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SOCIOLOGIA - PROBLEMAS E PRATICAS. 2141993, pp. 59-74 Modos de vida Novos percursos e novos conceitos Isabel Guerra* Resumo: A re-emergéncia do tema modos de vida recuperando um conceito tradicio- nal na sociologia urbana (¢ nao sé) estd longe de colocar os mesmos problemas do conceito inicial de Wirth. A sua abrangéncia, e os guestionamentos que encerra so, em si, 0 maior factor de indefinigio desta nogdo que se torou um "leitmotiv” sem conteiido preciso. No entanto, este conceito, ainda hoje confuso, permite interrogar ‘5 pressupostos mais essenciais da teoria socioldgica. A proposta das andlises dos "modos de vida" ao trazer a superficie as velhas questdes da teoria sociolé; retende reconciliar, pelo menos, trés niveis analiticos ainda pouco articulados: sistema e os actores, a Histéria ¢ 0 quotidiano, e 0 objectivo ¢ 0 subjectivo na percepgao do real. Mas, a utilizago deste quadro de referéncias exige, ainda, a exploracao de novas dimensées de andlise outrora secundarizadas pela sociologia. A idemtificagao da triologia tradicional da sociologia: “priticas”, “estruturas” e “rep sentagées” acrescentam-se novas dimensdes como 0 "imagindrio social”, dimensfio prospectiva e de ruptura com o real. Este novo percurso vai exigir a elaboragao (ou re-eleboragéo) de novos conceitos, a maioria "transversais”, que se situam na eneru- zilhada de diversas ciéncias — o conceito de identidade e de projecto, por exemplo. 1. Modos de vida : uma nogao sem contetido preciso A re-emergéncia do tema modos de vida, se recupera um conceito tradicional na sociologia urbana (e nao s6') esta longe de colocar os mesmos problemas do conceito inicial de Wirth. Asua abrangéncia ¢ os questionamentos que encerra sao, em si, o maior factor de indefinigaio desta nogio. "A partir da interrogacdo sobre os modos de vida podemos "encontrar" toda a sociologia (ou quase), sem contar com uma boa parte da antropologia e da psicologia social (e talvez mesmo da demografia ou da geografia humana)"*, Questionando os fundamentos da sociologia, 0 conceito de modos de vida tomnou-se um “leitmotiv” sem contetido preciso. "0 "modo de vida" é, em larga medida, uma nocdo trivial que banaliza todo o pensamento, mesmo o mais rigoroso, jé que ndo exige nenhuma clarificagao" (Juan, 1991, p. 13). Na tentativa de encontrar definigdes mais precisas, utiliza-se hoje os conceitos de "modo de * — Docente do Departamento de Sociologia do ISCTE, investigadora no CIES e no CET 60 Isabel Guerra vida", “estilos de vida", géneros de vida/genres de vie" atribuindo-Lhes contetidos, por vezes, de referéncias contraditérias. Diga-se de passagem, que este nao ¢ um fendmeno novo em sociologia. Como lembra Lacascade (1981) 0 conceito de “modos de vida” tal como outros conceitos socioldgicos (0 de classes por exemplo), pode ser suporte, quer de um discurso ideolégico, quer de um discutso cientifico, necessitando de uma definigdo clara e sem ambiguidades. Para Juan (1991) 0 uso do conceito “modos de vida” para qualquer pesquisa empirica confronta-se desde logo com dois obstaculos que é util distinguir sobre 0 plano analitico: um obstéculo légico ¢ um obsticulo socioldgico. O primeiro diz respeito a classificacdo das praticas; unificam-se os conjuntos de priticas pelos individuos ou unificam-se os individuos por um conjunto de praticas? O obstaculo socioldgico remete para a relag’o entre as priticas ¢ a posigae social: os niveis de recursos criando oportunidades de certas praticas sociais geram estatutos sociais que sao portadores de ldgicas culturais especificadas potencialmente classificadas como “légicas de classe”? 2. Novas dimens6es e novas articulagées A proposta das anilises dos “modos de vida” ao trazer a superficie as velhas questdes da teoria sociolégica pretende reconciliar, pelo menos, trés niveis anali- ticos até ai pouco articulados: o sistema e os actores, 4 Histéria € o quotidiano, o objectivo e 0 subjectivo na percepgdo do real. 2.1, A "descoincidéncia articulada” entre o actor e o sistema Uma das principais tenses da sociologia, particularmente presente no confronto entre a sociologia espacial (ecoldgica e “estrutural”) c a sociologia da cidade (de cariz “culturalista”), 6 a que opée as capacidades individuais aos determinismos iais. Os autores desenvolvem os scus modelos tedricos ¢ empiticos, quer valorizando as praticas e racionalidades individuais, quer valorizando 0 “peso das estruturas” na determinagio das condigées individuais e nos “habitus” que elas produzem. A anilise desta articulagéo complexa entre o sistema e os actores da lugar a um dos mais interessantes debates no dominio da ciéncia social e que se situa no coragdo de diversas disciplinas sociais. Nos ultimos anos, em sociologia, o debate retoma Parsons e é desenvolvido por socidlogos de renome como Crozier (1977), Boudon (1979, 1982, 1984, 1989), Mendras (1983), Touraine (1984), entre outros. Comoescreve Mendras*: "depois de um periodo em que es sociélogos viveram fascinados pelas tendéncias pesadas que atravessaram o planeta, vem um perfodo em que eles se interessam mais pelas diversidades, pelas forcas discretas presentes Modos de vida 61 em cada segmento da sociedade. Sem se atrever a defender que ndo hd sociologia sendo dos actores individuais, esforcamo-nos para demonstrar que hé maior liberdade nas rodas da engrenagem e que o resultado das forcas globais é segmentario