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Born ‘Ménica Medeiros Kothet Macedo Leanira Kesseli Carrasco (Ones,) (CON)TEXTOS DE ENTREVISTA Olhates diversos sobre a interagio humana Autores: Adiana Ampessan, Angela Cristina Batsios Praini Seger Blanca Susana Guevara Werlang Carolina Neumann de Barros Facto Denise da Costa Hausen. Dulce Helena Aguilar Baldo Fabicia Ramos Irani de Lima Argimon 1 Jcqueline Paetsch Moreira Janice de Oliveira Casithos Viola Juliana Ransch Potter Kelly Cardoso Pair | eanira Kessei Carrasco (org) Maria Licia Tiellet Nunes Marta Cemin Monica Medeitos Kother Macedo (ong) . Nidia Maria Marques } Nast elena Sanchotene deSouza 1 ‘Nelson Asnis i Neti Mauricio Piccoloto } Ricardo Wainer Sissi Vigil Castel “Tereza Rech QW NY wt Casa do Pslestogo® | ENTREVISTA DE TRIAGEM: ESPACO DE ACOLHIMENTO, ESCUTA E AJUDA TERAPEUTICA ‘Napa Marques A realidade complexa as exigéncias da vida atual tém contribuido para uma procura cada vez maior de parte de diver- pessoas por atendimento psicolégico. As instituigdes priva- das, 05 centros de saiide e os hospitais recebem uma significa tiva demanda de pacientes que trazem suas queixas, seus trau- mas € seus softimentos com o intuito de livrarem-se dos sinto- mas que os atormentam. Essas pessoas, muitas vezes, nflo tm 4 menor idéia do tipo de tratamento de que necessitam. Elas vém em busca, neste primeiro momento, de um espago no qual possam ser acolhidas, aceitas ¢ respeitadas em sua dor psiqui- €~ set acolhidas, aceitas ¢ ca, Necessitam do olhar e da escuta de uma outra pessoa que se ‘disponha a auxilid-tas a compreender algo do que se passa com elas, ajudando-as a encontrar uma saida para sua situaglo tual Este € um momento particular na vida de quem busca atendi- mento emocional, por isso a entrevista de triagem pode re entar para a pessoa o lugar de continéncia de que ela precisa, A interagaio que se estabelecera entre o entrevistador € 9 paciente definiré um campo propicio para que as sensagdes ¢ 08 sentimentos possam ser pensados de forma compartilhada. © campo da entrevista estrutura-se a partir da relagao intersubjetiva entre entrevistador e entrevistado, determinando um processo dinamico e criativo. “O campo é uma estrutura distinta da soma de seus componentes, como uma melodia é distinta da soma das notas musicais” (KANCYER, 1997, p.115). 182 (Conjtexton de enievita:obtes divers sobre a interagdo humana Bion (apud FERRO, 1995, p. 27) destacou a importincia do terapeuta assumir, desde o inicio de seu contato com o pa- ciente, uma atitude “sem meméria e sem desejo”, em que a capacidade de tolerar © desconhecido se ligue a confianga em algo que vai desenvolver-se por meio do contato emocional com © paciente, Nessa oportunidade, o par podera obter uma com- preensiio mais clara e profunda dos motivos que levaram o pa- ciente a buscar ajuda. Faimberg (2001, p. 63), a esse respeito, menciona a im- portincia da “escuta da escuta”, ou seja, o entrevistador deve ocupar-se de também escutar como o paciente ouviu os seus siléncios ¢ as suas intervengSes, Dessa forma, o entrevistador poderé ouvir o inaudivel que é comnnicado por meio da trans- feréncia ¢ da contratransferéncia, constituindo-se em instru- mento indispensdvel na descoberta do psiquismo do paciente. A autora comenta, ainda, que © paciente, ao escutar como 0 ‘terapeuta o escutou, encontrard a oportunidade de poder ouvir a si mesmo. Considerando esses pressupostos, entende-se que a entre- vista de triagem se constitui em um importante espago de aco- Ihida e de escuta para a pessoa que se encontra em sofrimento psiquico. A tarefa de procurar um significado para as perturba- ‘g0es trazidas pelo paciente e de ajudé-lo a descobrir recursos que 0 aliviem possui valioso cunho tetapéutico. As caracteristicas A entrevista de triagem, baseada no referencial teérico ps canalitico, envolve um proceso de avaliagao que nio se refere necessariamente a uma tinica entrevista, Em varias ocasibes, a avaliaeHo inicial pode demandarum periodo mais longo de tem- po, incluindo um niimero maior de entrevistas. As entrevistas de triagem sao entrevistas clinicas semi-estruturadas. Manica Mateisos Kother