40 Anos - dezembro de 1999
O SIGNIFICADO DE UMA ESCOLA DE APLICACAO
Prof. Dr. José Mario Pires Azanha
Docente da FEUSP
junto a uma instituicio de ensino superior porque, aparentemente, qualquer escola
‘comum poderia funcionar como tal. Concebida nesses termos uma escola de aplicacao
nada mais seria do que o local destinado a estagios e a eventuais pesquisas, sendo portanto
substituivel por qualquer outro dos milhares de locais que compéem a rede fisica de escolas
publicas e particulares do Estado. Tal concepedo é, contudo, excessivamente simplificadora nao
apenas das fungdes de uma escola de aplicacéo como também da propria idéia do que deve ser
uma faculdade de educacao. A simplificagao consiste em pensar-se a primeira como 0 local
onde se exercita a pratica e a outra como 0 local onde se estuda a tcoria. Nesses termos, teoria
e pratica em educacao aparecem como coisas perfeitamente distinguiveis, separaveis e até
distribuiveis por locais distintos.
N uma primeira aproximacdo parece desnecessério manter-se uma escola de aplicacéo
ontudo, por sua propria natureza o processo educativo consiste na inter-relacdo
dinamica entre o saber e o fazer e a propria teoria da educagao nada mais pode ser do
que a reflexdo permanente sobre esse processo. Nao ha, pois, como separar e distinguir
entre a pratica e a teoria em educagao sem mutilar a ambas. Para que tal no aconteca numa
escola de aplicacdo, é preciso conceber a esta, fundamentalmente, como a oportunidade de
desenvolvimento de um projeto escolar, isto é, de um esforgo coerente e continuado de realizar
uma idéia de Educacdo. Uma escola de aplicagao se destaca ¢ sc singulariza de outras da rede
escolar pela aspiracao que lhe é propria de converter-se em modelo para as demais escolas.
Modelo nao no sentido banal e pretensioso de coisa a set copiada, mas no propésito consciente
de ser fonte privilegiada de indicacao de diregdes possiveis e desejaveis no encaminhamento de
solugées para os multiplos problemas que se colocam continuadamente para qualquer escola.
Numa escola de aplicagao a rotina deve ser, paradoxalmente, a busca do novo que é 0 fazer
renovado pela critica permanente. Para uma escola superior devotada aos cstudos de
Educagdo, manter uma escola de aplicacdo é, pois, criar a oportunidade para esse esforco
permanente de elucidacao das relacées entre o saber ¢ 0 fazer. Esta oportunidade, contudo, nao
se instala pela simples manutencao de uma escola de aplicagao, nem mesmo pela convivéncia
harmoniosa entre ambas as instituigdes. Nessa convivéncia, o objetivo néo pode ser a paz dos
cemitérios. Se isto ocorrer, corremos 0 risco de recair na distingao pretensamente académica de
que a ministracao de saber tem uma autonomia com relagdo a pratica educativa.
ara evitar essa situagdo em que a idéia se dogmatiza em verdade ¢ a préttica se petrifica
em rotina, é preciso que o projeto escolar desenvolvido por uma escola de aplicacdo seja
acessivel néo apenas aqueles tantos que 14 estagiam mas a todos que por cle se
interessam. O que importa, pois, é que da parte da escola de aplicacdo haja a publicidade
permanente das idéias que impregnam o seu fazer ¢ o transformam ¢ da parte da Faculdade
que abriga a escola de aplicacao, empreender sistematicamente a anélise ¢ a critica daquelas,
idéias e daquele fazer.
Posta nestes termos, a convivéncia entre ambas as instituigdes sera essencialmente tensa como
é proprio de qualquer convivéncia intelectual fecunda.
inalmente, neste quacro esbogado, é possivel reiterar o esforco da E.A. em caminhar na
direcdo de uma auténtica Escola de Aplicacdo {grifo nosso).
*Do texto: "O Significado de uma Escola de Aplicactio para a FEUSP" - 1984.