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15 © Tempo A nobreza vive em bandos: a economia politica das melhores familias da terra do Rio de Janeiro, século XVII. Algumas notas de pesquisa.” Joto Fragoso** Entre os componentes do primeiro Consetho de Estado do Brasil in- dependente, temos Jodo Severiano Maciel da Costa (Visconde de Queluz), Felisberto Caldeira Brant (Marqués de Barbacena), Manoel Jacinto Nogui ta da Gama (Visconde de Baependi) e Luiz José de Carvalho e Mello (Vi conde da Cachoeira). Tais personagens pertenciam a antigas familias da no- breza da terra paulista, fluminense e mineira: os Horta, os Leme, os Azeredo Coutinho, os Andrade Soutomaior, os Teles Barreto, os Sodré Pereira € os Azedias Machado.! As cinco tilrimas descendiam de conquistadores * Artigo recebide em maio de 2003 ¢ accito para publicagio em julho de 2003. *O presente texto ~* Professor do Departamento de Histéria da UFRJ. "CE, Carlos Rheingane2, Primeiras Familias do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Livraria Brasiliana Editora, 1965, vol. 1, pp. 142-166, vol 2. pp. 495-497; Luiz Gonzaga da Silva Leme, Genealon gia Paulistana ~ CD, + Yol., S30 Paulo, Macromedia, 2002 (Maria Amato, org.) pp. wz parte de uma pesquisa financiada pelo CNPq, ul Joao Fragoso Dossié seiscentistas do Rio de Janeiro. Portanto, atravessaram as mais diferentes conjuncuras coloniais, enquanto melhores familias da terra, € pasticipariam do cfrculo do poder no inicio do império. O curioso desta faganha é que, no século XVII, os fluminenses safram de uma economia agucareira de segunda classe. Viajantes, camaristas e go- vernadores locais da época eram unanimes em sublinhar a inferioridade do agicar da regio, comparado ao das capitanias nordestinas.? Daf a m4 vonta- de das fiotas lusas em adquiri-lo. Apesar destas adversidades, a nobreza da terra sobreviveu ¢ ampliou seu poder no cencro-sul da América. O texto que se segue apresenta algumas das estratégias do grupo, tendo como cenirio o século XVII. O conjunto destas estratégias seria a cultura econdmica das prin- cipais familias da Republica, usada em seus negécios, ou seja, a apreensio desta cultura permite entender melhor os tragos da reprodugao econémica de uma sociedade do Antigo Regime nos trépicos, cuja légica subordinava o cabedal A gualidade politica e & social. O Antigo Regime nos trépicos e sua economia do bem comum Para compreender tais priticas, € necessério ter claro o cendrio que as produz, no caso, alguns dos mecanismos de formacao ¢ de reprodugio da sociedade colonial do Rio de Janciro. A constituigao da capitania fora o resul- tado da conquista, do mbate contra os franceses € os tamoios, entre 1560 € 1580. Diante das dificuldades econémicas do reino ¢ do império, a coroa teve de recorrer a conhecidos mecanismos do medievo luso: os recursos de seus vassalos, no caso, das elites coloniais americanas, ¢ o sistema de mercés> ® Sobre a aptidio dos solos do Rio de Janciro para o cultivo da cana, ver Alberco Lamego, O Homem e a Guanabara, Rio de Janeiro, IBGE, 1964, p. 135. Quanto aos comentarios dos via- jantes, ver o exemplo Ruiters, em 1618; ef. Dierick Ruiters, “A Tocha da Navegacio”, Revis- ta do Instituto Histérico ¢ Geogrétfco Brasileiro, vol. 269, Rio de Jancira, TAGB, pp. 63 39, 1966. Para a Camara, cf. Joao Fragoso, “Knights, ‘Archer Indians’ and the Atlantic World: Rio de Jancito in the 17 ceneury”, Imperial (Rejoisions: Brasil and the Portuguese Seaborne Empire — Conference in Memory of Charles R. Boxer, Yale University, 2002. Em finais da década de 1680, © governador Luiz de César de Menezes ¢ 0s oficiais do Senado afirmavam que a economia colonial do Rio “(..) € a mais miserével das deste Estado” ¢, diferente de outras capitanias, que tinham o tabaco, 36 contave com o agticar para sobreviver, ef. Arquivo Histérico Ultrama- tino (AHU, CA) (Colecao Castro Almeida ~ RJ), does. 1766-69. # Sobre as conjunturas do reino ¢ do império no period considerado, ver Joio Fragoso, “A nobreza da Republica; notas sobre a formagiio de primeira elite senhorial do Rio de Janciro”, Topoi ~ Revista de Histéria do Programa de