A sociologia da educagao: para qué?
Christian Baudelot
O tema que me propuseram tratar é o seguinte: “é util ou inutil ensinar a
Sociologia (em geral) e a Sociologia da Educagao (em particular) aos futuros
professores?” Esta pergunta tem sua histéria: surge nos mesmos termos em
‘que aqui se a formula, hd cerca de 80 anos na Franca, no momento em que
se cons' 76iao mesmo tempo a Sociologia Geral e a Sociologia da Educagao.
* Emile Dust, pai fundador na Franga da Sociologia em geral e da
Sociologia da educag’o em particular foi o primeiro a formulé-la. Ele
forneceu suas proprias respostas, ao mesmo tempo teéricas e praticas.
Vamos comegar esta exposic4o examinando a forma pela qual Durkheim
respondeu, em sua época, Aquela pergunta. Depois examinaremos arespos-
ta durkeiminiana 4 vista dos fatos recentes: perguntar-nos-émos se 0 auge
da Sociologia da Educacao na Franga no curso dos ultimos 20 anos levou ou
no a algumas transformagoes no funcionamento do Sistema Escolar. Com
base neste balango trataremos de precisar a natureza das contribuigSes da
Sociologia da Educag&o para a formapdo dos professores assim como seus
limites.
I
Durkheim sempre se interessou pela educagdo (...). Numerosas s4o suas
obras, cursos e conferéncias dedicados aos temas da educag4o. Numerosos
s4o os aspectos dos sistemas educacionais de que trata (ensino da moral, da
filosofia, ensino primério, secundério, historia da pedagogia na Franga...)
Sobretudo, foram numerosos os publicos aos quais se dirigiu: estudantes de
Escolas Normais, professores primarios e secundarios, professores univer-
sitarios, estudantes em geral.
Durkheim, erudito e militante =
Duas razdes principais explicam.o interesse de, Durkheim por.este tema:
—paraosociélogo que era, a educacdo representava um objeto privilegia-
Teoria & Educagcdo, 3, 1991 29do: era inclusive o objeto sociolégico por exceléncia, posto que se tratava da
Socializagao Ba jovem gerag&o pelas que a precedem. Tudo era, pois, social |
na éducagao. .
idade) Tinha especial
—Durkheim era também um militante da laic
interesse em suscitar e em desenvolver uma moral laicg que fosse definiti-
yamente auténoma frente a Religido. A escola represéntava neste projeto ao
mesmo tempo um desafic consider4vel e um meio eficaz de difus4o, uma vez
que era precisamente a instituido principal de socializacdo das jovens
peragées.
Homem de ciéncia, preocupado em analisar objetivamente a realidade
social com base nos fatos, Durkheim era também um homem afetado pela
evolugdo e pela transformagdo da sociedade na qual vivia. A Sociologia que
edificava 6 tinha paraele sentido se pudesse contribuir, iluminando-a, para
esta mudanga social: “Nossas investigagdes ndo merecem uma hora de
esforgo se ndo tm mais que um interesse especulativo”.
Afé ea opinido
No espirito de seu fundador, a Sociologia da Educagao é uma disciplina
primeiro e antes de tudo destinada aos futuros professores; deve-se ensind-
la aos alunos das Escolas Normais e aos professores prim4rios; aos estu-
dantes das Faculdades e aos professores do segundo grau, vo
rincipal é de ordem prdtica: trata-se, procedendoa umaanilise objetivado
wrlonea de ensinio de 30a historia e de suas fungdes, de seus contaldes e de
seus ideais, de se obter dois resultados: - -
I. Mobilizar os professores, infundindo ou dando-lhes a fé; estas sio as
proprias palavras deDurkheimaos futuros professores doensino secundaric:
loa
..por causa do desconcerto intelectualem quese-encontra, incertoouentre
um passado que morre e um futuro ainda indeterminado, o ensino
_secundério néo demonstra a mesma Vitalidade, o mesmo ardor de viver,
que antigamente. A velha fé na virtude persistente das letras cléssicas est&
definitivamente enfraquecida... mas, por outro lado, nenhuma fé nova veio
substituir a que desaparece. A missio de um ensino pedagégico é precisa-
mente a de ajudarna elaboragdo desta fé nova e por conseguinte na de uma
vida nova. Porque uma fé pedagégica é a propria alma do corpo que ensina
(Durkheim, 1904-5).
Mantém, na Educagao Moral na Escola Primdria, um dis: 0 préximo e
adaptado aos professores primérios: esfor¢a-se por definir starefa morabque
incumbe ao professor -primdrio na Franca contemporanea: .ensinar.ama
moral laica e racionalista, desembaragada de toda religido. Fazendo-se
sociolégica, a andlise moral pode.dar.um.fundamento-racional.a esta nova
moral que se organiza ao redor dos espiritos de disciplina, de abnegacdo, e
de autonomia.
80 Teoria & Educagao, 3, 1991
Lsoptl
2. Armar os professores de conhecimentos sobre o sistema de ensino, de
forma que eles préprios possam contribuir para transforméa-lo, com conhe-
cimento de causa.
