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Ives Gandra da Silva Martins AERA DAS CONTRADICOES Desafios para o novo milénio INTRODUCAO Carl Schmitt, na formulagzo de sua teoria das oposigées, encontra a esséneia da Moral na oposic2o entre o bem e o mal; da Estética entre 0 belo eo feio; da Economia entre o itil e 0 intitil, e da Politica entre o amigo e o inimigo. Notavel constitucionalista que foi, apenas nos tiltimos anos sua obra foi revisitada, pois, por ter sido adepto de Hitler ideologicamente, foi hostilizado pelos pensadores de esquerda. E, por ter dele se afastado, quando se desiludiu com seu projeto alemao, foi hostilizado pelos pensadores de direita. Somente agora, passados longos anos apds os acontecimentos que levaram ‘o mundo a uma Segunda Guerra Mundial, é que sua genialidade é reconhecida, como também os fundamentos de sua teoria constitucional. E de lembrar que a Alemanha sai da Primeira Guerra Mundial extremamente debilitada, mas, apesar disso, promulga a segunda grande Constituigao social do século —a primeira foi a mexicana — em 1919, ofertando 08 cidadaos direitos que o Estado nao poderia assegurar depois de uma guerra em que os alemies foram derrotados. Steven Webb, em seu livro sobre a hiperinflago na Reptiblica de Weimar, entre outros fatores, como o maltrato politica monetéria e aos déficits incontrolaveis do Estado, reconheceu nas expectativas frustradas, apesar dos esforcos governamentais em atendé-las, um dos fatores que levaram & hiperinflacao controlada por Schacht, a partir de 15 de novembro de 1923. Tal controle, todavia, gerou outros tipos de problema, quais sejam, a recessio e o desemprego, lembrando que a divida de guerra alema fora, também, fator a agravar o processo hiperinflacionério germanico. Alguns autores atribuem ao excessivo controle monetirio o fato de a Alemanha ter tido, apés 1923, inflagio inferior & da Franca, euja permanéncia, todavia, agravou sua agonia. A recessio hiperinflacionéria foi substituida por uma recessiio de estabilizacio, que terminou sendo um dos fatores determinantes da assungo de Hitler ao poder, como salvador da patria, em face dos fracassos das politicas anteriores. E que a hiperinflagao é recessiva, pois desorganiza a economia, enquanto a superinflacgdo, se privilegiados os mecanismos corretivos como a indexagao — mal evidente, mas necessério em alguns momentos —, permite que a economia nao se desorganize em face de um permanente reequilibrio monetario, que, no entanto, tem como inconveniente a realimentagio inflaciondria. A Alemanha viveu, até 1923, uma hiperinflagao com a economia absolutamente desorganizada. O Brasil viveu, até 1994, uma superinflagdo, nao tendo, todavia, por forga do instrumento da correcdo monetéria, uma economia desorganizada. Tais consideracdes preambulares sobre o fendmeno alemio da primeira metade do século ¢ 0 brasileiro objetivam mostrar que Carl Schmitt, ao captar a realidade pés-guerra alem4 A luz de sua concepgao historicista-axiologica do poder, reconhece estarem todas as Ciéncias e todas as manifestagGes culturais e filos6ficas conformadas a partir de conceitos opostos, os quais, em verdade, no mais das vezes, refletem as contradicées inerentes ao ser humano, Neste pequeno livro, pretendo meditar um pouco sobre este mundo de contradigdes, os interesses do ser humano e as incertezas de sua ago. Pretendo meditar, embora de forma perfunctria, sobre as raizes psiquico-culturais do homem, sua necessidade de viver em sociedade e sua dificuldade em nela conviver. Pretendo, no limiar de um novo milénio, analisar, numa concepgao muito pessoal, as razées que, no campo da teoria do poder, levam os diagnésticos ase repetirem, através da historia humana, os progndsticos a nao serem cumpridos e as relagées a exteriorizarem um permanente fracasso. Nao deixa de impressionar-me a constante contradigio entre a evolucao cientifica e teenolégica da humanidade, em todos os campos, e a repeticio monétona dos mesmos temas, dos