientes submetidos & cirurgia cardiaca ou da coluna lombar), traumatismo exsanguinante, hemorragia digestiva e didlise renal. O findo de olho geralmente se apresenta normal, embora possa haver edema do disco dptico se o processo se estender suficientemente no sentido anterior para atingir 0 globo ocular. As vezes, pode-se preservar a visao com hemotransfusio imediata e reversao da hipotensio. Neurite 6ptica E uma doenga inflamatéria comum do nervo éptico. No Optic Neuritis Treatment Trial (ONTT), a média de idade dos pacientes foi de 32 anos, 77% eram mulheres, 92% apresentavam dor ocular (sobretudo dor 4 movimentagdo ocular) e, em 35%, observou-se edema do disco éptico. Na maioria dos pacientes, 0 evento desmielinizante foi retrobulbar, e o fundo de olho tinha aspecto normal ao exame inicial (Fig. 39.10), embora com surgimento progressivo de palidez do disco éptico nos meses seguintes. FIGURA 39.10 A neurite 6ptica retrobulbar é caracterizada por exame de fundo de olho inicialmente normal, sendo essa a origem do dito “o médico nada vé, e o paciente nada enxerga”. A atrofia éptica se desenvolve apés crises repetidas ¢ graves. Quase todos os pacientes tiveram recuperagio gradual da visio apés episédio tinico de neurite éptica, mesmo sem tratamento, Essa regra é t&o confidvel que, se ndo houver melhora apés um primeiro ataque de neurite dptica, o diagndstico deverd ser posto em davida. O tratamento com metilprednisolona IV em altas doses (250 mg, de 6/6 horas, durante 3 dias), seguida por prednisona oral (1 mg/kg/dia, durante 11 dias), nao produz diferenga na acuidade visual final 6 meses apés a crise, porém esse tratamento acelera a recuperagao da visio. Portanto, quando a perda visual é grave (inferior a 20/100), frequentemente recomenda-se 0 uso de glicocorticoides IV seguido por VO. Em alguns pacientes, a neurite éptica permanece um evento isolado. No entanto, 0 estudo ONTT mostrou que o risco acumulado de diagnéstico de esclerose miltipla nos 15 anos seguintes a um episédio de neurite éptica é de 50%. Recomenda-se exame de ressonancia magnética (RM) cerebral em todos os pacientes que tenham tido uma primeira crise de neurite éptica, Se houver duas ou mais placas na imagem inicial, deve-se considerar a possibilidade de tratar para prevenir 0 desenvolvimento de novas lesdes desmielinizantes (Cap. 458). NEUROPATIA OPTICA HEREDITARIA DE LEBER Essa é uma doenga que geralmente afeta jovens do sexo masculino. Os pacientes sofrem perda visual gradual, indolor, grave e central em um olho, seguida, semanas a anos depois, por processo semelhante no outro olho. Na fase aguda, o disco éptico apresenta-se levemente pletérico com telangiectasias capilares em sua superficie. No entanto, nfo ha extravasamento vascular & angiografia com fluoresceina. Finalmente, ocorre atrofia do nervo dptico. A causa da neuropatia éptica de Leber é uma mutaco de ponto do cédon 11778 do gene mitocondrial que codifica a subunidade 4 da desidrogenase do dinucleotideo de adenina-nicotinamida (NADH). Foram identificadas outras mutagdes causadoras dessa doenga, a maioria em genes mitocondriais que codificam proteinas envolvidas no transporte de elétrons. As mutagdes mitocondriais que causam a neuropatia dptica de Leber séo herdadas da mae por toda a prole, mas geralmente apenas os filhos homens apresentam sintomas. Neuropatia éptica téxica Doenga que pode causar perda visual aguda com edema do disco éptico bilateral e escotomas centrais ou cecocentrais. Jé foi descrita apés exposigao a etambutol, alcool metilico (bebida alcodlica falsificada), etilenoglicol (anticongelante) e monéxido de carbono, Na neuropatia éptica toxica, a perda visual também pode ocorrer progressivamente ¢ produzir atrofia dptica (Fig. 39.11) sem uma fase aguda de edema do disco dptico. Varios agentes foram implicados na neuropatia 6ptica téxica, porém as evidéncias a favor de muitas dessas associagdes sao fracas. Apresentamos a seguir uma lista parcial de firmacos ou toxinas possivelmente responsiveis: dissulfiram, etclorvinol, cloranfenicol, amiodarona, _anticorpo monoclonal anti-CD3, ciprofloxacino, digitilicos, estreptomicina, chumbo, arsénio, tlio, p-penicilamina, isoniazida, emetina e sulfonamidas. Estados de deficiéncia, induzidos por inanig&o, mA absorgao ou alcoolismo, podem causar perda visual insidiosa. Os niveis de tiamina, vitamina B,, ¢ folato devem ser dosados em todos os pacientes que se apresentem com escotomas bilaterais sem explicagao e palidez do disco dptico. FIGURA 39.11 A atrofia dptica nio é um diagnéstico especifico, mas se refere & combinagao de palidez do disco éptico, estreitamento arteriolar e destruigao do feixe de fibras nervosas produzidos por diversas doengas oculares, particularmente as neuropatias épticas. Papiledema Esse termo descreve 0 edema bilateral do disco éptico causado por hipertenso intracraniana (Fig. 39.12). A cefaleia é um sintoma concomitante comum, mas no obrigatério. Todas as outras formas de edema do disco éptico (tais como 0 causado por neurite Sptica ou por neuropatia éptica isquémica) devem ser denominadas simplesmente “edema do disco éptico”. Trata-se de uma convengdo, mas que serve para evitar confusées. Muitas vezes, é dificil distinguir entre papiledema e outras formas de edema do disco éptico apenas com fundoscopia. Obscurecimento transitério da visdo é um sintoma clissico de papiledema. Ele pode ocorrer apenas em um dos olhos ou simultaneamente em ambos. Esse sintoma geralmente dura segundos, podendo persistir por mais tempo. E possivel que ocorram episédios de obscurecimento apés mudangas bruscas de posigo ou espontaneamente. Se esses episddios forem prolongados ou espontaneos, 0 papiledema ser mais perigoso. A acuidade visual s6 serd afetada pelo papiledema se ele for intenso, de longa durago ou acompanhado de edema macular e hemorragia. A campimetria revela aumento dos pontos cegos ¢ constriga0 periférica (Fig. 39.3F). No papiledema crénico, a perda visual periférica evolui insidiosamente, e 0 nervo éptico sofre atrofia. Nesse contexto, a redugdio do edema do disco éptico € um sinal funesto de que o nervo esté morrendo, ¢ ndo uma indicagao promissora de resolugao do papiledema. FIGURA 39.12 Pay a edema do disco éptico causado por elevagao na pressdo intracraniana. Esta jovem desenvolveu papiledema, com hemorragias e exsudatos algodonosos como efeito colateral raro do tratamento de acne com tetraciclina. Na investigagao de papiledema, hi necessidade de neuroimagem para excluir a presenga de lesdo intracraniana. A angiorressonancia magnética (ARM) é util em alguns casos para investigar oclusao dos seios venosos ou shunt arteriovenoso. Se os exames neurorradiolégicos forem negativos, deve-se medir a pressio liquorica subaracndidea por meio de pungao lombar. A pressao liquérica alta com liquido cerebrospinal normal aponta, por exclusio, para o diagnéstico de pseudotumor cerebral (hipertensao intracraniana idiopatica). A maioria dos pacientes é formada por mulheres jovens e obesas. O uso de inibidores da anidrase carbénica, como a acetazolamida, reduz a pressio intracraniana ao diminuir a produgdo de liquid cerebrospinal. A redugo do peso é vital: deve-se considerar indicar cirurgia baridtrica aos pacientes que no consigam perder peso com controle da dieta. Se a perda de visio for grave ou progressiva, deve-se proceder a um shunt imediatamente para prevengao de cegueira. Em alguns casos, a cegueira suibita, causada por papiledema fulminante, exige cirurgia de emergéncia. Drusas do disco éptico Sao depésitos refrativos dentro da substancia da cabeca do nervo dptico (Fig. 39.13). Nao tém relagaio com as drusas da retina, que ocorrem na degeneragdo macular relacionada com a idade. As drusas do disco éptico sao mais comuns em pessoas de descendéncia europeia setentrional. O diagndstico ¢ dbvio quando se detectam as drusas como particulas brilhantes sobre a superficie do disco 6ptico. No entanto, em muitos pacientes, as drusas situam-se abaixo da superficie, produzindo um pseudopapiledema. E importante reconhecer as drusas do disco éptico para evitar uma investigacdo desnecessaria de papiledema. A ultrassonografia (US) e a tomografia computadorizada (TC) sdo métodos sensiveis para a detecgdo de drusas ocultas, considerando que possuem calcio em sua composigao. Na maioria dos pacientes, esse ¢ um achado incidental e inécuo. No entanto, podem produzir obscurecimento visual em alguns casos. Na campimetria, formam pontos cegos aumentados e escotomas arqueados decorrentes de danos ao disco éptico. Com o envelhecimento, as drusas tendem a se tornar mais expostas na superficie do disco 4 medida que a atrofia éptica avanga. Hemorragia, membrana coroidal neovascular e NOIA sao mais frequentes em pacientes com drusas do disco dptico. Nao hd tratamento. FIGURA 39.13 As drusas do disco dptico so depésitos calcificados semelhantes a amoras no interior do disco éptico de etiologia desconhecida que causam “pseudopapiledema’ Degeneragio do vitree Ocorre em todos os individuos com o avangar da idade e produz sintomas visuais. Surgem opacidades no vitreo que formam sombras incémodas sobre a retina. Quando os olhos se movimentam, essas imagens “flutuantes” se movem em sincronia, porém com um pequeno retardo, causado pela inércia do gel vitreo. A tragdo do vitreo sobre a retina produz, um estimulo mecanico, que leva a percepgaio de clarées. Essa fotopsia é breve e monocular, diferentemente das cintilagdes bilaterais e prolongadas da enxaqueca cortical. A contragao do vitreo pode leva-lo a separar-se abruptamente da retina, evento precedido por assustadora chuva de imagens flutuantes e fotopsia. Tal processo, denominado descolamento do vitreo, € um evento degenerativo comum em idosos. Nao ¢ deletério a ndo ser que cause danos retina. Em qualquer paciente que se queixe de imagens flutuantes ou fotopsia, é importante uma cuidadosa fundoscopia, com dilatagdo, para a pesquisa de laceragées ou orificios na periferia. Se for encontrada uma lesio desse tipo, a aplicagao de laser poder impedir o descolamento da retina. Ocasionalmente uma lacerag&o provoca ruptura de um vaso sanguineo da retina causando hemorragia do vitreo com perda stibita de visto. Quando se tenta a oftalmoscopia, o fundo fica oculto por névoa sanguinea escura. Deve-se, entdo, examinar o interior do olho por meio de US para a pesquisa de laceragao ou descolamento da retina. Se a hemorragia no melhorar espontaneamente, pode-se remover o vitreo cirurgicamente. Também é possivel haver hemorragia vitrea a partir dos frégeis vasos neovasculares que proliferam sobre a superficie retiniana em pacientes portadores de diabetes melito, anemia falciforme ¢ outras doengas oculares isquémicas. Descolamento da retina Produz sintomas, como imagens flutuantes, clarées ¢ escotoma no campo visual periférico, na area correspondente ao descolamento (Fig. 39.14). Se 0 descolamento envolver a févea, haverd deficiéncia nos impulsos aferentes pupila e redugdo da acuidade visual. Na maioria dos casos, o descolamento da retina comega com um orificio, dobra ou laceragdo na retina periférica (descolamento regmatogénico da retina). Os pacientes que apresentam afinamento periférico da retina (degeneragao em treliga) séo especialmente vulneraveis a esse processo. Uma vez surgida uma falha na retina, 0 vitreo liquefeito entra pelo espago sub-retiniano e separa a retina do epitélio pigmentado. A combinagao do tracionamento da retina pelo vitreo com a entrada de liquido por tras da retina leva, inexoravelmente, ao descolamento. Os pacientes com histérico de miopia, traumatismo ou extragado de catarata sdo os que apresentam os maiores riscos de descolamento de retina. O diagnéstico é confirmado com o exame oftalmoscépico sob dilatagao. FIGURA 39.14 O descolamento da retina aparece como lamina elevada no tecido da retina com dobras. Neste paciente, a fovea foi poupada, de forma que a acuidade visual era normal, mas um descolamento inferior produziu escotoma superior. Enxaqueea classiea (Ver também Cap. 447.) Ocorre, em geral, associada a uma aura visual que dura cerca de 20 minutos. Na crise tipica, hé um pequeno distirbio no centro do campo visual que progride em diregdo a periferia, deixando atras um escotoma transitério. Na enxaqueca, o limite de expanséo do escotoma tem borda cintilante, oscilante ou em zigue-zague. Essa borda se assemelha as muralhas de uma cidade fortificada, dai a expresso espectro de fortificacdo. Os pacientes fornecem descrigdes diferentes do espectro de fortificagao, e € possivel que sejam confundidas com as da amaurose fugaz. Nos casos de enxaqueca, 0 sintoma geralmente tem maior duragao e é percebido nos dois olhos, enquanto, na amaurose fugaz, é mais breve e ocorre em apenas um olho. Os fenémenos relacionados com a enxaqueca continuam visiveis no escuro ou quando o paciente fecha os olhos. Em geral, ficam restritos ao hemicampo visual esquerdo ou direito, mas podem ocorrer nos dois campos ao mesmo tempo. Os pacientes muitas vezes tém histérico de crises estereotipadas. Na maioria dos pacientes, a cefaleia surge quando os sintomas visuais desaparecem. Ataques isquémicos transitérios A insuficiéncia vertebrobasilar pode causar sintomas visuais homénimos agudos. Muitos pacientes afirmam, erroneamente, ter sintomas no olho esquerdo ou no direito. Na verdade, esses sintomas afetam os hemicampos direito ou esquerdo dos dois olhos. A interrupgao da irrigagdo do cértex cerebral leva a um anuviamento ou acinzamento stibito da visdo, 4s vezes com luzes lampejantes ou outros fendmenos positivos similares aos da enxaqueca. Os ataques isquémicos corticais so mais breves que os da enxaqueca, ocorrem em pacientes mais idosos ¢ ndo provocam cefaleia. Podem estar associados a sinais de isquemia do tronco encefalico, tais como diplopia, vertigem, parestesia, fraqueza ou disartria. Acidente vascular encefalico Ocorre quando ha interrupgao prolongada da irrigagao sanguinea do cértex visual pela artéria cerebral posterior. Ao exame, 0 tinico achado é um defeito homénimo dos campos visuais, cujo limite coincide com 0 meridiano vertical. Em geral, 0 AVE do lobo occipital & causado por oclusdes trombéticas do sistema vertebrobasilar por émbolo ou dissecgdo. Outras causas comuns de perda visual cortical hemiandptica sio hemorragias lobares, tumores, abscessos ¢ malformagées arteriovenosas. Perda visual facticia (funcional, nio orgAnica) Ocorre em pacientes simuladores. Os iiltimos representam a grande maioria, que finge ter perdido a visio buscando simpatia, tratamento especial ou ganho financeiro. Suspeita-se de simulagao quando a historia é atipica, os achados fisicos esto ausentes ou sao contradit6rios, hd incongruéncias nos achados dos exames ou existe a perspectiva de ganhos secundarios. Nos EUA, onde sao abundantes os processos judiciais, a busca de beneficios fraudulentos levou a uma verdadeira epidemia de cegueira facticia. PERDA VISUAL CRONICA Catarata Consiste em opacificagao do cristalino em grau suficiente para reduzir a viséo. A maioria das cataratas tem evolugdo lenta, acompanhando o envelhecimento. Evolui mais rapidamente nos pacientes com histérico de traumatismo ocular, uveite ou diabetes melito. arias doengas genéticas, como a distrofia mioténica, neurofibromatose tipo 2 e galactosemia, podem levar a catarata. A radioterapia e os glicocorticoides podem ter, como efeito colateral, o surgimento de cataratas. Nesses casos, sua localizagao é subcapsular posterior. A catarata pode ser detectada pela auséncia do reflexo vermelho da luz do oftalmoscépio incidindo no fundo do olho ou pelo exame com lampada de fenda com dilatago pupilar. O tinico tratamento para a catarata é a extrago cirtirgica da lente opacificada. Milhées de cirurgias de catarata sao realizadas anualmente em todo o planeta. A operacdo geralmente ¢ feita com anestesia local em regime ambulatorial. Uma lente intraocular de plastico ou de silicone ¢ implantada na cépsula esvaziada do cristalino na camara posterior, como substituta da lente natural com recuperagao rapida da visdo. Mais de 95% dos pacientes que se submetem a extracdo da catarata tem melhora da visdo. Em alguns pacientes, a capsula da lente, que permanece no olho depois de extraida a catarata, eventualmente se opacifica, levando a uma perda secundaria na visdo. Para restaurar a claridade, faz-se uma pequena abertura com laser na capsula, denominada capsulotomia posterior. Glaucoma Trata-se de neuropatia éptica insidiosa e lentamente progressiva que geralmente esté associada 4 elevacdo crénica da pressdo intraocular. Depois da catarata, é a causa mais comum de cegueira em todo o mundo. E especialmente prevalente em afrodescendentes. Ndo se sabe por qual mecanismo a hipertensio intraocular danifica © nervo éptico. Os axénios que entram pelas areas temporais inferior e superior do disco s4o os primeiros a serem danificados, 0 que produz os tipicos escotomas arqueados (ou de feixes nervosos) A campimetria. Com a destruigdo das fibras, a borda neural do disco éptico se retrai, e sua escavagio fisiolégica aumenta (Big. 39.15). Esse processo & denominado “escavagdo” patolégica. A razio escavagio/disco € expressa como uma fragdo (p. ex., 0,2). A razio escavagao/disco varia amplamente em individuos normais, 0 que dificulta o diagnéstico de glaucoma pela simples observagdo de escavacdo éptica incomumente grande ou profunda. O cuidadoso registro dos resultados de exames seriados pode ser util. Nos pacientes em que a escavagao é fisiolégica, ela se mantém estavel, enquanto, naqueles portadores de glaucoma, ela aumenta inexoravelmente ao longo dos anos. A observagiio de aumento progressivo da escavago ¢ a detecgdo de escotoma arqueado ou de degrau nasal na campimetria computadorizada so suficientes para firmar o diagnéstico de glaucoma. A tomografia de coeréncia éptica revela perda correspondente de fibras ao longo das vias arqueadas na camada