You are on page 1of 9
=a LEITURAS fe ANDRE BAZIN as O CINEMA Colegio Primeiros Passos Golegio Primeiros Passos ENSAIOS Anwopologia da Comunicacio —-«Oqueé Ane Vial Jorge Cali Masiimo Canevacc © que é Cinema ie Antropologia do Cinema Jean-Claude Bernardet Traduefo: Massimo Canevacci Eloisa de Araujo Ribeiro O que é Fotografia Hitchcock’ Traut Citi ante Rubray Introdueio Ennevstar Iemail Xavier Frangois Truffaut O que é Teatro Fetnando Peirowo Borers DEDALUS - Acervo - FFLCH-FIL ee Colegio Encanto Radical Agi cinema cn Seer ame rascimento de um cinema A lmagem-Tempo Iomail Xavier 7 A bis Belewe Biche O mettre do medo ALinguagem Cinematogrifica ‘Inicio Araujo Marcel Maran 0 V0 dos Anjr: Bressne, TOMBO. . :29392 Spanzsla Brtado robre a eags0 cinematogrifica Jean-Claude Bernardec ~ editora brasiliense vil A EVOLUCAO DA LINGUAGEM CINEMATOGRAFICA! Em 1928, a arte muda estava em seu apogeu, © desespero dos melhores daqueles que assistiram ao desmantelamento dessa per- feita cidade da imagem pode ser explicado, se nao justificado, es que inema tinha se tornado uma arte supremamente adaptada ao ‘delicado incmodo” do siléncio € que, portanto, o realismo sonoro s6 podia condenar a0 caos De fato, agora que 0 emprego do som demonsirou o bastante que nao veio para aniquilar o Antigo Testamento cinematografico, mas sealizé-lo, caberia perguntar se 2 revolucao técnica introdu- Zida pela banda sonora corresponde realmente a uma revolugdo estétiea, em outros termos, se 05 anos de 1928-1930 sao efetiva- mente 0s do nascimento de um novo cinema, Encarada do ponto de vista da decupagem, a historia do filme ndo deixa aparecer, com efeito, uma solugdo de continuidade tao facilmente quanto se poderia pensar, entre 0 cinema mudo ¢ o falado. Em compensa~ (40, poderiamos revelar os parentescos entre certos realizadores dos anos 1925 e outros de 1935, e sobretudo do periodo 1940-1950. Por exemplo, entre Erich Yon Stroheim ¢ Jean Renoir ou Orson Welles, Carl Theodor Dreyer ¢ Robert Bresson, Ora, tais afinida- des mais ou menos claras provam, em primeiro lugar, que uma ponte pode ser langada por cima da falha dos anos 30, que certos res do cinema mudo persistem no cinema falado, mas, princi- palmente, que se trata menos de opor o ‘‘mudo” 20 “falado” do que, em ambos, familias de estilo, concepgdes fundamental- ‘mente diferentes da expressdo cinematografica Sem me dissimular a relatividade de uma simplificagao critica que as dimensdes deste estudo me impdem, ¢ considerando-o Na via estética na qual ela estava entao engajada, parec ° A EVOLUGAG DA LINGUAGEM CINEMATOGRAFICA 67 menos uma realidade objetiva do que uma hipétese de trabalho, eu distinguirei no cinema de 1920 @ 1940 duas grandes tendéncias opostas: 0s diretores que acreditam na imagem e os que acreditam na realidade. Por imagem, entendo de modo bem geral tudo aquilo que a representacao na tela pode acrescentar a coisa representada. Tal contribuigio complexa, mas.podemos reduzi-la essencialmente a dois grupos de fatos: a plastica da imagem e os recursos da mon- tagem (que nao é outra coisa senao a organizagdo das imagens no tempo). Na plastica, é preciso compreender 0 estilo do cenério ¢ da maguiagem, de certo modo até mesmo da interpretagao, aos quais se acrescentam a iluminacao e, por fim, 0 enquadramento que fecha a composicao. Quanto 4 montagem, otiunda prineipal- mente, como se sabe, das obras-p nh, André Mal- aux dizia, em Psicologia do cinema, que ela constituia 0 nasci- mento do filme como arte: 0 que o distingue realmente da simples fotografia animada. Na realidade, uagem agao da montagem pode ser ““invisivel”; € 0 caso mais frequente no filme americano classic anterior & guerra. Os cortes dos planos nao tém outro objetivo que o de analisar o aconteci- nento segundo a logica matemética ou dramatica da cena, E sua légica que torna ise insensivel; 0 espirito do espectador adota naturalmente os pontos de vista que 0 he propde, fcados pela gcogratia da acdo ou pelo destocamento do interesse dramético. A neutralidade dessa decupagem “invisivel”” néo d& conta, porém, de todas as possibilidades da montagem. Ein contrapat da, elas podem ser apreendidas perfeitamente, em trés procedimen- tos comhecidos geralmente pelo nome de “‘montagem paralela’ ‘montagem acelerada” e ‘'montagem de atragdes". Criando a montagem paralela, Griffith conseguia dar conta da simuttan