Pés-Graduacdo em Historia Social da UFRJ, Rio de 12 A nabrexa vive em bandos: a economia politica das melhores familias da terra do Rio de Janeiro, séeulo XVI Atendendo ao apelo do governador-geral da época, Mem de 84, capi- tdes-mores, fidalgos ¢ candidatos a cavaleiros mobilizaram suas parentelas, flecheiros indios c escravos e se deslocaram para o Rio. Para estes, tal convo- cacao tinha ressonancia na légica do Antigo Regime. Conguistar novas verras e, portanto, submeter populagées implicava em ter a qualidade de nobre: superioridade em uma hierarquia estamental. Isto se tornava ainda mais re- forgado, quando tais feitos guerreiros cram as custas desuas fasendas € niio tanto as do rei, fendmeno que podia traduzir-se em mercés régias para estes leais stiditos.* Em realidade, o contexto da ocupagao do Rio de Janeiro esclarece al- guns aspectos da sua sociedade colonial: aliangas entre fragdes de elites re- gionais; uma nobreza da terra baseada na idéia de conquista € a interferéncia da politica na economia, originando 0 que chamo de economia do bem co- mum. Vejamos rapidamente estes temas. Antes de tudo, a fragilidade da coroa portuguesa, ao contribuir para a circulagiio de rebentos das elites coloniais, provavelmente ajudou a resolver alguns dos problemas destas em suas regides de origem, isto &, Areas, como 0 planalro paulista, se baseavam em sistemas agrarios extensivos, porém de tipo antigo. Portanto, a reprodugao econdmica de tais sistemas ia além da simples incorporagao de mais terras ¢ mao-de-obra, como resultado do crescimento populacional. Por ser de tipo antigo, aquele dado se aliava a outros: os para- metros da hierarquia social excludente e os cargos de mando. Por conseguin- te, para as elites, o aumento de suas proles podia ameagar 0 seu status regio- Janeiro, UFRJ /7 letras, n* 1, pp. 49-52. Pelo sistema das mercés, 0 rei recompensava com benesses — terras, comendas, cargos, privilégios, etc. ~ aquelas pessoas que Ihe prestavam scrvigos; Angela B. Xavier, Anténio M., “As redes clientelares”, Antonio M. Hespanha (Coord.), Histéria de Portugal ~ Antigo Regime, Lisboa, Ed. Estampa, pp. 382-386, 1993; Joao Fragoso, “A nobroza..”, op. cit, pp. 67-82. + Para estes movimentos de fidalgos da terra de outras capitanias para o Rio de Janeiro, ver Elysio O. Belchior, Conguistadores ¢ Povoadores do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasiliana, 1965; Washigeon Luis, Na Capitania de Sao Vicente, Sio Paulo, Livraria Martins Ed., 1956, pp. 182-184; Biblioteca Nacional, Anais da Biblioteca Nacional (BN), Rio de Janeiro, 1935, vol. LV pp. 264 ¢ 265; Francisco de A. Carvalho Franco, Dicioncrio de Bandeirantes e Sertanistas do Brasil Belo Horizonte/Sto Paulo, Teatiaia/EDUSP, 1989, p. 49. Sobre o significado de conquista na Europa medieval ver Robert Bartlett, Tie masing of Europe, Princeton, Prineewon University Press, 199: Caro Baroja, “Religidn, visiones del mundo, clases sociales y honor durante los siglos XVI y XVII en Espafia”, Julio Pitt-Rivers y J.G. Petistiany (Eds.) Honor y Gracia Madrid, 1993, pp. 136-138. 3 Soto Fragoso Dossié nal,’ fenémeno que imprimia uma maior velocidade aos ritmos de reprodu- $40 do sistema agririo considerado. Deste modo, os pedidos de auxilio da coroa ajudavam a reprodugio de um Antigo Regime nos trépicos.° Os miicleos coloniais precisavam, continua- mente, de novas conquistas para alojar os novatos das familias de sua nobre- za. Da mesma forma, tais movimentos minimizavam, provavelmente, os con- flitos regionais intra-elites, Enfim, as gucrras no Rio de Janeiro, como a ex- pansiv culunial em Sao Paulo € no Nordeste, possibilitaram a reiteracdo do tipo de sociedade estudada’ e viabilizaram redes politicas, mesmo parentais, entre fragdes das elites de diversas regides da América portuguesa. Estas emigragdies, ao serem encabegadas pelas “boas” familias, davam margem @ alguns fendmenos. Os “nobres coloniais” iam com flecheiros ¢ cabedais, o que os diferenciava dos emigrantes pobres. Ao mesmo tempo, cabia-Ihes a chefia das incursdes a organizagio politica das novas areas. Segundo frei Vicente de Salvador, apés a vit6ria, o capitéo-mor da expedigao distribufa as presas de guerra e tratava da administragio da regiéo apossada. Nos dois atos, a proeminéncia pertencia aos fidalgos ¢ aos recém-fidalgos.