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@md sxe" O ENSINO DE MATEMATICA COM INTEGRACAO DE RECURSOS DIGITAIS: um olhar sobre aulas a luz da Orquestracao Instrumental TEACHING MATHEMATICS WITH DIGITAL RESOURCES: an analysis of classes from the viewpoint of the instrumental orchestration Rosilangela Lucena’ Verénica Gitirana? Luc Trouche? RESUMO, Tendo como base a anélise de duas aulas, retratadas em video e em histéria em quadrinhos, este artigo discute a Orquestragao Instrumental como um modelo tedrico que serve como ferramenta para entender a atividade do professor ‘para integrar recursos digitais em sua pritica, tendo de organizar artefatos, sujeitos, empo, ambiente em torno de uma situagdo matemdtica em sua sala de ‘ula, A andlise foca-se nas propriedades das quatro operagBes bsicas a serem censinadas em uma aula gragas as tabelas de dupa entrada, articuladas com a linguagem algébrica, A discussda teve lugar em uma turma de mestrada com uma professora e sete estudantes. A anélise foca diferentes elementos do modelo etraz & tona um novo conceito para o modelo, as reagées ad hoc dos estudantes em eventos imprevistos. Palavras-chave: orquestragdo instrumental; reagdo ad hoc; historia em quadrinhos; propriedades das operacdes; génese instrumental. 1, Dowioranda do EDUMATEC-UFPE, E-ms 5. Profesor do lnstitute Francés de Edscasio (FL) =| 238 Ensino de Matemstic em Debate (SSN: 2358-4122, Séo Paulo, 5.3. 238-261, 2018 ABSTRACT (On the basis ofthe analysis of two classes, portrayed in video and in comic books, this paper discusses the instrumental orchestration as a theoretical model for understanding teacher 6 activity aiming to integrate digital resources into his/her practice: s/he has to manage artifacts, subjects, time, environment to implement a ‘mathematical situation in his her classroom. The analysis focuses on properties of the four basic operations to be taught ina classroom thanks to a double-entry table, articulated with algebraic language. The discussion took place in a master ‘course involving a teacher and seven students. The analysis focuses on different elements of the model and it Brings up a new concept complementing the model, the ad hoe reactions of students at unfores ven events Keywords: instrumental orchestration; ad hoe reaction; comic books; properties of the operations; instrumental genesis. Introdugio 0 modelo tesrico da Orquestragdo Instrumental (O1), desenvolvido por Trouche (2005), muito tem contribuido com pesquisas sobre o ens no de matematica em ambientes ricos em tecnologias, especialmente as digitais, Este artigo destina-se a prover o professor e a comunidade de pesquisadores com um texto, em portugués, que apresente os elementos desse modelo teérico em articulagdo a anilises de exemplos de aulas, com foco na integragdo de tecnologia digital no ensino da matemitica, O mo- delo teérico OF é relevante & prética docente com recursos, em particular com os digitais, uma vez. que o objetivo é contribuir com a aprendizagem de matematica com a tecnologia. Nossa intengdo € propiciar a apropriago de pressupostos bisicos da OI, assim como de alguns prinefpios de outros aportes teéricos que a fundamentam, advindos da Teoria da Instrumenta- 40 e danogao de esquemas, desenvolvidas pelos professores e psicdlogos, Pierre Rabardel e Gérard Vergnaud, respectivamente. A metafora ¢ 0 ensino de Matematica com suporte de tecnologias digitais Ao usar a metéfora da orquestragdo, Trouche (2004) compara a sala de aula a uma orquestra, em que o professor é o maestro, seus estudantes sio os misicos, as tecnologias so os instrumentos musicais e as situagSes Ensne de Matométca am Dabate SSN: 2956-412, Si Pal, v5,m.3,p.238261,2018 239 de ensino so os repertérios. Embora a improvisagio, a inexperiéncia e ‘os sons nem sempre harménicos que ecoam na sala de aula nfo sejam uma realidade em uma orquestra, para Drijvers et al. (2010), esses stio aspectos relevantes que devem ser considerados pelo professor, o maestro da pratica docente, em uma orquestragdo instrumental. Assim & relevante definirmos © que vem a ser uma orquestragdo instrumental, de acordo com Trouche (2005, p. 126, tradugdo nossa) ‘Uma orquestragao instrumental é 0 arranjo sistemtico e intencional dos elementos (artefatos e seres humanos) de um ambiente, realizado por um agente (professor) no intuito de efetivar uma situago dada e, em geral, ‘guiar os aprendizes nas géneses instrumentais e na evalusdo e equilibrios dos seus sistemas de instrumentos. Com a Metifora da OI, Trouche (2005) aponta a importincia da situago matematica proposta aos estudantes, bem como dois elementos necessirios ao seu planejamento: a configuragaio e o modo de execugdo. Omodelo da O1 compde-se pela configurago didética dos artefatos, am- biente e sujeitos para explorago de uma situagao, além de seu modo de execugdo ou de operagdo, Segundo Drijvers et al. (2010 apud COUTO, 2015, p. 39-40): [J A configuragio didética é a organizagdo do ambiente de ensino © aprendizagem; é a