e, por vezes, contrdria d expectativa". Afastando-se de uma sociologia das “estruturas”, estes autores situam a sociologia no estudo dos processos de “interacgao” ¢ de “interpenetragdo” entre os "sistemas pessoais" e os “sistemas sociais”. Crozier justifica 0 seu objecto no livro — L’acteur et le systtme — dando conta de uma no continuidade entre actor ¢ 0 sistema: “Este ensaio é, antes de mais, uma reflexdo sobre as relagdes entre o actor ¢ o sistema. E, com efcito, em toro da existéncia destes dois pdlos opostos que se estrutura 0 raciocinio que fazemos. O actor nio existe fora do sistema que lhe define a liberdade e a racionalidade que pode usar na sua accdo. Mas 0 sistema nao existe sendo pelo actor, 0 tinico ente que Ihe pode dar vida ¢ mudar-lhe o sentido. E na justaposigio destas duas Idgicas que nascem os constrangimentos da ac¢ao organizada que o nosso trabalho péc em evidéncia"*, Boudon Sretoma as mesmas interrogag6es quando escreve que a atengao socioldgica "propde-se analisar as relagées complexas entre a estrutura dos sistemas de interaccdo definidos pelas instituigdes sociais e as expectativas, Sentimentos e accdes dos agentes". Do mesmo modo A. Touraine defende a reconciliagdo do sistema com os actores:”... Este livro (Le retour de l’acteur) cré que é posstvel, e necessério, definir um outro tipo de andlise, no centro da qual se coloca a ideia de ac¢do social... essencial é que a separacdo crescente do actor e do sistema qseja substituida pela sua interdependéncia, gracas a ideia de sistema de ac¢ao". © Desde hd muito que Touraine insistia no estudo dos "sistemas de accdo histérica",o que implicava "que em lugar de colocar a Sociedade na historia, é preciso colocar a histéria na Sociedade e chamar-lhe historicidade". As “estruturas" que organizam os sistemas ¢ os “modos de acgao colectiva” nao sao dados "naturais” que aparecem espontaneamente e cuja existéncia iria por si como resultado automatic de uma dinamica qualquer. Também nao so 0 fruto da soma linear das decisGes individuais. As “estruturas” sio sempre “provisorias e contingentes”, fruto das solugdes encontradas pelos actores gragas a recursos € capacidades especiticas ¢ historicamente datadas. Esta articulagao entre sistema c actor é bem enunciada por Curie (1989): "Se os homens fazem a historia é a partir daquilo que a historia fez deles, mesmo se é conyeniente ndo esquecer que, segundo J. P. Sartre, séo os homens e ndo as condi¢ées anteriores de vida que sao os autores da historia". Asestruturas e as formas de acco colectiva (mais ou menos formalizadas/ins- titucionalizadas) séo “artefactos humanos", estruturacao de um "minimo de orga- nizacdo dos campos de ac¢do social" ’. Isto significa que o sistema é 0 resultado de “efeitos de agregacao” ou de “efeitos de sistema” (Crozier, 1977) cuja légica de funcionamento nao provém directamente da racionalidade/intencionalidade dos actores individuais. 62 Isabel Guerra Se os resultados da ac¢ao colectiva sio, frequentemente, contrarios as vontades dos actores, isto nfo se deve a “natureza intrinseca” da aceSe colectiva nem aos problemas colocados pela préptia acco colectiva. Deve-se "ao modo de estrutu- ra¢ao social do campo da accao, quer dizer, ds propriedades de organiza¢do e/ou aos sistemas de acedo organizados, em sintese, ds formas de construcdo dos processos de ac¢do colectiva através dos guais estes problemas sao tratados e sem os guais néo poderiam existir, ou ndo seriam o que sao ie Mas é também esta nio coincidéncia e articulagao nao linear entre os “effets de systéme” e as decisGes individuais que esto na origem de um "determinismo bem temperado" dando "Ivear ao azar e a desordem"”, A incerteza instala-se na medida em que a acgo colectiva é fruto de decisdes de actores cujas necessidades ¢ interesses nao sdo idénticos e porque se age num campo de relagdes onde se desconhecem , em larga medida, os impactos das acgGes € o campo de relacées (¢ de logicas) dos outros actotes ‘! A indeterminagdo da dinamica dos sistemas nio minimiza a importancia do conhecimento do seu funcionamento, isto é, a importancia de compreender as suas légicas e racionalidades prdprias, interrogando o sentido social que eles repre- sentam e a que problemas tentaram responder, bem como as dificuldades e constrangimentos que provocam, Estes “efeitos de composigao” so as balizas, os constrangimentos ec 0 quadro do funcionamento da ac¢io colectiva e individual de hoje. A questo metodol6gica mais importante 6 a de escapar aos perigos de reificagao ¢ de raciocinio determinista que sempre caracterizou as andlises “estru- turalistas”. Mas serd necessdrio mudar de légica de andlise quando se passa ao estud6 das tacionalidades e decisdes dos actores? Apesar das propostas de autores como Boudon, Crozier, Touraine, esta questao esté ainda sem resposta, Se de um ponto de vista teorico se pode aceitar esta logica de interdependéncia, conflitual ¢ auténoma entre o sistema e os actores, metodo- logicamente a questo esta por responder. A capacidade de interrogar, entender e analisar, “hic et nunc”, a diversidade dos actores, individuais ¢ colectivos, cujo sistema de accdo engendrou os efeitos de agregagio, nao é facil. Ficam por responder inumeras quest6es, epistemologicamente e teoricamente pertinentes. Se se parte do pressuposto de que a sociedade é 0 “complexo efeito de agrega¢4o" de milhares de decisdes individuais, como resolver o desfasamento