Enecessdrio que este imenso trabalho de recriagio e reorganizagao que se
impéeseja obra domesm6 corpo que tem por miss&o fazer-se e reorganizar-
se, Nao se decreta nenhum ideal: tem que ser compreendido, amado,
querido por aqueles cujo dever é realizd-lo. Assim, pois, o mais urgente é
ajudar os futuros professores de nossos institutos a fazer-se coletivamente
uma opiniao sobre 0 que deve ser o ensino do qual sao responsaveis, os fing
que devem perseguir, os métodos que devem empregar. Pois bem, para isto
nao ha outra forma sendo a de pé-los em presenga dos problemas que se
colocam e das razées pelas quais se colocam, a de pé-los nas maos todos os
elementos de informagdo que possam ajudé-los a resolver estes problemas,
que possam guiar suas reflexdes pela via de um ensino livre... (Durkheim,
1938).
Uma fé nova para fazer funcionar 0 sistema; ter com que fazer-se uma
ido, para transformé-lo, tais s4o os servicos prdticos atribufdos a
: Sociologia da Educagdo por seu fundador.
Durkheim era aomesmo tempo eruditoe militante. Nomomentoem que
se institufa de forma dificil o sistema escolar que funcionaria ao longo da
terceira e mesmo da quarta Republica, atuou com energia, em companhia
de F. Buisson, L. Liard, E. Lavisse, para definir os objetivos e para dotar a
seus professores da formag4o intelectual e moral que lhe parecia melhor
adaptada a suas tarefas: moral laica fundada no conhecimento sociol
e histérico da sociedade e do sistema de educacao. Os professores deverdo
encontrar, nestes o col s. objetivos, elementos para guiar.sua apo,
esclarecer as mudangas e as transformagées que se imponham. Forjar-se
também esta “nova fé” que lhes faltava.
Durkheim, como sociélogo, conhecia a resisténcia que oferecia a reali-
dade social a quem queria modific4-la contra a corrente: “um fato”, dizia,
“no se muda por um malabarismo, mésmo quando seja desejavel”. Homem
de progresso e militante da laicidade, deseja que sua “sociedade volte a
tomar consciéncia de sua unidade organica” e reclamava “as mudangas cuja
necessidade se sente vivamente mas cuja natureza s6 se entrevé vaga-
mente”. Racionalista, enfim, estava convencido de que o sociolégo poderia
contribuir para essas mudangas produzindo o conhecimento objetivo do que
ele chamava “a verdadeira Natureza da Sociedade”, isto 6, “o estado da
sociedade tal e como se apresenta realmente”; este estado opde-se A “manei-
ra pela qual a sociedade se concebe a si prépria”. A sociologia devia, entdo,
introduzir no desenvolvimento'da sociedade uma “mais alta consciéncia de
si”, substituindo representagdes verdadeiras e representagées falsas.
A pergunta formulada: “E til (ou imitil) ensinar a Sociologia da Edu-
cap4oaos futuros professores?”, E. Durkheim respondeu SIM;e inclusive ele
Teoria & Educagdo, 3, 1991 31proprio organizou este ensino depois de havé-lo concebido e ministrado
pessoalmente.
UH
Passaram-se oitenta anos; a Sociologia da Educagao entrou em letargia na
&poca do entre-guerras; sé voltia a renascer nos anos sessenta com, por um
lado a Pesquisa de LINED (Girard, Bastide) sobre a entrada na classe de
sexta e o acesso de uma coorte de estudantes, e por outro lado, a publicagao
de Les Héritiers por Bourdieu e Passeron. A conjuntura modificou-se desde
Durkheim, a Sociologia da Educag4o também. No se trata j4 de por em
SY) pratica a escola da Republica, mas pelo contrrio, de confrontar_o que
pretende ser (a escola para todos) como que é (a escola para alguns): a
Sociologia moderna da Educagao nfo se atribui uma voca¢do construtiva,
como a de Durkheim; é antes uma fungo critica a que exerce.
Uma sociologia do aluno
— -
rm Oessencial paréQurkheimna escolaeramos objetivoseosideaisdosistema
\ | educacional,.os valores e sua transmissdo, amoral e a pedagogia. Interessa- ,
| va-se muito pela instituic¢ao, um pouco pelos professores, quase nada pelos
& estudantes, a ndoser como pedagos de cera virgem aserem modelados.Pelo
contrdrio, s4o os estudantes que ocupam o centro desta nova Sociologia da
Educaedo: os estudantes, tal e como sao, é nad ja es Heverion sD Os} Z
estudantes, na diversidade de suas origens de classe, eidade de
seus resultados escolares, nas divergéncias de seus destinos sociais.
publico escolar est dividido; a origem de suas divisdes encontra-se no
exterior da escola, na divisdo da sociedade-em classes. Porque proyém de
meios sociais diferentes e porque ocupardo postos diferentes na divisio
social do trabalho, os diferentes. grupos de estudantes.ndo manterdo as
mesmas relagdes com a instituigdo escolar; a escola, por sua vez, nao os
tratar4 da mesma maneira.
