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Guilherme de Souza Nucci | Codigo Penal | Comentado 9." edigio revista, atualizada e ampliada Estudo Integrado com Proceso e Execucio Penal ApresentacSes Esquematicas da Matéria EDITORA REVISTA DOS TRIBUNAIS 009528 Guilherme de Souza Nucci Cédigo Penal Comentado 9. edigdo revista, atualizada e ampliada Estudio itegrado com Process e Execuo Penal ‘ApresentagSes Fxquematicas da Maiéria. 1 edi: 20; 2c 2002; 3 edigo: 200% {sede rar tbo de 2003: 2" trage ‘hats 200%; fect 1 tage asl de 205; ager agosto be 2005; 3 rage: ebro de 3008 elo: 1 age: ge de 2008, tage: Se 20083 tage: nove de 3000" cdg. tages ari de 2007; 20a mat ds 2007; trager oat de 2007; Feecgao: 1 tragern: mato de 2008. ‘CARLOS HENRIQUE DE CARVALHO FILHO Diretorresponsivel ‘TODOS OS DIREITOS RESERVADOS A EDITORA REVISTA DOS TRIBUNAIS LTDA, Rua do Bosque, 820~ Barra Funda Yel, 11 3615,8400—Fax 11 3613.0450 CEP01136-000~ So Poul, $F, Brasil Pela areproduo total on parcial por qualquet enon procs, eecinent Sen raion microti Pre fg ics rproaticnn ongrains, video sco Vedas memotizacao ou a recuperaca0 total ou paca, encom ine lsio de quae pate desta obra qusk (uct Sutera de procestamento de dados sas provides SPicSese tomifam bs caractersiasgrticas da obra © 3 weteltoracao. A voi dos diets auras € pune! ano ge pg do Cole Fn i made pesto mula, buses © aprensaoe indenizaes Bras free Tota 110 da Lt 9610, de 19.02.1908, Let dos Dros Auto. © desta edigio (2008) ‘Viste nosso site ‘wwrstcom.be CENTRAL DE RELACIONAMENTO RT {atendimento, em dias itis, das Bas 17 horas) “el, 0800.702.2483 email de atendimento a0 consumigor sacereombr Inmpresso no Brasil [o1-2009), Universitaria complementar Atualizado até 13-01-2009), ISBN 97885-203-3415-7, APRESENTAGAO A 9.* EDICKO Av Stiste gas tis 1168972008, 1169072008 11.71972008 promoven vias alterages no Cédigo de Processo Penal, com alguns teflexos na legislagao penal. Esta, no entanto, ainda nao sofreu as modifieagdes necessétias, Por outro lado, areformado processo penal, eita de maneiraassistematica, comaaprovacio deprojetosindividuais edestacados, sem uma visio global do Cédigo de Processo Penal, evidenciaaimperfeigao dealteracdes pontuaiseasconsequgncias negativas davadvindas. Hinimeras contradicdes, causadorasdereflexos indesejaveisno dia- a-dia dos operadores do Diteito, além de provocar perplexidade no estudante, Serve de alerta, para que tal medida nao se estenda ao contexto penal, enalte- cendo-se a indispensabilidade de uma revisao integral do Cédigo, atualizando-o emodernizando seus institutos, porém sem criar mecanismosilogicose conflitos desnecessarios, Anona edicdo do Codigo Penal comentado adaptou-se a reforia do Codigo de Processo Penal, de modo. permitira continuidade do estudo integrado entre as disciplinas de Penal e Processo Penal. Alias, cada vez mais, reputamos ser indispensivel a aproximacao das eis processuais ao cenatio de direito material, oisambos estao entrelacados aosdireitose garantias individuais, consistindoem paleo unico de estudos para o aprimoramento conjunto das ciéncias criminais, Renovamos o nosso proposito de inserir,a cada nova edicio, textos inéditos, Jurisprudéncia recente erellexoes doutrinarias inovadoras Agradecemos aatencao do leitor e sua sempre bem-vinda contribuigao crti- «2, bem como a permanente dedicacio das varias equipes da Editora Revista dos “Tribunais ‘Sao Paulo, janeiro de 2009, OAvtoR ‘APRESENTACAO A 8." EDICAO Axes fundamentais na legislacdo penal ainda nao ocorreram, embora guns topicos tenham sido alterados a0 longo dos ultimos anos. Sempre nos pareceu que o Direito Penal, no Brasil, mereceria experimentar um choque sistémico, como fim de aprimori-lo, conferindo-the logia eficiencia de manei- ra amplae vigorosa. Para tanto, a primeira missfo do legislador haveria de ser 0 posto que o Parlamento brasileiro tem por habito empreender, vale dizer, em Jugar de criar, freneticamente, novas figuras ipicas incriminadoras, ¢ chegado o ‘momento em quea varredurase faz imperiosa, De que adianta adoutrina cultuar majoritariamente, o principio da intervened minima, uma das bases do Estado Democratico de Direto, se, na pritica, 6 implantado o metodo de um diteto pe- nal de intervengio maxima? O objetivo maior, inclusive para geraro tao falado combateimpunidade, deveriaseralimpezano amontoado deleis penais, grande Parte delas ja ndo aplicadas no cotidiano pelos operadores do direito Aconsagragio de um sistema ogico, enxuto, privilegiando, autenticamente, as infragdesmais graves, que no prescindem da intervenc20 penal, seriaigualmentea sagracio do interesseestatal em punir, com efetividade, os delinguentes. Em higar da falciada pregacao de que existe oimpériodo Estado contrao crime, organizado undo, somente porque normas e maisnormas penais sio criadas, ainda que ina- plicaveis,teriamosaeficdcia de um ordenamentosem excessos nem redundancias, Asautoridades publicas dedicariam seu tempo aos casos realmente importantes, © que, naturalmente, acarretaria em melhor impressao a sociedade. Enquanto tal reforma ampla nao se efetiva, cabe ao Judicidrio a tarefa de ex- urgar do universo penal as infragdes irrelevantes, homenageando aintervencao ‘minima e os demais principios penais, A oitavaedicao do Codigo Penal comentado, na linha dasanteriores, traz varios acréscimos no campo doutrinario e também a jurisprudencia recente dos tribu- nals patrios, com particular énfase aos julgados do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justica. Amodificagio legislativa, no campo da prescricao, trazida pela Lei 11.596/2007, foi devidamente introduzida e analisada Novos quadros esquematicos sto inseridos, facilitando a compreensio dos ‘temas expostos ¢ atendendo a expectativa do leitor. Esta obra mantémse atualizada e integrada com 0 Codigo de Processo Penal comentado e com o Leis penais ¢ processuais penais comentadas, formando um conjunto harmonico de idéias, opinioes e ensinamentos. AAs sugest0es dos letores foram avaliadas e, muitas dela itroduzidas nesta edicao, seguindo-se a meta de autocritica ¢ permanente vigilancia em relacao aos raciocinios construidos, em prol da melhor aplicacio das normas pe casos concretos. Gullherme de Souza Nucel Renovamos o nosso agradecimento aos colegas de magistratura ¢ aos de ma- gistério pelos sempre constantesconselhos ecriticas construtivas. Redobramosa confianga de que o leitor €0 melhor avalista do nosso trabalho, sempre disposto a colaborat. Reiteramos 0 nosso reconhecimento a Editora Revista dos Tribunais ppelo permanente incentivo em relacao a produc dos nossos trabalhos, ‘ao Paulo, margo de 2008. OAurox " APRESENTAGAO A 7.* EDICAO Aisne apés sete anos de existéncia, a sétima republicacao do nosso Codigo Penal comentado,a obrainicial de uma série delas, que veioa seguir, compondo o tniverso de comentérios,criticas e sugestoes por ids claboradas, como fito de aprimoraro Direito Penal brasileiro, Ingressamos, por certo, ainda, no cenatio do Processo Penal, tendo em vista a nossa formagio cientifica nas dduas éreas. Sempre buscamos a pauta mais atualizada possivel, com leituras ¢ inclusoes de artigos e teses inéditas, produzidas por valorosos autores nacionais c estrangeiros, sem deixar, jamals, de esbocar a nossa concordancia ou cfticaem relacioa determinada posigdo polemica, Acostumamo-nosa ouviro leitorepercebemos que esteespelha tanto jovem aluno universitario, dos primeirosanos do eurs0 de graduacao em Direito, como também o experiente Ministro ou Desembargador, autor de inuimeros votos, decidindo a sorte de milhares de réus, ao longo de anos, na seara das Cortes Cri- ‘inais. Ha, sem davida, os demais eficientes operadores do Direito,funcionando naacusagdo, na defesa.na investigacio criminal. Outra voz fortalecida ao longo ddos anos € a do candidato as carrelras juridicas, nas quais 0 ingresso se dé por concurso piblico, pois se cuida de estudamte dedicado e voraz de diversas maté- vias, sempre pronto a detectar 0s pros. contras de uma obra, que, notmalmente, Je coma mais profunda atencao. Nao podemos olvidar os candidatos aos ttulos de pés-graduacao, que nos brindam coma leitura de obras nossas,avaliando-as, cientifcamente,emseus trabalhos (dissertacbese teses),muitesdos quais vemos asatisfaedode examinar, em bancasuniversitaias.tantasconttibuigdessomam- seosprofessores, aqueles que, emsalade aula, ouvemas mais diversas indagacdes de seus alunos ¢, por vezes, buscam as respostas ei livros de doutrina, Nao as encontrando, sugerem a inclusto de um ou mais temas e procuram ser ouvidos. Emsuma, aaberturaparaessaceptacio deanseios, que indicamoshaver desde primeira edicio, somente serviu para que recebéssemos, ao longo dos anos, as ‘mais valiosas colaboracoes,dentre elogios criticas, todas igualmenteabsorvidas ¢,commuito desvelo,avaliadas. Muitasdelasse transformaramem topicos novos dle abordagem do Codigo Penal comentado~e de otras obras nossa. Esse €0 objetivo: buscar o maior leque de posigdes efornecer ao leitor,além da nossa contribuicio, a dos demais estudiosos do Diteito Penal, A sétima edi trazjurisprudencia atuaizada, sempre procurando retratar ‘como os tribunais patrios vem decidindo e aplicando 0 diteito penal aos casos oneretos. Duasnovas les surgitamrecentemente:aLei11.464/2007,caidandode ‘modificac6esimportantes na Lei dos Crimes Hediondos, dentreas quaisa fixacao do regime inicialfechado para os autores dessas especies de infragdes penais, bem como estabelecendo novos prazosparaa progressiode regime;aLei 11.466/2007, twatando da insereao da posse, uso e fornecimento de aparelhotelefOnico, deridio ‘ou similar pelo preso como falta grave, alterando, para tanto, a Lei de Execucao Penal, omnitidosreflexos naprogressiode regime, que é materia de fundo penal; ‘mesma Lei criou um tipo penal inédito~o ar, 319-A.—uma modalidade espect. 10 Guilherme de Souza Nucci fica de prevaricacao, cuja inalidade é buscara punigaodos funcionarios publicos aque deixarem de observar os seus deveres, permitindo o acesso de presos aos aparelhos de telefone, de rédio ou similares. Alem disso, incluimosas necessérias atualizacdes e referencias advindas das Leis 11.340/2006 (Violéncia Domeéstica) €11.343/2006 (Lei de Drogas). Nao podertamos deixar de registraro quo importante se tomnaajurisprudéncia brasileira, mormente as decisoes proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, no importante processo legislative de criacao das normas penais. A partirdo momento «em que o Pret6rio Excelso deliberou pelainconstitucionalidade doregime fechado integral para os condenados por delitos hediondos € equiparados, 0 rflexo foi imediato. Os parlamentares,cientes da novarealidade juridica, buscaram corrigit tumerto do passado, que, em nossa visio, era oimpedimento total eabsolutoapro- gressdoa qualquer condenado por crimehediondo eassemelhado, padronizando aexecuciio penal, o que ofendiao principio constitucional daindividualizacto da pena. Eofizeram, Alterandoa Leidos Crimes Hediondos, chega-sea um resultado equilibrado: maiores prazos para a progressto dos sentenciados por tais delitos; menotes prazos para os demais condenados. Porém, assegurada esta a individua- lizacio executéria da pena, Triunfaa vontade da Constituicao Federal, sem perda paraasociedade, Depende-se, sempre, do implemento real das demais condicoes legais para que o Dieito Penal se faca presente etenha o contorno almejado pelo Estaclo Demoeratico de Direito,atodosnésprometido, O brasileiro ecessitatanto de seguranga como de respeito as suas liberdade individu. Esse equilibrio, no cendrio penal, deve ser uma busca constante e eterna, O nosso renovado agradecimento aos componentes de todos os departamen- tos da Editora Revista dos Tribunais, com quem, ha anos, temos estabelecido um contato quase diario, em fungao das edicdes das nossas obras, coma finalidade de transformé-lasem leiturasfiuidas eagradaveis, mas com oindispensivel conterdo cientificoe pratico que o leitor almeja encontrar. Sao Paulo, marco de 2007. O Autor ‘APRESENTACAO A 6. EDICAO Apecaivenodsstes 10.763/2003 (regimede penas),10.792/2003 (progressio dle regimes e outros elementos de execugio penal), 10.803/2003 (condicio anilogaatde escravo), 10,886/2004 (violencia doméstica) 11.035/2004 (alsidade documental)€11.106/2005 (crimes contraos costumes), variasalteragdes foram introduzidas na quinta edigao do nosso Codigo Penal comentado. No timo ano, pudemoscolheralgunsrellexosconcretos dessasmodificacaes, tanto na doutrina quanto na jurisprudencia, justamente o que buscamos inserit na edigdo atual. O leitor podera observar que algumas ds reformas nao surtiram o eleito desejado, pois foram, como apontamos anteriormente, superficais fi- eis (ex.:amodificacio doar, 129, introduzindoa igurada violencia domestica); ‘outrasrepresentaram um importante avan¢o de ideias, modernizando o diteito penal (ex. as alteragdes e supressdes no contexto dos delitos contra os cost ‘mes);algumas mudancas provocaram intenso debate nos tribunais, acartetando correntes jurisprudenciais dispares (ex. a introdugo do Regime Disciplinar Diferenciado e as novas regras para a progressio); em suma,fizemos o possivel para captar todas essas tendéncias, expondo-as paraareflexaodo estudante edo operador do diteto Nestaedicdo, houve um especial cuidadonainsercaode novos cérdios sempre recentes, dos varios Tribunais de Justca dos Estados e dos Tribunals Regionals Federals, permitindo a ampliagio do conhecimento das posicdes dominantes nas cortes brasileiras Alem disso, em especial, no dia 23 de fevereiro de 2006, o Supremo Tribunal Federal proferiu decisio, no Plenério, considerando inconstitucional a vedacao a progressio de regime nos casos de condenagdes relativas a crimes hediondos Em consequencia, buscamos introduzir 0s eflexos desse veredicto nos varios aspectos pertinentes 4 aplicagao e & execugao da pena, bem como no tocante & possibilidade de concessio de beneficios aos condenados pelos delitos previstos na Lei 8.07290 Permanecemos abertos ao didlogo com o leitor, recepeionando todas as st- gest6es e critica relletindo sobre cada uma delas ¢oferecendo o resultado nas Timhas da nova edicao. Prestamos a nossa homenagem aos profissionais da Edivora Revista dos Ti- bbunais, pois sabemos que um trabalho como este nio se constr somente com {deias €estudos, mas também com a operacionalizagdo de um objetivo comum, que € 0 aprimoramento do estudo juridico no Brasil Sto Paulo, fevereio de 2006, OAvtoR ‘APRESENTACAO A 5." EDICKO quintaedigao donosso Codigo Penal comentado surge comintimerasalteragoes, -onfirmando a proposta estampada desde a primeira publicacao, trazendo a lume novos e recentes acordaos, discutindo as mais intrincadas questoes, bem como apresentando textos recém lancados de autores nacionais cestrangeiros. Todlos 0s temas expostos submeteram-se a0 nosso posicionamento ritico,em «special as modificacdes legislativas, introduzindo figuras questionaveis como a lesio corporal qualificada, denominada violencia doméstica, bem como o aperfei- ‘goamentodadescrigao tipicado crime dereducaoa condicaoanalogaade escravo. Algumasalteracdes no contexto das penas, comoa pretensio desimplificaro pro- cesso de progressio de regime, aconcessto de livramento condicional cindulto, arranharam o principio constitucional da individualizagao da pena, merecendo nossa critica e avaliacdo. Por outro lado, criou-se, a partir de modificacao da Let de Execucao Penal, outra especie de regime fechado, denominado de regime dis- ciplinar diferenciado, o que também foi objeto da nossa anise minuciosa Avaliamos, ainda, agora positivamente, a recente edicdo da Lei 11.106/2005, que provocou a descriminalizagao do vetusto crime de adulterio e retirou dos Uipos penais a preconceituosa terminologia referente& mulher honesta, Sob outro aspecto, revimas por completo a nova redacao dada ao tipo penal do art 293, Revisamosa obraintegtalmente, inserimosnovosexemplosenotasinéditasem quase todos os capitulo, As varias e novas Stimulas do Supremo Tribunal Federal foram colocadas nas notas pertinentes ¢ todas elas, assim como as do Superior Tribunal de Justica, em matétia penal, destacam-se agora em apéndice préprio, Elementos de medicinalegal, psicologiaforenseecriminologia foramaperfeico- ados ¢ enriquecidos, bem como varios esquemas ineditos foram introduzidos. Durante a elaboracio da 5.* edicao, auferimos o titulo de livre-docente em Direito Penal, como trabalho, ja publicado, intitulado Individualizacao da pena, ‘© que nos permitiy entiquecer os capitulos referentes&s penas esua aplicacao. Esta obra tem proposta diferenciada desde o inicio: os temas polemicos ~e ‘fo muitos ~ jamais sio debatidos ou expostos sob um tinico enfoque, que seria ‘© do autor. Nosso compromisso ¢ apresentar ao leitor 0 mais largo espectro das posicoes existentes, jamais deixando de demonstrar qual ¢ o ponto de vista que nos parece omais adequado, Busca-se nao deixar questioemaberto,o que poderia fomentar divida ao estudante e a0 operador do direito. Oleitor certamenteaproveitara oestudo, podendo estimular seu pensamento ‘exiticoe formar sua propria opinio acerca dos temas mais polémicos. ‘Uma vez mais, agradecemosa todos os que nos apoiaram na colheita de dados esugestdes para oaperfeicoamentoda obra, bem comoaos dedicados profissionais da Editora Revista dos Tribunais. Sao Paulo, marco de 2005. OAutor " APRESENTACAO A 4.2 EDIGAO One das Leis 10,695/2003¢ 10.741/2003 (Estatutodo Idoso),alterando varios dispositivos do Codigo Penal ecriando novas figuras ipicas, impul sionow a elaboracao da 4.* edicao desta obra, embora muitos outros acréscimos, que foram feitos, a estayam preparados para ainsercto. Ap6s mais um semestre letivo, sempre colhendo as proficuas sugestdes dos alunos e dos colegas de magistério, formamos um conjunto de modificagdes de introducoes indispensavets ao aprimoramento da obra, razdo pela qual 0 Codigo Penal comentado recebeu acréscimos em varios tépicos, mantendo 0 espttito do trabalho no sentido de sempre aperfeicoar-se, tornando-se o mais atualizado possivel Permanecemiosfitis 20 nosso propésito de produzir uma obra completa, con- tendo a exposicao diversificada do pensamento doutrinario, acordos recentes, sempre acompanhada do nosso posicionamento critico, voltada aosestudantes ‘em geral e também aos profissionais da area juridica Continuamos estabelecendo a vinculagdo da matéria com Processo Penal e Execugao Penal, visando a facilitacdo do estudo do consultor da obra. Renovamos 0 nosso agradecimento 40s leitores, sincetos colaboradores para © primor do estudo, bem como a Editora Revista dos Tribunais, pela confianga depositada e pelo incessante trabalho de divulgacto. Sao Paulo, outubro de 2003, Auton ~ APRESENTAGAO A 3.