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Narco orn S; 5 5 a | ‘Tituto do original em francés: Hiswire du Nouveau Mone De la Découverte A la Conguéte, une Expésience Européenne = 1492-15 Copyright © 1991 by Librairie Arthtme Fayatd (Os mapas foram feitos por Etudes et Cartographites, Lille. We edigi 1997 2 edigao 2001 Dados Inwemacionais de Catalogagaia na Publicagao (CIP) «Ciara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Benard, Carmen Histéria do Novo Munclo : Da Descoberta 4 Conquist Experigacia Européia, 1492-1550 / Carmen Bernand © Grusinsts ina Muracheo,~2, ed Euitora ds Universidade ds Sio Paulo, 2001 uma io Palos Bibliosrafia ISBN; 85-314.0101-4 L. Amuética Latina — Desenvolvimento cexploragio 2. Amé- rica Latina Historia I. Gruzinshi, Serge. U. Tilo. AIL Sétic 92.1082 cpp.0x0, fudiges para catilogo sistemnatico: 1, América Latina s Histdria 980 Direitos reservados & Edusp — Editora da Universidade de Sap Paulo Av. Prof, Luciano Guatberto, Travessa ],374 6 andar ~ Ed da Antiga Reitoria = Cidade Universitiria (05508-9400 ~ Sao Paulo — SP — Brasil Fax (Oxxl 1) 3818-1181 ‘Tel, (Dex) 3818-4008 / 3818-4150, swunweusp.be/edusp = e-mail edusp@edu.usp.br Impressono Brasil 2001 Fol feito o depSsita tegat * HISTORES DO.NOVO MUNDO Reina ante _o Renasc . 308 5, As Miragens da ‘Terra Firme 6.0 Caminho dos Manguerai 7A Conquista do Peru 8.0 Fim dos Conquistadores Conclusi Anexos wn 598 stnseie 633 645, 667 679 683, . 685 695 699 Léxicos. Cronologias bliografia Indice Onomistice.. Clossario Lista de Mapas c Graficos. indice Geografico. indice dos Pavos.. indice Tematico .... APRESENTAGAO A EDICAO BRASILEIRA Apresentar Carmen Bernand e Serge Gruzinski, autores de Hisléria do Novo Mundo, a0 leitor brasileiro é tarefa que me encanta. A primeira qualidade do livro refere-se A forma com que foi escri- to. O texto é claro, repleto de informagdes sobre abjetos, pessoas ¢ sen- timentos, permitindo ao leitor visualizar, em cores, a cena histérica. A segunda qualidade, aliada & primeira, ¢ nos fazer ver como os modos de formar o texto conformam a estrutura conceitual do trabalho. Instigados pelo movimento da narrativa podemos concordar ou nao com explicagées ligadas a uma histéria positiva, encontrar novas signili- cages em meio ao pormenor on, ainda, penetrar na tama das histéria em busca de um sentido “pés-moderno” para o texto. A historiografia brasileira nos tiltimos anos tendeu a valorizar qu tes tedricas. Deixou de lado informagées que permitissem ao leitor imaginar épocas, lugares ¢ sociedades com habitos diferentes dos seus. Eu diria que a cena histérica muitas vezes foi interrompida. Introduziram, em excesso, esquemas analiticos, prejudicando 0 longo caminho que nos conduz do especifice ao universal, Retomando a erénica referente aos séculos XV © XVI, 0 texto de Carmen Bernand e Serge Gruzinski restaura o sabor da narrativ Quantos paradoxos descobrimos nos documentos! Eles nos permitem escapar do raciocinio dual (criador de uma unidade para as wadicées io HASTORIA RO Novo MUNDO indigenas, ¢ de outra, para as tradicées curopéias) que nos leva a contra- por mecanicamente os interesses americanas aas interesses curopeus. O prazer cenografico, criado pela narrativa, advém do convivio dos autores com a documentagio do periodo, Serge Gruzinski viveu e pesquisou sete anos no México, Conviveu nio apenas com os arquivos, mas também com os mexicanos. Conheceu nao a alma deste povo infi- nitamente misterioso, mas a riqueza cultural produzida pela mescla das tradigdes indigenas ¢ curopéias. Carmen Bernand pesquisou no Pern, Argentina ¢ no Equador, demonstrando conhecimento profinde sobre 4 hist6ria da medici« cul questées ligadas na ¢ & histéria da Igreja. Formado pela Ecole Nationale des Chartes (1969-1973), Serge G inski é paledgrafo € profundo conhecedor da documentagéo ameri Scus trabalhos versam sobre o sincretismo, a histéria da Igreja, a historia ‘io da populacio ind na. da familia, a comunidade doméstica, as escrituras, as imagens nas cultu- béricas ow indigenas ¢ as edigdes criticas de textos mexicanos da época colonial. Sens livros j Ieitor quanto tes: 0 La Colonisation de Cimaginaire, saciétés indigenes et occidentatisation dans fe Mexique indigéne, XVEXVIT" siéele, editado pela Gallimard, pode ser lido iano € portugues. Le Destin brisé de lempire aztéque (Gallimard, 1988) encantrase em espanhol, inglés, alemao, necrlandés c japonés. La Guerre des images de Chaistophe Colomb & Blade Runner (1492-2019) agradou ao piblico de lingua italiana, espanhola © portugu gora a Edusp traducio de Histoire du Nouveau Monde. De la découverte a ta conquéte, Une expévience européenne. Sera uma nova descoberta, para nés, brasileiros, conhecer, quinhentos anos depois, a narrativa da experiéncia européial ‘armen Bernand doutorou-se em ctnologia, sob a orientagio do foram traduzidos em diversas locali; trajeto de sua obra, citarel os aro unas. balhos nportan- edi Prof, Claude LéviStranss, Entre os trabalhos que teve publicados, vale a pena destacar: La Solicitude de Renaissants. Matheurs et sorcellerie dans Jes Andes, publiendo em 1985, Les Incas, peuple du soleil editado pela Gallimard ¢ traduzido para o japonés, Atahualpa face aux Espagnols, Dias aciagos par a Paucar Guaman foi langado no México pela Fondo de Guluura, Tratd nteressante “ficcdo etnogrifica” escrita em lingua espanhola. almente, Carmen Bernand e Serge Gruzins lo livro Histéréa do Nova Mundo, no qual seri ma da mesticagem. As questées citadas rapidamei se i trabalham no segundo volume enfocado o proble- te nesta apresentagio, que se referem lentemente, uma definigao tedri- io, naio exeluem, ev APMSENTACIO 4 EDICAO BRASILIA u nd ¢ Serge Gruinski se interro- do mundo, os Carmen Berna origens da expansio do Ocidente atravé dor/devastador que ca- por gam sobre as valores, os modos de vida veiculados, o dan cr ractcrizou a conquista, Ambos assumem uma posicao eritica com relagio J americana, E muito embora considerem esta historia A histéria colo) tecida, em parte pelo sistema colonial, optam por valorizar 0 processo de ocidentalizagaio da continente americ Sem diivida, estamos diante de uma polémica que o leitor brasilei- ro deve acompanhar em detalhe. Boa leitura, 10. Java Thitoporo INTRODUGIO OCEANOS E, DEPOIS, MONTES DE NUVENS 0 que esta das aventuras que ¥os levarara a passar jor ganquntas geladas, a wencer dana oo tuntas wetes a percorter as highseays? Vinem-nas explorer mangucsais, fowdarias, esteyes varvidas pelos vento, « alravesiar geliras, exeanas « depois montes de mavens, ¢ nor dirigiemns para aljelions sempre mais distantes, entre fora de nis. Cuaisron Rasswane (0s Pavores da Geto das Torvas Relegadas em nossos livros de histéria 20s confins da Idade Média como tantas outras coisas, de nossas ¢ dos Tempos Modernos, ausente frigeis memérias e de nossas culturas estilhag quista da América merecem, contudo, ser consid ¢ao, Mais do que nunca ¢ necessirio, neste fim de século, interrog: a descoberta ca con: ‘adas com maior aten- se sabre as origens da expansiio ocidental pelo mundo, sobre as valores 0s modos de vida por ela veiculados, sobre o impulso criador ¢ devasta- dor que a moveu por muito tempo. Mas como escapar dos esquemas re- dutor de dos maniquefsmos ¢ dos clichés que nos servem por demai parimetro? De que forma evocar um labirinto de iniciativas ¢ de expe- m atores planctarios: a Europa mediterra- rigneias humanas que ret " JUSTORIA DO NOVO MUNI nea e nérdica, um continente ainda sem nome, mas também a escravos, a Asia das especiarias ¢ um isla em fulgurante expa Foram o recurso aos documentos de primeira mio, o mergulho latos, nos d ios, cronicas, As vexes époea, que guiaram nossa exploragio dos tos da meméria. De fato, a consulta das fontes antigas revelowse tio fe- cunda que transformou de mancira decisiva o curso de nosso projeto cartas € paciente nos r audigio das miisicas Tantas testemunhas desses acontecimentes, tantos atores empunha- idadles ram a pena para difundir o que viram ¢ igar as curio curopéias ou reivindicar sua parcela de gloria ¢ de recompensa. multiph dos pontos de vista permite os planos diversos que sa ram a histés ade um compu prisma do qual examindssemos as diferentes, luz ténue de Flandres, ¢ ia da Descoberta e da Conquis acclas inumeraveis sob focos de luz 1s da Espanha ¢ da Itilia, esplenelor de um sol de montanhs cm latitudes tropicais... No entanto, tudo nao tem hoje uma repercussio diferente. Foi preciso reter ¢ excluir, uma vez lembrados og aconteeimentos principais'. Destas fontes excepcionais de sensibilidade emergem fatias de vida. Destas erdnicas da Espanha ¢ da América surgem trajetorias pessoais cujo emaranhado, no espago & no tempo, restitui ao passado um pouco da consisténcia do vivido. Umas defrontam-nes brutalmente as situagdes-i- mite, ais fronteiras da morte, da fore ¢ da loucura que os navegadores, conquistadores ¢ colones que partiram em busca do ouro € das especia- vias viveram. A experiéncia ininterrupta do extremo, o enfrentamento do desconhceido, a exte ordindiria precariedade das condigdes de existénci a desinesura dos obsticulos ¢ das ambigdes desafiaram a andlise mais de uma vez. Como contraponto, outros itinerarios recriam © pano de fun- a empresa colossal, esbog: ndo, em torno dos microcosmos da peni rasmo, como uma imens Antuérpia ¢ Naipoles, Nur sula Ibérica, a Europa do Renascimento, a dos Bérgia ea de marchetaria que reuniria Londres e Lisboa, mberguie © Sevill 1. Desejandla saber mais ou situate em qualquer tapa da percutyo, 0 4 Fayard, sem a amizade © os encorajamentos de Agués Fontaine, rio fos de dlevenvober est itor poslers xe remeter as crae ia excallida ¢ as na 3, a bibl nologias, aos mapas, ao [éxico da Descobierta e da a confianga dla edivr fica cia de reler este longa manwscrito 2.0 emarantada di projeto com a ampliewde exigida. JearnM ws redes «das experiéneias permite perceber se deixa upreender facilmente quando & distribuida e imobilizada nas categorias tradieionals do econdmico, da social, da politica, lo celigiosn © da cultural, Nem histéria, nem anuropologia, e aim sformagion que elhe- Em meio a estas vi > cimento de um olhar apreendido no decorrer dos anos ¢ das travessias, quando nao da lenta sucesso das a de Colombo e de Isabel, Catélica (1451), a de Cortés (1485), a de Carlos Quinto (1500). Resta captar estas modulagé mperceptiveis, que te a historia ¢ secretam a meméri aquilo que as grandes sinteses, as ¢: deixam de lado ra, por vezes, 0 ¢ Assim, nosso livro abre espaco para tatisticas © as tabelas, devide As suas Jo, 0 afetivo. Por faléncias, o inespers isc hist6rica nao c ordenar demai: © desenvolvimento dos fatos, a taria introduzindo a posterior’ ene: menor impre nizado demais? Ora, as incertezas quanto a0 dia seguinte, o carater imprevisivel do \deamentos que expurgam © passado do fazem da aventt ‘0 bem orga meio pesaram demasiadamente no universo dos descobridores ¢ dos conquistadores p: riamos reduzir o proceso da descoberta a suas manifestagées intelectuais ou técnicas. Para sugerir as reagdes aetivas e as sensagdes provocadas por mM ignorados, Do mesmo modo, nfo pode- ra que seja esie mundo novo, fixamos imagens € momentos, emogées € siléncios: uma tompestade de neve nas encostas do Popocatépetl, © panico que toma conta de um conquistador, o sabor de uma fruta exdtica, o silén= cio dos mangue rio deveriam escapar ao historiador quando as fontes nos ofcrecem esses instantineos que muitas vezes basta wanserever? E nao sera, paracoxal- mente, seu cariter subjetivo que sis do Pacifico... Por que essas dimensé 2 seu valor histérico? Uma historia da descoberta ¢ da conquista da América poderia li- mitarse a esta volta no tempo, a estas incursdes nas memGrias, a estes entrecruzamentos de existéneias. Mas 0 fato é que estes percursos crono- légicos © antopolégicos remctem consiantemente a situagées que 15. A viagem nos leva para terras conhe- 10 que sio derrotados, io podem hoje nos deixar indifere cidas: os judeus que sio expulsos, 6 muculm: convertido sociedades s ou temidos, os mundos extra-curopeus cujas io eviradas ¢ as culturas de agdo em todas as suas for gregadas, a coloniz lade, as destruicdes ccolégicas... mas, as doengas que matam sem pie andl & eon Icitura orientads pata a exploragio do vivido indishdetl e coletivn, ent hiswéria do Now 1, ee sua sucesso, de sua Jas da sociedade, ele sua acura titan, Podersedi ler, no niomero especial de {Henne eonsagracla a 19) primeiro tag ja das grandes exper coli te set fim: a eclosio de sxperiéncia do isi, experiéneias italiana, flameng: ‘win “hove mundo 12 Comtubre ae 1902), com nossa dupla assinatura, um panorama das questies le que este acontecimento nus pate hoje ser portadar % JNSTORIA DO Novo MUNDO A descobert da América também é uma questio curopéia, Nio s6 porque Jacques Carticr ¢ 05 navios ingleses dos Gabot singraram os ma- res em diregio ao Novo Mundo, mas também porque ela opera a trans- feréncia para o solo americano de uma acumulacio de experiéncias ocidentais que fazem das Antilhas, ¢ depois do México ¢ dos Andes, ex- uaordinarios laboratérios humanos. Nestcs ambientes hostis ou surpre- endentes, grupos ¢ individuos desenraizados, que por vezes ja tinham. passado pela Itilia ou pela luta contra o isla, insistem em consiruir a ré- plica de uma sociedade curopéia sobre o lombo dos indigenas vencidos. Assim, a Descoberta marca 0 inicio da ocidentalizagao do mundo, ou da difusio, até aos mais longinquos recantos do globo, de modos de ida ¢ de pensamento surgidos na Europa ocidental. Por isto, ela consti- tui, muito além de uma mescla de modernidade € de arcaismo, uma di- sej mensao crucial de nossa identidade. Talvez a Europa moderna nao te- ana considerada na io do Novo nha nascido na América. Mas a experiéncia amet ¢ da descoberta, da conquista ¢ da colon Mundo constitui uma etapa fundadora. D contrapor-nos o fato de termos deixado de lado, imperd | pecado de etmocentrismo, as reagées das sociedades amerindias ¢, ainda que pensem menos neles, 0 destino dos africanos deportados para o Novo Mundo. Preocupados com a coeréncia ¢ com 6 rigor, preferimos dei ar para um segundo volume o estido aprofundado das atitudes dos vencidos, indios, negros ou mesticas. © enirelagamento das reagdes & demasiado complexo, as quest6es levantadas sio demasiado diversas ¢ cruciais para serem abordadas neste primeiro tomo. Por outro lado, é a tinica perspectiva na qual as categorias de Descoberta ¢ de Novo Mundo adquirem ou conservam um sentido. O segundo volume desta Historia do Novo Mundo abordara o tema da mesticagem ¢ as miiltiplas conse- qiiéncias da expansio europ: Seria ainda preciso apresentar aqui os mundos que viriam a ser o objetivo das descobertas. Mas como sugerir o que foi a América antes da invasio européia ~ antes, entio, de ser América — sem passar pelo olhar ocidental, dos conq! dores, ios, ¢ mais tarde dos arquedlo- gos € etndlogos? Goma descrever as sociedades amerindias como se a Europa ¢ o Ocidente munca tivessem existido, antes que a Histéria, isto é, a nossa, as aleangasse para destrui-tas, submeté-las ou transforma nossa imagem, muito antes de todos esses poves se tornarem indios, eles, que imaginavam encarnar cada um a humanidade inteira? A tarefa é evidentemente irrealizavel j4 que estas sociedades desprovidas de escri- tas compara ram somente vestigios de dificil interpre- avrronucéo " As inscricées mesoamericanas, por mais sofisticadas que sejam, naio mente decifradas ¢ sio de pouca valia para empreender wma tacio. foram inteir » Adificuldade nio séncia ou no mbém les ¢ que nao corr reconstituicao histéric ‘iter enignnitico das fo las por essas s sti apenas n diferentes concepgdes pondem as de tempo elabo nossas. A prépria questio da “histéria das populagdes pré-colombianas” nao tem sentido. Nao que nio tiv ntes de 1492, wansfor- magdes profundas ¢ acontecime! > enfraque tas mudangas chegou até nés pelos testemunhos dos conquistadores eu- ropeus ou da arqucologia, Masa grande maioria destes poves amorteccut a agio irreversivel do tempo contrapondorhe o trabalho do mito, como. demonstrou Lévi-Strauss num belo texto proustiano®, Assim, encontramo- sem cxistido, ido des Los hist6ricos; 0 &% nos frente a uma temporalidade ciclica que transforma o presente em pasado ¢ que nega 0 acaso do futuro. Tudo o que sabemos sobre as civilizagd antigas procede, desta for- ma, dos conquistadores europcus. Monumentos, estelas, inscrigées em pedra, plataformas, cacos, mar como enigmas que a arqucologia nao consegue decifrar de forma es tiva. Podemos nos admirar entio, como o poeta Pablo Neruda frente ruinas de Machu Picchu; “Pedra sobre pedra, ¢ © homem, onde ¢s Na verdade, a etnologia comparada é iguaimente capaz de reduzir nossa igno 0 de manipular os dados com prudéncia. Pois se é claro que no campo das representagas fatos parecem ancorarsc numa duracto muito longa, em outras esferas da vida social as wanstc 9 tio radieais que nao parece pos ; por fim, se ainda es as de conucos ou cle malocas, permanccem cia, com a condiga os el macées ocorridas desde 1492 invo idade qualque istem indios, ndio podemos por isso considera-los como populac ar uma cont s “pré-hispanicas”. 