“” Kis aqui a contribuigao fundamental desta nova Sociologia da Educagao:
_uma andlise de classe realizada no interior da escola. Girard e Bastide
descrevem a eliminagdoe arelegacdo dos filhos de camponeses e de oper4rios
ao longo do segundo ciclo; C. Grignon, a formacdo dos futuros operarios
qualificados no Colégio de Ensino Técnico, assim como as relagées dos
futuros operdrios e filhos de operdrios na escola e em seu futuro; Bourdieu
e Passeron demonstram que, longe de constituir um meio homogéneo, os
estudantes mantém com a cultura e o mundo escolar relacées diferentes e
que o princfpio destas diferengas deve ser buscado na diversidade das
origens de classe. Muitos outros ‘depois“deéles segiiirao a mesma andlise:
compreender e explicar 0 que ocorre na escola, desde a escola maternal até
a universidade, a partir do que ocorré’fora déla na divisdo da sociedade em
32 Teoria & Educagao, 3, 1991classes e nos antagonismos que resultam disso, tal é, afinal de contas, o
espirito comum da imensa maioria dos trabalhos recentes de Sociologia da
Educagao.
Uma sociologia das relagdes sociais de classe
Esta orientago cientifica comum pode acompanhar as divergéncias entre
os autores sobre a significagdo dos resultados ou sua explicacdo. Alguns
Justificam as desigualdades sociais ante a escola em nome da ideologia do
dom ou da meritocracia, outros as denunciam em nome da justiga; outros
véem nelas a lei implacdvel da reprodu¢do da sociedade. Estas divergéncias
podem ter parecido capitais; alimentaram numerosos e vigorosos debates.
Oessencial pode ser que esteja em outra parte: no fato de que em todas estas
andlises encontra-se uma mesma varidvel: a categoria sécio-profissional,
figura estatistica da classe social. E esta vari4vel estatistica esua aplicagao
Por todos os autores o que confere hoje sua unidade A Sociologia moderna da
Educagdo na Franga. E a raz&o pela qual, os resultados acumulados pelos
diferentes socidlogos revelam-se, afinal de. contas, amplamente acumuldveis,
, apesar da heterogeneidade das correntes tedricas ou ideolégicas A que se
filiam. Algo que merece ser assinalado pelo que pode ser uma excecdo em
Sociologia.
Corneille e Racine
A uma sociologia durkheimiana, corneilliana e otimista da instituigao
escolar que se trata de por em funcionamento, sucede, pois, uma sociologia
mais raciniana dos estudantes tal e como sdo, na diversidade e nas con-
tradigses de suas trajetérias sociais. Esta Sociologia conheceu.um vivo. auge
na Franga desde 1960 até hoje; seus resultados tam sido amplamente
comentados e debatidos; o ensino da Sociologia da Educacdo implantou-se
em toda parte; esta disciplina é ensinada especialmente nas classes de
psicopedagogia nas Escolas Normais.
Faz vinte anos que a Sociologia da Educacao existe novamente na Franca
e seus resultados s4o objeto de uma ampla difusdo, em particular entre os
professores e os pais de alunos.
Legitimidade de um balango
E possivel medir seu impacto? Todos estes conhecimentos acumulados
levaram a alguma transformacdo no funcionamento de nosso aparato
S escolar? Esta pergunta pode parecer descabida; é, no obstante, legitima. O
tacionalismo de Durkheim (saber para prever e poder) e'seu militantismo
social (mudar a Sociedade) no so completamente alheios aos socidlogos de
hoje, apesar do que possam dizer. A preocupacao militante de lutar contra
Teoria & Educacao. 3. 1991 33as desigualdades sociais, colocando-as em evidéncia e a necessidade cientt-
fica de conquistar o conhecimento objetivo contra as representagées que 0
deformam constituem a ética comum de todos os socidlogos. Animados pelos
mesmos preceitos de Durkheim, os socidlogos da educapo de hoje podem ser
interrogados sobre a eficacia de seus trabalhos. Nos vinte anos desde que_
existem e que seus trabalhos so difundidos e discutidos, acabaram eles (ou
cornecaram) por mudar algo na escola? Serd em funcao deste balanco que se
poderd decidirse é util (ou ndo) ensinar a Sociologia da Educacao aos futuros
professores.
UI
Como a abordagemessencial fazreferéncia as diferencas de classe, vamo-nos
limitar a este aspecto da questao. Alguns fatos:
A coisa varia...
A escolarizac4o obrigatéria ampliou-se; a idade média referente & sada da
_ escola elevou-se para todas as categorias sociais. A estrutura dos diplomas
modificou-se: sAo menos os que ndo tém diploma e certificado de estudos;
mais, muito mais os diplomas de ensino superior. Forte crescimento dos
titulares de um diploma de Ensino Técnico Curto, débil aumento dos
diplomados no ensino técnico longo. Em resumo, a escola 6, aparentemente,
uma coisa que funciona: a escolarizac4o amplia-se e os diplomas de nfvel alto
crescem como cogumelos; é a cispide da piramide que se alarga.
Democratizapao? Atengao para a definig4o! Quando se fala de demo-
cratizacao, quer se trate de um esporte (0 ténis, por exemplo), quer se trate
do ensino, confudem-se geralmente dois fendmenos: a extens4o numérica do
pubblico e a evolugdo de sua composi¢ao social. Se em nossa Sociedade, a
igualdade de acesso a certos bens (consumo médico, vinhos finos...) traduz-
s@ por um crescimento da clientela, o inverso esta longe de estar assegurado.