dade de duas agoes, distantes no espago, por uma sucesso de pl nos de uma e da outra. Em La rove, Abel Gance nos dé a ilusdo da aceleracao de uma locomotiva sem cecorrer a imagens reais de velocidade (pois afinal, as rodas poderiam rodar sem se deslocar), pela simples multiplicacdo de planos cada vez. mais curtos. Entim, ‘a montagem de atragbes, criada por Eisenstein, cuja descrigao nao € tao facil, poderia ser definida grosseiramente como o reforgo do sentido de uma imagem pela aproximasao de outra imagem que no pertence necessariamente ao mesmo acontecimento: os fogos de artificio em O velho € 0 novo, que sucedem a imagem do touro. Nessa forma extrema, a montagem de atragdes foi rara 6 ANDRE BAZIN mente utilizada, até mesmo por seu criador, mas podemos conside- rar bem préxima em seu principio & pritica mais geral da da comparacdo ou da metéfora: so as meias jogadas na cadeira a0 pé da cama, ou ainda o leite que transborda (Crime em Paris, de H. G. Clouzot). Existem, naturalmente, combinacées variaveis esses trés procedimentos Quaisquer que sejam, podemos reconhecer nelas 0 trago ¢o- mum que ¢ a propria definicao da montagem: a criagdo de um sentido que as imagens ndo contém objetivamente € que procede unicamente de suas relagdes. A célebre experiencia de Kulechov com © mesmo plano de Mosjukine, cujo sorriso parecia mudar de expresso conforme a imagem que o precedia, resume perfeita- mente as propriedades da montagem. ‘As montagens de Kulechov, a de Eisenstein ou de Gance nao mostravam 0 acontecimento: aludiam 2 ele, Eles tiravam, sem diivida, pelo menos a maioria de seus elementos da realidade que queriam descrever, mas a significacao final do filme residia muito mais na organizagao dos elementos que no conteiido objetivo deles. A matéria do relato, qualquer que seja o realismo individual da imagem, surge essencialmente de suas relagoes (Mosjukine sorrindo + crianga morta = piedade), isto é, um resultado abstrato cujos elementos concretos n&o comportam as premissas. Do mesmo modo, podemos imaginar: meninas + macieiras floridas = espe- ranga, As combinagdes séo incontaveis. Porém, todas tém em comum o fato de sugerir a idéia por intermédio da metafora ou da associagao de idéias. Assim, entre 0 roteiro propriamente dito, objeto iltimo do relato, e a imagem bruta, se intercala uma etapa suplementar, um “transformador” estético, © sentido nao esta nna imagem, cle ¢ a sombra projetada pela montagem, no plano de consciéncia do espectador. Resumindo: tanto pelo conteido plastico da imagem quanto pelos recursos da montagem, o cinema dispde de todo um arse- nal de procedimentos para impor aos espectadores sua interpreta- go do acontecimento representado. Podemos considerar que, no final do cinema mudo, esse arsenal estava completo, Por um lado, 0 cinema soviético levou as tltimas conseqiéncias a tecria ¢ pratica da montagem, enquanto que a escola alema fez com que a plastica da imagem sofresse todas as violéncias posstveis (ce- ndrio ¢ iluminac&o). E claro que, além do alemto € do soviético, outros cinemas também contam, mas seja na Franca, na Su ou na América, ndo parece que a linguagem cinematogratica careca de meios para dizer o que ela tem a dizer. Se 0 essencial A EVOLUGAO DA LINGUAGEM CINEMATOGRAFICA, 6 da arte cinematografica consiste em tudo 0 que a plastica e a montagem podem acrescentar a uma realidade dada, a arte muda uma arte completa. O som s6 poderia desempenhar, no maximo, tum papel subordinado e complementar: em contraponto a imagem visual. Mas esse possivel enriquecimento, que no melhor dos casos s6 poderia ser menor, corre o risco de nao ter muito peso no prego do lastro de realidade suplementar introduzido ao mesmo tempo pelo som. mente essa nosao geralmente admitida que questionam im mente, desde o cinema mudo, realizadores como Erich Von Stro- ‘A montagem 80 desempe- 1m papel, a ndo ser o papel totalmente negativo da vel numa realidade abun dante demais. A camera nfo pode ver tudo ao mesmo tempo mas, do que escoltte ver, ela se esforca a0 menos para nao perder nada. que conta para Flaherty, diante de Nanook cagando a foca, é a relagio entre Nanook ¢ 0 animal, a amplitude real da espera. A montagem poderia sugerir © tempo; Flaherty se limita a nos mos- trar a espera, a duragao da caga e a propria substancia da imagem, seu verdadeiro objeto. No filme, esse episodio 56 