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“Al6, amigos”: 0 soft power da Boa Vizinhanga chega pela Disney ilstine Koehler Zanella'*? Em 2003, apés ouvir atentamente o professor Joseph Nye J. discorrer sobre o soft power (em portugués, poder brando), 0 Secretario de Defesa dos Fstados Unidos, Donald Rumsfeld, afirmou: “Eu no sei o que isso significa’* (apud Nye, 2004:1X). Nesse tempo, os Estados Unidos do Presidente George W. Bush jétinham revidado os ataques de m de setembro de 2001, por meio de tropas lideradas pela Orgunizacio do Tratado do Atlintico Norte (OTAN) para combater a rede Al-Quaeda no Afeganistdo, é tinham derrubado 0 governo de Saddam Hussein pelo suposto ~ ¢ nunca comprovado ~ arma- zenamento de armas de destruigio em massa, Nesse tempo, também, as ppesquises mostravam que a imagem positiva dos Estados Unidos no exterior ‘se esfacelava e continuava a se deteriorar paralelamente ao crescimento do antiamericanismo derivado das politicas internacionais unilateraisem marcha (Pew Research, 2003a e 2003b). Nao era estranho, portanto, que Rumsfeld 1, Doutoranda em Estudos Fstratégicos Intern sla Universidade Federal do Rio ‘Grande do Sul (UFRGS) e doutorands em Cincia Politica pela Ghent University (OGent! Bélgia). Mestre em Integraio Latino-Americana, Bacharel em Direto ¢em Economia, todos pela Universidade Federal de Santa Maca (UESMD. an autora gostaria de agradecer & Edson J. Neves fr, Inaé Siqueira de Oliveira e Maia Carolina Silveira Betaldo pelos muito tei comentarios. Naturalmente,eseventuais equ voces subsistentes devem ser creditados somente& autora. Ei portuguésotermo tem sido traduzido como poder brando, Neste capitulo, ustr-e-4 indistintamente um e outro temo, embora autora considere quea versioem portugues no Tetrata todo o sentido que o conceit carrega na lingua em que foi orginalmente cunhado por sto, dé preferéncia para a utlizagio do termo no orginal doo’ t know what it means” (Rumsfeld apud Nye, 20061). do soubesse do q| 1.0 soft power: ele foi um dos principais artifices da erosio do poder brando estadunidense neste século, ‘0 mesmo nio se pode dizer do trabalho de Nelson Rockefelle do Eseritério do Coordenador de Assuntos Interamericanos (Office of the Coordinator of Inter-American Affairs - OCIAA) durante o governo di presidente Franklin Delano Roosevelt, na primeira metade da década 1040. Para contrapor influéncia da Alemanha nazista na América Lis Rockefeller articulou com Hollywood, especialmente com Walt Disney, 9 abordagem audiovisual da Politica de Boa Vizinhanga. Os filmes produvidlo nos Estados Unidos, nesse contexto, atenderiam tanto ao interesse de relralar ‘mais positivamente a América Latina para os estadunidenses quanto a0 prevenir que imagens ofensivas para os latino-americanos fossem a est ‘exportadas a partir dos Estados Unidos. O desenho e documentério Sali Anigos, langado no Brasil em 1942 com 0 titulo Ald, amigos! foi produzido ‘com essas finalidades e é, muito provavelmente, o melhor exemplo da di ‘mensio cultural da Politica de Boa Vizinhanga. Em um livro cujos trabalhos analisam espagos e atores transnacionsi a partir das ferramentas teéricas das Relagdes Internacionais, investigar 0 contexto hist6rico de produgao, financiamento e criagao de “Ald, amigos! ‘ontribui para avaliar a importincia da participagio de atores transnacionsis na arquitetura do soft power dos Estados Unidos. O soft power de Roosevelt, Rockefeller e Disney Nas RelagGes Internacionais é comum associar poder a posse de recur sos materiais suficientes para fazer com que outros sujeitos se comportem conformea vontade daquele que detém esses recursos. Assim, a populacio, o territério, a riqueza, o ntimero de avides ou blindados, entre outros, foram historicamente identificados como os recursos de poder. Porém, em.1999 (e, de forma sistematizada, em 2004), Joseph Nye Jt. provocowa dea ao cunhar a expressio soft power para conceituar a habilidade de se conseguir 0 que se quer por meio da atragio ao invés de coergo ou pagamentos, Em con- traposicdo ao hard power, cujos recursos para influenciar comportamentos so materiais, no soft powera capacidade de influéncia sobre outros sujeitos erivaria de trés recursos diferentes: “cultura (quando esta for atrativa aos thos dos outros), valores politicos (quando forem reproduzides doméstica as (quando elas sio vistas como ¢ internacionalmente) e politicas exter Jegitimas e dotadas de autoridade moral)” (Nye, 2004: Quando elaborado, o termo soft power influenciou a compreenséo sobre o poder, nao por ser uma novidade em termos de conceituacio ~ 0 poder continua ser compreendilo, por Nye, como a capacidade de um ator influenciaro comportamento de outros atores'—, mas porque, ao distinguir entre hard ou soft, Nye criou uma tipologia de poder organizada conforme (os recursos capazes de influenciar o comportamento