temporal, légico, e de poder entre estas “cristalizagées/situagdes” anteriores a0 sujeito que sao o campo dos constrangimentos da sua acgao de hoje? O individualismo metodolégico acentua a capacidade estratégica dos actores, sublinhando, simultaneamente, a descontinuidade entre as intengées individuais & 08 “efeitos de composigao” delas resultantes, que dio origem a“ produzindo uma sociedade contingente, em mutacao nao previsivel. Neste sentido, actores € sistemas, mesmo s¢ sao interpenetrados, terdo légicas diferentes e, para Boudon, parece que as instituigdes nao sio controlaveis pelos sujeitos da acgao. Modos de vida 63 Mesmo quando Touraine defende que a consciéncia historica vai de par com 0 crescimento da racionalidade dos actores néo esclarece os mecanismos de articulacao entre essa “tomada de consciéncia" individual ou colectiva que permite a uma sociedade assegurar a sua historicidade. Sendo o objecto da sociologia analisar, no as acgdes particulares, mas os fendmenos sociais a partir da representagdo de avgdes individuais e de acgdes colectivas, esta passagem entre o actor ¢ 0 sistema é, tedrica e metodologicamente, dificil para o pensamento socioldgico actual. 2.2, Historia e quotidiano: a autonomia relativa das praticas Na auséncia de uma “nova teoria da acgio social” que integre as perspectivas ¢ niveis de andlise parece ser de accitar uma descontinidade articulada entre os niveis “estruturais” e “compreensivos” de observacao do social. Dito de outra forma, na analise dos modos de vida estamos perante uma dualidade de andlise que parece opér, ainda hoje, “historicidade e quotidianeidade” (Fritsch, 1983). A descontinuidade dos niveis de andlise advém, nao apenas dos efeitos de agregagio que potencialmente opéem as racionalidades da acgao individual aos efeitos colectivos dessa mesma acedo, mas também das desigualdades de poder que, atravessando todos os niveis do social, tem uma fungdo de “determinagao” ¢ de hierarquizagao das regras de jogo do funcionamento do sistema. Os modos de vida, tal como hoje sio analisados, situam-se ao nivel da vida quotidiana. Frequentemente, a andlise do quotidiano, mesmo se relacionada com a Historia, é desvalorizada. A forma como se reduz ou se valoriza esta contradic¢ao aparente entre Historia ¢ historias individuais, e os utensilios tedricos e metodol6- gicos que se dispéem, colocam dificuldades as ciéncias sociais ¢ 4 sociologia em especial. Nao porque se trabalhe em “terra incégnita”, jd que muitos autores tentaram esta articulagéo (Lefebvre, Chombart de Lauwe, Ferraroti, Bertaux, Certeau entre outros), mas porque a oposi¢ao entre o quotidiano ¢ a Historia opera uma fractura profunda com graves efeitos na realidade social, sem que seja possivel, ainda hoje, encontrar formas de ultrapassagem dos obstdculos nesta articulacdo. © quotidiano envia para a esfera familiar ¢ privada, para as actividades de lazer, praticas de consumo, etc. Os campos do econdmico, do politico parecem excluidos deste nivel de andlise. No quadro desta dicotomia todos os que agem inseridos na dimensio da historicidade (da acumulagao e do poder) sio considera- dos como actores potenciais da Historia, inversamente os que se inserem no quotidiano (na dimensio da “reprodugio") sio considerados incapazes de agir, ou pelo menos de influenciar, a construgao da Historia. A anilise urbana foi sempre extremamente sensivel a esta dicotomia devido a sua inser¢éo no dominio do “consumo”. A separagéo entre o “consumo” e a "produgio” era fruto de uma separagdo tradicional, quer no interior da sociologia urbana, quer entre esta ¢ a sociologia do trabalho. 64 Isabel Guerra Mas a nogdo “modos de vida" abordava, uma vez mais, as relagdes aos dois niveis: a relacao entre as varid veis de andlise -— 0 economico, 0 politico, o cultural, etc., a articulacao entre os niveis de percepgio do real — o “sistémico” ¢ o "estratégico”. E, dificilmente a andlise dos "modos de vida" pode ignorar a hierarquia das redes de poder que estabelecem as articulagGes entre as diferentes “esferas” do social. No raciocinio tradicional, as pesquisas urbanas tendiam a estabelecer relagdes “imediatas” entre a “mobilizagao da forga de trabalho” e 0 "consumo". A forga de ser utilizado, o termo “reprodugiio da forga de trabalho” tinha perdido o seu sentido, tomando um sinal de pertenga intelectual ou ideolégica mais do que um modelo de andlise (Coing, 1982), Mas na sua origem esta nogdo eta entendida como o processo social pelo qual se realizava a renovagdo constante das capacidades — quantitativas ¢ qualitativas — dos trabalhadores em assegurar a producio. Esta definiggo fazia a ligagdo entre as duas dimensdes sociais de produgdo e de reprodugao social. No entanto, quando se colocava o problema da articulagao entre as “estruturas” eas “praticas” estava subjacente um conceito comum em que fepousavam ambas as andlises: 0 de relagdo social. Sendo um dispositivo basico, as relagdes sociais etam o modelo explicativo que sustentava a andlise das praticas concretas dos actores, mas sendo um conceito criticado, o seu contetido, uso ¢ validade, estava, directamente ou nao, no centro do debate. As "relagdes sociais” privilegiavam como factor explicativo das priticas sociais a insergao no “mundo do trabalho” e, ao fazé-lo, articulavam, lincarmente, quer a andlise das “estruturas” de dominagao”, quer as “priticas quotidianas”. Na sociologia urbana assiste-se, nos principios dos anos 70, a diversas tenta- tivas de articulagdo mais complexa entre estes dois niveis de andlise (Pingon, 1978, 1981, Godard, 1972. 