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Mikhail Bakhtin Cultura e Vida Ester Myriam Rojas Osorio eT ZL ley) Grupo de Estudos Bakhtinianos - GEBJUNESP Assis Como resultado, dois mundos se confrontam, dois mundos absolutamente incomunicaveis e mutuamente impenetraveis: 0 mundo da cultura e 0 mundo da vida (este é o Unico mundo em que cada um de nés cria, conhece, contempla vive e morre) — 0 mundo no qual se objetiva o ato da atividade de cada um e 0 mundo em que tal ato realmente, irrepetivelmente, ocorre, tem lugar. O ato da atividade de cada um, da experiéncia que cada - um vive’, olha, como um Jano bifronte, em duas diregées opostas: para a unidade objetiva de um dominio da cultura e para a singularidade irrepetivel da vida que se vive, mas nao ha um plano unitario e unico em que as duas faces se determinem reciprocamente em relagdo a uma unidade tunica. Somente o evento singular do existir no seu efetuar-se pode constituir esta unidade unica; tudo o que 6 tedrico ou estético deve ser determinado como momento do evento singular do existir, embora nao mais, é claro, em termos tedricos e estéticos (Mikhail Bakhtin — Para uma filosofia do Ato). ncia vivida: em espanhol e em portugués existe . palavra peculiar e sem ser participio passado: 0 Erlebnis de Edmund Husserl. = sil "Pedro de Jolo Baitores Copyright © dos autores Todos os direitos garantidos. Qualquer parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida ou arquivada, desde que levados em conta 0s direitos dos autores. Ester Myriam Rojas Osorio (org,) Mikhail Bakhtin: Cultura e vida. Sao Carlos: Pedro & Joao Editores, 2010, 180p. ISBN 978-85-7993-004-1 1. Mikhail Bakhtin. 2. Cultura. 3. Estudos linguisticos, 4. Estudos do discurso. 5. Sala de aula. 6. Autores. I. Titulo. cpp - 410 Capa: Marcos Antonio Bessa-Oliveira Editores: Pedro Amaro de Moura Brito & Joao Rodrigo de Moura Brito & Valdemir Miotello Conselho Cientifico: Augusto Ponzio (Bari/Italia); Joao Wanderley Geraldi (Unicamp/Brasil); Roberto Leiser Baronas (UFSCar/Brasil); Nair F. Gurgel do Amaral (UNIR/Brasil) Maria Isabel de Moura (UFSCar/Brasil); Dominique Maingueneau (Universidade de Paris XII); Maria da Piedade Resende da Costa (UFSCar/Brasil). & Pedro & Joao Editores Rua Tadao Kamikado, 296 Parque Belvedere www. pedroejoaceditores.com.br 13568-878 - Sao Carlos - SP 2010 SUMARIO Apresentacao Prof. Dra, Ester Myriam Rojas OSORIO (Docente Unesp- Assis) Introducao: (Reflexées sobre o trabalho de Bakhtin e sua relagdo com o ensino da escrita) Prof. Dr. Manuel Luiz Gongalves CORREA (Docente FFLCH ~ usP) Bakhtin e os estudos da linguagem Prof. Dr. Joao Bosco Cabral dos SANTOS (Docente ILEEL - UFU) A realidade intercultural chilena Prof, Dra. Ester Myriam Rojas OSORIO (Docente Unesp-Assis) Oeue oo outro na obra Ninguem é inocente em Sao Paulo Adriano Julio NOGUEIRA (Colaborador GEB) Bula de remédio: da teoria a pratica em sala de aula Prof. Dra. Alba Maria PERFEITO (Docente PPGEL ~ UEL) A Abordagem Intercultural como Possibilidade de Encontro de Saberes: A Academia como lugar privilegiado dessa interlocucao em favor da promocao humana. Prof. Ms. Claudia Pereira XAVIER (Docente - UEMS) Consideracées dos estudos bakhtinianos para utilizagao de imagens na sala de aula Prof. Ms. Ivo DI CAMARGO Jr (Coordenador GEB) 11 21 29 37 51 2 91 INTRODUGAO Reflexées sobre o trabalho de Bakhtin e sua relacdo com 0 ensino da escrita Manoel Luiz Goncalves CORREA! FFLCH - USP Nos estudos literarios ou linguisticos e em diferentes perspectivas, sao, atualmente, freqiientes as referéncias a produgao de Bakhtin e seu circulo. Dentre os estudiosos que se acercam de suas idéias encontram-se nao so os especialistas mas também aqueles que, interessados em refletir sobre a linguagem, reconhecem, nele, uma das mais. significativas contribuigées. O livro organizado pelo Grupo de Estudos Bakhtinianos da UNESP de Assis (GEB UNESP Assis) retine estudiosos com essas duas caracteristicas. Interessado primeiramente em refletir sobre a linguagem, o grupo persegue, no projeto que se evidencia em seu préprio nome, a trilha do especialista. De minha parte, nessa