mesmos estilos e da mesma maneira de ser do homem perante o Poder. ‘A propria concepgiio de Poder — e Helmut Kuhn nao o separava do conceito do Estado, definindo-o como uma “mera estrutura do Poder” — encontra nos primeiros grandes filosofos formulagdes que permanecem atuais até hoje, embora no tenham sido seguidas, na pratica, pelos que o detém. Em outras palavras, desde o nascimento das civilizagdes, e em todas as que se destacaram na historia humana, o homem vive contradigdes que podem ser detectadas em manifestagdes mais ou menos simbélicas da luta entre o bem e 0 mal, entre suas virtudes e defeitos, nas contradigdes internas, que terminam por se refletir nas contradigdes externas de atuagio social e politica. A consciéncia de nossas indiscutiveis limitagdes em captar nogies epistemoldgicas, assim como a certeza de que o conflito existe em cada homem, merece reflexdo mais pragmatica do que tedrica, visto que a produgao filos6fica mundial nunca deixou de se debrucar sobre esses temas, sem que os maiores génios tenham conseguido formular uma concep¢éio capaz de auxiliar a redugio do nivel de tais oposigdes. Este livro, portanto, objetiva, de forma singela e absolutamente perfunct6ria, entender alguns aspectos da contradigo do ser humano e da sua vida em sociedade, auxiliando uma inteligéncia mais profunda de fatos, acontecimentos ¢ alternativas sobre o que significa e o que significara, no século ‘XXI, a permanéncia dessa realidade. Saberemos vencé-la ou continuaremos a conviver com ela, como se nao existisse? $6 0 tempo dir. CAPITULO1 A AVENTURA HUMANA . O UNIVERSO QUE MAL CONHECEMOS Universo continua sendo uma incégnita. As viagens espaciais, os tclese6pios terrestres ¢ estelares e o fantistico avango da astronomia e das técnicas de sondagens da imensidao césmica suseitam 0 mesmo interesse que 0 homem primitivo encontrava na busca de uma explicagao para sua existéncia, sem ainda encontra-la. Apesar das monumentais conquistas nese campo, as modernas teorias continuam nao confiveis. Discute-se, hoje, se a expansio dos corpos siderais, encontrara um limite de perda de impulsdo, a partir do qual a forga da gravidade central terminara por atrai-los a origem, fazendo caminho inverso, tese esta que apaixonou os cientistas, durante varias décadas do século XX, mas de cuja comprovacio nao se tem evidéncias até agora. No se sabe se havera massa suficiente para atrai-los & origem e se haverd realmente uma desaceleragio de sua velocidade de impulsio, A propria explosio inicial (Big-Bang), de que teria resultado o universo que conhecemos, é dificil situar no tempo. Algumas descobertas atuais levantam a hipdtese de que nao teria ocorrido ha 15 bilhdes de anos, mas ha 17 bilhdes, ou mesmo ha 20 bilhdes de anos. Trata-se de uma ‘pequena ditvida’ de cinco bilhdes de anos sobre 0 inicio do Universo, que n6s, os homens, ainda nao conseguimos dirimir. E nossa cexperiéncia, como seres na face da Terra — mindsculo planeta de um pequeno sistema estelar perdido na imensiddo de outros sistemas dentro de uma galéxia, que também se perde na imensidade de galixias espalhadas pelo Universo —, é uma experiéncia de pouco mais do que umas dezenas de milhares de anos, se considerarmos os primeiros tipos com caracteristicas humanas. Nossa historia narrada, por outro lado, cujos documentos escritos nos permitem melhor conhecer o pasado, retroage, apenas, seis mil anos! Nés, que nao conseguimos decifrar um pequeno erro de cinco bilhdes de anos, temos uma histéria documentada de seis mil anos, ou de alguns milhares de anos a mais, se chegarmos aos autores dos desenhos das grutas em que os homens primitivos se refugiavam para protegerem-se das intempéries e das outras espécies de animais mais fortes. Mais do que isso, com toda a evolugio tecnolégica e as conquistas da Ciéncia, principalmente no mundo cibernético, continuamos sem saber, apenas pelos caminhos da Ciéncia, o que havia antes do Big-Bang e o que haverd depois. Continuamos sem saber a