1975, 1977 ¢ 1980). Nocntanto, ¢ comoescreve Juan’”, estes dois pélos de conhecimento do social levaram a um impasse sempre que se pretendeu analisar as priticas sociais: "a conclusdo implicita é idéntica, apesar do cardcter contraditério des modelos tedricos; os modos de vida ou seriam homogeneizados devido a pertenga de classe, ou demasiado muiltiplos e diversificados para que se possa tentar uma classifica- ¢Go formal" Aoanalisar a produgio deste periodo encontramos duas posigGes de base. Uma primeira defende que nao é possivel encontrar, nas contradigGes constitutivas das relag6es sociais, a légica social das priticas, dado que o campo da vida quoti forma um sistema especifico definido por uma légica interna de estruturagao (Godard e Culturello, 1980). Uma segunda posigdo pretendia accionar um esquema tedrico, a partir de hipdteses que petmitisse integrar a vida quotidiana como momento ¢ dimensio de uma teoria geral — a do desenvolvimento contraditorio da articulagdo entre forgas produtivas (onde o trabalho concreto e individual se inclui) e as relagdes de exploragao (Bleitrach e Chenu, 1979). Durante a ultima década, a intencao dos investigadores era a de criticar uma meta-sociologia dos processos concretos nos quais as modalidades de estruturagaio Modos de vida 65 social das praticas eram sempre dedutiveis, como efeitos empiricos, das relagdes socio-estruturais. Nao se abandona, pura ¢ simplesmente, 0 conceito de relagdo social ¢ com ele a possibilidade de pensar na determinagao social das praticas da la quotidiana, mas 0 conjunto das relagdes sociais € marginalizado através da sua passagem ao estatuto de “condigdes sociais” Estas “condigGes sociais” das praticas recuperam, na maioria das vezes, por andlise estatistica, as contradicdes “estruturais”, ndo representando sendo "factores sociais” ja dados. O sistema de praticas desliza inevitavelmente para a defesa da sua autonomizagao, mesmo que sob a forma de autonomia “condicionada”. Oestudo dos “modos de vida” encontra-se, assim, perante um dilema. Por um lado, a andlise da vida quotidiana assume a forma de uma mediagao horizontal numa légica pritica, especifica ¢ irredutivel, mas pagando 0 elevado custo da marginalizagao das contradigdes sociais que s0 intervém no estatuto de “condi- g6es” de um sistema de praticas que tendem a autonomizar-se. Por outro lado, a andlise dos modos de vida, submetendo-se a ldgica da “reprodugio da forga de trabalho", s6 adquire estatuto quando derivada do campo da interiorizagio e expresso das condigdes de exploragio e de classe. Depois da crise dos modelos tedricos, e como afirma Veltz (1983), acentua-se a interconexao entre os “modos de produgdo" e os “modos de reprodugio”. No plano conceptual esta sintese tem o enorme mérito de re-introduzir 0 processo de trabalho e os modos de vida no coragéo da economia e, ao fazé-lo, torna-se necessario discutir a articulagao entre as “praticas do trabalho" e da “vida fora do trabalho’. As pesquisas mais recentes sobre os modos de vida centram-se em dois aspectos fundamentais. Por um lado, a andlise da relagdo entre as diferentes praticas quotidianas (de trabalho, de vida familiar, de consumo, de lazer, etc.) €, por outro lado, as relages que 0 conjunto destas praticas quotidianas estabelecem com as relagGes sociais mais gerais, Embora a maioria das pesquisas nao esclarecam cabalmente as articulagdes. entre as relagées de “produgao ¢ as de reproducao social”, permitem detectar a extrema diversidade das formas de articulagao ¢ das metodologias de andlise As pesquisas feitas, quer a partir do “mundo” do trabalho, quer do ” “mundo” fora do trabalho, mostraram a complexidade das varidveis de “mediagdo” entre esses “mundos”. Pendariés (1980) sintetiza o interesse c a dificuldade desta abordagem da seguinte forma: "O objecto e o conterido de uma sociologia das praticas quotidia- nas consiste, entéo, e muito precisamente, na definicao da estrutura, da economia contraditéria e da dialéctica original desta relacdo de relaces sociais, quer dizer, na determinacdao das formas e das ldgicas dos processos concretos de trabalho, pelos quais uma unidade de vida quotidiana (individuo ou familia) elabora e transforma a convergéncia das determinacoes estruturais que focaliza num siste ma de praticas ou de modos de vida especificos e irredutiveis...A dificuldade essencial do percurso, "em duplo sentido”, aqui defendido, e 0 seu problema central, é entdo o de dar contadas modalidades segundo as quais uma determinada 66 Isabel Guerra relacdo social ou ordem estrutural (por exemplo, e em particular, as relacdes de exploracdo-repraducdo da forca de trabalho) intervém na logica individual das prdticas de um modo de vida""*. Colocar a vida quotidiana nesta dptica integradora, e de “duplo sentido’, complexifica as varidveis de andlise dado que obriga nfo apenas a considerar a complexidade das relagées entre actores € sistemas sociais, mas também a integrar no conceito de modo de vida a diversidade das redes de relagGes de poder que sao, e fazem, a vida quotidiana. Trata-se nado apenas de detectar a complexidade dos niveis ¢ varidveis presentes mas, e sobretudo, as suas hierarquias e influéncias reciprocas num mundo em mudanga. 