distingao, tenho dirigido meus esforgos no sentido de me situar no primeiro grupo desses estudiosos, nao, portanto, como um especialista em Bakhtin. E, pois, com a despretensao de um nao especialista que gostaria de deixar ao leitor, A maneira de apresentagao deste livro, algumas reflexdes 1 FFLCH - USP, Pesquisador CNPq — Proc. CNPq n° 305085/2008-5. q 1 t sobre o trabalho de Bakhtin e sua relacao com o ensino da escrita Escolhi comentar um aspecto bem conhecido dos estudos bakhtinianos, 0 qual combina duas caracteristicas: é fundamental na reflexio do autor e, ao mesmo tempo, tem servido & minha propria. Trata-se da distincdo que Bakhtin faz entre géneros primdrios e secunddrios ou, para o que me interessa, da proposigéo das relagdes intergenéricas como fundamento da dinamica dos géneros do discurso. Refiro-me, portanto, ao livro Estética da criacao verbal (1992), coletanea que retine os escritos de Bakhtin, talvez, mais conhecidos entre nds. O oral e 0 escrito como horizontes de reflexao de Bakhtin No que se refere ao modo de existéncia dos géneros do discurso, a distingéo entre géneros primdrios e secundarios é considerada, por Bakhtin, como de grande importancia tedrica. Na realidade, a convivéncia e a reparticao sociais desses géneros parecem lhe servir de base para refutar a atencao dada exclusivamente a linguagem oral, ou seja, a atencao Aos géneros do discurso cotidiano (principalmente a réplica do didlogo cotidiano) do ponto de vista da linguistica geral (a escola de Saussure e seus continuadores mais recentes ~ os estruturalistas, os behavioristas americanos, os discipulos de Vossler) [que, de acordo com o autor, dava relevo] ao discurso cotidiano oral, operando no mais das vezes com enunciados deliberadamente ptimitivos (os behavioristas americanos) — (Bakhtin, 1992, p. 280-281 ~colchetes meus). Nao é, pois, sem raz4o que o autor chama a atengaio para 0 fato de que o enunciado situa-se no cruzamento excepcionalmente importante de uma problemdtica, 0 que justifica 0 exame que anuncia: é deste dngulo que vamos agora abordar algumas dreas e 12 alguns problemas da linguistica. Examina, em seguida, a estilistica. O autor conduz a sua exposigao para o tratamento da complexa dinamica histérica dos sistemas da escrita e literario. A primeira tarefa seria sair da classificagao totalmente fortuita do estilo, caracteristica que o autor atribui aos estudos tradicionais, e integra-la ao género e as esferas de atividade humana, modo de levar em conta, também, os géneros primarios e secundarios. E esta ultima distingao que o leva a considerar dois diferentes sistemas: a lingua escrita e a lingua literaria. A lingua escrita é, pois, considerada um sistema dindmico e complexo, constituido pelos estilos de lingua, os quais, dentro do sistema da lingua escrita, se encontram num estado de continua mudanca (Bakhtin, 1992, p. 285, grifo meu). No sistema ainda mais complexo da lingua literdria, estao presentes componentes que, segundo o autor, incluem os estilos da lingua nao escrita. E continua: Para deslindar a complexa dindmica historica desses sistemas, para passar da simples (e em geral superficial) descricao dos estilos que se sucedem, e chegar a explicagdo histérica dessas mudancas, & indispensdvel colocar 0 problema especifico dos géneros do discurso (e nao s6 dos géneros secundarios mas também dos géneros primérios) que, de uma forma imediata, sensivel e Agil, refletem a menor mudanca na vida social (Bakhtin, 1992, p. 285, grifos meus). Tanto a lingua escrita quanto a lingua literdria sao, portanto, segundo o autor, marcadas pelos géneros do discurso. A maneira do que se constata atualmente em relagao a linguagem digital, Bakhtin afirma que a lingua escrita incorpora diversas camadas da lingua popular, acarretando em todos os géneros (literdrios, cientificos, ideolégicos, familiares, etc.) a aplicagdo de um novo procedimento na organizacao e na conclusao do todo verbal e uma modificagao do lugar que sera reservado ao ouvinte ou ao parceiro, etc., 0 que leva a uma maior ou menor reestruturacao e renovacao dos géneros do discurso (Bakhtin, 1992, p. 285-6). Conclui