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EXTRATIVISMO ANIMAL EM ZONA DE FRONTEIRA AGRICOLA NA AMAZONIA (O CASO DO MUNICIPIO MACHADINHO D’OESTE - RO) José Roberto Miranda! ‘Vania da Silva Nunes' ‘Maria Fétima B. Souza! InTRODUGAO Os programas de colonizagio na Amazbnia tém chamado a atengio de cientistas, autoridades ¢ ambien- lusts para o impacto ambiental causedo por des- tkmamentos e queimadas na faiza de fronteira agricola (Miranda, 1987; Walsh, 1986). O entrativismo vegeta tem slo merecedor de grande atengio por parte destes ‘eupos, mas pouca énfase tem sido dade ao extrativismo snimal Em projetos de colonizagio, nas dreas de fronteira agricola, onde aproximadamente 70% dos colonos so tfigirios de outros eeossistemas, pouco se sabe sobre 0 txrativismo animal por eles praticado. E menos ainda sobre © impacto que exereem sobre # composiglo € estruture dos povoamentose populagdes faunisticas. Este {épico merece uma avalingio criteriosa, pois caga é uma aividade tradicional na vida das populagoes rurais, Irasleiras, destinando-se principalmente a subsisténcia dasmestnas. Neste estudo deseja-ceinvestgar a utilizago, dosrecursos cinegéticos amazdnicos por estes eolonos © 0 ‘impacto que estas aividades causam na fauna amazénica. ara fazer essa aalinglo, fo escolhido o municipio de Machadinho D’Oeste, em Rondénia (Figura 1), sur- Edo da implantagio de um projeto de colonizagio thaborado pelo INCRA, financiado pelo Banco Mundial ‘que, até 1980, possua toda sua ree Mlorestada c itacta. ‘Nérea total do municipio é de 208.000 hectares, com 2.934 bots para colonos, dstribuidos em quatro glebas com a5 segintes dimensées:gleba 01 com 48.000 ha e 602 los, {cba 02 com 71.000 ha € 1.140 ltes, gleba 03 com 49.000 hae 622 otes ¢ gleba 06 com 40.000 ha e $70 otes (Figura 2}. Existem também no municipio um niileo urbano incipel, um aeroporto, 10 nicleos urbanos secundérios, ‘ireservasflorestais (com uma érea total de 68.000ha) € ligagio vidria com a BR 364. MATERIAL E METODOS: Para a obtengio das informagées de recursos cineggsicos dentro das propriedades, foram aplicados 356 questionsrios contendo S6varidveis ta forma deuma ficha pré-codificada. Tais questiondrios eram preenchidos diretamente com proprietirios ou ocupantes dos lotes, através de entrevista. Os lotes foram escolhides de ‘maneira aleatéria ¢ amostrados de mancira proporcional, dentro de uma estratégia de progressio espago- temporal (Godron ct al, 1968; Jurdant et al, 1977). Embora a caga seja uma atividade proibida, ela é praticada pela maioria dos colonos. A fiscalizacio exer- ‘ida pelos técnicos do IBAMA, influencia na quantidade de pessous que assumem a pritica da caga dentro das glebas. Este fato faz com que 0 mimero de colonos ‘cagadores seja subestimado. Entretanto, os resultados obtidos fornecem uma imagem global da pressio de caga praticada dentro de cada gleba do municipio de Machedinho D'Oeste- RESULTADOSEDISCUSSAO A primeira constatagio a ser feita é que existem diferengas significativas na pressfo de caga exercida em ceada gleba do municipio de Machadinho D ‘Oeste (Figura 3). © extrativismo animal é mais intenso na gleba 06, ‘hogando a ser aproximadamente duas vezes superior a0 as outras. A gleba 06 € de ocupagio recente, menos desmatads, ¢ provavelmente as populagées faunbticas encontram’se em densidades maiores, 0 que pode estar relacionado com a fronteira que esta gleba faz com a forestae pela presenca das reservas Massaranduba (5.566 hie aproximedamente) c Maracatiara (9.503 ha) além de uma tercera reserva bem menor, com cerea de 549 ba, fornecendo uma quantidade considerdvel de habitats para “igura 4 mostra que no existem diferengas sig- nificativas na pressio de pesca dentro de cada glebs, sendo que entre as espécies mais pescadas destacam-se traira (Hoplias malabaricus) € 