° EDICAO Aw: edicao do Cédigo Penal comentado foi claborada com © mesmo levotamento com que construimos as anteriores, embora traga aperfel- ‘oamento natural erguido pelas sempre bem-vindas criticas esugestoes de todos 6 profssionais que fizeram e continuam fazendo uso das dias anteriores, sem conta, evidentemente, 0 inestimvel apoio dos alunos da graduagao e da pos- sgraduacio, buscando propor inclusdes e sugerir novos temas a serem debatidos © comentados. Nossa proposta original de mesclar a andlise do texto legal coma Jurisprudencia mais atualizada possivel,bem como inserindo nossa visto erica ¢ também a dos autores que defendem posicionamentos diversos, ¢ mantida. Pensamos ter contribuido para estimular o debate nas salas de ala, justamente Porque oaluno temasua disposicdo, sobre os varios institutes, mtimeros pontos de vista para fecundar a troca de idias, além de contribuir para o profisional extra sua linha de acusa¢io, de defesa ou mesmo de julgamento. Alem da analise dos novos tipos penais introduzidos pela Lei 10.467, de 11 de junho de 2002, inserimos os conceitos de direito penal, politica criminal, criminologia eas escolas penais,além de ampliar, consideravelmente, outros {nsttutos}aexpostos nas edigSesanteriores, como, paracitarapenasitmexemplo, © consentimento do ofendido. Por sugesiao acolhida dos estudantes, buscamos faciltara consultaincluindo quadros esquematicos, que permatem melhiorandlise ememorizagaode certostemas, como ocorreu coma pescrigao, Nao desculdamos, ainda, de promoveraassociaciode idéiascomos temas dedireto processual penal, desenvolvidos em nosso Cédigo de Processo Penal comentado, agora ja atingindo 82. edigio, também com varias insers0es. Sentimo-nos a vontade para registrar que continuamos abertos as sugestoes € eriticas,tilhando 0 caminho da busea incessante pelo aperfeigoamento das ‘deias expostas efornecendo nossa modesta contribuigao,advindado magisterio 0 longo dos anos, parao estudo do direito penal. ‘Aos amigos, colaboradores €leitores 0 nosso agradecimento sincero, reno- vando, ainda, nosso reconhecimento pelo incessante apoio da Editora Revista dios Tribunais, ‘io Paulo, feverciro de 2003, OAvtoR APRESENTACAO A 2.* EDICAO 1m pouco mais de um ano, esgotou-se a primeira edigao desta obra, alem de -varias modificacdes terem ocorrido no contexto do Direito Penal, no Brasil Por isso, ao prepararmos a nova versio do Codigo Penal comentado,ficamos aten- tosas alteracdes legislativas, além de permanecermos ftis& proposta original do texto, que contém, além de comentarios a lei, nossa particular visto acerca dos temas estudados, criticando ou enaltecendo, mas sempre fixando 0 nosso posi- cionamento, em especial no que toca aos pontos mais polémicos. A primeira edigao encontrou grande aceitagiodentre profissionais do Dieito ‘eestudantes, embora tenha apresentado questdes que mereceram revisio e um estudo mals aprofundado, o que pode ser sanado nesta versio. Obtivemos de ruitos colegas, especialmente daqueles ligados ao magistério, impagivel cola- boracto na feitura de criticas ¢ observacdes, muitas das quais foram acolhidas somente serviram para o engrandecimento do texto, bem como, sem diivida, de nosso proprio estudo. Nao foram potcos os estudantes, tanto dos cursos de graduacdo, quanto daqueles que se preparavam ao ingresso, por concuts0, a8 carreiras juridicas, que nos procuraram ofertando sugestées primorosas para o aperfeicoamento do livro,além de solicitarem a abordagem a certos temas, que, nnaprimeira edicao, deixaram de ser expostos. Abertosestivemosatais colocagdes ¢ tivemos por objetivo, na elaboragao da nova versio, atender a todos os pontos de vista apresentados. Vislumbramos, ainda mais, a complexidade existente em alinhavar uma obra completa, que cuida de comentarios a todo um Cédigo, bem como traz temas doutrinarios, com sua repercussio jurisprudencial, de modo harmonica unifor- ‘me. Muitos dos obsticulos foram superados e outros, certamente, ainda podem existr, mas a perseveranga nos fara ultrapassé-los. Aobraincorporou comentariosasnovas figuras tipicas criadas, especialmente (0s crimes contra as financas puiblicas (Lei 10,028/2000), constantes dos arts 359-A a 359-H, 0 crime de assédio sexual (Lei 10.224/2001), constante do art. 216-A, além de ter levado em consideracio as modificagdes legislativas havidas 1a denunciagao caluniosa (art, 339, modificado pela Let 10.028/2000), no falso testemunho e falsa pericia (arts. 342 e 343, alterados pela Lei 10.268/2001), sem deixar passar em branco os teflexos trazides pela edicdo da Lei 10.054/2000, que regulamenta os casos de identificacao criminal, nos delitos de desobediencia e de auto-acusacao falsa. Fizemos incluir, também, no contexto das imunidades parlamentares, 0 disposto na Emenda n, 35, de 20 de dezembro de 2001, que limitou o alcance da imunidade dos deputados e senadores. Nao foram somente essas as inclusbes que a obra mereceu, Aprimoramos varios outros setores, ampliando, consideravelmente, o contexto doutrinatio. Inserimos os principios de Direito Penal, outras classficagdes do tipo penal e do dolo,oconflitoaparente de normas,asimunidades diplomaticas e parlamentares, alémde acréscimos consideraveisem outros assuntos, comoaimputacdo objetiva, a classficagao dos crimes ea extradicao ~ somente para exemplificar. Tivemos 0 20 Guilherme de Sowza Nucci ‘cuidado de, mantendo o espirito da primeira edicao, acrescentar apenas jurispru- dencia recente, espelhando a atual posicao dos tribunais patris. ‘Tivemos a oportunidade de coordenar nossos estudos de Direito Penal com ‘aprofundamento havido na area de processo penal, em face da edicaio do nosso Cadigo de Processo Penal comentado, cujo lancamento se faz concomitantemente aesta obra. Assim, o profissional o estudante poderao ter um estudo abrangente e harménico do direito material e do direito processual, a0 consultaremt 0 dois textos comentados, ambos com o mesmo objetivo de esclarecer, anotado 0 nosso particular posicionamento, a respeito dos temas expostos. Alegislagao penal continuaamerecer umareformaampla, como jaapregoamos na apresentacioprimeiraedigdo, sem ques fagam tantas modificacdes pontuais, empobrecedorasda harmoniado Codigo Penal, mas, adespeito disso, ndo'se pode ‘olvidar o esforco do legislador para atender importantes questdes penais, como ‘ocorreu, por exemplo, quanto aos crimes conta as finangas publicas. Auguramos que esta nova edicao possa continuat atendendo as expectativas dos seus consulentes ¢ continuamos abertos as criticas e outras sugestOes cons- trutivas, sempre bem-vindas. ‘Uma vez mais, agradecemos 0 apoio dos amigos ¢ a confianca, em nos depo- sitada, pela Editora Revista dos Tribunais, ‘io Paulo, fevereiro de 2002 OAvror ~ APRESENTACAO A 1." EDIGAO estudo do direito penal mostra-se, na atualidade, cada vez mais necessério ‘cminucioso, tendo em vista que, sob um primeiro aspecto, a criminalidade aumenta consideravelmente, por conta de fatores variados, sendo de se destacar ‘amiséria social, o fracasso da politica econdmica de muitos governos, bem como as sucessivas crises éticas pelas quais passou a sociedade brasileira nos iltimos ‘anos, muitas delas trazendo a falta de confianea nas instituices, Sob um segundo prisma,aausénciade uma politica cordenada de seguranca publica, abrangendo todo o Pais, que tem proporgdes continentais, leva ao descompasso entre as leis ceditadas e a realidade vivida, provocando um descrédito indevido, mas lamen- tavelmente presente, nas leis penais, com especial relevo para os tipos penais incriminadores, bem como no que diz respeito a aplicacao cumprimento das pens. Olegislador, por seu turno, cada vez que se defronta com situagdesfaticas adversas, tenta soluicionar o impasse com a criagao de novas figuras tipicas ou inovadores sistemas de aplicacao dalei penal. Como exemplos, pode-se mencionar fo advento da Lei 9.714/98, que instituit profunda modificacdo no contexto das penas alternativas, ea edigio da Lei 8.072/90, que trouxe nova disciplina paia os delitos considerados hediondos e outrosassemethados, servindo para demonstrat a ansia do Poder Legislativo em resolver o caos social ~ seja a superlotacao dos presidios, seja o recrudescimento dos crimes violentos~, renovando, a qualquer ‘custo, alegistacao penal, ainda que de mancira cristalinamente contraditria, Ao Judiciario, apes o advento de novas leis, resta aplicé-las, nem sempre gerando resultados positivos, com aefetiva prevengao ereeducagao de pessoas delingaen- tes, porque invariavelmente falta, no todo, coeréncia sistemica, impossivel deer ‘corrigida por remendos provocados por leis criadas em momentos de crise, sem grande rellexao ¢ dissociadas da realidade. Nao que as tentativas de aprimorar 0 sistema normativo penal sejam incabiveise desnecessarias: muito pelo contritio, ever existr e ser incentivadas, embora estejamos acompanhando enxertos variados, em diferentes pontos dos cédigos e dasleis esparsas, movimentando-se ‘em descompasso earritmia SeporumadoalLei9.714/98, queestamos utilizando comoexemplo,embora ‘outras existam causanclo conflites, eve o mérito de criar penas alternativas apri- vativa de liberdade, para crimes de menor gravidade, evitando-se os sérios males do sistema earcerario, que € capaz de corromper ainda mais o ser humano que delinqaiu, por outro, deixou defornecer critériose formulas razodveis, criteriosas, coerentes detalhadas paraa substituicao da pena de pristo por outrasrestrtivas dedireitos. Deixou, somente para ilustrar,adoutrina ea jurisprudénciaa missdo de definir como executar a pena de prestacao pecuniaria ou a perda de bens € valores, gerando, logo de inicio, correntes opostas de interpretacio, o que leva os ragistrados, por vezes, apreferirnao utiliza-las, paraque ndose tornem inexeqi- Iveis. No ocantea Lei dos Crimes Hediondos, surgida naonda dos sequestros que assolavam o Paisno final da década de 80 —situacao ainda nao resolvida, a bem da verdade —, teve o legislador por meta uma melhor forma de controle e prevengao dos crimes graves, instituindo regime rigoroso para o cumprimento das pens Guilherme de Souza Nucet privativasde liberdade eaté mesmo paraaguardar a solucao do proceso, vedando aconcessio de iberdade proviséria eaplicando oregime fechacio integral em caso de condenagao, Provocou, com isso, lamentaveis disparidades entre sujeitos que cometem crimes classificados como hediondos pelo simples preenchimento de alguma das figuras previstas no rol do art. 1.°da Let 8.072/00, mas que apresen- tam, para a sociedade, substancial diferenca de periculosidade. Nao se poderia, jamais, padronizar penas, egimes ebeneficios, comose osseres humanos fossern iguais, em personalidade eatitudes, praticando condutas exatamenteidénticas. A tentativa de estupro e um beijolascivo, considerado atentado violento ao pudor, {quando extraido mediante violencia, nao podem produizit o mesmo desvalor que Ecapaz de gerar 0 latrocinio on a extorsdo mediante sequestro seguida de morte {odavia, fica o juiz proibido de conceder, a quem ¢ preso em flagrante pot tais delitos, a liberdade proviséria, bem como deve impor o regime fechado integral tem caso de condenagao. As penas foram consideravelmente aumentadas e, ainda assim, sabe-se da existencia do art. 75 do Cédigo Penal, que constitui auténtico {eto para 0 cumprimento das penas no Brasil, fixado esse montante em 30 anos, esteja ou nao o condenado preparado a retornar ao convivio social. Desse modo, ‘caso uma pessoa seja condenada por varios crimes considerados hediondos a penas superioresacem anos de prisio, exemplificativamente, nao cumprira mais do que trinta, devendo ser colocada em liberdade a seguir. Nao terd, na maior parte dos cas0s, condigdes de retornar ao convivio social de maneira satisfatoria, seja porque nao obteve beneficios durante a execucao da pena — integralmente cumprida em regime fechado —, seja porque o sistema carcerério nacional € um dos piores do mundo. Vislumbra-se, portanto, uma auténtica conotacao liberal no referido art. 75 do Cédigo Penal, que nao tem igual correspondéncia na Lei dos Crimes Hediondos, de nitida formulacio rigorosa. O mesmo confronto se da entre a Lei 9.714/98, das penas alternativas, ¢ a mencionada Lei dos Crimes Hediondos. Por outro lado, a Lei de Téxicos, em vigor desde 1976, nao foi até 0 ‘momento revista, permanecendo na inadequada formula de equiparacao de tra- ficantes de pouquissima periculosidade, como aesposa do preso que carrega para dentro da cadeia, a seu pedido, pouca quantidade de maconha, com os grandes comerciantes de drogas, perigosos delinqitentes do crime organizado, que tran- sacjonam toneladas de cocaina. Ambos os agentes cometem o delito previsto no art, 12 e estdo sujitos a cumpririntegralmente a pena no regime Fechado, 0 que nao ¢ logico, nem verdadetramente ractonal. legislador poderia caminihar no sentido da descriminalizacto de uma sé- rie de delitos atualmente considerados de pouca utilidade, diante da evolucio social e dos novos costumes vivenciados pela sociedade brasileira, mas prefere alongar, sempre que pode, o j extenso rol de figuras tipicas dos cédigos e das leis especiais. Esquece-se, ainda, de queaverdadeira transformacao no sistema penal brasileiro, coma diminuic2o impunidade, deveria ter inicio, naatualidade, pelo processo penal, vetusto e defasado, que nao fornece aos aplicadores da lei penal os instrumentos adequados ao seu mister. De nada adianta um diteito penal apri- ‘morado sem que existam meios eficazes para o combate ao crime, especialmente ‘oorganizado. Por mais que se alterem as leis, ¢indispensavel que areforma se dé no direito penal no diteito processual penal, coordenadamentee, se posstvel, a0 Apresentacao @ 1.*edicao 23 ‘mesmo tempo. Sem isso, continuaremos a ter uma lei modema qualquer sendo Viabilizada por outra que possui décadas de existénciao descompasso torna-se ‘manifesto ¢ 0 desgaste é inevitavel. Na linha das contradicoes que estamos apontando, novamente inovou-se na legislacao penal, com a edicdo da Lei 9,983, de 14 de julho de 2000, que entrara ‘em vigor em outubro proximo, pois realizou-se uma reforma parcial na Parte Especial do Codigo Penal, tendo por finalidade atender ao reparo das incoerén- cias havidas na Lei 8,212/91, que euidava dos crimes contra a Seguridade Social Nesta lei estavam previstas, como delito, dez figuras ipicas (art. 95, alineas aaté _),embora somente trés delas possuissem pena, significando, pois, que as outras seteeramapenas propostasde criagio da figura delitiva, emasuaefetivaeao, uma vezinexistir crime sem pena, Logo, a titulodeexemplo, oempregador que deixasse de incluir na folha de pagamentos da empresa os segurados empregado, empre- sirio, tabalhador avulso ou autonomo que Ihe prestassem servicos, cometeria um ato ilicito, que ndo poderia ser considerado delito por falta de sancao penal E certo que tais defeitos graves foram corrigidos, pois as de: figuras tipicas dos ‘crimes previdenciatios foram inseridas no Codigo Penal, todas com previsto de sanglo, Entretanto, o que se critica 6a producao de mais uma reforma parcial do Codigo, quando a legislacio penal esta a demandar, de uma vez por todas, uma amplarevisto, extirpando-secrimesem nitido desuso, incluindo-se novas figuras Upicas e reformando-se aquelas que necessitam de ajuste. Destaque-se, abem da verdade, quea Lei9,983/2000 teve o méritode criar crimes especiais no campoda Informatica, vg. arts. 313-A (insercao de dados falsos em sistemade informacoes) €313-B (modificacdo oualteragdo nao autorizadade sistema de informagées). Mas, ‘para no alterar a numeracao existente no Cédigo Penal, introduziu as confusas figuras upicas desdobradas,acrescentandoasletras A” ow “B" emartigos vigentes, ‘que somente dificulta 0 manuseio ea inteligencia da ei penal. Ademais, nao se vislumbra coeréncia na insergio dasnovas figuras upicas nos atuiais locais que hes foram destinaclos, Exemplo disso €a insercao de dados falsos em sistema de infor- ‘macbes art. 313-A -, que passou a ser um desdobramento do peculato mediante erro de outrem, figura nao necessariamente vineulada ao procedimento do agente que falseia banco de dados da Administragao Pablica. Assim também aconteceu ‘com o novo art. 337-A (sonegacao de contribuicdo previdenciaria), que passou ser considerado fracionamento do crime de subtracdo ou imutilizagao delivro ou documento, que nada possui em comum coma figura recém-introduzida, Enfim, em que peseim os aspectos positivos da nova Lei 9.983, verifica-se que Aauséncia de interesse pela opcao de uma reforma ampla eprofunda do Codigo, reviamente debatida com a sociedade vai tomnando o estudo do direito penal cada vez mais conturbado e complexo, chegando a causar perplexidade ao estu- dante do bacharelado, Afinal, foram feitas mais de trinta modificacées sem que fosse alterada a numeragao do Cédigo Penal, inscrindo-se artigos e parigrafos ‘com desdobramentos incompativeis com a tradicao do direito brasileito. Nao se desconhece que o legislador, a0 elaborar tai figuras tipicas,inserindo-as na Parte Especial, respeitou odisposto na Lei Complementar 95/98, regulamentada pelo Decreto 2.954/09 (art, 19, 1a ID, fazendo constar os acréscimos de letras maitsculas na numeracao dos artigos e paragralos, embora o que estejamos a 24 Guilherme de Souza Nuect criticar, repita-se, a insistente tendéncia de se reformar parcialmente o Codigo Penal, quando o merecido, ha muito, seria uma ampla e cocrente tevisto. Se tal ‘ocorresse, nao seria necessario utilizar as letras para evitar a remumeracao do Decreto-lei 2.88/40. Poderiamosnosalongarnoapontamento de muitas outrasmazelasdosistema penal, alcomo colocado evigentenos diasde hoje, masperderiamosa objetividade ‘daintrodugto deste trabalho, que ¢ ofereceraosestudantes de Diteito €aos profis- sionais dasirea um Codigo Penal comentado, contendo estudos, sugestdes,criticas, posicionamentos doutrinarios dos mais variados jurisprudencia atualizada, Objetivo da obra, desde que o projeto de criacio deste Codigo surgiu, € unit, sem a va pretensio