de outros atores. O (i) hard power foi definido como a categoria de poder cujos recursos emanam ) soft power foi definido como a ca- da coergio militar ou econdmica, € tegoria de poder cujos recursos emanam da atracio exercida por meio da ‘cultura, dos valores politicos e das politicas externas de um pais (Nye, 2004) ‘Assim definido, é possivel perceber a construcio do que viriaa ser 0 soft ‘power estadunidense mesmo antes de esse conceito ter sido formulado. Tal ‘60 caso da dimensio cultural da Politica da Boa Vizinhanea de Roosevelt para a América Latina, Nela, Fstado, homens de negécios, dirigentes da industria cinematogréfica e de entretenimento dos Estados Unidos esfor- aram-se para, ainda durante a Segunda Guerra Mundial, conquistar os latino-americanos e afastar o avango comercial ¢ ideoldgico de poténcias ‘europeias (especialmente Alemanha ¢ Itdlia) na regio. O melhor caminho para atingir esses objetivos nao era o das armas. ‘Na década de 1930, os Estados Unidos abandonaram a politica inter- vencionista na América Latina e inauguraram o perfodo da Politica de Boa Vizinhanga’. Alguns pressupostos dessa iniciativa eram o abandono da 5: Essa compresnsto de poder encontrs-se dentro da teoria social do poder, quecoloca nase ho carder telacional deste ena qual o poder édefinido como "a capacidade do homem em Ueterininar ocomportamento do homem” (Stoppino, 0047932). O poder, assim, ndo reside fm uma coisa (eomo dinhelro, armas, posses et), mas o flo de ue um sueto élevadoa Comportarse de acordo com os desejos de outro sujlto(Stoppino, 2004934. ‘Entre gS €19330s Estados Unidos intervieram ow ocuparam militarmente os seguintes palsesmna América Centrale Caribe: Cuba (19891902, 1906-19, 913, 19171922), Guatemal {0920}, Haiti 5-934), Honduras (903.1907, 19,1912, 1924, 1923). México (149363917), ‘Nicarigua (i909, 110, 1912-1925, 1936-103), Panam (903), Porto Rico (1898) e Repblica Dominicana (903, 1908, 1905 191, 19161924) (Dabéne, 2003:39). politica de intervengio militar eo reconhecimento da igualdade juridica de todas as nagées no continente, da necessidade de mecanismos de consult entre os Estados para resolver eventuais desentendimentos e da importiicia da cooperagao pelo bem-estar dos povos das Américas (Moura, 2012:39) ‘Com a edlosao da Segunda Guerra Mundial, a manutengiio das bi relacdes com os latino-americanos mereceu, inclusive, alguns sacrilicio ‘como no caso da nacionalizagio das empresas petroliferas que atuavan\ ‘México, em 1938. O governo dos Estados Unidos inicialmente tentow iar um acerto para indenizagao das empresas americanas, mas acabou retirando do conilito para nao comprometer sua Politica de Boa Vizinhanga Na realidade, os Fstados Unidos pretendiam estabelecer um forte (hiss de comércio continental em seu beneficio, que viesse competir ¢91) 4 presenga europeia e, sobretudo, por termo ao comércio da Améric Latina com a Alemanha, que crescia a passos de gigante em conse uéncia dos acordos de compensagio, (Cervo, 2007:49) Os interesses americanos com a sua Politica de Boa Vizinhanga na re sido, portanto, eram bastante especificos: afastar a influéncia de ideolosi de inspiragao totalitiri, como o fascismo eo nazismo, e garantir 0 comércio regional para o pais. Tratava-se de uma retomada do espirito da Doutrin: Monroe (do afastamento de potencias estrangeiras do continente americano) adaptada as novas ameagas das décadas de 1930 € 1940. 7.A Doutrina Monroe, enunciada pelo presidente James Monroe em sa sétima mensagem 10 Congresso dos Estados Unidos, em 2 de dezombro de 183, consistiaem um caro arta 8 que as potenclas europetas se abstivessem de qualquer ingeréncla nos assuntos das Américas (Renchan, 2007:,8). Nas palavras do presidente Monroe: “Julgamos propicia «sta ocasio para afirmar como um prineipio que aetaos direitos e iteresses dos Estados Unidos, que os continentes americanos, em virtude da condigi livre eindependente que adguiriram e conserram, mio podem mais ser considerados, no futuro, como suscetives le coloniza;to por nenhuma poténcia europa ..] Ndotemos interfer, nem intereriremnos fem assuntos das atuats coldnias ou dependéncias de nenhuma das potencias europeias. ‘Mas, quanto aos governos que proclamaram e tém mantido sua independéncia que reco hecemos, depois de éria reflecio e por motivs justo, ni poderiamos considerat senao como manifestagdo de sentimentos hostis contra os Estados Unidos qualquer intervengao de alguma poténcia europeia come propésito de oprimi-los ou de contrarar, de qualquer ‘mado, 0 seus destinos. (Biblioteca Virtual de Dicetos Humans, 201). ‘De 1938 1945, 0 presidente Roosevelt comandou os Estados Unidos ea ‘ua politica externa foi direcionada A concretizagio desses interesses. Antes de se voltar para a América Latina, houve uma tentativa de incrementar 0 ‘gomércio logoem noyembro de 1933, quando Roosevelt