2.3. O objectivo e o subjectivo: racionalidades e imaginarios sociais A nogiio de modo de vida, como vimos atrds, forga 4 articulagao (descoincidéncias © articulagdes entre o “actor © sistema") ¢ a integragao dos niveis de andlise (articulagao interna a que 0 préptio conceito de modos de vida ¢ forgado). Mas, a utilizagdo deste quadro de referéncias exige, ainda, a exploragdo de novas dimen- ses de anilise outrora secundarizadas pela sociologia. E, no entanto, util relembrar que, apesar das divergéncias nem sempre eviden- tes, "toda a teoria social tem uma concep¢ao do individuo e do seu papel em relacdo aos outros e em relagao ds outras instituigdes sociais ou supra-indivi- duais" '°, O “retorno do actor” traz para 0 centro dos debates as racionalidades e os afectos inerentes as praticas quotidianas. A identificagao da trilogia tradicional da sociologia: “praticas”, "estruturas” e “representag6es”, acrescentam-se novas dimensGes como o “imagindrio social”, dimensio prospectiva e de ruptura com o teal. Este novo percurso vai exigir a elaboragao (ou re-claboragao) de novos conceitos, a maioria “transversais”, que se situam na encruzilhada de diversas ciéncias — 0 conceito de identidade e de projecto, por exemplo, A maioria destas novas dimensées e conceitos pretende articular 0 “objectivo” € 0 “subjectivo” das prdticas sociais, introduzindo as “racionalidades” e os “afec- tos”. 2.3.1. Os imagindrios sociais A actual introdugdo da dimensao do imaginario social no entendimento da vida quotidiana sé é possivel porque a andlise dos modos de vida rompe com as “determinagées" estruturais e introduz 0 actor como “produtor’ do seu proprio destino e como participante de um devir colectivo. A dimensao imaginaria decorre do dominio da racionalidade da acgao social situando-se ao nivel das intengdes onde a ldgica "historica" presente nas praticas, individuais ou colectivas, parece obedecer a parimetros que nao sio apenas “objectivos” ou “subjectivos”, mas que os articulam numa dimensio prospectiva. Modos de vida 67 O que distingue 0 imaginario das representages nao € 0 seu cardcter mais ou menos “irracional”, masa ultrapassagem do “real” para o campo das possibilidades e do desejavel. E esta ultrapassagem que torna o imaginario tio transgressor, tio prospectivo e precursor da sociedade de amanha. A analise dos modos de nao pode deixar de considerar "tudo o que vale universalmente sem razdo” € que se apresenta como uma “totalidade" de referén- cia, estabelecendo "o comportamento especifico do homo sapiens”. Trabalha-se niio sobre o que estd mas sobre o desejo do que deveria estar. "Utopia experimental” "que tenta dar conta da experiéncia e do possivel, que longe das construcées abstractas e a priori, e longe da submissdo ao real e ao senso comum, explora o real realizdvel”"®, Apelando a dimensées, simultaneamente cognitivas e emocionais, “estrutu- rais” e “compreensivas”, 0 imaginario é o desenho das potencialidades do amanha. "O imagindrio de que falo ndo é mais imagem de algo. Ele é a criacdo incessante e essencialmente indeterminada, (sécio-histérica e psiquica) de figuras/for- mas/imagens, a partir das quais pode ser "qualquer coisa" . O imaginario é, assim, qualquer coisa que se “inventa”, quer se trate de uma invengao absoluta” ou de uma deslocag4o dos sentidos que sao re-investidos de outras significacées. A importancia desta dimensio na andlise dos modos de vida advém do facto de que ela reflecte: a) uma tomada de posi¢4o efectiva sobre a realidade; b) uma tensao que permite descolar do “real” para a procura do amanhi (a realizagao do seu proprio desejo); c) 0 conflito potencial entre as “praticas” e as “representa¢Ges do mundo“ e o mundo em si mesmo para a definigéo de um “novo mundo"; d) a “energia” disponivel para a concretizacao de outros (novos) projectos individuais ou colectivos. O imagindrio é, ou poderd ser, um meio eficaz de visualizar 0 mundo futuro porque projecta no campo do real as possibilidades: permite, assim, detectar as contradiges entre 0 que esti e 0 que se deseja no campo das possibilidades do amanha ~°. Segundo Maffesoli "é esta contradicdo que produz a historia", Nesta contradigao encontra-se a “energia" disponivel "que empurra de forma motriz para o conflito com a realidade...enquanto fundamento da emancipacdo revoluciondria do homem"™? Este imagindrio, utdpico, e frequentemente “irracional”, tornado " factual” nos comportamentos sociais, é dificil de analisar e deixa escapar aquilo que o define. Como escreve Barel, "na medida em que a realidade social esté sempre cheia de potencialidades que fazem e que néo fazem parte dessa realidade, parece inteli- gente tentar marcar os limites cientificos de todos os modos de investigacdo sobre esta realidade”** O nivel do imaginario dificilmente pode ser analisado directamente, mas poderd tentar reconstruir-se a partir das suas manifestagdes jé que ele surge como © “fundamento da possibilidade e da unidade de tudo o que faz a singularidade do sujeito”™. 