selegdo dos recursos a setem disponibilizados; éa ela- boragao da atividade; é a escolha das téenicas de trabalho para apreensio dos objetos matematicos por meio das tecnologias ea definigd0 do papel dos sujeitos e artefatos envolvides neste proceso, Ll ‘0 modo de execugo éa forma que a atividade dever ser desenvolvida, ‘quando e como cada ferramenta inserida no ambiente e cada partieipante, seja professor ou estudante, deverdo desempenhar seu papel visando os beneficios das intengSes didéticas. Esse principio prevé e leva em conta possiveis resultados das ages instrumentadas, Os autores discutem a necessidade de destacar os momentos que exigem do professor uma decisio nao planejada, as denominadas decisdes ad hoc, definidas neste estudo como performance didatica’, em que o im- 44 Nestearige, estamos uilizando a wadugto de didactic performance como performance diditica tem verde desempento didtico, aim de mantcr ot ermos mais proximos da metifora de argues, spesar de desempenbo ler maior significado educecional 240. Ensna de Matersica em Debate (SSN. 215-4 Sie Paulo, 5.5, 238281, 2018 portante € 0 resultado alcangado com as modificagées realizadas durante a aula em situagGes inesperadas, Para eles, a performance didatica: [..1 consiste na performance alcangada pelo cendrio projetado, em que se faz possivel, Verificar a viabilidade das intengBes ¢ 0 sucesso da reali- zagio da orquestragao instrumental, Contemplam-se, também, aspectos relevantes que devem ser considerados, na execugio da atividade instru- ‘mentada, tais como, as decisdes ad hoe que devem ser tomadas diante de situagGes inesperadas que possam surgir numa orquestrago, advindas da realizagio da atividade matematica ou do uso da tecnologia, por exemplo. (DRIVERS et al., 2010, p, 215 apud COUTO, 2015, p. 39) Entretanto, nossa experiéneia em estruturar, executar ¢ analis orquestragGes instrumentais revelou-nos que, durante a sua execugo, 0 professor e 0s estudantes, em geral, regem diante de situagGes inesperadas (BELLEMAIN e TROUCHE, 2016; COUTO, 2015; LUCENA e GITI- RANA, 2015; LUCENA, GITIRANA e TROUCHE, 2016, 2018 ¢ no prelo; PEREIRA e GITIRANA, 2016; TROUCHE, 2004 e 2005). Essas reagdes do professor, embora nto planejadas, so de natureza didético- pedagégica, uma vez que tém foco nos objetivos (diditicos, formativos etc.) e buscam manter 0 bom andamento da orquestra — decisdes ad hoc (DRUVERS etal., 2010). 14s reagdes dos estudantes nao possuem natu- reza didatico-pedagégica, tendo em vista que o foco esté essencialmente na resolugo da situag4o proposta pelo professor ou em melhor se situar diante da orquestra em andamento. Assim, definimos reagGes ad hoc como as reagdes dos estudantes a situagdo proposta, as condigdes as restrigdes impostas a eles para resolver tal situagdo, em situagdes inesperadas. Elas ndo sao previstas pelo professor ¢ emergem durante o trabalho, individual ou coletivo, dos estudantes, durante sua attacao na orquestra, De forma mais especifica, as reagdes ad hoc podem ser motivadas, por exemplo, por causa das caracteristicas da situagio, dos conhecimentos exigidos para resolugio da situagdo, da habilidade ou nao no uso dos artefatos disponibilizados, da gesttio dos sujeitos envolvidos (papéis, fungdes ete.), do tempo de es ad hoc tal como as decisdes ad hoc, alteram 0 planejamento inicial da orquestra — a configuragdo didética, o modo de execugdo ¢ até mesmo a situacdo proposta, De uma forma ou de outra, elas sdo extremamente relevantes 4 orquestrago instrumental, uma vez Ensne dl Matométca am Dabate SSN’ 23564122, Séo Pale v8.0 3,p.238261,2018 241 que, em geral, modificam a orquestra em pleno andamento e precisam ser consideradas pelo professor (maestro) para repensar novos arranjos durante o proceso. Na Figura 1, esquematizamos os elementos da orquestragdo ins- trumental em dois atos. Para isso, utilizamos dois termos franceses: 0 primeiro — Mise en auvre — que denota 0 momento do planejamento da orquestragdo —a configuragdo didatica e o modo de execugio — para dar suporte 4 realizago da situagdo; o segundo ~ Mise en scéne —que denota ‘o momento em que a orquestra é colocada em cena, ou seja, como ela esté sendo executada, como esti favorecendo ou nao a realizagao da situagdo proposta ~ a performance didatica. Figura 1. Esquema do modelo da Orquestragdo Instrumental lenaondo 2 orgs. Sa) ol =) Fonte: 0 autores Oprimeiro ato, Mise en ceuvre (em azul), é estruturado pelo professor que determina a situagao, escolhe artefatos a serem disponibilizados, de- fine os papéis, fungdes de cada sujeito, o tempo de duragdo, etc., além das anilises a priori de natureza didético-pedagégica (em cinza). © segundo ato, Mise en scéne (em verde), &a vivéncia do primeiro ato, pelo professor e seus estudantes. Nessa etapa, silo confirmadas as previsdes feitas pelo professor ¢ a implementagdo ou nao de “planos B” para as situagdes jé previstas. ‘Também sdo identificadas as decisdes ad hoc do professor (em cinza) e as reagdes ad hoc dos estudantes (em vermelho). 