reconheceu o governo da Unido Soviética. Porém, as expectativas foram frustadas. Oportunidades melhores pareciam surgir efetivamente a0 negociar acordos comercias bila- {erais com diversas nagdes ~ estabelecidos a partir de 1935 ~ eao impulsionar relagbes mais cordiais com a América Latina (Freidel, 979.141). A presenca ino 86 econ6mica, mas também cultural e politica do nazismo germanico na regio, preocupava a presidéncia norte-americana e seus conselheiros. Em 1936, um relatorio de Carl Ackerman, académico da Columbia University, reportou que na América Latina existia “uma alarmante aceitagio do tota- litarismo europeu” e que “os préximos anos determinarao se a América do Sul permanecers americana ou setornarditalo-germanizada" (Gellman 1979 ‘apud Adams, 2007:290). No final da década, Roosevelt estava “convencido ‘que a Alemanha nazista representava uma grande ameaga 3 seguranca dos Estados Unidos e & Doutrina Monroe” (Smith 1976 apud Adams, 2007:290). Para estreitar lagos comerciais com a regio e afastar as influéncias nazistas, Roosevelt criou, em 1940, 0 Office for Coordination of Commercial and Cultural Relations between the American Republics, mais tarde reno- ‘meado simplesmente como Office of the Coordinator of Inter-American Alfairs (OCIAA). O empresirio Nelson Rockefeller foi escolhido pelo pré- prio presidente para chefié-lo, Fora Rockefeller que, preocupado com a presenga nazista na América Latina, tinha sugerido a criago do OCIA (Thomson, 1972). Rockefeller tinha interesse de longa data na América Latina em fungio dos investimentos no setor petrolifero que sua familia mantinha inicial! mente na Venezuela e, depois, também em outros paises. Para a missio de estreitar lagos com a regio, Rockefeller dispendeu especial esforco nas relagoes culturaist. Quando assumiu o OCIAA, um dos seus primeiros atos '8.Além da dimensio cinematogrificada Politica de Boa Virinhanga, diplomaci cultural desenvolvida pelos Fstados Unidos inclu patrocinio deviagens de artista su-america nos ao pafs. Um brasileiro beneficiado por esta politica fol oescrtor Erico Verissimo, Em janeiro de 1941 oescritor embarcou paratuma vagem detets meses aos Estados Unis, Com no érgio foi criar uma divisio de cinema que iria trabalhar para que 0s filmes de Hollywood passassem a apresentar uma leitura mais favorivel dos latino-americanos (Adams, 2007). A primeira parte da critica do colunisl L. Gomes ao filme Alb, amigos!, publicada em setembro de 1942, revels 4 desgastada relagao que antes existia entre a América Latina e Hollywood esta retratando aquela como estereotipada & exaustao nas telas de cinews ‘Uma das historias mais tristes que poderiam ser contadas antes ces\9 guerra seria uma narrativa bem simples e verdadeira dos contactos ei Hollywood ea chamada América Latina, nos bons tempos que che) até 1940, Nio é nada agradivel uma visio retrospectiva nesse sentid pois dela sairia uma impressio deprimente da incompreensio mits tem que viveram as duas metades da América que, contudo, tinh ‘um destino comum e vidas que se completavam, Eis porque, cada ver ‘em que nos lembramos de quantos filmes se fizeram com 0s ceniri naturais cos tipos humanos que vivem aquém Texas, no podemos yer com bons olhos os mosquitos, as febres, os pantanos, a falta de bali» a impetuosidade temperamental com que, a cada passo das ita, 1 presenteavam. A coisa chegou. tall ponto que mesmo nés comegaus nos enxergar com olhos de diretores pouco concenciosos. Os brasil por exemplo, comegaram a ver no mexicano um bandide potenc pronto a atacar a diligéncia que passasse mais préxima. Quanto a0 ‘mexicamos, nfo quero saber queda tinham de nds... (Gomes, 1942:7) (Onomeado por Rockefeller para tomar conta da tarefa de supervisionar Holly wood foi seu amigo de longa data John Hay Whitney, conhecido jogador de polo, com étimas relagbes no mundo da arte por ser, além de vice-diretor do Museu de Arte Moderna de Nova lorque, mecenas da ima arte, tendo atividades egendadas, Verssimo conheceu Helly wood e ficou uma manha itera viitando ‘os estidios da Disney. Foi ecebido por grandes esritorese artistas, como Thomas Mann, Somerset Maugham, Orson Welles, Walt Disney e Alfed Hitchcock. O escritor,perspicaz entendedor do contexto politico em que sua Viagem se insera, no se surpreendeu quando, para agradé-lo, alguns anfitries tentaram mostrar proximidade, langando ao meto da conversa um convite para uma "festa", ou se despedindo com um "adios". A experiénela ‘est retratada em Gato preto cm capo de neve, livro que revela os Estados Unidos a partir dda peespectiva de um contador de hstérias ~ como ele sempre se deiniu. patrocinado filmes icdnicos, como Eo Vento Levou, Semanas ‘6 cargo, Whitn jiitinha uma relagao de artistas, produtores, diretores e escritores entusiasmados em cooperar com as diretrizes de aproximagao com a América Latina (Adams, 