Macedo 6 Leanlca Kesseli Carrasco (Orgs) 18 Tavares (2002, p.46) satienta que ta clinica & um procedimento poderoso €, pelas suas caracteristicas é 0 tinico capaz de adaptar-se & diversidade de situagGes relevantes € de fazer explicitar particularidades que escapam a outros procedimentos, prineipalmente aos padronizados. Kemberg (1975) explica que a configuragio das entrevis- tas clinicas favorece a emergéncia da organizagao estrutural do funcionamento mental, pois contraria a classica entrevista, de avaliagdo das fungdes mentais com uma avaliagdo psicodinfmica dirigida & interago dos intervenientes. ‘objetivos e do tipo de informagao de qq ‘Para atingi-los; do tipo de interven¢ao que facilita a coleta dos liagfio. Essa forma de enitevisia aumenta a confiabilidade dos dados obtidos, fa- vorecendo o trabalho de pesquisa € o estabelecimento de um planejamento de agdes de saide ¢ de orientagio terapéutica Por isso, as entrevistas semi-estruturadas sto freqiientemente empregadas em locais como clinicas sociais, nos ambulatérias de psicologia dos hospitais, nos postos de saiide ptiblica, etc. (CUNHA, 2002). Gabbard (1992) ensina que o entrevistador deve manter um estilo de entrevista flexivel, passando da bus- ca estruturada de fatos a uma atitude niio-estruturada de eseuta das associagdes do pensamento do entrevistado. Os papéis As entrevistas de triage compreendem uma interagao, face a face, entre duas pessoas, em um tempo delimitado, com obje- tivos especificos e com papéis diferenciados. © entrevistador tem a fungi de conduzir 0 processo de triagem, ditigindo os diversos momentos das entrevistas em 16 (Con)extos de enuewss ollares divertoe sabre a nterago uma fungdo de seus objetivos primordiais de diagnéstico ¢ de indi- cago terapéutica, Cabe a ele, ainda, garantir um ambiente de, sigilo, confortivel ¢ livre de interrupgdes a fim de que o entre vistado sinta-se a vontade para falar sobre seus problemas, Sua primeira tarefa é a de transmitir que o entrevistado € aceito ¢ valorizado como uma pessoa tinica. O profissional, baseado em seus conhecimentos te6rico-técnicos e em seus recursos emo- cionais, iré avaliar os aspectos pessoais, relacionais e internos do paciente com o intuito de conhecé-lo o mais profundamente possivel. O entrevistador, partindo das associagdes do pacien- te, busca, de forma ativa, as informagdes necessarias para com- preender seu estado atual. Ele deve ser capaz de mover-se com espontaneidade ao longo dos temas trazidos pelo paciente nas entrevistas. No entanto, nao deve perder de vista a sua sua fungap de observar as Cordioli (1998) sugere que o entrevistador faga perguntas para auxiliar o paciente a iniciar 0 seu relato, expressar suas opinides ¢ seus comentirios, fazendo, ainda, ligagdes entre 05 temas abordados e resumos d final da entrevista, Bi acrescenta que o entrevistadot ‘pode utilizar-se de intervengées como: perguntas, comentirios, confrontagées, esclarecimentos, explicagées, assinalamentos e interpretages de ensaio, a fim de reunir os dados necessirios, néfo $6 para o seu entendimento da situagfo da pessoa, mas tam- bém para auxilid-la a obter uma consciéneia maior de seu pro- blema ¢ uma maior motivagao para adetir ao tratamento reco- mendado. paciente, em prinefpio, é quem, por estar em sofrimento, vem em busca de algum tipo de ajuda. Nesse processo, ele niio deve ficar na posigio de colaborador passive, que apenas res- ponde as perguntas do terapeut: deve ser convidado a ter ‘Ménica Medel Kother Macedo 6. Leanica Kessel Caras (Orge) 16s uma participagio ativa ¢ cooperativa, informando ¢ comuni- cando a respeito de suas dificuldades, seus sentimentos ¢ con- flitos, Ainda, se faz necessirio, que 0 pacienle possa lrazer a Percepgdio que tem de seu problema, bem como as expectativas que faz em relagdo a um atendimento e suas fantasias associa- das 4 forma como deseja ser ajudado. encontro, delineado em fungdo desses papéis descritos, define um campo relacional, construido pela comunii se estabelece a partir dos sentimentos que réncia e na contratransferéncia. A transferéncia € a pete) dos sentimentos relacionados a figuras do passado que sao re petidos com o entrevistador