admite, portanto, um iinico plano, Podemos negar que ele é, por isso mesmo, muito mais emocionante do que uma ‘‘montagem de atragbes”? Murnau nao se interessa tanto pelo tempo, mas pela realidade do espago dramético: a montagem nao desempenha, nem em Lobi- somem (Nosferatu) nem em Aurora, nenhum papel decisivo. No entanto, poderiamos pensar que a plastica da imagem a aproxima de um certo expressionismo, mas seria uma visdo superficial. A composicao de sua imagem nao é de modo atgum pictural, ela nao acrescenta nada 4 realidacle, nfo a deforma, muito pelo contré- rio, ela se esforga para desvelar suas estruturas profundas, para fazer aparecer relagoes preexistentes que se tornam constitutivas do drama, Assim, em Tabu, a entrada no campo da imagem pelo lado esquerdo da tela de uma nau identifica-se absolutamente com © destino, sem que Murnau jogue com o rigoroso realismo do filme, Mas foi seguramente Stroheim quem mais se opés a um sd tempo ao expressionismo da imagem ¢ aos artificios da montagem. Nele, a realidade confessa seu sentido como o suspeito sob 0 70 ANDRE BAZIN rogat6rio incansavel do comissério. O principio de sua mise-en-scéne é simples: oliar 0 mundo de bem perto ¢ com bastante insisténcia para que ele acabe revelando sua crueldade e feiira. Poderiamos imaginar facilmente, em ultima instancia, um filme de Stroheim composto de um tinico plano td longo ¢ grande quanto quiséssemos. A escalha desses irés diretores nao é exaustiva. Certamente cencontrariamos em outros autores, aqui ¢ ali, elementos de cinema nao expressionista € nos quais 2 montagem nao tem ver. Alias, até mesmo em Griffith. Mas talvez esses exemplos sejam suficie tes para indicar a existéncia, no Amago do cinema mudo, de uma are cinematografica precisamente contréria @ que é identificada com o cinema por exceléncia; de uma linguagem cuja unidade semantica e sintética ndo de modo algum o plano; na qual a ima~ xgom vale, a principio, nao pelo que acrescenta mas pelo que revela da realidade, Para tal tendéncia, o cinema mudo nao passava, de fato, de uma enfermidade: a realidade, menos um de seus elemen- tos. Virtualmente, tanto Ouro e maldicdo como a Joana d’Arc, de Dreyer, j4 s80, portanto, filmes faiados. Se deixarmos de con- siderar a montagem e a composicso plastica da imagem como a propria esséncia da linguagem cinematografica, 0 aparecimento tos radicalmente diferentes da sétima arte. Um certo ci sou ter morrido com a banda sonora; néo foi de modo algum “o cinema’: o verdadeiro plano de clivagem estava noutsa parte, con- nuava — € continua — sem ruptura, a atravessar 35 anos da his- tOria da linguagem cinematografis Sendo, assim, a unidade estética do cinema mudo questionada ¢ repartida entre duas tendéncias intimamente inimigas, reexami- nemos a historia dos dhtimos 20 anos. De 1930 a 1940, parece ter se instituide pelo mundo afora, ¢ principalmente a partir da America, uma certa comunidade de expresso na linguagem cinematografica, E 0 triunfo em Holly- wood de cinco ou seis géneros que asseguram entZo sua massa- crante superioridade: a comédia americana (A mulher faz 0 ho- ‘mem, 1936), 0 burlesco (Irmaos Marx), 0 filme de danga e 0 musi hail (Fred Astaire Ginger Rogers, os Ziegfeld follies), o filme policial € de gangsteres (Scarface, a vergonha de uma nacdo, O Jugitivo, O delator), 0 drama psicologico ¢ de costumes (Esquina ‘do pecado, Jezebel), 0 filme fantastico ou de terror (0 médico & ‘0 monstro, O homem invisivel, Frankenstein), © western (No tempo A EVOLUGAO DA LINGUAGEM CINEMA LUGRAFICA, u Scarface, o vergo- das diligéncias, 1939). O segundo cinema do mundo &, sem davida alguma, no mesmo periodo, o francés; sua superioridade se afirma acs poucos numa tendéncia que podemos chamar grosseiramente Ge realismo noir ow realismo postico, dominado por quatro nomes: Jacques Feyder, Jean Renoir, Marcel Carné e Julien Duvivier Nao sendo nossa intengao premiar, seria imitit demoratmo-nos 1os cinemas soviético, inglés, alema0 e italiano, cujo periodo con- siderado € relativamente menos significative para eles do que os dez anos seguintes. As produgdes americanas e francesas bastam, em todo caso, para definir claramente o cinema falado anterior & guerra como uma arte que alcancou visivelmente o equilibrio ¢ a maturidade. Primeiro, quanto ao fundo: grandes géneros com regras bem claboradas, capazes de agradar 0 maior piiblico