3, LésiStrause (1972), p58 Parte f Os MUNDOS ANTIGOS ANTES DA INVASAO Apis sa diliviey a tera tepowanses was, antes disse os homens mulipWcareurse ante que Meri, 2 Sab, eve melee pro courant sem mio passed sete enero Mito Boraro G. Lewes 0 Gru eo Cala, 1964 Da banquisa do Grande Norte 4 Terra do Fogo o continente ame- ricano era povoado por milhares de sociedades que difc am quanto aparéneé quar mo estreito que Tigou durante Em alguns séculos, os bandos espalharamse até 0 ex Que razdes te- riam impelido os cagadores de renas a se aventurarem naquelas ter indspitas? Esta riam a caca? Nao se sabe, Estes grupos pré-histéricos encontraram Américas um verdadciro paraiso chcio de herbivoros. Ignorando tudo dos costumes humanos, os animais cagacos por essas primeira mades forneceram-lhes reservas inesgotiveis cle proteinas, de gordura, de provivel que essa abundncia tenha facilitado a exp ertiginosa desses povos. remo sul do continent am sendo. levas de né- osso ¢ de couro. sio 2 rust 4.20 NOVO MUNDO ada do décimo milénio antes da no: tura da Na vi cra, a temper terra clevou-se consideravelmente, fazendo subir o nivel dos oceanos. A ponte siberiana foi inteiramente submer chegada dos primeiros europeus em 1492, 2 com exeegio das tribos articas, viveram isoladas do resto do mundo, tinico na historia do planeta, junto com o da Austrilia, 0 ¢ cano cumprit © papel de uma gigantesca armadilha humana, biolégica e cultural. Durante mithares di oam' nites nos, mig) sidticos penetraram por andas sucessivas c foram entéo condenados ao desenvolvimento “em la baratério”. Nem as instalagdes precirias dos vikings no litoral nordeste da América do Norte, nem as viagens pelo Pacifico, cuja realidade histéri ca repousa sobre hipéteses que ni v essa situiagiio excepcional! ificadas, alt > puderam s 1, Na Mewoamériea © na Conditheirs dos Anes, as condicGes elimiticas ¢ cculagieas, assim como junto de cireunstincias particulares, permitiram a domesticagio da mitho ¢ 0 desenvolvimenta de wn agticultura intensiva por volta do terceito milénia a. C. Es ies perenit dle civiizagties caractetizadas por vin s con 1m 0 desenvol Fonte hierarquia sox Al, por tm sistem de governo teocritica € por do 8: dlos, mas também ao longo dos grandes tios da ba ma arquiterera monwmental Em ouwes lugares, tanto nat almétiea dlo Norte quanto ua Amética redores de Vancouver, na costa leste dos Estados Ur 3 a rodla 56 exist potlerome tribos se desenvolverant: nos amaziiniea, que serviam cle meio de comin’ nal — for o Thana —era desconheciea ¢ 0 pido nus universo onde a tagio an com miniatura, em certos objetos cle te purrados para regides marginale: a Catifornia, a costa nor Ghuco. ¥ ea fou ots, Os grupos que sian es ca e da coi Foran et clo Chile, a Batagdnia © a zona tropa cha asta mossico einogréfico, a¥ Américas diferias também do Velho Muna quant a Osa eciosc Uo, como os lianas cos uanaces, on deste continente, Tubérculos como a miandioca © uma varied infnita de butts, on itr apenas as expicies maix conecitay, aseguranam # nbviténsia des sista demogriticn. A sis domésticos europeus crain desco cereals como o milho, par cicdades importantes do ponto d disso, por caus do fiokimente qute se sgt o feehamente elo estreite ele Belin as doenas infecciosas comuns tua Eu is estas ausent clos tipicos do continente carseterizavans as 20036 ravsava por toda lugar de forme endémnien cortesponstiam 4 Mescamériea ¢ a06 Antes, a Compensario, outras patologias provueadas pelos in Uuopicais © equatarias, ia sem contar a stiis que, mb. Fa, excetuando-se as grandes ronas de povoamento 4 continente estivese, no plane demogrifice, quase vazio, todos essex poves forma nas’, parafrascando Claude Lévi Strauss. De fato, 08 eagadores, col ‘cites pl eve agricultores iinerantes pes correram © exploraram espagos imensx. Assim, & preciso imagine grupos huemanos em eonstante cite principalmente, em comunicacio uns com os owttos, © que fisorece 2 repercassio de todas seriagdes ins eon Tu diferentes. E assim que podemos perceber, nos mitos que pertenclam a ultras muito distantes geografieanent das fronteiras que « iplam aos nossos exforeos de si tizagdo ou As nossas tepresentagGes em forma de dreas culturais claramente cicunser 4 ineag, os waias, oF mexicas, 08 IN tematsanilogos. Ora, ets luides social e essa instabilidade n conjuanto tribal de outen nia ce aranis exiatiiam enquante taise as tages que compaseram sas Em musitos aspecins, exsas s0- cicdailes ~ notadamente aquelas que se deseswvolveram na Mesoamériea = consti cultura sio wfiekentemente originais para que possanor invent ANTES DA INVASIO 2 ‘Como penctrar nesse “outro mundo” sem reduziclo demais 4 nossa 2 Um inventirio por area cul die pereeber os seres ¢ as €0 estitico demais, néio teria permitido entender as relacdes complexas de rra ont de troca que foram tccidas entre todos esses povos tama de seu passaco, mesmo se as mitologias esfor- lianca, de gui © que constituem a garam-se para neutralizar sua singularidade. Tomamos entio © partido de constituir seus modos de respectivos ambi homens do Mundo Antigo, de r no seio de se evocar esse: , suas motivacdes € suas reacde: poiando-nos em dados etnolégicos ¢ em documentos da época co- lonial, Com esta escolha ¢ esta evocacao, tentamos & nossa mancira pres- r uma homenagem a cxsas civilizagdes desapare cI ndo-lhes © que tém em comum, a linguagem do mito nhos relatos que iniciaremos nossa viagem, partindo da m t rquela que Magalhiic izar com o nome de “Teri do Fogo". longinqua das istrais, A PEDRA PREIA DO GU) NACO* L4, 0 vento sopra dia ¢ noite, levantndo ondas imensas e espumosas que vio quebrar na praia desolada, dobrando em dois as drvores que éu; 1, a luz nao aquece jamais conseguiem aprumarse, A onde tert os cuirtos dias do inverno. 1 o mundo dos humanos, as mulheres detinham todos os poderes ¢ os homens naqueles tempos muito antigos viviam no terror. Os infelizes esgotavamese cacando, pescando, colhendo frutas ¢ conch ntando arrancar dos senhores da Terra edo Oceano sua subsisténcia cotidian: cram também eles que educavam as m as peles, teciam cestos, criangas © que cuidayam da casa: prep mantiniam o fogo, cozinhavam, carreg: nm abri- am as s, consiru lintos, embors mantivesiem contatos freqientes com seus vizinhos. A questio de ssbermos come exsas diferentes culturas foram prodsiridas e acentnclas, para marcar as fronteiras, sic é te i resporul&- nas afistaria do objetive que nos atvibu 2. Como toda evaeagio, a massa tambén 6 parcial, ea amos de eulturas que apresen gus at de fox ma sucints obedece a escolhas pessoais ¢ 3 economia co linror «6 trataremos sos protaganistax dos epi s6dios citados darante nas arracia, Evitamas deliberadamente as refe clas genygriticas modiernas, que teriamy sido anacrinicas, Consado, para permitir que @ Teitar sitwe 0 eens da a4ao, assinalamos 1 Chaco de que os aves: Tern do Fog vers09 epissdios situanse vespestivamente nos acgintey In Pars nico, Pens ~ regidee de Huinaco, Casco, corn central ~, Néxice Antilhas, Env nota © na bibliogealfa, indicamos 8 textos principals nos qusis procta nos inspir © Terra do Fogo, a JNSTORIA DO NOVO MUNDO gos para se protegerem do vento. Suas esposas passavam o dia conversan= do, reunindo-se na easa-grande ¢ dando ordens. Lua tinha ensinado as mulheres os mistérios do hain, este rite du- a assustar as homens € nm se revoltar ramte o qual vestiam em segredo miscaras pa os com Os piores castigos. Os homens 10 ousa quando viam os cspiritos precipitando-se para fora da casagrande ¢ ber- rande, pois nado canheciam o wuque, Maso acaso quis que Sol, m: de Lua, descobrisse o estratagema. Revelou-o a seus congéne’ amened irromperam na cabana ¢, com golpes de marreta, 1 que os tinham enganado « ainda ignoravam a perfidia do mundo feminino. As mulheres pa aassacraram aque o bem, salvando apenas as mais jovens, que garam, caro por sua duplicidade ¢ os homeiis se apropriaram do ritual do hain, 5 © amedrontadas. A part ca mais foi derrubada. 7 1 dos tempos imemoriais, € que os hom com o fim de manter as mulheres submis: desse momento, a hierarquia dos sexos Assim como todos os outros iniciados de sua idade, o kloketen conhe- ce essa histor ns niio que ve deveriam esquecer nunca se quisessem preservar sua supremacia e sua independéncia, O aprendizado do segredo duravs asformagao de uma cri plenitude de suas forgas, Gom as provacdes a lei dos homens imprimia-se de modo indelé s das ancestr: muitas Tas, 0 tempo necessirio para a nga mum adulto, de wm ser indiferenciado num macho n infligidas ao adolescent vel na carne de seu corpo, como as mar AM BAY: das nas rochas que dominavam as bafas ¢ os despenhadeiros. Certo dia, 08 homens mandai que ele aprendesse a cuida’ MO rapa7, $6, para a floresta, para de si proprio, Nu em sen casaco de pele, com um gorro de casca de sirvore, 0 jovem segniu a pista da fa interpretar, conduzitro até uma cl silenciava seus passos. Alguns guanacos, fortes animais de pélos ruivos, tinham parado para pastar a grama rala, soba vigilincia de uma sentinela imOvel, de orelhas em pé € pescoco voltado em direco ao perigo que estava pressentinde. Num instante, os animais correram; num instante, ca noite dia, zendo ele mesme o seu fogo. A ce Puja, cuja lingnagem ele saberia agora areira, © a neve que acabava de cair 0 iniciado langou sua flecha ¢ 0 guanaco titubeou, ¢ depois cain na chao branco, O klaketen phar suia primeira presa, O rapaz estava inquieto, Nao Ihe tinham contado que o shoort, & pirito maligno, poderia a qualquer momento surgir da floresta? Rapida mente, despojou sua presa ¢ cortowa em pedaces, Da garganta fumegan- te do guanaco tirou uma pedra anormalmente grande que abriu como ava de aa uma noz até encontrar 6 caroco, liso ¢ redondo, preto pontilhado de estrelas que brill wan na palma ada de sua mio. No que mais ANTES DA INVASIO. as ir Vitorioso de seu medo e de sua ina- da Lua ¢ ele pr podia pensar quando acabava de s bilidade? A noite caindo, er ecisava vol- an De repente, 0 shoortsaltou de dentro da mata gritando, O Koketen sain voando, gritando também, ¢ desabalada carreira, conseguiu despisté-lo. Chega at dos homens conta ventura enquanto em 9 suaa ndo ac; am-no, horrorizados, O novigo ainda nio os adultos escut, abia que o shoort ¢ um deies, que tinha vestido a mascara para assusti-lo © coloca- lo A prova. O iniciado entregou a pedra preta ao poderoso conseihe dos ini te, que deixara provisoriamente seus atributos migicos para nio atmair os espiritos femininos, sempre atts de uma opor- tunidade para saciar sua sede de vinganca, guardon o presente Os dias dos iniciados ranscorriam sem momentos de inatividade; 10, los, 0 xo’onr mm avencer 0 frio ¢ o sono, a solidao © o medo. Todos temiam o aprendi parler dos xo'an, Cacados pelos grupos que dividiam 0 territ6rio, os aa'on IC 6) 1 eram assinados por seus vizinhos, que tomavam também suas esposas ¢ massacravam seus parentes préximos para impedir qualquer vinganca. Um entio o lugar daque- nortes, pilhagens, reconstitttic desses banclos que voltavam a ligarse regu. rito do kain sucedia ae eutro; um xo vn nove ton le que fora morto, Disputas, marcavam, assim, a existence! io de grupos Jarmente aos espiritos © ao passado imemorial Ao norte da f dos peseadores Alal ixa de mar (© estreito de Magalhaies) que as canoas alus atravessavam, outros cagadores de guanacos ¢ de nhandus* percorriam as planicies continentais, beirando as praias deso- vento que nunca cessava, freqiter gele nis, os téushens © muitos outros homens np dos mapuche da cordilheira, que tiravam sua subs quanto esses cagadores reinavam sobre os espacos in $ que os povoavam ladas por 0s aoniskens, os gué ido as lagos € Eram, corpulentos com 0 rosto m: cado pelas inte vezes, pr nicia da terra, nitos, formando m. s6 com os ant westruzes da Aniézien 8.0 relato evoca a vida dos inéetctos selk'nasns da Terra do Fogo. Este povo de cagadores, hoje extinto, primitives do cantinente ameticane, Os primeiros enropeus que os encontrar 108 homens comandacs por Pedro Sarmiento de Gamboa, en 1578. Contsida, & possivel que a frota de ‘Magafistes tenia petecbido, em outaeo de aque deram a evex grancle tha (Parte 1,3 zona austral, que pertence hoje a0 Chie: viviam extencialmente da pesca, Os aonickens, guenaikéns 0,08 fogs aceus por nt esses grupos, de one vi nome de Tecra tio F Os alakatufs moravam nai éshens eram, come oy selk’nams, cxcadores de guanneas e de abandus (Phar ameriacna, passaco que € parece com oavestruz, cogudo por set Girne © sas plinnas) © ocuparam aampla regio que eh nia (ao a els Aegina) 0x3 Jhamclos de “patagies" pelos homens de Magalies por causa de si corpiinc Uiscealmente: ‘grandes patas"), Por fim, 08 mapuches da Cor 26 INSTORIA po Novo MENDO A ABERTURA DO MUNDO** Sob 0 trépico de Capricérnio, os am uma agricultur pos dedicavam: a favor e i ca: ida pelo clima, pelo mode pesea. Pratie: solo ¢, acima de tudo, pela v nhanga de out as soci¢dades que thes haviam ensinado a domesticar a terra. Mas a atividade que mobiliza erg ens, to amarg de todos era a coiheita do me dos pequenos fritos ¢ das frutas preciso cozinha Jas por muitos dias pa que e iorna-las comesti is, além da captura de pequenos animais. Outrora, naquelas terras, as mulheres governaram com rigor, terriveis cuja fraude um dia os homens descobriram institwindo riuuais igualmente, eles filhas, video que pouparam para que a raga hima reagiram cruclmente, exterminando suas esposas, suas maes ¢ sua com excegio da mulher-« na se perpetuiasse. As marge! , como nas ilhas do mar austral, 6s iniciados aprendiam os segredos que funday s do grande rio Paragt ma ordem do mundo, A estacaa seca terminava lentamente. Na noite fria de Sunsas, o grito do engole-venio ressoava como um sinal que os goso aguardavam ha muitos dias, desde que a Agua dos pocos secara ¢ os rios nao cram mais do que filetes de agua suja. O assajna, 0 engole-vento, com a boca escan- carada como um sexo de mulher, viera anunciar a abertura do mundo. issdivio das primeiras tempestades antes do inicio das companiveis iquelas que o Mcnino-Nuvem despertara na época cm que os hom didos e gozavam do dom da OS: tis, as plantas ¢ as coisas es ava aabrir © mundo, era preciso respeitar a floresta ¢ protegerse das forcas maléficas que poderiam ser despertadas por inadve num siléncio profundo que os homens partiam ao rs terem ouvido © canto do passaro. Enfeitados como que pai ncia. Assim, do dia, apés a guerr rosto pintado com os cmblemas do seu cli, na cabeca 0 gorro de pele de jagu 1 o solo, Sua aparéncia era terrivel. Jej para kerem © direito de coletar o mel, a methor das iguarias, inebri © deliciosa, que pod los adoccer como também provocar um, prazcr intenso ¢ irresistivel. Nao comiam nada c nao bebiam, nao podi- pit nem engolir a saliva que formava pequenas bolhas no canto dos labios. Pois abrir a floresta eva um ato Go perigoso quanto 1, 08 gosodes martela tanto fai am nem ¢ a dlllcira dos Andes, que sio mais conhecides com o nome de araucans, praticavani a agrieultira, Usa 2; parm a Pataginia, Escalacl (1919). sos, parta “erra do Fogo, eseneiaimente Chapman (19 8° Botis ES DN INVASLO se CONE a mente ¢ dee matar m inimigo, o mel, assim como o sangue, poderia volta 08 guerreivos ¢ mati-los. De volta a vila, Lavavamese integ pois limpavam as armas € 0s objetos que os tinham acompanhado na expedi¢io. Naquela noite, dormiriam longe das mulher Alguns dias apds sua volta, trés homens partir mem direcio ao do de me! umas «: artaru- ocidente, enche n troci-lo por acas par gas com 0s tapuys do Izozog. Tinham pedido a ‘Togai, 0 xama, que os hasse: “Venha conosco, vocé nos protegera com sua forca”, Togai i ‘oso dos gosode, aquele que chamava a chuva ¢ acon era 0 nainai m pode que encontrava os objetos perdides, aquele que sabia viajar, arriscando 2 propria vida, até © mundo dos espiritos para trarer de vol mo queria voltar ao pais vazio, o sama juntou- vat ailma perdida de um doente. Ci se aos trés homens. No final dit estacéio s 1, 08 gosodcs tinham, dessa forma, 0 costu- me de cheias de tartarugas. Os tapuys, como cram chamades ger até aquelas paragens pantano: Imenic, trabalhavam a terra ¢ apreciavam o mel das terras dos gosod adocava os coragdes mais duros. desde que os ava, senhores dos tapuy Parapiti, mas o perigo olerecia aos gosodes wm atrative a mais: fugir dele teria sido interpretado como uma fraqueza, € a valentia dos guerreiros nio poderia ser maculada pela chiviea. Tanto mais quando Li cles tinham, ‘bia reccbélos, As transagdes cram fei sultavam os tapuys; estes desprezavam as cabacas ou m vazias; no fim, o mel e as tartarugas parti- forte © picante como os raios do sol, que viagem mio era desprovida de ri tinham se instalacio & margens do 08 IS AOS parceiros conhe gritos, Os gosodes davam a entender que estav dos que am em diregdes opostas, ¢ os gosodes recebiam um pouco de milho a mais pelo seu trabatho, Desta vez, no caminho, os gosod gens, mas Togai, 0 nainai, soube ev s cncontraram muitos animais selv los. Quando avistaram cabanas, apés alguns dias de marcha, Togai tirou de si mestre, o Sibio do grande rio, the dera outrora, ¢ que vinha, dizia cle, de terras muito distintes habitadas por espititos. Togai observou longamente sua superficie brilha ninando 0s reflexos, inter is de seu brilho, pretando as nuang indefin ‘Se cu for até os tapuys, me matario", cons entio entregau a pectra ao filho do irmao de sua mac ¢ disse-lhe: “Gua & mew puopie”, explicando com isto que es dela pio mais precisaria. Depois ransformou-se em jaguar’, AV io continental do Chaco 1, Os ayorés sit, como os sek" ua finda moran na setentsional (lotivia ¢ Paragnai atuaia), Bemnand (19 _ cagadores-coleton 2s JUSTORIA DO NOVO MUNDO AVAPORUS, OS COMEDORES DE HOMENS* De todas as vilas nos arredores chegavam pessoas para o banquete. Ali, na planicie do readas de campos de milho, as grandes 0 tiares onde viviam centenas de pessoas, estavam, Parapiti, alocas, ¢ cfervescemtes ¢ preparavam-se para viver um grande dia, As velhas mexi- AM a cerveja, que estava fermentando nos potes hia dias, para verificar seu grau de maturacio. Cremosa, gorda no ponto certo, espessa sem no en- tanto formar bolhas, a bebida tinha a consisténcia do esperma ¢, como, ele, era fecunda ¢ benfaze , inebriante também, de perder a cabeca, Outras mulheres tinham coberto a estaca, o fbira pema, com uma substin- cia grudent sobre a qual tinham colado ovos esmagados do passare mue- caraguae penas, Na noite estrelada, o canto das mulheres elevava-se como um clamor excitante até os astros do firmamento ¢ os homens bebiam sem parg oj num recipiente sem fundo, O tupichuariya, o homem-deus, falara da Te al clhas reencontrariam sua juventude r COMO Se AE , onde os guerreiros iriam Este paraiso no se DOS a morte € As pé das montanhas encontrava-se muito além, em dirt cdo ao ocidente. HA uma infinidade de lu n saberia dizer = ningué quantas ~ os ava estavam procurande. Tinham iniciado sua errineia hi nto tempo que haviam esquecido sua terra de origem. Muitos ava ti- nham ficado no caminho, optando por instalar-se em terr 5 acolhedo is dlos, talvez, desta busea interminvel. O © plantar 14 sua semente, « tupichwariya conhecia a preguica dos hum tava sem descanso a guerra e, nos ¢ é por isso que os exor- sim, a gloria. Os querembas escuta Os jovens guerreiros tinham o direite de usar o enfeite dos m-no. bios, o tembeta, que os diferenciaya de seus vizinhos e dava a seu rosto um ar fe- ror, ¢ belo, Gostavam das palavras do “cantor”, como costumavam chami- Jo, pois suas ps melodia suave. Como o hupichwariye s pareeiam ur cra protegido pelo jaguar, nao erraya munca. Trés cativos tinham sido arrastados para fora da cabana. Durante muitas luas tinham sido alimentados e presenteados da melhor maneira © agora que es belos ¢ gordos todos faziam festa para eles. Atentas A tarefa de pintar seus restos, as mulheres louvavam sua robustcz rindo. Os prisioneiros dividiram cerveja com os ava € seus escravos, os déceis tapuys, € a noite transcorrent na alegria. Deram para eada um uma joven que dividiu seu leito, No dia seguinte, foram amarrados euidadosames te, mas, de ados com as mos livres pa que pudessem jogar pedras ANTES DA INVASION 2» A América antes da colonizacio GCEANO ATLANTICO Lozog, i Avaporw iguana) OGEANO PACIFICO 1000 kim > 0 erajeto da peers bezonr ™ HISTORIA BO NOVO MUNDO mull que os provocavam gritando. Que espeticuto divertido ver es tes homens atrap de? As mulheres saltitavam ¢ redobravam as ameacas, fazendo rir toda a los pelas cordas e demonstrando tamanha habilida- assembléia Depois, sob o olhar dos cativos, acenderam uma grande fogueira; una velha cmpunhou o ilira pana com um gesto amcagador; passou-o depois a um tapay que o exibiu, por sua ver, para que os pri pudessem Jo, destacaram-se uns quinze jovens gue reiros, Suas pinturas de roste tornavamr-nos ae mesmo tempo magnificos © assustadores. Um deles apanhou a estaca ¢ enfioua no corpo de uma s vitimas, enquanto outros esmagavam seu erdnio com porretes, fazen- ion ‘08 da do os miolos espirrarem; entio foi a vez dos outros guerreires que niio tinham perdido nem um minuto do espeticulo. Por fim, as mulheres lancaram-se sobre os cadiveres ¢ arrastaram-nos para o fogo, rasparam as pele co de madeira em scus anus, para que nada se perdesse. ar canibal mareava o ponto culminante da A orgia guerreira, longe de acaimar seus sentidos, excitavaos até 1 que ficassem brancas € lisas, ¢ depois enfiavam um peda- Em meio aos ava, 0 jai festa o frenesi. Para aliviar @ corpo, aqueics que mataram, abstinham-se de comer a carne humana, e deixavam escorrer seu sangue fazendo profun- dos entalhes no corpo com incisivos de reedor sabo: ne deliciosa, que tinha side cortada seguinde p elas as entranhas, a line av: com deleite esta crigdes muito rigiclas. gta € o resto dos miolos, que consimiam depois de té-los fervido. Assim, com este ato, todos deviam se beneficiar, conforme sua posicao, da imor- talidade da Terra sem Mal. Tomando a forga a substancia de seus ini- migos, os ava tentavam aumentar a que posstiam, condicio necessiria pai de perpétta, Milhares de tapuys tinham encontrado a morte em seu v tre, e as tribos das redondezas, que conheciam sua reputacio, temiam-nos c atingirem aquele mundo profético onde a vida seria uma felicida- ne mais que a tudo no mundo. O tupichuasiya estaria, com sua grande sabedoria, pensando na Ter- em Mal, além das montanhas? Preparava-se, em toda caso, Pp sett caminho, embora sua idade fosse avangada, Sabia que sua crrincia a seguir estava perto do fim e estava feliz. Longe dos risos dos va sem descanso e seu espirito divagava, Seus membros € seu peito cram zcudidos por espasmos regulares euja intensidade 2 em ondas concéntricas © 86 diminuia para melhor retomar o pul chuariya, com os olhos meio abertos, gozava de seu Extase. NAo fosse 0 leve wemular da pedra preta de reflexos dourados que tinha no pesco- ANTES DA IMVASKO 3 60, pode 10 leve era seu corpo. Ado amanhe:- cer, mio agdemtando mais, recolhen suas roupas ¢ fe cia crer que estava morto, ‘a sempre*. PERENE, A MONTANHA DE SAL" As ar uris multicolorides lev gritando 4 medida que os homen Perene, que esperavam atingir antes do fin: as, OS MUCANOS, OS 1 nS; s fucavam o pintano e dirigiamss do dia. Tinham vindo de Jonge, pelos riachos ¢ pelos ries, a esta terra dos amucshas para buscar pedras de sal. Mulheres ¢ criancas tinham ficado nas maloeas com as pas rentes, pois a estrada era long: no com a garantia dos vizinhos, perigosa, Prec: © monsiro tragava viajantes dist e, me nos am contornar a gruta da anaconda, onde todos os dos ou imprudentes, fugir das intane- ixes dos rios, do jaguar ras armadilhas da floresta, dos chamades dos pe hostilidades nao tinh claro, de todos os inimigos com os quais : m ces Jo © que procurayam por vinganea. Mas Perene, a montanha de sal, anfitrides garamtiriam sua protecio. cus cesios plantas que ei nao estava longe, © Os homens trazi: esciam em seus dins e que permitiam tomar 0 caminho dos espiritos para descobrir 0 que estava oculto ao ola humano; levavam também coroas de plumas de rara beleza, mel ¢ madeira odorifera. Aqui ¢ ali, os fogs dos cereados const brindo os Mancos da floresta, Outras clar 08 troncos, quase cobertas pela vegetagio, escondiam de um sol ardente as banan ras © a mandioca. Eles das na encosta do Per se sentir, O barulho dos insetos cob discreta levamtava nuvens de borbole! brane Seu s masato, Em sege iram entre nuvens as primeiras cabanas, aninha- ene, quando @ peso do cansaco comegava a fazer. sells passos, mas sua progr aciina dos shimorotogé de > amis s corolas. y saiu da segunda matoea e recebcu-os com wma tigela de a, conversaram prolongadamente sobre os aconteci- 5. Osavaporus, literalmente, em gutarani, “comedores de carne humana", pertenciam ao grande conjunte Os ehitighianos instalssam-se aia Bolivia, e algumas tribos chegaram até os confine do apiguae a1 (Peru). O gelato acontece no Chaco boliviana, a intanos do Izozog, onde se perdem ae ‘iguas do Impétio dos incas, em Chachapoyas ¢ no ual ndeste de Santa Cru de la Sierra, is mangens dos Parapiti, O ypitaari iio da Bolivia orieatal era habitacla igualmente por grupos de hamavam, cam despeeza, de tase (seevidores") ras um profeta coq sobre ele, a expresso “hor menirdeus", Esta 1eg a aravabs, as chanés, ques chiriguanos reduziram 3 eseravidio Chace Sardi (196); Métrouy (LU, 1967): Clastres (1975); Combis (1997) © Pieme nino, a beies da floresta anizdniea, Per. 2 HISTORIA vO NOVO MUNDO mentos do ano. Os esty ngeiros souberam que a gente das cordilheiras tinha chegado de Chaclla com jéias € tecidos, Outros grupos jd haviam passado pelt montanha de sal com mercadorias de todo tipo, trazendo historias de paises distantes, que cram contadas depois aos recém-chega dos, cnriquecendo os detalhes, ¢ estas palavras que faziam com que vibras- riam espathadas em outros lugare no caminho com outras, para voltarem, de alguma forma renovadas, entrelacando-se sem naquela noite Aqueles que um dia as ¢ zer quanto se as estivessem escutando pela primeira ver, Borboletas cor de anil, ornadas de pequenos olhos nas cores do 1, haviam entrado zham langaclo © que as ouvisiam com tanto pra- na maleca, provocando certo alvoroco entre as mulheres, que se apressa- elas mergulhasse, utr pessoas presentes morreria em breve. No chio, as criangas brincavam, ram em tampar as panelas: se uma das borbe 1 das indiferentes A gitagio. Os cochichos contin taram cm suas esteiras. E murmtirios. O sonho libertou as a por oa noite igum tempo, depois que todos dei- idos ¢ seus impossc, com se s nas dos dormemtes, que vagaram a yontade em grande despreoeupacio, pois 0 chefe da madoca era um ho- mem com muitos podcres, cujos dardos invisiveis cram mais poderosos do que todos os de seus rivais. Algumas almas tiveram encontros surpre- endentes, ontras passearam pelas clareiras, houve até uma que se unin a mulhercervideo, com quem tinha um encontro nas noites de lua cheia. A maiori: se em brincar com os animais da floresta. Ao comtentou iar invisiv a sett invélucro do dia, esses par s voltaram calmamente p: carnal por esse lugar do erdinio cm que os cabelos ficam espetados, como 05 turbilhdes do rio, e que é a porta do corpo. Entio, as pessoas acorda- ram mas apés as outras e um nove dia comecau. ‘Os amueshas controlavam o {luxe das mercadorias que convergiam p tro de trocas que cra o Perene, a partir para outros lugares, em diregdo as cordilheiras do Oeste ou aos territ6rios da floresta que, de rio em rio, desciam até o mar imenso, em direcio ao sol nascente. 1 aoc ater: rae aio a4 plana € 0s rios arrastavam-se preguigosamente cavando um leito largo que mal se distinguia a outra margem. Na épaca da seca, nas fran+ jas de terra descobertas ¢ cheias de fimo, eresciam plantas que al vam poderosas tribos, sempre em guerra para ganhar mai: energia do ven- nenta- cido. Havia, entre estes povos, “comedors de homens", como todos os de gem tpi, aos quais os avaporus eram aparentados; outros grupos que eagavam cabecas; or outros enfin viviam tranqiiilos em suas clareiras onde constituiam o alvo dos guerrciros. Sub indo os grandes rios, sobre as ro- alavra, lai chedos em cima dos quais o senhor do ‘Trovie inscrevera sua ANTES DA INVASLO 33 onde moravam os amueshas ¢ 6s nomatsiguengu fértil, ¢ era preciso abrir ine ..0 solo no era tio memtente novas brechas na floresta para arrancar na parca subsisténcia, que a caga ea tavam. Por fim, dos confins da pesca felizmente comple- guia-se a montanha de sal que atrafa os homens vindos rande floresta, 4 procura da substincia preciosa e também dos do pais das cordilheiras, que estendia-se do lado do dine dos produios tra sol poente®, Na floresta dos mil sons, nha-se ouvido falar deste rei no de oure do qual se conhecia uma pequena amostra gracas aos mercadores que des- ciam de ki, curvados ao peso das mereadorias. Os montanheses, empur- rados por Tupac Inca Yupanqui, tinham feito algumas incursdes guerrei- rs imensidio v4 com facilidade, pois os invasores vinham de terras frias ¢ tinham dificul- dade em caminhar por aquelas extensdes expessas ¢ pre: anto qua 1 yde, mas os autdctones sempre os tinham rechagado sivas; os insctos nto os homens, litni mn suas ambigde: iais substituiram os enfrentamentos dirctos, ¢ todos encontravam va lagens nisso, mas a desconfianca , de ambos os lados. Os emissi rios do Inca habituaram Jgumas Iias a se avencurar no territérie dos cinavi antis, nome que day tais das montanhas ¢ que gravitavam em volta do Perene. Traziam ped para fazer madeira, que estes, por sua vez, tros am a todos aqueles que habitavam as encostas flore: vam com tribos mais di Lantes, jdias de ouro e prata e tecidos, cuja beleza despertava cobiga até muito longe, ja que até mesmo os chimorés do Orinoco conseguir um possuélos, Em troca de todos esses bens preciosos, os stiditos do Inca re- cel baco, mace m plum der com aqueles que consideravam como selv as raras © mel. Vinham também para apres jar e de wens o poder dev ver além do mundo visivel que conferiam certas planta antis possuiam. Marca Pari comandava um pequcno grupo de sunas—era o nome que davam a si mesmos normalmente e que significava simplesmente “os ho- mens” = p: hor Vilea Xagua. Aquele que o enviara tinha sido no= meado para a fungio por Tupac Inca, que o coloeara no comando de mil , na provincia dos chupachos, beir cujo segredo os os indo o territ6rio dos antis. Os 6, Onamiesiias pertencem 4 famiia lingiitiea arwak, asin como os nomatsiguengas, Estes dltinsos Go conheeidos pelo non Dita no piemonte andi ribo Perene (Peru orienta, possuta e de camps out anticampas, Estas populacies de ugrieultore 1 do Huallaga 20 Ucayali (Peru). O Peren inte de sal, a0 as de si gema, Este Cerra de ta Sal ji estava, do séeula XV, nas mins dos amucshas © dos campas Era um importante centre de trecas para onde conyergiant muitas tribos florestais do Ucayali, do Urubamba de Apurimac. © masate é wma bebida P81); Renard-Ca fermentadla, Renard Casevitz (1880 vite & Saignes & TaylorDescola (1480) ” JNSTORIA DO NOVO MUNDO montanheses observ: vam. diseretamente os pacotes de plantas que os ha- bitantes da floresia tinham colocado no chao, ostentando indiferenga; quase nao olhayam para os cspléndidos diademas de cores brilhantes que vieram buscar to longe e cujo valor conheciam. Os runas descon s povos das terras baixas pelos quais sentiam ao mesmo tempo avanti daqueies desprezo, devido 4 diferenga de costumes, ¢ atragio, por causa do misté- rie que emanava daquel midas que tinham dado 4 jas terras opressiva se luz a planta divina, a coca, que © Inca colocava acima de tudo. As ransagdes arrastayamese por muito tempo, como de costume. Marea Pari contava os pacotes ¢ verificava nos nés de seu guipua con ndo gosta- al que estava fazendo oralmente. Os habitantes da floresta, qu ¥ operacdes, contestaram as quantidade ercadores do Inca consignavam Os stiditos de Vilea Xagua fingi- pstrar sett m destes corddes nos quais os 1 s ram que estavam indo embora com suas mercadorias para m descontentamento, Os amueshas voltaram a servir masata ¢ loge os par cciros chegaram a um acorde. Os iceidos ¢ as joins tomaram o caminho dos rios ¢ depois embrenh al para umn longinguo stino, As phama : para o sol poente, ao longo de caminhos que subiam lentamente pelos primeiros contrafortes area Pari caminhava LI-Se HO OcCANO veg! cr eo mel dirk as plantas ascensio, que libertava pouco a pouco sua r doa spiracio ¢ a de seus homens da pressao sufecante F quente; pensou na estranha pedra preta que roubara do pa anfitriao, aprow ulhara © vi nerosidade para com cle tink i de seu tando-se da confusiio men tho, cu contudo, sido muito grande’, AFILIA DO KURAQAY id construir um eanal © huraga Vilea Xagua que gar sens campos. Mas dois cnormes vochedos barravam a passagem, ¢ todos os 7. Foi du de Tupse fnew Yapanqui = amorte em 193 — margens da ores aazbnica, Os yrodutos andines elaborados pelas etnias sulsmetidas 3 08 Incas tertaram poner nas soridade 2, cuja capital era Cusea (Peru), circulavam, graras is treas coma tribos (forestais, 20 longo dos tins da hacia amazinica, Gieza de Leon (1967) faa dos plemonte: “Hacia la parte delferante envid ulotesespities enviadlos por Tupae Inca ne 5 orejonesavisidos, cn habito de mencadetes, pi tas ctras que hobiene y qué gents lv mandabnp, 203, Par as chupachos, grupo dine da 16 de Huinaicn (Pens), ver Orsi de Zig (1067). Avila ee Chel, 2 Fete de Hixinica, floresta, era o local de resiléncha de um poderowo huraps, terme qufchsea para desig © Peru, Huénuce © Cusco, ANTES Da INVASLO 6 ‘Jos. O senhor convecou os melho- cos para deslocé-los tinham sido v res feiticcivos da regido © ordenou que encontrassem um meio para que pudesse achar um caminho cnue as ped rqueles que conseguissem eam Prometeu recompen- ! 