242 Ensne de Matematica em Debate (SSN. 2358-412) Se Paul, 5. 3,p. 23826 Para entender o modelo tedrico da Orquestragio Instrumental (OI), primordial que se tenha clareza sobre sua abordagem instrumental, a qual orienta o processo de génese instrumental quanto ao uso de tecnologias para fins educacionais. Segundo Rabardel (1995), a génese instrumental € atransformagdo gerada pela ago do sujeito sobre o artefato, tornando-o um instrumento na medida em que ele softe 0 processo de instrumentagao ao integréelo a sua pritica. Entender 0 processo de génese instrumental exige a distingao de alguns processos. A Génese Instrumental — Conhecendo seus Prineipios Discutiremos, nesta segio, a ideia de génese instrumental, parte dos pressupostos teéricos que fundamentam a OI, partindo de algumas quest6es iniciais, apresentadas na Figura 2 a seguir. Figura 2. Processos elementares da génese instrumental SP. > e e aa i ee Figura 3. QRCode de acesso 4HQA Instrumentada Para um melhor entendimento das ques- tdes apresentadas na Figura 2, utilizamos a histéria em quadrinhos (11Q) - A instru- mentada (LUCENA, 2013), para ilustrar e explicar alguns principios que fundamentam a OL. Esta HQ (acesse pelo QRCode da Fi- gura 3) faz parte do acervo de historias em quadrinhos produzidas por mestrandos da disciplina de Tecnologias na Educagaio Mate- Ensne dl Matemstca am Dabate SSN 2358-4122, Sio Pal, v5, 3, p. 238-26 243 matica (TEM), da Pés-Graduagao em Educagéio Matematica e Tecnolégica — EDUMATEC/UEPE, ministrada por Verdnica Gitirana em 2013. ‘igura 4, Historia em Quadrinhos ~ A Instrumentada > == Fonte: Lucena (2013) A produgdo da histéria em quadrinhos — A Instrumentada - ocorreu em decorréneia de uma proposta que a professora fez aos mestrandos, consistiu em fazer com que eles revelassem seu entendimento sobre a Teoria da Instrumentagao (RABARDEL, 1995), por meio de uma hist5- ria em quadrinhos. Para essa atividade, foi utilizado o site de criagao de histéria em quadrinhos — PIXTON@. No primeiro quadrinho da HQ, a personagem Flor, cansada de fazer a faxina, resolve pedir ajuda a Rabardel, a quem ela chama de “deus da instrumentago”, para se livrar do seu instrumento de trabalho, a vassoura, Segundo Rabardel (1995), um instrumento & um construto psicoldgico elaborado com um artefato mais esquemas de uso do individuo que 0 utiliza, A vassoura, ao ser criada, é um instrumento para o criador que vislumbra seu uso, mas nao passa de um artefato para os outros que pre- tia am Debate SSN: 23884122, Sic Pal, v5, 3p. 238261, 2018 cisam desenvolver regras de uso associadas As finalidades para utilizé-la, As regras de uso pautam-se em conhecimentos em ago (invariantes) ¢ possibilita inferéneias. Flor ainda revela, no primeiro quadrinho da HQ, que a vassoura é para cla um instrumento para varrer, ou seja, mais que um artefato, Ela desenvolveu esquemas de uso para realizar as atividades para as quais 0 artefato - a vassoura — fora criado como, por exemplo, varrer a sujeira que esté no chdo, Um esquema ¢ “a organizacao invariante da conduta para uma dada classe de situacdes. E nos esquemas que se tem de procurar 0 conhecimentos em ago do sujeito, ou seja, os elementos cognitivos que permitem 4 ago do sujeito ser operatéria” (VERGNAUD, 1996, p. 157) No segundo quadrinho da HQ, “o deus Rabardel” alerta Flor para a possivel utilidade da vassoura, inclusive para as fungdes que ela ainda desconhece. Nesse caso, a vassoura seria, para ela, um artefato, mas po- deria se transformar em um instrumento, Um exemplo disso seria limpar a sujeira do teto das paredes, embora exista o espanador, a vassoura poderia cumprir essa fungdo, ou ainda ser utilizada para bater em alguém, o que ndo ¢ correto, mas Flor faz isso no iiltimo quadrinho da HQ. De acordo com Rabardel (1995), o artefato é 0 mesmo, mas as fungdes dadas pelo individuo com os seus esquemas de uso, incluindo conhecimentos, ob- Jetivos, agao, inferéncia, entre outros aspectos relativos ao sujeito, é que variam, nisso consiste a esséncia de sua transformagao. No quadrinho 3 da HQ, apés refletir sobre a possibilidade de nao se desfazer da vassoura, Flor decide experimentar um novo esquema de uso baseado em seu conhecimento de hist6rias infantis — ela deseja fazer & vassoura voar. Flor inicia, entdo, 0 processo de instrumentalizagio. A esse respeito, Rabardel (1995) entende que o individuo comega a explorar 0 artefato e suas funcionalidades, desenvolvendo assim esquemas de uso, buscando conhecer suas potencialidades e limitagdes para a realizagdo de uma dada tarefa, que ndo precisa ser essencialmente aquela para qual foi criado. Flor sobe na vassoura e da comandos para que ela voe. Ela faz isso, provavelmente, com base nos filmes que viu ou nos livros que leu sobre as lendas e hist6rias infantis. Obviamente, a vassoura no voa, para que isso ocorra hipoteticamente, silo necessérios os seguintes esquemas: (a) Ensne dl Matométca am Dabate [SSN 2356-4122, Si Pale, vS.m.3,p.236261,2018 245 montar na vassoura e (b) dar