de fibras nervosas. FIGURA 39.15 O glaucoma resulta em “escavagao” medida que a borda neural é destruida, e a escavagao central vai se alargando ¢ se tornando mais profunda, A razao escavagdo/disco neste paciente € de cerca de 0,8. Cerca de 95% dos pacientes com glaucoma apresenta Angulo aberto da cdmara anterior. Nos individuos mais afetados, a pressdo intraocular esta elevada. Nao sdo conhecidas as causas da hipertensao intraocular, mas, nas formas hereditarias, ha associagdo com mutagées genéticas. Surpreendentemente, um tergo dos pacientes com glaucoma de Angulo aberto apresenta pressdo intraocular dentro da variago normal de 10-20 mmHg. Para essa forma, assim chamada glaucoma com presséo normal ou baixa, a miopia elevada ¢ fator de risco. Os glaucomas crénicos de Angulo fechado e de Angulo aberto geralmente sdo assintomdticos. Apenas 0 glaucoma agudo de angulo fechado causa hiperemia ou dor ocular, em razio da elevagao abrupta da pressdo intraocular. Em todas as formas de glaucoma, a acuidade da fovea é poupada até os estagios finais da doenca. Por esses motivos, é possivel haver danos graves ¢ irreversiveis antes que paciente ou médico identifiquem 0 problema. Assim, ¢ de vital importancia proceder ao rastreamento de pacientes para glaucoma avaliando-se a azo escavagaio/disco e medindo-se a pressio intraocular. O tratamento do glaucoma é feito com uso topico de agonistas adrenérgicos € colinérgicos, betabloqueadores e andlogos das prostaglandinas. Em alguns casos, a absorgao sistémica dos betabloqueadores a partir do uso de colirios pode ser suficiente para causar efeitos colaterais, como bradicardia, hipotens’o, bloqueio de ramo, broncospasmo e depressiio. Os inibidores da anidrase carbénica, topicos ou orais, so usados para diminuir a pressao intraocular por meio da redugdo da produgao de humor aquoso. O tratamento da malha trabecular do Angulo da cdmara anterior com laser melhora a drenagem ocular do humor aquoso. Se os tratamentos clinicos ¢ a laser niio conseguirem deter os danos ao nervo éptico provocados pelo glaucoma, a conduta deverd ser a construgio cirdrgica de um filtro (trabeculectomia) ou a instalagao de um dispositive de drenagem para 0 escoamento de de humor aquoso do olho de maneira controlada. Degeneragio macular Nos pacientes idosos, esta é uma causa importante da perda gradual, indolor e bilateral da visao central. Ocorre nas formas ndo exsudativa (seca) e exsudativa (iimida). A inflamago pode ser importante em ambas as formas de degeneragdo macular; a suscetibilidade esté associada a variagdes no gene que codifica © fator H do complemento, um inibidor da via alternativa do complemento. O processo nao exsudativo se inicia com o acimulo de depdsitos extracelulares, denominados drusas, sob 0 epitélio pigmentar da retina. Na oftalmoscopia, esses depésitos sao pleomérficos, mas geralmente aparecem como pequenas lesées amarelas isoladas agrupadas na macula (Fig. 39.16). Com o tempo, tornam-se maiores, mais numerosos € tendem a confluir. O epitélio pigmentar da retina fica atréfico e passa a apresentar descolamentos focais, 0 que interfere na fungéo dos fotorreceptores, levando a perda visual. O tratamento feito com as vitaminas C e¢ E, betacaroteno e zinco pode retardar a degeneragdio macular seca. FIGURA 39.16 A degeneragao macular relacionada com a idade consiste em drusas amarelas distribuidas na macula (forma seca) e de um crescente de hemorragia temporal a fovea com origem na membrana neovascular sub-retiniana (forma exsudativa). A degeneragao macular exsudativa, que responde pela minoria desses casos, ocorre quando vasos neovasculares da coroide crescem, passando por falhas na membrana de Bruch, ¢ proliferam sob o epitélio pigmentado da retina ou sob a retina. O vazamento a partir desses vasos produz elevagdo da retina, com distorgdes (metamorfopsia) e turvago da visio. Embora a instalagéo dos sintomas geralmente seja gradual, o sangramento a partir da membrana sub-retiniana coroidal neovascular as vezes causa perda visual aguda. As membranas neovasculares podem ser dificeis de serem visualizadas ao exame fundoscépico, uma vez que se encontram sob a retina. A angiografia com fluoresceina e a tomografia de coeréncia éptica, uma técnica para adquirir imagens da retina em corte transversal, sdo extremamente titeis para a deteccdo. Hemorragias volumosas ou repetidas sob a retina a partir de membranas neovasculares resultam em fibrose, desenvolvimento de cicatriz macular redonda (em forma de disco) e perda permanente da visao central. Houve um grande avango terapéutico com a descoberta de que a degeneracao macular exsudativa poderia ser tratada com injegdo intraocular de antagonistas do fator de crescimento do endotélio vascular. Administra-se bevacizumabe, ranibizumabe ou aflibercepte por meio de injegdo direta na cavidade vitrea, inicialmente com frequéncia mensal. Esses anticorpos produzem regressio das membranas neovasculares, bloqueando a agao do fator de crescimento do endotélio vascular e, consequentemente, melhoram a acuidade visual. Coriorretinopatia serosa central Essa doenga acomete principalmente homens entre 20 © 50 anos de idade. O extravasamento de liquido seroso a partir da coroide causa pequenos descolamentos localizados no epitélio pigmentado da retina e na retina neurossensorial, Esses descolamentos, ao atingir a macula, produzem sintomas agudos ou crénicos de metamorfopsia e turvamento da visio. Sao dificeis de serem vistos & oftalmoscopia direta, pois a retina descolada é transparente, ¢ a elevagiio, pequena. A tomografia de coeréncia éptica revela a presenga de liquido sob a retina ¢ a angiografia com fluoresceina demonstra fluxo do corante para o espago sub-retiniano. Nao se sabe a causa da coriorretinopatia serosa central. Os sintomas poderdo ceder espontaneamente se a retina readerir, mas ¢ comum a recorréncia do descolamento. A fotocoagulago a laser tem sido benéfica em alguns casos. Retinopatia diabética Doenga considerada rara até 1921, quando a descoberta da insulina levou a melhora radical na expectativa de vida dos pacientes com diabetes melito, Atualmente, a retinopatia do diabetes é uma das causas mais importantes de cegueira nos EUA. A retinopatia leva anos para se desenvolver, mas acaba por surgir em quase todos os casos. A vigilancia regular, feita por meio de fundoscopia com dilatagao da pupila, ¢ vital em todos os pacientes diabéticos. Na retinopatia diabética avangada, a proliferagaio de vasos neovasculares leva 4 cegueira por hemorragia vitrea, descolamento da retina glaucoma (Fig. 39.17). Na maioria dos pacientes, é possivel evitar essas complicagdes com o uso de fotocoagulagao a laser panretiniana no momento apropriado da evolugdo da doenga, Para uma discussie mais ampla acerea das manifestagées e do tratamento da retinopatia diabética, ver os Capitulos 417, 4 18 ¢ 419. FIGURA 39.17 Retinopatia proliferativa do diabético em homem de 25 anos de idade ¢ historia de 18 anos de diabetes melito, com neovascularizagao originada no disco 6ptico, hemorragia de retina e vitreo, exsudatos algodonosos e exsudato na macula. As manchas redondas na periferia representam fotocoagulacao panretiniana recentemente aplicada. Retinite pigmentosa Trata-se de termo geral utilizado para designar um grupo diverso de distrofias dos cones ¢ bastonetes caracterizadas por cegueira noturna progressiva, constrigao dos campos visuais com escotoma em anel, perda de acuidade e alteragdes ao eletrorretinograma (ERG). Existem formas autossémicas recessivas, dominantes, ligadas ao X e esporddicas. O nome da doenga tem origem nos depésitos negros ¢ irregulares de grumos de pigmento na retina periférica, denominados espiculas ésseas, dada a sua semelhanga com as espiculas do osso esponjoso (Fig. 39.18). A denominagdo é imprépria, uma vez que a retinite pigmentosa ndo é um processo inflamatério. A maioria dos casos deve-se a uma mutagao do gene da rodopsina (0 fotopigmento do bastonete) ou do gene da periferina, uma glicoproteina localizada nos segmentos externos dos fotorreceptores. A vitamina A (15.000 Ul/dia) retarda um pouco a piora do ERG em pacientes com retinite pigmentosa, mas nao produz beneficios na acuidade ou nos campos visuais. FIGURA 39.18 Retinite pigmentosa com depésitos de pigmento negro conhecidos como “espiculas ésseas”. O paciente apresentava perda de visdo periférica com preservacdo da visdo central (macular). A amaurose congénita de Leber, uma rara distrofia de cones, tem sido tratada com reposigao da proteina RPE6S faltante por meio de terapia génica, com melhora discreta na fungdo visual. Existem formas de retinite pigmentosa associadas a doengas hereditarias sistémicas raras, como a degeneragdio olivopontinocerebelar, doenga de Bassen-Kornaweig, sindrome de Kearns-Sayre e doenga de Refsum. O uso prolongado de cloroquina, hidroxicloroquina e fenotiazinicos (sobretudo a tioridazina) pode causar uma retinopatia t6xica semelhante a retinite pigmentosa com perda da visio. Membrana epirretiniana Trata-se de um tecido fibrocelular que cresce na superficie interna da retina, distorcendo a mAcula e causando metamorfopsia além de redugdio da acuidade visual. Ao exame da retina, vé-se a membrana enrugada, de aspecto semelhante a celofane. A membrana epirretiniana ¢ mais comum em pacientes com mais, de 50 anos, sendo geralmente unilateral. A maioria dos casos ¢ idiopdtica, mas alguns so causados por retinopatia hipertensiva, diabetes melito, descolamento da retina ou traumatismo. Quando a acuidade visual chega a um nivel em torno de 6/24 (20/80), recomendam-se vitrectomia e peeling cirtrgico da membrana para reduzir 0 enrugamento da macula. A contrago de membrana epirretiniana as vezes produz um buraco macular. No entanto, a maioria desses buracos é causada por tragao local do vitreo dentro da fovea. Em alguns casos, a vitrectomia melhora a acuidade visual. Melanoma ¢ outros tumores O melanoma é o tumor ocular primério mais comum (Fig. 39.19). Causa fotopsia, escotoma progressivo e perda da visto. Um melanoma pequeno é muitas vezes dificil de diferenciar de um nevo coroidal benigno. A comprovagao de padrao de crescimento maligno requer exames seriados. O tratamento do melanoma é controverso. Algumas das opgdes sio enucleagio, ressec¢ao local e irradiagao. Os tumores oculares metastaticos sao mais comuns que os tumores oculares primarios. Os carcinomas de pulmao e mama sao especialmente propensos a se disseminarem para a coroide e a iris. A invasio dos tecidos oculares por leucemias e linfomas também é comum. As vezes, 0 tinico sinal ao exame do olho sao restos celulares no vitreo, que podem ter o mesmo aspecto da uveite posterior crénica. Tumores retrobulbares do nervo 6ptico (meningioma, glioma) ou tumores quiasmdticos (adenoma hipofisario, meningioma) produzem perda progressiva da visio com poucos achados objetivos, exceto a palidez do disco éptico. Raramente, a stibita expansio de adenoma hipofisdrio causada por infarto e sangramento (apoplexia hipofisdria) leva a perda visual retrobulbar aguda, com cefaleia, ndusea ¢ paralisia dos nervos motores oculares. Em todos os pacientes que se queixam de diminuigdo do campo visual ou atrofia éptica, deverd ser considerada a necessidade de TC ou RM se a causa nao for descoberta apés cuidadosa revisdo da hist6ria e exame oftalmolégico meticuloso. FIGURA 39.19 O melanoma da coroide aparece como massa elevada e escura no fundo inferior, com hemorragia sobrejacente. A linha negra indica o plano do exame de tomografia de coeréneia éptica (abaixo), revelando o tumor sub-retiniano. PROPTOSE Quando os globos oculares parecerem assimétricos, o médico deverd avaliar, inicialmente, qual dos olhos encontra-se anormal. Um dos olhos est recolhido dentro da érbita (enoftalmia) ou é 0 outro que se encontra saliente (exoftalmia ou proptose)? Um globo ocular pequeno ou a sindrome de Horner podem conferir 0 aspecto de enoftalmia. A enoftalmia verdadeira ocorre apés traumatismo, por atrofia da gordura retrobulbar ou fratura do soalho da érbita. O exoftalmémetro de Hertel, instrumento portatil que mede a posigao da superficie anterior da cérnea em relagao a borda lateral da érbita, possibilita que seja medida a posigtio dos olhos dentro das érbitas. Na auséncia desse instrumento, é possivel avaliar a posigao relativa dos olhos pedindo-se ao paciente que incline a cabega para frente ¢ observando as érbitas de cima. Nessa posigaio, é possivel detectar uma proptose monocular de apenas 2 mm. A proptose sugere lesdo expansiva dentro da rbita e geralmente justifica o exame por TC ou RM. Oftalmopatia de Graves E a principal causa da proptose em adultos (Cap. 405). A proptose & muitas vezes assimétrica e pode até parecer unilateral. A inflamagdo orbital © o ingurgitamento dos misculos extraoculares, sobretudo do reto medial ¢ do reto inferior, causam a protrusdo do globo. Outros sintomas importantes sdo exposig’io da cérnea, retragdo das palpebras, hiperemia conjuntival, restrig4o da mobilidade ocular, diplopia e perda de acuidade visual por compressio do nervo éptico. A oftalmopatia de Graves é um diagnéstico clinico, mas alguns exames complementares podem ser liteis. O nivel sérico da imunoglobulina estimulante da tireoide frequentemente est elevado. Os exames de imagem da érbita geralmente revelam aumento dos miisculos extraoculares, mas isso ndo € obrigatério. A oftalmopatia de Graves pode ser tratada com prednisona oral (60 mg/dia) durante 1 més, com retirada progressiva por varios meses a partir de entdo. E comum haver piora dos sintomas com a retirada do glicocorticoide. Lubrificantes tépicos, fechamento das palpebras durante a noite, uso de cAmaras timidas ¢ cirurgia palpebral sd meios utilizados para reduzir a exposigao dos tecidos oculares. A radioterapia nfo é efetiva. Em caso de exoftalmia grave e sintomatica ou de redugdo da fungdo visual em razdo de compressao do nervo éptico, deve-se proceder 4 descompressao da érbita. Nos pacientes com diplopia, 0 uso de prisma ou a cirurgia da musculatura ocular podem ser usados para restaurar 0 alinhamento ocular na posigao primaria do olhar. Pseudotumor orbital Trata-se de sindrome inflamatéria idiopatica da drbita diferenciada da oftalmopatia de Graves pela queixa destacada de dor. Outros sintomas sdo ptose, proptose e congestio da érbita. A investigagio para sarcoidose, granulomatose com poliangeite e outros tipos de vasculite da drbita ou doenga do colégeno é negativa. Os exames radiolégicos muitas vezes revelam edema dos misculos oculares (miosite orbital) com aumento dos tenddes. Na oftalmopatia de Graves, geralmente ndo ha alteracio nos tendées dos miisculos oculares. A sindrome de Tolosa-Hunt (Cap. 455) pode ser considerada como uma extensfio de pseudotumor orbital passando pela fissura orbital superior até 0 seio cavernoso. O diagnéstico de pseudotumor orbital é dificil. A biépsia da érbita muitas vezes rende apenas achados inespecificos, como infiltragao da gordura por linfécitos, plasmécitos ¢ cosinéfilos. Uma resposta impressionante ao tratamento empirico com glicocorticoides é, indiretamente, o melhor meio de comprovar o diagnéstico, Celulite orbital A celulite orbital causa dor, eritema palpebral, proptose, quemose conjuntival, mobilidade restrita, acuidade reduzida, defeito pupilar aferente, febre e leucocitose. Surge com frequéncia nos scios paranasais. Uma causa comum é a disseminagdo por contiguidade de infec¢des do seio etmoidal por meio da lamina papiracea da érbita medial. Historia recente de infecgdes do trato respiratério superior, secregdes mucosas espessas ou doenca dentdria sdo dados significativos quando hi suspeita de celulite orbital. Devem-se obter hemoculturas, embora com frequéncia sejam negativas. A maioria dos pacientes responde bem A antibioticoterapia empirica de amplo espectro por via IV. Ocasionalmente, a celulite orbital evolui de forma fulminante, com proptose maciga, cegueira, trombose séptica do seio cavernoso e meningite. Para evitar esse desastre, a doenga deve ser tratada precocemente e de forma agressiva, com exames de imagem da érbita e antibioticoterapia imediata com cobertura para Staphylococcus aureus resistente 4 meticilina (MRSA). Se a fungdo do nervo éptico continuar se deteriorando a despeito da antibioticoterapia, ha indicagdo para drenagem cirirgica imediata de abscesso orbital ou de rinossinusite paranasal. Tumores Os tumores da érbita causam proptose progressiva ¢ indolor. Os tumores primérios mais comuns sio hemangioma cavernoso, linfangioma, neurofibroma, schwannoma, cisto dermoide, carcinoma adenoide cistico, glioma do nervo éptico, meningioma do nervo éptico e tumor misto benigno da glandula lacrimal. As metstases para a drbita sdo frequentes nos carcinomas de mama e de pulmiio, bem como no linfoma. Com o diagnéstico por pungao com agulha fina, seguido de radioterapia urgente, algumas vezes é possivel preservar a visao. Fistulas carotidocavernosas Essas fistulas, ao drenarem anteriormente através da 6rbita, causam proptose, diplopia, glaucoma e vasos conjuntivais arterializados em saca-rolhas. A causa mais comum das fistulas diretas ¢ 0 traumatismo. O diagnéstico é facil em razio dos sinais eloquentes produzidos pelo shunt com fluxo de alto débito pressao elevada. As fistulas indiretas, ou malformagées arteriovenosas da dura-mater, surgem geralmente de maneira espontanea, sendo mais comuns em mulheres idosas. Seus sinais sio mais sutis, ¢ os erros de diagnéstico, frequentes. A combinagao de proptose leve, diplopia, aumento dos misculos e hiperemia ocular leva muitas vezes a um diagnéstico erréneo de oftalmopatia tiredidea. A presenga de sopro, auscultado na cabeca ou descrito pelo paciente, é uma pista diagndstica importante. Os exames de imagem revelam aumento da veia oftalmica superior dentro da drbita. Os shunts carotidocavernosos podem ser eliminados com embolizagao intravascular. PTOSE Blefaroptose