de esgotar os assuntos tratados — 0 que seria até mesmo ina- dequado para comentarios deste perfil -,ateoria, a pritica,a sugestao ea critica, 0s dois ultimos elementos nem sempre presentes em obras de inequivoco valor doutrinatio, que deixam de provocar no estudante eno leitor, ce um modo geral, ‘ pensamento critico e renovador, do qual, com certeza, proliferam as ideias eas nnovas tesesjuridicas, que podem contribuirsobremaneita para oaprimoramento do direito penal Ascontradigdes do sistema penal brasileiro, algumnas das quais foram proposi- tadamente mencionadas nas linhas inicias para ilustrar 0 nosso intento, server para comporo universo de critica construtiva presente nesta obra, acompanhada da posicao doutrinaria vigente e da jurisprudencia pertinente. Desde 0 nosso ingresso nas carreiras publicas, inicialmente no Ministerio Publico do Estado de Sao Paulo, em 1987, ¢ posteriormente ma Magistratura do ‘mesmo Estado, no ano seguinte, jamais perdemos 0 contato coma area criminal ‘esempreestivemos constltando manuals e codigos comentadlos. A pratica profis- sional certamentenos impulsiona aisso, além do que, como aluno da graduacao, jd tinhamos tidoa oportunidade de consultar leis comentadas. Conelutmos, com ‘opassar dosanos, que o estudo minucioso de qualquer ramo doDireito passa por ‘varias fases, entre as quais nao se deve dispensar leitura das monografias, dos cursos, dos tratadose dos comentarios 0s cédigos eas leis penais. Entretanto, nao se pode olvidar que a complexidade da vida moderna ea racionalizacao do tempo trouxeram a necessidade e fizeram emergir as obras sintetizadas, condensando pensamentos e apresentando, de forma ordenada e clara, fasciculos sobre temas variados. E,trihando caminho paralelo, munca se perdeu de vista, nesse cenario, 0 tdo indispensével eddigo comentado, como base de apoio para o profissional ‘encontrar, rapidamente, uma abordagem condensada, mas aprofundada, de te- ras especificosrelativos a concreta aplicacao da lei penal. Destarte, nao se pode pretender, ao comentar a lei artigo por artigo, esgotar temas, especialmente os polémicos, embora uma abordagem incisiva sobre o assunto deva ser feta Apés darmos inicio aos nossos estudos de pos-graduacao, sempre voltados as areas penal e processual penal, que consideramos indissociaveis para a ideal aplicacao da lei, repressdo a criminalidade e possibilidade de éxito na recupera~ ‘edo do delingiente, bem como lecionando ha mais de wma década em cursos de _graduacdo, pudemos sentir ointeresse de varios colegas, professoreseestudantes, na obten¢ao de um Codigo Penal comentado que contivesse a andlise do autor, sua Apresentagdo a1." edigao 25 posicao pessoal sobre os temas tratados, ensinamentos doutrindtios relevantes e jurisprucéncia efetivamenteatualizada, Certamente muitas obras preenchem esse perfil, embora nossa proposta seja avancar um pouco mais, incluindo doutrina estrangeira, apresentando opinides criticase oferecendo sugestées.Por outrolado, a jurisprudéncia citada, na sua maioria,traz 0 contetido principal dos acérdaos, paraavaliacdo do leitor,e ntoa meraindicagao desua fonte. Enaose fazreferéncia a jurisprudencia em topicoa parte do texto analisado, dissociado doassunto, mas sim porocasiao da notapertinenteao artigo em estado, proporeionando imediata ligagdo entre o que se comenta eo ja decidido pelos tribunais patios. Houve 0 cuidado de colher jurisprudencia bem recente, abolindo-se mencoes de decisoes antigas, que jé nao mais vigem, pois a composicao das cAmaras e turmas das cortes alterou-se consideravelmente de alguns anos para c4, de nada adiantando ao estudante ou a0 profissional tomar conhecimento de um posicionamento nao ‘mais adotado ou ultrapassado, Quando, eventualmente, algum acérdio antigo forcitado, deve-se isso ao seu relevante aspecto historico, algo que procuramos, ‘na medida do posstvel, resaltar. Optamos por nao fazer citagao jurisprudencial em determinados artigos quando decisto recente nao fosse encontrada ou nao fosse satisfatoriamente elucidativa A obra nao tema presuncao de ser inédita, mas possui proposta diferenciada, contendo dados, informes e apresentagao inovadores em materia de Codigo Pe- nal comentaddo, Buscou-se fazer comentarios pormenorizados dos elementos dos tipos penais, especialmente os incriminadores, a fim de dispensar o estudante de consultas frequentes a outros livros, leis ou dicionarios, mesmo porque, diante dariqueza lingaistica do vernaculo, ha termos cuja significacio juridicaédiversa da coloquial Esforcamo-nos para atuar com imparcialidade em nossas posigies, a fim de ‘do constituir um manual de apoio primordialmente voltado ou a defesa out acusagio. Ao contrario, tivemos 0 empenho de afirmar 0 nosso pensamento aca- demico, que, mesmo que possa nao ser, para alguns, 0 mais correto, foi sempre explicta elealmente colocado. Apés a conquista dos titulos de Mestre e Doutor em Diteito Processtial Pe- nal, prestamos concurso para a cadeira de Direito Penal, sempre na Pontificia Universidade Catolica de Sao Paulo, onde atualmente lecionamos no cutso de graduacdo, sem deixar de atender a convites para ministrar aulas e conferéncias em cursos de pos-graduacio. Isso nos permit ainda mais, trocar idéias com advogados, promotores de justica, delegados de policia ecolegasda magistratura, e possibilitou que conhecéssemos o anseio por um Cadigo Penal comentado, que contivesse, como jd mencionado, sempre que posstvel, a posicao fundamentada do autor. Foi o que procuramos fazer. Eimperioso que agradecamos a todos aqueles que nos apoiaram nessa traje~ ‘ria, em especial aos integrantes das bancas que nos examinaram na Pontificia Universidade Catolica de Sao Paulo e, benevolentemente, apreciando nossos trabalhos, nos aprovaram, Merecedores dessa homenagem sao os Professores Doutores Hermfnio Alberto Marques Porto, nosso orientador, Dirceu de Mello, Luiz Alberto David Araujo, Osvaldo Henrique Duek Marques, Sérgio Seifi Sl ‘mura, Antonio Magalhaes Gomes Filho, Antonio Scarance Fernandes ¢ Antonio 26 Guilherme de Souza Nucct Luis Chaves Camargo, Além disso, nao poderiamos deixar dedemonstrar 0 nosso reconhecimentoaosalunosdobacharelado aos colegas dos cursos de pos-gradua- ‘io eextensio universitaria da Pontificia Universidade Catolica de Sto Palo, da Universidade Paulista, em especial a turma de 1995, da qual tivemos a satisfagao de ser paraninfo, da Universidade Braz Cubas, das Faculdades Metropolitanas Unidas, da Instituigio Toledo de Ensino, das Faculdades Integradas de Osasco, ‘da Escola Superior do Ministerio Pablico, da Escola Paulista da Magistratura, da Faculdade de Dizeito da Universidade Federal de Uberlandia, em especial atur- rma de 1998, do curso de pos-graduacao, do qual também tivemos a honra de ser paraninfo, do Instituto Internacional de Direito e do CPC ~ Curso Preparatorio para Concurso, de Sao Paulo, que nos permitiram proficuas trocas de ideias € 0 aprimoramento de conceitos, bem como aos profissionais com os quais tivemos asatisfagdo de conviver ao longo da carreira. O suporte da Biblioteca do Tribunal de Justiga de Sao Paulo foi fundamental, razao pela qual rendemos, também, 08 nossos agradecimentos aos seus dedicados funcionarios. Imprescindivel, ainda, ressaltar o apoio incondicional recebido do Prof. Dr. Antonio Carlos Marcato, incemtivador de todas as horas, desde o curso de graduacao da Faculdade de Direito da USR, passando pelo periodo em que cursamos a pds-graduacio lato senso da Universidade de Sao Paulo, até 0s dias presentes, Por derradeito, nosso reconhecimento’ Editora Revista dos Tribunais, pela confianca depositada neste trabalho, ‘S80 Paulo, agosto de 2000. OAuror SumARio Apresentagio.89.*edigao. 5 Apresentacio.8.*edicto 7 Apresentagi0a 7." edicto, 9 Apresentagio 6." edicao un Apresentagioa 5." edicto.. B Apresentaglo.a4: edigao. 15 Apresentagioa 3 edicao a Apresentagio a 2.*edicto 19 Apresentacioa I." edigao... 2 Tabua de abreviaturas 35 Parte Gerat An. 19 213 Segao! | Daspenas privativas Lead a 3 de iberdade Da Aplicagdo da Lei Penal | Att. 21.. 222 ae arf B 2a7| an. 33 ais ae 60 | 47 BT] An. 34. 339 ae a poe 252) an 35 at ant 42. 7s | 4% 25 257) ar. 36.. en AS, Ant 5°. 79] Titulo it AM. 37 347 AR. 62cm 96 | Dalmputabilidade Penal | an 38. ae AML 72mm 96) Att, 26 215 | AB 39 ccs 352 AM, B%ccouennsines 108] Art. 27 281 Art. 40 = An. 9 108 | Art. 28 284 | are 41 pa Art. 10 von M10 “Titulo v An 42 350 ae ~~ 12] De Concurso de Pessoas ant. 12 m2 Segio It An 29 25) Das penas restrtivas Titulo w AM 30. 301 ‘de direitos Do Crime An. 31 304! sas Bocce An 13 se 140 302 Titulov An 44 364 AM. Mbccnenncnnnne 162 Das Penas ATL 15 cescnnnnnnene 186 re 1) Ant. 16 soe 191 Capitulo! AML 46 arn 373 ‘An. 17... 195 | Dasespéciesdepena [AM 47 coco 375 Art 18 200! Art. 32 314 | Art 48 soon 376 Art Art Art Ant Art Art Ar. An. Art Art. Art Art An. Art Ant. Art, Art Ant Art Art Art Ant Art Art. Ant. Art An Seco tl Da pena de multa 49 50. 51 52 Capitulo i Da cominagdo das penas 33 54 3 56... sr 5 Capitulo tt Da aplicacio da pena 59 60 61. 2 0B oon OF ee 6 66. or 8 69. 70. 1. n Bu he 15. 7B scan - 386 Guilherme de Souza Nuect 380 | Art 3ei | Ar. 384 | Art, Art Art Art. 386 386 387 | Art 387 | Art 387 | Art Art Ant. Art Art Art #10 410 20 42 a4 an 427 | Art. 434 434 438 445 “47 450 463 463 465 467 | An. 474 | an. Ant. Art Capitulo V Da suspensdo TH 78. 79 vn 80... al 82... Capitulo V Do livramento condicional 83 8 85 86 BT 88 89 90 Capitulo Vi Dos efeitos da condenagao ae 22 Capitulo vit Da reabilitago 3 hav 95 Titulo Vi Das Medidas de Seguranca 96 97... condicional da pena 480 495, 503 303 504 505, 506 506 507 509 512, 514 516 317 519 520 Ant. 98.. sone 528. Ant, 99. 528 Titulo Vil Da Acao Penal Art 100. 531 Art. 101 533 ARTO cocnncnninee S34 Art, 103. 534 AME 104 on 535 Art, 105, 535 Art. 106. 535 Titulovin Da Extingao da Art. 107. 538 Att 108... 554 AM 109 ccscsnnnen S54 | Ant. 110.... 559 Ant 111 562 AM U2ecccnscannnsine 564 AR TB occu 565 An 114. 565 Ant 11S. 566 Ant. 116. 568 Art 117. oe 588 AM MB.occccnunsnin 573 574 Ant 120. 375 Pare Esreciat Titulo Dos Crimes contra a Pessoa Capitulo | Dos crimes contra a vida Art. 121 582 AML 22s 608 Susesnio 29 ou Capitulo Vi Capitulo tt ou Dos crimes Do roubo eda extorsio . ers) Coma aliberdade | 157. cena T3B individual AM L26.usnssnsine 616 AR ASB. 750 AM L2T 617 segio! Art. 159, 732 ete eee IT Dos crimes AR 160. 156 contraaliberdade Capitulo t pessoal | Capitulo mt Das lesées Ar M6ccccccce 690| PaUsurpagao corporais aoe 683 | Ar 161... 738 AM 129. 622 an 148, 685) AM 12a TOD Capitulo m | Art. 149, 7 Capitulov Papericasso an Dodano Gea Doscrimes contra | Art.163. 763 Co ainviolabiidade do | an. 164... 165 An. 130 638 domicitio nee tee ARBs HL] AR 150. ccnnnnne 694) a 166, eee AMIR 63 ou AM 167 cscs TOT Ant 133.. cs OS : Dos crimes contra a Cantuiv Art 134, - 647) inviolabilidade de eee Att 135 .ecmennnsnne 648 correspondéncia 2 apropriagao indébita An. 136, O51] AR Shenae TOL [ARN nnn 187 Ant 168. 770 (Sree 1) : Capitulo Iv Art. 169, sovvnnee TBT Darixa Segio An.170. a» 784 AR ABTovcnasssn 655) Doserimes contra a inviolabilidade dos Capitulo Vt Capitulov segredos Doestelionato Des cimes eo son TAL) S04 rues Contraa honra Ant 154. a TAS) Art 74 Are 138., 659 a 701 an.139 = Tilt x 709 Dos Crimes AB MO veers 668) contrac Patriménio | AFL 809 An. 141. . er An. 175. 802 AML 142... 673 Capitulo AM. 176.0 803 Ant 143, 676 Dofurto Ant 177 807 AIL Mosse OTT) AM ASS cscomoncen TAT) Att 178 813 AILS. 678) Art 156 ceo 733) Art. 179. 815 Capitulo Vit Da receptagio Art, 180. 816 Capitulo Vill Disposicdes gerais Art. 181 829 Att, 182.00 833 AME 183 oso 833 Titulo tt Dos Crimes contra a Propriedade imaterial Capitulo! Do crimes contra a propriedade intelectual Ant 184 835 ‘Art. 185 (Revogado pe- laLei 10.695/2003.)... 84+ AML 186.oncinnenne 84 Capitulo Dos crimes contra o privilégio de invengio ‘Art. 187 2191 (Revo- ‘gados pela Lei 9.279/ 1996.) soe 846 Capttulo mt Dos crimes contra as marcas de indiistria e comércio Art. 192.4 195 (Revo- ‘gados pela Lei 9.279) 1996.) 846 Capitulo IV Dos crimes de concorréncia desleal Art, 196 (Revogado pe- laLei 9.279/1996.) .... 846 Gullherme de Souza Nucet Titulo 1V Dos Crimes contra a Organizagac do Trabalho Art. 197, Art. 198. Art, 199. Art, 200... Art.20L... Art. 202. Art. 203. Att, 204.0 Art. 205, Art. 206... Art. 207... Titulov Dos Crimes contra 0 Anc218 Sentimento Religioso contra o Respeito Captiito mt 20s Mortos Do apto Capitulo! ‘Art. 219 (Revogado pe oettimes | Wael 11,10672005,) contraosentimento | Art-220 (Revogao pe- religioso tae 11.106/2005.) ‘Art. 221 (Revogado pe- : 865 Ane 208 laLei 1106/2005.) Captutot Art 222 (Revogado pe- Capt raat 1.106005), contra 0 respeito nen a0s mortos Disposicoesgeras Art.209, 868 | aro203, Art. 210.. 869 | are 224 ABZ ew 869 | an. 225 an212 871 | an.226 874 881 884 885 886 Titulo VI Dos Crimes: 0 contra os Costumes Capitulo! 847 | Dos crimes 850| contraalliberdade Aa sexual 52 | An 213. 53 | Att 214. 954 | ATE215. Att. 216.0 855 Att. 216-4... 860 861 Capitulo 1 862 Da seducao eda corrupgao 862 de menores ‘Ant 217 (Revogado pe- laLei11.106/2003.). 802 802 804 804 895 895, 896 904 907 Capitulo V Do lenocinio edo trfico de pessoas AM 27 cnn 908 APL 228. s10 (Are 210 eee O12 Att 230.0 918, Art. 231. 920 Art.231-A, 92 Ant. 232 sone 923 Capitulo i Do ultraje puiblico a0 pudor AME 233. 925 AML 234. ccunsnnenene 926 Titulovit Dos Crimes contra a Famili Capitulo 1 Dos crimes, contra o casamento Ant 235... . 931 AL 236 oo on 933, Att 237ccccrenennnns 935 ‘Art. 238. ~ 936 Art. 238, 937 Art. 240 (Revogado pe- la Lei 11.106/2005.)... 938 Capitulo Dos crimes contra estado de filiagao Art. 241 snes 938 Ant. 242, os 939 An. 243. on Sumi Capitulo ih Dos crimes contra a assisténcia familiar Art. 24 soos OL AM. 245 ccc 944 AM 246 corn 946 Aro] ene oay Capitulo 1V Dos crimes ‘contra o patrio poder, tutela ou curatela Art 248. oe 48 ATL 249 carcnnonenn 950 Titulo Vit Dos Crimes contra a Incolumidade Publica Capitulo 1 Dos crimes de perigo comum At 250 .cncsenensnan 953 Art. 251. 956 Att, 252. rors 957 Art, 253, - 958 Ant. 254, . 959 . 960 961 962 963 963 Capitulo it Dos ctimes contraa seguranca dos meios de comunicagao e transporte e outros servicos péblicos Art. 260. 964 Att, 261 ers 96 AT 262cnnennns 968 31 Ant. 263, 969 Ant. 264 snnee 970 Art. 265, om Art 266... 972 Capitulo i Dos crimes contra asatide publica Att, 267... eae 973) AM 208. ccccscseninene 973 Art 269, 976 AME 270.0 977 far 27 eee eee eal o7e AL 272 979 AML 27Bacscsensninine 981 Art. 274, 985 AM 275 co 986 A At 27s 988 Art.278. 990 Art. 279. 991 ARE. 280.00 991 Art. 281. Art. 282, At 283.0 Art. 284. | Art. 285.... 996 Titulo Ix Dos Crimes contra aPaz Pablica Art 286. oem 997 Ant. 287.. soon 998 Ant. 288. 998 Titulo X Dos Crimes contra aFé Publica Capitulo 1 Da moeda falsa Art. 289. 1003 Att. 290.0 1007 Art.291 su. 1008 Art 292.00 1010 Capitulo Da falsidade de tiulos e ‘outros papéis piblicos Att, 293. a. 10H Art. 294. .. 1018 Art. 295. 1019 Capitulo Wt Da falsidade documental Art. 296... 1019 Ant.297 1022 Ant. 298. 1028 APL 299. on 1030 Art, 300. 1035, Ant. 301 sus 1036 AME 302 ce 1038, Art. 303. 1039 Art 304. soe 1040 Art. 305. 1042, Capitulo IV De outas falsidades AL 306 ..scncsnninne LOM Ant 307. sons 1045 Art, 308, 1047 Art. 309, 1049 AM 310.0 1050 ‘Art. 31L 1051 Guitherme de Souza Nucet Titulo Xt Dos Crimes contra a ‘Administracio Pablica Capitulo Dos crimes praticados por funcionério publico contra a administragio em geral AML 312nnenene 1055 Art. 313. 1060 AM BIB-A cose 1061 Art 313-B so 1063 Art 314. 1064 AML 315 so 1065 An. 316, 1066 Art 317. 1071 Art. 318, 1075 AME 319 occrnsnoninens 1076 A B19-Avcscsosonene 1077 Att 320. sus 1080 Art. 321. vo 1081 Ant 322 . 1083 Ant. 323. sus 1084 Art 324 seosene 1085 Art. 325. 1087 Art. 326. 1091 Art. 327. 1091 Capitulo Dos crimes praticados por particular contra a administrago em geral Ar 328, 1093 Ar 329. 1094 A330 enenennes 1098 AML 331 1105 | Art.332... 1108 | Art. 333... 1109 AMI. 334.ccoccunsneee LIL AML 335. 7 Art. 336.. 1s AM 337 oun ans Ant. 337-4 sou 1120 Capitulo 1-A Dos crimes praticados por particular contra a Administracdo Pablica estrangeira Att 337-B vcveusesnee HOT AML 3B7-Cocennsnsnan WB2 Att 337-Dececncsenene M33 Capitulo it Dos crimes contra a administracao da justica AM 338. 1135 AM 338. 137 AL. 340. 144 sen TAS vow WAT _ 1158 1160 .. 1162 1163 116+ 1166 1168 1170 sens ITZ AM 352 eocsosonenenene MITE 175 . WT6 TT 1179 1180 _ 181 1182 Suazo 33 Capitulo IV. AM. 359-C..cssennee 1190 | Art 350-H... 1200 Dos crimes contraas } art 359-D... 1192 finangas piblicas AME 399-B cess HOS Disrosicoes Finats Ant 359-4. 115 | An. 350-F. 1196 | 49, 360.. ot AML 359-B cnn 1188 | Att 359-6. 1197 | Ant 361 201 Bibliografia 1203 Apendice. ssn 127 ‘Sumulas do Supremo Tribunal Federal em matéria penal... 1227 ‘Sumula Vinculante do Supremo Tribunal Federal em matéria penal. bose 1228 ‘Stimulas do Superior Tribunal de Justica em matéria penal. ss 1229 Indice Alfabético-remissivo. 131 TABUA DE ABREVIATURAS. AC ~Apelacio Criminal ADPF ~ Argiigdio de Descumprimento de Preceito Fundamental Ap.~Apelagio Ap. Crim. Apelagao Criminal Ap. Civ. ~Apelacao Civil ADIn ~ Agio Direta de Inconstituciona- lidade ‘Ag~Agravo AgExec. ~ Agravo em Execuco AgRg~ Agravo Regimental AL~Agravo de Instrumento Ajuris ~ Revista da Associagao dos juizes do Rio Grande do Sul BACEN~ Banco Central do Brasil Bol. AASP ~ Boletim da Associagao dos ‘Advogados de Sao Paulo Bol. IBCCrim~BoletimdoInstituto Brasileiro de Ciéncias Criminais Bol. TJSP — Boletim de Jurisprudéncia da Biblioteca doTribunal de Justica de Sao Paulo BMJ Boletim Mensal de Jurisprudéncia do Tribunal de Alcada Criminal de Sio Paulo C.-Camara CC -Cédigo Civil cit.~citado (a) J Conflito de Jurisdigéo CLT Consolidacao das Leis do Trabalho Cor. Pare, ~Correigo Parcial CP—Cédigo Penal CPC ~ Cédigo de Processo Civil CPP —Cédigo de Processo Penal Crim, ~Criminal CT Carta Testemunhavel CIN -Cédigo Tributario Nacional Den.~Dentincia Des. - Desembargador DJ—Didrio da Justiga DJU~ Diario da Justiga da Unido ECA ~ Estatuto da Crianga e do Adoles- cente ED~ Embargos Declarat6rios EL Embargos Infringentes Emb. Div. - Embargos de Divergéncia EV~Excegdo daVerdade Exur ~ Extradigao HC —Habeas corpus Ing.~Inquérito Policial TUF ~ Incidente de Uniformizacao de Ju- risprudéncia j.