internacional ¢ interessar também uma elite culta, contanto que ela nao fosse @ priori hiostil ao cinema. estilos da fotografia ¢ da decupa- a; uma total recon- n ANDRE BAZIN cilfacao da imagem e do som, Revendo hoje filmes como Jezebel, de William Wyler, No tempo das diligencias, de John Ford, ou 0 Tragico amankecer, de Marcel Carné, teremos a sensagio de uma arte que encontrou seu perfeito equilibrio, sua forma de expresso ideal e, reciprocamente, admiramos neles os temas dramaticos ¢ ‘morais que, sem divida, nao foram totalmente criados pelo:cinema, mas a0 menos elevados por ele a uma grandeza, a uma eficdcia artistica que, sem cle, nunca teriam atingido, Em suma, todas as caracteristicas da plenitude de uma arte “ ” Compreendo que se possa, com razio, defender a tese que a originalidade do cinema do pés-guerra, em relagao ao de 1939, re- side na promogio de certas produgdes nacionais e, em pi no brilho ofuscante do cinema italiano e no aparecimento de cinema brit€nico original e lberado das influéncias hollywoodia- nas; que dai se tire a conclusio que o fenémeno realmente impor- tante dos anos 1940-1950 ¢ a intruséo de sangue novo, de uma ‘matéria ainda inexplorada; em suma, que a verdade! foi feita muito mais a nivel dos temas do que do e © cinema tem para dizer ao mundo, mais do que da dizer. O “neo-realismo” no é a io um humanismo de ser um estilo de mise-en-scene? E esse estilo néo se definiria essencialmente por um desaparecimento frente & realidade? Tampouco temos a intencdo de elogiar nfo sei que preeminén- cia da forma sobre 0 fundo. ‘“A arte pela arte” ndo € menos herege no cinema, Talvez, ainda mais! Mas a tema novo, forma nova! E saber como o é mais uma} maneira de compreender melhor o que ele quer nos dizer. “Em 1938 ou 1939, portanto, o cinema falado conhece, sobre- ido na Franga ¢ na América, uma maneira de perfeigao cl fundada, por um lado, sobre a maturidade dos géneros di cos elaborados durante dez anos ou herdados do cinema mudo e, or outro, sobre a estabilizacdo dos progressos técnicos. Os anos 30 foram a um s6 tempo os do som e da pelicula pancromitica ‘Sem dvida o equipamento dos estiidios nao parou de ser aperfei- oado, mas tais methoras eram apenas de detalhe, nenhuma delas abria possibilidades radicalmente novas para a mise-en-scbhe. Tal nao mudou desde 1940, a nio ser talvez no que toca a fotografia, gracas a0 aumento da sensibilidade da pelicula, A pancromética desequilibrou os valores da imagem, as emulsoes ultre-sensiveis permi ue seus contornos fossem modificados. Podendo rodar em com diafragmas muito mais fechados, A.EVOLUGAO DA LINGUAGEM CINEMATOORAFICA. 73 © operador pode, se fosse o caso, eliminar as imagens nebulosas dos planos de fundo que geralmente eram de rigor. Mas poderia~ mos, certamente, encontrar exemplos anteriores do emprego da profundidade de campo (como em Renoir); ela sempre foi possi- vel em cenas de externa ¢ até mesmo em estiidio, mediante algu- ‘mas proezas. Bastava querer. De modo que se trata, no fundo, menos de um problema técnico — cuja solugao, é verdade, foi enormemente facilitada — do que de uma busca de estilo, sobre a qual voltaremos a falar. Em suma, desde a vulgarizaco doy ‘emprego da pancromética, 0 conhecimento dos recursos do micro- fone e da gengralizacao do guindaste no equipamento dos esté- dios, podemos Bonsiderar adquiridas as condigbes técnicas necessé-| rias e suficientes para a arte cinematografica a partir dos anos 30. 34 que os determinismos téenicos foram praticamente el dos, € preciso entio procurar noutra parte os sinais ¢ os princi- pios da evolucdo da linguagem: no questionamento dos temas e, por conseguinte, dos estilos necessétios & sua expresso. Em 1939, © cinema falado chegara a0 que os gedgrafos chamam de perfil de um rio. Isto 6, a curva matemética ideal que € 0 fonte & sua embocadura ¢ cessa de ia mais seu leito. Mas, caso ocorra algum movimento geologico que aumente excessivamente a peneplano, modifique a altitude da fonte, a Agua comeca a trabalhar novamente, penetra nos terrenos subjacentes, embrenha-se, mina e escava. Por vezes, tratando-se de camadas de calcério, todo um novo relevo se esbova em baixo-relevo quase invisivel sobre o planalto, mais complexo e irregular no caso de seguirmos o curso da agua. EVOLUGAO DA DECUPAGEM CINEMATOGRAFICA A PARTIR DO CINEMA FALADO Em 1938, encontramos quase em