Trata-se de queda anormal da palpebra. A ptose, uni ou bilateral, pode ser congénita e causada por disgenesia do levantador da pdlpebra superior ou por insergao anémala de sua aponeurose na palpebra. A ptose adquirida pode ter uma evolugo tao insidiosa que o paciente nao percebe o problema. O exame de fotografias antigas ajuda a determinar a época em que o problema se iniciou, Na anamnese, devem- se procurar antecedentes de traumatismo, cirurgia ocular, uso de lentes de contato, diplopia, sintomas sistémicos (p. ex., disfagia ou fraqueza muscular periférica) ou historia familiar de ptose. Uma ptose flutuante que piora no final do dia caracteristica da miastenia gravis. Ao exame fisico, devem-se pesquisar evidéncias de proptose, massas ou deformidades palpebrais, inflamagao, anisocoria ou perda de mobilidade. Para determinar grau de ptose, mede-se a largura das fissuras palpebrais com 0 paciente na posigao priméria do olhar. O grau de ptose sera subestimado se o paciente procurar compensar levantando as sobrancelhas com o misculo frontal. Ptose mecdnica Ocorre em muitos pacientes idosos em razio de estiramento ¢ redundancia da pele das palpebras bem como da gordura subcuténea (dermatocalase). O peso desses tecidos redundantes leva 4 queda da palpebra. O aumento ou a deformagao da palpebra por infecgio, tumor, traumatismo ou inflamagdo também causam ptose puramente mecénica. Ptose aponeurética Consiste em deiscéncia adquirida ou estiramento do tendao aponeurético que liga o misculo levantador a lamina tarsal da pdlpebra. Mais comum em pacientes idosos, aparentemente € causada pela diminuigdo da elasticidade do tecido conectivo. A ptose aponeurética também constitui sequela comum do edema palpebral causado por infeccdo ou traumatismo contundente da pdlpebra, cirurgia de catarata ou uso de lentes de contato. Ptose miog@nica Entre as causas de ptose miogénica estio a miastenia gravis (Cap. 4 61) ¢ algumas miopatias raras que se manifestam com ptose. O termo oftalmoplegia externa crénica progressiva refere-se a uma série de doengas sistémicas causadas por mutagdes do DNA mitocondrial. Como o nome indica, os achados mais comuns sao ptose simétrica de progressdo lenta e limitagdo da mobilidade ocular. A diplopia é geralmente tardia, pois a redugdio dos movimentos oculares ¢ simétrica, Na variante da doenga de Kearns-Sayre, ha alteragdes na pigmentagao da retina e anomalias da condugio cardiaca. A bidpsia de musculos periféricos mostra as tipicas “fibras vermelhas rotas”, A distrofia oculofaringea ¢ uma doenga autossémica dominante distinta que se inicia na meia-idade, caracterizada por ptose, limitagao dos movimentos oculares e disfagia. A distrofia mioténica, outra doenga autossémica dominante, causa ptose, oftalmoparesia, catarata e retinopatia pigmentar. Os pacientes apresentam perda de massa muscular, miotonia, alopecia frontal e anormalidades cardiacas. Ptose neurogénica Resulta de lesées que afetam a inervagio de qualquer dos dois misculos que elevam a palpebra: 0 musculo de Miller ou o levantador da palpebra superior. O exame da pupila ajuda a distinguir entre essas duas possibilidades, Na sindrome de Horner, a pupila do olho com ptose fica menor, e os movimentos oculares esto mantidos, Na paralisia do nervo oculomotor, a pupila do olho com ptose encontra-se normal ou aumentada, Se a pupila estiver normal, mas houver limitagao da adugdio, da elevagiio ¢ da depressao, é provavel que haja paralisia do oculomotor sem acometimento da pupila (ver adiante). Raramente, uma lesdo do pequeno subnticleo central do complexo oculomotor causa ptose bilateral com movimentos oculares pupilas normais. VISAO DUPLA (DIPLOPIA) A primeira pesquisa a ser realizada é se a diplopia persiste em um dos olhos quando 0 outro é coberto. Caso positivo, o diagnéstico € diplopia monocular. A causa geralmente é intrinseca ao olho e, portanto, ndo ha implicagdes nefastas para o paciente. Algumas causas de diplopia monocular so aberragdes da cérnea (p. ex., ceratocone e pterigio), erros de refracdo nao corrigidos, catarata ¢ tragio da fovea. As vezes, trata-se de um sintoma de simulag%o ou uma doenga psiquidtrica. A diplopia que desaparece ao cobrir um dos olhos é chamada diplopia binocular, sendo causada por alteragdes do alinhamento ocular. Deve-se perguntar ao paciente sobre a natureza do sintoma (se 0 deslocamento da imagem é apenas lateral ou se também tem um componente vertical), 0 modo de inicio, a duragao, a intermiténcia, a variag3o durante 0 dia e os sintomas neuroldgicos ou sistémicos associados. Se o paciente manifestar diplopia durante a consulta, o exame da mobilidade ocular deverd revelar a deficiéneia que corresponda aos sintomas do paciente. No entanto, pequenas deficiéncias da movimentagao ocular podem ser dificeis de se detectarem. Por exemplo, a mobilidade ocular de um paciente que tem paresia leve do nervo abducente pode parecer normal, embora o individuo manifeste diplopia horizontal ao olhar para a esquerda. Em tal situacdo, o teste de cobertura é um método mais sensivel para avaliar o mau alinhamento ocular. Esse teste deve ser feito primeiro com o paciente na posigao primaria do olhar e, depois, com a cabega virada e inclinada em cada diregdo. No exemplo anterior, o teste de cobertura com a cabega virada para a direita maximiza o deslocamento da fixagao produzido pelo teste. As vezes, durante exame de rotina, encontram-se desvios oculares em pacientes assintomaticos. Se os movimentos oculares estiverem normais, e 0 desalinhamento ocular for igual em todas as diregdes do olhar (desvio concomitante), o diagnéstico ser estrabismo. Nessa doenga, que acomete 1% da populagao, a fusdo é interrompida na primeira infancia. Para evitar diplopia, a visdo é suprimida no olho incapaz de fixar. Em algumas criangas, isso leva a prejuizo da visio (ambliopia ou olho “preguigoso”) no olho desviado. Ha varias causas de diplopia binocular: infecciosas, neoplasicas, metabélicas, degenerativas, inflamatorias e vasculares. E preciso determinar se a diplopia é de origem neurogénica ou causada por restrigées da rotagdo do globo ocular decorrentes de doengas locais na érbita. Pseudotumor orbital, miosite, infecc¢4o, tumores, doenca tiredidea e pingamento da musculatura (p. ex., na fratura do soalho da érbita) causam diplopia restritiva. O diagnéstico de restrigaio em geral é feito pelo reconhecimento de outros sinais e sintomas associados de doenga orbital local. A nao realizagéo de imagem de alta resolugao da érbita é um equivoco comum na investigagao de diplopia. Miastenia gravis (Ver também Cap. 461.) Trata-se da principal causa de diplopia. A diplopia, muitas vezes, é intermitente, varidvel e no se restringe a uma tnica distribuigdo de nervos motores oculares. As pupilas sempre esto normais. Pode haver também ptose flutuante. Muitos pacientes apresentam uma forma exclusivamente ocular da doenga, sem sinais de fraqueza muscular sistémica. O diagnéstico pode ser confirmado por injegdo IV de edrofénio, que produz reversao transitéria da fraqueza palpebral ou da musculatura ocular. Os testes sanguineos para anticorpos contra o receptor da acetilcolina ou antiproteina MuSK estabelecem diagnéstico, mas os testes sdo frequentemente negativos na forma puramente ocular da miastenia gravis. O botulismo, por intoxicagao alimentar ou por ferimentos, pode simular miastenia ocular. Tendo sido excluidas as possibilidades de doenga orbital restritiva ¢ de miastenia gravis, a causa mais provavel para diplopia binocular é lesdo de um dos nervos cranianos que suprem os misculos extraoculares. Nervo oculomotor © terceiro nervo craniano inerva os retos medial, inferior superior, o obliquo inferior, o levantador da palpebra superior ¢ 0 esfincter da iris. A paralisia total do nervo oculomotor causa ptose, midriase ¢ deixa o olho desviado “para baixo e para fora”, em razo da aco sem oposigao do reto lateral e do obliquo superior. Com essa combinagdo de achados, o diagnéstico é dbvio. Mais dificil é 0 diagnéstico de paralisia inicial ou parcial do nervo oculomotor. Nesse quadro, é possivel haver qualquer combinagdo de ptose, dilatagdo pupilar e fraqueza dos misculos oculares inervados pelo nervo oculomotor. Devenrse fazer exames seriados frequentes durante a fase evolutiva da paralisia para que o diagndstico nao passe despercebido. O surgimento de paralisia do nervo oculomotor com acometimento pupilar, especialmente quando acompanhada de dor, sugere lesdo compressiva, como um tumor ou ancurisma no poligono de Willis. Nesses casos, & necessério solicitar exames de neuroimagem, além de angiografia por TC e RM. Em algumas ocasides, faz- se necessaria a angiografia com cateter para se excluir a possibilidade de ancurisma. A lesio do nicleo do oculomotor, situado no mesencéfalo rostral, produz. sinais diferentes dos encontrados nos casos de lesdo do nervo. Ocorre ptose bilateral, pois 0 musculo levantador ¢ inervado por um tnico subnicleo central. Ha também perda de forga do reto superior contralateral, uma vez que 0 miisculo € inervado pelo nicleo oculomotor contralateral. As vezes, ha perda de forga motora nos dois retos superiores A paralisia isolada no niicleo oculomotor é rara. O exame neurolégico geralmente revela outros sinais de les%io do tronco encefilico por infarto, hemorragia, tumor ou infecgao. As lesdes nas estruturas que circundam os fasciculos do nervo oculomotor e que descem pelo mesencéfalo deram origem a uma série de epdnimos classicos. Na sindrome de Nothnagel, a lesio do pedinculo cerebelar superior produz paralisia oculomotora ipsilateral com ataxia cerebelar contralateral. Na sindrome de Benedikt, a lesio do nucleo rubro causa paralisia oculomotora ipsilateral com tremor, coreia e atetose contralaterais. A sindrome de Claude & a combinagao das duas sindromes anteriores, pois ha lestio simultinea do niicleo rubro e peduinculo cerebelar superior. Finalmente, na sindrome de Weber, a \esio do pedinculo cerebral causa paralisia oculomotora ipsilateral com hemiparesia contralateral. No espaco subaracnéideo, 0 nervo oculomotor pode ser lesionado por aneurismas, meningite, tumores, infarto e compressa. Na herniacao cerebral, 0 nervo fica preso entre a borda tentorial e o processo unciforme do lobo temporal. Durante a herniagao, a torgdo do mesencéfalo e as hemorragias associadas também podem causar paralisia oculomotora. No seio cavernoso, a paralisia oculomotora origina-se de aneurisma carético, fistula carotidocavernosa, trombose do seio cavernoso, tumor (adenoma hipofisario, meningioma, metastases), infecgao por herpes-zéster e sindrome de Tolosa- Hunt. A etiologia de uma paralisia oculomotora isolada com pupila normal muitas vezes ndo é esclarecida mesmo apés neuroimagem e pesquisa laboratorial extensa. Acredita- se que a maioria dos casos decorra de infartos microvasculares do nervo em algum ponto do seu trajeto do tronco encefiilico até a érbita. O paciente costuma se queixar de dor. Diabetes melito, hipertensdo arterial e doengas vasculares so fatores de risco importantes. A recuperagdo espontinea, que ocorre ao longo de meses, & a regra. Se nio houver recuperag4o ou surgirem novos sinais ou sintomas, 0 diagnéstico de paralisia oculomotora microvascular deve ser reavaliado. Quando ha les%io do nervo oculomotor por traumatismo ou compressdo (tumor, aneurisma), ¢ comum haver regeneragaio aberrante. A conexdo errénea das fibras que inervam os musculos levantador e retos produz elevagiio da palpebra quando o paciente realiza adug%io do globo ou quando olha para baixo. A pupila também se contrai A tentativa de aducdo, elevagdo ou depressio do globo. A regeneragdo aberrante nio & encontrada apés paralisia oculomotora por infarto microvascular e, portanto, sua ocorréncia invalida esse diagnéstico. Nervo troclear O quarto nervo craniano se origina no tronco encefilico © é ligeiramente caudal na sua relago com 0 complexo do nervo oculomotor. As fibras saem pelo dorso do tronco encefilico e cruzam para inervar o obliquo superior contralateral. As ages mais importantes do miisculo sao baixar e fazer convergir os globos oculares. Por isso, a paralisia produz hipertropia e exciclotorgao. A ciclotorgao raramente € notada pelos pacientes. Eles se queixam de diplopia vertical, principalmente quando leem ou quando olham para baixo. A inclinagdo da cabega para 0 lado da paralisia também exacerba a diplopia vertical, ¢ a inclinagiio para 0 outro lado a alivia, Esse teste de inclinagao da cabega é uma manobra vital para o diagnéstico. Todas as ctiologias anteriormente descritas, exceto o ancurisma, para a paralisia oculomotora também se aplicam & paralisia isolada no nervo troclear, O nervo troclear é especialmente propenso a lesdes apés traumatismo craniano fechado. Acredita-se que a borda livre do tentério comprima o nervo quando a cabeca é golpeada e ha concusstio. A maioria dos casos de paralisia isolada do nervo troclear é idiopatica. O diagnéstico de paralisia “microvascular” acaba sendo feito por exclusdo. Na maioria dos pacientes, hd melhora esponténea ao longo de meses. Um prisma com a base para baixo (que pode ser colado aos éculos dos pacientes como uma lente de Fresnel destacdvel) pode aliviar temporariamente a diplopia. Se a paralisia no melhorar, os olhos poderao ser realinhados, enfraquecendo o musculo obliquo inferior. Nervo abducente O sexto nervo craniano inerva 0 misculo reto lateral. A paralisia desse nervo produz diplopia horizontal, que piora quando o paciente olha para o lado da lesio. Uma lesio nuclear produz sinais e sintomas diferentes, pois 0 nucleo abducente contém interneurénios que percorrem o fasciculo longitudinal medial até o subnticleo do reto medial do complexo oculomotor contralateral. Assim, a lesdo nuclear do abducente produz paralisia completa do olhar lateral por fraqueza dos miisculos reto lateral ipsilateral ¢ reto medial contralateral. A sindrome de Foville ¢ causada por lesdes dorsais da ponte e tem como sintomas paralisia do olhar lateral, paralisia facial ipsilateral e hemiparesia contralateral, causada por danos as fibras corticospinais descendentes. A sindrome de Millard-Gubler, causada por lesdes ventrais da ponte, é idéntica, exceto pelos achados oculares. Nessa sindrome, ha apenas fraqueza do reto lateral, ¢ nao paralisia do olhar, pois ocorre lesdo do fasciculo abducente, ¢ nao do nicleo, As etiologias mais comuns para a paralisia do abducente ao nivel do tronco encefilico so infarto, tumor, hemorragia, malformagao vascular e esclerose multipla. Apés deixar a ponte ventral, 0 nervo abducente avanga no sentido anterior ao longo do clivo, perfura a dura-méter na altura do dpice petroso e entra no seio cavernoso. Em seu trajeto subaracnéideo, é suscetivel a meningite, tumores (meningioma, cordoma, meningite carcinomatosa), hemorragia subaracnéidea, traumatismo e compressao por aneurismas ou vasos dolicoectisicos. No dpice petroso, a mastoidite pode causar surdez, dor ¢ paralisia ipsilateral do abducente (sindrome de Gradenigo). No seio cavernoso, 0 abducente pode ser atingido por aneurisma da carétida, fistula carotidocavernosa, tumores (adenoma hipofisério, meningioma, carcinoma nasofaringeo), infecgdes herpéticas ¢ sindrome de Tolosa-Hunt. A paralisia uni ow bilateral do abducente é um sinal classico de hipertensao intracraniana, A visualizagiio de papiledema a fundoscopia confirma o diagnéstico. O mecanismo da paralisia ainda é controverso, mas a causa parece ser 0 deslocamento rostrocaudal do tronco encefilico. Esse mesmo fenémeno explica a paralisia do abducente por malformagao de Chiari ou por queda da pressdo intracraniana (p. ex., apés pungio lombar, raquianestesia ou extravasamento dural espontineo de liquid cerebrospinal). O tratamento da paralisia do abducente visa a rapida corregaio da causa subjacente. No entanto, a causa priméria muitas vezes permanece obscura mesmo apés cuidadosas investigagées. Assim como nos casos descritos anteriormente de paralisias oculomotora ou troclear isoladas, acredita-se que a maioria dos casos seja causada por infartos microvasculares, porque ¢ comum a presenga de diabetes melito ou de outros fatores de risco vasculares. Em alguns casos, pode haver mononeurite pés-infecciosa (p. ex., apés influenza). A cobertura de um dos olhos com tampao ou lente ou 0 uso de prisma aliviam a diplopia até que a paralisia melhore. Se a recuperagdo for incompleta, a cirurgia da musculatura ocular quase sempre conseguir realinhar os olhos, pelo menos em sua posigao priméria. Nos pacientes que apresentem paralisia do abducente sem melhora espontinea, deve-se procurar por etiologia oculta (p. ex., cordoma, meningite carcinomatosa, fistula carotidocavernosa, miastenia gravis). Os tumores da base do cranio facilmente passam despercebidos mesmo com neuroimagem com contraste. Paralisias de miiltiplos nervos oculomotores Tais paralisias nao devem ser atribuidas a eventos microvasculares esponténeos que s6 atingem um nervo de cada vez. Essa notavel coincidéncia, de fato, ocorre sobretudo nos pacientes diabéticos, no entanto 0 diagnéstico sé € possivel em retrospecto, quando todas as demais possibilidades tiverem sido excluidas. A neuroimagem deve ser concentrada em seio cavernoso, fissura orbital superior e apice da érbita, onde os trés nervos motores oculares esto mais proximos. No paciente diabético ou imunocomprometido, as infecgdes fiingicas (por Aspergillus, Mucorales ¢ Cryptococcus) so causas comuns de paralisia de miltiplos nervos. Nos pacientes com cancer sistémico, a meningite carcinomatosa é um diagnéstico provavel. O exame citolégico pode resultar negative, mesmo quando so examinadas varias amostras de liquido cerebrospinal. A sindrome miasténica paraneoplasica de Lambert-Eaton também pode causar oftalmoplegia. A arterite (temporal) de células gigantes as vezes se manifesta por diplopia, causada por paralisia isquémica dos miisculos extraoculares. A