~Julgado em JC—Jurisprudéncia Catarinense JM~Jurisprudéncia Mineira J-Lex—Julgados do Tribunal deJustica(an- tiga Revista de urisprudénciadoTribunal de Justica de Sao Paulo R)TJESP) JSTF-Lex —Jurisprudéncia do SupremoTri- bunal Federal JST) ~Jurisprudéncia do Superior Tribunal de Justica JUBI—Departamento Técnico de Jurispru- dénciaeBibliotecadoTribunaldeJustica de Sao Paulo (boletim) JUTACRIM-SP — Julgados do Tribunal de Algada Criminal de S30 Paulo JUTARS ~ Julgados do Tribunal de Algada do Rio Grande do Sul LCP ~ Lei das Contravengdes Penais LEP ~ Lei de Execugao Penal LRF - Lei de Responsabilidade Fiscal MI-Mandado de injungao Min, — Ministro Ms -Mandado de Seguranga 36 Guilherme de Souza Nucct 1m.y.—maioria de votos ob.-obra p.—pégina PE ~Pedido de Extradicao PT—Peticio QC - Queixa-crime RA~Recurso de Agravo RBCCrim. — Revista Brasileira de Cigncias Criminais RC-Reclamagio RDA - Revista de Direito Administrative RDP— Revista de Direito Pablico RDTJRJ-Revista de Direito do Tribunal de Justiga do Rio de Janeiro RE-Recurso Extraordindrio Ree. ~ Recurso Criminal Ree. Adm. —Recurso Administrative rel.—Relator REsp— Recurso Especial Rev. ~ Revisio Criminal RF—Revista Forense RHC Recurso de Habeas Corpus RISTF ~ Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal RJDTACRIM - Revista de Jurisprudénciae Doutrina do Tribunal deAlcada Criminal de Sao Paulo RJTAMG— Revista de Julgados doTribunal de Alcada de Minas Gerais RJTJ-Revista de Jurisprudéncia doTTribunal de Justica (ex.: RITISP, RITIRS) RITIRJ- Revista de Jurisprudéncia do. ‘Tribunal de Justica do Rio de Janeiro RITIRS—RevistadejurisprudénciadoTribu- nal de Justica do Rio Grande do Sul RJTJSP— Revista de Jurisprudéncia do Tri- bbunal de Justica de Sao Paulo RMS ~ Recurso em Mandado de Seguran- ca RO Recurso de Oficio RSE~Recurso em Sentido Fstrito RSTJ- Revista do Superior Tribunal de Jus- tiga RT Revista dos Tribunais RTER — Revista do Tribunal Federal de Re- cursos RIJ— Revista Trimestral de Jurisprudéncia (STF RIJE-Revista Trimestral deJurisprudéncia dos Estados STF—Supremo Tribunal Federal ‘STJ~ Superior Tribunal de Justiga T-Turma t-Tomo TA-Tribunal de Algada TAPR—Tribunal de Alcada do Parané TACRIM/R§ — Tribunal de Alcada Criminal do Rio de Janeiro ‘TACRIMSP- Tribunal de Algada Criminal de Sao Paulo ‘TFR- Tribunal Federal de Recursos ‘TJ Tribunal de Justiga ‘TJM -Tribunal de justica Militar ‘TJMG ~ Tribunal de justica de Minas Gerais ‘TISP—Tribunal de Justica de So Paulo ‘TP—Tribunal Pleno ‘TRF ~ Tribunal Regional Federal VCP —Verificagio de Cessagao de Pericu- losidade ‘vat. — votacdo unanime Codigo Penal Decreto-lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940 0 Presidente da Republica, usando da atribus ‘20 que The confereo art. 180 da Constituic, ecretaa seguinte Let Parte GeRAL Titulo | Da aplicacao da Lei Penal: Anterioridade da lei Art. 1.9 Nao ha crime? sem lei’ anterior? que 0 defina.”* Nao hd pena!¥sem prévia cominacao legal." 1-A. Conceito de direito penal: é 0 corpodenormas uridicas voltado“fixagao dos limites do poder punitivo do Estado, instituindo infracoes penais e as sandes correspondentes, bem comoregrasatinentes asuaaplicacao. Para iriosautores, hdife- renga entre diveito penal e direito criminal, sendoesteabrangentedaquele, porque daria enfoque ao crime e suas conseqtiéncias ju- ridicas, enquantoesteseria mais voltadoao estudo da punigdo, Assim nao nos parece € tudonao passade uma op¢éo terminolégica. Jativemos, no Brasil, um Cédigo Criminal (1830), mas depois passamosadenominaro corpodenormasjuridicasvoltadoaocomba- teacriminalidade como Cédigo Penal (1890 £1940). Omesmoocorreemoutros paises, havendo oraa op¢ao pela denominacio de direito criminal (v.g., Gra-Bretanha), ora de direito penal (vg., Ita). 1-B. Direito penal objetivo e direito penal subjetivo: odireitopenalobjetivoéo corpodenormas uridicasdestinadoaocom- bateacriminalidade, garantindo adefesada sociedade, como exposto noitem anterior Emboraalgunsautoresdenominem direito penal subjetivo como o direito de punix do Estado, que surge apés 0 cometimento da infragao penal, parece-nos correta a visio de Anibal Bruno ao sustentar que inexiste, propriamente, um direito penal subjetivo, pois “o que se manifesta no exercicio da Justica penal é esse poder soberano do Es tado, um poder juridico que se faz efetivo pela lei penal, para que o Estado cumpra aasua funcdo origindria, que € assegurar as condigoes de existéncia e continuidade da ‘organizacto social. Reduzi-lo a um direi- to subjetivo falsifica a natureza real dessa funcdo e diminui a sua forca e eficécia, porqueresolveo episédio do crimeapenas emumconflito entre direitos do individuo edireitos do Estado” (Direitopenal—Parte -geral, t. 1, p. 34-35), 1-C. Evolucao do direito penal ees- colas penais: oser humano sempre viveu agrupado, enfatizando seu nitido impulso associativo elastreando, umno outro, suas necessidades, anseios, conquistas, enfim, sta satisfacao. Ensina Carrara que “€ falsa Guitherme de Souza Nucet 38 a transigao de um estado primitivo, de ab- solutoisolamento, para outro, modificado artificial. (..) 0 estado de associacao €0 Linico primitivo do homem; nelea propria Tei natural o colocou desde o instante de sua eriagao” (cf. Programa do curso de di- reito criminal, x.1,p. 18). Namesma otica ‘Anibal Bruno (Direito penal - Parte geral, t 1, p. 67). E desde os primérdios o set humano violou as regras de convivencia, ferindo semelhantes e a propria comuni- dade onde vivia, tornando inexoravel a aplicacao de uma punicao. Sem diivida, no se entendiam as variadas formas de ‘castigo como se fossem penas, no sentido técnico-juridico que hoje possuem, embo- ra nao passassem de embrides do sistema vigente. Inicialmente, aplicava-seasangao como fruto da libertagao do cla da ira dos deuses, em face dainfragao cometida,quan- doa reprimenda consistia, como regra, na expulsaodoagentedacomunidade,expon- do-o a propria sorte. Acreditava-se nas forcas sobrenaturais, que, por vezes, nto passavam de fendmenosda natureza,como a chuva ou o trovao, motivo pelo qual, quandoa punigaoera concretizada, imagi- nnavao povo primitivo que poderia acalmar 08 deuses. O vinculo existente entre os ‘membrosdeum grupo eradado pelototem, ‘que, na visio de Pessagno e Bernardi, “era ‘um animal, uma forca sobrenatural (ou uma planta, mas, preferencialmente, um animal) e se considerava vinculado, de ‘modo particular, aos individuos integran- tes de uma tribo, uma familia, uma casta ‘owumsetordacomunidade, que poderiam, ‘oundo, ser transmitidoshereditariamente, quando individualizados. Isto porque, a0 lado dos totens individuais, existiam os de sgrupo,demembrosdacomunidade, do cla a estabelecer-se entre eles uma hierarquia fe graduagio” (cf. Pierangeli, Das penas: tempos primitivos e legislacdes antigas, Eseritos uridico-penais,p.340). Narelagao totémica, instituiu-se a punigao quando houvesseaquebradealgum tabu (proibicao sagrada,ligadaas religides primitivas). Nao hhouvesse a sancao, acreditava-se que a ira dos deuses abrangeria todo o grupo. Atin- giu-se,emumasegunda fase, quese con- vencionou chamar de vinganga privada, ‘como forma de reagao dacomunidadecon- tra o infrator. Na realidade, a justiga pelas proprias mdos nunca teve sucesso, pois implicava,naesséncia, em autentica forma deagressao. Diante disso, terminavageran- do a indesejada contra-reagdo ¢ 0 circulo vicioso tendiaa levaraoexterminio de clas e grupos. 0 vinculototémico (ligacdo entre 0s individuos pela mistica e magica) deu lugar ao vinculo de sangue, que implicava na reuniao dos sujeitos que possufam a ‘mesmadescendencia. Vistumbrandoaten- dencia destruidora da vinganca privada, adveio o que se convencionou denominar de vinganca publica, quando o chefe da twibo ou do cla assumiu a tarefa punitiva, A centralizagao de poder fez nascer uma forma mais segura de repressio, sem dar ‘margem ao contra-ataque. Nessa época, prevaleciao critério do taliao (como expli- ca Pierangeli, o vocabulo vem de tals, ex- pressao de origem latina, cujo significado € que asangao deve ser tal qual o atentado ‘wo dano provocado, implicando no olho por olho, dente por dente, ob. cit., p. 343), acteditando-se queo malfeitor deveria pa- decer o mesmo mal que causara a outrem. Nao preciso ressaltar que assancOeseram brutais, cruéis e sem qualquer finalidade ‘itil, a nao ser apaziguar os animos da co- munidade, acirrados pela pratica da infra- cdo grave. No Oriente antigo, fundava-se apunigdo em caraterreligioso,castigando- se o infrator duramente para aplacar a ira dos deuses. Notava-se 0 predominio do talido, que, se mérito teve, consistiu em reduzir a extensio da punicao e evitar a infindavel onda de vinganca privada. Na 39 Cadigo Penal Comentalo Gréciaantiga, comoretrataramosfildsofos a epoca, a punicdo mantinha seu carater sacto e continuava a representa forte ten- dencia expiatoria e intimidativa. Em uma primeira fase, prevaleciaa vinganca de san- gue, que terminou cedendoespacoao talito € A composiclo. O Direito Romano, divi- dido em periodos, contou, de inicio, com a prevalencia do poder absoluto do pater familias, aplicando as sangdes que bem entendesse ao seu grupo. Na fase do reina- do, vigorou o caréter sagrado da pena, fit- mando-se o estigio da vinganca publica No periodo republicano, perdeu a pena o seu carater de expiacio, pois se separaram 0 Estado e 0 culto, prevalecendo, entao, 0 talido ea composigao. Havia, para tanto, a possibilidade de entregar um escravo para padecera pena no lugar do infrator, desde quehouvessea concordanciada vitima—0 quenao deixava de ser uma formadecom- posigdo, como bem lembra Pierangeli (ob, cit,,p. 366-368). A Lei das XII Tabuas teve ‘oméritodeigualarosdestinatariosdapena, configurando auténtico avanco politico- social. Durante o Império, a sancio penal tornou-se novamente mais rigorosa, res- taurando-seapena de morteeinstituindo- se os trabalhos forcados, Se na Republicaa pena tinha carter predominantemente preventivo, passou-seave-lacom oaspec- o eminentemente intimidativo. Mas foi também a epoca de significativos avangos na concepcao do elemento subjetivo do crime, diferenciando-se o dolo de impeto dodolode premeditacao,entreoutrascon- quistas, Continuavam aexistir,noentanto, as penas infamantes, cruéis, de morte, de trabalhos forcados e de banimento. O Di- reito Germanico, de natureza consuetudi- naria, caracterizou-se pela vinganca priva- daepela composicio, havendo, posterior mente, a utilizacto das ordalias ou juizos de Deus, Eram provas que submetiam os acusadosaos mais nefastos testes de culpa: itulo —_Da aplicagio da Lei Penal | caminhar pelo fogo, ser colocado em agua fervente, submergir num lago com uma pedra amarrada aos pés—e, caso sobrevi- vessem, seriam considerados nocentes;do contrério, aculpaestariademonstrada, nao sendo preciso dizer o que terminava ocor- rendonessas situacdes. Havia, também, os duelos judiciarios, em que acabava preva- lecendoa eido mais orte.O Direito Cané- nico, predominando na Idade Média, per- petuou 0 cardter sacro da puni¢ao, que continuava severa, mas havia,ao menos, 0 intuito corretivo, com vista a regeneracao docriminoso. Areligito eo poder estavam profundamente ligados nessa época e a heresiaimplicavaemcrimecontrao proprio Estado. Surgiram os manifestos excessos cometidos pela Santa Inquisicao, que se valia, inclusive, da tortura para extrair a confisso punir, exemplarmente, com medidas cruéis e publicas, os pretensos culpados. Inexistia, até entio, qualquer proporcionalidade entre a infragao come- tida ea punicdo aplicada. Vale mencionar, ainda, o estudo de Jodo Bernardino Gon- zaga,a respeito do direito penal no cenario indigena brasileiro: “O Direitoassim cons- tituido sera forcosamente esquematico, nebuloso, masnem porissodeixade repre- sentar um instrumento de conservacao da ordem publica. A reagdo nao fica entregue ‘aginteiroalvedrio da vitima, porque resul- ta de imposicao do pensamento coletivo. Emconsequencia, o quea Historia mostra cexistir em toda comunidade primitiva nao €a simples faculdade de vingar-se 0 ofen- dido ou seu grupo, mas odever de fazé-lo. O que varia € 0 modo de realizar-se a vin- {ganca, Se,num primeiro momento, perma- nece em largamargementregue adiscrigao da vitima, 0 progresso neste terreno con siste em restringir-se cada vez maisaliber- dade com que € exercida: na medida em que se aperfeicoa a organizacao coletiva, dda andrquica vinganca privada, emotiva e Gultherme de Souza Nucci 40 xgeradora de excessos, 0 aparecimento de tum Poder central leva inevitavelmente a0 seu cerceamento, Evolui-se para o talido, para a composicao pecuniaria; opéem-se limitesaintensidade da reacao, indicam-se aqueles que poderao sofré-Ia; e chega-se afinal asubstitwicao da vingancapelapena, cargo exclusivamente do Poder Publico” (O direito penal indigena. A época do des- cobrimentodo Brasil,p. 123).O destino da penaeraaintimidacdo pura, oqueterminou saturando muitos filésofos ¢ juristas, ate que, com a obra de Cesare Beccaria (Dos delitose das penas, 1764), nasciaacorren- tedepensamentodenominadaescolaclds- sica, Contrério a pena de morte eas penas crus, pregou Beccariao prinetpiodapro- porcionalidade da penaa infracao pratica- da dando relevoaodano queocrime havia causado a sociedade. O caréter humanita- rio presenteemsuaobrafoium marco para odireito penal, até porquese contraposa0 arbitrio¢ prepoténcia dos juizes, susten- tando que somente leis poderiam fixar pe nas, nao cabendo aos magistrados inter- pretd-las, mas somente aplicé-las tal como postas. Insurgiu-se contra a tortura como ‘meétodo de investigacdo criminal e pregou 0 principio da responsabilidade pessoal, buscando evitar que as penas pudessem atingir os familiares do infrator, o que eta fatocorriqueiroaté entéo. A pena, segundo defendeu, além do carater intimidativo, deveriasustentar-senamissiode regenerar © criminoso. Nesse perfodo, havia 0 pre~ dominio de duas teorias contrapostas: te oria da retribuicao (absoluta) e teoria da prevencio (relativa).A primeira (Carrara, Rossi, Kant, Hegel, entre outros) defendia queapenatinha finalidade eminentemen- teretributiva, voltada ao castigo do crimt- nnoso;asegunda (Beccaria, Feuerbach, Car- ‘mignani, entre outros) entendiaqueapena deveria ter um fim utilitario, consistente na prevengao geral e especial do crime. A escola cléssica encontrouseu grande repre- sentante e consolidador em Carrara, que se manifestou contrario a pena de morte © as penas cruéis, afirmando que o crime seria rutodo livre-arbitriodo ser humano, devendo haver proporcionalidade entre 0 crime easancioaplicada, Passou-seacon- siderar que a responsabilidade penal fun- dava-se na responsabilidade moral, justa- ‘mente porquese deuenfaseaolivre-arbitro. Ocrimepassouasertratadocomoumente Jjuridico endo comosimples fato do homem. (0 escopo da pena era retribuir o mal do crimecom oral dasancito, emborapudes- se haver~e até fosse desejavel que ocor- resse—aemendado infrator. Essasituaca no entanto, nao concerniaao direito penal. E diz Carrara: “O espetaculo de um delin- quente emendado edificante, éutlissimo moral publica: nisso convenho. E por isso abomino e me oponho a pena de morte; porque acredito firmemente na forca mo- ralizadorado espeticulode um delingiien- teemendado; enaoacredito, absolutamen- te, na forca, que com temerario cinismo ouvi chamar moralizadora, do espetéculo de uma cabeca decepada, exibida ao povo. Nessa cenade circo ex vejo, ao inves, todos 08 embrides da depravacao do povo. Um criminoso emendado, porém, ao prego da atenuacao da pena merecida € uma excita- ‘cao delingaéncia; 6 um escandalo politi- co. Considero, pois, utilissima a reforma dovéu, aser procuradacom toda diligencia, ‘mas completamente fora do circulodoma- gistério penal” (cf, Programa do curso de direito criminal, v.11, p.92). Coma publi- ‘cago dolivro Ohomemdelingiiente (1876), de Cesare Lombroso, cravou-se omatco da linha de pensamento denominada escola positiva, Lombroso sustentow que o ser humano poderia ser um criminoso nato, submetido a caracteristicas proprias, ori- ginarias de suasanomaliasfisico-pstquicas. essa forma, ohomem nasceria delinquen- cm Codigo Penal Comentado Titulo | Da aplicagio da Lei Penal te, ou seja, portador de caracteres impedi- tivos de sua adaptacio social, trazendo como conseqiencia ocrime, algo natural- ‘mente esperado. Nao haveria ivre-arbitrio, ‘mas simples atavismo. A escola positiva deslocou o estudo do direito penal para 0 campo da investigagao cientifica, propor: cionando o surgimento da antropologia criminal, apsicologia criminal edasocio- logia criminal, Ferri e Garofalo foram dis- cipulos de Lombroso e grandes expoentes da escola positiva, sobretudo o primeiro, Defendeu Ferri que o ser humano seria responsivel pelos danosque causasse sim- plesmente porque vivia em sociedade. Ne- ou terminantemente o livre-arbitrio, de- fendido pela escola classica, Assim, 0 fun- damento da punigao era a defesa social. A finalidade da pena consubstanciava-se, primordialmente, na prevencio a novos crimes, Nao ha diivida que a escola positi- vva exerceu forte influéncia sobre o campo daindividualizacao dapena, prinefpio que rege 0 direito penal até hoje, levando em consideracdo, por exemplo, a personalida- dee a conduta social do delinquiente para o estabelecimento da justa sancao. Varias otras escolas surgiram apés aclassica ea positiva, buscando conciliar os prinefpios de ambas, mas nenhuma delas atingiu 0 ‘rau de consisténcia das primeiras, Deno- minaram.se escolas ecleticas, Apreciando as imtimeras escolas penais, professa Fre- detico Marques que, na escola clissica, houve excesso de preocupacio com o ho- mem abstrato, sujeito de direitos, elabo- rando suas ideias com o método dedutivo do jusnaturalismo, enquanto na escola positiva houveuma hipertrofianaturalista, preocupando-se em demasia com as leis fisicas que regemo universo,emdetrimen- tw daespiritualidade da pessoa humana. A escola eclética denominada técnico-juri- dica, por sua vez, baseou-se na hipertrofia dogmatica, sem grande contetido, Enfim, conclui, “o Direito Penal deve estudar 0 ‘criminoso como espirito ¢ matéria, como pessoa humana, em face dos principios éticosa que esta sujeito e das regras juridi- ‘eas que imperam na vida social, e também anteas eisdo mundo natural que heafetam parte contingente e material” (Tratado de direito penal, v1, p. 110-111). Apds a Se- gunda Grande Guerra, novos