2007). Whitney conquistou também outra peca fundamental para fazér fun- cionar essa diplomacia americana por meio do cinema: a Motion Picture Producers and Distributors of America (MPPDA). Fundada em 1922, a MPPDA, hoje apenas Motion Picture Association of America, € uma asso- ‘igo comercial que representa os seis maiores estidios de Hollywood e euida da promogaio dos seus negécios*. Atualmente essa associagao comercial ‘busca abertura de mercados eluta contra a pirataria do material audiovisual. Nas suas primeiras décadas de existéncia, a MPPDA, influenciada pela pressio popular que demonstrava preocupacio com o papel degenerativo dos contetidos dos filmes, criou um sistema de autocensura que resultou na criagio do Production Code (Murphy, 1975:493)- Whitney conseguit convencer a MPPDA a contratar o cubano Addison Durland para chefiar ‘a divisio do Production Code para a América Latina, Ele seria 0 principal ‘responsivel por controlar a diplomacia cultural da Boa Vizinhanca no seu duplo objetivo de (a) evitar ofender a sensibilidade dos latino-americanos «¢ apresentar os estadunidenses como mais proximos a eles, ¢ de (b) apre- sentar uma imagem mais positiva dos latino-americanos para o piblico estadunidense (Adams, 2007). Em sua vertente cultural, o OCIAA de Rockefeller, além de super sionar 0 que era produzido, dava apoio direto a determinadas produgdes. ‘Um destes apoios foi dado a Orson Welles, jé reconhecido pelo trabalho em Gidaddo Kane, de 1940, que foi convidado para a tarefa de desenvolver filmes dentro do espirito da Politica de Boa Vizinhanga. Welles comegou a trabathar em um documentério sobre historia veridica de trésjangadeiros {que navegaram das costas de Fortaleza ao Rio de Janeiro para protestar contra ‘© presidente Getilio Vargas, cm fungao das suas leis de seguridade social, ‘que os excluia. 0 documentario it all true (E tudo verdade) mostraria cenas 5, secs eatidios membrosda MPPDA cio Walt Disney Studios Sony Pictures Entertaiment, Paramount Pictures, 2oth Century Fox, Universal Studios e Warner Bros de negros e pobres®, ¢ seu retrato realista nao agradou nem ao presidente brasileiro Getilio Vargas, nem ao chefe do OCIA, Nelson Rockefel ‘Naturalmente, o trabalho nao chegow a ser concluido (Sadlier, 2007). 0 que estava em jogo nao era retratar a América Latina, ‘Tratava-se de negocios « de afastar as influéncias totalitirias, especialmente as alemas. Para aprox) ‘mar a América Latina e, sobretudo, para atrair os latino-americanos par a esfera de influencia dos Estados Unidos, era necessirio destacar a aley iy € 0 encontro fraterno de povos ¢ culturas. Nacla melhor para isso que 0) abordagem mais lidica da regiao. Assim como Rockefeller, Walt Disney também era um empresirio pre ‘ocupado com 0 rumo dos seus negécios. Disney gozava do sucesso cle sev Personagens em solo americano, mas enfrentava protestos de seus artis ‘que pararam em uma expressiva greve em 1941. Com o mercado europe\i cada vez mais fechado devido A expansiio nazista, a ampliagio dos neyoci para o mercado latino-americano era uma alternativa sedutora, até poryii suas criagSes, como o filme Fantasia e 0 personagem Pato Donald, ja erat admiradas aquém Texas", Disney aproveitaria a oportunidade para cons truir uma das maiores parcerias de Hollywood com o governo Roosevelt “ninguém trabalhou mais proximo ao escritério de Roosevelt [OCIA, durante [a era da Boa Vizinhansa] que Walt Disney. De fato, Disney cr © chefe propagandista do escritério para a Politica de Boa Vizinhangai (Richard 1993 apud Adams, 2007:293). Seus filmes Ald Amigos! e Vocé ja fo 4 Bahia? estao entre as obras mais emblematicas da politica cultural de Bio: ‘Vizinhanga dos Estados Unidos para a América Latina’, ‘Em 493,08 dircores Richard Wilson, Bill Krohn e Myron Meisllancaram. document homénimo (i's all true), no qual narram a aventura de Orson Welles na América Latina na época da Politica de Boa Viinhanga. 1, No Brasil, em 1940, hd diversos sinais do reconhecimento que as produgies Disney leangavamn no Brasil, Em setembro, Pato Donald era wilizado como uina especie de gare to-propaganda para chamaropiblicoparaa inauguracio da Cineac, sala pars aexbicto de filmes na Cincindia (Fotha de Noite, 194022). Dols meses mais tarde, quando foi lange ‘fle Fantasia, Folha da Note pubicou uma coluna intitlada "Walt Disney supera-s asi mesmo”, celebrando o génio cratvo de Disney que conseguira, de forma "prodigiosa ‘combina “musica sinfonica, imagens e cores ~ pesas de Beethoven, Bach e Tehaikowsky em uum desenho animado” (Palka da Noite, 940:04) 1a, Alem dos desenhos de Disney Holly wood prodiziu uma série de outros materia dentro ‘do esprit da politica de boa vizinhanga, entre os quais se destacam alguns melodramas Os atores transnacionais do mundo cinematogratico hollywoodiano, que moldam a forma de ver o mundo de centenas de milhares de Ame espectadores no exterior, slo fonte de soft power para os Estados Unidos. Bissa atratividade da cultura estadunidense, em grande parte transmitida pelo cinema, chega até hoje, integrada nas percepgdes, entendimentos ¢ agbes das pessoas: {.