sindrome de Fisher, uma variante ocular da sindrome de Guillain-Barré, causa oftalmoplegia com arreflexia e ataxia. A ataxia muitas vezes & suave, ¢ os reflexos podem estar normais. Em cerca de 50% dos casos, sao detectados anticorpos antigangliosidios (GQIb). Distirbios supranucleares do olhar Esses distirbios muitas vezes so confundidos com paralisias de miiltiplos nervos oculares. A encefalopatia de Wernicke, por exemplo, pode causar nistagmo e déficit parcial do olhar vertical ou do horizontal, simulando uma paralisia combinada dos nervos abducente e oculomotor. Essa doenga atinge os pacientes alcoolistas ou desnutridos, podendo ser revertida com tiamina. Outras causas importantes de paralisia supranuclear do olhar so infarto, hemorragia, tumor, esclerose miltipla, encefalite, vasculite e doenga de Whipple. Os distirbios do olhar vertical, sobretudo dos movimentos sacddicos para baixo, so um sinal precoce da paralisia supranuclear progressiva, O movimento de perseguigao suave com o olhar € afetado mais adiante no curso da doenga. Doenga de Parkinson, doenga de Huntington e degeneracao olivopontinocerebelar também podem afetar o olhar vertical. O campo ocular frontal do cértex cerebral participa da geragao de sacades do lado contralateral. Apés acidente vascular hemisférico, os olhos costumam apontar para 0 lado lesionado em razio da falta de oposigo 4 agao do campo ocular frontal no hemisfério normal. Esse déficit melhora com o tempo. As convulsées tendem a ter efeito oposto: causam desvio conjugado dos olhos para longe do foco de irritacao. Lesées parietais prejudicam a perseguigao suave de objetos que se movam em diregao ao lado da lesio, Lesées parietais bilaterais produzem asindrome de Balint, caracterizada por deficiéncia da coordenacao mao-olho (ataxia dptica), dificuldade de iniciar movimentos voluntérios oculares (apraxia ocular) ¢ desorientago visuoespacial (simultanagnosia). Olhar horizontal Os impulsos corticais descendentes que controlam o olhar horizontal convergem na ponte, Os neurénios da formagdo reticular pontina paramediana controlam o olhar conjugado ipsilateral. Eles vao direto para o miicleo abducente ipsilateral. Uma lesio nessa regido pontina ou no micleo do abducente produz paralisia ipsilateral do olhar conjugado. A lesdo em qualquer desses pontos produz sindromes clinicas quase idénticas, com a seguinte excegao: a estimulagao vestibular (manobra oculocefilica ou de irrigagao calérica) produz desvio conjugado dos olhos para o lado lesionado nos pacientes que apresentem lesio da formagao reticular pontina paramediana, mas nao nos portadores de lesao do micleo abducente. OFTALMOPLEGIA INTERNUCLEAR & causada por danos ao fasciculo longitudinal medial, que sobe do nicleo abducente na ponte ao niicleo oculomotor no mesencéfalo (por isso a denominago “internuclear”). A lesio das fibras que levam o sinal conjugado dos interneurénios do abducente aos motoneurénios do reto medial contralateral produz uma falha da adugdo a tentativa de olhar lateralmente. Por exemplo, um paciente com oftalmoplegia internuclear (OIN) esquerda terd os movimentos de adugdo do olho esquerdo diminuidos ou ausentes (Fig. 39.20). O paciente que apresenta lesdo bilateral do fasciculo longitudinal medial teré OIN bilateral. A causa mais comum é a esclerose miltipla, mas a lesdo também pode ser provocada por tumores, acidentes vasculares, traumatismo ou qualquer processo no tronco encefalico. A sindrome um-e-meio é causada por lesio combinada do fasciculo longitudinal medial e do nicleo abducente do mesmo lado. O Unico movimento ocular horizontal desses pacientes é a abdugdo do olho contralateral. FIGURA 39.20 Oftalmoplegia internuclear (OIN) esquerda. A. Na posigio inicial do olhar, os olhos parecem normais. B. O olhar horizontal para a esquerda encontra-se intacto. C. Ao tentar mover o olhar horizontalmente para a direita, o olho esquerdo nado consegue aduzir, Nos pacientes levemente acometidos, 0 olho é capaz de aduzir parcialmente ou de forma mais lenta do que 0 normal. Geralmente, ha nistagmo no olho abduzido. D, A imagem axial de ressonancia magnética ponderada em T2 através da ponte mostra uma placa desmielinizante no fasciculo longitudinal medial esquerdo (seta). Olhar vertical E controlado ao nivel do mesencéfalo. Nao foram esclarecidos quais circuitos neuronais esto afetados nos distirbios do olhar vertical. No entanto, sabe-se que lesées do niicleo rostral intersticial do fasciculo longitudinal medial e do nicleo intersticial de Cajal causam paralisia supranuclear do olhar para cima, do olhar para baixo ou de todos os movimentos oculares verticais. A etiologia mais comum é a isquemia da artéria basilar distal. O estrabismo vertical & 0 desalinhamento vertical dos olhos que, geralmente, permanece constante em qualquer posicaio dos olhos. Nesses casos, € dificil localizar a lesao, pois ja foi descrito estrabismo vertical apés lesdes de diversas areas do tronco encefiilico e do cerebelo. SINDROME DE PARINAUD Também denominada sindrome mesencefilica dorsal, trata-se de distirbio supranuclear peculiar do olhar vertical causado por lesao da comissura posterior. E um sinal cléssico de hidrocefalia por estenose do aqueduto. Outras causas da sindrome de Parinaud so tumores da regiio pineal ou do mesencéfalo, cisticercose e acidentes vasculares. Essa sindrome tem como caracteristicas a perda do olhar para cima (e, as vezes, para baixo), nistagmo de convergéncia-retragao & tentativa de olhar para cima, desvio ocular para baixo (sinal do sol poente), retrago palpebral (sinal de Collier), estrabismo vertical, pseudoparalisia do abducente, bem como dissociagao dos reflexos fotomotor e de acomodacao pupilares. Nistagmo E uma oscilagio ritmica dos olhos. Pode ser fisiolégico, em resposta a estimulos vestibulares ou optocinéticos, ou patolégico. Varias doengas podem provocar nistagmo (Cap. 28). As anormalidades dos olhos e dos nervos dpticos, presentes ao nascimento ou adquiridas na infancia, podem provocar nistagmo complexo, com movimentos de busca, componentes pendulares (senoidais) e verticais. S40 exemplos 0 albinismo, a amaurose congénita de Leber e a catarata bilateral. Esse tipo de nistagmo é comumente referido como nistagmo sensorial congénito. Trata-se de denominagao inadequada, porque, mesmo em criangas com les&o congénita, o nistagmo sé aparece semanas aps 0 nascimento. O nistagmo motor congénito, semelhante ao nistagmo sensorial congénito, surge na auséncia de qualquer anormalidade do sistema visual sensorial. A acuidade visual também se mostra reduzida no nistagmo motor congénito provavelmente em razdo do préprio nistagmo, mas raramente abaixo de 20/200. NISTAGMO ONDULATORIO Caracteriza-se por afastamento lento do ponto de observagdo, seguido de movimento sacddico rapido corretive. Por convencao, 0 nistagmo é denominado segundo sua fase rapida. Pode ser vertical (para baixo ou para cima), horizontal (para qualquer dos lados) ou rotacional. O padrao do nistagmo pode variar de acordo com a posigao do olhar. Alguns pacientes nao pereebem que tém nistagmo. Outros referem visio turva com movimento subjetivo de vaivém do ambiente (oscilopsia) e que corresponde ao nistagmo. Os nistagmos suaves podem ser dificeis de serem percebidos ao exame desarmado dos olhos. A observacdo de movimentos nistagmoides do disco éptico a fundoscopia ¢ um método sensivel para a detecgao dos nistagmos sutis. NISTAGMO SUSCITADO PELO OLHAR & a forma mais comum de nistagmo ondulatério. Quando assumem posigdes excéntricas nas érbitas, os olhos tém uma tendéncia natural a voltar a sua posigdo anterior. O individuo compensa com uma sdcade corretiva para manter o olho desviado em posi¢ao. Muitas pessoas normais apresentam nistagmo leve suscitado pelo olhar. Algumas substdncias podem exacerba- lo (sedativos, anticonvulsivantes, Alcool). As outras causas so paresia muscular; miastenia gravis; doengas desmielinizantes; e lesdes do cerebelo, tronco encefilico e Angulo pontocerebelar. NISTAGMO VESTIBULAR O nistagmo vestibular & causado por disfungdo de labirinto (doenga de Ménigre), nervo vestibular ou nicleo vestibular no tronco encefilico. O nistagmo vestibular periférico muitas vezes ocorre em episédios isolados, junto com sintomas de nduseas e vertigem. Podem ocorrer zumbido e disacusia associados. Mudangas subitas na posigdo da cabeca podem provocar ou piorar os sintomas. NISTAGMO DE BATIMENTO DESCENDENTE Ovnistagmo de batimento descendente resulta de lesdes proximas da jungao craniocervical (malformagao de Chiari, invaginagdo basilar). Também foi relatado em AVE de tronco encefiilico ou de cerebelo, intoxicago por litio ou por anticonvulsivante, alcoolismo e esclerose miltipla. O nistagmo vertical superior esta associado a danos no tegumento pontino por acidentes vasculares, desmiclinizagao ou tumores. Opsoclonia Esse distirbio raro ¢ impressionante dos movimentos oculares consiste em salvas de sdcades consecutivas (sacadomania). Quando tais movimentos se restringem ao plano horizontal, prefere-se a designagtio flutter ocular. Pode ocorrer na encefalite viral, no traumatismo ou como efeito paraneoplasico de neuroblastoma, carcinoma de mama e outros tumores. Também jé foi descrito como fendmeno benigno e transitério em pacientes sadios. 40e Uso de oftalmoscépio portatil Homayoun Tabandeh, Morton F. Goldberg O exame da retina de um humano vivo fornece uma oportunidade nica para o estudo direto dos tecidos nervoso, vascular e conectivo. Muitos distirbios sistémicos tém manifestagées retinianas que sao valiosas para rastreamento, diagnéstico ¢ manejo dessas condigdes. Além disso, o envolvimento retiniano nos distirbios sistémicos, como o diabetes melito, é uma causa importante de morbidade. O reconhecimento precoce por rastreamento oftalmoscépico é um fator fandamental no tratamento eficaz. A oftalmoscopia tem o potencial de ser um dos elementos com mais “alto rendimento” do exame fisico. A oftalmoscopia eficaz requer uma compreensdo basica das estruturas oculares e das técnicas oftalmoscépicas ¢ o reconhecimento de achados anormais. VISAO GERAL DAS ESTRUTURAS OCULARES O olho consiste em um invélucro (cornea e esclera), 0 cristalino, o diafragma da iris, 0 corpo ciliar, a coroide e a retina. A cdmara anterior ¢ 0 espaco entre a cérnea e 0 cristalino, e é preenchida pelo humor aquoso. O espago entre o aspecto posterior do cristalino ¢ a retina € preenchido pelo corpo vitreo. A coroide ea retina cobrem os dois tergos posteriores da esclera internamente. A cérnea e o cristalino formam o sistema de foco do olho, enquanto a retina age como o sistema fotorreceptor, traduzindo a luz em sinais neurolégicos, que, por sua vez, sdo transmitidos ao cérebro por meio do nervo 6ptico e das vias visuais. A coroide é a camada de tecido altamente vascularizado que nutre a retina e esta localizada entre a esclera e a retina. A camada do epitélio pigmentar retiniano (EPR) é uma monocamada de células pigmentadas que sdio aderentes as células fotorreceptoras sobrejacentes. O EPR tem papel importante no metabolismo fotorreceptor da retina. FUNDO DE OLHO NORMAL ‘As areas importantes que sio visiveis pela oftalmoscopia incluem a macula, o disco 6ptico, os vasos sanguineos retinianos e a periferia da retina (Fig. 40c. 1). 6ptica, * Mécula, e e € Ora 2 7 serrata 2 a FIGURA 40c.1 Diagrama mostrando os pontos de referéncia do fundo de olho normal. A macula é limitada pelas arcadas vasculares superior e inferior e se estende por 5 diametros discais (DD) temporalmente ao disco dptico (cabega do nervo dptico). A parte central da macula (fovea) esta localizada 2,5 DD temporalmente ao disco 6ptico. A periferia do fundo de olho é definida arbitrariamente como a area que se estende anteriormente a partir da abertura das veias do vértice para a ora serrata (a jungdo entre a retina e 0 corpo ciliar). (Desenho cortesia de Juan R. Garcia. Usado, com permissdo, de Johns Hopkins University.) A MACULA A macula é a parte central da retina e € responsavel pela visdo detalhada (acuidade) e pela percepgiio das cores. A micula é definida clinicamente como a rea da retina centrada no polo posterior do fundo do olho, medindo cerca de 5 didmetros de disco (DD) (7-8 mm) e limitada pelo disco éptico nasalmente e as arcadas vasculares temporais superiormente e inferiormente. Temporalmente, a macula se estende por cerca de 2,5 DD do seu centro. A fovea, na parte central da mécula, corresponde ao local da melhor acuidade visual. Ela tem aproximadamente 1 DD de tamanho e parece ter uma cor mais escura do que a drea em torno. O centro da févea, a fovéola, tem uma configuracao encovada, deprimida, medindo cerca de 350 ym. O DISCO OPTICO O disco éptico mede cerca de 1,5 mm e esta localizado cerca de 4 mm (2,5 DD) da fovea, em direcdo nasal. Ele contém a artéria e a veia central da retina de onde elas se ramificam, uma escavagdo central (fossa) e uma borda neural periférica. Normalmente, a proporcdo da fossa:disco é menor do que 0,6. A fossa esta localizada temporalmente em relagdo A entrada dos vasos no disco. O disco éptico normal tem coloragao amarelo/rosada. Ele tem margens claras e bem definidas ¢ est4 no mesmo plano da retina (Fig. 40c.2). Os achados patolégicos incluem palidez (atrofia), edema e aumento da fossa. FIGURA 40e.2 Fotografia de um disco dptico esquerdo normal ilustrando a ramificagdo da artéria e veia retinianas centrais, uma escavacdo fisiolégica, capilares superficiais e margem distinta. A escavagdo esta localizada temporalmente entrada dos vasos do disco. (De H Tabandeh, MF Goldberg: Retina in Systemic Disease: A Color Manual of Ophthalmoscopy. Nova Iorque, Thieme, 2009.) O EQUADOR E A RETINA PERIFERICA O equador do fundo do olho é definido clinicamente como a area que inclui a abertura interna das veias do vértice. A retina periférica se estende a partir do equador, anteriormente para a ora serrata. OFTALMOSCOPIA Ha inameras formas de visualizar a retina, incluindo a oftalmoscopia direta, oftalmoscopia indireta binocular ¢ a biomicroscopia de lampada de fenda. A maioria dos nao oftalmologistas prefere a oftalmoscopia direta, realizada com um oftalmoscépio manual, porque a técnica é simples de dominar e o equipamento é portatil. Os oftalmologistas geralmente usam a biomicroscopia de lampada de fenda e a oftalmoscopia indireta para obter uma visio mais ampla do fundo do olho. OFTALMOSCOPIO DIRETO Os oftalmoscépios diretos so equipamentos manuais simples que incluem uma pequena fonte de luz para iluminagao, uma abertura de visualizagio por meio da qual o examinador vé a retina, e uma série de lentes usadas para corregio dos erros de refragiio do examinador ¢ do paciente. Um equipamento mais recente, 0 oftalmoscépio PanOptic fornece um campo de visao mais amplo. Como usar um oftalmoscépio direto Um bom alinhamento € 0 ponto central. A meta é alinhar 0 olho do examinador com a abertura de visualizago do oftalmoscépio, a pupila do paciente ¢ a drea de interesse na retina. Tanto o paciente quanto 0 examinador devem estar em uma posigao confortével (sentado ou deitado para o paciente, sentado ou em pé para o examinador). A dilatagdo da pupila e a redugao da luz ambiental facilitam o exame. As etapas para a realizagao da oftalmoscopia direta sao resumidas no Quadro 40e.1. (TOUSEN DIRETRIZES PARA A REALIZACAO DE OFTALMOSCOPIA DIRETA + Instruir o paciente a remover os éculos, manter a cabesa reta e olhar firmemente para um ponto distante em frente a voc8. Vocé pode remover ou manter os seus éculos. Posicionar a sua cabesa no mesmo nivel da cabesa do pacient. + Usar 0 seu olho direito e mio dircta para examinar o olho direito do paciente, e 0 seu olho esquerdo e méo esquerda para examinar 0 olho esquerdo do paciente. + Usando a Inz do oftalmoscépio como uma lanterna, examinar rapidamente as caracteristicas externas do olho, incluindo os cilios, margens da palpebra, conjuntiva, esclera, iris e forma, tamanho e reatividade da pupila + Colocar a luz do oftaimoscépio na pupila do paciente na distancia de um brago e observar 0 reflexo vermelho. Observar anormalidades do reflexo vermelho como uma opacidade do meio. + Trocando-se até a lente +10 D na sequéneia de lentes, enquanto se examina o olho de uma distancia de 10 em, ¢ possivel uma visio amplificada do segmento anterior do olho. + Reduzir a poténcia da lente para zero e se aproximar do paciente, Identificar o disco dptico apontando 0 oftalmoseépio cerca de 15° nasalmente ou acompanhando um vaso sanguineo em diregao ao pice de qualquer ramificagao. Se a retina estiver fora de foco, girar o dial de lentes para qualquer lado, sem mover a sua cabera. Se o disco se tornar ‘mais claro, continuar girando até atingir o melhor foco; se ele ficar mais borrado, girar para o outro lado. + Quando vocé visualizar o nervo éptico, observar a forma, tamanho, cor, margens ea fossa. Observar também a presenga de pulsagdes venosas ou pigmentos em torne como um crescente coroidal ou escleral + Asseguir, examinar a macula, A mécula € a érea entre as arcadas vasculares temporais superior ¢ inferior, ¢ seu centro 6a fovea, Vocé pode examinar a macula apontando o oftakoscépio cerca de 15° temporalmente a0 disco éptico. Alternativamente, pega ao paciente para olhar para o centro da luz. Observar o reflexo foveal ¢ a presenga de qualquer hemorragia, exsudato, vasos sanguineos anormais, cicatrizes, depésitos ou outras anormalidades. Examinar os vasos sanguineos retinianos pela reidentificagdo do disco dptico ¢ seguindo cada um dos quatro ramos principais para longe do disco. As veias so vermelho-escuro ¢ relativamente largas. As artérias so mais estreitas e vermelho brlhante + Posa ao paciente para olhar nas oito diregSes cardinais para permitir que voc® veja a periferia do fundo de olho. Em um paciente com uma pupila bem dilatada, é possivel visualizar até o equador OFTALMOSCOPIO PANOPTIC O oftalmoscépio PanOptic é um tipo de oftalmoscépio