o comando “Voa vassoura, voa!”, Nese caso, © processo de génese instrumental ndo passa da instrumentalizagdo para a instrumentagdo. Sem sucesso ¢ ja irritada, no quadrinho 4 da HQ, Flor questiona “o deus Rabardel”, informando-o que, embora a vassoura seja um ins- trumento para ela, dando-Ihe suporte quanto & limpeza, para executar a fungdo voar, ela ainda & um artefato, Rabardel, de forma a fazer mengao aos esquemas de uso, responde a Flor no quadrinho 5 da HQ, falando da obviedade da ndo instrumentagdo. Ele justifica que nao basta mudar a fungao do artefato e exploré-lo, o individuo também tem de passar por transformagdes, precisa desenvolver os esquemas para fazer a vassoura voar, No caso de Flor, para fazer a vassoura voar com base nos esque- ‘mas utilizados, ela teria de adquirir os esquemas proprios a uma bruxa. “Quando o individuo atribui fungdes aos artefatos, os esquemas de ago de uso ou esquemas mentais evoluem, dando origem as novas formas de utilizagao do artefato, surgindo entdo o instrumento” (RABARDEL, 1995, p. 93 —traducdo nossa). Quando isso ocorre, hi o proceso de ins trumentaedo do sujeito que passa a integrar de fato o instrumento 4 sua pritica e, por consequéncia, transforma-se também. Inserir ou Integrar? Acreditamos que a discussio sobre a histéria em quadrinhos — A Instrumentada — contribuiu para dar uma nogdo do que & um artefato, ‘um instrumento, 0 que so os processos de instrumentagdo e instrumen- talizago, e que todos esses conceitos compdem a génese instrumental. Entretanto, ainda hd dois aspectos importantes que desejamos esclarecer: © significado de inserir e de integrar uma tecnologia, seja ela digital ou no, & pratica docente. Para isso, utilizaremos uma anélise do video: Tecnologia e Metodologia (GTRIC, S/D). 246 Ensna da Matersica em Debate (SSN. 215-4 Sie Paulo, 5.5, 238281, 2018 Figura 5. Video ~ Tecnologia x Metodologia © QR Code de acesso* 0 video Tecnologia e Metodologia ¢ uma animagdo produzida pelo Grupo de Trabalho de Imagem e Conhecimento—GTRIC, da Universidade Presidente Ant6nio Carlos - UNIPAC. Fle apresenta uma situago que reflete a realidade de muitos professores, dando luz a uma importante discussdo quanto ao uso de tecnologias da informagdo e comunicagao na educagao: a diferenca entre inserir e integrar uma tecnologia a pritica docente. ‘Um dos maiores erros que podemos cometer em relagio as tecnologias digitais consiste em acreditar que elas, por sis6, iro transformar a escola, oensino, a aprendizagem, ou educago como um todo. 0 trecho 1 (00:58 4 01:37) ilustra bem essa crenga, quando o gestor da escola apresenta 0 projeto da escola nova, que terd metodologia nova pautada nas tecnologias digitais. Sem formagdo para 0 uso dos novos artefatos, em apenas uma semana, a professora se instrumentaliza. No trecho 2 (01:45 a 01:55), podemos perceber sua habilidade quanto ao uso da tela de projegdo e do projetor multimidia, A professora utiliza projetor multimidia como para projetar as operagdes que devem ser feitas pelos estudantes e respondidas em seus computadores. Apés responder, o valor & apresentado. Nesse caso, os artefatos foram inseridos 4 pratica docente sem pro- vocar um diferencial para o ensino, Ela usa o datashow e o computador transformando-os em um instrumento similar ao quadro branco, os estudantes, por sua vez, utilizam 0 computador como se fosse papel ¢ lépis. O método utilizado pela professora nao transforma a tecnologia em um instrumento, nem favorece tal transformago na relago estudante- 5. pase youtube.com/vatch yx RtOmvypk Ensine de Matemétca am Dabato [SSN 2356-4122, Sio Pal, v5, 3p. 23826 247 computador. Dessa forma, os artefatos nfo oferecem um diferencial a sua pritica, para favorecer o ensino e a aprendizagem, (0 projetor multimidia pode ser bastante itil ao professor para projetar imagens e videos que venham agregar valor a sua aula, E um excelente recurso que permite projetar aulas previamente produzidas, em geral, no formato de slides ou, ainda, para exibir atividades dos estudantes, entre muitas outras formas de uso. Entretanto, no trecho 3 (01:58 a 02:26), esse equipamento ¢ utilizado para exibir a tabuada, antes exposta por meio de um cartaz fixado na lousa. A metodologia continua a mesma, porém aplicada agora na tela de projegao e projetor digital inseridos na sala de aula. 0 video Tecnologia ou Metodologia apresenta uma situagao elassica de insergo das tecnologias sem integragio, ou seja,trata-se de uma in- sergio de um conjunto de recursos que no passam de um artefato, tendo em vista que no oferecem diferencial ao ensino proposto. A professora continua ministrando a mesma aula, os estudantes também continuam estudando a tabuada da mesma forma, embora agora com o projetor multimidia utilizado como cartaz e 0 computador como caderno. De fato, a integragdo de tecnologias digitais exige do professor: formagao, planejamento e constante reflexdo sobre sua pritica. Nao & suficiente conhecer as funcionalidades dos artefatos e saber manuseé-los, ou