0 piau (Leporinus sp.). ‘Todavia cabe salientar que a pesca é uma atividade de média importancia, pois ela é praticada sobretudo em periodos de estiagem e visa unicamerte 0 consumo préprio dos agricultores. As respostas dadas pelos agricultores acerca de pesca, no entanto, nio devera sub- estimar a importincia desta atividade, pois ndo existe nenhum controle de apanha de peixes por parte do IBAMA. A anilise mais fina dos dados indica que o Jac. (Penelope sp.) ¢ 0 mutum cavalo (Mitu mitu) sio as aves abatidas em maior quantidade, praticamente em todas as slebas (Figura 5), seguidos pela Azulona (Tinamus ao),0 ' Nucleo de Monitoramento Ambiental ¢ de Recursos Naturais por Satélite (NMA/EMBRAPA), Sto Paulo. FOREST'90 “ae José Roberto Miranda er alii jscamin (Psophia leucoptera) ¢ os inambus (Crypturellus barker ¢ C. soui), certamente entre outros motivs, este resultado deve-se a0 sabor da carne ¢ ao porte bastante avantajado deseas espécies. E interessante notar que, na lca 01, 0 niimero de aves abatidas & se menor que nas restantes. Talver. isso se deva a uma implantagio mais antiga de colonos cagadores nesta gleba 4 baixa dinimiea de reconstituigio das populagies des- ‘Os mamiferos representam a fonte de proteinas preferida dos agricultores de Machadinho (Figura 6). As Guas espécies de roedores mais cagados pelos colonos de todas as glebas sio a cutia (Dasyprocta sp.) € paca (Agouti paca), sendo a carne desta tiktima considerada ‘uma das methores, pela populagio local. Com mamiferos, rediamente eagados pelos colonos, encontram-se as duas espécies de veado (Mazama americana © Mazama gouazoubira) € quatro de tatus (Priodontes maximus, Cabassous sp, Dasypus novencinctus, olypeutes matacus} presentes no perimetro de Machaditho. Entre os tatus,o tatu canastra (Priodontes maximus) apresenta um porte avantajado e apesar de atingir peso consideravel, de até 60 quilos, nko é cagado regularmente. ‘Tulvez isto se deva ao fato de que esta espécie apresenta ‘uma reduzida densidade populacional. As espécies de tatu mais cagadas sfo 0 tatu galinha (Dasypus novem- cinctus), cuja carne € muito apreciada, ¢ 0 tatu bola (Tolypeutes matacus) de tamanho bem mais modesto ¢ de ficil apanha, pois quando € molestado defende-se a ssumindo a forma de bola. © eateto (Tayass tajacu) € & anta (Tapicus terrestris) sio abatidos, menos freqiientemente provavelmente devido a baixa densidade das populagies. (Os vertebrades que mais atacam as culturas nas diferentes glebas sio todos mamiferos (Figura 7), sendo que trés pertencem & ordem Rodentia (cutis, paca e rato) © um & ordem Artiodactyla (veado). A maior ocorréncia de vertebrados ocorre na gleba 02, onde a pace (4 gouti ‘paca) foi mencionada por cerca de 56% dos agricultores entrevistados, seguida pela cutia citada por 49% dos agricultores. freqlente ouvir os agricultores dizerem au plantam de mein com as. cute” indiando uma forte predagio das culturas de mitho por esta espécie. resultado previsto, pois a gleba 02 possul a eee smédia de culturas anuais, que servem de alimentagio para 0s vertebrados citados e « gleba 06 possui a menor rea :média cultivada com culturas anus. A gleba 03 teve suas cculturas menos atacadas pelos vertebrados, sendo que os dos foram os mais freqentemente citados ¢ 26% dos agricultores os mencionaram. A gleba 01 teve suas cul- turas mais atacadas por ratos e veados, enquanto a gleba 06 foi mais atacada por cutias ¢ veados. AAs culturas mais citadas pelos agricultores como atacadas por vertebrados foram as anuais (milho, ma dioca, abdbora ¢ arroz) (Figura 8). Na gleba 02, 53% dos agricultores mencionam que tiveram suas cultura de abébora atacadas, seguidas pelo miho, mandioca ¢ arroz em menores proporgses. A gleba cujas culturas foram ‘menos tocadas pelos vertebrados foi a 03, mesmo assim, 0 arroz