direto que € projetado para prover uma visto mais ampla do fundo de olho e tem um pouco mais de aumento do que 0 oftalmoseépio direto padrao. As etapas para o uso do oftalmoscépio PanOptic sao resumidas no Quadro 40e.2. COMO USAR UM OFTALMOSCOPIO PANOPTIC + Focar 0 oftalmose pio: olhar através do visor para um objeto que esteja pelo menos 3,0-4,5 metros de distancia Focalizar a imagem do objeto usando o dial de lentes. Colocar a abertura do dial em “pequeno” ou posigao inicial + Ligar 0 aparetho e ajustar a intensidade da tuz para “maximo”, + Instruir o paciente a olhar para frente. Mover 0 oftalmoscépio para perto do paviente até que 0 cdlice éptico encoste na sobrancelha do paciente. O cilice éptico deve ser comprimido cerea de metade do seu comprimento para aperfeigoar a visdo. + Visualizar o disco éptico. + Examinar 0 fundo como deserito no Quadro 40e.! SINAIS RETINIANOS ASSOCIADOS A DOENGAS SISTEMICAS ALTERAGOES RELACIONADAS COM A IDADE As alteragdes comuns relacionadas com a idade incluem diminuigdo do reflexo foveal 4 luz, drusas (pequenos depésitos amarelos sub-retinianos), atrofia leve do EPR e aglomerados de pigmentos. HEMORRAGIAS RETINIANAS As hemorragias retinianas podem ter varias formas ¢ tamanhos dependendo da sua localizagao dentro da retina (Figs. 40¢.3 © 40e.4). Hemorragias em chama de vela esto localizadas no nivel da camada de fibras nervosas superficiais e representam sangramento da rede capilar interna da retina, Uma hemorragia com centro branco é uma hemorragia em chama de vela superficial com uma area central esbranquigada, frequentemente representando edema, necrose focal ou infiltragdo celular. As causas de hemorragia com um centro branco incluem endocardite bacteriana e septicemia (manchas de Roth), distirbios linfoproliferativos, diabetes melito, hipertensdo, anemia e¢ distirbios do colégeno vascular, Hemorragias puntiformes sfio hemorragias pequenas, arredondadas, superficiais que também se originam da rede capilar superficial da retina, Elas lembram microancurismas. As hemorragias maculares so um pouco maiores em tamanho, escuras ¢ intrarretinianas, Elas representam sangramentos da rede capilar profunda da retina, Hemorragias sub-hialoides so varidveis na forma ¢ no tamanho e tendem a ser maiores do que outros tipos de hemorragias. Elas frequentemente tém um nivel liquido (hemorragia em “forma de barco”) e esto localizadas dentro do espago entre o vitreo ¢ a retina, As hemorragias sub-retinianas esto localizadas profundamente (externas) na retina. Os vasos retinianos podem ser vistos cruzando sobre (internas a) tais hemorragias. As hemorragias sub-retinianas so varidveis em tamanho e, mais comumente, so causadas por neovascularizagio coroidal (p. ex., degeneragao macular imida). FIGURA 40c.3 Hemorragias superficiais em chama de vela, hemorragias puntiformes e¢ microancurismas em um paciente com retinopatia diabética nao proliferativa. FIGURA 40¢.4 Hemorragias retinianas profundas e superficiais em um paciente com leucemia crénica. Condigdes associadas a hemorragias retinianas incluem doengas que causam microvasculopatia retiniana (Quadro 40c.3), retinite, macroaneurisma retiniano, papiledema, hemorragia subaracndidea (sindrome de Terson), retinopatia de Valsalva, trauma (lesio ocular, les%io craniana, lesées por compress&o do térax e do abdome, sindrome do bebé sacudido, estrangulamento), degenerago macular e descolamento do vitreo posterior. Os estados de hiperviscosidade podem produzir hemorragias puntiformes e maculares, veias dilatadas (aspecto em “cordao de salsichas”), edema do disco éptico © exsudatos; alteragdes similares podem ocorrer com a adaptagao a grandes altitudes em escaladores de montanhas. DOENGAS ASSOCIADAS A MICROVASCULOPATIA RETINIANA + Diabetes meio + Hipertensdo sistémica + Oclusio da veia retiniana + Ochisdo da artéria retiniana + Microembolia miipla; p. ex., retinopatia por talco secundaria a uso de drogas intravenosas, septicemia, endocardite, retinopatia de Purtscher Doenga da artéria cardtida, fistula carotidocavernosa, sindrome do arco aértico Retinopatia por célula falciforme Retinopatia por radiagao, irradiago da cabega/pescoso Retinopatia por HIV Vasculite retinéana ‘Anemia Trombocitopenia Distirbios linfoproliferativos Coagulopatia ‘Sindromes de hiperviscosidade Retinopatia da prematuridade MICROANEURISMAS, Microaneurismas sao formagdes saculares externas dos capilares _retinianos, aparecendo como pontos vermelhos (similar a hemorragias puntiformes) e medindo 15- 50 um. Os microaneurismas tém uma permeabilidade aumentada e podem sangrar ou vazar, resultando em hemorragia retiniana localizada ou edema. Um microaneurisma por fim trombosa e desaparece dentro de 3-6 meses. Os microaneurismas podem ocorrer em qualquer condigao que cause microvasculopatia retiniana (Quadro 40e.3). EXSUDATOS DUROS Exsudatos duros so depésitos amarelos, brilhantes, bem circunscritos, localizados dentro da retina. Eles se originam as margens de areas de edema retiniano e indicam aumento da permeabilidade capilar. Exsudatos duros contém lipoproteinas e macréfagos cheios de lipideos. Eles podem ser eliminados espontaneamente ou apés fotocoagulagio com laser, frequentemente dentro de 6 meses. Os exsudatos duros podem ocorrer isoladamente ou podem estar espalhados por todo o fundo de olho. Eles podem ocorrer em um padrio circular (circinado), centrado em torno de uma area de microaneurismas com vazamento. Uma estrela macular consiste em um padrio irradiante em forma de estrela de exsudatos duros que é visto caracteristicamente na hipertensao sistémica grave e na neurorretinite associada 4 doenga da arranhadura do gato. Condigdes associadas a exsudatos duros incluem aquelas que causam microvasculopatia retiniana (Quadro 40e.3), papiledema, neurorretinite, como a doenga da arranhadura do gato e a doenca de Lyme, lesdes vasculares da retina (macroaneurismas, hemangioma capilar da retina, doenga de Coats), tumores intraoculares ¢ degeneragao macular timida relacionada com a idade. A drusa pode ser confundida com exsudatos duros no oftalmoscépio. Ao contrério dos exsudatos duros, as drusas so depésitos sub-retinianos ndo refrdcteis com margens borradas. Eles geralmente so vistos em associag&o com degeneracao macular relacionada com a idade. EXSUDATOS ALGODONOSOS Os exsudatos algodonosos sao lesdes retinianas superficiais amarelo-esbranquicadas com bordas emplumadas indistintas medindo 0,25-1 DD de tamanho (Fig. 40.5). Eles representam areas de edema dentro da camada de fibras nervosas da retina devido a isquemia focal. Os exsudatos algodonosos geralmente se resolvem espontaneamente dentro de 3 meses. Se a condi¢do isquémica subjacente persistir, novas lesdes podem se desenvolver em diferentes localizagdes. Os exsudatos algodonosos frequentemente ocorrem em conjunto com hemorragias retinianas ¢ microaneurismas ¢ representam microvasculopatias retinianas causadas por inimeras condigdes sistémicas (Quadro 40e.3). Eles podem ocorrer isoladamente na retinopatia por HIV, lipus eritematoso sistémico, anemia, trauma corporal, outras condigdes sistémicas (retinopatia de Purtscher ou similar) e terapia com interferon. FIGURA —40e.5 Exsudatos algodonosos, lesées_—_superficiais _amarelo- esbranquigadas com bordas emplumadas caracteristicas, em um paciente com retinopatia hipertensiva. (De H Tabandeh, MF Goldberg: Retina in Systemic Disease: 4 Color Manual of Ophthalmoscopy. Nova lorque, Thieme, 2009.) NEOVASCULARIZACAO RETINIANA Complexos neovasculares retinianos so redes irregulares de finos vasos sanguineos que crescem em resposta isquemia retiniana grave ou inflamagio crénica (Fig. 4e.6). Eles podem ocorrer no disco éptico ou adjacente a ele ou em outra parte da retina. Os complexos neovasculares so muito frégeis e tém um alto risco de hemorragia, frequentemente causando perda visual. As doengas associadas a neovascularizagao retiniana incluem condigées que causam microvasculopatia retiniana grave, especialmente as retinopatias diabética e de células falciforme (Quadro 4Ue.3), tumores intraoculares, inflamagio intraocular (sarcoidose, uveite crénica) © descolamento crénico da retina. FIGURA 40.6 Neovascularizacao do disco éptico em um paciente com retinopatia diabética proliferativa grave. Também esto presentes miltiplos exsudatos duros. EMBOLOS RETINIANOS As fontes comuns de émbolos retinianos incluem placas ateromatosas da artéria carétida, valvulas cardiacas e anormalidades septais, arritmias cardiacas, mixoma atrial, endocardite bacteriana, septicemia, fungemia e uso de drogas intravenosas. Os émbolos plaquetirios tém aspecto amarelado ¢ adquirem o formato dos vasos sanguineos. Eles geralmente se originam de placas ateromatosas dentro da artéria cardtida ¢ podem causar perda transitéria da visa (amaurose fugaz). Os émbolos de colesterol, também chamados de placas de Hollenhorst, so depésitos amarelos cristalinos que so encontrados comumente nas bifurcagées das artérias retinianas ¢ podem estar associados a amaurose fugaz. Os émbolos calcificados tém aspecto branco-perolado, sio maiores do que os émbolos de plaquetas e os de colesterol, ¢ tendem a se alojar nas grandes artérias da retina ou em torno do disco éptico. Os &mbolos calcificados frequentemente resultam em oclusao das arteriolas retinianas. Os &mbolos sépticos podem causar hemorragias retinianas de centro branco (manchas de Roth), microabscessos retinianos ¢ endoftalmite endégena, A embolia gordurosa ¢ a embolia por liquide amniético sao caracterizadas por miltiplas oclusées de pequenos vasos, causando exsudatos algodonosos tipicos ¢ poucas hemorragias (retinopatia do tipo Purtscher). A embolia por talco ocorre com usuarios de drogas intravenosas ¢ é caracterizada por miltiplos depésitos refracteis dentro dos pequenos vasos retinianos. Qualquer forma grave de embolia da artéria retiniana pode resultar em isquemia da retina ¢ suas sequelas, incluindo neovascularizagao retiniana. MANCHA VERMELHO-CEREJA NA MACULA Mancha vermelho-cereja na macula € o termo usado para descrever 0 aspecto vermelho escuro da area foveal central comparado com a regio central circunjacente (Fig. 40¢.7). Esse aspecto é devido mais comumente a uma perda relativa da transparéncia da retina parafoveal resultante de edema nebuloso isquémico ou depésito de macromoléculas dentro da camada de células ganglionares. As doengas associadas as manchas vermelho-cereja na mdcula incluem a oclusdo da artéria central da retina, esfingolipidoses e mucolipidoses. FIGURA 40e.7 Manchas vermelho-cereja na macula e edema nebuloso da macula em um paciente com oclusao da artéria central da retina devido a um émbolo originario de uma placa ateromatosa da artéria carétida. DEPOSICAO DE CRISTAIS NA RETINA Os cristais na retina aparecem como depésitos finos, refrdcteis, amarelo- esbranquigados. As condigées associadas incluem cistinose infantil, hiperoxaliria priméria, oxalose secundaria, sindrome de Sjégren-Larson, uso de drogas intravenosas (retinopatia por talco) e firmacos como tamoxifeno, cantaxantina, nitrofurantoina, metoxiflurano ¢ etilenoglicol. Os cristais também podem ser vistos nas doengas primérias da retina, como telangiectasia justafoveal, atrofia do giro e degeneracio cristalina de Bietti. Microémbolos antigos podem imitar cristais retinianos. EMBAINHAMENTO VASCULAR RETINIANO O embainhamento vascular aparece como uma bainha amarelo-esbranquigada em torno de uma artéria ou veia retiniana (Fig. 40c.8). As doengas associadas a0 embainhamento vascular retiniano incluem sarcoidose, tuberculose, toxoplasmose, sifilis, HIV, retinite (citomegalovirus, herpes-zdster e herpes simples), doenga de Lyme, doenga da arranhadura do gato, esclerose miltipla, leucemia crénica, amiloidose, doenga de Behget, vasculite retiniana, oclusao vascular retiniana ¢ uveite crénica. FIGURA 40e.8 Embainhamento vascular sobre 0 disco 6ptico em um paciente com neurossarcoidose. DESCOLAMENTO DA RETINA O descolamento da retina é a separagdo da retina do EPR subjacente. Ha trés tipos principais: (1) seroso/exsudative, (2) por tragdo ¢ (3) descolamento da retina regmatogénico. No descolamento da retina do tipo seroso, a localizagao do liquido sub-retiniano depende da posigdo, caracteristicamente gravitando para a parte mais inferior do fundo de olho (sinal de desvio de liquido), e ndo hd rupturas na retina. As doengas associadas ao descolamento da retina do tipo seroso/exsudativo incluem hipertensdo sistémica grave, shunt arteriovenoso dural, anomalias vasculares da retina, sindromes de hiperviscosidade, papiledema, uveite posterior, esclerite, inflamagao orbital e neoplasias intraorbitais, como o melanoma coroidal, metastases coroidais, linfoma ¢ mieloma miltiplo. O descolamento da retina do tipo tracional € causado por tragéo interna sobre a retina na auséncia de ruptura da retina. A retina na drea de descolamento é imével ¢ céncava internamente. Proliferagao fibrovascular é um achado associado com frequéncia. As condigées associadas ao descolamento de retina por trago incluem retinopatias vasculares proliferativas, como retinopatia diabética proliferativa grave, ocluséo de ramo da veia retiniana, retinopatia de células falciformes e retinopatia da prematuridade. O trauma ocular, vitreorretinopatia proliferativa e inflamagdo intraocular sao outras causas de descolamento por trago da retina. O descolamento da retina do tipo regmatogénico é causado pela presenga de uma ruptura na retina, permitindo que o liquido da cavidade vitrea tenha acesso ao espago sub-retiniano. A superficie da retina geralmente é convexa para frente. O descolamento da retina regmatogénico tem um aspecto enrugado e ondula com o movimento ocular. As causas de ruptura na retina incluem descolamento do vitreo posterior, tragdo vitreorretiniana grave, trauma, cirurgia intraocular, retinite e orificios atréficos. EDEMA DO DISCO OPTICO O edema do disco éptico é uma elevagao anormal do disco éptico com borramento de suas margens (Fig. 40e.9). O termo “papiledema” é usado para descrever 0 edema do disco éptico secundario A elevago da pressao intracraniana. No papiledema, a pulsago venosa normal no disco caracteristicamente esta ausente. O diagnéstico diferencial do edema do disco éptico inclui papiledema, neurite dptica anterior (papilite), oclusdo da veia central da retina, neuropatia éptica isquémica anterior, neuropatia dptica téxica, neuropatia Optica hereditaria, neurorretinite, papilopatia diabética, hipertensdo (Fig. 40e.10), — insuficiéncia__respiratéria, _ fistula carotidocavernosa, infiltrago nervosa do disco éptico (glioma, linfoma, leucemia, sarcoidose ¢ infecgdes granulomatosas), hipotonia ocular, inflamagao intraocular crénica, drusas do disco dptico (pseudopapiledema) e hipermetropia elevada (pseudopapiledema). FIGURA 40c.9 Edema do disco éptico em um paciente com papiledema devido & hipertensao intracraniana idioptica. O disco éptico é hiperemiado, com margens indistintas. Hemorragias superficiais esto presentes. FIGURA 40e.10 Edema do disco dptico e hemorragias reti com hipertensio maligna. nas em um paciente LESOES EM MASSA CORIORRETINIANAS As lesdes coroidais em massa aparecem espessadas ¢ podem ou nao estar associadas a aumento da pigmentagiio. Lesées pigmentadas em massa incluem nevos coroidais (geralmente achatados), melanoma coroidal maligno (Fig. 40e.11) e melanocitoma, As lesdes nao pigmentadas incluem melanoma coroidal amelanético, metistases coroidais, retinoblastoma, hemangioma capilar, granuloma (p. ex., Toxocara canis), descolamento coroidal, hemorragia coroidal e degeneragio macular relacionada 4 idade. Outros tumores raros que podem ser visiveis ao oftalmoscépio incluem osteoma, astrocitoma (p. ex,, esclerose tuberosa), neurilemoma ¢ leiomioma. FIGURA 40e.11 Melanoma coroidal maligno. A lesio ¢ bastante elevada ¢ pigmentada ¢ tem depésitos sub-retinianos de pigmento alaranjado caracteristico de melanoma maligno. LESOES PIGMENTADAS O diagnéstico diferencial de lesdes pigmentadas planas do fundo de olho é resumido no . O aparecimento de cicatrizes coriorretinianas de coriorretinite antiga por Toxoplasma é mostrado na . DIAGNOSTICO DIFERENCIAL DAS LESOES PIGMENTADAS PLANAS DO FUNDO DE ‘OLHO Pigmentagio em espiculas ésseas + Retinite pigmentosa e suas variantes + Retinopatia pigmentar nas doengas sistémicas: sindrome de Usher, abetalipoproteinemia, doenga de Refsum, sindrome de Kearns-Sayre, sindrome de Alstrém, sindrome de Cockayne, ataxia de Friedreich, mucopolissacaridose, sindrome paraneoplisica + Infecgdes: rubéola congénita (retinopatia em sal e pimenta), sifilis congénita + Descolamento coroidalretiniano resolvido + Degeneragdo pigmentar reticular relacionada a idade Les6es pigmentadas irregulares + Cicatrizes coriorretinianas + Infecgdes: Toxoplasma gondii, Toxocara canis, siflis, citomegalovirus, herpes-zéster e herpes simples, virus do ‘este do Nilo, histoplamose, infecgao parasitéria + Coroidite: sarcoidose, oftalmia simpética, sindrome de Vogt-Koyanagi-Harada + Infarto coroidal: hipertensdo grave, hemoglobinopatias faleiformes + Trauma: crioterapia, cicatrizes de fotocoagulagéo a laser + Degenerago macular relacionada a idade + Férmacos: cloroquina/hidroxicloroquina, tioridazina, clorpromazina, desferrioxamina + Nevos coroidais + Hipertrofia congénita do epitéio pigmentar retiniano FIGURA 40e.12 Cieatrizagao coriorretiniana devida & coriorretinite antiga por Toxoplasma. A lesio & plana e pigmentada. Também estdo presentes areas de hipopigmentacao. 