68 Isabel Guerra O “método da convergéncia” proposto por Durand = apoia-se no retorno ao “trajecto antropolégico”, isto ¢, a "incessante troca que existe ao nivel do imagi- nario, entre as pulsdes subjectivas e assimiladoras e as intimages objectivas que emanam do meio cdsmico e social". A tinica direcgao eficaz parece ser a de seguir o trajecto biografico dos actores tentando aprender as intengées e finalidades que, nas suas sucessivas reformula- ges, parecem orientar as ac¢des. 2.3.2, Racionalidades e emocaes Em todas as pesquisas sobre a vida quotidiana encontra-se a preocupacdo em entender o grau de consciéncia dos actores sobre a condugao dos seus destinos, individuais ou colectivos. Dito de outra forma, pretende-se compreender o nivel de “racionalidade” ou de "irracionalidade” * presente nas priticas sociais. Mas, ao nivel da vida quotidiana, a racionalidade advém, simultancamente, do facto & da emogdo que 0 acompanha, A racionalidade 6, simultaneamente, razdo que decorre do objecto de conhecimento e emogio que advém do sujeito do conheci- mento. Nas propostas do individualismo metododoldgico de Boudon (1985) a racio- nalidade é sempre “negociada” porque ela é “limitada" por dois tipos de causas: as limitagdes que decorrem do “conhecimento dis situagdes” € os “efeitos” nao controlados que ela, frequentemente, produz. Recusando as decisées “en état de nature“, a fronteira entre “racionalidade” e “irracionalidade” é de dificil definigao. E necessario, segundo Boudon, contextua- lizar os factores que permitem entender a racionalidade da ac¢o social. O primeiro factor advém do facto de que "a nogdo de racionalidade sé pode ser definida em certas situagdes. Por outras palavras, a capacidade de lhe dar um sentido preciso existe em funcdo da estrutura da situacdo que se considera" >’. E nesse sentido que Juan propoe a articulagao entre praticas quotidianas e os niveis de estruturagao da historicidade. "A procura de um nivel intermedidrio de estruturagdo das praticas sé se pode fazer na articulacdo entre o actor e o sistema, quer dizer, na andlise das relacGes que o actor estabelece com a situagdo social que é também, e sobretudo, uma relagdo com o seu préprio futuro" Esta forma de compreensao da racionalidade das decisées obriga os investi- gadores a penetrar no contexto de acg4o do actor onde a pretensa “irracionalidade” de certas decisdes se torna inteligivel no universo das representagdes, mais ou menos fundamentadas, que esto na origem das praticas quotidianas. A questio sociologicamente mais pertinente (¢mais complexa) é a de entender de que forma a légica das acgdes individuais estd presente na explicagio dos fendmenos sociais, jd que estes, decorrem das primciras. Em sintese, poderd dizer-se que a racionalidade pratica inerente a vida quoti- diana decorre de trés componentes essenciais: o conhecimento, a situagGo ¢ a intencionalidade, O conhecimento diz respeito ao dominio da informagao sobre 0 contexto da acgao ¢ dos recursos disponiveis (meios) de forma a “racionalmente” definir os fins Modos de vida 69 aatingir. A situagao é, simultancamente, a dimensio estratégica dos comportamen- tos ¢ a defini¢do dos contornos (limites) da racionalidade. A intencionalidade 6 0 sentido (coguitivo e afectivo) que 0 actor atribui aos conhecimentos ¢ ds incertezas da situagao. Funciona como clemento potencial de decisiio resolvendo também 0 conflito entre conhecimento e emogao. E neste sentido que a andlise da vida quotidiana nao dispensa, nem 0 recurso 4 andlise do “sistema” que fornece o contexto, os recursos eo quadso de referéncia da acgao, nem o Tecusse a racionalidades varias que decorrem de niveis cognitivos e emocionais “integrados” na acco, 2A, Identidades e projectos 2.4.1. A identidade, um conceito sociolégico Occonceito de identidade, tal como 0 conceito de projecto, éretomado recentemente. na sociologia, na tentativa de integrar a diversidade das articulagGes e dimensGes que a analise dos modos de vida estd a exigit”’, E um conceito que pretende integrar a percepgao e a acgdo sobre o mundo articulando, ndo apenas um sistema de Tepresentagdes e de imagindrios sociais, mas também uma rede de pertengas a categorias sociais especificas. Apesar das fragilidades que este conceito ainda encerra*”, asua ripida, e muito interessante, utilizagdio nas pesquisas sociol6; tem feito “surgir” uma grande diversidade de dimensées de andlise. Nos ultimos anos a sociologia utilizava o conceito de “habitus” para se dar conta da “interiorizagdo da exterioridade ¢ exterioriza do da interioridade” que estaria na origem da explicagao das acgdes dos ujeitos > . Oconceito de “habitus”, pela sua proximidade a um esquema de interpretagdo assaz “determinista”, nao oferecia a dindmica que a recomposigao saciolégica do conceito de identidade poderia permitir °*, Hoje, 0 conceito de identidade estd a ser definido na intersecgdo entre as diferentes "teorias” sociolégicas operando a sintese entre os niveis mais interac- cionistas, etnometodologivos e praxiolgicos. As dificuldades da sua utilizagao em sociologia parecem residir, em parte, na dificil distingdo entre o que é construido pelo individuo e aquilo que ele integra como caracteristicas do meio exterior. Para Zavalloni,”> " trata-se de entender as relacées funcionais entre a consciéncia subjectiva e a identidade (identidade pessoal) ¢ os atributos sociais objectivos (identidade social)". A maioria dos autores estabelece uma distingdo entre a identidade individual ea identidade social (Turner, 1979; Codol, 1981; Taboada-Leonetti, 1981), consi- derando a primeira como "o conjunto organizado de sentimentos, representagées, conhecimentos, lembrancas e projectos face a si prprio”™* ¢ a segunda como "a referéncia privilegiada, quer a pertenca a um grupo ou a uma categoria social determinada (Tajfel, 1974) quer d determinagao pelo contexto de um "lwgar" e de uma defini¢do specifica ‘na estrutura social a qual se espera que