toda parte o mesmo tipo de decupagem. Se chamamos, um pouco convencionalmente, “‘expres- sionista”” ou “‘simbolista”’ o tipo de filmes mudos fundados na composicéo plastica e nos artificios da montagem, poderiamos qualificar a nova forma de relato de “analitica”” © ‘dramética” Consideremos, para retomar um dos elementos da experiéncia de Kulechov, uma mesa posta e um pobre diabo faminto. Podemos imaginar a seguinte decupagem em 1936: 4 ANDRE BAZIN; 1, plano geral enquadrando a um s6 tempo 0 ator e a mesa; 2. traveling para a frente terminando no rosto que exprime uma mescla de maravilhamento e desejo em primeiro plano; 3. série de primeiros planos de viveres; 4. retorno ao personagem enquadrado de pé, que avanga len- tamente em direcao da camera; 5. ligeiro traveling para tras a fim de permitir um plano ame- rieano do ator apanhando uma asa de galinha. Quaisquer que sejam as variantes que se possa imaginar para essa decupagem, haveria ainda pontos comuns: 1. a verossimilhanga do espago, no qual o lugar do persona- ‘gem esta sempre determinado, mesmo quando um primeiro plano elimina o cenario; 2, a intengao € os efeitos da decupagem sto exclusivamente dramaticos ou psicoldgicos. Em outros termos, encenada num teatro e diante de um audi- ria exatamente 0 mesmo sentido, o acontecimento continuaria a existir objetivamente. As mudancas de ponto de vista da camera nada acrescentariam. Apresentam apenas a realidade de maneira mais eficaz. Em pr melhor vista, salientando em segi » quando permitem que seja, la © que merece ser salientado, E claro que, como o diretor de teatro, o diretor de cinema dis poe de uma margem de interpretacdo para onde pode dirigir o sen- ‘ido da acdo. Mas é apenas uma margem e, como tal, néo poderia modificar a logica formal do acontecimento. Consideremos, em contrapartida, a montagem dos ledes de pedra em O fim de Sdo Petersburgo; aproximadas com habilidade, uma série de escultu ras do a impressto de um iinico animal que se ergue (como 0 ovo). Esse admiravel achado de montagem ¢ impensavel em 1932, Em Firia, Fritz Lang introduz ainda em 1935, apés uma sucesso de planos de mulheres tagarelando, a imagem de galinhas cacare- jendo num patio. E uma sobrevivéncia da montagem de atracdes que ja chocava na época ¢ que, hoje, parece totalmente heterogé- «Rea ao resto do filme. Por mais decisiva que seja a obra de um Carné, por exemplo, em sua valorizacao dos roteiros de Cais de Sombras ou de Trégico amanhecer, sua decupagem permanece a0 lade que ele analisa, & apenas uma maneira de vé-la sistimos ao desaparecimento quase total dos tru- ques visiveis, tais a superposigao, e até mesmo, sobretudo do primeiro plano cujo efeito fisico por demais vi Tento tornaria a montagem sensivel. Na comédia americana tipica, © diretor retorna toda vez que pode ao enquadramento dos perso. AEVOLUGAO DA LINGUAGEM CINEMATOGRAFICA 15 nagens acima dos joelhos, que se verifica mais de acordo com a atengao espontinea do espectador, © ponto de equilfbrio natural de sua acomodacao mental. De fato, tal pratica da montagem tem suas origens no cinema E nos O mesmo papel que ela desempenha em io partido, por exemplo, pois, com Intolerdn- duz a concepcdo sintética da montagem que jevard As suas iltimas conseqiiéncias € que se ‘menos exclusivamente, accita por toda parte no final do cinema mudo. Compreende-se, alfés, que a imagem sonora, muito ‘menos maledvel. que a imagem visual, tenha levado a montagem iando, cada vez mais, tanto 0 expressionismo icas entre as imagens. de 1938, os filmes eram, de fato, quase sem excegiio, decupados segundo os mesmos principios. A historia era deserita por uma sucessdo de planos cujo niimero variava relativa- mente pouco (cerca de 600), A técnica caracteristica dessa decupa- gem era 0 campo/contra-campo: €, por exemplo, num didlogo, @ tomada alternada, conforme a logica do texto, de um ou outro interlocutor. Foi esse 0 tipo de decupagem, perfeitamente conveniente aos melhores filmes dos anos 30 a 39, que a decupagem em profundi- dade de campo de Orson Welles e de William Wyler veio questionar. ‘A notoriedade de Cidadao Kane nao poderia ser exagerada. Gragas & profundidade de campo, cenas inteiras séo tratadas numa {inica tomada, a cdmera ficando até mesmo imovel. Os efei- tos draméticos, que anteriormente se exigia da montagem, surgem aqui do deslocamento dos atores dentro do