4le Videoteca de neuro-oftalmologia Shirley H. Wray O controle adequado dos movimentos dos olhos exige a atividade coordenada de muitas estruturas anatémicas diferentes do sistema nervoso central ¢ periférico e, por sua vez, manifestagdes de uma série variada de distirbios neurolégicos e clinicos sao reveladas como distirbios dos movimentos dos olhos. Esta colegdo de videos apresenta uma introdugio a distirbios distintos do movimento dos olhos encontrados no contexto dos distirbios neuromusculares, paraneoplasicos, desmiclinizantes neurovasculares e neurodegenerativos. Casos com esclerose miltipla Video 41e.1 Sindrome do um-e-meio de Fisher (ID164-2) Video 41¢.2 Caso de palpitagao ocular (ID166-2) Video 4le.3 Nistagmo de batimento descendente e nistagmo periddico alternante (ID168-6) Video 41¢.4 Oftalmoplegia internuclear bilateral (ID933-1) Casos com miastenia gravis ou miopatia mitocondrial Video 41.5 Ptose unilateral: miastenia gravis (tumores timicos) (ID163-1) Video 41e.6 Oftalmoplegia externa progressiva (oftalmoplegia externa progressiva: citopatia mitocondrial) (ID906-2) Casos com doenca paraneoplisica Video 41e.7 Nistagmo paraneoplasico de batimento ascendente, céncer no pancreas, anticorpo anti-Hu positivo (ID212-3) Video 41¢.8 Palpitacaio ocular paraneoplasica; adenocarcinoma pulmonar de pequenas células; marcador negativo (ID936-7) Video 41e.9 Palpitagiio/opsoclonia; paralisia bilateral do sexto _nervo; adenocarcinomas de mama; marcador negativo (ID939-8) Casos coma sindrome de Fisher Video 41.10 Ptose bilateral: diplegia facial; oftalmoplegia externa total; anticorpo anti-GQ,, positive (ID944-1) Casos com doenga vascular Video 41e.11 Embolos retinais (filme ou findo) (ID16-1) Video 41e.12 Paralisia do terceiro nervo (microinfarto) (ID939-2) Caso com doenga neurodegenerativa Video 41¢.13 Apraxia da abertura das palpebras (paralisia supranuclear progressiva) (1D932-3) Caso de oftalmopatia associada 4 tireoide Video 41e.14 Orbitopatia restritiva da doenga de Graves; exoftalmia bilateral (ID925- 4) Caso com encefalopatia de Wernicke Video 41e.15 Paralisia bilateral do sexto nervo (ID163-3) Caso com sindrome de bloqueio Video 41.16 Mergulho ocular (ID4-1) Caso com um paciente comatoso Video 41¢.17 Nistagmo de batimento descendente (ID 166-11) Caso ocorrido dois anos apés uma hemorragia pontina Video 41e.18 Tremor palatal (ID936-4) A Videoteca de neuro-oftalmologia apresenta varios casos de distirbios do movimento dos olhos. Todos os videos pertencem 4 colegio da Dra. Shirley Wray foram acessados no site NOVEL. Para ter acesso ao material, va para: hitp://NOVEL-utah.edw/ Wray hitp://countway.harvard.edu e/ou consulte 0 livro Eye Movement Disorders in Clinical Practice Shirley H. Wray, MD, PhD, Oxford University Press, 2014 42 Disturbios do olfato e do paladar Richard L. Doty, Steven M. Bromley Todas as substancias quimicas necessdrias a vida penetram no corpo pelo nariz e pela boca. Os sentidos de odor (olfato) ¢ sabor (paladar) monitoram tais substincias quimicas, determinam 0 aroma ¢ a palatabilidade de alimentos ¢ bebidas ¢ alertam para condigées ambientais perigosas, incluindo fogo, poluigdo do ar, escape de gas natural e alimentos contaminados com bactérias. Esses sentidos contribuem significativamente para a qualidade de vida e, quando comprometidos, podem levar a consequéncias fisicas e psicoldgicas indesejadas. Um entendimento basico desses sentidos na satide e na doenga é crucial para o médico, pois milhares de pacientes se apresentam nos consultérios médicos por ano com queixas de disfangao quimiossensorial. Entre os mais importantes desenvolvimentos recentes na area de neurologia encontra-se a descoberta de que uma redug&o no sentido do olfato se encontra entre os primeiros sinais, sen&o for o primeiro, de doengas neurodegenerativas, como a doenca de Parkinson (DP) e a doenga de Alzheimer (DA), significando a sua fase “pré- sintomética”. ANATOMIA E FISIOLOGIA Sistema olfatorio As substancias quimicas que possuem cheiro penetram na regio anterior do nariz durante a inalago e a aspiraco ativa, bem como na parte posterior do nariz, (nasofaringe) durante a deglutigo. Apés alcangar as areas mais elevadas da cavidade nasal, dissolvem-se no muco olfatério e se difundem ou sao ativamente transportadas por proteinas especializadas para os receptores localizados nos cilios das células receptoras olfatérias, Os cilios, dendritos, corpos celulares ¢ segmentos axénicos proximais dessas células bipolares esto localizados dentro de um neuroepitélio invulgar que cobre a placa cribiforme, o septo nasal superior e partes do corneto superior e médio (Fig. 42.1). Cada uma das cerca de 6 milhdes de células receptoras bipolares expressa apenas um dos cerca de 450 tipos de protefnas receptoras, a maior parte das quais responde a mais de uma tinica substincia quimica. Quando comprometidas, as células receptoras podem ser substituidas pelas células progenitoras préximas 4 membrana basal. Infelizmente, tal substituigo é em geral, incompleta, Bil ofatiie Siibigio do | ‘t —pemite inter FIGURA 42.1 Anatomia das vias neurais olfatérias, mostrando a distribuigao dos receptores olfatérios no teto da cavidade nasal. (Copyright David Klemm, Faculty and Curriculum Support [FACS], Georgetown University Medical Center; usada com autorizagao.) Apés coalescer em feixes envolvidos por células que formam bainhas semelhantes 4 glia (denominadas fila), os axénios das células receptoras atravessam a placa cribiforme em diregao aos bulbos olfatérios, onde estabelecem sinapse com dendritos de outros tipos celulares no interior dos glomérulos (Fig. 42.2). Essas estruturas esféricas, que constituem uma camada distinta do bulbo olfatério, representam um sitio de convergéncia de informagao, pois existe um nimero muito maior de fibras aferentes do que eferentes. As células receptoras que expressam 0 mesmo tipo de receptor se projetam para os mesmos tipos de glomérulos, efetivamente tornando cada glomérulo uma unidade funcional. Os principais neurénios de projegao do sistema olfatério — as células mitrais e em tufo — enviam dendritos primarios para o interior dos glomérulos, estabelecendo conexao nao apenas com os axénios aferentes das células receptoras como também com os dendritos das células periglomerulares. A atividade das células mitrais/em tufo € modulada pelas células periglomerulares, dendritos secundarios de outras células mitrais/em tufo e células granulares, as células mais numerosas do bulbo. Essas tltimas células, que so altamente gabaérgicas, recebem estimulos das estruturais cerebrais centrais e modulam a saida das células mitrais/em tufo. E. interessante mencionar que, de forma semelhante as células receptoras olfatérias, algumas células do interior do bulbo sofrem substituigo. Portanto, os neuroblastos formados no interior da zona subventricular anterior do cérebro migram ao longo da corrente migratéria rostral, finalmente se transformando nas células granulares ¢ periglomerulares. Célula granular Célula mitravem tufos “} Tato ofatério lateral [pes da célua granular Camada ploxiforme interna = }Camada da célula mitral Camada plexiforme externa Camada glomenslar | Camada das fibras nervosas Neurérics olfatérios Células raceptoras olfatérias Cllios olfat6rios Neurénio sensorial FIGURA 42.2 Esquema das camadas ¢ ramificagdes do bulbo olfatério. Cada tipo de receptor (vermetho, verde, azul) se projeta para um glomérulo comum, A atividade neural no interior de cada glomérulo é modulada pelas células periglomerulares. A atividade das células de projegao priméria, as células mitrais e em tufo, é modulada pelas células granulares, células periglomerulares e dendritos secunddrios de células adjacentes mitrais e em tufo. (Do site www. medicine yale,edu/neurosurg/treloar/index. html.) Os axénios das células mitrais e em tufo estabelecem sinapse no interior do cértex olfatério primério (POC) (Fig. 42.3). O POC € definido como aquelas estruturas corticais que recebem projegdes diretas do bulbo olfatério, principalmente dos cértices entorinal ¢ piriforme. Embora o olfato seja tnico no sentido de que suas projecdes aferentes iniciais ultrapassam o télamo, individuos com comprometimento do télamo podem exibir déficits olfatérios, particularmente os de identificagdo de odor. Tais déficits provavelmente refletem 0 envolvimento de conexées talémicas entre o cortex olfatério primario e o cértex orbitofrontal (OFC), onde ocorre a identificag’o do odor. As ligag6es anatémicas intimas entre o sistema olfatério e as amigdalas, o hipocampo e © hipotélamo ajudam a explicar as associagées intimas entre a percepgao do odor as fungdes cognitivas, como meméria, motivagao, alerta, atividade autonémica, digestao e Bulbo olfatério Traio offatério Estria olfat6ria medial Estria olfat6ria lateral Area piriforme Atea enturtinial Nerve vago Medula espinal Verme cerebelar "= Gerabelo FIGURA 42.3 Anatomia da base do eérebro mostrando o cértex olfatério primario. Sistema gustatério Os sabores sao percebidos por células receptoras especializadas presentes no interior dos botdes gustatérios — pequenas estruturas segmentadas semelhantes a uma toranja (grapefruit) localizadas nas margens laterais e no dorso da lingua, céu da boca, faringe, laringe e es6fago superior (Fig. 42.4). Os botdes gustatdrios linguais estéo envolvidos por protuberancias bem definidas denominadas papilas fungiformes, foliaceas e circunvaladas. Apés serem dissolvidas em um liquido, as particulas de sabor penetram na abertura do botdo gustatério — 0 poro gustatério — e se ligam a receptores nas microvilosidades, pequenas extensdes de células receptoras no interior de cada botdo gustatério. Essa ligacdo altera o potencial elétrico da célula gustatoria, resultando na liberagdo de neurotransmissor por sobre os neurénios gustatérios de primeira ordem. Embora os humanos possuam cerca de 7.500 botées gustatérios, nem todos abrigam células sensiveis ao sabor; alguns possuem apenas uma classe de receptor (p. ex., células respondedoras apenas a agticares), enquanto outros contém células sensiveis a mais de uma classe. O nimero de células receptoras de sabor por bot&o gustatério varia de zero a bem mais de 100. Uma pequena familia de trés receptores acoplados 4 proteina G (GPCRs), a saber TIR1, TIR2 e TIR3, medeia as sensagdes de sabores doce ¢ umami. As sensagées de amargo, por outro lado, dependem dos receptores T2R, uma familia de aproximadamente 30 GPCRs expressos em células distintas daquelas que expressam os receptores para o doce e 0 umami. Os T2Rs respondem a uma ampla faixa de substéncias amargas, porém ndo as distinguem entre si. Os sabores dcidos so percebidos pelo receptor PKD2L1, um membro da familia de proteinas dos receptores transitérios de potencial (TRP). A percepgao das sensagdes salgadas, como aquelas induzidas pelo cloreto de sédio, surge a partir da entrada dos ions Na* nas células através de canais de membrana especializados, como o canal de Na* sensivel & amilorida. ro gustatia 4 ——| Berge Bustctvo rangi FIGURA 42.4 Esquema do botdo gustatério e sua abertura (poro), bem como da localizagdo dos botdes nos trés principais tipos de papilas: fungiforme (anterior), folidcea (lateral) e circunvalada (posterior). CRP, célula receptora do paladar. Estudos recentes mostraram que ambos os receptores relacionados com os sabores amargo e doce também esto presentes em todo 0 corpo, principalmente nos tratos alimentar e respiratorio. Essa importante descoberta generaliza o conceito da quimiorrecepgao gustatéria as outras éreas do corpo além da boca e da garganta, coma a-gustducina, a subunidade a da proteina G especifica para o sabor, sendo expressa nas chamadas células em escova encontradas especificamente no interior da traqueia humana, pulmio, pancreas e vesicula biliar. Essas células em escova sio ricas em 6xido nitrico (NO) sintase, conhecido por lutar contra organismos xenobidticos, proteger a mucosa de lesdes induzidas por acidos e, no caso do trato gastrintestinal, estimular os neurénios aferentes vagais e esplénicos. O NO age posteriormente sobre as células adjacentes, incluindo células enteroendécrinas, células epiteliais absorventes ou secretoras, vasos sanguineos da mucosa e células do sistema imune. Membros da familia T2R de receptores do sabor amargo e dos receptores do sabor doce da familia TIR foram identificados no interior do trato gastrintestinal e nas linhagens celulares enteroendécrinas. Em alguns casos, esses receptores s&o importantes para o metabolismo, com os receptores TIR3 ¢ a gustducina, desempenhando papéis decisivos na detecgéo ¢ no transporte de agticares da dicta, vindos do lumen intestinal para o interior dos enterdcitos absorventes via um transportador de glicose dependente de sédio e na regulagao da liberagéio de horménio a partir das células intestinais enteroendécrinas. Em outros casos, esses receptores poderdo ser importantes para a protecdo das vias respiratorias, com uma quantidade de receptores T2R de sabor amargo nos cilios méveis das vias respiratrias humanas que respondem as substancias amargas aumentando sua frequéncia de batimento. Um receptor gustatrio especifico T2R38 expresso no epitélio do trato respiratério superior humano e responde as moléculas sinalizadoras N-acil-homoserina lactonas secretadas pela Pseudomonas aeruginosa e outras bactérias Gram-negativas. Diferengas na funcionalidade de T2R38, como as relacionadas com o genétipo TAS2R38, correlacionam-se com a suscetibilidade as infecges do trato respiratério superior em humanos. A informagao do sabor é enviada ao cérebro por trés nervos cranianos (NCs): 0 NC VII (onervo facial, que envolve o nervo intermedidrio com suas ramificagdes, os nervos petroso maior e corda do timpano), 0 NC IX (0 nervo glossofaringeo) eo NC X (0 nervo vago) (Fig. 42.5). O NC Vil enerva a porgdo anterior da lingua e todo o palato mole, o NC IX enerva a parte posterior da lingua, e o NC X inerva a superficie laringea da epiglote, a laringe e a porgdo proximal do es6fago. O ramo mandibular de NC V (V;) conduz a informagdo somatossensorial (p. ex., tato, queimagdio, resfriamento, irritagao) ao cérebro. Embora nao seja tecnicamente um nervo gustatério, o NC V compartilha vias nervosas primdrias com diversas fibras nervosas gustatérias e acrescenta a sensagdo de temperatura, textura, sabor picante e aromatico a experiéncia do sabor. O nervo corda do timpano é famoso por tragar um curso recorrente através do canal facial para a porgdo petrosal do osso temporal, atravessando a orelha média e, em seguida, saindo do cranio pela fissura petrotimpanica, onde se junta ao nervo lingual (uma divisio do NC V) préximo lingua. Esse nervo também carrega fibras parassimpaticas para as glindulas submandibular e sublingual, enquanto 0 nervo petroso maior supre as glandulas palatinas, influenciando, assim, a produgao de saliva. Nervo facial (Vil) Ganglio trigeminal glossafaringan (1X) Newvo vego (X) Nervo laringeo superior FIGURA 42.5 Esquema dos nervos cranianos (NCs) que medeiam o sentido do paladar, incluindo os nervos corda do timpano (NC VII), 0 nervo glossofaringeo (NC IX) ¢ 0 nervo vago (NC X). Os axénios das células de projegdo que estabelecem sinapse com os botdes gustatérios penetram na porgao rostral do nucleo do trato solitario (NTS) para o interior da medula do tronco encefalico (Fig. 42.5). A partir do NTS, os neurénios se projetam para uma divisaio do nicleo talamico ventroposteromedial (VPM) através do lemnisco medial. A partir desse ponto, so emitidas projegées para a parte rostral do opérculo frontal e insula adjacente, uma regidio do cérebro considerada como o cértex gustatério primdrio (PTC). As projegées a partir do cértex gustatério primario vao, em seguida, para 0 cdrtex gustatério secunddrio, denominado de OFC caudolateral. Essa regiao do cérebro esta envolvida no reconhecimento consciente das variedades gustatérias. Além disso, como cla contém células que sao ativadas por diversas modalidades sensoriais, representa provavelmente um centro para 0 estabelecimento do “sabor”. DISTURBIOS DO OLFATO A habilidade de sentir odores é influenciada, na vida didria, por fatores como idade, género, estado geral de satide, nutrigao, tabagismo e estado reprodutivo. As mulheres, em geral, sobrepujam os homens nos testes de fungiio olfatéria e conservam a fungdo normal de sentir odores até uma idade mais avangada do que os homens. Significativas reduges na habilidade olfatoria sio observadas em mais de 50% da populagao entre 65 e 80 anos de idade e em 75% daqueles com > 80 anos (Fig. 42.6). Essa presbiosmia ajuda a explicar por que muitos individuos mais velhos observam que a comida tem menos sabor, um problema que podera levar a distirbios nutricionais. Ela também ajuda a explicar por que um niimero desproporcional de idosos morre por envenenamentos acidentais causados por gas. Uma lista relativamente completa de condigdes e distirbios que tém sido associados a disfungio olfatéria esté apresentada no Quadro 42.1. 