na situagiio atual. A transferéncia é [ ‘uma dimensio vital da avaliagaio, na medida em que afeta dire- tamente a cooperagiio entre o paciente ¢ o terapeuta, Padroes de transferéncia fornecem vislumbres de relacionamentos signifi- cativos do presente ¢ do passado do paciente. Gabbard (1992) recomenda que sejam abordadas as distorgdes transferenciais precocemente, para que sejam removidos posstveis obstaculos a.uma efetiva coleta da histéria. O autor alerta, entretanto, que 0 entrevistador deve ter presente que a relagdo entrevistador-pa- ciente é sempre uma mistura de transferéncia e de relagao real. © entrevistador desenvolvera reagdes de contratrans- vg feréncia em relagto ao paciente. Ele experimentard algumas =) sespostas emocionais diante do paciente semelhante as desper- f ~{ tadas por este em outras pessoas. Mas, também, poderd ter sen- sages originadas de figuras importantes de seu proprio passa- do. Por isso, é fundamental que o entrevistador monitore suas Teages de forma a nfo atud-las, mas utiliz4-las como uma fon- ‘EUs informagSes a respeito do pacienic, Assim, também esta- ‘¥a mais Capacitado a tolerar as intensas ansiedades despertadas por temas relacionados a experiéneias dolorosas ou fatos que envergonham o paciente, podendo, de forma segura, falar aber- tamente sobre eles. 165 (Contexts de enteisas olares divers sobre miner human Essa comunicagio particular inclui ainda as reagdes , advindas das identificagdes-projetivas cruzadas entre entrevistador e entrevistado no aqui-agora da entrevista. Esse < Angulo oferece uma valorizada fonte de informag6es a respeito } dos sentimentos e dos modelos relacionais primitivos do entre- \ vistado (ZIMERMAN, 1995). Os objetivos A entrevista clinica é uma técnica que pode ser estruturada de acordo com formas diferentes de abordagem, conforme os objetivos especificos do entrevistador e de seu referencial teé- rico. Os objetivos de cada tipo de entrevista é que iro determi- nar estratégias, intervengées, alcances e limites. As entrevistas de triagem, realizadas dentro do enfoque psicodinmico, objetivam primordialmente elab {ria clinica, definir hipdteses de diagndstico descr ia psicoding de prognéstico € de indicagag ierapéutica. ~ Hist6ria Clinica Cunha (2002, p. 59) refere que a historia do paciente com- preende a sua histéria de vida pessoal e a historia de sua doenga atual. “Pressupse uma reconstituigo global da vida do pacien- te, como um marco referencial em que a problemitica atual se enquadva ¢ ganha significado”. A histéria de vida do paciente oferece os dados necess4- rios para que o entrevistador possa chegar as hipdteses de diagnéstico descritivo e psicodinamico, O entrevistador co- loca sua escuta e sua atengao a disposig&o do paciente para acompanhar a ordem em que sio relatados acontecimentos, \ 167 Jembrangas, interesses, preocupagdes e outros conteiidos, pois assim obteri pistas para as conexdes inconscientes do entrevis- tado. O entrevistador ini registrando no s6 0 que o paciente verbalizou, mas também 0 momento da entrevista ¢ os senti- mentos que acompanharam as informagbes. A histéria atual contempla o esclarecimento dos sinto- mas do entrevisiad Sem que surgiram, a de estréssores que desencadearam oll agravaram 0 Quadro. E_indispenisdvel averiguar como essa situagio influéncia as relagdes socials, sexuais, fami- liares ¢ profissionais do paciente, assim como o grau de desconforto e \dapiagiio que geram em sua vida fun- A historia pregtessa ira complementar esses dados, na medida em que oportuniza uma visio do desenvolvimento evolutivo da pessoa. Nesta fase da coleta de dados ¢ impor- tante que o entrevistado seja envolvido numa revisao de seu passado, por meio das possiveis ligagées entre os aconteci mentos e sentimentos atuais ¢ os de sua infancia e adoles- céncia, Convém que o entrevistador adote um modelo de anamnese que 0 oriente, de forma flexivel, a buscar as infor- magdes necessérias ao seu trabalho, respeitando as possibi idades do paciente ¢ os limites dos objetivos das entrevistas de triagem. Hipétese de Diagnéstico Descritivo O diagnéstico descritivo (baseado nos critérios de DSM-IV TR), embora insuficiente para