enquadramen Uhido de uma vez por todas. E claro que Orson Welles no tou" a profundidade de campo, como tampouco Griffith inventou ‘© primeiro plano; todos os primitives do cinema a utilizavam, e por razies Sbvias. A imagem nebulose sé apareceu com a monta- gem. Ela néo era apenas uma sujei¢do técnica consecutiva a0 ‘emprego dos planos préximos, mas a conseqiiéncia légica da mon- tagem, sua equivaléncia plistica. Se, a tal momento da ago, 0 diretor faz, por exemplo, como na decupagem acima imaginada, um primeiro plano de uma fruteira, é normal que a isole também no espaco pela focalizacdo. A imagem nebulosa do fundo confirma gem, ela pertence apenas acessoria- mas essencialmente a0 do relato, Jean Renoir ja tinha perfeitamente compreendido quando esere- veu em 1938, isto é, depois de A besta humana e A grande ilusto 6 ANDRE BAZIN ce antes de A regra do jogo: “Quanto mais avango em minha pro- fissio, mais sou levado a fazer a mise-em-scéne em profundidade em relagao @ tela; quanto mais isso funciona, mais eu evito criar © confronto entre dois atores colocedos obedientemente diante da c&mera como no fotdgrafo””. E, com efeito, se procurarmos o: precursor de Orson Welles, nao seré Louis Lumiére ou Zecca, mas Jean Renoir. Em Renoir, a busca da composigao em prof didade da imagem corresponde efetivamente a uma supressio par- cial da montagem, substituida por fregitentes panordmicas ¢ entra- das no quadro. Ela supde 0 respeito & continuidade do espaco dramético e, naturalmente, de suua duracao. E evidente, para quem sabe ver, que os planos-seqtiéncia de Welles em Soberba nao so de modo algum “o registro” passivo de uma agdo fotografada num mesmo quadro, mas, 20 contrério, que a recusa de cortar 0 acontecimento, de analisar no tempo & rea dramitica, € uma operacdo positiva cujo efeito & superior ‘a0 que a decupagem clissica poderia ter produzido. Basta comparar dois fotogramas em profundidade de campo, uum de 1910 ¢ 0 outro de um filme de Welles ou de Wyler, para compreender s6 ao ver a imagem, mesmo separada do filme, que sua funcao é bem diferente, O enquadramento de 1910 ident se praticamente com a quarta parede ausente do palco do teatro ‘ou, pelo menos em cenas externas, com 0 melhor ponto de vista sobre a ago, enquanto que 0 cenétio, a iluminacao ¢ 0 Angulo dao, & segunda paginacdo, uma lesibilidade diferente. Na superfi- cie da tela, o diretor eo operador souberam organizar um tabuleiro de xadrez dramético, do qual nenhum detalhe é excluido. Encontra- remos os exemplos mais elaros disso, se nao 0s mais originais, em Pérfida, no qual a mise-en-scene ganha um rigor depurado (em Welles a sobrecarga barroca torna a anélise mais complexa). A colocagdo de um objeto em relagao aos personagens é tal que 0 espectador no pode escapar a sua significacdo. Significacdo que ‘a montagem teria detalhado num desenrolar de planos sucessivos.? Em outros termos, 0 plano-seqiiéncia em profundidade de campo do diretor modemo nao renuncia & m poderia renunciar sem recair num balbucio pri A composicao pldstica. O relato de Welles ou de Wyler nao € menos explicito que o de John Ford, mas ele tem sobre o tiltimo a vanta- gem de ndo renunciar aos efeitos particulares que se pode tirar da unidade da imagem no tempo ¢ no espago. Nao é indiferente, com efeito (pelo menos numa obra que consegue ter estilo), que um acontecimento seja analisado por fragmentos ou representado em A EVOLUGAO DA LINGUAGEM CINEMATOGRAFICA 77 sua unidade fisica, Seria evidentemente absurdo negar os progres- sos decisivos trazidos pelo emprego da montagem na inguagem da tela, mas eles foram adquiridos em detrimento de outros valo- res, no menos especificamente cinematograficos. Por isso, a profundidade de campo nao ¢ uma moda de opera~ dor com 0 emprego de filtros ou de tal estilo de iluminagio, mas uma aguis tum progresso dialético na historia da linguagem cinematogratica. E isso nfo € apenas um progresso formal! A profun de campo bem utilizada nao € somente uma maneira a um s6 tempo mais econdmica, mais simples e mais s acontecimento; ela afeta, com as estruturas da linguagem cinema tografica, as relat jabes intelectuais do espectador com a imagem ¢, com isso, modifica 0 sentido do espetdculo. ‘O assunto deste artigo levaria a analisar as modalid Iogicas dessas relagdes, quando nao suas relacdes estéticas, mas poderd ser suficiente observar grosso modo: 