estudos de direito penal provocaram o surgimento do movimento denominadonovadefesasocial Segundo licao de Oswaldo Henrique Duck Marques, afasta-se do positivismo e voltaa afirmar o livre-arbitrio como fundamento da imputabilidade, demonstrando que 0 crime € expressio de uma personalidade tunica, sendo impossivel haver a padroni- zacao sugerida pela escola fundada por Lombroso. A nova defesa social reconhece que a prisio é um mal necesssirio, embora posta imimerasconseqiiencias negativas, devendo-se, no entanto, abolir @ pena de morte, Prega,ainda, adescriminalizacaode certas condutas,especialmenteaquelasque so consideradas crimes de bagatela, evi- tando-se oencarceramentoindiscriminado, E arremata: “Os postulados tracados pela Nova Defesa Social parecem mais condi- zentes com a tealidade atual e com uma visdo progressista do ireito Penal, umavez que nao perdem as conquistas relativas & protegioaosDireitosHumanos, alcancados nas ultimas décadas” (cf. Fundamentos da pena, p. 100). Deve-se, ainda, dar relevo & teoria surgida nas wltimas décadas, deno- minada teoria da prevengdo geral positiva, reafirmando que a pena nao serve para in- timidar criminosos, mas apenas para rea~ firmar a “consciencia social da norma”, demonstrando a sua vigencia por meio da aplicacdo da sancao penal. A teoria da pre- vvencao geral positiva divide-se em: a) fun- damentadora (Jakobs), sustentando que a aplicagiodapenatemo poder deevidenciar que o agente do crime nao se conduziu Guilherme de Souza Nucci #2 corretamente, servindo de orientagdo aos cidadios para o cumprimento das normas em geral, com funcao educativa. Por isso, € conteatia ao direito penal minimo; b) limi- tadora (Roxin, Mir Puig, Silva-Sinchez), reafirmando as bases da anterior, embora pregando queaintervencao do Estadodeve serlimitada, Narealidade, em nosso enten- dimento, pena possui carter multifaceta- do, implicando em retribuigdo, o que con- tinuaa imperarno inconsciente coletivo da sociedade, bem comono propriotextolegal (art. 59, CP), além de significar prevencao geral positiva (reafirmacao dos valorese da efetividade do direito penal) enegativa (in- timidagao a sociedade) e prevencio indivi- dual positiva (reeducacao) ¢ negativa (reti- radadocondenado doconviviosocial quan- do necessério), Abordamos o tema, com maiores detalhes, no titulo relativo a pena. Desde logo, remetemos o leitor para nosso livro intitulado Individualizagao da pena. 1-D. Politicacriminal:paraunsécién- cia; para outros, apenasuma técnicaouum método de observagao candlise criticadodi- reitopenal. Parece-nos que politicacriminal éummododeraciocinareestudarodireito penal, fazendo-o de modo eritico, voltado a0 direito posto, expondo seus defeitos, sugerindo reformas e aperfeicoamentos, bem como com vistas 2 criagio de novos institutos juridicos que possam satisfazer as inalidades primordiais de controlesocial desse ramo do ordenamento. A politica criminal se da tanto antes da criagao da ‘norma penal como também por ocasiao de suaaplicagao, EnsinaHeleno Fragosoqueo nome depolitica criminal foidado aimpor- tantemovimentodoutrinatio,devidoa Von Liszt, que teve influéncia como “tendéncia técnica, emfacedalutadeescolaspenais, que havianoprincipiodesteséculonaltiliaena Alemanha, Essa corrente doutrinaria apre- sentava solucdes legislativas que acolhiam as exigencias de mais eficiente repressio a criminalidade, mantendo as linhas bsicas do Direito Penal clissico”. E continua o autor, afirmando que o termo passow a ser utilizado pela ONU para denominaro “cr: tério otientador da legislagao, bem como 0s projetos e programas tendentes & mais ampla prevencao do crime e controle da criminalidade” (Ligdes de direito penal, p. 18). Ver, ainda, oconceito feito por Roberto Lyra,nanota abaixo, Estabelecendoadife- rengaentre politica criminal ecriminologia (cujoconceitoseravistonanota 1-E), Sérgio Salomao Shecairadizque “aquelaimplicaas estratégiasaadotarem-se dentro do Estado rho que concerne a criminalidade ¢ a seu controle; jaa criminologia converte-se,em face dapoliticacriminal,emumaciénciade referencias, na base material, no substrato teoricodessaestratégia. A politica criminal, pois, nao pode ser considerada uma ciéncia igual 8 criminologia e ao direito penal. E ‘uma disciplina que nao tem um metodo proprio e que esta disseminada pelos di- versos poderes da Uniao, hem como pelas diferentes esferas de atuacdo do proprio Estado” (Criminologia, p. 41). 1-E, Criminologia: ¢ a ciencia que se volta a0 estudo do crime, como fendmeno social, bem comodo criminoso,comoagente do ato ilicito, em visio ampla e aberta, nao ssecingindo analise da norma penal e seus efeitos, mas sobretudo as causas que levam Adelingiéncia, possibilitando, pois, oaper- feicoamentodogmaticodosistemapenal. A criminologiaenvolveaantropologia criminal (estudo da constituigdo fisiea e psiquica do delinqieente) ~ inaugurada por Lombroso comaobraOhomemdelingtiente—,bemcomo apsicologia criminal (estudo do psiquismo do agente da infracao penal) ea sociologia criminal (estudo das causas sociais da cri- minalidade). Roberto Lyra inclui,ainda,no seucontextoapolticacriminal,definindo-a comoa'‘ciencia que estuda:a)ascausaseas concausas da criminalidade e da periculo- 43 Codigo Penal Comentado Titulo I~ Da aplicagio da Lei Penal sidade preparat6ria da criminalidade; b) as ‘manifestacdese osefeitosdacriminalidadee apericulosidade preparat6riadacriminali- dade;c) apoliticaa opor, assistencialmente, a etiologia da criminalidade e da periculo- sidade preparatoria da criminalidade, suas manifestacdeseseusefeitos” (Criminologia, .39). Earremata,afirmandoque, enquanto acriminologia “considera, verticalmente,a criminalidade (conceito criminologico)",0 direito penal “considera, horizontalmente, crime (conceitojuridico)” (ob. ci.,p.51) Nas palavras de Sérgio Salomao Shecaira “criminologiaéumnomegenéricodesignado um grupo de temasestreitamente lgados: oestudo ea explicacio da infracio legal 0s ‘meios formaise informaisde queasociedade se utiliza para lidar com o crime e com atos desviantes;anatutezadas posturascom que as itimasdesses times erdoatendidas pela sociedadle;e, porderradeiro,oenfoque sobre © autor desses fatos desviantes” (Crimino- logia, p.31). 1-F. Principios de direito penal: eti- mologicamente, principio tem varios sig- nificados, entre os quaisodemomento em {que algo tem origem; causa prizndria,ele- mento predominante na constituigao de ‘um corpo organico; preceito, regra ou lei; fonte ou causa de uma acio. No sentido Juridico, naose poderiafugirde tisnocdes, de modo que o conceito de principio indi- ca uma ordenacio, que se iradia e imanta 0 sistemas de normas, servindo de base paraa interpretacao, integracao, conheci- mento € aplicacao do direito positivo. Ha principios expressamente previstosem ei, enquanto outros esto implicitos no siste- ‘manormativo, Existem, ainda, osqueestao ‘enumerados na Constituicio Federal, de- nominados de principios constitucionais, servindo de orientagao para a producto legislativa ordinaria,atwando como garan- tias diretas e imediatas aos cidadaos, bem como funcionando como critérios de in- terpretacdoe integracio do texto constitu: cional (ver nosso Jiiri~ Principios consti- fucionais, p. 12-17). Dentre estes encon: tramos, igualmente, os explicitos € os implicitos. Regem o direito penal brasilei- Toosseguintesprincipios: I~constitucionais explicitos: a) principio da legalidade ou da reserva legal: trata-se do fixador do con- tetido das normas penais incriminadoras, ‘ou seja, 0s tipos penais, mormente os in- eriminadores, somente podem sercriados através de leiem sentido estrito, emanada do Poder Legislativo, respeitado o proces- so previsto na Constituigdo (ver a nota + aoart. 1.°), Encontra-se previstonoart. 5°, XXXIX, da CE bem como no art. 1.° do ‘Codigo Penal; b) principio da anteriorida- de: significa que uma lei penal incrimina- dora somente pode ser aplicada a um fato cconcreto, caso tenha tido origem antes da pritica da conduta para a qual se destina, ‘Como estipulam o texto constitucional ¢ © art, 1° do Codigo Penal, ‘nao ha crime sem lei anterior que o defina’, nem tam- pouco pena "sem prévia cominacao legal” (destacamos). Denadaadiantariaadotarmos oprinespio da legalidade semacortespon- denteanterioridade, poiscriarumalei, apos ‘ocometimento do fato, pretendendo apli- céclaa este, seria totalmente inttil para a seguranca que a norma penal deve repre- sentar a todos 0s seus destinatarios. O in- dividuo somente esta protegido contra os abusos do Estado caso possa ter certeza de que as leis penais sao aplicaveis para o fu- turo,apartir de sua criacao, nao retroagin- do para abranger condutas jrealizadas; c) principio da retroatividade da lei penal be= néfica (ou principio da irretroatividade da lei penal): significa que a lei penal nao re- twoagira para abranger situacées ja conso- lidadas, sob o império de legislacao dife- renciada, Logo, quando novas leis entram em vigor, devem envolver somente fatos coneretizados soba sta égide, Abre-se ex- Guilherme de Souza Nucci 44 ceeaoairretroatividadequando ingressamos no campo das leis penais benéficas. Estas podem voliar no tempo para favorecer 0 agente, ainda que o fato tena sido decidi- dopor sentencacondenatstia, com transi- to em julgado (art. 5.°, XL, CF; art. 2.°, paraigrafo unico, CP); d) prinefpio da per- sonatidade ou da responsabilidade pessoal: significa que a punigdo, em matéria penal, nao deve ultrapassar da pessoa do delin- aqiiente. Trata-se de outra conquista do di- reito penal modemo, impedindo que ter- ceiros inocentes € totalmente alheios a0 crime possam pagar pelo que nao fizeram, nemeontribuiram para quefosse realizado. ‘familia do condenado, por exemplo, no deve ser afetada pelo crime cometido, Por isso, prevé a Constitui¢ao, noart, 5.°, XLV, que “nenhuma pena passaré da pessoa do condenado”. Isso ndosignificaque naohaja possibilidadede garantira vitimado delito a indenizacao civil ou que o Estado nao ;possa confiscar o produto do crime alias, ‘oqueo proprio art. 5. XLY, prevé; ) prin- celpio da individualizagdo da pena: quer dizer queapenanio deve serpadronizada, cabendo a cada delingdente a exata medi- da punitiva pelo que fez. Nao teriasentido igualar os desiguais,sabendo-se, porcerto, ‘que a pratica de identica figura tipica nao <ésuficienteparanivelardoissereshurmanos. ‘Assim, justo ¢ fixar a pena de maneira individualizada, seguindo-se osparametros legais, mas estabelecendoa cada um o que Theé devido. Eo que prevéoart. 5.°, XLVI, dda Constituicao, Sobreo tema, em maiores detalhes, consultar 0 nosso trabalho Indi- vidualizagiio da pena; ) principio da huma- nidade: significa que o direito penal deve pautar-se pela benevolencia, garantindo o bem-estar da coletividade, incluindo-se 0 dos condenados. Estes nao devem ser ex- cluidos da sociedade somente porque in- fringiram a norma penal, tratados como se no fossem seres humanos, mas animais oucoisas. Porisso, estipulaa Constituicto quenaohaverd penas: 1) demorte (excecdo feitaa epoca de guerra declarada, conforme previsdo do Codigo Penal Militar); 2) de carater perpétuo; 3) de trabalhos forgados; 4) de banimento; 5) cruéis art.5.°,XLVID, bem como que devera ser assegurado 0 respeito integridade lisica e moral do reso (art. 5.°, XLIX), Narealidade, houve, em nosso entendimento, um desvio na redacio desse inciso. Oquea Constituicao proibesioas penascruéis (género),doqual sao espécies as demais (morte, perpétua, ‘trabalhados forcados, banimento). Efaltou, dentreasespecificas, descreveras penasde castigos corporais. Logo, a alinea e do in- ciso XLVI do art. 5.° da Constituicao Fe- deral ¢ 0 genero (penas cruéis); as demais representamasespécies;Il-constitucionais implicitos: a) principio da intervengao mi- rnima (ou da subsidiariedade): quet dizer ‘que o direito penal nao deve interferir em demasiana vidado individuo, retirando-lhe autonomia e liberdade. Afinal, «lei penal nao deve ser vista como a primeira opcto (prima ratio) do legisladot para compor os conflitos existentes em sociedade e que, peloatualestagio de desenvolvimentomo- ral ético da humanidade, sempre estardo presentes. Ha outros ramos do direito pre- paradosa solucionar as desavencas lides surgidas na comunidade, compondo-as sem maiores conseqincias. O direito pe- nal é considerado a ultima ratio, isto €, a uiltima cartadado sistemallgislativo, quan- do se entende que outra solucao nao pode haver sendo. criacto de lei penal incrimi- nadora, impondo sancao penal ao infrator. Como bem assinala Mercedes Garcia Aran, “odireito penal deve conseguir a tutela da paz social obtendo o respeito a lei e aos direitos dos demais, mas sem prejudicar a dignidade,o livre desenvolvimento da per- sonalidade ou a igualdade e restringindo ‘a0 minimo a liberdade” (Fundamentos y 45 _Cédigo Penal Comentado Titulo |~ Da aplicagio da Lei Penal | aplicacién de penasymedidasde seguridad en el Cédigo Penal de 1995, p. 36). Caso0 bem juridico possa ser protegido de outro modo, deve-se abrir mao da opcao legisla- tiva penal, justamente para nao banalizar ‘apunicao, tornando-a, porvezes, ineficaz, porque nao cumprida pelos destinatirios danormae nao aplicada pelos 6rgaos esta- tais encarregados da seguranca publica. Podemos anotar que a vulgarizagio do di- reito penal, como normasolucionadorade qualquer conflito, pode levar ao seu des- crédito. Atualmente, somente para exem- plificar, determinadasinfragoes de transito ‘posstem punigdes mais temidas pelosmo- toristas, diante das elevadas multas e do ganhodepontosno prontuario,que podem levaraperdadacarteirade habilitagao—tudo isso, sem o devido processo legal, do que ‘aaplicacao de uma multa penal, sensivel- mente menor. Enfim, o direito penal deve servisto como subsididrioaosdemaisramos do direito. Fracassando outras formas de punigao ede composicao de contflits, lan- sa-se mio da lei penal para coibir compor- tamentos desregrados, que possam lesionar bensjuridicos tutelados. Luiz Luisisusten- ta que o Estado deve evitar a criacao de infracbes penais insignificantes, impondo penas ofensivas a dignidade humana, Tal postulado encontra-se implicito na Cons- Aituicao Federal, que assegura direitos in- Violaveis, comoa vida, aliberdade,aigual- dade, a seguranca e a propriedade, bem como colocando como fundamento do Estado democratico de direitoadignidade da pessoa humana. Dat ser natural que a restrigdo ou privacao desses direitos invio- laveis somente se torne possivel caso seja estritamente necessaria a imposicao da sancao penal, paragarantirbensessenciais aohomem (cf, Osprincipiosconstitucionais penais,p, 26). Ndo menos correta€a visio de Anabela Miranda Rodrigues ao dizer ‘que, “naverdade,namaisrecentedefinigao de bem juridico, independentemente da diversidade de formulagoes, 0 ponto de partida ¢ 0 de que o bem juridico possui natureza social e 0 de que o direito penal s6 deveintervir para prevenir danossociais € nao para salvaguardar concepedes ideo- logicas ou morais ou realizar finalidades transcendentes”, E continua, firmando entendimento de que “a premissa de base continua a ser ade que o hodierno Estado de diteito € informado pelo principio do pluralismo eda tolerancia, daqui se dedu- zindo, ainda mais uma vez, que a pena estatal nao pode ser legitimamente aplica- da para impor o mero respeito por deter- minadas concepgdes morais. Desta orien- tacto axiol6gica do sistemaconstitucional derivaria, pois, um principio vinculantede politica criminal: 0 direito penal tem por funcao apenas preservar as condicdes es- senciais a uma pacifica convivencia dos individuos-cidadaos, s6 nesta medida lo- grando, pois, legitimidade a intervencio Jjuridico-penal” (A determinagdoda medida da pena privativa de liberdade, p. 268 € 282-283). Ilustrando a questdo ¢ demons- trando que o ordenamento juridico penal brasileiro nao prestigia o principio ora co- mentado, pode-se encontrar acérdao do STF debatendoaconfiguracio (ounao) da contravencao penal de perturbacio do sos- sego (art. 42, LCP). A correria e os objetos arremessadosao chao noapartamento onde reside oacusadoeseuscinco ilhos, meno- res de dez anos, serviriam para configurar 0 tipo penal da contravencao? O Pretorio Excelso reunit-se para deliberar que “o bem juridico tutelado € a paz publica, a tranqdilidadedacoletividade, nfo existin- do a contravencao quando 0 fato atinge ‘uma tinica pessoa” (HC 85.032, 2.