uma compreensio profinda da problemética da pessoa e para a formulagao do prognéstico, constitui-se em uma informagio essencial para orientar, num primeiro momento, o raciocinio clini- co do entrevistador quanto 4 escotha de tratamento mais 168 (Can)eextos de entreviats olhares diversas sabre a intragso humana adequadg. Cordioli (1998) lembra que, para algumas situa- Ges, a psicoterapia pode ser a pedo terapéutica adequa- da, enquanto que para outras é a psicofarmacoterapia, ou a terapia psicossocial, ou outras formas de tratamento. Ele adverte que a indicago inadequada de uma psicoterapia pode ser ineficaz em certas condigdes e eventualmente pode agravar os sintomas do paciente. Hipétese Psicodinamica hip6tese psicodinamica refere-se ao diagndstico que visa enéender 0 quanto e como o paciente esta doent como adoecen ¢ como a sua doenga o serve. Braier (1986) deno- mina o diagnéstico dinamico, realizado a partir de entre- vistas preliminares, de hipdtese psicodindmica minima ou precoce. O autor entende que essa hipétese inicial é um esbogo reconstrutivo da histéria dindmica do paciente, uma tentativa de compreensio global de sua psicopatologia que tende a incluir todas as perturbagdes e potenciais conheci- dos. A hipétese dindmica x 08 problemas referidos pelo paciente 4 luz da teorig. Na ela- boragaio dessa hipdtese dindmica breve, o entrevistador. pro- cura explicar os contlitos subjacentes ao problema atual do paciente, especificando as forgas em jogo, as ansieda- des dai decorrentes, 0s mecanismos de defesa mobilizados € os resultantes expressos pelos sintomas. Essa integragiio, no formato de uma compreensio légica e abrangente da psicopatologia do paciente, é indispensavel para que o entrevistador tenha condigées de definir um prognéstico ¢ uma indicagao terapéutica com maior precisio e trangiiili- dade. Além disso, permite que o entrevistador possa fazer uma devolugao diagnéstica, baseado em um conhecimento consistente do paciente. ‘Ménica Medeiros Kother Macedo & Leanira Kesseli Carrasco (Orgs) 169 Prognéstico Miranda-Sa Junior (2001) afirma que conhecer ¢ poder pre- ver. Ou seja, ele explica que todo o conhecimento presume al- guia previsibilidade ¢ explicabilidade, o diagnéstico e tam- ‘bém um prognéstico. O autor salienta que os diagndsticos de- vem ser elaborados de maneira a se referirem aos aspectos fenoménicos atuais da enfermidade, incluindo sua etiopatologia € antecipando a previsio de sua evolugat. Apésa realizagio do trabalho avaliativo da triagem, é possi- vel efetuar uma avaliagdo prognéstica relativa ao quadto atual que motivou a busca de atendimento, Braier (1984) menciona ser importante analisar as diversas condigdes diagnésticas do paciente (inicio da doenga, tipo de psicopatologia, contexto Sociofamiliar, recursos de égo, grau de motivagio e de insight) ‘Para se considerar um progndstico como favordvel ou desfavo- rivel. Acrescenta que ¢ preciso, também, verificar 0 context assistencial quanto as possibilidades terapéuticas que oferece em seus aspectos temporais, espaciais, equipe de trabalho, ete. A triagem, como um primeiro filtro, tem a fungao de bus- car as informagées bisicas sobre o paciente com 0 objetivo de formular recomendagées diagnésticas e terapéutica. Esta tarefa exige do entrevistador 0 conhecimento das possiveis aborda- gens psicoterdpicas, bem como de outras formas de atendimen- to que possam ser necessarias a0 paciente. O profissional ira emitir sua opinitio acerca da aborda- ‘gem terapéutica que considera a mais adequada a situagao dq paciente, Poderd esclarecer a este o tipo da indicagdo: se indi- vidual, familiar, ambulatorial, consult6rio privado ou em am- biente hospitalar. 