0s incapa yes com a per bios vindos dos quatro cantos do ma. Apenas quatro, dentre todos esses pais, conseguiram cumprir a fa tes amare num casal de estrel anha desclobrando-se num par de serpen- as, uma do creptisculo, outra da manh Seguros de sua arte, fiararam um cano perfeitamente nivelado pelo qual comegou a correr a agua benélica, revitalizando o milho do kiwvaga, O senhor soube manter sua promessa: Aqueles que o ajudaram distribuiu terras € esposas, a todos 0s outros reservou © pior dos castigos, ¢ for degolados na hora, © sangue jorrou dos supliciados ¢ formou um verda- deiro rio que, mesclado ao barro, consolidou a canalizacao. “Aquele que tudo vé", temivel exccutante do Inca, viera fazer © cen- ‘am so de todos os chupachos com seu costtmciro rigor. Da longinqua capi- tal, Cusco, o Umbigo do Mundo, 0 Filho do Sol fazia questio de zelar por urdo s Pescapar a menor espiga de milho 1 is humilde tributirio, pois nada devia ser subtraide dos celeires do do Inca nao residia em sua administragio? Seu império, que m deis: mom stado, A for a bava de do por seus igencias do tribute. Mes- mo com estes esforcos, o soberano nko desconhec “aqueles cujos olhos enxergam tudo”, que certos kiwaga dissimy stiditos ¢ assim m 0 trabalho deles em seu proveito. Tupac Inca desconfiava dos senhores locais ¢ sua justica castigava de forma exemplar quando abusos eram descabertos. desviav: Vilea Xagua havia se adiamtado. Permanece capital ¢ dera tr cava das Muth era concubina do praprio Tupac Inca. Go: logiada que 0 episé por muito tempo na =x; uma de suas irm entio de uma posicio acho viera confirma sde suas filhas da can: A inspegio fora uma operacao de rotina, ¢ este homem duro e eficiente 1 fora incomodado, ainda que, com habilidade, tivesse escondido do petor as trés familias que moravam nas piantacdes de coca do Manangalli, osd as do Yarucaxa, ox ardavim os rebanhos nas ences! que estavam instalados entre os Queros ¢ que entalhavam ssim como 6 volume real de mercadorias que seus homens tra outros tr madeil terras dos antis, como resultado de uma troca qu trazia yantagens. Vilca Xagua tinha enganado “os olhos tode-poderasos que, por mais agndos que fossem, no conheciam como ele seus domi sempre The nios. Como 0 emissirio odiado teria podido “ver” realmente 0 que aco’ 6 AUSTORIA DO Nove MUNDO tecia em todas as ravinas, todas as gargantas, todos os recantos de uma provincia como a de Vilca Xagua, cujo ancestral fundador nao era nin- guém menos do que Caxacayan, a montanha de pico erigado que domi- na o vale? O grande kuraga deixara também de assinalar a extraordinaria mul- tiplicacao de seus rebanhos de Ihamas, que acontecera depois que Mar- Pari, um de seus sitditos, trouxera da floresta uma estranha pedra pret de pontinhos de ouro, iguais as estrelas da noite. Este ovo mineral cheis tornara'se sua conop, que ele guardava em casa a sete chayes. Parecia-lhe que este grande pedregulho absorvera o poder de todas as outras pedras que seus pais the transmitiram de geragio a geracdo ¢ eujas formas ¢ contornes lembravam os animais que deviam proteger. Vile: - compensara seu ficl servidor atribuindoshe uma segunda esposa, conhe- cida pela arte da tecelagem. Avila onde Vilea Xagua tinha casa estava situada numa zona tempe- 1a propicia a cultura do milho. © clima era bastante suave € a orienta cio das encostas gozava de uma insolagio prolongada. Os terracos de cultivo elevavam-se de forma regular, dando ao conjunto um ar préspero. Os campos cultivados eram dominados por um circo de montanhas en as quais destacava-se o Gaxacayan. No ponto maisalto da montanha, o raio Libiac costumava vir sentar em seu assent rochoso, provoeando entio violentas temp: Para apazigu re ade: levavam of Jo, os habitant endas, cer eja de milho, conchas, flores, coca ¢ também, quando a geada amea- cava as colheitas, uma crianga cm tenra idade. Da esplanada que servia de lugar de reur que era usa ye que b propriedade do draga saia uma pi 1 chegar As batatas, Era preciso subir um morro bast te inclinado, passar pelo milho c contomnar um degrau. Ao cabo de algum tempo, atingiase wma zona mais dura e mais fria, favoravel aos tubércus los que ofereciam na époea dos primeiros brotos um lindo espeticulo. Mais além, na puna planicie de que sempre gostaram os habitantes do tavam rebanhos de Ihamas € de guanacos, assim como alp: era reservada para o Inca ¢ para os senhores poderoses. Vilea Xagua ¢ os de sua linhagem gostavam de cestrais eram origindrios ¢ a situada em algum tugar na di cio do sol nascente. Animades por um 0 guerreiro, tinham sido. conduzidos pelo valente Yarovilea até Orcon, a vila onde o huraga fixara énci es de morrer, Yarovilca mareara os limites de seu territé- rio colocando uma pedra, uma huaned, que penetrara na matriz da ter- rae que desde entio garantiu a fecundidade de todos os seus descenden- ontar que seus an- resid tes. O corpo de Yaravilea foi vestide com suas youpas © foi ANTES DA INVASLO. a” colocado num niche do C de sua mac; a secura do putrefia foi honrada por todos os seus descendentes. Para alimentila, algumas parcelas de terra foram consagradas, ¢ todas os moradores da vila, por sew turna, cuidaram das culturas O ritmo das esiagées era, em Orcon como em todo hi » pontua- Grios. Gada ava um certo mimero de tarefas ¢ de servicos obrig: fornecer um contingente de servidores caleulado pro- po provincia devi porcionalmente de sua circunscri¢ao, uns cem homens para ct de de Cusco, uns quarenta para as obras de construgio ~ as construcdes tinham se desenvolvide de forma incrivel desde 0 tiltimo Inca -, uns vin- te para guardar as mimias dos Incas, outros cem g r pecas de ceri > mimero de tribu soberano vivo, outros vinte para fabric para explorar a coca, tins sesse dez como servidores de Tupac Inca, sem contar os fazedores de sapatos, 08 batedores de caca, os pastores, os trabalhadores para as salinas ¢ para a pimenta. Além disso, duzentas pessoas das que ficavam trabalhavam para os trabalhos de marcenaria, ui nas terras do Inca As mulheres constituiam uma forma particular de wibuto. Escolhi- das por sua beleza, tinham como tarefa tecer as pecas finas, os tecidos de cumbi, que somente as linhagens nobres tinham o direito de vestir, Po- diam também ter a honra, as vezes, de dividir © leito do Filho do Sol, dos membros de sua ilustre familia, ow ainda de algum capita coberto de gloria, O soberano recebia este tributo feminino do qual guardava uma parte, Redistribuia o restante nos quatre cantos do império, decidinde so- bre as aliancas ¢ tecendo com os kuraga lagos de fidelidade que conti- bufam para consolidar seu poder e para manter a ordem em tod: nagées que dobrava A sua autoridade. As corvéias cram efetuadas por turnos para nie empobrecer a vincias. Vilea Xagua cuidava da exata distribuicao dos encargos, auxi do por contadores que regist lade nos cordées do quipu, Nio longe de Orcon, enconuravase o ¥1 com sua fiteira de ceicires que podia ser vista de longe quele lugar que os bens recolhidos dos grupos loeais cram conservados para serem ntro de Hudnuco, rcitos depois distribuidos para os ex membros da linhagem do Inca que Vilea Xagua possuia quinze esposas com quem vivia em harmonia. nham todas grande habilidade e seus dedos sabiam dar vor & Ia: seus para os necessitados e para todos iviam do u ho de seus stidites, 0: 38 JUSTOREA DO NOVO MUNDO biament tecidos retracavam os feitos dos antepassados, combinande s cores, marcando as nuangas cromaticas, que se escalonavam entre dois tans muito contrastantes para que estes pudessem se defrontar visivelmen- perto de si duas irmas com os filhos, sua vellza mie te, Ele mantive uma das mulheres de seu pai; hospedava ainda dois servidores. O kuraqa havia engendrado uma descendéncia numerosa e seu poder fecundant que a idade pd , era compariivel ao de sua huanca, 0 ialo de pedra plantado na terra timida que se erguia na entrada da vila. asa paterna para fund tet, mui cia ndo arrefec ‘ A maioria de seus filhos havia deixade a sua prépria linhagem, ¢ dei queles que ainda viv to pequenos para voar com as préprias asas, a jovem Tanta Carua e: iam sob s tre 2 ma stin predileta, A moea era Wo bela que o proprio sol sentia inveja de seu britho. Sua pele era lisa, uniforme ¢ sem a menor mancha; seus cilios eram lin- damente curvos ¢ seus dentes brancos € regulares como os griios do mi- iho. Como cle a amava muito ¢ tinha orgulho dela, resolveu envid-la a Cusco para fazer dela uma capac huecha. Sabia que esta honra Ihe valeria uma recompt momento yencrada pelos seus, A noticia foi recebida com alegria por toda a familia; s6.a mie manifestou alguma reticéncia. Vestiram Tanta asa generosa € que sua filha querida seria a partir daquele Carta com as mais belas roupas, ¢, escoltada po um cortejo de paren- tes ¢ de servidores, deixou Orcon ao raiar do sol. A procisse acompa nhow a linha reta que passava pelo caminho dos picos, figando todos os lugares veneniveis, os fuacas, aos quais era devotaco um culto particula até o templo do Sol, no Umbigo do Mundo. A estacdo das chuvas aeabava de comegar, ¢a cidade de Cusco pr ¢ para celebrar um conjunto de rituais, Capac Inti Raymi, para pa afastar o mau tempo ¢ garantir o fluxo do mundo, A cada quatre anos, nesta data, o Inca livrava-se de ido o que o maculara, pois ¢: como Filho do Sol, a toda: Java EXPOsto, 1s conjungdes funestas com os astras e as for- ¢as teltiricas, Esta purific se maculada, nto s6 ¢ sob sux autoridade estariam em perigo de morte. Para este fim, ele ia esta macula, a capac it privileginda lo. Avisado da chega- tudo © que maculava Ao impunh como também todas as comunidactes colocacas sco- se ainda mais, pois se o Inca fos- thia wi 4 jovem muito bela para quem transmit . Neste ano, a fe hucha, cnjo nom fillva de Vilea Xagua, cuja beleza tinham-lhe ex da de Tanta Carus, 0 Inca fez 0 levantamento 4 a pureza frente “Aquele que Fala", “Servidor do Sol” ¢ segundo, depois a jovem adqui dele, na hicrarquia do poder; depois, desceu para se lava na corrente do Apurimac, acompanhade por todos 05 seus conselheiros. ANTES DA INVANLO. io Neste momento, Tupac Inca esti sentado em seu trono de oure; 0 monarea esta usando sua insignia real, a tanga de Wi que cinge sua testa como uma coroa; vestin, por cima do vestido de 1a de de pélo de moreego. O F ¢ 08 Ibutlos de stias orellias, que descem até os ombros, conferem a sua paca, uma cap: ho do Sol refulge com o brilho de suas jéias, figura wn ar majestatico, A sua volta dispuscram as estituas do Sol, do Raio ¢ do Relimpago, assim como as mimias ancestrais, enfeitadas com suimttiosas vestes, ¢ com todos aqueles que zelavam por elas. Tanta C ua esta estarrecida com ess pompa. Ela assiste Js libagées do Inca, que ofe- rece a seu pai, o Sol, uma cerveja de milho feita para este fim pel sua esposa principal = ¢ irma =, ¢ pelas puallas, suas outras mulheres, que trazem jartos de our nbém o g de sacerdote degolar um Ihama de pélo imaculado como sua propria pele € regar com 0 sangue que jor do mitho, preparada para a cerimdnia. Ele fu com isso uma massa que dd para o Inca ¢ seus contendo # preciosa bebida. Ela ¥ ata farinha branea proximos comere Os cantos, as dangas, ay oferendas, os sacrificios de animais que sc sucedem, os banquetes ¢ as bebedeiras, autorizados nessa oportunidade, a festa do Sol, a mais bela do ano. Li cstio, sentados, os princi- marca pes de Hanan Cusco, o bairro alto, descendentes cas esposas favoritas do. Inca, e os de Hurin, 0 bairro baixe, composto das linhagens vindas das mulheres secundarias, com suas mtimias. Ao en ardecer, quando a ch sfio colocados de volta em seus va fina comega a eair, os corpos anceste nichos até o dia seguinte. Num comodo longe do olhar da multid Tupac Inca deflora Tanta Carua ¢ tansmite para set corpo ti ido, » joven © o belo a sua micula que © negara chu nte qu tro longos nos. De ago- racm diante, cia é toda impurer: o Inca eo mundo i , capac hiuecha, © precisa morrer para que teivo possam continuar a viver sem temor, Ceread: rua retom pelos seus, Tanta C: © caminho que a leva de volta para avila de seu pai. Enquanto na ida todos acon no encomtra mais carregando ¢ afastam-se de seu caminho, baixando os olhos, Chegando que Vilea Xagua preparar jd tive festas suficientes em Cusco.” io-lhe para beber uma infusio que # faz adormecer, Com la, s sabent @ peso que ela es mi. para ve-la c tou 1, pois as pessoa gora ng A.sua casa, cla recusa a fest pede ao pai intio, “Acabe comigo", cuidado, desce n seu pequeno corpo até o fundo de um poco seco ¢ co- locam Li vasos € pratos de ouro, assim como os mais suntuosos yestidos, E ..0 poco € coberto com pedras € todos yao embor depois, em sinal de gratidio, Vilea X: rior ¢ a chefia de u Pou 1 segue! ita sera elevado a um grau supe- ios. De cunscrigo reunindo quatro mil wibu “a HISTORLA DO NOVO MUNDO todas as vilas dos arredores, as pessoa vem honrar a capac hucha ¢ wazer- partir desse momento, A prospe- Ihe oferendas. Pois é ela que preside ridade da provin: Nos NFINS DO IMPERIO INCA* Tint Huallpa contempia o mar imenso pei primeira vez. Acabou de ¢ para sujeitar melhor o lito- ao controle de , confiowlhe esta importan- Em pé sobre um alciro sobre st descer com suas ur s da planie ral de Chincha, que acabara de passar pa que mio é outa senao o proprio Tupac Incs te missio embora cle fosse muito jovem, rvat Os pescadores que vio, palha, ultrapassando a arrebentagio e desaparecendo por algum tempo rat cuseo. Seu p obse as embarcacoes de sob a espuma das ondas. Do alto-mar yer um cheiro forte que ele no consegue identific 1. As gaivotas disputam peixes, mergulhando virias vezes, arrancando a presi umas is otras ¢ lancando gritos que rasgam © ar; 4 beira do mar, um pelicano imével olha fixamente para s presa. ‘Titu Huallpa examina o céu cinzento, do qual jamais cai chuva nenhu- ma. O calor seco do litoral corta sua respiracio. O Grande Soberano de seu filho até 0 rio ompanhou as tro} Apurimac. Depois, cansado de viajar pelos quatro orientes de seu imp rio, retirouse para a cidade de Cusco, dominada por uma fortaleza sahuaman, a Aguis Assustadot 1, construfdla com pedras das que havia sido necessavia a forga de centenas de homens para ae: eplis segutide com as conqui ul de sua vida, cle pode se orgulhar de ter pros is inieia s de Ss por seu pai e submetido dezen: adotaram © culto do Sol, sem contude ao: fontes, s ott picos de onde cada um sai povos gerreiros © incertos; cle abandonar seus proprios lugares de vene despenhadeiros, gruta vores, pogos, ido da terra onde Viracocha os semeara. O Inca anexou, por sua vez, o ori culo de Pachacamac, contruido a beira do oceane, ¢ com isso todos os santuiries que dele dependiam. Ele estendeu a essas terras planas € B. Orvie de Ziitiga (1967); Cristital de Molina, “el Cuaqueiio” (19 102; He 175; Zuid 5 Gieea ale Leon (1967), pp. 100- 1 (1978), pp. 1037-1056, A. face, nindlez Principe em Dusiots (1985), pp. 47 qite io devemos confinndir com a hun (nome dado a lugares que erim objeto dos cultos mast bém a todos os Fen eno singulares), emt um monolito erguido sobre win campa © que represe o ancestral pettificadlo, Sobre as Auancas, wee Duviols (1979). * Per, lioral de Pacttice, ae sul te Lit, ANTES D8 INA a 1 belo idioma quichua que tem uma melodia de rouxinol ¢ weras, Forgou aqueles povos A rendieao cortando os ©, irrigagio que lhes traziam a vida, ¢ os antigos rebeldes torna uatirios, enquanto seu orgutho se trinsformay vilismo. No interior de seu império, a ordem sucedeu ao eaos. Sem o conse’ do Inca, ningué isde am-se d6- em sc men- n mais cir alou, nem modificou por sua prépria von- coisa que introd para o tributo. Apenas os mensa tade as cores de seu cha confusio insuportivel nas cons © os carregadores tiveram permis pén ou de suas roupa: io para trafegar pelas estradas, que cle desenvolveu ¢ amplion sem preocuparse com o releve que resistia & sua obra. Por sobre os rios profundos foram construidas pontes de corda que s irduas os rebanhos de [hamas atravessavam sem perigo: as encostas m: foram dominadas com escadas de pedra de milhares de degraus; os de- sertos, os vwulcdes cobertos de neve, as geleiras ¢ os picos dit cordilheira maj as jangadas do Inca singraram Haua Chumbi ¢ Nina Chumbi, de onde teuxeram objetos suntuesos ¢ homens de pele negra No entanto, o Filho do Sol sabe que as vit6i stost foram domados ¢ até mesmo o imenso oceano cinzento, pois até as has Longinquas, as Hhas do Fogo, is muito ipidas s © que acos irredutiveis & sua Lei, Nas terras dos antis, as margens da grande floresta orien! xércitos tiveram de supor tar derrotas; entravados na floresta impenctravel, atolaram na fornalha da armadilha verde onde pululam insetos capazes de acabar com a sint- de dos mais robustos montanheses. O orgulito de Tupac Inca teve de contentar-se com algumas fortalezas erguicas na margem do piemonte e eniregues a tropas seguras; nos degraus do Sudeste, seus eapities conti- veram o ayanco dos abominiveis chiriguanos, canibais i OTUs que exer- nte sobre aquelas fronteiras, preocupacao do untrepokagia desses povos ba quanto o enoja, pois nos Quatre Orientes de sex imp comer carne humana. Mas os veveses que sofreu frente ocupagées que agitam Tupac Inca. Em todos os lugares, as aliangas balan- cam ¢ 05 pactos se rompem, Mal haviam desatolade da lama da floresta, suas wopas tiveram de descer apressadamente at numa pressiio con nde C paro: IsLA-O LAMLO m deve io ningud Ds tis sflo apenas uma das pre- © lago Titicaca © domi= nar a revolta dos kollas, nago ntumerosa ¢ altiva dos altiplanos cuyjos re- banhos sio os mais belos ¢ os mais ricos do ui acreditaram rapido demais que ram os guerreiros do Inea, revoltaram-se ¢ recusaram-se a pagar 0 toad so. Seus kuraqas, que 5 entranhas da Grande Floresta engoli- bu co. Impicdoso, o Inca castigon sust indocilidade, e com a pele de 2 MISTORIA bo Nove UNDO seus corpos os habitantes de Cuzco fabric: nbores de ressondinei m ensurdecedor 1 sul, até a . Os exéreitos penetraram em segnida m: territério dos charcas, onde descobriram mina contiMuaram sua prog de prata ¢ de ouro com o, encontrando em seu veios inesgotavei minho tribos de agricultor s que os acolhe: 1 com todo © respeito, final de scu périplo, os ten limites metidio is maptches cortaram seu caminho, ¢ os is do Império dos Quatro Cantos ficaram no rie Maule, 0 noroeste, os exércitos do In: Em direga o devastaram o pais dos ‘a Cusco ¢ das. Em Tumibamba, esposairma de Tupac Inca deu 4 luz um menino que leva agora o nome de Huayna por isso que o Grande Soberano permanece ligado a estas montanhas setentrionais, mais verdes e mais férteis do que as de sua terra natal. Para © Fitho do Sol percorren pesso- fiavis, dizimando a populacio masculina ¢ depor outros lugares aqueles que tiveram suas vidas pou uma linda fortaleza com paredes arredondadas, impressionar aqueles poves turbulento: mente a maioria das terras; carvegado numa Titeira, passou cm grande pompa pelas gargantas mais abruptas, sem que tar os olhos quando da sua passagem nguém ousasse Levan astavam-se de seu ca- s pessoas minho €, em sinal de veneracio, arrancavam sens Ihas invocando seu nome. Tupac Inca distritsuiu mi seus eapities, seus soldaclos, para os senhores que prestavam obediencia. Dewlhes se jos © suits sobrance- ares de tecidos para idores, mulheres, privilégios ¢, coisa que ndio tem prego, a gloria de terem sido iluminados pela luz do Sol. Com toda razio, ele podia conside como um benfeitor. Sempre mais longe, este parece ser 6 lema daquelas colunas, que percorrem a pé dist ncias imensas, indiferente: um releve que parece ter horror da superficie plana. Os soldados 1 porretes com habilidade, escolhendo a Ina cheia para a te ainda do que o territério dos ¢: dilhei| de rebel ncjam a funda ¢ 0 os ar, Mais distan- fiaris, o vale feliz de Quito nao resis- s meridion: 10. Foi deslo © coldnias vindas das ¢ coibir qualquer tentati fo kollas para Tumibamba ¢ cai foram instaladas ando as popul regiio de Hirinaco que © sistema, a er triunfado das disputas regionais credita realmente nessa ilus: ris para © Inca quebrou as aliangas locais. Gragas 7.— on pelo menos certo consenso = par Mas sera que Tupac Inca Por enquanto, uma relativa t io do império. A beira do oceano, em Chincha, Tita Huallpa descobriu com espanto a prospcridade do Senhor das Planicies. Este detém sew poder ¢ sua riqueza do mar, que as jangadas percorrem seguindo a linha do litoral até os mangue a sobre toda a exten- de Tumbes ¢ muito ANTES DA INVASTO. 