seja, instrumentalizar-se, ¢ preciso fazer uso integrado deles de forma a favorecer o ensino e a aprendizagem. Isso s6 ¢ possivel quando os arte- fatos passam a ser instrumentos para o professor que pode aproveitar-se de suas potencialidades — génese instrumental, Anilise da Orquestragao Instrumental de uma aula sobre propriedade das operagdes Seré que basta o professor ser instrumentado, para utilizar as tec- nologias integradas ao ensino de matemdtica? ‘O modelo teérico da Orquestragdo Instrumental (OI) visa a favorecer a organizagdo de um ambiente propicio para permitir a génese instru- mental do estudante para aprender matemética em ambientes ricos em tecnologias, em particular as digitais. Assim, uma das condigdes para 0 248 Enna de Matersica em Debate (SSN. 215-4 Sie Paulo, 5.5, 238281, 2018 professor de matemitica é a sua propria génese instrumental, de forma a utilizar os recursos digitais como instrumentos para promover a apren- dizagem matematica ¢ como esse profissional insere artefatos em sua pritica docente, passando a integrd-los como instrumentos para as suas ages, produzindo um diferencial ao ensino e & aprendizagem. Nessa seedo, discutiremos a orquestragdo instrumental, fazendo a anélise de uma aula elaborada por Verdnica Gitirana, utilizando 0 modelo, em uma de suas turmas da Pés-Graduago. Essa aula tinha por objetivo promover uma situagdo em que os estudantes e professores de matematica da Educagdo Basica descobrissem propriedades das quatro operagGes basicas, por meio de padrdes geométricos em tabelas de dupla entrada das operagdes, correlacionando com sua escrita algébrica. Para tanto, planejou-se utilizar: tela de projegao e projetor digital, computador, celular, bluetooth, cademo, caneta e lapis de cor. A HQ denominada “A Tabuada” (LUCENA, 2016) foi construida para ressaltar elementos de uma orquestragao instrumental presentes na aula. A HQ foi parcialmente produzida no PIXTON@ e adaptada para insergdo das tabelas de mul- tiplicagao e divisdo construidas durante a aula por estudantes da turma da Pés- Graduagao. Dois grupos da turma foram consultados e nos autorizaram a utilizagaio © publicagao de suas tabelas nesta HQ. Figura 6. QR Code de avesso aHQ A orquestracdo instrumental sera analisada, utilizando-se a HQ. Nos primeiros quadrinhos da HQ — A Tabuada (do | ao 7), pode-se verificar elementos da configuragdo diditica da orquestragdo instrumental. Ensne dl Matemétca am Dabate SSN’ 2358-4122, Sio Pal, v5, 3, p. 238-26 249, Figura 7. HQ “A Tabuada” (seis primeiros quadrinhos) ‘ATabuada yng EE Peer Fonte; Lucena (2016) Aprofessora esta engajada em garantir que ndo esti se esquecendo de nenhum dos artefatos que ird compor seu conjunto de recursos, os quais dardo suporte 4 sua aula, Ela planejou utilizar 0 computador, projetor multimidia, o celular, papel, Lapis e lapis de cor. Curiosos, os estudantes querem saber o que ela esté fazendo e, pela segunda ver, ela respondeu, ja impaciente e em nome de “Saint-Luc”, uma referencia a0 criador do modelo tedrico em foco — Luc Trouche, que ela esta orquestrando (Qua drinhos 1 e 2). 0 termo “orquestrando” ¢ a referéneia a “Saint-Luc des orchestra- tions” evidencia a metifora e gera uma nova questo, a do quadrinho 4, quando Roberto pergunta a ela o que iriam tocar. Nesse momento (Quadri- ho 5), a professora Vera apresentou parte de suas intengGes didaticas. Sem uma clara explicitagdo da situago a ser explorada, o anincio foi rejeitado de imediato, e nao & dificil descobrir 0 motivo, uma vez que 6s estudantes revelaram total aversdo & tabuada: um retrucou afirmando que jé decoraram; outra ironizou “cantando” a tabuada 2.x 2,23 (..)i€ 250 remit am Debate (SSN. 235841 She Paulo, 5.3, 238281, 2018 mais outro se desesperou com a amiga que “canta” a tabuada chamando a agdo de ladainha, O que se pode esperar de uma aula que jd comega com tantas nega- tivas, por parte dos estudantes? Em um primeiro momento, isso parece uma situagao inesperada, ‘mas a professora Vera jé previa tal comportamento, pois jé conhecia os estudos de educagio matemética sobre a aversio dos estudantes & tabu- ada devido a forma como Ihes fora ensinada que pode ser repetigdo para memorizagio. Mas seus planos eram outros ¢ foram revelados quando ela fez uso da tela de projegao e do projetor digital para informar a todos 0s estudantes sua configuragaio didética (Quadrinhos 7 ¢ 8), bem como a situagdo proposta: Figura 8. Quadrinhos de 7 a9 Fonte: Lucena (2016) + Asituagio: (a) construir uma tabela de multiplicar ou dividir com 10 linhas € 10 colunas, usando Iépis e papel quadriculado; (b) apés a construgdo, pintar com os lépis de mesma cor os nimeros da tabela que representassem um padrdo correlacionado a alguma das propriedades da operagdo realizada; (c) tirar foto da tabela construida e enviar por bluetooth para o computador da professora de forma que ela pudesse projetar as respostas; (d) apresentar as propriedades encontradas; + 0 contetido: uso da tabela como recurso para 0 estudo das pro- priedades