1. que a profundidade de campo coloca o espectador numa relagdo com @ imagem mais proxima do que a que cle mantém com a realidade, Logo, é justo dizer que, independente do proprio conteido da imagem, sua estrutura é mais realista; 2. que ela implica, por conseguinte, v1 ativa e até mesmo uma contribuigdo pi cisa seguir o guia, dirigir sua atengdo par: Ihe para ele 0 que deve ser visto, Ihe é si escolha pessoal. De sua atengao ¢ de sua vontade depende em parte o fato de a imagem ter um sent 3. das duas proposigdes precedent decorre uma terceira que pode ser qualificada de metafisica. ‘Analisando a realidade, a montagem supunha, por sua pré- pria natureza, 2 unidade de sentido do acontecimento dramatico. Sem diivida, outro encaminhamento analitico seria possivel, mas entao teria sido um outro filme. Em st essencialmente € por natureza a expressio da ar que a experigncia de Kulechov demonstra justamente por absurdo, dando a cada sentido preciso 20 rosto cuja ambigilidade nude mental mais espectador @ Em contrapartida, a profundidade de campo reintroduz a am- bigilidade na estrutura da imagem, se nfo como uma necessidade de Wyler so pouco ambiguos), pelo menos como uma fade. Por isso nao é um exagero dizer que Cidadao Kane ANDRE BAZIN tor moderno nao renuncla 4 montagem, ele 1A cena da sucidio fracessado em Cidaddo Kane. 86 pode ser concebido em profundidade de campo. A incerteza fem que permanecemos da chave espiritual ou da interpretacko esta, a principio, inserita nos préprios contornos da imagem Nao que Welles se proiba recorrer aos procedimentos expressio- nistas da montagem, mas justamente a utilizacto ocasional deles, entre os “*planos-seqiiéncia”, em profundidade de campo, Ihes con- fere um sentido novo. A montagem constituia outrora a propria matéria do cinema, a textura do roteiro, Em Cidadao Kane, um encadeamento de superposigdes opdese & continuidade de uma cena representada numa tinica tomada, ele é outra modalidade do relato, explicitamente abstrata. A montagem acelerada jogava com ‘© tempo e com o espaco; a de Welles nao procura nos enganar, a0 contrario, se propde, por contraste, como uma condensacao temporal, o equivalente, por exemplo, do imperfeito francés ou do freqiientativo inglés. Assim, a ““montagem répida”’ ¢ a ‘‘monta- gom de atragdes", as superposicdes que o cinema falado nao mais empregara durante dez anos, voltam a ter um uso possivel em rela. ‘¢f0 a0 realismo temporal de um cinema sem montagem. Se nos demoramos no caso de Orson Welles, foi porque a data de seu apa- recimento cinematografico (1941) marca bem © comeco de um A EVOLUCAG DA LINGUAGEM CINEMATOGRAFICA 8 novo periodo, ¢ também porque seu caso é 0 mais espetacular € 0 mais significativo em seus préprios excessos. Entretanto, Cidadao Kane se insere num movimento de conjunto, num vasto desioca- mento geol6gico dos fundamentos do cinema, que confirma quase em toda parte, de algum modo, essa revolugao da linguagem. Eu encontraria uma confirmaco disso, por caminhos diferen- tes, no cinema italiano, Em Paisa e em Alemanha ano zero, de Roberto Rossellini, «em Ladrdes de bicicleta, de Vittorio de Sica, © neo-realismo italiano opde-se as formas anteriores do realismo cinematogrAfico pelo despojamento de todo expressionismo e, em particular, pela auséncia total dos efeitos de montagem. Como em Welles, e apesar das oposigdes de estilo, 0 neo-realismo tende justamente oposta a de Kulechov diante do primeiro plano de Mosjukine. Trata-se de conservar seu mistério. Nao devemos nos iludir com 0 fato de a evolusao neo-tealista ndo parecer se tradu- zir, a principio, como nos Estados Unidos, por alguma revolucao na técnica da decupagem. Sao muitos os meios para atingir 0 mesmo objetivo. Os de Rossellini e os de De Sica sio menos espe- taculares, mas também visam acabar com a montagem e a fazer entrar na tela @ verdadeira continuidade da realidade. Zavattini nao sonha com outra coisa que filmar a vida de um homem a ‘quem nada acontece! O mais “esteta’” dos neo-realistas, Luchino Visconti, revelava — t€o claramente, aliés, quanto Welles — 0 projeto fundamental de sua arte em La terra trema, filme com- posto quase unicamente de planos-seatiéncia, no qual a preocupa- sao de apambarcar a totalidade do acontecimento se traduz pela profundidade de campo ¢ por intermindveis panoramicas. Nao poderiamos, porém, passar em revista todas