Um esporte burgués, 0 ténis, pode desenvolver-se, nao porque adquira
adeptos em outros meios, mas porque a burguesia e a pequena burguesia
fazem-se mais numerosas ou mais esportivas, ou as duas coisas a0 mesmo
tempo. Em todos estes casos,.a banalizac4o do acesso ndo traduz em absoluto
uma igualdade social das oportunidades.
E exatamente o que ocorre no ensino.
mas é a mesma coisa!
De fato:
1)0 que nao mudou, ou muito pouco, é o acesso aos diferentes diplomas
das criancas procedentes das diferentes classes saciais: os filhos de operarios
¢ de camponeses permanecem macicamente relegados ao grupo dos sem
34 Teoria & Educagdo, 3, 1991
*diploma, ao C.E.P. (Certificado de Estudos Prim4rios) e ao C.A.P. (Certifi-
cado de Habilidade Profissional) e a outros diplomas do ensino curto; os
filhos dos quadros médios e superiores acedem sem dificuldade ao ensino
superior.
E verdade que a universidade acolhe hoje a um pouco mais de filhos de
operdrios que ontem, 1960: 0,5% dos filhos de operdrios acedem & univer-
sidade. 1976: 4,3%. A situacdo dos filhos de operdrios frente 4 universidade
melhorou, sem duvida, entre as duas datas. S6 que tantoem 1960 quantoem
1976aimensa maioria dos filhos de operdrios (99,5%no primeirocaso, 95,7%
no segundo) s4o exclufdos da universidade. Entre estas duas datas algo
fundamental mudou para os filhos de executivos e de profissionais liberais.
Em 1960, a universidade s6 estava aberta a uma minoria deles (37,7%); em
1976, o ensino universitario est4 aberto A imensa maioria deles: 71,8%.
~ Conseguiram, pois, entre as duas datas a seguranca de ir & universidade, o
que seus antepassados ndo conseguiram. Fundamentalmente nada mudou
entre estas duas datas para os operdrios; para os membros do pessoal
dirigente algo essencialse produziu(Baudelot et al., 1981). Nauniversidade, |
neste caso, ocorre 0 mesmo que nas aulas de ténis.
2)0 que tampouco mudou é a correspondéncia entre nivel de diplomae e
emprego: os mesmos diplomas d4o acesso aos mesmos empregos e 208
mesmos status sociais. Em 1980, 71% dos titulares de um ensino curto s40
oper4rios, Tal pai, tal filho, diz o provérbio: tal diploma, tal status, diz o
socidlogo, e se trata de uma relagdo estdvel que ndo mudou. Todos os
discursos mantidos hoje sobre a desvalorizacdo dos diplomas desconhecem.
os fatos.
Demonstramos em nosso livro sobre os estudantes e a ultima pesquisa
do INSEE (Instituto Nacional de Estatistica) sobre a formagdo profissional
confirma inteiramente esta tendéncia: “A distribui¢do das -freqiiéncias de
acesso as diferentes categorias sociais manteve-se relativamente estdvel
para os diplomas e os fluxos de saida desenvolveram-se mais, isto 6, os do
ensino superior e os do ensino curto”.
3)Quanto ao professor, aqui, sim, h4 uma mudanga. A origem dos
professores e professoras do primdrio modificou-se sensivelmente. Entre
1950 e 1975, o corpo magisterial feminizou-se muito, se se pode expressar
desta forma. Decadadez docentes,citosdomulheres. Esta feminizagao veie
acompanhada de uma elevacdo de sua origem social: somente 18% das
professoras da regido parisiense tém um pai operdrio ou camponés. As duas
tergas partes das professoras procedem da burguesia ou da pequena burgue-
sia. Nos anos 60, de cada dois professores, menos de um tinha esta
procedéncia. Quanto aos cénjuges das professoras, de cada trés, dois s40
quadros médios ou superiores. Quase nunca oper4rios (Berger, 1979).
4)Em 1979-80 um filho de operdrio especializado tem dez vezes mais
possibilidades de repetir seu primeiro ano de escola primaria que um filho
ou filha de médico,
Teoria & Educagdo, 3, 1991 355)Por fim, a generalizagdo da escolarizacéo e a tendéncia a elevar 0
ndmero dos diplomas nao deve fazer-nos esquecer o ntimero importante de
jovens que saem do sistema escolar sem nenhum diploma ou provides
unicamente de diplomas que nao servem para nada; 509.000 rapazes e
458.000 mocas entraram desta forma no mercado de trabalho entre 1972 e
1977. Seus efetivos aproximam-se daqueles dos diplomados em ramos do
ensino técnico curto. A prolongac4o da escolaridade nao veio acompanhada
—linearmente — por uma elevag4e das qualificaches.
Em resumo, a difusdo de uma Sociologia de Educacao de esquerda, hostil
a perpetuario das desigualdades-soeaik “miao_parete_haver
modificado sensivelmente.o.estado dosistema.-Hoje, como ontem, a divisdo
de classes exécuta seu trabalho na escola e pelaescola. Perguntar-se, a vista
do balango precedente, se estas desigualdades aumentaram ou diminufram
nao tem nenhum sentido. Continuam sendo principais.