o autor que a literatura se caracteriza pela dialogizacao mais ou menos marcada dos géneros secunddrios, de tal modo que quando passamos do estilo de um género para outro [...] destruimos e renovamos 0 proprio género (Bakhtin, 1992, p. 286). Desse modo, o estudo da literatura pode ser tomado como distintivo em relagao ao trabalho feito pelas ciéncias exatas e naturais. A esse respeito, Lemos (1994) faz importantes observagées sobre a posicao de Bakhtin quanto ao trabalho com formas monoldgicas ou dialégicas de conhecimento: as ciéncias exatas e naturais seriam formas monolégicas de conhecimento, em que 0 tinico sujeito é o sujeito cognoscitivo que se coloca diante de seu objeto como diante de uma coisa sem voz. Isso que ele chama de coisificagéo, e que é 0 procedimento préprio a essas ciéncias, ¢ incompativel com as ciéncias humanas cujo objeto © ‘ser expressive que fala’, o qual, por jamais coincidir consigo mesmo, tem um sentido inesgotavel e ndo pode ser apreendido como coisa (Lemos, 1994, p. 39, grifos no original). E esse olhar para o ‘ser expressivo que fala’ que me interessa perseguir em minha reflexao sobre a escrita e seu ensino. O escrevente e o principio de realidade Na pesquisa que desenvolvo sobre escrita, parto da assungdo de um principio de realidade que, apesar de quase Obvio, consiste em dar um lugar para o sujeito que escreve, isto para esse ‘ser expressivo que fala’. 14 Entendamo-nos. Carlo Ginzburg, em formulacado baseada em Renato Serra, um “critico italiano com fortes interesses filosoficos”, assim define “principio de realidad”: [Na narragéo de uma batalha] desajeitadas cartas mandadas pelos soldados iis suds familias, artigos de jornal escritos para agradar um piiblico distante; relatos de agées de guerra rabiscados com pressa por unt capitio impaciente, reelaboracdes de historiadores cheios de veneracio supersticiosa por cada um desses documentos, todas essas narracoes, independentemente de seu carater mais ou menos direto, tem sempre uma relagio altamente problemética com a realidade. Mas a realidade (“a coisa em si”) existe (Ginzburg, 2009, p. 226 — colchetes meus). Assim como as diferentes narragdes de uma batalha tém uma relagao altamente problemdtica com a realidade, sem que deixe de existir, porém, “a coisa em si” (a propria batalha), é igualmente problematica a relagao que o produto escrito mantém com o seu produtor. O escrevente, que pode ter uma conformacao fisica, peso e estatura determinados, nao se constitui como dado de realidade em fungao, apenas, desses aspectos mais visiveis. Por isso, pode-se fazer um paralelo entre a relagéo problematica narracao x coisa em si [a batalha], por um lado, e o produto da escrita x seu produtor [um dado escrevente], por outro. E isso em dois sentidos: em relagdo ao escrevente, o produto da escrita é construido como uma escrita de si, mas 0 escrevente é, a0 mesmo tempo, e em diferentes niveis, distinto do individuo biolégico que emite sons vocais. Reconhecer essa relagao problematica com a realidade nao corresponde, porém, no outro extremo, a propor um lugar vazio para 0 sujeito, no qual ele seria apenas falado pela funcao discursiva que ocupa. Em outras palavras, na pesquisa ou no ensino, sempre que se pensa no texto e em seu processo de produgao, além da dimensao pragmatico-enunciativa que situa o enunciador e rege © processo de textualizagdo, ha, também, a ordem histérico- 15 discursiva em que texto e escrevente se inscrevem. S6 quando se encontram, portanto, dimensao pragmatico-enunciativa e ordem histérico-discursiva, é que 0 texto ganha a sua coeréncia e tem validadas as suas ligagdes formais. Por sua vez, a partir desse encontro, 0 escrevente j4 nao lida apenas com as orientagdes da situagdo imediata de enunciagao, mas, também, e necessariamente, com a_ articulagéo entre os elementos pragmatico-enunciativos e a ordem historico-discursiva, ligada, esta Ultima, as representagdes da situacao, da acao entre interlocutores e do ja-enunciado que fertiliza, pelo que escolhe e pelo que esté fora de sua escolha, a sua memoria discursiva*. O principio de realidade e as relacées