razio do surgimento do Universo, a razo pela qual 0s corpos siderais existem, por que hé vida na Terra e nao nos demais corpos siderais que integram a diminuta parcela do Universo que conhecemas e por que as espécies mudam desde o nticleo das primeiras células vivas até a magnifica mAquina humana. E parte sensivel dessa realidade é de dificil apreensio pelos meios cientificos de que dispomos atualmente, pois a velocidade maxima que conhecemos é a velocidade da luz e, por ela, levariamos décadas, séculos € milhées de anos para atingir os planetas, as estrelas e os conglomerados celestes mais préximos, ainda que considerassemos apenas aqueles postados fora do sistema solar. Nosso conhecimento do sistema solar & bastante primitivo, Exploramos os planetas vizinhos da Terra, tendo pousado em Marte e enviado sondas a outros planetas. As naves Voyagers 1 ¢ 2, lancadas na década de 70, somente na década de 90 sairam do sistema solar conhecido e seguem agora rota desconhecida, Jevando uma mensagem variada, definida pela equipe de Carl Sagan, para que, se capturada e nao destruida por nenhum meteorito, possa servir de indicacio da Terra e da existéncia de vida no planeta. Mesmo as pessoas que leram o livto Murmitrios da terra escrito pela equipe que coordenou o projeto das Voyagers sentem que essa mensagem € frégil, admitindo-se que seres inteligentes de outras areas do Universo consigam capté-la. Se decodificarem o disco terao dificuldades até mesmo para descobrir a localizacao da Terra, visto que as indicagées foram feitas a partir da sinalizacio que temos sobre o sistema solar e niio de sua integracao no Universo, que, de resto, desconhecemos, com o que, sem conhecimento do proprio sistema solar, 0 referencial gravado se perde. Em outras palavras, o Universo é uma ine6gnita ¢ estamos muito longe de compreendé-lo, nada obstante os avangos da tecnologia para capti-lo, ¢ continuamos como um povo recém-surgido e perdido numa miniscula area da imensidio celestial, sem destino e sem conhecimento de sua realidade, que busca encontrar veredas ainda inatingiveis, repito, pelos caminhos da Ciéncia. A ignordncia dos efeitos dessa realidade, a certeza de que continuara inacessivel por espago de tempo indeterminado, pois a vontade de descobrir ¢ de viver — como se a vida fosse permanente e a morte nao fosse a mais certa das realidades — torna o homem, inserido nesse contexto, 0 herdico lutador contra suas préprias contradigdes na busca de explicagio do até agora inexplicavel. E apesar de seu mundo ser absolutamente inexpressivo no contexto universal e apesar de sua vida ser um lapso mais insignificante ainda — a Lua recebeuo impacto de um meteorito hé 800 anos e treme até hoje por forga desse evento recentissimo —, o certo é que, ao criar o tempo como instrumento de divisio da eternidade, vive na busca de seu préprio destino, defrontando-se com as grandezas e misérias que conformam sua historia, ainda incipiente e nem mesmo definida. 1.2.0 HOMEM ‘Nesta breve introdugao sobre o contexto do homem e suas contradigoes, continuo a tracar rapidas pinceladas sobre sua aventura no Universo. Antes mesmo que a psicologia cuidasse de descobrir o interior do individuo, ow.a filosofia, sta conformagao no espaco que ocupa, as religides buscaram 0 significado do ser humano a luz de sua criagdo, que Ihe transcende até hoje a compreensio ¢ a cuja divindade criadora deveria render suas homenagens. £ interessante notar que a medida que o homem avanca em sua concepcdo ‘ontognoseolégica (relagao entre o objeto conhecido e o sujeito conhecedor), menos claras fieam as perguntas fundamentais sobre quem somos, por que existimos, como fomos criados e qual ser nosso destino. Ha uma nitida pereepedo, em todas as religides, de uma dualidade de tendéncias no homem. Na mesma pessoa convivem tentagdes para o male aspiragdes para o bem, cuja explicagdo é tanto mais complexa quanto mais evoluida a religiao. Arnold Toynbee demonstrou que cinco grandes pensadores, com