pertenca (Knapp, 1969; Codal, 1979)" 70 Isabel Guerra Estas definigdes enfatizam a ambiguidade que caracteriza 0 conceito: a iden- tidade ¢ pessoal nas dimensGes construidas pelo sujeito como imagem de si e é social nas identificagdes que 0 sujcito integra como dimensées de pertenga social a grupos, Ora esta distingdo é bem difici) de identificar nos estudos empiricos. As pesquisas actuais defrontam-se com dificuldades em ultrapassar esta distingao classica entre 0 individual ¢ 0 colectivo de tal forma o “ser social” se estrutura no "eu" e vice-versa *°, Mas 0 conceito de identidade, apesar da sua indefinigao, ¢ das dificuldades de operacionalizagao, faz, ja hoje, parte integrante do vocabulério e dos niveis de andlise dos modos de vida. 2.4.2. Do imagindrio ao projecto A construgao da identidade faz-se num processo dinamico onde os sujeitos tem uma percep¢ao da realidade ¢ organizam os seus modos de vida num contexto balizado pelas conjunturas histéricas. O processo de construgio das identidades esta, por definicdo, em constante reformulagao. Esta dimensio temporal, de continuidade, que faz com que os modos de vida sejam entendidos como um conjunto integrado de praticas articuladas a "repre- sentagées do mundo” ¢ a “imaginarios sociais”, que ird exigir um conceito agluti- nador das logicas estruturantes das praticas. O conceito de “projecto” parece resultar dessa necessidade de reforcar a dimensao temporal de construgdo permanente de uma percep¢io do mundo e de clarificagio do lugar no mundo de cada um. Pretende-se articular as priticas sociais, como totalidades organizadas num movimento onde se reconhece, a todos, eacada um, 0 desejo de agir, em fungio dos seus objectivos, o que reforga, ainda, © reconhecimento da racionalidade intencional da acgao humana. Gilberto Vetho”’ defende que o conceito de projecto permite escapar aos riscos de considerar as acgGes individuais como categorias residuais, fruto da soma de "acces estratégicas” dispersas. Mas ainda, segundo o autor, o conceito de projecto permite uma compreensao socioldgica da ac¢ao social como um elemento decisivo de entendimento dos ptocessos globais de transformagao da sociedade, porque ele se baseia nas acgdes racionais dos sujeitos, com vista 4 concretizagao dos seus objectivos e controlo dos seus préprios destinos. Ele distingue-se da ideia, ou da utopia, porque visa a sua concretizagéo como elemento essencial. Sendo um elemento da praxis, ¢ estando também ele em reformulacdo perma- nente, o projecto pode ser definido como "a intencdo de uma transformagao do real, guiado por uma representacdo do sentido dessa transformagao tendo em consideragdo as condigdes reais, e animando as praticas”™*. As emogGes estao ligadas aos projectos e integram-nos. "Uma sociologia dos projectos deve ser, em larga medida, uma sociologia das emocdes”®. Poder-se-d analisar os projectos, tal como as identidades, nas suas expressdes individuais ou colectivas. A possibilidade de individualizag%o dos modos de vida no cotitexto da diversidade das sociedades actuais é objecto de estudo de muitos Modos de vida 7 investigadores sociais. Estd sobejamente demonstrada a capacidade de decisio dos actores em todas as sociedades apesar da diferente valorizacao da sua individuali- dade e da diversidade dos constrangimentos das situacGes societais *°, No entanto, os projectos sao também colectivos, de grupo, de classe, de pais € 0 entendimento dos projectos colectivos sao fundamentais para a compreensio dos movimentos e mudangas sociais. "A capacidade de construir e de exprimir rojectos préprios é uma forma de distinguir os grupos sociais como unidades, com integracées diferentes, porque 0 projecto é indispensdvel para a organiza¢ao dos sujeitos em torno de interesses comuns" * As dificuldades metodoldgicas sao imensas. Como identificar os projectos quando na sua maioria nao sao “racionalizados" de forma consciente e consistente, resultando “ex-post” na "justificagdo” de um percurso de vida? Como decompor a diversidade e complexidade das contradigdes potenciais entre “representagdes do mundo”, praticas efectivas e “imagindrios” a que se aspira? Nesta perspectiva, a andlise das trajectorias, ndo apenas no seu petcurso, ritmo e direcgao, mas também como expresséo de um projecto em evolugao, é um elemento determinante de andlise. Notas 1 Vera utilizagao da nogo de modos de vida noutras disciplinas sociais em J.P, Lacascade,1981 2S. Juan, Sociologie des genres de vie: morphologie culturelle et dynamique des positions sociales, Paris, PUF, 1991, p.12. 3-H. Mendrase M. Forsé, Le changement social, Paris, Armand Colin, Coliection U, 1983, p.9. 4 Michel Crozier et Ethard Friedberg, L/acteur et le sysiéme: les contraintes de Vaction collective, Paris, Ed. Seuil, 1977, p9. 5 Raymond Boudon, La logique du social, Paris, Hachette, 1979, p.28. 6 Alain Touraine, Le retour de l'acteur, Patis, Ed. Fayard, 1984, p. 31. 7 J. Curie, "M, Crozier ou fe changement sans fins", in Dynamiques sociales et changements personnels, 1989, p. 121. 8 M. Crozier e E. Friedberg, op. cit, 1977, p.14. 9M, Crozier e E. Friedberg, op. clt., 1977, p. 16. 10 Raymond Boudon, La place du désordire, Presses Universitaires de France, Patis, 1984, pp. 165-190. 