intergenéricas Em situagdes de ensino de escrita, essa constituigao complexa do escrevente participa ativamente da relagao de ensino e aprendizagem. Pode, mesmo, ser considerada como um dos fatores responsaveis pela alteragao da direcao prevista para um objeto a ensinar e, até mesmo, pela alteragio do préprio objeto a ensinar no percurso que ele cumpre até 0 objeto ensinado. Em termos bakhtinianos, a refracao produzida sobre o objeto a ensinar corresponderia a atitude responsiva ativa (Bakhtin, 1992, p. 298-9) nao simplesmente do escrevente enquanto individuo bioldgico, mas dele em sua complexa relagao com esse dado de realidade. No que se refere a produgao escrita, uma das maneiras de se observar essa relacao problematica com a realidade é, ainda 2 Segundo Brandao, a memdria discursiva, exercendo {...] uma fungio ambigua na medida em que recupera o passado ¢, ao mesmo tempo, o elimina com os apagamentos que opera, [...] irrompe na atualidade do acontecimento, produzindo determinados efeitos... Ainda segundo a autora, esses efeitos de memsria tanto podem ser de lembranga, de redefinig@o, de transformagao quanto de esquecimento, de ruptura, de denegagio do jé-dito (Brandao, 1995, p. 79). 16 em termos bakhtinianos, por meio das relagées intergénericas registradas no texto. Antes de aborda-las em sua relacgao com a escrita, retomo as reflexdes de trés autores, dentre os quais o proprio Bakhtin, que estudam essas relagdes com base no estudo do didlogo e no aspecto dialdgico da linguagem. Comego por uma observacao de Marcuschi sobre o género conversagao face a face. Antes de dominar outros géneros que nao a conversa¢ao — 0 mais fundamental de todos, na formulacao de Marcuschi (1986, p. 14) — pode-se pensar em intimeras espécies conversacionais que integram essa experiéncia primordial com a linguagem. O préprio Marcuschi lembra de uma delas quando comenta a fala solitaria da mae ao dar a vez ao bebé, reproduzindo as respostas que atribui a ele e dialogando com elas ao Ihes reconhecer um sentido. Este exemplo leva ao limite o papel do contexto extraverbal, uma vez que, nao se comunicando por palavras (contexto verbal), a crianga acaba por impor a mae a duplicagéo dos papeis de falante e ouvinte, alternancia por meio da qual ganham sentido os enunciados atribuidos, de modo ficticio, a cada um dos participantes. Explorando outro limite, 0 da redugao do didlogo a uma unica palavra, Bakhtin, em Discurso na vida e discurso na arte (sobre poética socioldgica), cita 0 exemplo de duas pessoas que dividem a mesma lingua e o mesmo espaco fisico e cultural: Duas pessoas estao sentadas numa sala. Estao ambas em siléncio. Entao, uma delas diz “Bem.” A outra nao responde. [...] Vamos supor que a entoaco com a qual esta palavra foi pronunciada nos é conhecida: indignagao e reprovacdo moderadas por um certo toque de humor. Esta entoagio de algum modo preenche 0 vazio semantico do advérbio bem, mas ainda nao nos revela o significado do todo. O que é que nos falta entao? Falta-nos o “context extraverbal” que torna a palavra bem uma locucdo plena de significado para o ouvinte. Este contexto extraverbal do enunciado compreende trés fatores: 1) 0 horizonte espacial comum dos interlocutores (a 17 unidade do visivel - neste caso, a sala, a janela, etc.), 2) 0 conhecimento e a compreensio comum da situagao por parte dos interlocutores, e 3) sua avaliacdo comum dessa situacao. No momento em que 0 coléquio acontecia, ambos os interlocutores olhavam para a janela e viam que comegava a nevar; ambos sabiam que jd era maio e que ja era hora de chegar a primavera; finalmente, ambos estavam enjoados e cansados do prolongado inverno — ambos estavam esperando ansiosamente pela primavera e ambos estavam amargamente desapontados pela neve recente. [...] Os flocos de neve permanecem do lado de fora da janela; a data, na folha do calendario; a avaliacdo, na psique do falante; e, nao obstante, tudo isto esta presumido na palavra bem. Agora que nés percebemos 0 presumido, isto é, agora que nés conhecemos © horizonte espacial e ideacional compartilhado pelos falantes, 0 sentido global do enunciado Bem é