Devemos pois concluir que a Sociologia da Educacdo no serve para nada,
uma vez que nao consegue vencer as desigualdades que combate? E comple-
tamente inutil ensind-la aos futuros professores e as futuras professoras
nessas condigdes? Mais valeria a pena, talvez, substitui-la pela Histéria da
Arte ou por cursos especializados de arqueologia bizantina estrutural. Vale
a pena formular a quest4o, uma vez que neste momento o interesse dos
professores pela arqueologia bizantina estrutural teria ao menos a vanta-
gem de ndo diminuir seu moral e de interess4-los positivamente por coisas
apaixonantes, uma vez que lendo os livros modernos de Sociologia da
Educag4o, os professores podem com razdo formar um sentimento de
impoténcia, de fatalidade e de culpabilidade.
Este nao 6, certamente, nosso ponto de vista. E certo que esta observagao
estimula a moderar o otimismo durkheimiano que fazia do “conhecimento
verdadeiro” a condigdo necessaria e quase stifi¢ierite ‘da mudanga no bom
sentido.
O voluntarismo de Durkheim e sua crenga na éficdcia das idéias justas
(pensava que se podia mudar um sistema mudando primeiro as idéias dos
agentes) tornam-se aqui inadequados.
Iv
Este balango, amplamente negativo deste o ponto de vista da emancipacao
pela escola das classes populares, assim como desde o ponto de vista da
redugdo progressiva das desigualdades sociais, nao nos deve levar ao
des&nimo e ainda menos 4 idéia de que para nada serve ensinar esta
Sociologia aos futuros professores. Por qué?
Reconhecer este fracasso.é j4 por.si umaJicdo de Sociologia para a ado:
a realidade escolar, como parte da reatidade social, nao se muda nem pela
boa vontade dos professores.nem pelos decretos do.governo. Nao basta, como
se poderia pensar, que os professores compreendam,amem a classe operaria
36 Teoria & Educacéo, 3, 1991edesejem asalvacdo escolar de seus filhos para que desaparecam as divisées
sociais na escola. Os obstaculos encontrados nfo tém sua origem na
“resisténcia 4 mudanga dos professores” ou na “forga de inércia do sistema”:
devem-se muitomais fundamentalmente as funcées sociais reais do sistema
escolar nas sociedades burguesas. Estas fungdes, 6 necessdrio conhecé-las
e olhd-las de frente: com lucidez. A Sociologia da Educag4o pode contribuir
para isto. A escola e sua organizacdo sdo parte das estruturas pesadas da
. sociedade,
A escola capitalista divide as criangas porque 4 divisdo capitalista do
trabalho exige que os trabalhadores intelectuais sejam separados dos
trabalhadores manuais. A ‘escola capitalista forma cerca de 20% de tra-
balhadores intelectuais e cerca de 80% de individuos pouco ou nada quali-
ficados porque o mercado de trabalho est4 feito desta forma. A divisdo
capitalista do trabatho, a exploragdo dos trabalhadores, a extorsdo-da mais-
valia, a desqualificag4o do trabalho, o temor do desemprego, o exército
industrial de reserva, a separacdo crescente entre trabalho intelectual e
trabalho manual, eis aqui as verdadeiras causas que permitem explicar a
estrutura e o funcionamento da escola capitalista. As razdes de sua sepa-
ragdo em duas vias de escolarizacao e a divisdo que opera entre as criancas,
énecessdrio bused-las na organiza¢ao capitalista do trabalho, istoé, forada
escola.
Pois bem, os professores nao s4o os mais indicados para aceder a esta
visdo das coisas e extrair conseqiiéncias: distanciados e protegidos das
razées da producdo capitalista, tém certa dificuldade para conceber e ainda
mais para admitir que o trabalho que se Ihes pede na escola estd de fato
regido pelo que ocorre a safda da escola, isto é, nas fabricas.
Estaé,entretanto, arealidade, etemqueser encaradade-frente..A fungio
real da escola no tem, em absoluto, como fim desenvolver harmoniosa-
mente oindividuo ou desenvolver suas qualidades pessoais; isto é um sonho
abstrato de psicélogo. Consiste, pelo contrario, em produzir para o mercado
de trabalho séries de m4o de obra mais ou menos qualificadas. F.aestrutura
do mercado de trabalho o que pesa sobre a escola com todo seu peso até ao
ponto de imprimir-lhe sua forma,
As pesquisas do INSEE permitem ter-se uma idéia mais ou menos clara.
Ao longo de um ano, 800.000 jovens aproximadamente entram pela
primeira vez no mercado de trabalho. Entre eles:
—Cerca de 75% encontram um emprego: de operdrio(42,7%), de em-
pregado(24,2%), de pessoal de servicos (6,2%) e de operario agricola (1,2%).
—18,3% sobre o mesmo mercado, com um emprego de quadro,
As outras porcentagens repartem-se entre os empresérios, 0 clero, 0
exército, a policia (3,7) € os agricultores 3,7).
Estas cifras so interessantes: expressam de forma claraa estrutura do
mercado de trabalho tal e como se apresenta hoje aos jovens que saem da
escola, De cada dez empregos, 7,5 sio empregos de trabalhadores de
Teoria & Educagdo, 3, 1991 37fabricas, de comércio ou de escritério; menos de dois so postos de quadros.