*T. rel. GilmarMendes, 17.05.2005). Comadevi- davenia, naose tratade questaopenalmen- terelevante, aponto de mobilizar o Supre- mo Tribunal Federal, oqueevidenciaestar Guitherme de Souza Nucci 46 © ordenamento juridico penal totalmente defasado emrelagio a0 queseesperade um “direito penal minimo”; b) principio da fragmentariedade: significa que nem todas aslesdesa bens uridicosprotegidosdevem ser tuteladas e punidas pelo direito penal, pois este constitui apenas uma parte do ordenamento juridico. Fragmento éapenas parte de um todo, razio pela qual odirei- to penal deve ser visto, no campo dos atos ilicitos, como fragmentirio, ou seja, deve ‘ocupar-se das condutas mais graves, ver- dadeiramente lesivasa vida em sociedade, passiveis de causar disturbios de monta a seguranca piiblica ea liberdade individual. O mais deve ser resolvido pelos outros ra- mos do direito, através de indenizacdes civis ou punigoes administrativas. Nao deixa de ser um corolario do prinetpio da intervenc4o minima ou dasubsidiariedade do direito penal. Pode-se, ainda, falar em fragmentariedadede 1-grauede2. grau. Aprimeirarefere-se forma consumadado delito, ou seja, quando o bem jurtdico pre- cisa ser protegido na sua integralidade. A segunda cinge-se a tentativa, pois se pro- tegeoriscode perdaoudelesio, bemcomo a lesao parcial do bem juridico (cf José de Faria Costa, Tentativa e dolo eventual, p 21-22);¢) principio da culpabilidade: quer dizer que ninguém seré penalmente puni- dosenao houveragido com dolo ou culpa, dando mostras de que a responsabilizacao nao deve serobjetiva, massubjetiva (mullum ‘erimen sine culpa). Trata-se de uma con- quista do direito penal moderno, voltado a idéia de que a liberdade € regra, sendo excecio a prisao oma restricao de direitos. Além disso, o proprio Cédigo Penal esta- belece que somente ha crime quando esti- ver presente 0 dolo ou a culpa (art. 18). Note-se,ainda,aredacto do paragrafo ini- co desse artigo: “Salvo os casos expressos ‘em kei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senao quando o pra- tica dolosamente”. Assim, a regra adotada € buscar, para fundamentar ¢ legitimar a unico, naesfera penal, odolo do agente. Nao o encontrando, deve-se procurar a culpa, desde que expressamente prevista, comoalternativa,no tipo penal incrimina- dor. Emhipsteses extremadas, devidamen- teprevistasemlei, pode-seadotararespon- sabilidade penal objetiva, fundada em ato voluntario do agente, mas sem que, no ‘momento da praticadacondutacriminosa, estejam presenteso dolo ou aculpa, como ocorre com a embriaguez voluntaria (art 28,1, CP). Paramaisdetalhes, consultara nota 17 a0 art. 28. O prinefpio € expresso no Cédigo Penal (art. 18), mas implicito na Constituicdo, onde encontra respaldo nna busca porum direito penal de interven- ‘¢do minima, com fulero na meta estatal geraldepreservacao dadignidadedapessoa humana, Naotica de Jescheck, o principio da culpabilidade serve, de um lado, para conferiranecessiria protectodo individuo em face de eventual excesso repressivo do Estado, fazendocomquea pena, por outro, circunscreva-se as condutas merecedoras de um juizo de desvalor ético-social (cf. Tratado de derecho penal ~ Parte general, .25-26):d) principioda taxatividade:sig- nifiea queas condutas ipicas, merecedoras de punicdo, devem ser suficientemente claras e bem elaboradas, de modo a nao deixar divida, em relagio ao seu cumpri- mento, por parte do destinatério danorma. Aconstrugio de tipos penais incriminado- resdibios e repletos de termos valorativos -vagos pode dar ensejo ao abuso do Estado na invasio da intimidade e da esfera de li- berdade dos individuos. Alids, nao fossem 60s tipos taxativos—limitativos, restritivos, precisos ~e de nada adiantaria adotar 0 principiodalegalidade ouda reserva legal. Esteéum principio decorrente,nitidamen- te, da legalidade, logo, éconstitucional im- plicito. Ensina Luiz Luisi que “o postulado 47 Codigo Penal Comentado emcausaexpressaaexigenciadequeasleis penais, especialmente as de natureza incri- minadora, sejam claras e 0 mais possivel certase precisas. Trata-se de um postulado dirigido ao legislador vetando ao mesmo a elaboragdode tipospenaiscomautilizacao de expressoesambiguas, equivocase vagas demodoaensejardiferentese mesmo con- trastantes entendimentos. O principio da determinacio taxativa preside, portanto,a formulagao daleipenal, aexigirqualificacto ecompeténciado legislador, eousoporeste de técnica correta e de uma linguagem ri- gorosa e uniforme” (cf. Osprincipios cons- titucionais penais, p. 18); e) principio da Proporcionalidade: quer dizer queas penas devem ser harmonicas coma gravidade da infragao penal cometida, nao tendo cabi- ‘mento oexagero,nem tampoucoaextrema liberalidade na cominagao das sangbes nos tipospenaisincriminadores, Nao eriasen- tido punir um furto simples com elevada pena privativa de liberdade, como também nio seria admissivel punir um homicidio com pena de multa. A Constituicao, a0 es- tabelecerasmodalidadesde penas quealei ordinaria deve adotar, consagra a propor- cionalidadede maneira implicita,corolario natural da aplicacao da justica, que € dara cadaum oqueéseu, pormerecimento. Fixa o art. 5°, XLVI, as seguintes penas: 1) pri- vagio ou testrigaoda liberdade; 2) perda de bens; 3) multa; 4) prestacao social alterna- tiva;5) suspensio ou interdicao de direitos. Nodizer de MariangelaGamade Magalhaes Gomes, “a circunstancia de o principio da proporcionalidade nao estar expresso na Constituicao brasileira ndoimpedequeseja reconhecido em vigor também aqui, invo- cando 0 disposto no § 2.° do art. 5.°° (0 principio da proporcionatidade no direito penal, p. 63); 0 principio da vedagao da duplapunicéo pelo mesmo fato:significaque rninguem deveser processadoepunidoduas vezes pela pratica da mesma infragao penal Titulo I~ Da aplicagio da Lei Penal (ne bis in idem). Tal garantia esta prevista implicitamente na Convencéo Americana sobre Direitos Humanos (art.8°,4).Senao ha possibilidade de processar novamente quem jé foi absolvido, ainda que surjam nnovas provas, € l6gico nao ser admissivel puniroagenteoutra vez pelo mesmo delito. Vera nota 92 a0 art. 8.° 1.G. Dignidade da pessoa humana: haalgunsautores, noBrasil,quesustentama existenciado principio penaldadignidadeda pessoa humana, afirmando seroregentedos demaiseconcluindoque toda leiqueviolara dignidadedapessoa humanaseriainconstitu- ional. Emborasejanitidaacarénciade uma definigdo do que venhaa ser tal principio, especialmente a luz do direito penal, bem como ainda que se possam reconhecer os bonssentimentose propésitosdaquelesque assim pensam, nao podemosaquiescerque se rate de um principio penal. A dignidade dapessoahumana ouseja,orespeito devido peloEstadoaoserhumano,individualmente considerado, nao podendo ser sacrificado emnnome do interesse coletivo (cf. Manoel Goncalves Ferreira Filho, Comentarios é Constituigao brasileira de 1988, p. 19),€ ‘uma meta geral, abrangendlo toda aface do Estado Brasileiro e, conseqtientemente, do Estado Democratico de Direito, Nessa esteira, Celso Bastose Ives Gandra Martins dizemquea “referencia dignidadeda pes- soa humana parece conglobar em si todos aqueles direitos fundamentais, quer sejam os individuais, clissicos, quer sejam os de fundo econdmico e social. (..) Portanto, 0 queele estaa indicar é que éum dos fins do Estado propiciar as condicdes para que as pessoasse tornem dignas” (cf. Comentérios 4 Constituigéo do Brasil, v. 1, p.425). Ora, daitorna-se facil observar que a dignidade dapessoa humanaé umametaaseratingida pelo Estado e pela sociedade brasileira, nada tendoaver com um principio penal espect- fico, Quem praticahomicidio, porexemplo, Guitherme de Souza Nucci merecendo punigio, ofendeu a dignidade da pessoa humana, Logo, todas as normas penais estio, em conjunto, protegendo 0 respeito ao ser humano e seus valores fun- damentais. Nao se trata de um principio penal, mas tio-somente de um firidamento do Estado Democratico de Direito 1-H. Lesividade (ou ofensividade) incipio dedireito penal:haquem. sustenteaexistenciaautonomado principio dalesividade (ouda ofensividade),alegando quesomente podemser criadostipos penais incriminadores capazesde ofenderumbem juridico alheio, devidamente tutelado. Em ‘outras palavras, nao se poderia aceitar a incriminagao de uma conduta nao lesiva ~ou provocadora de infima lesio ~a bem juridico determinado. Fundam-seosautores cemdireitosconstitucionaiscomo intimidade, liberdade, vida privada etc. (por todos, cf. Paulo Queiroz, Direito penal—Parte geral, p. 46-47). Permitimo-nos discordar. Nao deixamos de aceitar o pontode vistade que odireito penal deve se ocupar de condutas graves, ofensivasa bens uridicosrelevantes, evitando-sea intromissao excessivanavida privadadecadaum,cerceandoemdemasiaa liberdadealheiae expondo ao rdiculo, mui- tas vezes,o ser humano, buscando puni-lo porfatosnitidamente irrelevantesaos olhos da imensa maioria da sociedade. Nao se tratariade um direito penal tipico do Estado Democtatico de Direito, masdeum Estado totalitirio e intervencionista. Porém, nao ‘vemos 0 nomeado principio da lesividade como algo auténomo, com vida propria, distinto, pois, do principio da intervencao ‘ménima, Afinal, em homenagem a ultima ratio, deixa-se a0 direito penal oambito da tipificacio das condutasmaissérias,efetiva- ‘mente lesivasa interessestelevantes. Punir pensamentos, porexemplo, seria piceda invasio de privacidade do individuo. Ofen- deriaodenominado principiodalesividade? Narealidade, atacariaa intervendo minima. Estado deve respeitar a esfera intima do cidadao. Quandodefendemosem nossa obra Leispenaiseprocessuaispenaiscomentadasa inconstitucionalidadedacontravenciopenal davadiagem (art. 59 daLeideContravengoes Penais), conforme expusemosna nota 318 ao referidoart.59, baseamo-nosno principio daintervenciominima,associadoaocariter discriminat6rio do tipo penal. O mesmo se diga a contravengdo da mendicéncia (art.60 da mesma Lei). Ora, pode-se argumentar, igualmente, que nao ha bem juridico re- levante a ser atacado por qualquer dessas contravengdes. Sao condutas, na essencia, inofensivas a ordem publica ea sociedade. Sob outro prisma, quando defendemos 0 principio da insignificancia, como causa de exclusio dattipicidade (nota 27-Baoart. 14), fundamo-nos, também, naintervencio ‘minimae, por viade consequencia, na falta de ofensividade a qualquer bem juridico de relevo, a0 menosa ser protegido penal- ‘mente. Defendemos, portanto, que a ofen- sividade ou lesividade deve estar presente no contexto do tipo penal incriminador, ppara validé-lo, legitimé-lo, sob pena de se esgotaro direito penal emsituacdesinécuas sem propésito, especialmente quando se contrastaaconduta praticadacomotipode angio para la prevista como regra, oustja, a pena privativa de liberdade. Ha enorme desproporcao, Porém, aofensividade éum nftido apéndice da intervencao minima ou subsidiariedade do Direito Penal Democri- tico, Naonecessitaserconsideradoaparte, como principio auténomo, pois the falece forca ¢ intensidade para desvincular-se do principal, nem existem requisitos proprios {que o afastem da ideia fundamental de uti- lizar a norma penal incriminadora como ailtima cartada para solucionar ou compor conflitos emergentes em sociedade. Em suma, a ofensividade ¢ uma conseqiéncia do respeito a intervencao minima. 2 oven Sia Bg is sé 6 z suod ep oad @sanousou9D “2 z | Gonondxa) saad | svoromnstoy (1 nd 9) p onSeoqde x saauuzoNe3 “| 43°51 BEAD "NINN eg Ht — (BOL EID 0) SPENT aq feud onanid ap sojdiountg Guitherme de Souza Nucci 50 2, Conceito deanterioridade: signi- fica que ¢ obrigatoria aprévia existenciade lei penal incriminadora para que alguém possaser por um fato condenado,exigindo, tambem, prévia cominacao de sancao para que alguém possa sofré-la. Por outro lado, cumpreesclarecer que, apesardearubrica doart, |°mencionarapenasaanterioridade dalei penal, espelha, ainda, o principio da legalidade ou dareserva legal, comose vera a seguir. 3. Extensiodapalavracrime: porfor- cadatradigao do principio, vem-seusando a palavra crime em vez de infragdo penal, que seria 0 genero, da qual sio extraidas as espécies crime e contravencao penal. Entretanto, € posicdo tranquila a leitura extensivado conceito decrime paraabran- ger também a contravencao, submetida igualmente aos principios da reserva legal edaanterioridade. 4. Conceito de legalidade: ha tres, significados: a) politico (garantiaconstitu- ional dos direitos humanosfundamentais; }) juridico em sentido lato (ninguém esta obrigadoa fazer ou deixar de fazeralguma coisa senio em virtude de lei, conformeart 5°, IL, CF); ) jurfdico em sentido estrito oupenal (fixador do contetidodas normas penais ncriminadoras). Neste ultimo pris- ‘ma, é também conhecido como principio da reserva legal, ou seja, 0s tipos penais incriminadoressomente podem ser criados porletem sentido estrito, emanada do Le- gislativo, deacordo como processoprevisto nna Constituigao Federal. Ha,ainda, oquese chama de reserva legal qualificada, que éa reserva de lei, dependendo das especifica- bes eitas pela Consttuicao Federal. Assim, zndo basta editar uma lei para disciplinar determinado assunto, sendoimprescindivel que se respeite o ambito estabelecido pelo tuinte. Exemplos: a) para violar 0 sigilo das comunicagdestelefonicaséneces- sériaaedicdo de uma let, que esta limitada aosfinsdeinvestigacdo criminal ouinstrucao processual penal (art.5.°, XII, CF);b) “com efeito, 0 proprio paragrafo 1.°, do mesmo artigo 220 [da CF], autoriza o legislador a disciplinar o exercicio da liberdade de imprensa, tendo em vista, sobretudo, a proibictodoanonimato,aoutorgado direito de resposta ea inviolabilidade da intimida- de, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas. Trata-se, verdadeiramente,de ‘uma reserva legal qualificada, que permite cestabelecimento de restrigao aliberdade de imprensa com vistas a preservar outros direitos individuais, nao menos significa- tivos, como os direitos da personalidade em geral” (cf. Antonio Henrique Graciano Suxberger, Responsabilidade penal sucessiva noscrimesdeimprensa,p.37).Araizhistorica do principio da legalidade~a lei que ouve antes de condenar, como ensina Webster est na Magna Carta de 1215 (“Nenhum homem pode ser preso ou privado de sua propriedade a nao ser pelo julgamento de seusparesou pelaleida terra"). A expresso original —by the lawof the land foi modi- ficada em edicao posterior da Magna Carta para due process of law (devido proceso legal). A garantia tinha por finalidade evitar que alguém fosse preso ou privado deseus bens pela vontade singular do soberano, obrigando que os magistradosaplicassem, efetivamente, as leis consuetudinarias a €poca consagradas pela comunidade. A formulacéo propriamente dita do prinei- pio da legalidade coubea Beccaria, em sua festejada obra Das delitos edas penas, com influénciade Montesquiewe Rousseau Por outro lado, a construgio dopreceito latino ‘nullum crimen, nulla poena sine previa lege deveu-se a Feuerbach (Cerezo Mir, Curso de derecho penal espaiol — Parte general, v. 1p. 163:Jiménez de Asia, Lecciones de derecho penal, p. 14e57).Faconsagragao Sl digo Penal Comentado Titulo !—Da aplicagio da Lei Penal datipicidade (adequacao dosfatosconcretos a0 modelo legal previsto na norma penal), que é a elaboracao cientifica do principio no contexto do direito penal 4-A. Diferenga entre mera legali- dade e estrita legalidade: a primeira é ‘uma “norma dirigida aos juizes, aos quais prescreve a aplicacao dasleis tais como so formuladas";a segunda designa “a reserva absolutadelei, que éumanorma dirigidaao legislador,aquem prescreveataxatividadee preciso empiricadasformulacdeslegais” (Luigi Ferrajoli, Direitoerazdo,p.31).Nao se pode, na atualidade, contentar-se coma ‘mera legalidade, pois nem todo tipo penal construtdo pelo legislador obedece, como deveria, ao principio da taxatividade. O ideal € sustentar a estrita legalidade, ou seja, um crime deve estar descrito em lei, ‘mas bem detalhado (taxativo), de modo a nao provocar dtividas e questionamentos intransponiveis, bem comosendo possivel visualizarumaofensaabemjuridicotutela- do, agindo o autor com dolo ou culpa. 5. Legalidade material e legalidade formal: denomina-se legalidadematerialou -substancialo principio vinculadoaoconcei- tomaterial de crime,aopassoquelegalidade formal esta ligado ao concetto formal de delito. Vale, pois, defini-los: materialmente, crime é, nas palavras de Bettiol, “todo fato hhumano lesivo de um interesse que possa comprometer as condicdes de existéncia, conservagao e progresso da sociedade” (apud José Frederico Marques, Tratado de direito penal, v. 2, p. 23). Trata-se de um conceito muito aberto de delito, de forma que, sendo aceito, poderiam ser punidas todas as condutas perigosas, mesmo que no estivessem expressamente previstas em lei. Por isso, a legalidade substancial ou material nao é a melhor garantia ao in- dividuo. Ensina Paulo José da Costa imior que tal principio ¢ adotado em nome da chamada “defesa social” (Comentarios ao Cédigo Penal, p. 1),ouseja, ele mais vale & sociedade do queao cidadao. Formalmente crime ¢ toda conduta que ofende um bem juridicamente tutelado, previstaemtlei,sob ameagadepena. Trata-se,sem hivida,deum ‘conceito mais seguro a0 individuo, pois 0 Estadondo poder considerar delito acon- dutaquebementender, massomenteaque estiver tipificada. Eripicidade €areducaoa categorias juridicas do principio maior da legalidade. Nalicao de Miguel Reale Junior, trata-se da “elaboracao cientifica e técnica do principio ‘nullum crimen sine lege’, cexercendo de forma mais segura a fungao de garantia” (Parte Geral do Cédigo Penal (Nova interpretagdo), p. 20-21), ou seja, devidamente descritas em lei. Adota-se, no Brasil, 0 principiodalegalidade formal, conforme demonstra 0 att. 1.° do Codigo Penal. 6. Alcancedosprincipios dalegalida- deedaanterioridade: ¢ fundamental quea Ieipenalincriminadorasejaeditadaantesda ocorrénciado fato, Enquanto a Parte Geral do Codigo Penal prevéo principio geral(le- gilidade eanterioridade), Parte Especial, atravésdos tipos penais, concretizaodireito penal liberal. Naspalavrasde Baumann,“ parte especial do Cédigo Penal se convei te em uma ‘Carta Magna do delingitente’ (Von Liszt) unicamente quando se proibe a0 legislador a criacao de um direito penal retroativoeao juizsuaaplicagao” (Derecho penal Conceptos fundamentales ysistema introducciéna la sistemética sobre a base de.casos],p. 74). 7. Eficécia dos principios da legali- dade e da anterioridade: para verificar a eficécia dos principios, primeiramente convém mencionar 0 conceito de tipo pe- nal, que significa modelo legal de conduta, Gulherme de Souza Nuc 52 No prisma mais interessante para odireito penal, encontra-se tipo penal inerimina- dor, que estabelece o modelo de conduta proibida (ex.: “matar alguém” é 0 modelo de conduta vedada pelo ordenamento juu- ridico penal, intitulado “homicidio”, que visa a protecdo do bem juridico “vida”), A definigao legal da infragéo penal ha de ser feita de forma clara e inteligivel, para nao gerar tiposabertosdemais,causandoo esvaziamento do principio dareservalegal. tipo aberto é aquele que depende da in- terpretacao do juiz para ser integralmente compreendido e aplicado. Levando-se em consideracdo que o direito penal veda uso da analogia (processo de integragao da lei, que atua através de um método de semelhanga, quando houver lacuna) para ctiartipos penais ncriminadores, épreciso evitara elaboracao de definicoes legais de ‘crimes que sejam tio vagas, quanto inse- guras. Exemplo disso seria a elaboracio de um tipo penal enunciando como crime “agit perigosamente contra osinteresses da sociedade". Qualquer conduta, conforme critérios imponderaveis do juiz, poderia encaixar-se nesse preceito, ferindo, ob- viamente, o princtpio da legalidade. Por ‘oportuno, deve-se mencionar aexistencia dos tipos fechados (aqueles que contém apenaselementos descritivos, prescindindo dayaloracéo cultural do magistrado,como ‘ homicidio - art, 121, CR, supracitado) € dos riposabertos (osque contem elementos normativos ou subjetivos, merecedores de valoracio pelo aplicador da lei, como a exposigio ou abandono de recém-nascido ~art, 134, CP—,que mencionao elemento “desonra”, para apontar a motivagao da ‘mae 20 largar seu filho, que é de complexa interpretacao, variando conforme o lugar € época). Ambos sao igualmente impor- tantes (fechados e abertos), embora o que se esteja defendendo ¢ a impossibilidade de criacao de tipos penais incriminadores {que transcendam o minimo de seguranca exigido pelo texto constitucional e pelo proprioart.1.