6 egantes trocam scus machados de cobre ¢ s mullus indispensiveis em toda oferenda. longinquas, os mercadores na seus tecidos por vértebras, este As jangadas voltam repletas até a borda de coroas ¢ de diademas, de va- sos de prata, de couragas forradas de algoctio, de tinturas de todas _ de estatuetas com formas de animais; estes objetos serao trecados core por conchas precios: das que Ihes entregam os povos tatuados do mat ciam com outros mereadores vindos do interior ¢ peaminh por esmeraldas, por ouro e por cabacas decor que, por sta vez, com: terras. Essas relacdes obedecem a m apenas produtos destina- dos aos senhore is © aos rituais; correm pelas cordilheira vales sctentrionais, além de Quito ¢ dos vuledes do Imbabu fins do mundo conhecido. O Inca, que nao aprecia as atividades merean- Icance no seio de seu império. Tolera, no entanto, as do Senhor day Planicics, que dispoe de uma frota de milhares de be que elas trazem bens tio inestimiveis quanto sente até que suas caravanas chegucm A beira ¢ pelos Wé OS CON tis, tenta limitar embareages, pois raros em suas terr do lago Titicaca, no pais dos kollas, para adquirirem cobr ia impossivel a troca com os povos maritimes do Norte. A chas tio cobigadas, os homens do Senhor das Planicies entregam aos homens do: sem o qual se n das con Hiplanes © guano, um adubo de pissaros do mar que ¢ 0 jimento dos campos. O Senhor das Planicies resolveu selar um casamento entre sua filh melhor de olhos de estrela ¢ Titu Huallpa, A beleza da princesa, © esplendor de sttas roup: © repele, evita eneon igua chegue dace constante dos pescadores 1a juventude ¢ sca varam de imediato 0 coracio do mogo, mas 1s presentes. “Faga primeiro com cmos juntos”, dissc-lhe. Pois 2 dorm ulagiio das eaat » poderiam fazer Je pouco a pouco os jar ndo; a cada dia chadur: ssque- cer que os cana dins, Nos da pr aumentam, abertas como gargant morrendo. Os Ihamas que Tit Huallpa touxe das cordilhciras acostumaram com o clima marinho e também estio definhando. E esto secos ¢ que aareia im a, a te dentas; o milho encolheu ¢ ¢ Jo se ntao ve esta pedra preta com brilhas de raio que o irmio de sia , poderosa kuraga de Huxinuco, the dera antes de morrer? Sera que set poder se teria exatirida ao contato do ar salgado? O jovem trocaa com I rar sta donzela. Mas ela repete: ‘aca chegar agua antes que morramos de sede, Enuio deitarei com voce", do, Titu Huallpa teve de apelar para todos os meios. Sacrificou com rece canais tém sua fonte, Mandou abrir a montanha, para fazer chegar'a neve um ara We ador por tuma conel -nascidos em Pampacocha, 14 onde os rios que alimentam os " JUSTORIA DO NOVO MUNDO dos picos ¢ inundar © vale com sua gua benéfica, Lancou pedras com sua funda para aleancar o Relimpago ¢ 0 Trovao, Esvazion um Lago no vale, ¢ centenas de sapos espalh : pelos Quatro Orientes. Ofertou as for- cas do Géu © das Profundezas centenas de conchas. Enfim, quando tudo perdido, um f jorrou de uma fonte seca; o filete tor- ums lete de aig nowse riacho, ¢ o riacho corredcira, arrastando na descida pedras © plan- tas, A corrente penctrou mas canalizagdes € a substincia vital chegou ao nilho, as abdboras, aos feijées ¢ a todas as outras plantas que a seca des- ira, A Bela de Olhos de Estrela finalmente abriu sew bracas, © os dois amantes ficaram em harmonia com a ‘Tit Huallpa conheceu a felicidade m s forgas teliiricas, por um ins ante. ito tarde. As febres das terras bai- xas teriam enfraquecido a esse ponto, out tera sido : agio da montanha, cujas emanagde todo caso, 4 medida que o verde volta a crescer nas planicies, 0 joven vai cando ¢ encolhende. pds & morte”. acam © corpo daqueles que ousam violar seu solo? Em ai é a mtimia que vir © BANQUETE DOS MERCADORES POCHTECAS* Nos confins da Guatemala, Zanatzin, 0 chefe dos mereadores da ordem aos carregadores de amarrarem seus fardos e de p bengalas. A caravana parte em meio ao pé para empreender a eaminha- da cxaustiva que a leva de volta para as terras altas do Noroeste. Ela é zarem § m de cidade em cidade e de composta por carregadores que se reve pochtecas vindos de México-Tenochtithin, Estes mer adores praticam um comére » de longo alcance que os leva para tarias, n jdantes, onde adquirem mat de quetzal ¢ de peles de animais feroze: © escravos, em troca de artigos manufaturados que Tevam nde Senhor entregowlhes mil ¢ seiscen- Jo espléndida, Zanatzin © seus pocklecas escoaram-nas no mercado de Thutelolco para comprar mercadorias que icalango, em nome de seu senhor. Levaram ni das populagdes iribu- Lerras esi \s preciosas: plumas ementes de cacau, ouro No México, o proprie tas pecas de algodio de fabri tro m “li”, no Anahuae . Sobre at mereadares da vale de Chincha wa Epoca prébispinies, ver Rastworawiki (1970), pp. 195-178; iC Incaeat ribocdacplanicies ¢ dos Leb (1967) pp. 191-197; sobre as viagenss nari Inca, Sarmiento de Gamboa, em Levilier (1942) pp. 106-108; sobre a navegagio av longo da costa do Pacifico, Oberem ¢ Hartmann (1982), pp. 128-149. (0 relate da lela don Othos de Estrel fe Dusiols (LOTLIOTG; © Guatemala, México, vale do: México. ex costeiros, ver sabre as conquistss de 6 de Tup: inspirade nos mitos de Flearochi ANTES DA INVASLO B ianas de corte al apreciadas nas terr entio roupas, obsi outras mereadoris do, aguihas ¢ silex, cochonila e as longingttas, sem contar os pa- cotes que Ihes entregavam as mercadoras da cidade, Mesmo carregados, a viagem havia transcorrido sem transtornos, pois o tempo scco estava bom e a divindade os protegia: Zanavin era um homem virtuoso © cui- dara de partir num dia bom ¢ numa hora propicia. Antes de dei far stn casa tinha se barbeado ¢ lavade a cabega pela tiltima yer ¢ até sua volta ndo se banhara mais. Tinha no maximo esfregado o peito. Por fim, na partida, evitara olhar para tris ¢ entre aqueles que fieavam nin- guém movera um dedo", Zanatzin até gosta do calor timido da provincia de Xicalango, onde moram os plantadores de cacau que falam uma lingua maia, O mar esti proximo, E um lugar para o qual convergem caravanas vindas das quatro direcdes: das montanhas do Chiapas, de Acalan, por via e dos confins do Usumacinta, Os ma hora igna, Iucatd m uma rede de estr: que se prolongam até o sul da Nicaragua ¢ mesmo mais longe, em ter onde se abastecem de ouro em toca de tecidos. Mais longe, no ma grandes barcos ousam cortar as ondas sem contude afastarem-se dema- iadamente do litoral. Localizado mum te domin: das seus ritério céntrico, em relagio A esfera de influéncia de México-Tenochtitkin ¢ de seus alindos, Xicalango oferece uma espécie de zona franca onde os mereadores podem tratar de seus 1 nqjtilidade!’, Nao foi sempre assim. Em Cuetlaxtkin, Ki onde os vales quentes des- cem em dirccao aa Mar do Norte (0 golfo do México) , pocktecas enviados pelo Grande Senhor foram sufocados com fumaca de pimenta; quando morreram, foram esvaziades ¢ enchicos com palha; por fim fizeram seus Scios com toda tr corpos sentarem em bancas ¢ thes da indignacio do ¢ dos mereacores -, ¢ tot! n posigdes ridiculas que provoca- de foi sangrento = para alivio o logo foi subjugada, De fato, a expansio militar da Triplice Alianga — aquela que haviam concluide, ha ués gi 3 i le México-Tenocluitkin, Texcoco ¢ Tlacopan = deve muito 1 Mesmo tempo negociantes, embaixadores, batedores ‘ande Senhor, O revit re; n parte gragas a el s forcas da Alianga haviam atingi- gua maravilhosa”, ao sul, ao lon- go do Pacifico, ¢ a0 norte, no gollo do México onde a terr cont 10, Hassig (1985): Sahagtin (1977), t.10, pp. 13-42. € mexicas, do ponto de vista da antropologia, ver Chapman (29 11. Sobre os msiiay ver Thomson (1070), pp. 17, 128138, 12, Darin (1867), th p. 198, 3 pchtecas de conjunte sapresenta “% HISPORLA DO NOVO AUINBO Além da retidao e da valentia, Mos se dos mereadores que se trem observadores finos € stutos. O proprio Zanatzin participara de expedi¢des de reconhiecimento em territérias distantes ¢ hostis. Vestido como © povo do lngar, cuja lingua falava perfeitamente, sen ga do mercado como um simples camponés ¢, sem ninguém perceber, ana pra icl mu. gravara cm sua meméria tudo 0 que acontecia ¢ se dizia a sua volta. servidor, levou suas informagdes ao Grande Senhor, que © recompens Hoje, Zanatzin é rico e respeitado. Pois se ¢ verdade que a maior parte da mereadoria é des mas, pedras preciosas, tinturas -, uma parte delas eabe aos comerei inada a satisfazer as necessidades da nobreza ~ plu- nites a quem o trafico waz opuléneia e prestigio. Desta feita, Zanatzin concluiu negécies vantajosos. Trouxe também ras quentes dois escravos jovens ¢ de belo porte e uma grande daquelas ter quantidade de quinquilharias: pequenas pérolas, plantas medicinais dua Jo @ accitar a troca, uma pedra pre garantira ele, para aplacar as dores de barr peles de cervideo, as quais seu parceiro acrescentou, para encorajé- a de reflexos dourados que servia, 1. O pedregulho era muito 3 olén © que servem a fins semelhantes. O mercador nao dele. Enfiow a pedra no fun maior do que aqueles que se encontram na garganta dos paissaros hati laotl, heactli, aztatl, Jo & menos ainda desfazer- ousou recns do de um pacote ¢ esquecenna” A volta da caravana é muitas y E preciso poder contar ansados, pois as mercadorias so em todo nsportadas no lombo de homem. Aos perigos inerentes & cidentes, traigdes, ataques de surpre: os da noite, Obrigados a dormir a céut aberto, os mer es aquiaticos e t -vingangas © massacres expedicio ~ escentan io presa Facil dos sei sles quie querem o fogo, cnergia (0 fonalli), do qual todo homem portador desde seu nascimen- to. Mas desta vez nenhum incidente maior atrapalhou a viagem, ¢ 0 com- no vale do México com a te- boio, saindo de uma nuvem de pé, penet v de uma volta feliz conf aque a certes: A beira do atividade febril: peseadores ¢ cacadores de € aos pés mais cansados", ago, a mais de dois mil metros de altitude, reina uma saros aquiticos navegam entre 0s juncos ¢ 0s iris, que a brisa de inverno agita graciosamente solr Catadores de vermes ¢ de parasitas, wal o sol escaldante do meio-d tes de sal, camponeses percorrem este paraiso lacustre que consegue aos jardins mentary uma poptlacdo espantosamente grande graga 14, Francisco Merndnder, Histaia Nature de Narou Piper, México, UNAM, 1059, vol. th pp. SOT 6, 41980), GL ppd 14 Lager Aust ANTES D4 INVASIO 7 construides cm iThotas artifieiais. A época em que os mexicas eram apes nas um pobre bando miserivel, surgido do norte ¢ expulso pelos habi- antes das margens do rie pa star banida para pre. Pequenos rolos de fumaca clevam-se dos santuirios apontados para © céu ¢, de longe em longe, conchas marinhas ressoam no vale. Zanavin, em: que percorrew tantas terras, divide com seus companheires o orgulho de pertencer a magnifica cidade lacustre que nao tem mais nada que inve- jar a fabulosa Tula dos toltecas, nem a Teotihuacan, a antiga Morada dos Deuses, cujas pirimides macicas, gigantescas ¢ em ruinas ergnem-se a nordeste do vale, México-Tenochtitkin é mais do que um ofsis de beleza surpreendente, onde o chciro da pimenta mescla-se ao dos montes de flo ser s cle s de mil cores; é um imenso formiguciro, poveado por milhar s, conto ¢ cingfienta, duzentos, talvex trezentos mil. Ninguém — todo caso, nio os pociecis = conseguiria dar seu miimero. México= Tenochtitkin, onde o saque das cidades vencidas ¢ os tributos arrancados a propri se amontoam, & 205 povos submetidos 4 Triplice Aliang: ima- gem da abundancia, Mesmo com a impaci |, Zanatzit na cidacic, o mais discretame ncia € 6 eansaco que sentiam, obececende © seus homens esperaram pela noite para penetr curiosos, Ainda era preciso que o sig tc passivel, Jonge des othares dos no do dia fosse propicio. O signo ce. -cessidade. Um tio ¢ um irmao recebem a calli, 1- Casa, atendia tal mer Cuidem destes bens que 1 encar pre tin c scus companhcites retiram-se a scus lares para dormir em paz. De volta apés meses de © de privacoes, Zanatzin no che- com as ligrimas-que-transbordam-pe loria que servidores guardam rapidamente me pertencem, pois pertencem ao meu senhor; foi cle que me egou de wazé-los até aqui.” Com estas palavras, os pochtecas vio contas a seus chefes do resultado de scus negécios, Depois, Zana- mao, Mesmo com suas preoct: Para pacdes ¢ suas penas, considera-se feliz por ter cumprido sua tare festejar o acontecimento, convida para um peetivas familias. Apés tan do s@ broas de milho, ele oferece um jantar digne de um se qual gasta quase udo 0 qi 1 importancia, ja que seu prestigio aumenta! Outro banquete ~ vio distante - eclebrara sua aanquete seus pares e as res issadas nas estradas, comen- as noites ruins pa ganhou, Mas isso partida, N: m-The seus filhinbos ¢ suplicaram para que cutics quela oportunidade, as ma se deles, tao fri s emtregar: hos igeis ainda, como pa 15. Bers n (1982), que Wi uma sintese recente sobre a deminacio da Triplice Alianga, "5 HISTORIA DO Novo. MUNDO “os tesouros de fdos do ninho, Os antigos desfilaram seus conselhos — da partida, c. Zanatzin artuma as eniranhas” ~ € a noite terminara na angiist Mas agora, essas preocupacées dissip oferendas de ali quando todos estio reunidos, distribui cogumelos pretos ¢ cacan, Os convidados que consumiram “a carne divina” comegam a cantar a dan car, arrastados para outros mundos por alucinagdes ¢ visbes que come tam depois com prolixidade. No dia seguinte, sio servidos perus com milho, pedacos de ave sabre fatias de cachorro, tomates, cacau com es peciarias, molhos que excitam o paladar, de cores vibrantes, vermelho, seus tos destinadas ais entidades protetoras e, depois, verde, ocre, marrom, sabiamente arranjados de forma a acentus contrastes, pois a perfeigio de um prato é medida tanto por seu sabor quanto por sua paleta de cores. Zanatzin convidou mereadores como cle, mas também nobres dos quais é forn desse antepasto, ele manda wazer a mais saborosa das carnes, a de dois rapazes “lavados”, comprados a um preco alto ¢ bem alimentados para este banquete. A carne dos sacrificados é servida sobre um leito de mi cedor ¢ que deseja seduzir com sua prodigalidade, Depois tho temperaco com um poueo de sal ¢ sem pimenta. A alegria esti no seu ponto maximo. Os mercadores enaltecem os nobres, cobrem-nos de pre- tantes, io-lhes inform ces sobre os mundos ¢ as evitam pre ifestar em demasia seu sucesso ou sua fortuna. No final dentemente mai do banquete, o anfitrido distribui macos de flores, “tubos de fumaga sementes de cacau © presentes. Di como de costume, a oportunidade de dividir su: cursos trocados ene ma -reuni lo, que di aas mais idosos, Apés a experignei excitacao das visdes ¢ a exaltacio da boa comida, o tom entristece. Gon tam og ausentes levados pela doenga, dizimados pelos adversirias e pi dos por deslizamentos ou tragados pelos los an ais selvagens, soter despenhadeiros. Todos se espantam de te reina, “Para onde va Migos, para onde v flores ¢ os cantos! Que vossos cor inda esta ‘em ros, pois a nos? Abandonamos as mor- 108, 1gdcs néo se entristegam, meus caros. Nossa viela passa e vai-se para sempre.” A certeza da impoténeia humana € a submissio ao inelutivel que os poemas € 0s cantos expressam en trisicza serena acabam sempre por vencer. E Zanatzin no ignora que sua, quando morter queim rio com cle os cofes onde tera guardado snas avos que teri sacrificadel™, roupas ¢ os enfeites dos belos eser 16, Sabuagtin (1977), 4. 18, pp. 43565 (1, pp. 340316, ANTES DA INVASLO. ” OS PERIGOS DA TERRA DESLIZANTE © sucesso de sua empresa, Zanatzin nio o devia a sua inteligéncia nem ascu faro astuto, indispensivel para sobreviver nos mereados distan tes ‘ores da divindade. Gracas ao conselho dos anciios, & @ sim aos fa retidio de sua conduta ¢ A pureza de seu roso dispe plinas rigorosas ¢ fazer escorrer de seu sexo 0 sangue precioso. Dormia companheiros, o ‘Todo-pode- ¢ seus bens. Zanatzin sabia obrigar sua carne as disci- cord: a de noite par nio desperdigar tempo no sono. Tenta- ra preservar a harmonia das forcas que pouco ¢ aa evitar o orgulho ea mentir regulavam stta satide © 0 bem. estar de seu corpo. E verdade que essas © mater forgas ao mesmo tempo invisiv percebé-las, Uma delas — 0 fonallé— era wna beca para ligar diretamente 0 corpo ao cos ase nos cabelos. Segundo os antigos, era do tempo das cria- is escapavam a nossos senti- dos, limitados demais p espécie de fio que saia da mos. Assim, 0 fonalli concent: is vind. a manifestaco quente ¢ luminosa de energi des que envolviam a terra ¢ penet bre a terra orientavam, Mas ndo era s6 0 homem que tinha es: gio. O fonalli irradiava igualmente dos animais, das plantas ¢ dos objetos, das mereadorias ¢ das montanli O fonalli de nosso me im no individua, cujo destino so- ado D rete ¢ As paixdes ntinea o atormentar fugia da sujeira do coito addltcro que arruinava os perus, ressecava os campos ¢ desmanchava os negécios mais seguros, esurag dorias. Como ele n estava descontente de seu sucesso, pissaro era impene cle admirava os emplumadores que mors bairro: 0 coragio deles, que ardi de tansformar as matérias que cle préprio (razia em obras delicadamente trabalhadas, De tanto transportar plumas de queval, Zanatzin tina pen- sadlo mutitas vezes na forma de manipulédas ¢ de dar relevo a sua textu- ra tirando partido de suas cores vibrantes © me limpo, pois ele ido a s merca- sett coracio- “ivel aos maleficios. M Jas no mais profimdo de CU ser, am nie muito Jonge de seu com 0 fogo divino, tornava “08 capazes licas!