Estas cifras proporcionam-nos uma primeira medida. O que nao nos
dizem 6 que a diferenga é cada vez maior na divisdo do trabalho entre os
postos de quadro e os empregos de operdrios ou de empregados.
Assistimos a uma polarizacao das qualificagdes: por um lado, postos que
exigem um trabalho cada vez mais desqualificado, fragmentadoem milhares-
de especializagées parcelares e rotineiras, progressivamente despossuidas
de todo elementointelectual. Por outro lado, postos onde tende aconcentrar-
se a maior parte dos elementos intelectuais do trabalho, postos confiados a
minoria de individuos que receberam na escola uma formagao longa. Deve-
se ressaltar que as fungSes intelectuais tendem também a confundir-se com
as fungdes de enquadramento: os intelectuais s40 ao mesmo tempo quadros,
Desta forma compreendem-se melhor as razdes da divis4o escolar e a
necessidade, para o capital, deisolar logo uma elite a quem ser4 dispensada
uma formagdo intelectual longa, ao mesmo tempo que 0 sentimento de sua
superioridade. Compreende-se melhor por que a escola capitalista esté
dividida em duas vias de escolarizagdo: a via secunddrio-superior, encarre-
gada de recrutar, de isolar e de formar os 20% dos futuros quadros ¢ a via
primdrio-profissional, encarregada de guardar e de ocupar os 80% restantes,
destilando a conta-gotas, a uma minoria dentre eles, as qualificagdes
profissionais absolutamente necessérias.
Contra esta divis4o, 0 professor nao pode fazer nada. E-lhe imposta da’
mesma forma que 0 cardter capitalista da sociedade na qual nasceu. A
divisdo da escola capitalista em duas vias é um fato objetivo, um fato de
estrutura que s6 desaparecer4 com (e mesmo depois...) a destruigao das
relagdes capitalistas de producdo.
Esta divisdo, melhor conhecé-la e reconhecé-la que neg4-la.Longe de
conduzir ao fatalismo e’a resignagao, a Sociologia da Educac%o permite,‘ao
tontrario, aos professores distinguir, na escola, entre o que depende deles e
0 que n4o depende; entre o modific4vel e o'intransformavel; entre aterra
cultivdvel e o cimento armado. Deveria, pois, dissuadir os professores de
tentar modificar a forma do cimento armado com umaregadeira; oresultado
se conhece de antem4o: é nulo.
§, entretanto, a este trabalho de Sisifo que nos convidam todas as
palavras de ordem que atribuem a realizacao da igualdade de oportunidades
como fim da atividade progressista em Pedagogia.
Palavra de ordem democratica (a igualdade!), palavra de ordem eficaz,
uma vez que permite popularizar certos dados estatisticos, palavrade ordem
positiva, uma vez que significa que a pequena burguesia que ensina n4o se
satisfaz sem reclamar com o papel que lhe atribuiu. Mas h4 também a outra
face da moeda. Trata-se de uma palavra de ordem utépica, que ignord as
relagdes entre a diviso do trabalho e a realidadé escolar. Porque mesmo que
os 20% de trabalhadores intelectuais fossem recrutados em proporgSes
iguais em todas as categorias da popula¢do, o fundamental nado mudaria.
38 Teoria & Educacéo, 3, 1991Porqueademocracia, em boa légica, diz respeito aos 80% restantes.Ouentao
se esquece simplesmente este fatofazendocrer que umasociedade composta
quase exclusivamente de intelectuais é uma sociedade possivel e desejavel...
A existéncia do desenvolvimento da classe operdria est4 pois implicita-
mente considerada camo uma cat4strofe, mesmo se, verbalmente, se quer
reconhecer que a classe oper4ria 6 portadora do futuro da sociedade inteira.
No plano pedagégico, a ideologia da igual dade de oportunidades permite
o desenvolvimento lacrimoso da pedagogia da compensacdo: o filho de
operdrio est4 em inferioridade; cabe a escola descobrir os métodos que 0
assimilardo a um filho de intelectuais. Condenada ao fracasso na maioria
dos casos, mas assegurada por este mesmo fato, do futuro indefinido dos
trabalhos de Sisifo ou de Penélope, o empreendimento assemelha-se ao das
irmas de caridade ou ao dos missiondrios. Nao se trata-de preparar para seu
oficioe de arm4-los para luta aos filhos de trabalhadores aceitos como tais,
trata-se de dar-lhes a salvacdo, livrando-os de sua condigdo.