percepgio fenoménica do sobrenatural, surgiram em lugares diversos e em curto lapso de tempo definido (Isafas, Pitigoras, Confiicio, Zaratrusta e Buda), em todos eles sendo comum o diagnostico da natureza humana, ainda que apresentado com justificagdes, estas sim distintas, para explicar a tendéncia para o mal de um ser teoricamente criado para o bem. Os filésofos — que se consideram sempre mais racionais que os religiosos na explicagao da fenomenologia humana —, desde os pensadores pré-socriticos até os dias correntes, nao evoluuiram muito, suas concepgdes sendo admiradas mais pela téenica de pensar do que propriamente pelas solugdes apresentadas. Os pré-socraticos muitas vezes trabalharam com a légica formal (Parménides, Zenon, Pitégoras); outras vezes estudaram a matéria, os elementos para justificar a vida (Anaximenes, Anaxagoras, Herdclito, Tales ete.), quando nao se perderam na exaltacio da inteligéncia, fazendo da filosofia um campo de exercicio sofista. A propria genial triade formada por Sécrates—Platio—Aristoteles, que foram os que mais se debrucaram sobre a natureza humana e sua vocagao social, apesar de terem seguidores por milénios (a Academia de Plato durou mil anos; © Liceu de Aristételes gerou discipulos, inclusive entre os eristiios, como, de resto, Platiio jé o fizera), embaragou-se na explicagiio do homem e dos fenémenos. universais, tendo uma percepgao, brilhante para a época, dos espacos siderais, apenas em parte desmentida pelos fatos, acontecimentos e descobertas da segunda metade do século XX. Fé curioso que tais magnificos pensadores nao tenham sido tZo precisos ‘como Sao Pedro, tum ignorante indiscutfvel, em face dos trés génios gregos, que, em sua Segunda Epistola, declara que, no fim dos tempos, a Terra sera consumida pelo Sol ¢ desaparecerd em chamas. Carl Sagan, do alto de seus conhecimentos cientificos, dois mil anos apés, confirma a afirmagao de Sao Pedro, ao dizer que nos proximos cinco bilhdes de anos 0 Sol explodira consumindo os planetas mais préximos (Merctrrio, ‘Venus e Terra), antes de se transformar em uma estrela and, de densidade incomensuravel. A Ciéncia, pelas palavras de um reconhecido ateu, confirma a revelagio de um analfabeto em astronomia, com um atraso de dois mil anos. O certo é que, se passarmos pela filosofia romana (repeti¢zo da grega), pelos filésofos arabes — dois deles influenciaram Tomas de Aquino (Avicena € Avert6is) —, e chegarmos a Idade Média européia, veremos que os séculos Aureos da producio filos6fica (séculos XII e XII foram séculos de filosofia cristd: ‘io Tomds de Aquino reafirmando, de forma sistematica, teses de Agostinho, aquele mais influenciado por Aristoteles e este por Platio, lembrando-se de que 0 Bispo de Hipona viveu no século IV, tendo falecido no inicio do despertar do quatrocentismo europeu. F toda a linha filos6fica do século XII foi procurar aliar a explicagio racional, sempre pobre, a uma explicagao teol6gica, em que o sobrenatural decorre dos indicios percebidos no mundo natural. ‘Mesmo a produgao filoséfica da Renascenca até Descartes, ap6s 0 experimentalismo inglés, é insuficiente para explicar a fenomenologia humana, no maximo diagnosticando problemas e nao encontrando solugées. Aruptura filoséfica de Descartes, com a tabula rasa e 0 cogito ergo sum, i inicio a filosofia moderna, em que, nada obstante a existéncia do Criador seja reconhecida por Descartes, ela decorre da stia conscientizacio dessa verdade e njjo da aceitagdo de um dogma. Aruptura de Descartes permite a Kant admitir um relacionamento do homem com seu Criador, mas a partir de ser, o Criador, uma eriatura da criatura, endo algo que antecede a esta. O homem faz sua realidade e, inclusive, aquela de explicagio da existéncia e da origem do mundo. E nao me deterei em outras consideragdes, pois toda a filosofia pré e pés- kantiana, incluindo a técnica dialética de Hegel — que permitiu a Miguel Reale ofertar um dinamismo préprio a sua teoria tridimensional do Direito, como