foi citado por 25% dos agricultores como alvo de predagio da fauna selvagem. Na gleba 02 verifica-se que 0 café ¢ 0 arroz sio a8 culturas mais atacadas por prapas em Machadinho D™ Oeste (Figura 9). Em contrapartida, as culturas menos stacadas por praga sio asda gleba 06, Isto também pode estar relacionado com o fato de que a gleba 02 possla maior dren media cultivada e a gleba 08 possui a menor, fespectivamente 18-468,0 ¢ 7.410,0 ha. E pertinente dleclarar que as pragasmencionadas (broca, mela, vaquin- ha, lagara, ete) sfo provocadas por virias espécis de invertebrados, devidoao tipo de levantamento feito, nfo rossivel determinar as espécies. ‘A poplilgio de Machadinho D’Oeste é compost basicamente de agrcultoresoriundos dos Estados do Sal e Sudeste, com raras exceqdes. Com tradigdes cult r6ptias¢ pouco conhecimento da Noresta, estes colonos Stam 8 recursos cinegéticas como complemento alimentar importante para sua subsistencia. Com 0 avange da fronteira agricola, relagées ecoligicascomegam a fear evidente, principal. mente no que diz respeito & mudan tlguns roedores, como a pace ¢ 8 eutia que uti culturas anuais em sua alimentagio e, por estarem préximas is moradias humanas, si faclmente abatidas Utlizadas como aimento. CONCLUSAO- tividade importante para a complementagio do aporte protéico as familias de agricultores de fronteiras agricolus, Acteditamos que ela representa cerca de 30% da proteina animal consumida pelos colonos. Osresuitadosobtidosindicam a cutia, paca. veados como os mamiferos mais cagados no municipio de Machadinho D'Oeste. Estas espécies sio igualmente os animais que mais predam as culturas anuais implantadas. Provavelmente a preferéncia de caga dessas espécies estd relacionada com seus hibitos de atacar as culturas dentro das propriedades (lotes) FOREST 90 Figura 2- Apresentacio das quatro glebas do municipio de Machadinho D'Oeste - RO. cmETO MTA we om a Knute RTC. Ww BID § Verttratos wa ceapturades dentro de cada gleba do municipio de Le A WIIWGQyQ Wy cceeetesdeeed * MLLER IIIIK;_ g José Roberto Miranda er alii AVES MAIS CAPTURADAS MAMIF EROS MAIS CAPTURADOS RE SSCCKKKK WZeeeececieigs § BRSSRRRSGRGG ae3aaagae Q LLL Ltiililees KGS “gaeaaaaaae Q Freqibéncia Relativa dos mamiferos Machadinho D'Oeste - RO eco eroertss Oeste -RO, Figura 5 - Freqiiéncia Relativa de aves capturadas dentro de cada gleba do municipio de Machadinbo D’- Figura 6. 790 José Roberto Miranda et alii VERTEBRADOS QUE MAIS ATACAM AS CULTURAS Zia KKK Figura 7 - Freqiiéncla Relativa dos vertebrados que mals atacam as culturas dentro de cada glebs do ‘municipio de Machadinko D'Oeste-RO. 8 2 ° = s s g : g > = o 2 3 Q § é waa. \ x i n 3 a ty 5 \LLLLLLLLLLLLLL 223335 0 Por vertebrados dentro de cada gleba do Figura 8 - Freqiéncia Relativa das culturas mals atacadas ‘munlefplo de Machadinho D’Oeste-RO. José Roberto Miranda et alii CULTURAS MAIS ATACADAS POR PRAGAS WLLL 7 N NZ IAs i t i i i waar maar “WH as BS ae Figura 9 -Freqincla Relativa das culturas mals atacadas por pragas deatrode cada glebe do municipio dde Machadinhoo D'Oeste - RO. RAFIA MIRANDA, EE. de. Rondonia - aterm do mito e 0 ‘mito da terra 0s colonos do projeto Machadinho. Jaguariina, SP, CNPDA/EMBR APA, 1987. 175p. IN, M; LONG, G.; LE FLOC, H.E; POIS- SONET, J; SAUVAGE, C.; WACQUANT, JP. WALSH, J. World Bank pressed on environmental (Code pour le revelé méthodique de la vegetation t da reforms, Science, 234(4778):813-815, nov. 1986. riliew. Paris: Centre National de la Recherche Scientifique, 1968. 292p. il, IRDANT, M; BELAIR, JL; GERARDINI, V. Limentaire du capital-nature: méthode de classifica- fone de cartographieécologique du teritvire. Qui: Servide des Biudes Eoologiques . 1B71. 202p. il. (Série de Clasiication Beologique ‘Territoire, 2).

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