170 (Contexts de eneevists eras humana Deve ser lembrado de que existem doengas fisicas que se fazem acompanhar de sintomas psiquidtricos dificeis de serem diferencindos de alguns transtomos emocionais. Dessa forma, € indispensivel a busca de esclarecimentos da presenga ou nao de causas fisicas, bem como da utilizagio de medicamentos que possam confundir o diagndstico. O entrevistador precisa considerar outros aspectos para for- mular a sua indicag‘o terapéutica, Ele deverd levar em conta as condicdes de vida do paciente como seus recursos financ TOs Sha disponibilidade de hordrio, acesso fisico e apoio f enfim, levar em conta as necessidades ¢ as possibilidades da “pessoa part {que'a sta nfo seja recomendado um tipo de ‘atendj- ideal, mas impraticdvel Os elementos necessarios a definigao destas conclusdes diagnésticas e terapéuticas so obtidos pela avaliagiio de varios aspectos do funcionamento do sujeito. O entrevistador tem, tam- bém, como objetivo examinar o grau de motivagaio ¢ de insight, © nivel de funcic uly, O3 recursos de ego € o padrao Sociofamiliar. E importante assinalar que esta avaliagdo & feita ‘com 0 propésito especifico de conhecer 0 suficiente da situa- so da pessoa para poder Ihe dar um encaminhamento. Por isso, tais aspectos deverio ser aprofundados no atendimento psico- l6gico propriamente dito. Grau de Motivagio ¢ de Insight Refere-se a disposigdo da pessoa em reconhecer as difj- culdades psiquicas que prejudicam seu desenvolvimento ¢ suas relagdes, mostrando clara desconformidade diante de- las, O paciente explicita o desejo consciente de engajar-se em um processo que possa ajudi-lo a fazer mudangas em sua vida, mediante a solugo efetiva de seus problemas. A disponibilidade em compreender e superar impasses pode Méiea Medeiros Kother Maced 6 Leanira Kesseli Carrasco (Org) m ser observada no contato com o paciente por meio da identi- ficacao de alguns indicadores. Assim, suas respostas as in- tervengdes do entrevistador, a consciéncia de sua enfermi- dade, a capacidade de criticar sua situag&io de modo flexivel, sua possibilidade de trabalhar com varios niveis de expres- stio simbélica, realizando conexdes entre situagdes vividas no passado ¢ os afetos a elas associados e suas conseqiién- cias na vida real, a honestidade consigo mesmo, para encon- trar a verdade sobre sua prépria pessoa, a capacidade de reviver situagdes dolorosas e comunicé-las ¢ sua capacidade de auto-observagiio demonstrardo seu grau de insight e de motivagiio. O entrevistador deve ter em mente que a decistio de procu- rar um atendimento, freqlentemente, & ambivalente, Ao mes- ‘mo tempo em que o paciente expressa seu desejo de encontrar alivio para o seu sofrimento, aparecem oposigdes inconscien- tes que dificultam 0 encontro de solugdes mais realistas. Os aspectos mais maduros e saudaveis da personalidade do sujeito buscardo aliar-se ao entrevistador para se contatar com a doen- a, Em contrapartida, as resisténcias se opéem a esta alianga, reforgando a doenga (SANDLER, 1977). Nivel de Funcionamento Onivel de funcionamento correspond que 0 enirevistado mantém com a realidade em geral. Segundo Kemberg (1980), 0 exame da realidade pode ser observado pela capacidade do entrevistado em distinguir os sentimentos como provenientes de seu mundo interno ou como proveniente de fora (alucinagées, ilusdes); pela preservago da consciéneia re- flexiva ¢ do juizo critico; pela presenga de peusamentos e afe- tos apropriados ou nao, bem como pela sua capacidade de empatizar com o entrevistador. m (Con)tertos de entrevista lhars divers sob interasfo humana antor, considerando esses crit hamento psiquico em trés sivética. O ios, classifica o funcio- inane ee re integradas, hd falta de capacidade empitica, as relagdes de objeto sito cad- eas, hd auséncia de control mpulsos, bai frustragdes, a personalidade é instavel e o superego, ri Euncionamento psicsi imagens do self‘e dos objetos es- tio fundidas, predominam a projeco ¢ a identificagio projetiva como mecanismos de defesa, o exame da real 1d grave- menfé comprometido e os sintomas so egosinténicos, Recursos de Ego Braier (1986) destaca a necessidade de o entrevistador ob- ter uma visio das condigées egdicas do paciente. Para tal, bus- ca avaliar os recursos de ego (aspectos maduros ¢ sadios) que ele dispde para fazer frente & sua realidade interna e externa, No momento da tiagem interessa que se indague sobre : dsicas do epo co cognigao, linguagem, afeto econduta; “Ja, @ capac dade de o paciente enfrentar dificuldades, tolerar perdas.e separagdes; hho controle e na expresso dos impulsos dos afetos, como at -xualidade e ansiedade (pode ser excessivo