-] parte do conhecimento pritico das pessoxs assimilaram os simbolos valores americanos, Esse é um ponto relevante quando se considera ‘que crescente extensio, intensidade e velocidade da interacio global «encoraja os fluxos culturais e materiais por todo o mundo. Nesse con- texto, aqueles que vém dos Estados Unidos prevalecem porque os seus « simbolos estio profundamente incorporados em sociedades estrangeiras, ‘o que as faz mais receptivas a esses valores e bens (Bohas, 2006:397), As racionalidades, a forma de julgar as acbes, os padres de compor- tamento, enfim, 0 conjunto de valores e simbolos que sio transmitidos pelo cinema em determinado momento se tornam tao habituais que as sociedades que os receberam perdem 0 controle sobre eles. Esse € um processo longo ¢€ profundo, Sem pretender fazer um julgamento de valor sobre a cultura = o que seria nao s6 imprudente como invisvel -, 0 fato que o mundo se torna socializado em uma cultura, sobre a qual os povos ¢ os Estados tém menos controle do que sio controlados. Essa linha de raciocinio permitiria « diversos musicals. Fol exatamentenesse ginero que se destacou a luso-brasleira Carmem Miranda. A *pequena notivel", camo fcou conbecida, com seu turbante cheio de frutas, gravou dez filmes pla Fox entre 940.1946. Nesseano ela fol também a mulher que pagou maisimpostos nos Estodos Unidos Schpun, 2008-463) Com este sucesso, artista alo 0s Estados Unidos ao posto do patamar superior da carrera de artistas brasileicos '3.No original: “part oftheir practical knowledge has assimilated American symbols and values. This standpoint isall the more elevant a the ‘growing extensity, intensity and ve= locity of global interaction’ encourage cultural and material flows from allover the world. In this context, those coming from the United States prevail sine its symbols are deeply embedded in foreign societies, which make them more receptive to its values and goods” Bolts, 20068357). 14, Sio_diversos os exemplos que podem ilustrar a repetiglo de padres que as plateias recebem ~ percchem ~ io como normais, mas como superiore, tas como o modelo de vestimentas(vestidos rodadose cals boca de sino das décadas de 1960 €1970), 0 posse de determinados cletrodomésicos, ohabito de fumar (apresentado por Hollywood como sinal de status e poder até meados da década de 3980), entre outros. concluir, como faz Bohas, que std o instrumento sobretudo, da hegemonia dos Estados Unidos nos dias de hoje (Bohas, 2006), Na construgio de soft power, Es Unidos e estados Latino-Americano) e atores transnacionais (estiidios ii industria cinematogrifica, associagdes comerciais etc.) poden ado (estruturas domésticas dos Estados de diversas maneiras, mais ou menos independentes. ‘Thomas Risse-Kappen reuniu um grupo de autores em torno do tudo da dinamica dos atores transnacionais ¢ concluiu que as estruturs domésticas podem mediar, afastar efiltrar 0 impacto politico das ativida des transnacionais. Mais especificamente, Risse-Kappen concluiu que estruturas domésticas determina a acessibilidade e 0 impacto dos ator: transnacionais (Risse-Kappen, 1995:289). © mesmo se aplica ao periv«lo estuclado neste capitulo. Quando Orson Welles foi enviado & América Latina para fazer um filme dentro da Politica da Boa Vizinhanga, a existéncia de uum Escritério para Assuntos Latino-Americanos (OCIAA) na estrutura de Estado dos Estados Unidos, viabilizando a sua vind, foi fundamental. Poréin ‘quando a sua produsao nao agradou ao presidente Getilio Vargas, e também desgostou o chefe do Escritrio, Rockefeller, o impacto do trabalho de Welle foi inexistente. Por outro lado, as produgdes do empresério Walt Disney agradaram fortemente o governo estadunidense e os latino-americanos, ainda ressentidos da pesada estereotipagao de suas culturas pela industria de Hollywood, As criticas entusiasmadas a proximidade e amizade entre (5 Estados Unidos e 0s seus vizinhos do sul no filme Ald, amigos! eriaram atratividade pelos valores de tniao continental, promovidos pelos Estados Unidos para fazer frente a ameaga ideolégica e comercial que representava a Alemanha nazista, Em outras palavas: Hollywood e seus filmes da Boa Vizinhanga criaram soft power para os Estados Unidas na regido e, quigé, tenham sido os primeiros movimentos da estruturagio da hegemonia ide oligica estadunidense que nos alcanga até hoje. “Al6, Amigos!” Al6, amigos! & um filme de 1942 que mescla desenhos e imagens re- ais para retratar a viagem de dois meses cle desenhistas, de técnicas e do a6 proprio Walt Disney pela América do Sul. O filme & composto de quatro segmentos, cada