*, Mas cle tinha uma perua adormecida centro de seu coracado, sua inabilidade fundamental dava ainda mais reievo ao talento de seus vizinhos, lembrando-lhe a todo momenta que ninguém podia eseapar totalmente ao destino inscrite no dia de seu nascimento. Ele tinha de seguir seu caminho cumprir aqui- lo que a divindade esperava dele. 17. Loper Aunin (1990), 11, p. 262; Legnos (19801 1977), & Hh, pps 7586; Lpce Austin (2980), 4 1, pe BH so HISTORIA DO NOVO MUNDO Como todos os homens na terra, o mercador Zanatzin era obriga- do por sua natureza, por sua condigio ¢ por sua educagio, a participar da manutengao ¢ da marcha do cosmos dedicando-se aos sacrificios. Quantas vezes jd nao tinha furado a lingua, as palpebras, 0 pénis ¢ os dedos com espinhos de cacto? E este sangue que fizera correr de sua propria carne tinha contribuide para a regencragio das forgas césmicas. Quando crianga, furaram suas orellas; quando teve mais idade, ensina- ram-lhe muito cedo a se acostumar com a dor, com os banhos gelados, tanto mais penosos pois era preciso tomélos durante as noites freseas dos altos planaltos. Agora que seu nome era conhecido, ele podia oferec As divindades outros presentes de que elas gostavam ainda mais, como estes eseravos, homens ¢ mulheres, que cle adquiria para engordélos ¢ crificadores. As divindades estayam sempre com fome m forcas vitais, Para devolverthes os dons que dispensa- humanidade, para eseapar da fome e das epidemias, os homens 1s, Ninguém desconhecia que o sangue dos sacrificados assim como o dos guerrciros mortos em comba+ lizavam o Sol ¢ a Terra. Até mesmo o nde enur gilos aos e sempre exigi vam) destinavam-lhes essas oferendas hur te revi Senhor, Imagem proveitave dessa liberagio de forgas vitais gerada pelo sacrificio: safa dela recomposto, recarregado ¢ satisfeito com um acr Viva da Divindad. cimo de exi téncia, de bravura ¢ de renome"”. Zanatzin tinha cinco esposas. Um di , A mais jovem, que ele amava a, “corrompeu-se” mus cuidados para que a cr irradingio, O parto, como quase sempre, fol um verdadciro combate, corajosamen- te enfrentado pela mie, que cm momento algum deixows dor. Ao fim dessa luta pela vida, naseeu um menino sob o signo 1-Mor- t fi com cari ho por sua beleza ¢ sua conduta perf cou gravida, Os dois pais redobra esperada pudesse reeeber dos eéus superiores wma prime am 0 do Todo-poderoso Tezcatlipoc nna distribuia as digni- dares ¢ as honrarias tio facilmente quanto as re O acontecimento provocou na familia uma alegria indescritivel, pois a crianga tinha garan. tia de gozar de um vigor pouco comum. O favor dessa di faire negociante ~a profissio era heredixiria — um “mercader de escra- vos", um dos niveis mais altos que um pociteca poderia desejar, Esse nas- cimento vinha compensar 0 do ano anterior, advindo sob um signo funes- indade faria do to, pois o primeiro filho ascera no perfodo de cinco dias adicionais ¢ nefastos que encerra o ano. Desoladas pelas infelicidades que o espera: 19, Dawerger (1979); Lpes Austin (F980), 4.1, pps 192499, ANTES DA INVASLO sr vam na terra, os pais tinham entregue a crianca ao sacrifieador para que esie a ajudasse a escapar ao sett infortiinio®. A parteira encheu de agua uma tigela nova, limpou 0 recémmnascido para fazer penetrar nele a forca do fanallie suplicou as potencias divinas, a Senhora da Agua, o Sol e a Terra, para que agraciassem a crianca com seus dons, Nao esqueccu nenhum ritual; ninowo longamente murmuran- do palavras carinhosas, para introduzito no mundo terrestre. “Colar pre- cioso, pluma preciosa, pedra preciosa, pulseira preciosa, turquesa precio- sit. cis que voc® chegou na Terra, o higar dos tormentos, @ lugar da dor, onde faz calor, onde faz frio, onde 0 vento sopra.” A crianga foi chamada de Yaotl, 0 Valoroso, em honra a Tezcatlipoca, o Todo-poderoso*. No cntanto, a mic teve dificuldades em recuperarse do parto. Apos © nascimento, suas forgas def m, Ela “alterowse”, Sua agonia come- aproximavase a hora da desagregacio ¢ da dispersio das spléculo carnal. A energia ree vars cou, e com el forgas qu q que habitava o cor animavam. Seu lonalli deixou o ree io da mulher destacou-se também, € come ela pe hou o Géu do Sol ao invés de ir cera em conseqiiéncia de um parto, g: para o Mundo dos Defuntos, o mictlan, onde chegam os mortos normais. A jovem esposa de Zanatzin reuniv-se no além no campo de batalha. Seu cackiver foi vestide ¢ maquiado antes de ser 10 alto de wma colina onde foi queimado. A familia ofe- 2s belos guerreiros mortos wansportado p: receu para sua vi cisou de apenas oitenta dias para alcangar 0 Céu do Sol, enquanto sua pré- P ¢ voltar para aquele vaio mergulhado na @ solvese para scmpre. Mais tarde, ao fim de pac recuperar o fonalfi da amada para wanei+lo nu coftinho enfeitado junto com as einzas ¢ os cabelos da morta. Seu gesto deverd aumentar a inten cle pre gem roupas, alimentos ¢ utensilios de cozinha, E ela pre- mie, que morreu de vethice, levara quatro anos para chegar ao mictlan vidio, onde o individuo di dade das forgas qu cer os momentos de felicidade, banir a saudade, pensar apenas em seus erros e concentrar sua energia no instante presente™, Teria aquela mulher virtuosa se transformado em borboleta, a exem- mm de agora em diante seus companheiros, para que ela iria descer do céu pela Arvore do is ¢ para tornd-las feias? Seu mar ava forgarse a esque- : protegem a familia. M plo dos guerreiros que era sugar o néctar das flores? Sera Oeste para causar paralisia nas criane do conservou a lembranga de sua modéstia © de sua coragem, ¢ che 20, Lopez Austin (1980), (1 3601 21, Sehagin (1977), (11, pp. 170-192, 22, Lépex Austin (1980), pp. 368, 282, 82 FIISFORIS DO NOVO MUNDO va, mesmo que sua morte gloriosa fizesse de sua passagem uma apoteo- SUAS, SEL © po se. Yaotl cresceu cercado por suas madra uma multidio de servidores, Seu pai, agora todo-poderoso, nao se ausen- tava mais c fi as mercadorias, Pode cuidar mais de perto da educagio de seu menino litavasse a organizar dali mesmo os comboios ¢ a redistribuir afastar as armadilhas que poderiam prejudicar suas forgas vitais estra- gando o bom augiirio ligaco ao seu signo. Assim, todos cvitav por cima do pequeno corpo de Yaotl durante seu sono, com medo de estragar o fio de seu Jonalli ¢ de interromper seu ere meiras mechinhas de cabelo for estranho animal aquatico consagrado a Tlaloc, o deus da m_passar imento. Suas pri im oferecidas aos ratos ¢ suas UNTas aun chuva. O mer- cador aproveitava de todos os pretextos para incitar seu filho a aprimo- rarse € para prevenito contra os perigos que se muhiplicavam na “veer deslizante”. A existéncia wanscorria assim, regrada, limpa e severa, en- quanto os desejos, limitados por tanta vigilincia, adormeeiam’, HISTORIA DE FSCRAVO Um dia, no mcio da estagio das chuvas, Zanatzin comprou quatro 10 senhor do Ty um jovens, am na tempestade, O eserayos no mereado para oferta: esguios ¢ tinham uma pele sem defeito. Dang: mercador examinou-os cuidadosamente para sc certificar de que nao ti- nham mancha nem doenga, Nao eram otomies limitados nem totonaques do litoral, e sim rapazes que provinham dos arredores ¢ m ames: ist ma lingua que ele a coclho, mex © com sua compra, Oo pochtece preparavase xar 0 lugar quando de repente um deles escapou. Correu feito um vendo a cabeen com habilidade para nio ser atrapalhado pela horizontal que haviam enfiado no ar re vara de made’ el que cle carre @ no pescogo. Os me seuntes afastaram-se para acom panhar as peripécias de sua corrida; nenhum dos comerciantes fez 0 menor gesto, Zanatzin podia gritar 4 vontade: ele sabia ‘adores © 05 muito bem que dentro do mercado ninguém tinha o direito de deter um escrave em fuga, O jovem saltou como uma flecha ¢, exausto, passou pela porta ¢ colocou, triunfante, o pé sobre um excremento que frente da entrs fugitivo fez a seguinte declaragie, num tom solene: ¢ encomtrava, por sorte, na a. A rmultidao estava exultante, Frente aos Purificadores, agin, Augurios y Atusiones, México, UNAM, 1 23, Sahagdn (1977), 4 1H, p. 202; Informanies de 3 vo e fugi das méos de meu senhor, como um passaro da gaiola, Pisei nesta merda como era necessatio, ¢ venhho a vés para que me purifiqueis ¢ quebreis meu cativeiro.” Entio os Purificadores retiraram o ancl infamante, despiranyne c la- n-no da cabeca aos pés. Vestido com roupas novas, foi reapresenta- do a seu antigo senhor que o honrou ¢ © acolheu em sua casa como um homem livre. Come lembranga de sua incrivel corrida, foi chamado de Agil®*. O antigo escravo, que se sentia bem na companhia de Zanavin, neceu na casa do mercador, Tornawse até seu homem de confian- uxiliando-0 na organiza¢io dos pacotes ¢ fazendo as compras nece: jas para o andamento dos negécios. Tais eneargos no consumiam todo o tempo daquele homem répide ¢ esperto. Podia entio dedicarse a mil jogos nos quais brilhava. Sabia dancar maravilhosamente, com os bracos estendidos para a frente, carregando bracadas de rosas e de plu- mas, em cima de um terceiro homem. Podia também pegar um pedaco de pau com os pés e fazer malabarismos e dar saktos que provocavam a admi cio dos transcuntes. Ou ainda, subir ao topo do mastro, dangar ¢ tocar tamborim, para, no final, descer com seus companhe pelos pés, girando em torno do poste como pi nh montado nos ombros de um companheiro que, por sua vez, estava ros, amarrados cipava de todas as festas ¢, de toda a cidade, Yaotl gostava de ver Agil fazer malabarismos € contoreerse, sem nunea perder o equilibrio. Um dia, 0 antigo escravo contou-lhe como havia perdido sua liberdade: depois de uma époea de fome, seus pais, na misér i ta. Desde que estava livre de novo nao tinha mais voltado para yé-los ignorava até se ainda estavam vivos. Por outro lado, ausentavasse bastan- ava is dividas m de vol a, venderam-no para ps € no o comp: te, sob pretexto de fazer uma comp com feijées ou para freqitentar as prostinutas, sem © conhecimento de seu protetor. Toleravam scus desvios devido 4 humildade de sua condicao. A purificagao que reeebera havin retirado a macula da escrav Zanatzin, pa a para jogar dados avi io, mas seu coragio nfo era mais to verde ¢ Guardava ainda um pouco daquela qu terizava as pessoas de ba fo frie quanto o dos homens livres. idade quente ¢ cozida qu carac- 24. Laper Austin (1980), 11 p. 403, 25, Sahagia (1077), 1, p. 28; Diar del Castflo (1908), (1, 26, Sobre 03 jogos de amare para terandlises peneirantes sobie a cultsra dos nahwias, Ghrisian Duvernges, pt tj ois 1978; Lapez Austin (1990), b 1, pe 255, ques, Baris, Mouton 5 HISTORIA Da NOVO MUNDO Outro dia, um wemor, como aqueles que sacudiam regularmente a cidade de México-Tenochtitlin e que talvez em breve destrt do, espalhou o panice na casa de de pernas para oar, Depois a calma voltou, ninguém fora ferido, mas uns objetos haviam sido quebrados. Com gestos sempre rapidos, Agil come- iam o mun- anawzin, Em um instante ude fico gona colhen pacotes € sacolas, encontrou as pedras de jade que tinham sido derrubadas no chao ¢ perceben, num canto, um pedregulho escuro cuyja rusticidade chamou a sua atengio, Nunca vira nenhum objeto semelhante rrumar as coisas de seu protetor que © terremoto espalhara. Re- ¢ isso desperton sua curiosidade, Talvez tenha vinde a vontade de guarda- Jo para si, e cle o subtrain na confusio geral Os dias passaram. Zanatzin parceia nao estar preoctipado com a pedra, caso ainda se lembrasse dela, Agil esqueceu seu pequeno furto & continuou correndo pela cidade, como de costume. Depois, ausentou-se durante alguns dias. De alegre que era, tornowse taciturno. Corren o rumor de que estaria se embebedando com pessoas infames que The te- riam dado bebidas que o fizeram perder a raao, que teria abusada dos cogumelos divinos. 7 ta estava desonrando, Algum tempo depois, o mercador soube por um Agil tinha chegado as terras quentes dos huastecas no Nor s mulheres so elegantes ¢ os homens sem pudor. Ti A beira do Mar Imenso (0 golfo do México). atvin fechowlhe a porta da casa, que sta condu- ham isto o rapaz em Tochp: ‘Temendo ser encontrado pelo coletor de impostos de México, que esta- a circulando pe ras, ele fugiu numa embarcacio pressas © sumiu para sempre no mar. Na praia, perto da foz do rio ama- relado que arrastava cipds ¢ orquideas, os tiltimos vestigios de Agil foram apagados. Restava apenas uma pedra preta ¢ o barulho das ondas que tinham encoberto 0 som das conchas amassadas por seus passos. Que loucuira langarse ao mar quando todos subem que no horizonte tudo esta fechado € que a linha das aguas verdes ergue sua barreira liquida que carrega os Nove Céus de Cima. Até mesmo os gigantes que quiseram atin- arn ultrapassar a “Agd “Y redonde pricada gir o sol munca consegt Maravilhosa OS RITUAIS DA CHUVA O jovem Yaotl foi com sua familia para a festa de Toxcatl dada em honra a Tezeatlipoca, divindade ce pedra preta ¢ Iuminosa, enfeitada de 27. Sahagsin (1977), 0, pp. 1194181 55 ouro, jade ¢ plumas coloridas. O deus todo-poderoso ¢ onisciente esta 1a, A sua frente. Tezeatlipoca twaz querda seu espelho reluzente ¢ polido em que o mundo se reflete, Com a mio direita segura quatro fle- chas que lembram o castigo que reserva aqueles que tranggridem a ordem das coisas, A morada de Tezcatlipoca ergue-se no topo de um santudrio com oitenta degraus de altura, por tris de um muro, escondido do olhar da multidio, Mas a pera preta que foi retirada para esta oportunidade esti hoje exposta aos olhos de todos. Ela rei nante, na fren altar de pedra enfeitaco com tecidos preciosos, de cores refinadas, De repent ido de uma pequena flauta de terracota, A alli cdo atinge todos aqueles que a escutam. Suas Kigrimas suplicam 4 escuri do da noite e a6 vento que nao os abandonem nem que acabem corn suas na mio lo. na, vidas ¢ com os sofrimentos que suportam. Enquanto isso, os sacerdotes vestiram a divindade viva que esti para ser sacrificada com Tezeatlipoea. Depois, pux: povo, Zanatzin ¢ os seus nao enxergam mais, nessa aparigio maravilhosa, insignias cle m a cortina do aposento para mostrila a0 mesmo tempo alimento divine ¢ divindade de carne € osso, aquele que outrora fora seu semelhante™. Celebrada para fazer a chuva cair do céu, a festa de Toxeatl dura dez ai atlipoca-pedra preta descen até uma plataforma nos degraus mais baixos, Os “doadores” = assim chamamse os jovens que estio apren- dendo a fazer oferendas ~ trazem entio colares de espiga de milho, que colocam no pescoco dos nobres, distribuindo-Thes também rosas, Depois, os jovens levantam a plataforma onde est colocado o Tezcatlipoca de pedra pret gam-no em procissio em volta do pati divindade est quideas e de giras ae ca feit da com centenas de flores, de s sabiamente arrumados, cujo perfume e frescor alegram os coragées. Quando termina o passeio ritual, levam-na de volta para o santuirio onde ela se ergue entre rosas. Chega a s oferendas. Qs mais pobres dio pombas. O dor arranea a cabega dos passaros ¢ os lanca ao pé do altar, onde eles se esvaziam de seu sangne, Outros trazem frutas, alimentos, segun- ven sacrifica do as recursos de cada um. Quando todas essas oferendas forem consa- gradas, as pessoas voltam para casa a dedicadas 4 divindade preparam uma va vados aos dignitirios ¢ aos grandes sacerdotes, Quando o alimento divi- no foi consumido, a festa recomeca para que sc proceda ao sacrificio do deus vivo, o escravo magnifico que sobe um a um, com uma lenticio n de comer, enquanto as javens jedade infinita de pratos reser- 28, Duin (1967), 101, pp. S74 56 JSTORIA Da NOVO MUNRO ificadores imobilizam scus pés ¢ suas mios; o corpo do homem-deus assim oferccido alha para pensada, os degraus que o separam do altar. Os wor abre seu eTLO & © cén ¢, depois, com um gesto preciso € rotineiro, 0 peito com uma faca de obsidiana, mergulh: arranca o coragio ainda palpitante, que oferece ao Sol, O costume reza que um s6 cativo s Contudo, # cada quatro anos, acrescentam,se outros e seu. re pelos degraus da escada de pedra. Ha aS méos no torso 4 a sacrificado nessa solenidade. gure esc gum tempo, as oferendas hu- Ianas que um costume imemorial exige aumentaram consideravelmen- tee, para a festa de Huitzilopochtli, o Senhor da Guerra, o ntimero de Jo grande que os sacordotes revezam-se com fervor durante horas, enquanto o cheire do sanguc fresco, mesclado ds mavens de incen- so ¢ a perfume dos macos de flores, inebria o pitblico. O ritual reine uma multidio imensa ¢ é acompanhado por imtimeras dancas ¢ cantos que milhares de jove incansavelmente, Essa profusio de rao movimento do cosmos e do tempo. to conhe vitimas é stinttosamente vestidos, executam, s reprocuz na superficie da ter- les exigem tanta energia, tan- mento, tantas sibias preparagdcs ¢ tantos recursos m que nao se diferencia mais a celebragio do trabalho cotidiano, Além disso, tudo na terra é s6 trabalho ¢ ritual, ¢ 6 bom que seja iménias divul nfase ¢ uma crucldade pensa- co-Tenochtitkin aos olhos das cidades ns da nobre: ma m corn um stivel poder de Méx vencidas, Mas, além de tudo, expressam a preocupacio © a convicgao de que todos tém de tomar parte na marcha do cosmos, que & possivel, se- gundo as cireunstine’ as, acelerar 0! tornar mais lenta: passos infinitamen- , frenesi ininterrup- as loucas dos doadores tc lentos do cative que sobe os deg to dos dancarinos com plumas mult ou das futuras vitimas pelo vale®. ‘aus do santua ‘olores, cor} © “LUGAR SEM PO, SEA SUJEIRAT Aos doze anos Yaoll, o filho de Zanauzin, & colégio religioso reservadlo aos filhos clas fumilias nobres. Esse privilégio Ihe fora concedido em razio da virtude ¢ da fortuna de seu pai. No en- aceito no calmecac, um tanto, 0 menine sabe muito bem que, mesmo com o prestigio de sua fa- milia, nunca pertencera a nobreza dos pipiltins, Seu destino € scr um mercador pochteea, Um dia, ele tera de pegar a estrada c arriscar sua vida 39. Legros (1985p. ANTES DA INVASLO. 