ou estar diminuido), * a relagio do ego com o superego. Interessa ao entrevistador avaliar a rigidez ou a ineficiéncia do superego por meio da ot Monies Medeivos Kother Macedo & LeaniraKeweli Coresco (Ones) 1m maneira como o entrevistado relaciona-se consigo ou fant IStICOS,, cele). ‘Zimerman (1999) énfitiza a importancia dos mandamentos superegéicos n0 psiquismo do paciente, uma vez. que com freqtiéncia se apre- sentam na vida da pessoa em forma de culpa, auto-acusa-** es, busca inconsciente de punigiio, desvalia, etc, Me + ‘oS mecanismos de defesa principais utilizados pelo paciente para fazer frente as jiedades ¢ aos seus impulsos. Deve-se identificar sé existe predominio do uso de mecanis- ‘mos mais maduros ou mais regressivos. Estes mecanismos de defesa podem ser de dois tipos: as defesas adaptativas como a repressio, a racionalizagiio, anulagio, formagao reativa, sem distorgdo da realidade e as defesas primitivas como dissociagao, identificagao projetiva, controle, idealizagio, ne- gagio, com distoreiio da realidade (CORDIOLI, 1998); + aregulago e as caracteristicas da auto-imagem (desvalori- zada, grandiosa, hipervalorizada, cl + Asrelagdes objetais, ow seja, a maneira 1 habitual do entrevista- do interagir com as pessoas significativas de sua vida, Bellak ¢ Sinall (1969) comentamt que o MOIS dé Teaco dbjetal do paciente seri examinado no que diz respeito a sua qualidade intensidade ¢ aos aspectos manifestos e latentes, a pattir da conduta evidenciada pelo paciente durante as entrevistas cli- nicas, da historia de suas relagdes interpessoais, de suas fanta- sias, recordagées e da contratransferéncia, Esse exame fome- ‘ce ao entrevistador informagbes acerca da posigao do paciente na familia e nos sistemas sociais, do nivel de maturidade das relagdes objetais, bem como da natureza de suas relagSes objetais intemas. © entrevistador obterd uma idéia do tipo de ‘padrio que o entrevistado repete em suas relagdes, que poder ser, entre outros, de_dependéncia, de simbiose, de {_sadomasoquismo, de evitagao, de triunfo on de distanciamento, yee 14 (Con)textos de ences: clhares diets sobre a itergto humana AT __(Condrentor de ensrevit: cates dvetos sobre a teapto humana Padrio Sociofamiliar A realizagiio de uma hipétese diagnéstica do funcionumento familiar do paciente ¢ de seu meio ambiente permite que o entrevistador verifique como essas situagées incidem e in- fluenciam a sua problemética atual. A natureza da dindmica «dis TelagBes indicard as condigdes da rede de apoio que o entre- Com essas informagdes, 0 entrevistador ter adquitido uma visio das caracteristicas de personalidade do paciente, poden- do considerar a existéncia ou nao de patologias de carter. Oprocesso As entrevistas de triagem desencadeiam um processo cuja evolugiio pode ser observada por meio de fases que apresentam caracteristicas ¢ fungdes particulares, Sullivan (1983) comenta sobre a existéncia de quatro possiveis fases que acompanham as entrevistas. A fase inicial é aquela em que habitualmente 0 entrevistadoy analisa e discute com o paciente as razdes que o levaram a pro- curar atendimento. Nesse momento, é importante que o profis- sional estabelega um rapport rapido e claro, explicando ao en- trevistado os objetivos do enconiro. Assim faz com que ele se sinta valorizado e aceito, favorecendo a construgiio de um vin- culo de confianga. Gabbard (1992) sugere que o entrevistador adote uma atitude recepriva de escuta a fim de compreender 9 ponto de vista do paciente de uma forma efetiva e empética, participando ativamente da relago que se estabelece. Sullivan (1983) enfatiza que os dados essenciais da psicopatologia emer- gem de uma observacao participativa resultante da interago intensa entre entrevistador e paciente. Monica Medeiros Kother Macedo & Leanira Kessli Carrasco (Orgs) ns Na fase inicial, a principal fungo do entrevistador é 0 esta: belecimento da relagio e do contrato de trabalho, que inclui a coleta dos dados sociodemogréficos (nome, idade, profissto, + escolaridade, etc) do entrevistado e as combinagdes acerca dos | 2” encontros, como: objetivos, limites, hordrios, duragdo aproxi- i e mada do processo de triagem e