Boletim Operário
Nº 609
O Paiz
Rio de Janeiro
22 de setembro de 1887.
Edição 1082 - Ano IV
Capa
Negro Fugido
O atual gabinete, que recuou ante os que podiam fazer-lhe
pagar caro o seu arbítrio, as suas violências, tem mostrado
singular e triste coragem de perseguir, seviciar e entrega à
vingança doas maus senhores os míseros escravos que
foragidos se acolhem a generosidade do povo desta grande
cidade. Nesta campanha, que mais tarde a história recordará
com a justa severidade com que Macaulay nos descreve as
assises sangrentas presididas por Jeffryes, de ominosa
memoria, destaca-se o porte do chefe de policia na inexorável
prática da sua impiedosa missão. Para sua Excelência o
escravo fugido é o pior dos criminosos, mais terrível do que o
assassino, mais perigoso do que o ladrão, e por isso deixa
impune o assassino, incólume o capoeira, solto o ladrão, para
empregar os seus agentes, os seus secretas, os seus capoeiras
privados, a força paga pelos contribuintes para garanti-los e
protege-los, em descobrir, dar caça e agrilhoar aqueles animais,
menos felizes do que os irracionais que tem altas personagens
para protegê-los em poderosa associação.
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Ano XII
Caxias do Sul, 01/ago/2020
Com escândalo público e ofensa a moral desta sociedade, há
dois anos que a policia da cidade é uma espécie de comissariato
para pega de negros. Valongo novo e repugnante para depósito
de escravos à conta dos senhores que balanceiam nas ultimas
gotas do suor e do sangue desses infelizes, os saldos que ainda
podem fruir. Daqui temos reclamado muitas vezes contra o
rebaixamento de um serviço publico criado e mantido para fins
justos e elevados, e os nossos reclamos e os nossos protestos
em nome da humanidade e da lei serviram apenas para registro
da desgraça das vergonhas destes tempos. Agora, como repto
as vozes generosas dos que no Senado impelem o governo a
capitular na Bastilha da escravidão, a polícia reincide na sua
perseguição contra os escravos. Continua a detenção a ser o
entreposto do tráfico. Na madrugada de ontem um grupo de
malfeitores, vulgarmente conhecidos por secretas, levaram em
carro para a estação da estrada de ferro um escravo, um
desgraçado, cujo único crime era ser vitima da cobiça de
homens maus. As desceram do carro tiraram a mordaça ao
cativo, que principiou a implorar socorro, a misericórdia de Deus,
porque já não espera piedade de seus algozes. Aos clamores do
escravo, acudiram algumas pessoas que se dirigiam à mesma
estação e então os secretas, os malfeitores policiais, atiraram-se
à sua vitima, espancando-a e dilacerando lhes as roupas. Na
estação da Estrada de Ferro, que tantas vezes tem sido teatro
da afrontosa cena, recursaram receber aquela mercadoria por
falta de origem legal, ou antes, de conhecimento em forma. Os
condutores tiveram de voltar, sempre esbordoando o escravo,
para o centro de onde tinha saído. Hoje é provável que o negro
fugido tenha voltado à justiça privada do senhor, e quem sabe
se já não expiou com a vida (para exemplo) o imperdoável crime
de procurar a liberdade. E são anarquistas e desordeiros os que
profligam tais horrores e honrados e moralizados os que os
praticam. E a senha oficial.