um remetendlo a um pais da regio visitado por Disney € seuss funcionérios: “Lago Titicaca’ retratando o Peru; “Pedro’, retratando 4s aventuras de um aviozinho pelas cordilheiras do Chile; “El Gaucho Goofy’, retratando a Argentina e especialmente os costumes dos pampas; ‘“Aquarela do Brasil’, retratando as belezas naturais ¢ os tipos humanos (0 malandro) do Rio de Janeiro. Apesar da primeira cena com imagens reais interpelar os espectadores “Vocts ja viram um estidio de desenhos animados mandar uma expedigo a0 ‘strangeiro?”, sugerindo uma dimensio privada da empreitada, Alé, amigas! {oi totalmente financiado pelo Office of the Coordinator of Inter-American / Affairs (Adams, 2007:204), Como visto, as imagens ea sonorizagao do filme, assim como os demais ‘materiais produzidos durante o perfodo da Boa Vizinhanga, deveriam garantir queo seu contedido nao viesse« ferir a sensibilidade dos latino-americanos. Para aleangar as massas ¢ incutir nelassimpatia pelos Estados Unidos, Disney Janga mao, em tempo integral, de dois importantes recursos: a constante afirmagio da ideia de proximidade e a musicalidade. ‘A ideia de unio fica estampada logo nos objetivos da expedigio dos fancionarios da Disney na América do Sul, apresentados na primeira cena de imagens reais do filme: os artistas vém “em busca de mnisica, danga € quem sabe de algum amigo para o camundongo Mickey e o Pato Donald” (ALO, AMIGOS!, 1942). Era uma postura totalmente diferente da politica de invasGes unilaterais, tao utilizada pelos Estados Unidos no inicio do século XX. Esse aniincio evoca a ideia de trocas, compartilhamentos, cooperacio erelagio horizontal ~justamente 0 quese espera que exista em uma relagdo entre amigos. A simpatia eo humor naturais ao desenho animado dio leveza forma da mensagem, €0 uso das imagens reais, nas quais 0s funcionérios de Disney confraternizam com os novos amigos, dé concretude a relagdo de proximidade sugerida no desenho. © Brasil chegou a merecer a criagao de um personagem préprio para recepcionar Pato Donald em sua passagem pelo Rio de Janeiro. De acordo comm Sodré, nao ¢ acidental que se tenha escothido um simpético papagaio a brasileiro, José (28) Carioca", como 0 anfitrido de Pato Donald na sua ayer ‘ura na regio: trata-se da representagio do historico “papel exercido peli Brasil como procurador dos interesses comerciais [dos Estados Unidos) (apud Ferreira, 2012259) A recepgio do filme foi positiva e entusiasmada, especialmente 10 [sl ALO AMIGOS! Tudo 0 que Hollywood produziw até hoje no sev de estreitar 0s lagos que unem as Américas desaparece dian ‘maravilhoso poema colorido de Walt Disney. Nao é apenas a be esfuziante do colorido, a linha perfeita dos desenhos ou a grag ii sistivel das figuras que torna ‘ALG, Amigos!” uma produgio parte 19 ji grande obra do genial criador do Pato Donald. [..] o que dist este filme dos demais de Walt Disney é 0 sentimento de simpatia ois ‘com as coisas e para coma gente da América do Sul. Disney 10 "vi apenas a América do Sul, como outros turistas Ele “sentit-a I "Alo Amigos!” éa materializagio desse entimento, (olla da Noite, 1942 “Mesmo criticos mais écidos, que viam pouco ou nenhum valor cinewis ‘tognifico nas obras de Disney, nao deixaram de reconhecer 0 valor da obi para as relagdes continentais. L. Gomes, apds dissertar sobre os esteredtip veiculados até entio por Hollywood (em trecho citado anteriormente) reconhece que: [-.J a fita de Disney representa 0 marco duma nova diregio franc, sadia e honesta nas nossas relagbesartisticas coma prodigiosa Américs de Roosevelt |..] Porisso é muito natural que, desde j, citculer wis ‘compreensio ¢ uma amizade intensa entre o povo ianque €0 Powe Brasil, através do grande veiculo da arte filmada, (..] Diante do pape! internacional que a ‘politica’ de Disney tem, nfo cabe o comentiio i 15. A receptividade do filme deu fama a Zé Carioca ¢ permitilhe fazer histria, tendo sido langado em quadrinhos e anunciado a0 piblico brasileiro como promessa de sess ‘munda:"Walt Disney eo papagaio brasileiro. Hollywood. Depois de Dumbo’, Walt Disney “nunc uma sfriede desenlos animados onde o papagaio brasileiro ter seu papel de“asto* {el Exist uma enorme curisidade em torno desse personagem brasileiro do cinema dos bichos e elas impressdes colhidas nos Estidios da R.K.O,, parece que o papagaio ‘muito breve, um favorito das plateias do mundo” (Folha da Mamba, 194303) suas fitas, Ainda que fossem fitas dum valor cin natogrifico enorme wo Go caso de'Al8, amigos! (Folha da Maha, 1942:7) Valea pena ressaltarainda a sonorizagao do filme. A misica de abertura envolve, elaxa e aproxima o espectador da obra hollywoodiana, como, aliés, ficontece em toda a obra, facilitando a aceitagdo da mensagem (Ferreira, 4008177). A melodia inicial anuncia: “Saudamos, a todos, da América do Sul, A terra onde o céu é sempre bem azul. Saudamos, a