5 40 s g a £35 3 3 a = 30 e 5 = | 40 E 25 2 2 a $ 20 *—* Mulheres (n = 1158) 2 ®--« Homens (n =797) te —— Grupo total (N = 1955) £ 5 $s 59 20-29 40-49 60-69 80-89 Faixa etéria FIGURA 42.6 Valores do University of Pennsylvania Smell Identification Test (UPSIT) em fungaio da idade ¢ do sexo do individuo. Os nimeros de cada ponto de dados indicam o tamanho das amostras. Observar que as mulheres identificam odores melhor do que os homens em todas as idades. (De RL Doty et al: Science 226:1421, 1984. Copyright © 1984 American Association for the Advancement of Science.) PITUIEEEN DIsTURBIOS E CONDICOES ASSOCIADAS AO COMPROMETIMENTO DA FUNCAO OLFATORIA CONFORME AVALIAGAO DO TESTE OLFATORIO Acidente vascular encefitlico Aids/infeegao por HIV Alcoolismo Alergias Anorexia nervosa Ataxias Ataxias degenerativas Congénitas Deficigncia de vitamina B,. Deficiéncias nutricionais Deficit de atengdo/distirbio de hiperatividade Degeneragao do lobo frontotemporal Deméncia multi-infarto Diabetes melito Disgenesia gonadal (sindrome de Turner) Distirbio do comportamento do sono REM Doenga de Alzheimer Doenga de Chagas Doenga de Huntington Doenga de Lubag Doenga de Parkinson (DP) Doenga de Pick Doenga de Refsum Doenga pulmonar obstrutiva erénica Doengas hepiticas ELA guamaniana/DP/deméncia Encefalite por herpes simples Enxaqueca Epilepsia Esclerose lateral amiotréfica (ELA) Esclerose miitipla Esquizofrenia Exposigo a substéneias quimicas téxicas Exposigdo quimica Férmacos Fibrose cistica Além do envelhecimento, as tré: Gestagio Hanseniase Hipertrofia adenoide Hipotireoidismo Iatrogénese Idade Infecgdes do trato respiratério superior Insuficigneia do cértex da suprarrenal Insuficigneia pulmonar obstrutiva Insuficigneia renaVinsuficitneia renal de estdgio terminal Miastenia gravis ‘Narcolepsia com cataplexia ‘Neoplasias craniana/nasal Obesidade Paralisia facial Pseudo-hipoparatireoidisimo Psicopatia Psicose de Korsakoff Radiagao (terapéutica, craniana) Rinossinusite/polipose Sindrome da delesao de 22411 ‘Sindrome das pernas inquictas Sindrome de Asperger Sindrome de Bardet-Biedl Sindrome de Cushing Sindrome de Down Sindrome de Sigren Sindrome de Usher Tabagismo. Transtorno afetivo sazonal Transtorno de estresse pés-traumitico Transtorno do panico Transtorno obsessivo-compulsivo Traumatismo craniencefélico Tremor ortostatico causas identificdveis mais comuns de perda de olfato duradoura ou permanente observadas na clinica sao, em ordem de frequéncia, infecgdes respiratorias graves do trato superior, traumatismo craniano e rinossinusite crénica. A base psicolégica para a maioria das perdas relacionadas ao traumatismo craniano ¢ 0 rompimento ¢ a subsequente cicatrizagao dos filamentos olfatérios quando passam da cavidade nasal para o interior da cavidade cerebral. A perda do olfato nio precisa ser acompanhada de fratura ou patologia da placa cribiforme. A gravidade do trauma, relacionada a uma fraca Escala de Coma de Glasgow na apresentagdo e a extensdo da amnésia pdés-traumatica, esté associada a um risco mais elevado de comprometimento olfatério. Menos de 10% dos pacientes com anosmia pés-traumatica ird recuperar a funcionalidade normal relacionada com a idade ao longo do tempo. Esse fato eleva para aproximadamente 25% aqueles com perda inferior a total. As infecgdes respiratérias do trato superior, como aquelas associadas 4 gripe comum, influenza, pneumonia ou HIV, podem comprometer direta e permanentemente o epitélio olfatério pela redugdo do numero de células receptoras, danificando os cilios das células receptoras restantes e induzindo a substituigdo do epitélio sensorial pelo epitélio respiratorio. A perda de olfato associada a rinossinusite crénica esta relacionada 4 gravidade da doenga, com a maior perda ocorrendo nos casos em que esto presentes tanto a rinossinusite quanto a polipose. Embora a terapia sistémica com glicocorticoides possa geralmente induzir uma melhora funcional tempordria, ela nao restabelece, em geral, os niveis normais do teste olfatério, implicando na presenga de perda neural permanente crénica e/ou e no fato de que a administragao transitria de glicocorticoides sistémicos ndo debela completamente a inflamagio. Sabe-se que a microinflamagao de um epitélio, aparentemente normal em outros aspectos, pode influenciar a fungdo olfatéria. Diversas doengas neurodegenerativas sao acompanhadas de comprometimento olfatério, incluindo DP, DA, doenga de Huntington, sindrome de Down, complexo parkinsonismo-deméncia de Guam, deméneia de corpos de Lewy (DCL), atrofia sistémica miltipla, degeneragdo corticobasal ¢ deméncia frontotemporal; a perda olfatéria também poderd ocorrer na esclerose miltipla (EM) e no distirbio comportamental idiopatico do sono REM (DCRi). O comprometimento olfatério na DP geralmente precede o diagnéstico clinico em pelo menos quatro anos. Em casos simulados, estudos da sequéncia de formagao de agregados anormais de a-sinucleina e de corpos de Lewy sugerem que os bulbos olfatérios podem representar, juntamente com o niicleo dorsomotor do vago, 0 primeiro sitio de comprometimento neural na DP. Em_ estudos post-mortem de pacientes com sinais de DA “pré-sintomdticos” muito brandos, 0 comprometimento do olfato tem sido associado a niveis mais clevados de patologia relacionada com a DA. A perda do olfato é mais marcante em pacientes com manifestagdes clinicas precoces de DCL do que naqueles com DA branda. E interessante mencionar que a perda de olfato é minima ou inexistente na paralisia supranuclear progressiva e no parksonismo induzido por 1-metil-4-fenil-1,2,3,6-tetra- hidropiridina (MPTP). O distirbio olfatério da EM varia em fungiio da atividade da placa nos lobos frontal ¢ temporal. A perda do olfato na DCRi da mesma magnitude da perda observada na DP. Esse fato & de particular importéncia porque pacientes com DCRi desenvolvem frequentemente DP e hiposmia. Existem algumas evidéncias de que DCRi pode realmente representar uma condicdo precoce associada a DP. O distirbio do comportamento do REM nao apenas é observado na sua forma idiopatica, como também pode estar associado a narcolepsia. Essa observagdo originou um estudo recente de pacientes narcolépticos com e sem distirbio do comportamento do REM que demonstrou que a narcolepsia, independentemente do distirbio do comportamento do REM, estava associada a comprometimentos da fungao olfatéria. A orexina A, também conhecida como hipocretina-1, encontra-se dramaticamente reduzida ou indetectavel no liquido cerebrospinal (LCS) de pacientes com narcolepsia e cataplexia (Cap. 38). Os neurdnios contendo orexina no hipotdlamo se projetam em todo o sistema olfatério (a partir do epitélio olfatorio para o cértex olfatorio), € a lesdo dessas projegdes que contém orexina pode ser um mecanismo basico para o comprometimento da fungao olfatéria em pacientes narcolépticos. A administragdo de orexina A (hipocretina-1) intranasal parece levar 4 melhora da fungo olfatéria, sustentando a nogao de que o comprometimento olfatério brando nao é apenas uma caracteristica primaria de narcolepsia com cataplexia, mas que a deficiéncia de orexina do sistema nervoso central pode representar uma etapa fundamental do mecanismo para essa perda. DISTURBIOS GUSTATORIOS A maioria dos pacientes que se apresenta com disfung%o gustatéria exibe perda olfatéria, e ndo gustatéria. Isso ocorre porque a maior parte dos sabores atribufdos a gustacdo na verdade dependem de estimulo retronasal dos receptores olfatérios durante a deglutigio. Como observado anteriormente, os botées gustatérios apenas medeiam sentidos 0s, como as sensagdes de doce, amargo, acido, salgado e umami. O comprometimento significative de toda a fung%o gustatria bucal é raro, exceto em distirbios metabélicos generalizados ou no uso sistémico de algumas medicagdes, pois ocorre a regeneragaio dos botdes gustatérios, ¢ 0 comprometimento periférico isolado acarretaria no envolvimento de miiltiplas vias dos nervos cranianos. Apesar disso, a gustag4o pode ser influenciada por (1) liberagdo de materiais que mascaram o paladar a partir da cavidade oral por condigdes médicas ou aparelhos (p. ex., gengivite, sialadenite purulenta); (2) problemas de transporte das substincias para os botdes gustatérios (p. ex. ressecamento da mucosa orolingual, infecgdes, condigdes inflamatérias); (3) lesio dos préprios botdes gustatérios (p. ex. trauma local, carcinomas invasivos); (4) lestio das vias neurais que inervam os botdes gustatérios (p. ex., infecgdes da orelha média); (5) lesdo das estruturas centrais (p. ex., esclerose miltipla, tumor, epilepsia, acidente vascular) e (6) disturbios sistémicos do metabolismo (p. ex., diabetes, doenga da tireoide, medicamentos). Ao contrario do NC VII, o NC IX esta relativamente protegido ao longo de sua via, embora intervengdes iatrogénicas como tonsilectomia, broncoscopia, laringoscopia, intubagdo endotraqueal e radioterapia possam levar a uma lesio seletiva. A les%io do NC VII geralmente resulta de mastoidectomia, timpanoplastia e estapedectomia, induzindo, em alguns casos, sensagdes metilicas persistentes. A paralisia de Bell (Cap. 455) é uma das causas mais comuns de lesio do NC VII, que leva ao disturbio gustatério. Em raras ocasides, as enxaquecas (Cap. 447) esto associadas a um prédromo ou aura gustatéria ¢, em alguns casos, os sabores podem eliciar um ataque de enxaqueca. E interessante que a disgeusia ocorra em alguns casos de sindrome da boca ardente (SBA; também chamada de glossodinia ou glossalgia), assim como boca seca e sede. A SBA esta provavelmente associada a disfungdo do nervo trigémeo (NC V). Algumas etiologias sugeridas para essa sindrome pouco conhecida sao sensiveis a tratamento, incluindo (1) deficiéncias nutricionais (p. ex., ferro, Acido félico, vitaminas B, zinco); (2) diabetes melito (predispondo possivelmente a candidiase oral); (3) alergia a dentadura; (4) irritagao mec4nica causada por dentaduras ou aparelhos orais; (5) movimentos repetitivos da boca (p. ex., degluti¢ao atipica, ranger de dentes, bruxismo); (6) isquemia da lingua resultante de arterite temporal; (7) doenga periodontal; (8) esofagite de refluxo e (9) lingua geografica. Embora tanto o paladar quanto 0 olfato possam ser contrariamente influenciados por agentes farmacolégicos, as alteragées de paladar relacionadas aos farmacos sio mais comuns. Na verdade, tem-se observado que mais de 250 medicamentos alteram a habilidade de sentir o paladar. Os principais agressores incluem agentes antineoplasicos, antibidticos ¢ medicamentos para o controle da pressdo sanguinea. A terbinafina, um antifiingico comumente utilizado, tem sido associada a distirbios do paladar que duram até 3 anos. Em um ensaio controlado, quase dois tergos dos individuos recebendo eszopiclona experimentaram uma disgeusia amarga que foi mais forte nas mulheres, sistematicamente relacionada ao tempo de administragdo do firmaco € positivamente correlacionada com os niveis sanguineos ¢ salivares do firmaco. O uso intranasal de géis ¢ sprays nasais contendo zinco, que representam uma profilaxia comum de baledo (sem receita médica) para as infecgdes virais das vias respiratérias superiores, tem sido implicado na perda da fungao olfatéria. Ainda sio necessarios mais estudos a respeito de sua eficdcia na prevengao de tais infecgdes, que representam a causa mais comum de anosmia e hiposmia. A disgeusia ocorre geralmente no contexto de farmacos usados para tratar ou minimizar sintomas de cancer, com uma prevaléncia ponderada de 56-76%, dependendo do tipo de tratamento de cAncer. Tentativas para prevenir problemas gustatérios devidos a esses farmacos que usam sulfato de zinco ou amifostina profilaticos tém se demonstrado minimamente benéficas. Embora medicamentos antiepiléticos sejam ocasionalmente utilizados para tratar distirbios olfatérios ou gustatérios, tem-se mostrado que o uso de topiramato leva a uma perda reversivel de uma capacidade para se detectar e reconhecer paladares e odores durante o tratamento. Juntamente com 0 olfato, varios distirbios sistémicos podem afetar o paladar. Eles incluem insuficiéncia renal crénica, doenga hepatica em estgio terminal, deficiéncias de vitaminas e minerais, diabetes melito e hipotireoidismo — para citar alguns. No diabetes, parece haver uma perda progressiva de paladar comegando pela glicose e, em seguida, se ampliando para outros adogantes, estimulos salgados e, depois, para todos os estimulos. Condigées psiquidtricas podem estar associadas as alteragdes quimiossensoriais (p. ex., depressdo, esquizofrenia, bulimia). Uma revisio recente sobre as alucinagées tateis, gustatérias e olfatérias demonstrou que nenhum tipo de experiéncia alucinatéria é patognoménica para qualquer diagnéstico estabelecido. Sabe-se que a gravidez representa uma condigao Unica em relagdo a fungaio do paladar. Parece haver um aumento na aversdo e intensidade dos sabores amargos durante o primeiro trimestre, que podera ajudar a garantir que a mulher gravida evite venenos durante uma fase critica do desenvolvimento fetal. Da mesma forma, um aumento relative na preferéncia pelo sal e sabores amargos no segundo e terceiro trimestres pode suportar a ingestéo mais necessdria de eletrélitos para expandir 0 volume de fluido e sustentar uma dieta variada. AVALIACAO CLINICA Na maioria dos casos, uma histéria clinica cuidadosa ira estabelecer a provavel etiologia de um problema quimiossensorial, incluindo questes sobre a sua natureza, aparecimento, duragio e padrio de flutuagdes. A perda —repentina sugere a possibilidade de traumatismo craniano, isquemia, infecgdo ou uma condigao psiquidtrica. A perda gradual poder refletir 0 desenvolvimento de uma lesio obstrutiva progressiva. Uma perda intermitente sugere a probabilidade de um processo inflamatério. O paciente devera ser perguntado a respeito de potenciais eventos precipitadores, como infecgdes virais (influenza) anteriores ao aparecimento de sintomas, porque estes normalmente so subdimensionados. Informagdes a respeito de traumatismo craniano, habits de tabagismo, abuso de drogas ¢ alcool (p. ex., cocaina intranasal, alcoolismo crénico no contexto das sindromes de Wernicke e Korsakofi), exposigdes a pesticidas e outros agentes téxicos ¢ intervengdes médicas também sdo liteis. Uma determinagao de todos os medicamentos que o paciente tomou antes e no momento do aparecimento do sintoma € importante, porque muitos podem causar distirbios quimiossensoriais. Condigdes médicas de comorbidade associadas ao comprometimento do olfato, como insuficiéncia renal, doenga _ hepatica, hipotireoidismo, diabetes ou deméncia, devem ser avaliadas. A puberdade retardada em associagao @ anosmia (com ou sem anormalidades craniofacial da linha média, surdez e anomalias renais), sugere a possibilidade de sindrome de Kallman. A lembranga de epistaxe, secregdo (clara, purulenta ou sanguinolenta), obstrugao nasal, alergias sintomas somiticos, incluindo dor de cabega ou irritago, pode auxiliar na localizagaio. Questdes relacionadas 4 meméria, sinais parkinsonianos e atividades convulsivas (p. ex., automatismos, ocorréncia de blackouts, auras e déja vu) deverao ser consideradas. Um litigio iminente ¢ a possibilidade de se fingir de doente devem ser considerados. Testes olfatérios modernos de escolha forgada podem detectar a simulagdio de doenga a partir de respostas improvaveis. Exames neurolégicos e otorrinolaringolégicos (ORLs), juntamente com os exames apropriados de imagem cerebral e nasossinusal, ajudam na avaliagdo de pacientes com queixas olfatérias ¢ gustatérias. A avaliagao neural deverd se focar na fung’o do nervo craniano, com particular atengdo as possiveis lesdes intracranianas e na base do cranio. Os exames de acuidade e campo visual e do disco éptico auxiliam na detecgdo de lesdes da massa intracraniana que induzem pressdo intracraniana (papiledema) e atrofia 6ptica, especialmente quando se considera a sindrome de Foster Kennedy. O exame ORL deverd avaliar exaustivamente a arquitetura intranasal ¢ as superficies mucosas. Pélipos, massas ¢ adesdes dos turbinados para o septo nasal podem comprometer o fluxo de ar para os receptores olfatérios, pois menos de um quinto do ar expirado atravessa a fenda olfatéria na auséncia de obstrugao. Testes séricos sanguineos podem ser de grande ajuda na identificag’io de condigdes como diabetes, infec¢%o, exposigao a metais pesados, deficiéncia nutricional (p. ex., vitaminas B, ou B,,), alergia e doengas renal, hepatica e da tireoide. Como acontece em outros distiirbios sensoriais, é aconselhdvel a realizagio do teste sensorial quantitativo. Registros orais de pacientes podem ser mal interpretados, alguns pacientes que se queixam de disfingao quimiossensorial apresentam fungao normal compativel com sua idade e sexo. Os testes quantitativos de paladar e olfato fornecem informagdes validas para a dispensa do trabalhador e outras exigéncias legais, bem como uma forma de avaliar precisamente as intervengdes de tratamento. Diversos testes padronizados para a avaliag%o do paladar e olfato estio disponiveis comercialmente, A maioria avalia a habilidade de pacientes em detectar e identificar odores ou sabores. Por exemplo, o mais amplamente utilizado desses testes, 0 University of Pennsylvania Smell Identification Test (UPSIT) de 40 itens, usa normas baseadas em quase 4.000 individuos normais. F feita uma determinagao das disfungdes absolutas (i.e., perda branda, perda moderada, perda severa, perda total, provavel fingimento) e relativa (comparagao percentual compativel com idade e sexo). Embora o teste eletrofisiolégico esteja disponivel em alguns centros de estudo dos sentidos de paladar e odor (p. ex., potenciais de odor relacionados a eventos), eles necessitam da apresentacdo de estimulos complexos e equipamento de gravagdo e raramente fornecem informagdes diagnésticas adicionais. Com excegdo do eletrogustémetro, os testes de paladar comercialmente disponiveis foram disponibilizados apenas recentemente. A maioria utiliza tiras de papel de filtro impregnadas com substdncias, de forma a nio ser necessaria a preparagao do estimulo. TRATAMENTO E MANEJO Considerando os varios mecanismos pelos quais os disturbios olfatérios ¢ gustatorios ocorrem, o controle de pacientes tende a ser especifico para cada condigdo. Por exemplo, pacientes com hipotireoidismo, diabetes ou infecgdes geralmente se beneficiam de tratamentos especificos para corrigir a doenga basica que influencia adversamente a quimiorrecepgao. Para a maioria dos pacientes que se apresenta primariamente com perda obstrutiva/de transporte afetando as regides nasais e paranasais (p. ex., rinite alérgica, polipose, neoplasias intranasais, desvios intranasais), intervengdes médicas e/ou cirtrgicas normalmente sao benéficas. Tratamento com antifiingicos e antibidticos podem reverter problemas de paladar secundarios a candidiase ou outras infecgdes orais. O bochecho com clorexidina alivia algumas disgeusias para os sabores salgado ou amargo, provavelmente como resultado de sua forte carga positiva. A secura excessiva da mucosa oral é um problema causado por varios medicamentos ¢ condigdes, ¢ os tratamentos com saliva artificial ou pilocarpina oral podem ser benéficos. Outros