°do Codigo Penal, istoé,uma definicaominimamentesegurae detectavel pelo interprete. Ver, ainda, a respeito do temaa proxima nota. 8. Eficiéncia dalegalidade como ga- rantiahumanafundamental:alegalidade, no campo penal, nao pode ser uma garan- tia meramente formal, sendo insuficiente apenas a existéncia de uma lei anterior a conduta. Torna-se indispensivel que a elaboragao do tipo penal~modelo legal de conduta proibida—sejaespecifica, ou seja, claramente individualizadora do compor- tamento delituoso (ef. Luiz Vicente Cer- nicchiaro, Direito penal na Constituigao,p. 18). Apreceituacao genéricafereoprineipio da legalidade, Reportemo-nosaoart.6.°do Codigo Penal soviéticode 1926: *Reputa-se petigosatodaacao ou omissiodirigida con- traaestruturado Estado sovietico, ou que leseaordem juridicacriadapeloregimedos trabalhadoresecamponeses paraaépocade transigioa organizacaosocial comunista.”. ‘Trata-se de umn tipo extremamente aberto, com foco voltadoa periculosidade da con- uta, numaavalia¢ao que era, com certeza, politica, Portanto, mesmo que existente a let, o principio da legatidade estaria sendo apenasumaformalidade, poisqualqueracao ou omissio que o Estado desejasse consi- derar *perigosa”, diante de um modelo tio aberto, poderia fazé-lo. A Unio Sovietica, na pratica, terminou negando eficacia ao prinefpio da reserva legal, como adverte Basileu Garcia (cl Instituigdes de direito pe- nal,¥.1,t.1,p.150-151).Battaglini sempre considerou condendvel colocar no Codigo Penal incriminagdes de aleance latissimo, comafinalidade decobrir,o mais possivel, ceventuais acunas. Essaprovidencia, queda ‘margemaos tipos exageradamenteabertos, ofendealegalidade. Alias, mesmono.direi- 5B. Codigo Penal Comentado to anglo-americano, baseado no sistema do direito consuetudinério, portanto, néo vinculado perfeitamente ao principio da legalidade, ja existem varios precedentes judiciais declarando inconstituctonais as tegtas de direito penal que permitem a elaboracao de normas penais genéricas € imprecisas. O direito brasileiro nao deixa deterseusexemplos, Comobemressaltado porLuiz Vicente Cernicchiaro, “nessecon- texto, sem chivida, de duvidosa harmonia com a Constituicao da Republica, a Lei 4.898/65. Literalmente, estatui o art, 3.° Constitui abuso de autoridade qualquer atentado: a) a liberdade de locomogao; b) ainviolabilidadedo domictlio... Notocante aalinea’b’, eas mesmas consideracées si pertinentes as demais alineas, o conceito de ‘inyiolabilidade do domicilio’¢ ilimi- tadamente genérico, permitindo incluir fatos sem a necessaria especificacao” (ob. cit, p. 19). Ora, omesmo se pode dizer do atentado a liberdade de locomocao. Trata- se de preceito muito genérico, que pode dar margem a interpretagoes indevidas. Comentando o dispositivo, ensinam Gil- berto Passos de Freitas e Viadimir Passos de Freitas que “todo cidadao tem o direito de se locomover para onde bem entender, desde que respeite o direito dos demais ci- dadaoseasnormas legais vigentes” (Abuso de autoridade, p. 26). Justamente por nio ser especifico, ora os Tribunais estao des- considerando como abuso de autoridade as chamadas prises para averiguagio, ora estdo punindo, Do exposto,deduz-se queas descricoes genéricasde tipos penaispodem ser mais perigosas do que a analogia, pois estapelomenostem um parimetrodeseme- Ihangacomoutra condutacerta. Preleciona Frederico Marquesque, “noDireito Penal, analogianao pode seraplicadaparacriarse figura delitivanao previstaexpressamente, ‘ou sangio penal que o legislador nao haja estatufdo, O principio da reserva impede Titulo 1 Da aplicagso da Lei Penal {que figuras tipicas sejam elaboradas pelo rocesso analégico”. Ainda assim, men- cionando que a Dinamarca € um pais cuja legislacdoadotaaanalogiaem matéria penal, JembraoensinamentodeStephan Hurwitz, da Universidade de Copenhague, dizendo ser mais seguro ao individuo a aplicagio da analogia do que a formulagao vaga e imprecisa de determinados tipos penais (ch. Tratado de direito penal, v. 1, p. 227). Eevidente que, para a elaboracao de um tipo penal, o legislador precisa operarcom certa liberdade, reservando ao juiza tarela de interpretar e complementar o conteudo do tipo incriminador. Por isso, € possivel existittipos abertos,tais como os deaborto arts. 124 a 127) e de rixa (art. 137), que precisam dainterpretacaodoaplicadorda ei paraseremaplicados. Isto nao significa que se deva privilegiara criagdo de tipos muito ‘vagos, pois, quanto mais especificos eles puderem ser, melhor para o direito penal e para o individuo. Assim, para assegurar a eficdcia do principiodalegalidade €preciso manter 0 equilfbrio ¢ o meio-termo: nem analogia, nem tipos extremamente vagose genéricos. Em ambos os casos, estar-se-ia preterindo a aplicacio do preceito consti- tucional da reserva legal 9. Utilizagao da interpretagao ex- tensiva, interpretacao analégica e ana- logia em direito penal: a interpretacao € um proceso de descobertadoconteddoda leie nao de criacdo de normas. Por isso, € admitida em direito penal, tanto a extensi- va, quanto a analégica. A extensiva é 0 processo de extracao do auténtico signifi- cadodanorma,ampliando-se oalcance das palavras legais, a fim de se atender & real Finalidade do texto. Aanaligica €o proces- so de averiguacao do sentido da norma Juridica, valendo-se de elementos forneci- dos pela propria lei, através do método de semelhanga, Como exemplos de interpre- Gauitherme de Souza Nucci 54 tacio extensiva encontrados no Codigo Penal, podem ser citados os seguintes: a) ant.172 (duplicatasimulada), que preceitua ser crime “emitir fatura, duplicata ou nota de venda que nao corresponda a mercado- ria vendida, em quantidade ou qualidade ou ao servico prestado”, Ora, é natural supor que a emissio de duplicata quando © comerciante nao efetuou venda alguma também é crime, pois seria logicamente inconsistente punir quem emite 0 docu mento em desacordo com a venda efetiva realizada, mas nao quando faz o mesmo sem nada ter comercializado. Assim, onde sele, no ipopenal, “vendaquendo corres- pondaamercadoria vendida”,leia-se ainda “venda inexistente";b) no caso doart. 176 (outras fraudes), pune-se a conduta de quem “tomar refeigao em restaurante (...) sem dispor de recursos para efetuar o pa- gamento”, ampliando-se 0 contetido do termo “restaurante” paraabranger, também, boates, bares, pensbes, entre outros esta- belecimentos similares. Evita-se,comisso, que o sujeito faca uma refeicao em uma pensio, sem dispor de recursos para pagar, sendo punido porestelionato, cuja penaé mais elevada; c) na hipotese do art. 235 Gbigamia),atémesmopelarubricadocrime, percebe-se ser delituosaacondutadequem se casa duas vezes, Valendo-se dainterpre- tacdo extensiva, por uma questo logica, pune-se, ainda, aquele que se casa varias vezes (poligamia);d) ofurto torma-se qua- lificado, com penadereclustode trésa ito anos, caso a subtracao seja de veiculo au- tomotorque venhaaser transportado para ‘outro Estado ou para o exterior (art. 155, §5.°), Nao se mencionou o Distrito Fede- ral, porém ¢ ele equiparado, constitucio- nalmente, aos Estados-membros, em vir- tude de varias finalidades (arts. 32 € 34, CF). Porisso, levaroveiculodeum Estado- ‘membro ao Distrito Federal também € su- ficiente para caracterizar o furto qualifica- do (ver a nota 39 ao art, 155, 8 5.°). Nas hipdteses mencionadas nas letras a, ced, a interpretacao extensiva pode prejudicar © réu, enquanto na situacao descrita na letra pode beneficid-to. No caso da inter- pretacdo analégica, confira-se 0 disposto no art. 121, 82°, IIL Qualifica-se o homi- cidio quando o agente cometer o crime “com empregode veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidiaso ou ‘eruel, oudequepassaresultarperigocomum” (grifamos),verificando-se, pois, que, dadas as amostras pelo tipo, permite-se que 0 intérprete va buscar outros meiossimilares aos primeiros, igualmente configuradores de insidia, crueldade ou perigo comum. A adocio das interpretagoes extensivaeana- logica € amplamente aceita pela doutrina € pela jurisprudencia, Por todos, pode-se citaraligdo de Jiménez de Astia,afirmando que 0 meio literal ¢ 0 teleolégico podem evar a um resultado harmonico e conclu- sivo na interpretacao das leis penais, seja ele restritivo ouextensivo, posto que, assim fazendo, consegue-se captar a vontade da lei, Somente quando houver diivida na interpretacio prevalece o critériorestritivo parando prejudicar oréu eextensivoquan- do Ihe for favoravel (cf Lecciones de dere- cho penal, p. 73). A.analogia, por sua vez, ‘éumprocesso deauto-integracao, criando- se uma norma penal onde, originalmente, nao existe, Nesse caso, nao se admite a analogia in malam partem, isto 6, para pre~ judicaro réu, Nem todas.as vozes sao con- ttarias ao emprego em geral daanalogiano direito penal. Confira-se a licdo de Carne- Tutti: “Considero que a proibicao da ana- logia na aplicagao das leis penais € outra supersti¢ao da qual devemos nos livrar. isso nao se deve enxergar uma conse- quencia do prinefpio da certeza jurtdica, senaio uma desconfianca com relacao a0 Juiz, a qual, se tem razies historicas bas- tante conhecidas, carece de todo funda- 55 Codigo Penal Comentado mento pratico” (El problema de la pena, p. 74, traduzi). Por outro lado, somente em carder excepcional a analogia in bonam artem (parabeneficiar) deveser utilizada em favor do réu. Exemplo da primeira (in ‘malam partem) seria a construgao do tipo penal de estupro praticado por mulher con- tra homem, por semelhanga a situacao in- versa previstanoart. 213. Outrailustracdo, extraida de caso conereto, juulgado pelo Supremo Tribunal Federal, em relagao a chamada cola eletrénica, uilizada por de- terminados vestibulandos: “Em conclusio de julgamento, o Tribunal, por maioria, rejeitou dentincia apresentada contra De- putado Federal, em razdodeterdespendi- do quantia em dinheiro na tentativa de obter, porintermédio de cola eletronica,a aprovacio de sua filha e amigos dela no vestibular de universidade federal, condu- ta essa tipificada pelo Ministério Pablico Federal como crime de estelionato (CP.art. 171), € posteriormente alterada para falsi- dade ideologica (CP, art. 299)— Informa- tivos 306, 395 ¢ 448, Entendeu-se que 0 fato narrado nao constituiria crime ante a auséncia das elementares objetivasdo tipo, porquanto, naespécie,a fraudenao estaria naveracidade do conteuidodo documento, ‘mas sim na utilizacao de terceiros na for- mulacao dasrespostasaos quesitos.Salien- tou-se, ainda, que, apesar de seu grau de reprovacio social, tal conduta nao se en- quadraria nos tipos penais em vigor, em face do principio da reserva legal eda proi- bicao de aplicacao da analogia in malam artem. Vencidos os Ministros Carlos Brit- to, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbo- sae Marco Aurélio, que recebiamadentin- cia (Ing. 1145/PB, Pleno, rel. orig. Min. Mauricio Correa, rel, para o acordao Min. GilmarMendes, 19.12.2006, m.v)”. Exem- plo da segunda situacao (in bonam partem) €aaceitagdo doabortodamulher quetenha engravidado, vitima de atentado violento a0 pudor, uma vez que a lei somente auto- riza oato quando a gravidez for originaria de estupro art. 128,11, CP). Por derradei 10, cumpre destacar que até mesmo o em- prego daanalogia para favorecerorendeve serreservado para hipotesesexcepetonais, ‘uma vez que o prinefpio da legalidade € a regra,endoaexcecio. Dai porque mio pode omagistrado disseminar 0 uso daanalogia para absolvero réu, poisisso colocaria em risco a seguranca idealizada pelo direito penal. Nao édemaiscitaraligaode Hungria a esse respeito: “Os preceitos sobre causas descriminantes, excludentesouatenuantes de culpabilidade ou de pena, ow extintivas de punibilidade, constituem jus singulare em relagao aos preceitos incriminadores ou sancionadores, e, assim, nao admitem extensio além dos casos taxativamente enumerados” (Comentérios ao Cdigo Pe- nal. 1,1. 1, p.92). Em posi¢ao contratia, confira-se Nereu José Giacomolli, contes- tandoautilizagao de tiposabertos, normas penais em branco, interpretacaoextensiva ce anal6gica: “A defesa de um direito penal comtiposabertos, difusos, indeterminados, ‘ou commnormasppenais dependentesde uma normatividade integradora (normas penais embranco), ou de um regramento judicial, sio caracteristicas de um Direito Penal autoritario e demasiadamente repressivo, inadmissfvel no atual estado de desenvol- vimento da civilizacao. (..) Aexclusio das interpretacdesanalégica,criativaouexten- siva, prejudiciaisao imputado,determina- da pela reserva legal, se aplica tanto na concretude dasnormas criminais contidas na parte geral do Codigo Penal quanto nas especiais e nas extravagantes. # um impe- rativo da ineidencia da lex stricta a respel- to da responsabilidade criminal, que en- globaa descricao tipica,asancao e todasas circunstancias que influem na dosimetria da pena” (Fungdo garantista do principio da legalidade, p. 483-485). Guitherme de Souza Nucci 56 pena e medida de seguranga: a medida de seguranga nao é pena, mas nao deixa de ser uma especie de sancao penal, aplicavel aos inimputaveis ou semi-imputaveis, que praticam fatos tipieos e ititos (injustos) e precisam ser internados ou submetidos a tratamento. Trata-se, pois, de medida de defesa social, embora se possa ver nesse instramento uma medida terapéutica ou pedagogica destinada a quem € doente Entretanto, ontologicamente, nas palavras de Magalhdes Noronha, nao ha distingao alguma entre pena e medida de seguranca (Direito penal, p. 312). Em suma, quando se trata de privar a liberdade de alguém, € preciso respeitar o principio da legalidade. ‘Torna-se importante, ainda, mencionar a licdo de Pierangeli ¢ Zaffaroni: “Salvo 0 caso dos inimputdveis, sempre que se tira a liberdade do homem por um fato por ele praticado, o que existe & uma pena, porque toda privagdo daliberdadetemum contetido penoso para quem a sofre, O'nome que se the dé nao tem significagao, porque nao € possivel destruir todo o sistema de garan- tias trabalhado pelo Direito, na sua longa historia de lutas pela liberdade humana, 6 com uma ¢ outra denominagdes dadas a uma categoria de penas. Nao é possivel fazer-seaquiumactiticagerala categoriadas medidasde seguranca, masoqueacabamos deafirmar constituiumacriticasintetizada a respeito” (Da tentativa, p. 29). O antigo art, 75 do Cédigo Penal dispunha que “as medidas de seguranca regem-se pela leivi- genteao tempo dasentenca, prevalecendo, entretanto, se diversa,aleivigenteao tempo da execncio”. Ora, revogado que foi pela Reforma Penal de 1984, ¢ natural ficarem, agora, as medidas de seguranga sujeitas 0 principio da legalidade. Portanto, além das opinides ja mencionadas de Noronha, Plerangelie Zaffaroni, comasquaisconcor- amos, posiciona-se pela sua submissio a reservalegal eao principio daanterioridade ampla parcela da doutrina nacional: Julio Fabbrini Mirabete, Alberto Silva Franco, Paulo José da Costa Junior, Celso Delman- to € Heleno Cliudio Fragoso, Em sentido contriio,admitindoaaplicactoimediatada medida deseguranca: Franciscode Assis To- edo, Luiz Vicente Cernicchiaro e Feu Rosa. Convém mencionar a posicao de Lycurgo de Castto Santos: “A aplicacao retroativa das medidas de seguranca nao importa um ‘menoscabo do principio de legalidade por dois motivos: 1°) aaplicacao de umanova ‘medida pressupde que elaé maiseficaz que a anterior a fim de diminuir ou eliminar a probabilidade de que oindividuo cometera nofuturo outrosdelitos (retroatividadeem beneficiodoréu);2.°)aplica-se,conformeos juizossucessivos, uma consequencia legal ~anovamedidadeseguranca—existenteno momento em que se comprovaa periculo- sidade doagente:o que permite aaplicacio damedidanaoéo ato criminoso, que opera como simples garantia, senao o estado pe- riculoso doagente (aspecto subjetivo)” (O principio de legalidade no moderno direito ‘penal, p. 197). Melhorteriasido,noentanto, «a Constituicdo ter deixado bem clara essa aplicacao, nos moldes empreendidos pela Constituigao portuguesa (art. 29,1). 11. Fontesdodireito penal dividem- se em:a) materiais,asque propiciama cria- (edo dasnormaspenais. Consubstanciam-se na figura do Estado, através da Unio; b) Jormais, as que permitem 0 conhecimen- to € a exteriorizacao das normas penais. Quanto as materiais, preceitua o art. 22,1, da Constituigdo Federal: “Compete priva- tivamente & Unido legislar sobre: 1~direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrario, maritimo, erondutico,espacialedo trabalho” (grifamos). Alias, nesse sentido, confira-se a recente Suimula 722 do STF: “Sao da competéncia legislativa da Unidoa 57 Codigo Penal Comentado Titulo I Da aplicagio da Lei Penal definigdodoscrimesderesponsabilidadeeo estabelecimento das espectivas normasde processoe ulgamento”. Excepcionalmente, reve oart. 22, paraigrafo tnico, da CE que “lei complementar podera autorizar os Es- tados a legislar sobre questdes especificas das matérias relacionadas neste artigo”. Portanto, visando. regionalizagaodedeter- minadas questoes penais, seria admisstvel queaUnigoautorizasse o Estadoaconstruir ‘um tipo penalincriminador,prevendodelito peculiaracerta partedo Pats, Emborandose tenha noticia dessa pritica, averdade éque ‘ostado jamaispoderia legislar em matéria de Direito Penal Fundamental (normasin- seridasna Parte Geral do Codigo Penal, que devemteraleance nacional, afisn demantera integridade do sistema), nem tampouco po- deria compornormasquecontrariassem, de qualquer modo, alegistacao federal. Assim, aatividade legislativado Estado, emmatéria penal, ocuparia eventual lacuna existente nas normas federais. Quanto as formais, dividem-se em imediatas, que sto as leis, emsentidoestrito,criadoraserevogadoras de normas penais, e mediatas, que sto os costumes e 0s principios gerais de direito, auxiliadores do processo de interpretacio aplicacao da lei penal. Assim, somente a lei, em sentido estrito, pode fixar crimes. Conceitua-se lei (formal ou em sentido estrito) como a “manifestacio da vontade coletivaexpressadaatravés dos rgioscons- titucionais” (cf, Astia, Leccionesde derecho penal, p. 5+). Portanto, somente o Poder Legislativo Federal, como regra, pode fazer nascer uma lei penal, Analisemos outras espécies normativas: a) emenda a Consti- tuicdo: no pode restringir os direitos € as garantiasindividuais art. 60,84.