11 Para Boudon a indeterminagio tem duas fontes, uma objectiva outra subjectiva. A primeira advém “lorsque la nature d'un systéme est tlfe qu'elle laisse & certains au moins des acteurs inclus dans le systéme une autonomic telle qu’ils peuvent effectivement procéder a des choix entre des options contrastés et que les acteurs n’ont pas de préférences prévisibles par rapports 4 ces options”. A indeterminagao subjectiva resulta do facto de que as decisdes dos actores "débordent A la fois les intentions des acteurs et les capacités d’anticipation des observateurs. Ver R. Boudon e F. Bourricaud, Dictionnaire critique de sociologie, Presses Universitaires de France, Paris, 1982, pp. 160 a 163. 12 Juan, S, op. elt, 1991, p.12. 13 Ver M. Pingon, Besoin et Habitus, CSU, Paris, 1978, p.81 e seguintes. 14 Um nimero variado de pesquisas com quadros de anélise diversificades desenvolveram-se sobre- tudo no final dos anos 70. Uma anilise e confronto das perspectivas de andlise das priticas sociais uurbanas € feita por J. P. Pendariés, "De l'indédectubilité des pratiques sociales” in Familles Mobitisées — accession cla propriété du logement et notion d’effort des ménages, Université de Nice, CNRS, Nice, 1980, 2 Isabel Guerra 15 Pendariés, op. cit, 1980, p.a8. 16 N. Abercombie, Clase, estructuray conacimiento, Ediciones Peninsula, Sociologicus, 27, ledigao, Batcelona, 1982, p.84. 17 G. Durand, Les structures anthropologiques de l'imaginaire, Dunot,, Paris, 1984. 18 M. Maffesoli, La logique de la domination, PUF, Paris, 1976, p. 20. 19 C. Castoriadis, L ‘istitution ‘maginaire de la société, S* ed, Ed. Seuil, Paris, 1975, p.7- 20 A operacionalizagio deste dimensio esta muito presente no conceito de“ projecto” de que falaremos adiaate. O "projecto” é, de alguma forma, 0 imagindtio realizével e prospectivo, presente na estruturagio da vida de hoje, 21 Maffesoli, M., op. cit, 1976, p.51 22 Ihidem, p.52. 23 Yves Barel, "La reproduction sociale:itinéraire d'une recherche” in L "Homme et la Societé,n®24/25, 1973, p.216. 24 C. Castoriadis, op. eit, 1978, p.200. 25 Durand, op. cit, p., 1984 38. 26 Em Weber, o problema das causas ¢ efeitos da racionalidade é um tema central na medida em que 0 sentido subjectivo (intencdo) presente na acgao ¢ a sua justificagao causal. Os diferentes tipos de racionalidade weberianos confrontam-nos com a auséncia de “irracionalidade” na acgio. De facto, sejam quais forem as motivagdes da acg4o, a racionalidade estd sempre presente seja ela “ldgica’, “afectiva” ou “tradicional”. 27 R. Boudon, La place du desordre, 2 éme edition, PUF, Paris, 1985, p.58. 28 Juan, S,, op. eit. 1991, p.14. 29 Vera historia deste conceito ¢ os questionamentos que se colocam & sua utilizagdo em sociologia em Taboada-Leonetti, “Identité individuelle, identité collective—problémes posés par I"introduc- tion du concept en sociologie. Quelques propositions théoriques a partir de trois recherches sur Vimmigration’”, in Informations sur les Sciences Sociates, 20, (1) 1981, p. 137/138, 30 No artigo citado, Isabelle Taboada-Leonetti afirma mesmo que existe um "vazio" teérico e -metodoldgico em tomo da nogao de identidade (1. Taboada-Leonetti, 1981, op. cit., p. 137). 31 Ver em Bourdiew a definigéo inicial desta problematica e do conceito de “habitus”. P. Bourdieu, Esquisse d'une théorie de la pratique, Librairie Droz, Geneve, Paris, 1972. 32 A passagem do quadro de referéncia de Bourdieu para a sociologia urbana fol iniciaimente realizada por Michel Pingon (1978,1981). De forma genética, poderd afirmar-se que esta passagem foi realizada através de uma reducdo da andlise das “estruturas” bascada sobre as "determinagdes estruturais" ao estatuto de “condigdes sociais", 0 que permitiu a autonomizagao da anilise das “priticas sociais urbanas” mas, simaitaneamente, reduziu a capacidade de entender as atticulagdes entre “actor e sistema”, 33 M. Zavalloni, “ L’identité psychosociale, un concept a la recherche d'une science” in 8. Moscovie? (ed.), Introduction a la Psychologie Sociale, , Tome 2, Larousse, Paris, 1973. 34 J.Tumer, "Towards a cognitive redefinition of the social group” citado por J. Kasterszein, op. cit, 1981, p. 100, 35 L.Kastersztcin, "Aspects psychosociaux de l’identite”, in Information sur les Sciences Sociales, 20 (1), 1981, p. 99. 36 Sobre a conflitualidade e distincia entre a identidade individual e social ver o artigo de Taboada- Leonetti, 198), ap. cit. 37 Gilherto Velho é um socidlogo/antropélogo brasileiro que trabalha sobre as questées urbanas ha longo tempo, Ele utiliza o conceito de projecto como um conceito central na sua obra Individualismo € Cultura, Zahar, Rio de Janeiro, 1983. 38 C. Castoriadis, op.cit, 1975, p. 106. 39 G. Velho, op. cit., 1981, p. 28. 40 Um exemplo bem interessante da utilizagao do conceito de projecto, na india, é-nos dado por Louis Dumont, no seu livro, Homo aequalis, Paris, Gallimard, 1977. 0 autor estuda a génese da nocao de sujeito como categoria dominante no contexto da complexidade do problema das “castas” locsis. 41 Nesta frase, Velho sublinha a dimensdo colectiva dos projectos, dimensio que esta no centro de uma sociologia politica. Gilberto Velho, op. cit., 1981, p.143, Modos de vida 73 Bibliografia ABERCROMBIE, N,, Clase, »structura y conocimiento, Ea. Peninsula. Barcelona, 1982. BAREL, Y.," La reproduction sociale: itinéraire d'une recherche”, in L’Homme et la Société, 24/25, 1973, BLEITRACH, D.; CHENU, A., L’usine et la vie -— lutes régionales: Marseille et Fos, Francois Maspero, Patis, 1979. BOUDON, R., La logique du social, Hachette, Paris, 1979. 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