das operagGes de multiplicagio e de divisio por meio da Ensne dl Matemétca am Dabate SSN’ 23584122, Sio Pale, v8.0 3,p.238261,2018 251 exploragdo tabuada multiplicagio e de divisdo e correlago com padrio geométrico encontrado na tabela de dupla-entrada; + Os recursos: celular, papel quadriculado, computador, projetor digital, lapis, lipis de cor, tela de projegdo, a tabuada construida, bluetooth; + Objetivos em relagao aos reeursos: (a) apoiar a identificagao de padrdes ¢ propriedades — tabela e lépis de cor; (b) conseguir compartilhar coletivamente ¢ com rapidez a produgao dos grupos para uma discussao — celular e bluetooth; (c) apresentar para os demais os padres e propriedades encontrados na tabela — tela de projegao e projetor digital; + A organizacdo dos estudantes e seus papéis: formagao de du- plas ou trios; cada grupo deveria construir uma tabela de um tipo de operacdo; os componentes de cada grupo deveriam dividir as atribuigdes entre eles — pintar a tabela, anotar a sistematizagio ‘matematica, fotografar, enviar para a projego ¢ apresentar; + Objetivos quanto 4 organizacAo dos estudantes: (a) construgdo coletiva da tabela de forma que os conhecimentos de cada um pu- dessem colaborar para a identificagdo dos padres e propriedades; (b) apoiar uns aos outros quanto ao uso das tecnologias, celular, bluetooth e projetor, para realizar a apresentagao e discusstio co- letiva com a turma; ‘+ ‘Tempo: apesar de nao explicitar para os estudantes, a professora Vera estipulou que essa fase seria realizada em 20 minutos. Apés explicar a dindmica da tarefa aos estudantes, a professora encer- rou a sessio de reclamagdes deles, sobre a tabuada, com os comandos da situagdo da organizagao dos trabalhos com um diaporama previamente construido, na fase de configuragao didatica Na programago do modo de execugao, a professora Vera propds que os estudantes trabalhassem em grupo, cada um com seu papel definido no grupo, sendo ela a mediadora, observando o trabalho dos estudantes, e: (a) quando chamada, cla devolvia a questo proposta de modo a fazer 0 estudante refletir ou (b) observar novas descobertas na explorago dos es- tudantes, de modo a incentivé-los a ndo deixarem a descoberta de lado. 252 mina a ia am Debate ISSN: 238841 Sie Paulo, 5.5, 238281, 2018 Iniciado 0 trabalho em grupo, no demorou para que os estudan- tes percebessem que aquela aula sobre a tabuada, seja de dividir ou de multiplicar, era diferente, € 08 resultados da orquestragao instrumental comegaram a surgir & medida que eles conseguiam, com © uso da tabela e das cores, fazer emergir as propriedades com base nos padrdes observados, construin- do seus esquemas de ago instru- mentada e propiciando a discusso. Figura 9. Quadrinho 10, Fonte: Lucena em grupo(Quadrinho 10) (2016) A medida que a orquestrago foi colocada em cena (em pratica), outra situagdo imprevista pela professora surgiu, Uma das estudantes chegou muito atrasada dificultou sua atuagdo, j4 que ges, deixando o parceiro a frente da atividade, pois ela no conseguia entender o que deveria ser feito. Nesse caso, a professora Vera ndo previu que estudantes que chegassem atrasados poderiam ficar sem trabalhar, por isso, no preparou orientagées diferentes daquelas da apresentagdo coletiva. Essa situagdo imprevista, da performance didatica, faz-nos refletir sobre a configuragio didatica ¢ a necessidade de uma anilise a priori pautada no somente nos aspectos cognitivos, mas também na gestdo da sala de aula. Ao nao se engajar na atividade, tem-se um caso de reagio ad hoc da aluna que chegou atrasada, sendo a ago pereebida apenas durante a apresentagao, quando ela revela a professora o motivo de sua ndo efetiva participagao, Assim que o trabalho em grupo foi encerrado, a professora Vera propés uma nova configuracio didatica da aula em que toda a turma trabalharia em conjunto na apresentagao e discussdo de suas descobertas ¢ definiria um de seus componentes para apresentar o que eles haviam produzido coletivamente. A cada grupo foi destinado um tempo de apre- sentago, ¢ os colegas da sala poderia discutir e elaborar questées para melhor entender as descobertas, A professora Vera assumiu o papel de intervir com perguntas que esclareceriam as descobertas ou motivassem a discussio, como mostra o quadrinho em que Jodo apresentou a produgdo dele ¢ de seu colega, Wilson, cles optaram por fazer a tarefa cm dupla. ndo ouviu as orienta Ensne de Matométca om Dabate SSN: 2356-4122, Si Pal, vS,m 3,p.236261,2018 253 Joao iniciou a apresentagao por meio da projegao de slides e expés as trés propriedades encontradas pelo grupo, sendo: (a) comutatividade; (b) elemento neutro da multiplicagao; (c) os quadrados perfeitos da diagonal da tabela de multiplicagao por eles construida, Nos slides, eles expuseram uum resumo e depois cada padrio pintado com a mesma cor e relacionaram cada um a propricdade identificada (Quadrinhos 11, 12 e 13). ‘Além disso, o engajamento e crescimento da autoestima provocado pela metodologia de investigar padrdes