°, CF), de forma que nao pode tocar no principio da Tegalidade. Emtese, porque éfrutodo Poder ‘Constituinte Derivado ou Reformador, pode criar lei penal, jé que nada veda expressa- ‘mente. Fntretanto, nao é tradicional, nem ‘cabivel ocupar-se disso;b) leicomplementar pode legislar sobre matéria penal, porque tem proceso legistativo mais complexo do que lei ordinaria. Como exemplo de norma penal incriminadora editada por lei complementar, confira-se 0 art. 10 da Lei Complementar 105/2001: “A quebra de sigilo, fora das hipoteses autorizadas nesta Lei Complementar, constituicrimee ‘sujeita os responsiveis a pena de reclusio, de 1 (um) a4 (quatro) anos, e multa, apli- cando-se, no que couber, o Codigo Penal, sem prejuizo de outras sancdes cabiveis. Paragrafo tinico. Incorrenasmesmas penas quem omitir,retardar injustificadamente ou prestar falsamenteasinformagoes requeri- das nos termos desta Lei Complementar”, Em sentido contrério, convém mencionar a posicao de Cernicchiaro, Sustenta que 0 10] da lei complementar ¢ exaustivo na Constituigao, nao incluindo nenhuma hi- potese de criagio de lei penal, alem do que €exigido quorum qualificado para elaborar umalei complementar,oqueiriaengessaro Congreso Nacionala modificara lei penal que fosse criada pelo processo qualificado (ek DireitopenalnaConstiuigao, p 46-47); «)leis delegadas: sa0 as norms elaboradas pelo Presidente daRepiiblicapordelegaco do Congresso Nacional (art. 68, CF). Nao podemserutilizadaspara criarlei penal, pe- asseguintesrazdes:¢.1) noincisoll do8 1° doart. 8constaavedacio paraadelegacto emmatéria dedireitos individuais. Estando oprincipiodalegalidade previstonoart.5.° da Constituigdo, € natural que se trata de direito fundamental, alheio, portanto,alei delegada;c.2) oprocesso legislative pratica- ‘mentedeixade existir, nao sendopermitido 0 tramite pelas duas Casas do Congresso, nema apresentacdode emendas;c!) medida provisoria: ¢norma uridica, ouseja,letem sentido material ouemsentidoamplo, mas naoem sentido formal ou estrito, demodo ‘que nao pode criar lei penal. Havia quem Guitherme de Souza Nucci 58 sustentasse serpossivela medida provisoria ctiarleipenal, poisa Constituigéo, noart.62, dizia somente que “emcaso derrelevanciae urgéncia, 0 Presidente da Repablicapodera adotar medidas provisorias, com forcadelei (.)", Por outro lado, o antigo deereto-lei, que foisubstituido pela medida proviséria, «em 1988, eraaceito pelo Supremo Tribunal Federal para tal finalidade. Logo,a medida provis6ria também poderia,em tese,criarlei penal. A maioriadospenalistas, noentanto, sempre foi contrariaahipotese. O principio dareserva legal, previstonoart. 5." falaem lei, tose podendo incluir nesse conceitoa ‘medida provisoria. Além disso, a medida é ato de vontade exclusivo do Presidente da Reptiblica, nao nascendo da participagao dos representantesdo povo. Deoutraparte, seria itreparivel o dano, caso alguém fosse preso, em razao de uma medida provisoria ‘riadoradelei penal, posteriormente revo- ¢gadapelo Congresso Nacional, Finalmente, naoexistemrazdes de urgenciaerelevancia que possam justificar a elaboracao de lets penais por obra restrita do chele do Exe- cutivo. O Supremo Tribunal Federal nao chegow a se pronunciar, até hoje, sobre a possibilidade dese editarem leis penaispor ‘medida provisoria. Ha casos, no entanto, de leis penaiscriadas por tal via: Lei 7.960/89 (prisio temporaria) e Let 7.679/88 (proi- bicao de pesca por explosivo). Convem ressaltar, por derradeiro, que havia maior aceitacto doutrinaria quanto a criagéo de leipenal do incriminadora, porintermédio demedida proviséria, vedando-se, apenas, aprodugdo de tipos penaisincriminadores. Nosso pensamento sempre foi adverso. O direito penal nao é matéria uxgente que Justifique a edicao de normas por ato do Presidente da Republica, ainda que seja futuramente submetido ao Congreso Na- cional, podendo transformar-seemei, Nao teria 0 menor sentido criar-se uma causa excludente de punibilidade, por exemplo, através demedida provisoria—beneficiando varios condenadoseréusportodo 0 Pais, pata, depois, nao ser aprovada pelo Poder Legislativo, anulando seus efeitos ex tunc. ‘0s beneficiados pela medida retornariam aocircere? Os processosseriam reabertos? Seriaaconsagracio do caos. E fundamental ‘mencionar as palavras ce Osvaldo Palotti Jinior:*Medida provis6rianao podecuidar de crime e pena em nenhum aspecto, Nao apenas quando cria figuras tipicas novas (novatio criminis), ou quando torna mais severa norma jé existente (novatio legis in ‘pejs). Tudo o que diga respeito a Direito Penal esta fora do alcance desse ato legis- lativo do Presidente da Republica. O vicio deinvalidadeque contamina opreceitoem ‘comentonaopoderiasersanadonemmesmo sea medida provisbria que ocontém viesse ser convertida em lei. Somente a matéria compativel com a medida provisoria € que pode, examinada pelo Congreso Nacional, wansformar-se em lei. Nao aquela, repita- se, que escapa do ambito tematico dessa providencia unipessoal do Presidente da Republica” (Aspectos principais do princi- ‘pio da legalidade em direito penal, p.91) Atualmente, a questao foi definitivamente resolvida pela promulgacao da Emenda Constitucional 32, de 11 de setembro de 2001, que alterou a redagao do art. 62 da Constituicao Federal, acrescentando-lhe 0 § 1.°, nos seguintes termos: “E vedada a edigdo de medidas provisoriassobre materia: Tnrelativaa:(...)b) direito penal, processual penal e processtal civil” 12. Caracteristicas da lei penal: lei, fontetinica dodireito penal, temasseguintes caracteristicas:a) éexclusiva, isto é,somente cla pode criar delitos,fisando as penas; b) € obtigatoria, fazendo com que todos os seus destinatarios a acatem, sejam os drgtos do Estado, sejao povo;c) €inafastavel, somente sendo revogada por outralei;d) éigualitavia, 59 Cadigo Penal Comentado Titulo | Da aplicagao da Lei Penal prevendo aplicagio identica a todos os seus destinatarios, sem privilégios; ¢) € constitu ional, devendo estarde acordocoma Cons- tituicio Federal, sob penadendoseraplicada (Asta, Lecciones dederecho penal, p.55). 13. Iniciativa de leis em matériape- nal: podem propora criacao de leis penais: a) osmembros do Congresso Nacional (art. 61, caput, CF);b) Presidente da Repiiblica (art. 61, caput, CP); ¢) a iniciativa popular Ainiciativapopularpodeserexercidapela apresentagao a Camara dos Deputados de projetodelleisubscrito por, nominimo, um porcentodoeleitoradonacional,distribuiclo pelomenosporcincoEstados,com naome- nos de trés décimos por cento dos eleitores de cada um deles”, conforme dispoe o art. 61, 8 28, CF). Entende-se que o Supremo ‘Tribunal Federal, os Tribunais Superiorese © Procurador-Geral da Repiilica nao tém iniciativa de leisdestinadasa dar existéncia a leis penais porque estas nao constituem ‘materia de seu peculiar interesse (art. 96, CP), 14. Normaspenais em branco ele- galidade: ver nota 34.20 art. 3." 15. Costumeelegalidade:ocostume indo serve para criar ou revogar lei penal, a despeito deservir parao processo de inter- pretagao. Assim, em que pese a evolucio social da atualidade, coma constante libe- ragdo dos comportamentos, nao se pode considerar “revogado" o art. 215 do Codi- go Penal (posse sexual mediante fraude), a pretexto de que os costumes estariam a indicar, praticamente, nao haver mais possibilidadedeumamutherserludibriada por um homem, a fim de consentir numa conjuncaocarnal. Admitindo-se, somente paraargumentar, que al situagao fosse ple- namente verdadeira, ocorreto é manter-se © tipo penal vigendo, até que outra lei o evogue, podendo-se, no entanto, utilizar (8 atuais costumes para auxiliar na inter pretacdo daselementaresdo tipo. Diante da relevancia da decisao, convém mencionar a posicio do Superior Tribunal de Justica a esse respeito: “A eventual tolerancia ou a indiferenca na repressao criminal, bem assim o pretenso desuso ndoseapresentam, em nosso sistema juridico-penal, como causa de atipia (precedentes). A norma incriminadoranao pode serneutralizada ou ser considerada revogada em decorrencia de, v.g., desvirtuada atuacio policial (art. 2.°, caput, da LICC)” (RE 146,360-PR, 5.* T. rel. Felix Fischer, 19.10.1999, v.u,,DO 08.11.1999, p. 85), 16. Plebiscito e referendo: nao sio meios adequados para dar origem ale pe- nal. O art. 49, XV, da Constituicdo Fede- ral estipula caber ao Congreso Nacional autorizar referendo e convocar plebiscito, ‘que, no entanto, somente podem aprovar ou rejeitar lei penal materializada ow a ser criada pelo Parlamento. Sobre a diferenca entreambasas formasdeconsulta popular, esclarece Alexandre de Moraes que, “en- quanto o plebiscito € uma consulta previ que se faz aos cidadaos no gozo de seus direitos politicos, sobre determinada ma- téria a ser, posteriormente, discutida pelo CCongresso Nacional, oreferendo consisteem ‘umaconsulta posterior sobre determinado ato governamental para ratifi sentido deconceder-Ihe eficécia (condigao suspensiva),ou, ainda, pararetirar Iheaefi- cécia (condigao resolutiva)” (Constituigao do Brasil interpretada e legislagao consti- tucional, p. 1.000). Confira-se o exemplo doreferendo invocado paraaaprovacao de Aispositivo de lei, notando-se que ele nao ccria a norma, mas serve para acolher ou rejeitaro que} foi editado pelo Congresso Nacional: art. 35 da Lei 10.826/2003 (Es- tatuto do Desarmamento): “E proibida a comercializagao dearma de fogoe municao Guitherme de Souza Nucet 60 em todo territorio nacional, salvo paras cntidadesprevistasnoart.6:%destaL ei”, Este dispositivo, paraentrarem vigor, dependeria daaprovacao mediante referendo popular, realizado em outubro de 2005. Em caso de aprovacao doreferendo popular,o disposto neste artigo entraria em vigor na data de publicagao de seu resultado pelo Tribunal Superior Eleitoral. Entretanto, fotrejeitado, significando que 0 comércio de armas de fogoemunigao continuaautorizado, desde que respeitados os requisitos legais. Lei penal no tempo” Art. 2." Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime,"™¥© cessando em virtude dela a execucdo @ 05 efeitos penais da sentenca condenatéria.” Paragrafo tinico. A Ici posterior" que de qualquer modo favorecer oagente,”"* aplica- se aos atos anteriores," ainda que de- Cididos por sentenca condenatéria transitada ‘em julgado. 17. Conceito eaplicagio da extrati- vidade daletpenal:aregra geralemdireito € aaplicagio da lei vigente a época dos fatos Ctempusregitactum). Aexcegao éaextrativi- dade, ouseja, apossibilidade de aplicagao de uma lei fatos ocorridos fora do ambito de sta vigencia, O fenomeno da extratividade, ‘no campo penal, realiza-se emdoisangulos: a) retrotividade: € aplicagao de uma nova letpenal beneficaa um fato (infracao penal) acontecidoantesdoppertododasuavigencia (ant.52,XL,CF);b) ulratividade:éaaplicacao cde uma lei penal benefica,jérevogada, aum fato (Sentenca) ocorrido depois do pertodo da sua vigencia. O Cédigo Penal brasileiro, noart.2°, faz referéncia somentea retroati- vidade, porque esté analisando a aplicacio ys0s ‘eduatuas ep ojnfue 0 qos ‘no pop exep esaleanasanop ‘ngs oe jangroneysteus & 04 e150 35 (VNAINAS V4 OLV4 0 2ULNI WYYOOIA) ‘SVIMYIGIWYILNI SVOUINIA SIVN3d SHIT Guilherme de Souza Nuceh 74 Lei excepcional ou temporéria® Art. 3.° A lei excepcionab’' au tempo- rita,” embora decorrido o periodo de sua duracdo ou cessadas as circunsténcias que a detezminaram, aplica-se ao fato praticado durante a sua vigéncia>** 30. Conceito deleisintermitentes:as leisexcepcionaise tempoririassoespécies do genero intermitentes, aquelasfeitas para durar por um perfodo determinado. Isto porque, como regra, asnormas penais tém prazo de vigencia indeterminado, até que sejam poroutrasrevogadas. Entretanto,em algumas situacdes especiais, torna-se im prescindivel estabelecerum prazocertode duracao para leis penais incriminadoras. 31. Coneeito de leis excepcionais: sto feltas para durar enquanto um estado anormal ocorrer. Cessama sua vigénciaao mesino tempo em queasituacao excepcio- nal também terminar. Exemplo: durante o estado de calamidade puiblica, decretado em uma localidade devastada por alguma catastrofe, podem-se aumentar as penas doscrimescontrao patrimonio parabuscar evitar os saques, 32. Conceito de leis tempor: silo as editadas com period determinado de duracao, portanto, dotadas de auto-re- vogacao. Assim, porexemplo, uma leifeita para valer por um prazo de seis meses. cionais ou temporarias siolleis que naores- peitamaregraprevistanoartigoanterior,ou seja, 0 principio da retroatividade benéfica. Seo fizessem seriam inécuas, pois, cessado oprazodesua vigéncia, todos oscriminosos que estivessemsendo punidospelapriticade infragSespenaisnesse periodoexcepcional ou temporiio teriam beneficios. Noexem- plomencionadodacalamidade piblica, caso osagentes pudessem ser beneficiados pela retroatividade benigna, tio logo as penas dos crimes contra o patriménio voltassem 40s patamares originais, suas penas seriam alteradas. De nada teria adiantado a edicao da lel intermitente. Essas leis (temporétias ou excepcionais) sio sempre ultrativas, a fim de manter 0 seu poder intimidativo. Ha, no entanto, excegio: uma lei tempord- tia mais benéfica, editada posteriormente, pode alterar, para melhor, lei temporaria anterior, desde que respeitado 0 mesmo periodo temporal. Nesse caso, o prinefpio daretroatividade benéficaestafixado entre rnormas de igual satus e com identica fina- Tidade. Questo constitucional: estar-se-ia ferindo o disposto noart. 5°, XL, daCons- titui¢ao Federal (“alei penal nao retroagirs, salvo para beneficiar 0 réu”)? A resposta € negativa, Tal nao ocorre pela razao de o {ator “tempo” integrarattipicidadedanorma temporaria ou excepcional, significando que, ao deixar de existir, ndo traz, em seu lugar, nenhuma outra norma aplicavel a ‘mesma hipotese. Exemplificando: uma lei penal ¢ editada dobrando as penas dos de- litoscontrao patrimonio enquanto duraro estado decalamidade pitblica, Deve-selero tipo penal excepcional do furto: “Subtrair, parasiou para outrem, coisa alheia mével, durunteestadode calamidade piilica” Uma vez encerrado esse periodo, tornaa vigera anterior punicdo, quendo se pode considerar nova norma penal, sujeita a retroatividade prevista na Constituicao. Volta-se ao tipo penal anterior, de diferente redacao: “Sub- ‘rair, para si ou para outrem, coisa alheia mével”, Sao normas diferenciadas, nao incidindo a regra constitucional da retroa- tividade benéfica, Nao basta simplesmente dizer que a temporéria ou excepcional € ultrativa, fendmeno diverso do previstona Constituicao Federal, que menciona ape- nas a retroatividade, uma vez que, se fosse possivel aplicar a retroatividade benéfica, 3B Codigo Penal Comentado Titulo! certamenteelaanulariaqualquerefeitodelei considerada ultrativa porleiordinaria, Nao poderia o Cédigo Penal fixaraultratividade denormasque confrontassem diretamente ‘com futuras leis mais benéficas, a pretexto de se considerar diferente o efeito, isto é, ultratividade eretroatividade. Em verdade, somente nao seaplicao prinefpio constitu- cional previsto noart. 5°, XL, quandoallet temporaria ouexcepcional cessascuiefeito, voltando a vigorar norma que estava com ficdciasuspensaoumesmooutraleieditada especialmente para regular determinado caso, por se tratar de diferentes normas: ‘uma inclui na sua redagao o fator tempo, enquanto a outra nao o faz. Sobre as leis cexcepcionais, emvvisto diferenciada,leciona Luiz Luisi queasleisexcepcionaisstoasque existem, emcarsterpermanente,emboras6 adquiram eficacia quando ocorrem fatos € situacdes especiais. Cita como exemplo ‘Codigo Militar. H4 normas que somente se aplicam em época de guerra. Cessada esta, perdemacficacia, mas continuam vigendo, Aplicam-se para o pasado, levando-se emt contaquealeiaindaexiste, massem eficacia (Osprineipiosconstitucionaispenais,p.22). Quanto as temporérias, que desaparecem apésdeterminado periodo,créserinconsti- tucional dispostonoart.3.°,CP mandando que sejam aplicadas retroativamente (Os rincipios constitucionats penais, p. 23) 34, _Normas penais em branco e 0 principio dalegalidade: convémdemons- {rar que as normas penais em branco nao ‘ofendem o prinefpio da legalidade, o que se pode fazer através da analise das leis intermitentes. Sao normas penaisem bran- co aquelas cujo preceito primario ¢ inde- terminado quanto a seu contetido, porém determinavel, além de terem 0 preceito sancionador determinado, Dividem-seem: 4) normas impropriamente em branco, que se valem de fontes formais homogeneas, aplicagSo da Lei Penal indo penais. Fx.: os impedimentos matti- moniais do crime doart. 237 (casarconhe- cendo tais impedimentos) sio achados no Codigo Civil, que também ¢ le; by normas ropriamente em branco, que se wtilizam de fontes formais heterogeneas, porque o orgio legiferante ¢ diverso e sempre fora do ambito do direito penal. Ex.: 0 crime contra a economia popular, referente a transgressio de tabela de precos, que € f- xadapor 6rgio do Poder Executivo,atraves deregulamento federal, leisou regulamen- tos estaduais ou municipais, tem como complemento da lei penal em branco um elemento de diferente fonte normativa. As rnormas em branco nao ofendem a legali- dade, porque se pode encontrar o comple- ‘mento da lei penal em outra fonte legisla- tiva extrapenal, previamente determinada ‘econhecida. E preciso, no entanto, quese digaque ocomplementoda normaembran- coe, comoregra, denatureza intermitente, feito paradurarapenas porum determina- do periodo. Uma tabela de precos, por exemplo, tem carter temporario, Assim, valendo-se desse caso, quando o comple- ‘mento tiver carter secundario a propria norma penal, utiliza-se o disposto no art. 3°: ele sempre ultrativo, Acrescentando aoexemplo da tabela: um comerciante que tenha transgredidoa tabela Aterdsuacon- utaavaliada pelo juiz combasenessames- ‘matabela, endo com fundamentoemoutra, que veniha a ser editada até a data da sen- tenga. Por outro lado, quando o comple- ‘mento da lei penal em branco for a parte essencial da norma, vale dizer, € mais im- portante conhece-to do que propria des- cricdo da norma penal, nao € possivel apli- caroart.3°,massimoart.2.°, Ex.:sealguém traz consigo substiincia entorpecente, defi- rida como ilicitaem portaria de érgao vin- culado ao Ministério da Satide, uma vez ‘que a droga seja retirada dessa relacao, € natural que haja retroatividade benefica. O

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