todos, amigos de coracio, que li deixamos e de quem lembramos ao cantar essa cangio" (ALO, ‘AMIGOS!, 1942). As melodias cas letras das cangbes, simples ¢ envolventes, embalam os espectadores por entre as mensagens de unio ¢ proximidade. ‘Nao apenas espectadores do pailico em geral foram conquistados pelos desenhos Disney. Escritores como o cubano Alejo Carpentier € brasileiro Mirio de Andrade foram também seduzidos pela originalidade criativa de suas produgdes. Porém, o marco da celebragio de Disney entre osintelectuais, certamente se encontra no livro Poemas a Walt Disney, do escritor cubano Guillermo Villarronda (Borge, 2008113). ‘Acestética animada do desenho, a melodia da musica, isto 6 a criatividade ‘ealudicidade trazidas pelos desenhos animados americanos vao inculcando ‘mensagens politicas na regigo. Mensagens que, uma vez bem-recebidas por aqueles a quem se destinam, terminam por representar a aceitaglo de uma forma de entender representar 0 mundo e contribuem para simpatia que ‘0s povos sentem pela cultura, pelos valores politicos e pelas poiticas de um pais. Essa a capacidade de gerar atratividade por meio dos filmes, que sto produto cultural de um povo. Dai porque Hollywood acaba sendo uma das principais fontes da arquitetura do soft power dos Estados Unidos”. 16. Os Fatados demonstram que opotencial dasimagens de Holly wood niolhes pass gvo- ‘ado, Recentermente, Washington demionstrou seu agradecimento a cinema estadunidense ‘quando, nacerimdnia de entreg do Oscar 200, a primea-dama Michele Obama anunclou S grande premio da nlte- 0 Oscar de melhor fme—diretamente de dentro da Casa Branca. ‘Oipremindo foi Argo, de Ben Afleck, wm filme que conta 0 reagate de sis diplomatas dos Estados Unidos em Teer, no Lr, curante crise dos reféns de 1979. A historia enfatiza 0s bios heroicos ea eipetaculareriatividade dos norte-americanos e, mesmo tendo recebido tlgamar citcas por minimizar a patiipasio canadense-na gio e exagear os perigos (que teriam sido enfrentads, especialmente no aeroporto de Teer, o filme conquistou o Piblicoe, em sis meses, arrecadou US$ 136.019.4400 ~ maisde tes vereso orgamento que onsumia nasi proiugao (IMDb, 201) Frente repercuss2odo filme se pronunclow Shrmando que fatos so contedos deforma distoreda eositanlanos si retratados como ‘brutalizados,e enunciou que financiaré um filme em resposta& Argo. 219 Susan Strange chamou de “estruturas de conhecimento” © conju do que se acredita, do que se percebe como entendido e dos canais ¢ para que crengas e valores sejam comunicacios (S {que os atores transnacionais da indkistria audi range, 19942119), O pay sual desempenham pa ctiagdo dessas estruturas de conhecimento em torno do “american way 0 life” € parte fundamental da atratividade exercida pela cultura america Ao contrério do que uma leitura simplista pode dara entender, esses loi exercem mais que uma simples submissio e exploragio de outras cultura [Em grande medida, os consumidores escolhem estes € nio outros prov culturais. Ao longo do tempo, esse padrio de consumo introjeta también)“ truturas de conhecimento” que projetam esferas de influncia eatrativilil E muito dificil mensurar 0 quanto de soft power foi gerado duranie © governo Roosevelt ou pode ser gerado hoje pela indiistria audiov'sis| Porém, a participagaio da produgao audiovisual na Politica de Boa Vizinhays de Roosevelt foi enorme, chegando-se a afirmar que os filmes Al6, ar © Voed jé foi a Bahia? foram “os dois mais bem-sucedidos embaixador: inter-hemisféricos asairem [de Hollywood] durante a era da Boa Vizinhan. (Richard apud Adams, 2007:293). A importancia da sétima arte para a Politics da Boa Vizinhanga de Roosevelt foi tao expressiva que ela ficou tambéy conhecida como a Politica de Boa Vizinhanga de Hollywood. Consideragées finais ‘Valendo-se do contexto e das motivagdes que levaram 3 produgio do fil me Alb, amigos!, este capitulo analisou a participagao da indiistria audiovisual 1a construcao da projegao de poder estadunidense para a América Latin ‘Viu-se que, durante a primeira metade da década de 1940 e jé tendo eclodido a Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos tinham que lida com constrangimentos de ordlem ideol6gica eecondmica na América Latina Por um lado, a presenga da Itélia fascista e especialmente da Alemanha nazista na regio ameagava a tradicional érbita dos latino-americanos em: torno da esfera de influéncia dos Estados Unidos; por outro, a assinatura de acordos de compensagio de comércio entre a Alemanha ¢ diversos paises latino-americanos mais as restrigdes comerciais na Europa crescentemente controlada pelos nazistas ameagavam a dimensio ja mundial de uma série de ind estadu Nas primeiras décadas do século XX, os Estados Unidos tinham ado- {ado uma politica de intervengSes unilaterais na regido para garantir seus Intetesses. Porém, com uma