os levam a querer fotografar suas descobertas utilizando seus proprios celulares. A iniciativa dos estudantes em preparar uma apresentago detalhada foi mais uma situagao nao pre- vista pela professora. No modo de execuso, como planejado, ela previ e assim solicitou que os estudantes tirassem foto da tabela e enviassem para © computador dela, onde salvaria a foto enviada para apresentar depois. Entretanto, eles utilizaram os seus computadores pessoais para organizar um diaporama mais detalhado de suas descobertas, em decisaio ad hoc, a professora permite que seja elaborado o diaporama pelos figura 10. Quadrinhos de 11 a 13 Fonte: Luvena (2016) © segundo grupo era formado por Lany, Roberto ¢ Anita. Lany eraa represen- tante do trio e também optou por apresentar a produgdo deles em forma de slides, ela falou sobre as descobertas em relagdo & operagdo de divisdo, sendo elas: (a) todo mimero dividido por ele mesmo resulta 1; (b) todo nimero dividido por um, resulta Figura 11, Quadrinho 14 tia am Debate ISSN: 238841 She Paulo, 5.3, 238281, 2018 nele mesmo; (c) os niimeros equidistantes pela diagonal sdo inversos multiplicativos. (Quadrinho 14) Fles também fizeram uso da imagem fotografada e de sua edigdo demonstrar suas descobertas nos slides. Entretanto, a forma como esere~ veram seus dados ¢ bem diferente, Perceba que Anita, Roberto ¢ Lany fizeram uso da representagdo escrita em Iingua materna (Quadrinhos 14, 15, € 16). Joao e Wilson nao apenas fizeram uso desse tipo de representagdo, ‘mas também prezaram por organizar as informagdes numa representagao algébrica, relativas as propriedades encontradas. Figura 12, Quadrinhos de 15 a 17 Fonte: Lucena (2016) Dando sequéncia ao modo de execugdo, 0 estudante Marcel foi convidado para apresentar a produgo dele com sua dupla, a estudante Rosi, Porém, mais um imprevisto ocorreu: a dupla informou a professora © 4 turma que apenas um deles, Marcel, conseguiu executar a atividade, porque Rosi chegou atrasada e nao conseguiu entender a qual foi a at vidade proposta. Além disso, 0 que Marcel conseguiu identificar em sua tabela ja havia sido apresentado anteriormente, pois ele escolheu a tabela de multiplicacao, tal como a dupla, Joao e Wilson (Quadrinhos 15, 16 € 17). Diante desse contexto, a dupla preferiu nao apresentar seus achados, mesmo quando a professora insistiu que eles fizessem isso. Embora a produgo dos estudantes Marcel e Rosi néo tenha sido apresentada, essa situagdo trouxe & tona, mais uma vez, um aspecto importante além das Ensne dl Matométca am Dabate SSN: 2356-4122, Si Pale, vS.m.3,p.236261,2018 255 ja conhecidas as decisdes ad hoc® (TROUCHE, 2004; DRIVERS et al., 2010) da OI: as reagdes ad hoc. Figura 13. Quadrinho 18, Fonte: Lucena (2016) "ar neraarsa nas rempoeaat ‘Na configuragao didatica, o pro- drvongeme sauces fa ha fessor precisa dedicar tempo para prever 0 que pode ocorrer durante a Ege mon oho colocagdo em cena (pritica) da orques- sci ae tragdo, com a finalidade de se evitar, : a0 maximo, situagdes inesperadas que possam comprometer 0s objetivos di- Aiticos da orquestragao instrumental Rost for qo ocd rae Utilizamos a andlise a priori de Artigue a EEE (1994) como técnica para realizar tal previsto, Para isso, é importante que © professor tenha sempre um plano “B”, 0 que parece nao ter ocortido no caso da professora Vera. Ainda assim, existem as que no se podem prever, nesse caso, as decisdes ad hoc sao fortemente evocadas. E na performance diditica, terceiro elemento do modelo da OI, que 0 pro- fessor pode identificar tais situagdes € os reflexos das suas decisdes ad hoc, que altera ora a configuragao didatica, ora 0 modo de execugdo, na busca de um melhor suporte & génese instrumental. Mas, como discuti- ‘mos anteriormente, as situagdes inesperadas nem sempre evocam apenas decisbes ad hoc do professor, por vezes, elas fazem emergir as reagdes ad hoc dos estudantes. ‘No quadrinho 19, Rosi, tal como seus colegas, no sabem da relagiio da expresso ad hoc com a teoria que esti fundamentando a pritica de sua professora, Porém, ela parece saber que tal expressdo é usada para designar decisdes eventuais e em caso de necessidade. Assim, ela se justifica a professora informando-a que o motivo pelo qual ndo ajudou © seu parceiro foi uma decistio ad hoc, omitindo 0 verdadeiro motivo: seu atr 6, Acxpressdo ver do Latim e significa, segundo diciondrio online: “Para ese caso tualmente”, “riado para este propésito especitica”, “pontual”. 