honotérios. A © primeiro contato com o entrevistador desempenha um papel fundamental no tipo de vivencia que o paciente terd e do seguimento de seu encaminhamento, Cabe ao entrevistador fa- cilitar 0 desenvolvimento de um clima de confianga, por inter- médio de sua disponibilidade emocional, em receber a deman- da do paciente, mostrando-se interessado por seus problemas e disposto a Ihe oferecer ajuda, Também é tarefa do entrevistadoy estar atento para as ansiedades, fantasias e defesas que acom- panham o paciente nesse primeito momento. O paciente, para fazer frente as ansiedades mobilizadas pelo inicio da entre- vista, poderd utilizar-se de defesas expressas por meio de lencios, ou de perguntas relativas a vida do entrevistador, ou de comentérios inadequados, ou expressées de desconfianga, etc. ‘Tais manifestagdes se constituem em estratégias utilizadas pelo ‘entrevistado para enfrentar esse momento e para evitar 0 conta- to com seus sentimentos e com os fatos a eles associados. O entrevistador, considerando as particularidades de cada entre- vistado, precisaré encontrar o tipo de intervengao que facilite o enfrentamento do paciente destas ansiedades e, assim, prosse- guir com a entrevista, Evitar pausas e siléncios prolongados, que podem aumentar 6 nivel de ansiedade e de tensto do pacien. te, pode ser uma estratégia produtiva nesta primeira fase A fase intermediavia caracteriza-se por um petiodo de maior, aprofundamento da problemética do pacientg. Sullivan (1983) refere que, primeiramente, hé um reconhecimento por parte do entrevistador e do entrevistado da necessidade de identificar experiéncias ¢ formas de sentir que teriam participado da 16 (Contexts de entevsa lhares dvi sbre a interagfo humana formagiio de sua petsonalidade e influenciado em seus compor- tamentos ¢ relacionamentos. Esta fase é seguida de outra que visa investigactio detalhada daquilo que constitui as zonas de Conta da pessoa, encontrando elos entre as situagdes atuais de, desajuste com outras experiéncias que envolvem a histéria de vida passada do entrevistado, Dessa maneira, a dupla tem a opor-) tunidade de esclarecer e aprofundar o conhecimento a respeito’, da problemiatica que motivou a consulta e sua repercussio nas ( diversas dreas da vida atual do paciente, Essa etapa da avaliagiio, | além de oportunizar a coleta de dados necessérios para a elabora- (20 de hip6teses diagndsticas e para a indicagao terapéutica, co- labora para que o paciente amplie o conhecimento de sua afligaig e obtenha maior consciéncia de suas dificuldades. O entrevistador, porém, nessa fase de investigagdo mais profunda, nao pode se descuidar da manutengfio da alianga te- rapéutica, Para tal, é importante que ele lance mio de algumas estratégias na tentativa de facilitar a condugiio das entrevistas. Auutilizagao, por exemplo, de perguntas aber, vlarificagdes recapitulagdes favorecem a fluidez.da entrevista e incrementam a interagao entre o entrevistado e o entrevistador na tarefa de aniilise ¢ investigagdo dos conflitos. A fase final remete a uma retomada do processo de avalia- ¢4o com o intuito de se chegar a um fechamento e a uma devo- lugio, No momento do encerramento é fundamental. que-o pa- ciente Sinta qu vista de devolugio do paciente. Braier (1986) recomenda que o entrevistador transmita oral- mente ao paciente, numa linguagem simples ¢ clara, as impres- sdes gerajs a respeito de sua problematica, sem se aprofundar ‘em demasia, Ble sugere que 0 entrevistador use as interpretagdes denominadas panorimicas, pois permitem esbogar de maneira global, psicodinamismos subjacentes & situagio-problema. O | | oniea Motes Kocher Macedo & Leaira Keel Casco (Org) m autor ensina que esse procedimento objetiva fazer o paciente sentir que as suas verbalizagdes foram valorizadas e compreen- Gidas; reforga sua motivay;o para entender e resolver suas di culdades por meio do tratamento indicado. A devolugao, além dos aspectos diagndsticos, precisa con- templar uma hipétese progndstica capaz de tranquilizar o pa ciente & medida que Ihe é mosirado que existem recursos terapéuticos capazes de resolver seus sofiimentos ou, pelo me- nos, amenizé-los. E importante que