7 para a gloria do Grande Senhor. Antes da separagio, scu pai repetiuthe 6s conselhos costumeiros. “Vore nasceu, voce viveu ¢ voc’ esta se exerci- tando para levantar voo." Falowlhe num tom grave, cnumerando as ten- tacées que deveria cvitar ¢ as oportunidades de ser virtuoso, Conversou com ele por muito tempo, orgulhoso de vé-lo conviver com os filhos $ senhores. “Vocé possi olhos, vocé possui ouvides”, disse, aludindo a sua “Viva corretamente™, 15 que foram aceitos no eahnecac. gas estuda em outras escoias, separads s distingdes, é por- es cidade: is dos poderasos dos quais néio aprenderio os valores nem 9 que os nobres de México-Tenochtitlin ¢ das grand légios e seu poder: de seu meio reiras ¢ os Grandes Sacerdotes das [orcas superiores ¢ das enti zelam cui- dadosamente de s em os guel que animam o universo ¢ re scparagio entre os grupos impde-se como a noite sucede ao dia. Se os “Filhos das Gentes”, os pipildins, dirigem tanto as cid citos ¢ captam a maior parte do tributo extorquide dos povos dominados, nao seria por que possuem uma forca vital, um tonalli, mais forte do que a dos mortais comuns? Ainda precisam saber manté-lo ¢ aumentéclo sem cessar, Primeiro consumindo com discernimento os objetos de luxe que 08 mercadores pochteces fornecem, as plumas de passaro, as pedras raras, as roupas bordadas que concorrem para seu bem-estar. O perfume revigorante das flores - um acessério masculino por exceléncia ~ é pa ticularmente apreciado pelos senhorcs que andam por todo lade com um maco delas na mio. O cacau, uma bebida cobicada ¢ prestigiosa, a care ne dos animais selvagens ¢ as drogas alucindgenas ocultam propriedades cles quanto os exé tio maravilhosas que sio de uso exclusiva dos dirigentes*. Mas é sobretudo a educagio religiosa que contribui sas qualidades nos pipiltins. Como todos sabem, tudo © que no é perf formar cs to é condenayel. Conscientes de estarem destinados a ocupar altos cargos, os jovens dedi melhor merecé-los, fortalecendo seu tenalli pessoal do qual vira sua aptidio para governar 0 povo. No ethnecac, 0 “Lugar sem mas, da T am-se Sujeira, sem P6", mas também a “Casa das Lagr teza”, cles se castos, em dominar seus desejc veis. Durante esforgam em obedecer, em permanec des dos guardides veners nos, os filhos ela em memorizar as da nobreza jejuam, levantam no meio da noite, sangram suas 01 , stias in, Hilueacisn Meaica, Antofogi de Texios Suhaguntines, Ménies, UNAM, 1983, p. 89 ¢ 80, Alfiede Léiped Au passin, 81, Leper Austin (980), 1.1, po 38 HISTORIA DO NOVO MUNDO costelas © suas pernas com espinhos de maguey on com ossos afiados. Dia apés dia, economizando sobre scu tempo de sono, eles se exercitam na leitura dos destinos ¢ na contagem dos anos, na interpretacio dos sonhos, alar bem é tio importante nessas saciedades, que sio mundos da palavra, onde os discursos niio aca- bam mais, que o detentor do poder supremo tem o titulo de hey tlatoani, 0 Grande Orador, Os disefpulos repetem os “cantos divinos” sob 0 controle na arte de falar bem ¢ de dizer coisas certas, impiedoso dos mestres, que, auxiliades pelo anciio, desdobram diante dos olhos dos pupilos as pinturas dobradas em leque cm que se ve a esséncia das coisas, O bustio do mestre aponta para as figuras multicoloridas, as vezes manchadas de sangue humano, ¢ os alunos identificam umas apés as outras as formas divinas, sabendo que estas so pa lobran, de se fracionar, de sofrer toda sorte de metamorfose, de estilhagamento e de mutilacao, ou de receber nomes secretos e mutantes*, siveis de se des AS ORIC SDA TERRA E DO TEMPO Entio, qual é esse saber que garante Aquele que © possui poder e cha rividéncia? O conhecimento das origens ¢ do tempo. Os discursos do mestre desvendam aos jovens 0 conteddo das “pinturas”, ¢ 0 jovem Yaotl, us colegas, fica sabendo qu em das coisas as divin- cereado por s na orig dades nao faziam nada, Esse 6 veram mover-se criando o fogo, um mei Ther e instituir: clas resol- nO homem e€ a mus io durou sciscentos anos. E1 paso, ¢ n © trabalho; fizeram os dias e com te dessas unidades formaram os meses, ¢ com dezoito desses meses constituiram anos de te- zentos ¢ sessenta dias; fizeram a agua, fizeram descer do céu uma deusa, Cipactli, a Senhora da Terra, ¢ a colocaram na dgua, Cipaetli tina a apa- réncia de um jacaré, era coberta de olhos ¢ de bocas, ¢ mordia como um animal selvagem. Depois, as divindades que a tinham feito baixar se t formaram em serpentes ¢ a partiram em dois. Com um dos pedacos f vam a terra ¢ levaram a outra metade para 0 céu™, Para impedir que as partes desmembradas de ¢ reunissem, as divindades que a violentaram ergueram quatro arvores para sustentar a abobada celeste. O afastamento assim mantido perm io das forgas di ns ia. a cireulaca daquele momento, em com- pensacio ao atentado que sofrera, a Terra produziria todos os alimentos was entre o céu€ a te a. A partis 2. Loper Austin (1985), pp. 99, 55, 67. 8, Tingomie Historia de lox Mesicanay, eit. por de Ma Garibay Ky México, Porriia, 197%, p. 108, ANTES DA INVASAO, so de que os homens precisariam; de seus cabclos sairam as arvores, as {lo- res € 0 verde; seus olhos inumeraveis tornaram-se rios e grutas imen enquanto seu nariz deu origem as montanhas ¢ aos Vales, Mas as vezes a com coragées huma- 4 scus frutos se for regada com o sangue dos homens. Jos dos colégios calmecacs, os alune Terra chora de noite, Ela 56 cala quando satisfei nos ¢ Nos pitios sombr. compa: nham a partir das “pinwas” as peripécias da origem do mundo ¢ des seres que os ancifios explicam, Aplicam-se em fixar na memoria as formas © as cores que cobrem as folhas desdobradas. Contemplam com venera- co a imagem de Cipacili, o monstre da Terra, que tem as vezes rosto de homem, outras, de muther, Q mundo sensivel que os cerca, os tis ¢ as plantas, os minerais, os menores acidentes do relevo, os objetos sho, entio, as emanacées do corpo dessa deusa, como sc todos vivessem imersos na natureza divina, numa continuidade perfeita que somente as thas da percepgao humana nao permitem perceber cle wna 6 vez, Eis io, quando partem na noite gelada para escalar a montanha , jovens ¢ velhos podem al por que razi gar passagens perigosas que penité ligam © mundo dos homens ao dos seres primordial ‘© 0S espacos humanos ¢ extra-humanos, entre as coisas, os animais, as plantas, os ho- mens e as forgas superiores, abrem-se corredores misteriosos, entrelacam- En se trocas incessantes, operam-se fluxos e metamorfoses que mesclam inextricavelmente os clementos do cosmos", A narrativa divina também explica a origem do tempo. O tempo foi a des do a de- as coisas, ¢ como toda criado como toda saparccer, Na superficie da terra, na juncio das forcas que descem do céu ¢ das que sobem das profundezas, surgi o tempo dos homens, o tempo de todo dia. Entretanto, dois outros tempos o antecederam: um, vazio, de antes do comego, quando os deuses estavam mergulhados na inagao; outro, nascido no bajo das violagdes, dos conflitos ¢ dos assassinatos que pontilharam a cr Este segundo tempo é crucial: cle condiciona aquele que transcorre na superficie da terra enue os homens; determina a substincia dos acontecimentos que acao dos seres animados ¢ inanimados. compéem nosso tempo humano. Assim, sobre cada instante que passa aqui, pesa um feixe infinita- mente complexo de forgas. Sio identifieadas pela marca de um signo (de 1 a 20) ¢ de um namere (de 1 a 13) que oferecem duzentas ¢ sessenta combinacées possiveis, ¢ que sio intcrpretados segundo sua posicio den- tro de treze dias, de um més, de um ano. Segue-se que so cabo de um 3H. Lopee Austin (1980), 11, pp. AL1-112; Ledm-Portilla (1985), pp. £90206. “ HISTORIA DO NOVO MUNDO espaco de tempo consideravel, todas as combinagdes podem repetirse de forma idéntiea, ¢ a hist6ria pode acontecer de novo, ponto por ponto. A grande engrenagem ciclica dos tempos, cujos eixos sio as ‘irvorescolu- nas helicoidais que retinem o céu e o inframundo, fornece entio uma das chaves di Jo do universe. compreen Depois, o cnsino continua, sem deixar nenhum descanso aos jovens, E a vor do mestre explica incansavelmente os mistérios da harmonia do balhar p s foreas césmicas, explorar ¢ submeter aquelas que o favorecem, escapar das energias ne- fastas que o podem agredir ¢ destruir, Todo tempo livre, nao controlado, 0 do escravo ou © do servidor que foge as obrigacos mulher ne- controla mundo: todo homem deve tr 3 gligente ou leviana, leva a perda do transgressor. Agil s6 poderia encon- trar a mor Mas é preciso seguir nas ondas da agua maravilho: marcha do tempo e reconhecer os ciclos que regulam a irrupeao das forgas. Para chegar a isso, ¢ medir 0 tempo das criag segundo a medida do tempo humano, os Grandes Sacerdotes claboraram ctlendarios sofisticados que encerram a vida cotidiana numa rede de priticas ¢ de rituais que repetem em cimentos criadores, Assim, as grandes festas sio celebradas no ritmo do calendirio de trczentas ¢ sessenta dias (dezoito meses de vinte dias) aos 1m mais cinco, enquanto o ealend di ninos sio iniciacos dessa forma darios, e também na decifracio dos Ihes 43 Ja humana os aconte- ioc torio de quais se acr se duzentos ¢ sessent s destila sua prdpria escansio do tempo. Os me- nos mistérios dos ntimeros ¢ dos calen- sonhos ¢ dos signes, percept o triviais quanto um coelho que entra numa ca isem det um coiote que € encontrado na estrada, o som de um machado na noit augtirios, na maioria inquietantes, que é preciso interpreti-los 2 tempo para amenizar suas conseqiiéncias, Ora, hi varios dias, 0 calmecac esta se imterrogando: barulhos, gritos estranhos, aranhas vermelhas ¢ rugidos distantes turvam a tranqiilidade ‘antos dos mestres ¢ dos alunos, Naquela noite, Yaot! ¢ seus companheiros ob- serva 1 com estupor wm cometa atravessando o eéu, Citlalin popoce, Cabelcira de Fogo, Flecha de Luz. Eo Grande Sacerdote anunciou: “A se mexer”, querendo dizer com isto que ". Os camponeses exelamaram desolados: “S lembranga permanente do que deve acontecer ¢ de encarar o futuro como uma realizagaio funes- piritos estavam sempre prontos para o pior™. gua co Braseiro divinos v a ivia estou uma guer i nossa fome, sera nassa . De tanto viverem r ia, os e 05 (1980) ANTES DA INvASLO. 61 SUANAJIANT® Periodicamente os furaces devastam Guanahani, uma ilhota insta- Jada em torno de wma laguna, protegicla do alto-mar por recifes de co- wudindo « estrutura dos bohios, imediatamente reconstruidos por uma multidio de bragos que trabatham como as abelhas de uma col- méia. E um pedacinho de terra, um clo de um arquipélago que contém uma dezena de outras ilhas, entre as quais as canoas ¢ as pirogas cireu- ‘ais, sa lam facilmente. Algu qiienta homens, ¢ outras contém apenas um remador ¢ singram o mar como a flecha corta 0 ar. Pois os homens no temem o alto-mar, que eles iques de Cuba e de Quiz- to das nas delas sto grandes, capaze: de suportar uns cin percorrem até o sul, li onde os grandes queya-Aiti, auxiliados por seus ancest plantas, o sol ea chuva ¢ até o parto. Naquel: mens vivem ¢ trabalham, ¢ a auitoridade dos chefes é medida pelo ntime- ‘ais, controlum o crescime! s ilhas meridion s, 08 how ro de s tbem transforn s naborias, servidores que como as frutas amargas que colhem nas florestas para aprimorar des costumeir E bom yiver em Guanahani, ainda que ataques surpress dos vizinhos sejam sempre temidos. O solo ¢ plano ¢ sempre verde, ¢ 0s homens cons- trujram colinas artifieiais sobre as quais cresce a mandioca, da doce e da doce, o milho, om: amarga, a b: frutos, as conchas ¢ os peixes que o ma inteiro. Quando o casih ( He) convoca seu povo para festins em homenagem a seus ancesteais, 0 alimento parece inesgotaivel. © corpo, quase nu, respira ¢ se mexe em liberdade, N culares amontoamse pacotes de algodiio, com o qual os homens te redes ¢ sacos além dos preciosos easulos ancestrais, aqueles que guardam nhagem. © pove d © 6 algadio, Isso sem contar os gencroso fornece durante 0 ano rea s cas a forga contida nos osses dos mortos de alta s ilhas. venera os recep nitamente mais fe tes do que os homens. Os zemes Jiculos © teme os zemes, que sio in alam. Eles se deslocam, mesmo se os m seguré-los com cordas; uns fazem chover ou ventar, -scerem. Sabe-se como ap homens tentar outros fazem as pl a ira consi grando-Ihes oferendas apropriadas ¢ escutando a voz dos Homens de Poder que viajam até cles gracas ao tabaco ¢ aos jejuns prolongados de seis ou sete dias que os mergulham em éxtase, Os mortos normais bém sio inquietantes, pois seus zemes gostam de deixar sua morad anoitecer, para comer goiabas ¢ seduzir as jovens. Das Cr acar su Bahantas, a HISTORIA DO XOVO MUNDO O cacique possui a sabedoria ligada a sua idade e a sua funcie. Em Guanahani, como nas outras ilhas, a etiqueta & obrigatéria. Durante as grandes ccriménias piiblicas das quais o cacique tem a iniciativa, ele flea sentaco em seu tron ¢ acompanha com o tambor os cantos € as dancas recitam stat genealogia. E em frente A sua casa que de seus stiditos, q 0s guerreires exercitam-se no jogo da pelota, o datey, que as autoridades observam sentadas sobre cadeiras de aparato com esculturas complicadas, feitas com uma variedade do ébano, E também o cacique que possui as pedras de irés pontas que sio colocadas nos ¢2 d dar as parturientes, O bohite, “Aquele que Ve", aprendeu a falar com os ancestrais gr gas as vertigens que Ihe daa fumaga do tbaco, que cle inala de noite, A luz das tochas. Se 0 cacique age sobre a ordem do mundo, devido 20 poder dos mortos de sua linhagem, cle, 0 visiondrio, tem 0 eneargo de mpos na hora da semea- fades, ¢ mas a, A beira dos rios, par 1 aplacar as tempe as, patra ajn- proteger os homens, de cuidar dos doentes, de prever 0 resultado dos comb: Mas, mesmo com a quietude da noite ¢ a cama que reina nas grandes cabanas, 0 bohity est preocupado, Na noite anterior, sua sobri- nha tivera um sonho tranho que inquictou seu espirito. Ela viu-se gré- ava chato; de repente as dores chegaram € cla se colocou de edcoras, mas de seu sexo cai no wna erianga mas sim um ovo de pedra, preto € dourada, que se quebrou em mil pedagos. A jovem vida, mas seu ventre e ‘esta sonh do no findo de sua rece ¢ Aquele que Sabe percebe um pre ) sombrio que cle nao consegue decifrar Foi para a praia, pois nao conseguia adormecer. A das horizonte, cle percebe um ponte de luz, m Asondas do mar d noturna No especificamente um lume. neam e impedem sua visio. O reflexo, tio ténue que cio, volta a aparecer, para novamente desapa A luz demais para vi de un O Homem de s da noite se enche de incerteza. acaricia a cabel palmeiras a arcia esta fresea sob seus p cele acredita ter sonh alia de uma dem piroga € baixa aber nao sabe mais e de repente a ca iJe fica 1a, esperando, depois volta para sina catba no abismo do sono. No dia seguinte, quando o sol dis- solve a escuridao, dando a 1 da retomada da alga ra, os pescadores clio um grito de espanto. A sua frente, sobre o ma a estrel ars rde reflexos turquesa, tés pirogas de tamanho mons cem colinas flutaantes do que embareagécs, invadiram a baia. Quando s desajeitados em roupas ridiculas desembarcam na praia, derreten- 80, que mais pare- do de suor ¢ espalhando tm cheiro azedo quase tio inebriante quanto o dos cadaveres veneriveis mas assus! adores, © povo da ilha correu para DA INVASLO a8 oferecer-Ihes presentes para que desaparecesscm 0 mais rapido possivel. S6 o Homem de Saber sabe agora que o sonho nao mentira ¢ que mulheres 1 ‘36. Pané (1977); Sawer (1984); Arrom (1975); DreyfueGamelon (1980-198 1) A visita ao continente, antes da Invasi er wort, aind tanbas de gelo, Mas nacuucas costa, en: TerraNove, ne Labrador ou no lendirio Vinland, fe rm Jos, grandes Ioivos, vindos do _ deveria prosseguir pelas tertas da Norte do México, pelas des planicies, pelas montankias que hoje fazem parte dos Estados Unidos ¢ da Canada, Mais a0. onde as vezes se ditigem me aleangastamos as costas banhadas por mates frlos, pata séculos, os indigenas no tinham visto desembarear seres desconheci ento do elima durante a sécato XIV diminuits as come: Leste, da Groenlindla? Sem diivida, © resi Inieagbes no Atlantica norte. Mas é possivel que, por volta de 1473, uima expedico enviads pelo rei dda Dinamarcs tens atingido as iguas do Sie Lourenge e que marinheiros de Bristol, na mesma €poe, tenham ehegado 4 terra firme. No entanto, eccex contatos, embora foscem mais continuos © mais fre ma forma de uma im io e de uma conquista, Para un qiientes do. que pensamos, munca tom hafanco dos contains pié-hispinicos entre vikings © amerindios, vejam Riley, Keiley, Penningt Rands (1971); Crosby (1986), pp. 41-69, 1492 Don Fomanto © fatel subracteram seus catversrion sapss ter vencide es canarines, qurimaren ruitos sedomitas se expuescrans lvuel De Crarvada brinnfaran: governarim bem a Kipankin: sncantravae fens mune vistos ole Freanga eves suas canquisias Nedpotes etomararm Post Heexasno- ot, Pe buides a 1492, D. se de todos os perigos, a histéria reteve principalmente o dia 12 de outubro, da “desco- berta da América” por Crist6vaio Colombo. No entanto, esta fa . que este ano decisive, ane de todas as parti no inicio era apenas a aventurs de um punhado de marinheiros, no teve aos olhos dos contemporincos a importancia que a historia Ihe deu mais tarde. O acontecimento mais significative ocorreu alguns meses antes da Pp: das earavelas do Almirante em dire¢io aos reinos de Catai e de Cipango, outrora descritos por Marco Polo. Apés setecentos ¢ setenta anos de presen¢a muculmana em solo ibérico, os Reis Catélicos conquis: HISTORIA DO NOVO AUNDO tavam pe Granada. E: 8 imo reduto dos mouros na Espanha, o reino de ta rendicao colocava um ponto final na campanha condi com ardor por Fernando c Isabel desde 1481; a partir daquele momen- to, @ espantosa diversidade cultural e lingitistica da Espana deveria se dobrar Aquilo que substituiria a identidade nacional, ou seja, 0 catolicis- mo tin! A queda de Granada aconteceu no dia 2 de janciro, no final das festas de yannayrque coincidiam com aquelas que os cristios celebra "Va ‘ante. am entre o Natal c 0 Ano Novo. Naquele fatidico ano de 1492, 0s festejos uadicionais dos mouros, fruto de um Tonge convivio pacifico com os ¢a- t6licos, tinkam perdido sua animacae ¢ sta exuberincia costumeiras. Nao sabemos se os casais que se uniram em matriménio naquele dia, obede- cendo a um costume ancestral, acreditaram realmente que os auspicios Ihes cram favoriiveis. Por causa do rigor do cerco, as bancas