examinarei mais adiante —, é uma procura de explicacdo racional do ser humano e de suas circunstancias soci naturais e do Universo, como afirma com: pertinéncia Ortega y Gasset. O certo, todavia, é que os filésofos nao conseguem responder a questdes fundamentais sobre o homem apenas com 0 uso da razio, € os tedlogos, que as respondem, precisam do ‘conhecimento da fé’, que o nosso Leonel Franea denominava ‘a psicologia da fé’. Como Bergson admitia que ha um conhecimento pela intuigao, ha que admitir que a fé pode gerar um conhecimento também consistente. Averdade é que, nada obstante os geniais filésofos surgidos no mundo nesses seis mil anos de histéria narrada, continuamos a fazer, sem obter respostas por meio exclusivo da razio, as mesmas perguntas que fizeram nossos primeiros ancestrais, que nao acreditavam em Deus. 1.3- ASOCIEDADE © homem nasceu para viver em sociedade. Robinson Crusoe ¢ figura de ficgdo e apesar de existirem pessoas capazes de viver por algum tempo isoladas dos demais, como Amir Klink, por exemplo, trata-se de situago excepcional que nunea seré a regra. A convivéncia humana, todavia, exterioriza a necessidade do comando, pois, com excecio dos agrupamentos animais, em que o instinto cria regras permanentes ¢ imutéveis (abelhas, formigas, lobos ete.), a sociedade humana é um conglomerado de interesses, paixdes ¢ luta pela sobrevivéncia. Desde os tempos das cavernas, o homem vive em sociedade para se proteger e sobreviver. E, desde os tempos primitivos, as liderangas nessa sociedade exercem o Poder. Hannia Ito, professor da Universidade de Sofia, no Japao, atribui o inicio da tributacdo a necessidade de as primeiras tribos fazerem esforgos conjuntos, (tributagdo em espécie) para se protegerem, como a construgio de uma palicada para a aldeia. Denominava a tributagio inicial ‘economia de aquisigao compuls6ria’. F interessante notar que a histéria da humanidade é uma histéria da luta pelo Poder, em que, embora reconhecendo a necessidade de viver em sociedade, ‘0 homem comum é sempre manipulado pelos lideres. Desde as lutas entre as tribos némades e sedentrias — cujas permanentes vitorias das primeiras, mais habilitadas A guerra do que os povos agricolas, terminaram no momento em que estes cresceram numericamente e puderam fazer frente a seus ataques — que tais, liderangas se manifestaram. Ahistéria do homem, portanto, em verdade, é uma histéria da luta pelo Poder. E nem se diga que a evolucio cultural melhorou o nivel desse combate, pois os regimes politicos criados, mesmo no constitucionalismo moderno e nas democracias, nio afastaram 0 fato de que a ambigio pelo Poder ultrapassa a racionalidade das teorias politicas e das formulagdes filos6ficas. Rotrou, em verso de grande significado, lembra que: ‘ous lés crimes sont beaux, dont um trone est le prix”* CInocente fidelidade, I, 2) e Racine declara: “Le nom de pere, Atale, est un titre vulgaire: Cest un don que le ciel ne nous refuse, gudre. Un bonheur si commum n’a pour moi rien de doux, Ce n'est pas un bonheur, s'il ne fait les jaloux, Mais le tréne est un bien dont le ciel est avare; Du reste des mortels ce haut rang nous separe” ** (A Tebaida) ambos tendo o mérito de pereeber que, se a sociedade ¢ a conseqiiéncia necesséria da sobrevivéncia humana, o exercicio do Poder é o efeito aglutinador dos homens que o desejam mais para exereé-lo do que para servir aos demais. E todas as guerras foram decorréncia dessas ambigies politicas. Nao sem razo, repito, Helmut Kuhn, ao definir o Estado como uma estrutura do Poder, acentuou que a entidade estatal nfo ¢ representativa da sociedade, mas sim dos governos. Por outro lado, o grande jusfilésofo inglés Hart, (em O conceito da lei) dizia que as leis sao feitas, nas democracias, para serem aplicadas a governantes e governados, mas, como sio feitas pelos governantes, geralmente, os beneficiam. “Todos os crimes so belos, quando 0 trono é 0 prego.” **

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