eventual necessidade de concentrar estorgos militares na guerra na Europa e tendo em vista que a disputa na América Latina era por mentes ¢ mercados, o presidente em exercicio, Franklin Delano Roosevelt, adotou uma abordagem mais soft - no sentido de nio utilizagio da forga fisica ow ameaga de sangdes econdmicas - para a regio. Para a abordagem mais leve de recuperacao de espago na América Latina, Roosevelt contou com o apoio de importantes empresirios estadunidenses preocupados especialmente com os negdcios que tinham e/ou pretendiam cexpandir na regio. Nelson Rockefeller, cujas empresas familiares exploravam ppetréleo na Venezuela e queriam expandir a attuagao na regiao, foi o encarre- gado de chefiar o Escritério do Coordenador de Assuntos Interamericanos. We enses €resteingiam a expansdo de outtas. Sua posigio enquanto ator nas relagdes internacionais ica, a partir de entio, Jocalizada em um hibrido de ator privado e pailico. Assim que assume 0 ‘cargo, preocupa-se com a dimensio cultural da Politica de Boa Vizinhanga ‘trata de articular o controle das produgées hollywoodianas em uma dupla dimensto: para que elas nem retratassem uma imagem negativa dos latino -americanos para os estadunidenses nem ofendessem as sensibilidades dos latino-americanos, até entio bastante diminuidos ¢ ridiculatizados. ‘Nesta dupla tarefa ingressou de bom grado Walt Disney. O desenbista ‘cempresirio ja tina logrado reconhecimento em solo dos Estados Unidos ‘com seus desenhos, mas com a Segunda Guerra o mercado europeu ficou progressivamente inacessivel. Para completar o quacro, ele enfrentava uma crise na empresa que, em 1941, resultou em uma greve geral dos seus fun- cionirios. A adesio a um projeto que permitiria @ sua expansio comercial cera irrecusivel e Disney embarcou - literalmente ~ para a América Latina. ‘Das ctiagdes de Disney para a regido resultaram dois filmes emblemticos: Al, Amigos!, ou Saludos Amigos (1942), no original, e Voce jd foi é Baia’, ‘ou Los tres eaballeros, no original. Ambos retratavam as maravilhas natu- rais, culturais e, eventualmente, mesmo a modernidade urbana de paises Jatino-americanos até entdo totalmente desconhecida dos estadunidenses. Brasil e México, dois Estados-chave na regido para as relag inte dos Estados Unidos, chegaram a ganhar personage s proprios para repre Carioca e Panchito Pistoles, respectivamente. senti- Considerando as relagdes internacionais pregressas dos Estados Unis com a América Latina, pode-se dizer que a diplomacia cultural site dos Estados Unidos para a regido foi inaugurada com a Politica de toy Virinhanga, Para estruturi-ta foi fundamental a ago de atores transnacioi interessados, também eles, nos resultados de uma politica de aproximnaii) com os demais paises do condominio het rico, Se, por um lado, é dificil mensurar o quanto essas ages contribiirai) para a construcéo de poder dos Estados Unidos na América Latina, oi ‘outro é inegivel asimpatia que despertaram em expressiva parte do pili ‘Tanto Zé Carioca quanto Panchito Pistoles fizeram fama em seus pairc Diversos artistas, alguns de expressiva projegao em seus pafses, também se renderam aos encantos dos desenhos animados e das personagens Disney Hollywood, que até 1940 tinha contribuido para criar esteredtipos sobre 0 ppovos ¢ culturas que habitavam a América Latina, foi um dos principy instrumentos de construgio da ideia de unidade do continente american nos anos de guerra, A influéncia de Hollywood para determinar formas de ver o mundo ee agir nele articulou-se com a nova estratégia de atuacdo dos Estados Unidos Para o governo essa era uma necessidade estratégica; para os empresérios ile Hollywood, como Walt Disney, que tio bem projetaram seus negécios no periodo e no espirito da Boa Vizinhanga, essa era uma oportunidade tinic de ganhar mercados. Durante 0 periodo da Boa Vizinhanga, portanto, atores estatas etransnacionais se articularam para conquistar governos, mentes consumidores na América Latina, Estes, medida que introjetavam simbo los e valores dos Estados Unidos, isto &, quanto mais atraidos pela cultura, politica externa e valores polit 10 [os recursos de soft power de Nye], mais reforcavam 0 soft power deste pais em relacio a eles. E, se considerarmos «que grande parte da hegemonia americana hoje consiste no seu dominio ideoldgico, construido ao longo de décadas ¢ introjetado profundamente {ulver consigamos localizar na diplomacia cultural de Roosevelt os primeiros icos para a hegemonia da cultura estadunidense, especial- ppassos siste mente na América Latina. Referéncias ADAMS, Dale. “Saludos Amigos: Hollywood and FDR’ Good Neighbor Policy’: Quarterly Review of Film and Video. Londres, v.24, n. 3,207. BIBLIOTECA VIRTUAL DE DIREITOS HUMANOS. Doutrina Monroe ~ 1923. Disponivel em: . Acesso fem: 9 fev. 2014. 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