de frutas cristalizadas ¢ de pies em forma de cidade que alegravam as vielas nou- tres tempos, por o¥ , bastante pobres. © que dizer das trocas de presentes entre vizinhos ¢ parentes, que pro- vocavam regularmente a reprova¢io dos wlemis, inimigos das priiticas hibridas ¢, logo, impuras? Teriam as pessoas coragem de se alegrar e de ofrecer aos poctcrosos elogios em verso?! E muito provavel que as elites pl disso, a tos prodi quele século, como nao pereeber, « posteriori, a sombra da fatalidade no terremoto de 1431, que sacudiu as fundagdes de Granada e que derrubou as parcdes do Alhambra?" Mohamed XI, conhecido como Boabdil, jamais conseguin restaurar Tha", a mais bela joia do Ocidente*, Mesmo arruinado, o Alhambra era de uma riquc ede um refina mento dinicos, Contrariamente aos castelos castclhanos, fortalezas som br a beleza da vida, integrando em sua arquitetara labirintica o esplendor das neves eternas do macico da jo desta festa estavam, sem dtivida sentissem que os granadinos viviam catastrofe havia sido anunc ‘cos irreversiveis. Al s de alerta, Dentre tan- m da por sin ios ocorridos n “cidade verme- eau 1. La Granja (1969), pp. 35864 reglan esmeradamente, Hay gentes que permiten a sus familiares comer de ellos y otros ve Lo una desposada subida en au etrado tr ‘que comen una parte de aquello y venden el resto" 4 ricos montan en sts casas puestos como el de los tenderus y fos dela cual no ce cerraran fas pucttas, Los Alons» Bartantes Maldonado citade por Torres Bulls (1951), ps 188: “En este tiempo temibio la tier cen cl real del Rey yen Granada se cayé parte de la Alhambra J fué tan grande este vemblor y ta tas vezes qite no avin memoria de gertes que urieren vito cosa semefanie™ Monetatins (1920), p47: Nimile eredo in tota Europa non ese, Omnia adeo magnifice, adeo super addeo exquisite erant facta de varia genere, ut paradisumy erederes” 1492 67 Sierra Nevada, os jogos de Inz inteligentemente filtrada, o murmiirio das fontes, o brilho dos espelhos d"gua, os perfumes dos jardins e o farfalhar das arvores na brisa, No Alhambra, nada de retratos ou de estitnas dos soberanos dos tempos passados para decorar os interiores. A palavra de Deus era o bastante, espalhada em arabescos na brancura dos muros, «al- ternando com poemas escritos em bela caligrafia em honra dos emires. O palicio erguia-se na mais alta das trés colinas que compunham o sitio de Granada. Em frente, do outro lado do Darro, ficavam os bairros do Alca- zaba e do Albaicin, com suas vielas ingremes onde o cheiro da fritura fun- dia-se ao aroma dos jasmins, Desde que a guerra comegs ra, OS campone- m-se neles. ses das redondezas amontoavi 1492 marca em primeiro lugar o fim da reconquista da Espanha pelos cristios. S6 mais tarde a data sera associada 4 descoberta do Novo Mundo. Para medir o peso da questio mugulmana, basta lembrar 0 con- texto mediterrance no qual se inscreve a guerra de Granada: o avango otomano que fornecera 0 pano de fundo lancinante da expat marina. Quando, no dia 28 de julho de 1480, os turcos invadiram Otr io ultr: ne to, na costa do mar Adridtico da Itilia, degolando ¢ empalando todos os seus habitantes com excegio dos jovens de ambos os sexos, a ameaga que faziam pairar sobre a cristandade desde a tomada de Constantinopla em 1453 tornau-se mais presente ¢ mais angustiante, O rei de Napoles, pri mo de Fernando de Aragio, solicitou com insisténci: \juda das fore cristis porque “Mahomet Bey tinha em mente nao s6 erradicar a religiio cris mas também exterminar todos os principes que cram seus defen- sores ¢ reduzir os italianos a escravidiio"! Frente a esse perigo, Fernando ¢ Isabel reagiram com prontidio em na Italia, para onde foi enyiada uma frota de vinte € cinco navios comandada por Pedro de Cadis, “o Bode" (mache cabrio), ¢ na pro- pria peninsula, onde os muculmanos de Granada, por sua posi¢io estra- duas frentes tégica, tornavam-se a “quinta colina” do Grio-turco’. Dessa forma, os saberanos de Castela e de Aragko viram-se investides por uma dupla missdo: de um lado, punham fim 4 ocupagio secular dos mouros ¢ con- solidavam a unidade de Castela ¢ de Aragio; de outro, erguiam-se como uma muralha da cristandade abalada em seus fundamentos. A sorte do reino de Granada foi entio selada em 1481, 4. Palencia (1973) yhexti 5. ME, p81 nazande a Hos italiano: todos con el eantiverion Década vol. 1, fio 1, pp. 88: “am cin cle la religién eatslica" as HISTORIA DO Novo MUNDO CRISTAOS E MUGULMANOS ANTES DE 1481 Ha mais de dois séculos as pequenas guerras entre mugulmanos ¢ cristos cram costumcizas, como o cram as uréguas mais ou menos longas, 68 contatos ¢ 116 trocas de toda sorte, A decadéncia politica dos reinos islimicos de Espana comegou no dia seguinte a vitéria cristi de Las Navas de Tolosa, em 1212. Na segunda metade de século XIV, Fernando ILI, “o Santo”, conquistara a Andaluzia, centro do isi peninsular, com excecio mugtilmano em territério cristio, da zona oriental de Granada. Encla esse pequena reino vixeu uma expansio efémera durante o reinado de Mohamed V, construter do Alhambra. Com sua morte, a fu ridas naufragou em intrigas dinasticas ¢ em conflitos religiosos. De sua gléria pa rie de viver © um prestigio liter: rio que, para além das fronteiras culturais ¢ religiosas, influenciaram pro- fundamente a Castela do séeulo XV". da, conservou apenas uma Sob o reinado de Henrique WV, “o Impotente”, meio-irmio de Isabel, o dnimo dos combatentes cristaos abrandou-se, sensivelmente, por uma boa razdo: rumores acusavam o rei de Castela de cercar-se de jovens mottros com os quais se entregava a “torpezas"; e, 0 que era mais grave, acusavam o soberano de ter adotade os costumes de seus amados ¢ cor- ria o boato de que teria abragado a religiao muculmana’. Henrique IV gostava de montar gineta, ou seja, com os estribos bem curtos, 6 que cra contrario aos usos castelhanos; apreciava os alimentos dos inficis, os figos, as uvas passas, o Icite ¢ © mel que o rei de Granada en ele saboreava sentado no chio, 4 moda dos maometanos’. Em $ java c que palacio do Aledzar, a estatua do rei vestide & moda “sarracena” pareci estar provocanda a de dom Rodrigo, 0 tiltimo rei visigodo, por culpa de panha para quem os dvabes passaram o estreito em 711 ¢ entraram ni: 1i ficarem durante século: ©. Vernet (1978), pp. 67-68; sobre @ reino Nasrida ver Rachel Arié (1987), 7. Pal contraido artaigados habitos de woluptuosidad en cia (1975), Dévada f, val. 1 Hiveo ti, p69: “los granadinos {...] confesaban | o com Ios motos, a euyas costumbres, trae, Tariana seeta religiosa se mostraba tan aficionado que a todo lo complete dle Vida ¥ haste 4 smteponia”, 8, Palencia (1075), il, pp. Le 1: marchas, pesos previamente de acuertlo con su escolta de ees motos, salianle al encuentro con higos, pasa, manteca, leche y mie, que el Rey saboreaba con deieite, sentado en fe, fino 1, pe 29 su odio a todo cult erin suelo a la usanza morisea” 9 su orden entaba represeatade en tale sarraceno, como quetiendo signifiear ez 08 O imteresse de Henrique IV pelos muculmanos certamente nao esta desvinculado da fraqueza dos ataques contra o reino de Granada antes da corongio de Fernando e de Isabel. Os combates contra os mouros eram organizados pelos senhores instalados nas regides ditas “de fronteé ra”; cram pontuais ¢ mais pareciam raids, as entradas. Como na Antigiti- dade, essas incursdes tinham por objetivo a destruigio das fortificagdes inimigas, a pilhagem, a aquisicao de cativos ¢ de reféns, ¢ a velha tatica da “terra queimada” (tala) para esfomear o adversirio", Elas davam aos Grandes honra, prestigio, gloria, e também riqueza. Entre esses aristocra- tas, a familia dos Mendoza conquistara um papel de primeiro plano, ta- Ihando um renome ¢ um poder consideraveis durante o século XV; anos depois da queda de Granada, essa dinastia estendera sua mao para além dos mares em terras que Inigo Lépez, 0 segundo marqués de Santillana, ar!!! nao podia nem imagi Diego Arias Davila, tesourciro do rei, tinha entendido muito bem que a guerra contra os mouros era um negécio lucrativo, e por isso acon- selhou a Henrique IV que empreendesse uma nova campanha contra 0s infiéis, em 1454, para aplacar a opiniae piblica e a revolta dos nobres, sempre prontos 4 insurrei¢ao contra um rei cuja fraqueza e a conduta in alimentavam as conversis ea discérdia. O soberano dete a necessidade de atae: aval aqueles por quem sentia uma atragio inegavel, mas a ambigao e as palavras envolventes de Dicgo Arias venceram suas reticéncias. A guerra justificaria uma cobranga exeepeional de impostos, repetia 6 tesoureiro, ¢ perar as custos da empresa", Masa guerra fracassou. Henrique nao con- rasassem as culturas muculmanas; com o pretexto de iropas que “respeitassem estas s novos recursos (repartimientos) deveriam su- seguia deixar que que Ihe pertenciam, ele exi de su 10, Tranzo- (1940), p. 8% “eutid en fa citylad de Jahén euando sus gentes muchos mores € moras. nifios iados en eucrdas © muchos despojes de joyas e preseas muy reas ¢ ganados, Do fig revebicto con tant grant goro © alegria como solian resgebir en Roma sus emperadores quando de sus conquistas boltian vencedores’ 11. Pulgar (1971), p. 2K, conta que o marqués de Saatillana "ize la guter puss 90 cf sugo de servidumtre e los apremic x dar en ps qual el rey experava resecbit, ni ellos jams pensaron dar. E allende del oro que dlieron les consti que saliasen todos las chtistianos que esta tan eruida a Jos moros que los ins cada ao waayor eantidadl de ato de ks cativos en tierra de moras, los quales este marqu redimig det cativerio’ 12, Os argumentas que Diego Arias apresentou forant relatados por Palencia (1975), cua erdnica € few ones de Lor ‘camente hostil a Henrique 1V: “pues tamto las querellas del pueblo como tas maguinas rales queelariat acallacas al sole apellide de la guerra contra los g parte, hasta el coste ntismia dl I tw nuevas repartimientos pervonates de ampafia podria convertirse en. gananeia si ordenaba para tal obje- ipuestos”, Déada I, vol. 1, lito Ul, p. 6 70 JASTORIA DO NOVO MUNDO Arvores frutiferas que levavam tanto tempo para tomar raiz e para cre essiio fazi A menor agi cer enquanto qu Se parece exato que durante essas campanhas os mouros evitaram todo choque com um rei que thes inspirava uma simpatia evidente, de viando de seu caminho quando viam de Ionge sua sillueta A ginet senhores chamados para o servigo das armas nao foram poupados, Assim, © cavaleiro Garcilaso de Ia Vega, parente por parte de mic dos Mendoza, foi atravessado por uma flecha envenenada em 1458; morreu em convel- a com que morressem na hora"? sdes atrozes, sob os olhos sccos de Henrique IV, que o detestava por ter vencido em combate singular um de seus favoritos mouros. Voyeurismo: mérbido mesclado de ingratidao, j que o rei entregou os troféus de guerra ¢ os titulos honorificos nao ao filho do defunto como e: 0 cédigo da nobreza, ¢ sim ao comandante Miguel Lucas de Tranzo, se- nhor de Jaén, guerreiro, grande cacador € cronista bissexto". Em nome de inte: particulares, alguns senhore ipulava dos menos importantes, formaram por vezes coalizdes com os mouros, em detrimento de outros nobres cristios. Adversirio feroz de Henrique IV e de seu pai Juan II, Rodrigo Manrique, cunhado do infeliz Gareilaso, imortalizado pelos famosos versos que seu filha Jorge Ihe consagrou, usou tropas mugulmanas para combater scus inimigos pessoas". Em 1462, Bartolomé de Marmol renegou o cristianismo e, na companhia de qua mpos andaluzos fazendo a caga aos crise tro outros hereges, rastreou os ca tos, Esses renegados mataram uns quarenta homens; arrancaram dos cadiveres a lingua, as orelhas ¢ os testiculos, antes de i > rei de Granada para reecber a recompensa por sua faganha. Devemes acreditar afirma que esses homens {a da moura de Henrique 12" na no cronista Palencia qu ziam parte da gu TA I p, Jrbores frutales 4 LH. fy tie Vy ps 108, 15, As Crinicas de foi U, conbecidas com a titulo de “alegaba et menoseabo ee to suyo [..] Exigia que al me por un tiempo respetaten los ‘unto tardan en arraigar yen crecer y tan pocoren morir con el mac ligero dao” vinicas det Hademere, publicadias por Mata Catriazo (1946), comtam a teak Gran delios tomé consigo fasta ciento cincuenta de a cavallo de los dichos motos denis de fos de su eas", 12 dos mill moros del rreyno ele ique: “E cle alli se ayunts con fa Le cortid giertos togares del dicho adelantado de Murgia.. E ele que non pudo tomar ninguna exp. CCCLXI, p. 194; sob o reinado de Henrique IW tambéns: "Ca por alguns diferengias entre Los principales caualteros de Careloua nassidas, ligironse com las Marat el conde de Cabra © Martin Alonso de Montemayor y suscaderentes:y digrontes entrada para en tierra de cristianas”, Iranzo (10), pl 16, Patencia (1975), Déeada 1, vol. 1, lito BY, p. 8, 1492 n PERIGOS DENTRO DE CASA (1463-1481) dada pelas Jutas dindsticas que dividiam a A Reconquista © nobreza ¢ que tomaram, em certes momentos, um aspecto de guerra civil. Nesse sentido, a Castela cristd estava tio agitada quanto o reino de Gra- timir um conflito fértil em s facgdes dilaceravam. Para . de onde emergiu o verdadeiro homem da situagio, ou se nada que mudany Isabel de Cast a, Iembremos © essenci Henrique IV, rei de Castela, apés oito anos de convivio conjugal sem descendéncia, anula seu casamento com Blanea, filha de dom Joao de com dona Juana, irma do rei de Portugal. Quando a vera bem conhecida de todos - citavam até teste- Aragon, ¢ casa impoténcia do monar munhas oculares -, a rainha da a luz, em 1463, uma menina, também de nome Juana, que o povo apelida imediatamente de a Beltrancja, do nome do favorito do rei, Beltran de la Cueva, Podemos adivinhar faciimente as intrigas que esse nascimento provecou. Pois a Core dentes quando nao existem filhos legitimos de rei: o jovem principe dom Alfonso, que morreu envenenado, ¢ sua irma Isabel, ambos filhos de wm. segundo leito do rei de Castela, Juan II, As mudangas de Henrique 1V, as estratégias politicas ¢ matrimoniais dos reis de Portugal ¢ da Franga, a diplomacia, as waigdes de toda sorte t¢m como centro duas jovens, Juana, aja, ¢ Isabel. Enquanto Henrique IV esti em conversacées para casar sua irma com o duque de Guyenne, estoura um golpe de conse: tem outros preten- icas de maxim importineia; Isabel casa-se com o principe Fernando de Aragio, no dia 19 de ounubro de 1469. Ela tem dezoito anos, a do trono de cle dezesscte. A partir desse momento, a herdeira legiti Castela encontr amento, no comando de qi Espanha No plano externo, essa unio das duas no interno, os senhores est? se toda a ¢, por sen c Coroas introdiz uma gran- de ameaga; no Jos entre a leald de a Henrique IV, que apéia as pretensdcs da Beltrancja, ¢ 0 principio de legitimidade dinastica. Desse conflito, do qual no podemos mostrar toda a complexidade, nasce uma luta ene faccdes (bandos), que carr ga, na espiral da anarquia, a nobreza, mas, junto com cla, os pequenos hidalgos de provincia que se agrupam, por sua vez, em banderias, Quando Henti- que IV morre, em 1474, Portugal, que apdia a Beltraneja e cujas ambigdes politicas sie evi Espanha; além disso, a Franga de Luis Xt ameaca os reinos de Aragio ¢ de Castela cm Perpignan ¢ em Navarra. Mas Isabel ¢ Fernando, apoiados pela maioria dos Grandes, dentre os nto, ttitores da Belt dentes, invade a ‘ais os Mendoza, que aneja, saira 7 UBSTORIA BO NOVO MUNDO cedores dessas provagées ¢ conseguirie, com uma determinagio exem- plar, restaurar a autoridade real. Durante as Iutas dindsticas que os confrontaram primeiro a Hen que IV, depois aos partial ios da Beltr Isabel ¢ Fernando souberam explorar a fibra “nacional”, muito sensivel nas les (comunidades), xigencias ilegitimas dos cstrangciros (os portugueses Hen- mica com Luis XI, os revoltadas com as notadamente): numa carta que enderegaram ao re eos f ne tentativas de rique IV para protestar contra jovens principes Isabel ¢ Fernando ge o tio detestave come 6 pi deixaram de aludir a “estes estran- s"”. Alonso de Palencia, que relata © rei de Aragio, cercado pelos franceses no Norte da Catalunha, virando a sitagio a seu favor, empresta a0 rei, agradecido, palavras espantosas, ji que estamos em 1472: “Feliz 6 aquele que, como eu, pode se dizer pai de seu libertador e do libertador de sua patria!” Sem contar que, na pena de seu cronis- ta oficial Hernando del Pulgar, juceu converso, os futures Reis até! apar asamento, como os candidatos do povo e das comunidades contra as ambigdes estrangeiras dos amigos da Beltraneja". O termo nagio comeca a ser usado no século XV para designar toda comunidade caracterizada pela consciéncia de sua unidade politica. Es! palavra, em sta antiga acepeao, continua a ser aplicada a todo grupo que possui caracteristicas prdprias: as cristios, as judeus, o gentio, os lavra- dores, os soldados, ¢ até as mulheres = femenil nacién® = ¢ enfim, mais tarde, os indios da América. A natio implica igualmente uma origem co- mum. Este é, por exemplo, o caso daqueles peregrinos do Pequeno-Egi- to, nomades vindos do Oriente no inicio do século XIV, expulsos de suas terras pelos mugulm ‘os A vossa mac: ¢ Fernando prestou soeorro a seu p: m, HO momento de seu 21 sses peregrinos, que a se de uma forma estranha, Os homens tém cabclos compridos e argolas nas orel mutheres usam um turbante sobre uma estrutura de pas Tha; cles tém a pele morena ¢ percorrem Castela e Aragiio sem se fix da nao siio chamados de ciganos, vestem- 17, Palgar (1943), t 1, p. Al: “se proeura de meter genes esira geros a esta wuestra nackin muy adiosas, de Iuzer otros moviesientos contra Hosoteas e contia Ta derechs e legitima subye 18, Palencia (1875), Déenda Wh, vol. 2, livvo VIE, p. LOA: “Dichoso yo que puedo lamar ertador y libertader de mi pattia” (1943), Lf, p. SH “de las quales (bodas} plogo mucho a tada la mayor parte de lor gra

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