o entrevistador fornega e explique os pas- 805 futuros ao paciente como marcagdo de novas consultas para iniciar um processo psicoterdpico, encaminhamento para outro profissional ou outra medida que deva ser tomada. ‘Na etapa final & dada a oportunidade de a pessoa expressar seuis sentimentos e pensamentos em relagiio & experiéncia vivi- da por meio das entrevistas de triagem. O entrevistado pode expressir sna opinifio ¢ seus sentimentos em relagio as conchi- des e ds recomendages do entrevistador. E oportuno ajudar 0 paciente a compreendé-las, removendo distorgées ou fantasias Contraproducentes quanto a elas ou as referentes as suas difi- culdades ¢ as suas necessidades. A devolugiio dos resultados requer flexibilidade, pois, além de transmitir 0 que entendeu do paciente e de sua demanda, 0 entrevistador deve ser capaz de expor alternativas de tratamen- to. Quando se faz necessirio um encaminhamento, 0 entrevistador deve conhecer os alcances e limites dos tratamen- tos psicoterdpicos existentes disponiveis e acessiveis as reais condigées do paciente, Malan (1983) conclui que o trabalho do profissional, a0 longo de entrevistas que objetivam avaliar as condigées do pa- ciente com vistas a Ihe fazer uma indicagao terapéutica, é com- plexo e exige algumas maneiras de pensar e de comportar-se. 16 (Conjtexos de entrevista: oharesdivesos sabe a itera humana autor expde que o entrevistador deve realizar uma avaliagaio clinica (o diagnéstico clinico influenciara o prognéstico), deve pensar psicodinamicamente (identificar as forgas em eouflivo no interior do paciente e entre este e 0 seu meio, no presente e no passado), deve pensar praticamente (0s recursos reais e vid veis do paciente), deve estar atento & entrevista para, por meio de um rapport rapido, buscar os dados de que necessita para 0 encaminhamento correto e deve ser sensivel e habil para trazer A superficie as expectativas ¢ apreensées com que o paciente reage A entrevista e as suas interveng6es. Aajuda terapéutica A entrevista de triagem pode ser considerada um momento crucial no diagnéstico e no encaminhamento terapéutico em satide mental, Esse primeiro encontro, quando conduzido com competén. cia e sensibilidade pelo entrevistador, oferece ao entrevistado a experiéncia de ser respeitado, despertando-Ihe sentimentos de ’ ) confianga ¢ de esperanga de encontrar alivio para as suas difi- culdades ¢ softimentos. Dalgalarrondo (2000) registra os fre- ‘iientes abandonos de muitos servigos ambulatoriais, ocasio- nados, algumas vezes, pelas atitudes pouco receptivas ow ne- gligentes dos profissionais. Sendo assim, a entrevista de triagem mostra-se titi, néio $6 pelos fins diagnésticos e de indicagio terapéutica que almeja alcangar, mas também pelos efeitos terapéuticos que exerce sobre os pacientes que se encontram fragilizados e mais favo- raveis a serem influenciados por uma ajuga, Fiorini (1979) ates ta, baseado em sua experiéncia clinica, que essa entrevista quan- do adequadamente conduzida pode desempenhar importante papel terapéutico, reduzindo o grau de desergiio no seguimento ‘Minica Medeiros Kother Macedo & Leanira Keveli Caratco (Orgs) 119 dos tratamentos. A entrevista, diz Tavares (2002), tem o poten- cial de modificar a maneira como o paciente percebe sua auto- estima, seus desejos, seus projetos de vida e suas relages sig- nificativas, Por isso, o profissional precisa desenvolver habili- dades especificas para realizar essa tarefa, Greenspan Greenspan (1983) recomendam que o entrevistador treine sua capacidade de observar, procurando, por meio de uma aprendi zagem continuada, aprofundar seus conhecimentos da teoria psicanalitica ¢ da técnica de entrevista, desenvolver atitudes éticas ¢ aprimorar seu autoconhecimento, uma vez que sua per- sonalidade serd seu principal instrumento de trabalho. Referéncias bibliograficas BELLAK, L. & SMALL, L. Psicoterapia breve y de emergén- cia. Pax-México, México, 1969. BRAIER, E. A. Psicoterapia breve de orientagiio psicanallti- ca, Si Paulo: Martins Fontes, 1986, CORDIOLI, A. V. Psicoterapias abordagens atuais. Porto Ale- are: Artmed, 1998, CUNHA, J. 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