De fato, por muito tempo existiraa intelectuais e operdrios. A formac4o
dos operdrios efetua-se hoje negativamente sobre a base de uma selecdo pelo
, fracasso, Fazem-se operdrios.e-empregados aqueles que.se encontram, em
, um momento dado, eliminados da via destinada a formar a elite. Esta
eliminagdo comega desde a escola prim4ria. Houve uma época em que as
duas vias de escolarizag4o estavam fisicamente separadas e onde os futuros
trabalhadores recebiam uma formacdo positiva que se concretizava no
Certificado de Estudos Primérios, compromisso histérico entre a burguesia
e o proletariado da terceira Republica. Hoje, sob o pretexto da igualdade,
submetem-se todos os jovens franceses As normase as cadéncias destinadas
a formar engenheiros, médicos, arquitetos e professores. E chama-se “de-
mocratizap4o” ao crescimento progressivo dos efetivos doensino secundario
longoe curto. Concebidas e organizadas paraos filhos de quadros superiores
— desde a escola prim4ria — estas normas’e estas vadéncias operam logo
para o deslocamento de geragdo e persuadem os 20% que resistem, de sua
superioridade; os 80% que restam, de sua indignidade. Se a existéncia e a
divisdo das duas vias 6 uma obrigardo inevitavel, necessdria para a re-
produce da sociedade capitalista, a destruipao e o aniquilamento de uma
instrugdo popular de massas nao 6 numa necessidade t4o premente.
;~ Democratizar o ensino é hoje ocupar-se de melhorar notavelmente a
formacao recebida pelos mais despojados, mais que acrescentar mais ou
menos ao numero dos favorecidos. Ha, haver4 mais operdrios: mais vale
form4-los intelectualmente, profissionalmente e moralmente em seu officio
antes que persuadi-los de que se se fazem operdrios 6 porque foram
incapazes de chegar a ser engenheiros.
Democratizar o ensino é simplesmente por a escola a servico do povo,
evitando antes de tudo que os trabalhadores ndo recebam por bagagem
escolar inteira sub-produtos da instrugdo reservada aos futuros intelec-
tuais. Esta claro, entdo, que o essencial da luta situa-se na via primério-
Teoria & Educagéo, 3, 1991 89\
profissional: nao se trata de suprimir a realidade das vias de escolarizagao,
nem de tentar desesperadamente fazer entrar o maximo de alunos na via
secundério-superior, mas de Jutar ali onde os filhos dos trabalhadores e
futuros trabalhadores, eles préprios,est4o macicamente escolarizados. Esta
concepro realista, em oposigdo aos sonhos pequeno-burgueses, n4o desem-
boca em nenhuma desesperanca; porque nao é trabalho o que falta.
No fundo, o trabalho do sociélogo da educag4o’ assemelha-se ao do
cartégrafo, Levantar o mapa escolar, proceder-avtévantamento topogrAfico
do terreno e do relevo, representar na escala precisa os principais macicos
da paisagem escolar, medir os caudais dos rios, ter os mapas em dia, eis aqui
£M que 0 socidlogo da educa¢4o pode ajudar o professor. Pode ajudd4-lo a
orientar-se na jungle escolar. Ajudd-lo aorientar-se endo guid-lo. Caber4 aos
professores depois tracar, com o mapa na m4o, seus proéprios itinerdrios em
fungdo de suas opgdes e da natureza do terreno em que se encontram. Dar-
se-4o conta, entao, de que o mapa que lhes proporcionou o socidlogo est4, com
freqiiéncia, defasado e sempre impreciso quanto aos detalhes. Somente
figuram os grandes eixos; as rodovias estaduais, os caminhos locais, os
atalhos, os vaus, isto 6, as tnicas vias que interessam ao professor em seu
caminhar de todos os dias, porque sdo estes os que ele toma, estes somente
figuram de forma excepcional nos mapas. Sé so conhecidos por aqueles que
se encontram no local: foram, por outro lado, eles que os tragaram. Entre os
grandes resultados da sociologia da educac4o e o trabalho cotidiano dos
professores, a distancia 6, pois, grande; as ligdes do socidlogo ndo sdosempre
imediatamente consumiveis pelo professor,
Um mapa em grande escala de Sao Paulo ndo permite orientar-se no
Parque do Ibirapuera. O trabalho do docente no campo consiste em fabricar
itinerdrios do Parque do Ibirapuera. Convém insistir nesta questo. Esta
sociologia docartégrafo tem seus limites; e estes limites podem ser catastré-
ficos e, decerta forma, um certo mimerode mapas pode servir mais paraque
se percam os docentes que para ajuda-los a encontrar-se. Desde o momento
em que se introduz no sistema escolar uma disciplina, h4 uma reinterpre-
tagao da disciplina pelo sistema. Em particular, desde que se introduz algo
na escola, observa-se imediatamente uma divisdo entre a teoriae a pratica.
Sabe-se em que estado a sociologia da educag4o pode entrar nas escolas
normais, mas nao se sabe em que estado pode sair das escolas normais;
imaginemos opior, eo pior pode sempre ocorrer: 60 processo de escolarizacdo
da sociologia da educapao, a reprodugda com esta nova disci plina da divisdo
classicaentrea teoriae a pratica. Novértice da piramide, nas universidades,
océu dateoria, ofirmamento, osol, os fabricantes da nova teori: jada sociologia
da educacao; este sol tedrico, que nao pode vir a n4o ser do céu, gerador e
dispensador de luz vai em seguida inundar com seus raios todos os andares
do edificio escolar até os mais baixos, nas escolas prim4rias. Completamente
abaixo, nas salas de aula, os praticantes que devem assimilar a teoria que
vem do céu; e a sociologia da educacao no pode, evidentemente, menos que
40 Teoria & Educagao, 3, 1991iluminar em cada momento sua prdatica cotidiana, e os pobres praticantes
t&m que aprender tudo dos grandes teéricos. Insistir-se-ia, assim, na
colocagéo em funcionamento de uma nova hierarquia religiosa, a santa
hierarquia da sociologia da educag4o: no vértice um ou varios papas; no
vaticano universitdério, um nimero impressionante de bispos, alguns
cardeais, sacerdotes, didconos; e o povo fiel que deve.aprender a recitar, a
repetir, o evangelho que vem de cima.