256. Ensna de Matemsica em Debate (SSN: 215-4 She Paulo, 5.3, 238281, 2018 Figura 14. Quadrinhos 19 e 20 Esta fol ua decade Fonte: Lucena (2016), ‘A “esperteza” de Rosi deixa seus amigos sem nada entender, ¢ a professora ficou surpresa. Ela nao esperava por isso, tampouco tinha uma deciso ad hoc — era uma reagio ad hoc. Na verdade, segundo a professora, nem o Paul Drijvers, eriador do terceiro elemento da TOI — A performance didética — poderia prever uma resposta como a que foi dada pela estudante. Durante a execugdo de uma orquestragdo instrumental, perceberemos que as situagdes inesperadas, ora geraram decisdes ad hoc, ora reagoes ad hoc, as primeitas tomadas pelo professor, as segundas pelos estudan- tes. Algumas dessas situagdes podem contribuir ou ndo para um melhor desempenho da orquestragao. Um exemplo disso ¢ 0 fato de a professora ‘Vera nao prever que seus estudantes usariam um software de elaboragao de apresentagies ~ reagiio ad hoc. Entretanto, se ela 0 soubesse, poderia ter disponibilizado tablets ou notebooks pata que os estudantes pudessem preparar suas apresentagdes durante o trabalho em grupo, Nesse iltimo caso, terfamos uma decisio ad hoc. Outra situagdo interessante teve relagdo com a atividade matemé tica, A professora solicitou que cada grupo (dupla ou trio) construisse uma tabela da multiplicagdo ou da divisio. Ela ndo contava que, com a formagao de trés grupos, uma das operagdes poderia se repetir, o que geraria resultados semelhantes, podendo desmotivar os estudantes da apresentagao posterior, tal como ocorreu com a dupla Marcel e Rosi. Se a Ensne dl Matemétca am Dabate SSN: 2356-4122, Si Pale, vS,m 3,p.236261,2018 257 professora tivesse previsto tal situagdo, poderia ter proposto a construgo de uma tabela por operagdo: adigao, subtragdo, multiplicagao e divisio, ou ainda mediar para que cada grupo apresentasse resultados de forma a todos ficarem com algum resultado a apresentar. Isso evitaria a reagiio ad hoc da dupla de nao apresentar 0 trabalho. Outro aspecto ndo previsto foi o que fazer com os estudantes que porventura chegassem atrasados. Era preciso, neste caso, pensar em como dar suporte a eles, de forma que eles pudessem participar ativamente da tarefa, evitando assim a reagdo ad hoc ficar sem trabalhar. Isso pode comprometer a orquestragdo e, consequentemente, a aprendizagem dos estudantes envolvidos. Consideragaes Finais Esse texto objetiva a apresentacdo discussio ilustrada de prinefpios fundamentais do modelo tebrico da Orquestragdo Instrumental (OD), tal como de outros referentes aos aportes tedricos que a fundamentam os da génese instrumental, da Teoria da Instrumentalizagdo—Rabardel (1995), além do conceito de esquemas oriundo da Teoria dos Campos Conceituais, (VERGNAUD, 1996). ara isso foram utilizadas duas histérias em quadrinhos — HQ: A Instrumentada e A Tabuada. Além disso, utilizamos 0 video Tecnologia e Metodologia. A primeira HQ permitiu-nos discutir a génese instrumental © 0s elementos que a compdem: artefato e instrumento; instrumentaliza- sao e instrumentasaio; inserir e integrar. Questdes sobre esses elementos foram levantadas, a fim de que o professor conseguisse defini-las e diferencid-tas. (O video analisado permitiu-nos exemplificar uma pratica docente em que os recursos, entre eles as tecnologias digitais, sfo inseridos e pouco ou nada acrescentam & pratica docente e & aprendizagem dos estudantes. Outras questes foram apresentadas para motivar a reflexio do profes sor, leitor desse texto sobre a necessidade de que 0 conjunto de recursos utilizados/disponibilizados pelo professor oferega um diferencial a forma, como ele ensina, tal como, a forma como seus estudantes aprendem. A segunda HQ contribuiu com a apresentagao do modelo teérico da Ole de seus elementos: a configuracdo didatica e o modo de execugio 258 Ensina de Matemsica em Debate (SSN: 215-4 She Paulo, 5.9.3, 238261, 2018 como parte do planejamento, e a performance diditica, como parte da colocago em cena da OI planejada, como mostra o esquema, A perfor- mance didatica dessa orquestragao colocou em evidéncia as reagées ad hoc dos estudantes quando diante das condigSes/restrigdes/ete. impostas pela situagio, configuragao didatica e o modo de execugdo previstos pelo professor, Aexperiéncia vivenciada pelos estudantes mediante a proposta de sua professora, que consistiu no ensino diferenciado da tabuada e pautado em tecnologias digitais, associado a recursos analégicos e aproveitamento das potencialidades digitais, tem sido um exemplo de integragao de recursos, a pritica docente. Por fim, comparando alguns aspectos do uso da tabuada no video ena HQ, procuramos revelar a importineia do modelo da OI que permite, por meio de elementos, a modelagem de situagdes de ensino, sistematizada ¢ intencional, com suporte de tecnologias digitais. Recebido em: 14/08/2018 Aprovado em: 30/11/2018 Referéncias ARTIGUE, M. Didactical engineering as a framework for the conception of teaching products. In: BIEHLER, R.; SCHOLZ, R. W WINKLEMANN, B. Didacties of mathematics as a scientific discipline. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers, 1994, p. 27-39. BELLEMAIN, F; TROUCHE, L. Compreender o trabalho dos professores na concepedo ¢ utilizagao de recursos no seu ensino. Anais do T LADIMA — Simpésio Latino-Americano de Didética da Matematica - Bonito-MS. ‘Campo Grande: UFMS, 2016, p. I-14. Disponivel em: hitps://drive. google.com/file/d/0B6OphkgfrkD3eGRISW liVHg3YjQiview. Acesso: 15/06/2018. COUTO, R.L. 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