métodos para melhorar o fluxo de saliva incluem o uso de pastilhas expectorantes, de menta ou sem agticar. Os ativadores de sabor podem tornar © alimento mais palatavel (p. ex., glutamato monossédico), mas aconselha-se cautela para que seja evitado o uso excessivo de ingredientes contendo sddio ou agucar, particularmente em circunsténcias em que um paciente também apresenta hipertensao ou diabetes basica. Medicamentos que induzem distorgdes do sabor podem geralmente ser descontinuados e substituidos por outros tipos de medicamentos ou formas de terapia. Conforme mencionado anteriormente, agentes farmacoldgicos levam a disturbios do paladar com muito mais frequéncia do que a distirbios olfatérios, e mais de 250 medicamentos tém sido citados como responsaveis pela alteragéo do sentido do paladar. Entretanto, é importante observar que diversos efeitos relacionados com farmacos so duradouros € nao so revertidos por sua breve interrupgo. ‘Um recente estudo de cirurgia endocdspica dos seios paranasais em pacientes com rinossinusite crénica e hiposmia revelou que pacientes com disfungdo olfatéria severa anterior a cirurgia apresentaram uma melhora mais acentuada e sustentada ao longo do tempo, quando comparados com pacientes que apresentavam disfungdo olfatria branda antes da intervengdo. No caso de condigées inflamatérias intranasais e relacionadas aos seios paranasais, como as observadas na alergia, infec¢ao por virus ¢ traumas, 0 uso de glicocorticoides intranasais ou sistmicos também poderé ser de grande ajuda. Uma estratégia comum consiste no uso de uma série decrescente de prednisona oral. A utilidade de ter o olfato restaurado pelo uso de glicocorticoides tépicos ou sistémicos tem sido estudada. A administragao intranasal topica tem se mostrado menos eficaz, em geral, do que a administrac&o sistémica; entretanto os efeitos de diferentes técnicas de administragaio nasal no foram analisados; por exemplo, glicocorticoides intranasais sdio mais eficazes se administrados na postura de Moffett (cabega na posigao invertida, como por sobre a beira da cama com a ponte do nariz perpendicular ao chido). Apés traumatismo craniano, um ensaio inicial de glicocorticoides podera ajudar a reduzir o edema local e a deposigao deletéria de tecido cicatrizante em torno dos filamentos olfatérios ao nivel da placa cribiforme. Os tratamentos sao limitados aos pacientes com perda quimiossensorial ou lesio priméria das vias neurais. Apesar disso, a recuperagdo espontanea poder ocorrer. Em um estudo de acompanhamento de 542 pacientes que se apresentaram ao. nosso departamento com perda olfatria por uma variedade de causas, ocorreu uma melhora modesta em um periodo de tempo médio de 4 anos em aproximadamente metade dos participantes. Entretanto, apenas 11% dos pacientes anésmicos e 23% dos hipésmicos recuperaram a fungdo normal compativel com a idade. interessante mencionar que 0 grau de disfungdo presente no momento da apresentagdo, ¢ nao a etiologia, representou a melhor indicagdo prognéstica. Outros preditores foram a idade e a duragdo da disfungao anteriores a avaliagao inicial. ‘Um estudo nao cego mostrou que pacientes com hiposmia podem se beneficiar por sentir fortes odores (p. ex., eucaliptol, citronela, eugenol e alcool feniletilico) antes de se deitarem e imediatamente apés se levantarem, diariamente, por varios meses. A razio para tal estratégia vem de estudos animais que demonstram que a exposigao prolongada aos odores pode induzir atividade neural aumentada no interior do bulbo olfatério. Em um estudo nao controlado, o acido a-lipoico (400 mg/dia), um cofator essencial para varios complexos enzimaticos com possiveis efeitos antioxidantes, foi mostrado como benéfico na atenuagéo da perda olfatéria apés infeccao viral do trato respiratorio superior; necessdria a realizagao de estudos controlados para confirmar essa observagao. Esse agente também tem sido indicado como titil em alguns casos de hipogeusia e da SBA. O uso de zinco e vitamina A no tratamento de distirbios olfatérios é controverso, e nao parece ocorrer maior beneficio do que o restabelecimento de deficiéncias estabelecidas. Entretanto, tem sido demonstrado que o zinco melhora a fungado do paladar secundaria as deficiéncias hepaticas, e os retinoides (derivados da vitamina A bioativa) sao conhecidos por desempenhar um papel essencial na sobrevida de neurénios olfatérios. Um protocolo, no qual o zinco foi infundido em tratamentos quimioterdpicos, sugeriu um possivel efeito protetor contra o comprometimento crescente do sentido do paladar. Doengas do trato alimentar podem nao apenas influenciar a fungéo quimiorreceptiva, como também influenciar ocasionalmente a absorcdio de vitamina B,». Esse fato pode levar a uma deficiéncia relativa de vitamina B,,, contribuindo teoricamente para o distirbio do nervo olfatério. Suplementos de vitamina B, (riboflavina) e magnésio sdo aventados na literatura alternativa como adjuvantes no controle de enxaquecas, que, por sua vez, podem estar associadas a disfungao olfatéria. Como a deficiéncia de vitamina D representa um cofator da toxicidade mucocutinea induzida pela quimioterapia e da disgeusia, a adigdo de vitamina Ds, 1.000-2.000 unidades por dia, poderd beneficiar alguns pacientes com queixas olfatérias e gustatérias durante ou apés a quimioterapia. Diversos medicamentos tém sido citados como bem-sucedidos na melhora de sintomas olfatérios, embora em geral faltem evidéncias cientificas fortes de sua eficacia. Um registro de que a teofilina melhorou a fungao olfatéria nao foi controlado e n&o considerou a ocorréncia de alguma melhora significativa sem tratamento; na verdade, a porcentagem de respostas foi aproximadamente a mesma (cerca de 50%) do que a observada por outros para mostrar a melhora esponténea durante um periodo de tempo semelhante. Antiepiléticos e alguns antidepressivos (p. ex., amitriptilina) tém sido utilizados no tratamento de disosmias ¢ distorgées olfatérias, particularmente apés traumatismo craniano. Ironicamente, a amitriptilina também aparece com frequéncia na lista de medicamentos que podem distorcer os sentidos do olfato e do paladar, possivelmente devido a seus efeitos anticolinérgicos. Um estudo recente sugere que 0 uso do inibidor de acetilcolinesterase donepezil na DA, que atua no sistema nervoso central, levou ao aumento das medidas de identificagdo olfatérias que se correlacionam com impressées médicas globais nos registros de gravidade da deméncia. Terapias alternativas, como acupuntura, meditagdo, terapia comportamental cognitiva e ioga, podem auxiliar os pacientes a controlar experiéncias desconfortaveis associadas ao distirbio quimiossensorial e as sindromes de dor oral e a lidar com os estresses psicossociais em torno do comprometimento. Além disso, a modificagéo da dicta e dos habitos alimentares também é importante. Acentuando-se outras experiéncias sensoriais de uma refeig&o, tais como a textura, aroma, temperatura e cor do alimento, pode-se otimizar a experiéncia global da alimentagdo para um paciente. Em alguns casos, um acentuador de sabor, como 0 glutamato monossédico (GMS), pode ser adicionado aos alimentos para aumentar a palatabilidade ¢ a apeténcia. A higiene nasal e oral adequada e o tratamento dentario rotineiro sao formas extremamente importantes para que os pacientes se protejam dos distirbios da boca e do nariz que possam levar, em tltima andlise, aos distirbios quimiossensoriais. Os pacientes deverao ser aconselhados a nao compensar sua perda de paladar pela adigao de quantidades excessivas de agticar ou sal. O ato de parar de fumar e a interrupgaio do uso oral de tabaco so essenciais no tratamento de qualquer paciente com distirbio olfatério e/ou gustatério e deverao ser repetidamente enfatizados. Um elemento terapéutico importante e geralmente negligenciado vem do préprio teste quimiossensorial. A confirmagao ou a falta de conformagao com a perda é benéfica aos pacientes que se apresentam com a crenga, a luz de membros da familia e profissionais de satide nao capacitados, de que podem estar “loucos”. Nos casos em que a perda & menor, os pacientes podem ser informados da probabilidade de um prognéstico mais positivo. E importante mencionar que testes quantitativos localizam o problema do paciente entre a perspectiva geral. Portanto, em geral é terapéutico para um idoso saber que, enquanto sua fungao olfatéria ndo é a mesma do que costumava ser, ainda se situa acima da média do seu grupo de classificag%io. Sem a realizag%io dos testes, muitos desses pacientes simplesmente recebem a informacdo de que estdo ficando mais velhos e de que nada pode ser feito por eles, levando, em alguns casos, depressio e A redugdo da autoestima. 43 Disturbios da audicao Anil K. Lalwani A perda da audigdo é um dos distirbios sensoriais mais comuns entre os humanos ¢ pode comecar em qualquer idade. Cerca de 10% da populagdo adulta tém algum grau de perda auditiva, e um tergo dos pacientes com > 65 anos tem perdas auditivas suficientes para justificar a utilizagao de aparelhos auditivos. FISIOLOGIA DA AUDICAO ‘A flungaio das orelhas externa e média é amplificar o som para facilitar a conversdo da energia mecanica da onda sonora em um sinal elétrico pelas células ciliares da orelha interna, processo conhecido como mecanotransdugio (Fig. 43.1). As ondas sonoras entram no canal auditivo externo e colocam a membrana timpanica em movimento, que, por sua vez, movimenta o martelo, 0 estribo e a bigorna da orelha média. O movimento da base do estribo provoca alteragdes de pressio na orelha interna cheia de liquido, gerando uma onda que se estende pela membrana basilar da céclea. A membrana timpanica e a cadeia de ossiculos da orelha média atuam como mecanismo de compatibilizagio da impedancia, aumentando a eficiéncia da transferéncia de energia do ar para a orelha interna cheia de liquido. Cre tra 3 , Zo FIGURA 43.1 Anatomia da orelha. A. Ilustragdo de um corte coronal modificado passando pela orelha externa e pelo osso temporal, com demonstragaio das estruturas das orelhas média ¢ interna. B. Visdo ampliada em alta resolugdo da orelha interna. Os estereocilios das células ciliares do érgio de Corti, que estio localizadas na membrana basilar, esto em contato com a membrana tectorial e sao deformados pela onda transmitida. O ponto de deslocamento maximo da membrana basilar é determinado pela frequéncia do tom estimulador. Os tons de alta frequéncia causam deslocamento maximo da membrana basilar nas proximidades da base da céclea, enquanto, com os sons de baixa frequéncia, 0 ponto de deslocamento maximo é dirigido para o dpice da céclea. As células ciliares internas e externas do érgio de Corti tém padrées de inervagéio diferentes, mas ambas séo mecanorreceptores. A inervacdo aferente relaciona-se principalmente com as células ciliares internas, enquanto a inervagao eferente estd relacionada predominantemente com as células ciliares externas. A mobilidade das células ciliares externas altera a micromecanica das células ciliares internas, criando um amplificador coclear que explica a sensibilidade extrema ¢ a seletividade de frequéncia da céclea. A partir da céclea, a especificidade das frequéncias é mantida em todos os pontos da via auditiva central: nticleos cocleares dorsais e ventrais, corpo trapezoide, complexo olivar superior, lemnisco lateral, coliculo inferior, corpo geniculado medial cértex auditivo. Com as frequéncias baixas, as fibras individuais do nervo auditivo podem responder com maior ou menor sincronismo ao tom estimulador. Com as frequéncias mais altas, hé um bloqueio de fase, de forma que os neurénios alternam em resposta as fases especificas do ciclo da onda sonora. A intensidade é determinada pela quantidade de atividade neural em cada neurénio, pelo nimero de neurénios em atividade e pelos neurénios especificos que sao ativados. Ha evidéncias de que as orelhas direita e esquerda, assim como o sistema nervoso central, podem processar a fala de maneira assimétrica. Em geral, um som ¢ processado de maneira simétrica a partir do sistema auditivo periférico até o central. Ha, porém, a “vantagem da orelha direita” para tarefas de audigao dicética, nas quais os sujeitos devem relatar sons diferentes apresentados de forma concomitante a cada orelha. Na maioria das pessoas, hd uma vantagem de percepgdo na orelha direita para silabas formadas por consoantes-vogais, consoantes oclusivas e palavras. Da mesma forma, enquanto © processamento de sons no sistema auditivo central é simétrico com minima especializacao lateral em sua maior parte, o processamento da fala é lateralizado. Hé especializagdo do cértex auditivo esquerdo para reconhecimento e produgao da fala e do hemisfério direito para aspectos emocionais e tonais da fala. A dominancia do hemisfério esquerdo para a fala é encontrada em 95-98% das pessoas destras ¢ em 70- 80% das pessoas sinistras. DISTURBIOS DA AUDICAO A perda auditiva pode ser causada por anormalidades do pavilhao auricular, do canal auditivo externo, da orelha média ou interna, ou das vias auditivas centrais (Fig. 43.2). Em geral, as lesées do pavilhdo auricular, do canal auditivo externo ou da orelha média — que impedem a transmissdo do som do ambiente externo para a oretha interna — causam perdas da audigdo de condugdo, enquanto as lesées que bloqueiam a mecanotransducao na orelha interna ou a transmissdo do sinal elétrico pelo oitavo nervo craniano ao cérebro causam perda da audigdo neurossensorial. Trpacegae de eeure | en a Panag ao Feet alesis ag Brameese Pn rama Riecwweonon |S mea sie ame aloe adioreira ona pars ageirete ae a Gwerai) Chama — ae | nace xen) [Basremer] [Sat oF Sinvone [own zo |i Sis meine | Petia unr Tara om Boogie dor || Se seem Banner arom eee tena ecb esa mes € tes eee ee a |e iio ewe aria |jesconndease Stier Tamer artis engage . “mores Go agi portce sla Poapeniecahnanaty ty Secon rnin te FIGURA 43.2 Algoritmo para avaliagao da perda auditiva. AVE, acidente vascular encefilico; OMA, otite média aguda; RAET, resposta auditiva evocada do tronco encefilico; SNC, sistema nervoso central; PA, perda auditiva; PANS, perda auditiva neurossensorial; OMS, otite média serosa; MT, membrana timpanica. ‘Tomografia computadorizada do osso temporal. ‘Ressonincia magnética (RM). Perda da audigio de condugio A orelha externa, o canal auditivo externo e as estruturas da orelha média sfio constituidos de forma a recolher ¢ amplificar 0 som e transferir de maneira eficiente a energia mecdnica da onda sonora para a céclea cheia de liquido, Os fatores que obstruem a transmissdo do som ou reduzem a energia actistica provocam perda da audigdo de condugdo. O déficit auditivo de condugaio pode ser causado por obstrucdo do canal auditivo externo por cerume, residuos e corpos estranhos; edema do revestimento do canal auditivo; atresia ou neoplasias do canal; perfuracées da membrana timpanica; ruptura da cadeia ossicular, como ocorre com a necrose do processo longo da bigorna depois de traumatismo ou infecgdo; otosclerose; ou liquidos, fibrose ou neoplasia da orelha média. Raramente, malformagdes ou patologias da orelha interna, como deiscéncia do canal semicircular superior, displasia do canal semicircular lateral, divisio incompleta da orelha interna e aqueduto vestibular grande, também podem estar associadas A perda auditiva de condugao. A disfungao da tuba auditiva é extremamente comum nos adultos e pode predispor a otite média aguda (OMA) ou a otite média serosa (OMS). Traumatismo, OMA e otite média crénica so os fatores comumente responsaveis pela perfuragdo da membrana timpanica. Embora as perfuragdes pequenas geralmente cicatrizem espontaneamente, as falhas maiores comumente exigem intervengdo cirtrgica. A timpanoplastia € altamente eficaz (> 90%) para a reparagdo das perfuragées da membrana timpanica. Em geral, a otoscopia & suficiente para diagnosticar OMA, OMS, otite média crénica, impactagdo de cerume, perfuragio da membrana timpdnica e disfungdo da tuba auditiva; a timpanometria pode ser util para confirmar a suspeita clinica desses disturbios. O colesteatoma, tumor benigno formado por epitélio escamoso estratificado na orelha média ou na mastoide, ocorre comumente nos adultos. Essa lesdo benigna tem crescimento lento e destréi ossos e tecidos normais da orelha. Entre as teorias patogénicas propostas estio a migragdo e a invasdo pés-traumiticas do epitélio escamoso por uma bolsa de retrac4o, a implantag4o do epitélio escamoso na orelha média por uma perfurago ou um procedimento cirdrgico e a metaplasia associada a irritagdo e infecgao crénicas. Ao exame, geralmente hé uma perfuracdo da membrana timpanica, que se mostra preenchida por material escamoso esbranquigado caseoso. A presenga de um pélipo aural obscurecendo a membrana timpénica é altamente sugestiv. de um colesteatoma subjacente. Secregdo auricular crénica que no melhora com o tratamento antibistico apropriado deve sugerir colesteatoma. E comum encontrar perda da audig%o de condugdo secundaria A erosdo dos ossiculos. A intervengao cirtrgica € necessdria para remover esse processo destrutivo. A perda da audigao de condugao com canal auditivo normal e membrana timpanica integra sugere uma patologia dos ossiculos ou a existéncia de uma “terceira janela” na orelha interna (ver adiante). A fixagdo do estribo pela otosclerose & uma causa comum de perda da audigdo de condugdo para frequéncias baixas. Isso ocorre com frequéncia igual nos homens © nas mulheres ¢ & transmitido como trago autossémico dominante com penetrancia parcial; em alguns casos, esse distiirbio pode ser uma das manifestagdes da osteogénese imperfeita. Em geral, 0 déficit auditivo evidencia-se entre o final da adolescéneia e a quarta década de vida. Nas mulheres, 0 processo otosclerético é acelerado durante a gravidez, e a perda auditiva pode ser percebida

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