perfeitamente claro para nds e compreendemos igualmente sua entoagio (1926-s/d, p. 5). Diferentemente de Marcuschi e explorando a teoria da enunciagao de Bakhtin, Marchezan (2006) estuda o didlogo como um conceito-chave, que, tanto no dominio da comunicacio quanto no dominio da reflexao, serve de base para a teoria. Além de permitir propor o carater dialdgico da linguagem, a autora mostra que a diversidade de didlogos permite considerar nao 18 um grande dilogo geral, sem feigdes, mas uma diversidade de didlogos, traduziveis em especificidades de estilo e género, que os particularizam e localizam em praticas sociais cotidianas e em esferas de atividade mais sistematizadas. E continua: os dialogos sociais nao se repetem de maneira absoluta, mas nao sao completamente novos, reiteram marcas histéricas e sociais, que caracterizam uma dada cultura, uma dada a sociedade. A autora sintetiza, entao, 0 desafio a que a nogdo de genero busca responder: apreender a reiteracdo na diversidade, organizar a multiplicidade buscando 0 comum, sem cair em abstragdes dessoradas de vida Longe disso, ¢ a propria dinamica e heterogeneidade social que podem explicar os géneros (Marchezan, 2006, p. 118, grifos meus) Nesse ponto, temos ja material para uma conclusdo, ainda que de cardter provisério. No processo_histérico- discursivo, as singularidades dos didlogos sociais, ao produzirem as unidades reais dos enunciados (Bakhtin, 1992, p. 294) - dotados, portanto, de um matiz dialdgico -, se multiplicam em géneros do discurso. Nao o fazem, no entanto, unicamente por forga da repartigao social de uma dada esfera de atividade humana, mas, também, em funcdéo do que Marchezan chama a propria dindmica e heterogeneidade social que podem explicar os géneros (grifo meu). Consideragoes para futuros encaminhamentos Observar a dindmica que esta na base de constituigao dos géeneros € uma das atitudes de pesquisa que defendo no estudo da escrita. Por meio dela, acredito, podem-se explorar, produtivamente, no ato da leitura, os pontos de tropego do proprio leitor, momentos em que, normalmente, ele se coloca como juiz do sentido produzide num dado texto. A leitura, réplica que ratifica a ordem histérico-discursiva da produgao textual, isto 6, que atribui ou nao coeréncia ao texto e validade as suas articulagdes formais, deixa de ser, portanto, um julgamento normativo no sentido gramatical (da gramatica oracional ou interoracional ou daquela das articulagSes formais supostas como corretas antes mesmo de o texto ser produzido) para passar a uma avaliagio que toma, implicita ou 19 explicitamente, como parametro o presumido que pode ser apanhado na leitura de um texto. Eis, portanto, um modo de explorar as relagdes intergenéricas no estudo da escrita. Para o seu ensino, o Passo seguinte € reconhecer a trajetéria do escrevente pelas praticas sociais orais/letradas e sugerir uma direcao Para o que se evidencia como a reminiscéncia de um género ou o nascimento Referéncias BAKHIIN, M. Estética da criagdo verbal. Trad. de Maria Ermantina Galvao Gomes Pereira, revisio de Marina Appenzeller. Sao Paulo: Martins Fontes, 1992. GINZBURG, C. O exterminio dos judeus e o principio de realidade. Trad. de Henrique Espada Lima In: EPPLE, A. et al. A histéria escrita: teoria e historia da historiografia. S40 Paulo; Contexto, 2009. LEMOS, C.T.G DE, A fungao e o destino da palavra alheia: trés momentos da reflexdo de Bakhtin. In: BARROS, D.L.P. DE & FIORIN, J.L. (orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade: em torno de Bakhtin. $40 Paulo : EDUSP, 1994, pp. 37-43 MARCHEZAN, R. C. Didlogo. In: BRAIT, B. (org.). Bakhtin: outros conceitos-chave. Sao Paulo: Contexto, 2006, pp. 115-131. MARCUSCHI, L. A. Andlise da conversacao. S40 Paulo : Atica, 1986. VOLOSHINOY, V.N. / BAKHTIN, M.M. Discurso na vida e discurso na arte (sobre postica sociolégica). Trad.: Carlos Alberto Faraco e Cristovio Tezza Para uso didético, com base na traducao inglesa do original de 1926, feita por LR. Titunik e publicada em: Voloshinov. Freudism. New York, Academic Press, 1976. s/d. 20

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