as obras que participam dessa evolugao da linguagem desde 1940. E hora de ten- tar uma sintese dessas reflexoes. Os titimos dez anos parecem marcar os progressos decisivos no campo da expresso cinemato- aréfica. Foi propositalmente que parecemos perder de vista, a par- tir de 1930, a tendéncia do cinema mudo ilustrada particularmente por Erich Von Stroheim, F. W. Murnau, R. Flaherty e Dreyer Nao que parecesse extinta com o cinema falado. Pois, muito pelo contritrio, pensamos que cla representava o veio mais fecundo do cinema dito mudo, 0 tnico que, precisamente porque o essencial de sua estética nao estava vinculado a montagem, atraia o realismo sonoro como um prolongamento natural. E bem verdade, porém, que 0 cinema falado de 1930 a 1940 nao Ihe deve quase nada a ‘nao ser a excecdo gloriosa e retrospectivamente profética de Jean <0 ANDRE BAZIN Em Le terra trenta, de Luchino Visconti, a preocupagio de agambarcar 3 tolalidade Gos acontecimentos se traduz pela profundidade de campo e por incerminaveis panorirnicas as Rava Renoir, © tinico cujas pesquisas de mise-en-scéne esforcam-se, até A regra do jogo, para encontrar, para além das facilidades da montagem, © scgredo de um relato cinematografico capaz de expressar tudo sem retalhar 0 mundo, de revelar o sentido oculto dos seres e das coisas sem quebrar sua unidade natural Nao se trata, contudo, de langar sobre o cinema de 1930 a 1940 um descrédito que nao resistiria, alids, de modo algum, & evidéncia de algumas obras-primas mas simplesmente de introdu- zir a idéia de um progresso dialético cuja grande articulacao ¢ marcada pelos anos 40. £ verdade que o cinema falado anunciow a morte de uma certa estética da linguagem cinematografica, mas somente daquela que o distanciava mais de sua vocacZo realista Da montagem, no entanto, o cinema falado tinha conservado 0 essencial, a descri¢ao descontinua ¢ a analise dramatica do evento. Renunciou & metafora ¢ ao simbolo para esforcar-se na ilusto da representacdo objetiva. O expressionismo da montagem desapare- ceu quase que completamente, mas o realismo relative do estilo A EVOLUCAC SUAGEM CINEMATOGRAFICA 8 de decupagem, que triunta geralmente por v~!ta de 1937, impli- cava numa limitagao congénita da qual né~ podemos nos dar conta enquanto os assuntos tratados !> cram perfeitamente apro- priados. E 0 que acontecia na coméd:: americana, que atinge sua perfeigio no ambito de uma decopagem em que o realismo do tempo ndo desempenhava papel algum. Essencialmente légica, como 0 vaudeville ¢ 0 jogo de palavras, perfeitamente convencio- nal em seu conteiido moral ¢ sociolégico, a comédia americana sé tinha a ganhar com o rigor descritivo e linear, com os recursos rmicos da decupagem classica, Foi, provavelmente, sobretudo com a tendéncia Stroheim- Murnau, quase eclipsada de 1930 a 1940, que o cinema reata mais ou menos conscientemente durante os iiltimos dez anos. Mas ele nao se limita a prolongé-la, busca também ali o segredo de uma regenerescéncia realista do relato; este torna-se novamente capaz de integrar 0 tempo reat das coisas, a duragao do evento 20 qual a deeupagein, classica substitufa insidiosamente um tempo intelec- tual e abstrato. Longe, porém, de eliminar definitivamente as con- “quistas da montagem, ele Ihes da, ao contrario, uma relatividade © um sentido. E apenas em relagdo a um realismo acrescido a ima- gem que um suiplemento de abstragao torna-se possivel. O reperts- ., 0 estiligtico de um diretor tomo Hitchcock, por exemplo, estende- se dos poderes do documento-bruto as superposicdes ¢ ads closes. Mas. os primeiros planos de Hitchcock nao so os de C. B. de Mille em Enganar e perdoar. Sao apenas uma figura de estilo entre outras. Em outros termos, no tempo do cinema mudo, a monta- gem evocava 0 que o realizador queria dizer; em 1938, a decupagem. descrevia; hoje, enfim, podemos dizer que o diretor escreve direta- mente em cinema, A imagem — sua estrutura plastica, sua organi- zapdo no tempo —, apoiando-se num maior realismo, dispde assim de muito mais meios para infletir, modificar de dentro a realidade. cineasta nao ¢ somente o concorrente do pintor e do dramaturgo, mas se iguala enfim ao romancista. igos, o primeiro esctito para o liv ani- 3), © segundo, inttulado “A decupagern lstragOes precisas desta endlise podem ser encontradas no proprio estudo sobre iam Wyler

You might also like