Finalmente, podia-se muito bem usar a sociologia da educag4ocomo meio
de selecionar os futuros professores. Poder-se-ia propor uma série.de temas
de oposi¢do, por exemplo: “A escola capitalista est4 ou ndo composta de duas,
trés ou quatro redes?”. Tempo de resposta: trés horas. “O que é mais
importante na escola: a inculcacdo ideolégica ou a transmiss4o cientifica de
conhecimento?”. Tempo: duas horas e meia. Poderia haver exercicios es-
tatfsticos: calcular a probabilidade para um filho de operdrio cuja mae é
empregada, a avé, panificadora e o irmao, diabético, de repetir seu curso
preparatério (seis pontos), de fazer alem&o como lingua primeira (cinco
pontos) e de casar-se com uma bacharel (trés pontos). Também podem-se
formular questdes em forma de dissertaco: “Com relag4o ao aparato de
produgdo, a escola estA em uma situacdo de autonomia relativa ou de
. dependéncia relativa?” Poderfamos continuar com esta série de exercicios.
grande o perigo de pér em funcionamento uma nova escoldstica e 0 risco
é tanto maior quanto isto j4 existiu em Durkheim que dividiu cuidadosa-
mente seu ensino dispensando uma versdo muito elaborada aos futuros
docentes do ensino médio e uma versdo diluida aos futuros professores
priméarios. Hoje, na Franga, a formagao dos professores de educagao fisica
est4 vivendo este drama; nela introduziu-se uma sociologia do esporte cujos
grandes te6ricos encontram-se naturalmente no Collége de France, um
lugar especialmente importante para fabricar esportistas.
De fato, podem-se pensar outras coisas e, em particular, que o famoso
corte entre teoria e pratica nado deve ser reproduzido. De onde vem o
conhecimento em uma matéria, por exemplo, como sociologia da educacao?
Vem indissoluvelmente da pratica e da reflexao tedrica sobre esta pratica, t
Por isso, € enormemente importante, se se quer que a introducao da
sociologia da educagSo nas escolas normais seja wtil, que ndo se a ensine
como as outras disciplinas, com a teoria no céu que desce em cascata, mas
que se considere que o essencial é agir de forma que os praticos sejam
também teéricos da sociologia da educagdo e de certa forma sdo 0s mais bem
situados para conceber, por eles préprios, todo um conjunto de novos
conhecimentos e que 0 principio do conhecimento nao é em absoluto o
monopélio da teoria. Portanto, seria sumamente importante formar pro-
gressivamente os futuros docentes e ensinar-Ihes no resultados da socio-
logia da educaeao, o qual 6 alguma coisa, mas possibilitar que cheguem eles
Mesmos a serem seu prdprios socidlogos da educacda, que dispdem a partir
desse momento dos meios téoricos, técnicos é praticos, que Ihes permitam
Teoria & Educacéo, 3, 1991 41produzir conhecimento sobre o sistema escolar que sejam interessantes.
Neste momento ter-se-ia um conhecimento vivo que partiria das preocu-
pagdes da pratica e que poderia consideravelmente enriquecer os ativos da
sociologia da educacdo que s4o o estado atual das coisas, sobretudo a
ocupacio dos teéricos estritos. Que é interessante, n4oserd eu quem vA dizer
9 contrario, mas 6, ao mesmo tempo, insuficiente, Pode haver outra forma de
conhecimento sobre a educacdo que seja ao mesmo tempo teérico e pratico.
Péde-se observar, ao longo desta exposi¢do, que o socidlogo da educagao
que lhes falou saiu de vez em quando de seu papel de cartégrafo; chegou
mesmo, a propésito da democratizagao, a aconselharitinerdrios. Trata-se da
manifestagdo incontrolada de um marxismo impenitente ou, dito de uma
forma mais escolar, de um testemunho de fidelidade para com o fundador da
disciplina, Emile Durkheim, que nunca concebeu a sociologia da educagao
como um saber estritamente especulativo? Vocés devem decidir.
Referéncias Bibliogrdficas
BAUDELOT, C. et al. Les etudiants, | emploi, la crise. Paris, Maspero, 1981.
BERGER, Ida. Les instituteurs d une 8énération a t autre. Paris, PUF, 1979.
DURKHEIM, E. Introdugdo @ Evolugdo Pedagégica na Franca. Curso dado em
1904-5.
DURKHEIM, E. L évolution pédagogique en France. Paris, Presses Universi-
taires de France, 1988.
we
Este artigo foi originalmente publicado na revista espanhola Escuela de
Maestros, n? 2, 1983 (tradugao para o espanhol-de Antolin Granados Marti-
nez). Transcrito aqui coma autorizaga4o do autor. Tradugdo de Tomaz Tadeu
da Silva.
wW
42 Teoria & Educagdo, 3, 1991