* Algo semelhante ocorreu no Rio quinhentista. Os capities ¢ seus descenden- tcs constituiriam o governo da nova vidude. Circulariam pela Camara e pela administragio periférica — provedor da fazenda, capitao de fortaleza, ete. — além de criarem parentescos entre si.’ $ Vale lembrar que, em $0 Paulo do século XVI, os pais privilegiavam as mogas com parte substantiva da fortuna familiar na forma de dotes. Preteridos, os filhos homens se dirigiam para a fronteira, em busca de terras, indios sfacus. Cf. Muriel Nazzati, O Desaparecimento do Dote, Sio Paulo, Cia. das Letras, 2001, passinr; John M. Monteiro, Negros da terra, Sio Paulo, Gia. das Letras, 1994, passin. * Para nogio de Antigo Regime nos trépicos, ver Joo Fragoso, Maria de Fétima Gouvéa & Maria Fernanda Bicalho (Org,), “Introduga0”, O Autigo Regime nos Trépicos: a dindmica impe- tial portuguesa (séeulos XV e XVID), Rio de Janeiro, Civilizagio Brasileira, 2001. Para Sao Paulo, temos, por exemplo, as investidas territoriais dos bandeirantes (John Monteiro, 0p. it.) &, no Nordeste. ver as narrativas de frei Vicente Salvador sobre a ampliagio dos néiele- 08 colonisis chefiados por “homens bons”, de Pernambuco para a Paraiba. Cf. frei Vicente Salvador, Histéria do Brasil, Belo Horizonte, Ed. Itatiaia; $0 Paulo, Ed. da USP, 1982, pp.170- 2, 179-82 e 226-9, Sobre as redes parentais citadas, ver Joao Fragoso, “Knights...”, op.cie. Frei Vicente Salvador, op. cit, p. 166 ¢ pp. 254-55. ° As familias Mariz.¢ Azeredo Coutinho exemplificam tais fendmenos. Antonio de Mariz, em 1570, era camarista, anos depois ocupou o posto de Provedor da Fazenda Real. Juliio Rangel de Macedo, aparentado do capitio-mor do Espirito Santo, Marcos Azeredo Coutinho, no ano de 1583 foi ouvidor geral do Rio e, em 1589, oficial da Camara, Os rebentos de ambos se casariam. Cf. Elysio Belchior, op. cit, pp. 512-13; Carlos Rheingantz, op. cir; Prancisco A. vatho Pranco, op. cit, p. 49. 4 A nobrexa vive em bandos: a economia politica das melhores familias da terra do Rio de Janeiro, século XVH Cabia 8 Camara 0 bem-estar da Repiiblica, ¢ isto, entre outras coisas, significava fiscalizar 0 abastecimento da cidade. Suas agdes podiam aleangar também 0 comércio ultramarino, como 0 frete 0 prego do agticar; ou seja, na pratica, ela intervinha no chamado pacto colonial. Como cabega da Rept blica, ainda distribufa monopélios na economia regional, como 0 trapiche do aciicar € 0 agougue ptiblico: o primeiro cuidava do peso ¢ da exportagio do agticar da capitania, e o segundo era responsavel pelo abate da carne de vaca consumida pelo povo."” Os postos da coroa eram adquiridos como uma mercé régia. Desneces- sério dizer que tais cargos davam ao scu titular a possibilidade de interferir em setores nevrilgicos da vida da cidade, desde a economia até a justi¢: Além do poder ¢ do prestigio neles contidos, conferiam ganhos pecuniarios a08 seus titulares. Ao lado dos salarios pagos pela Fazenda Real, as cartas- patentes dos oficiais e dos ministros do rei previam “gratificagdes” sob di- versas rubricas, como emolumentos ¢ propinas. O capitéo de uma das forta- lezas da bafa de Guanabara, por exemplo, podia ganhar emolumentos das naus que passavam defronte a sua guarni¢ao.' Gomo se mencionou, a precondigao para ocupar tais oficios era os servigos prestados a coroa, Neste sentido, nada melhor do que ser conquistador ou seu aparentado para ter uma boa folha de servigos a e/ Rey €, portanto, solicitar tais benesses. Espero que estes tiltimos pardgrafos tenham esclarecido a nogao de Antigo Regime nos trépicos. Antes de tudo, trata-se de uma sociedade hie- rarquizada pela politica, Deter o controle sobre o governo da Reptiblica sig- nificava pertencer ao grupo social com chances de dominar a sociedade. No Rio, a principio, tal estrato era formado por conquistadores, Autodenomina- vam-se, ¢ cram reconhecidos pela sociedade nascente, a nobreza da terra ou as melhores familias da governanga.” 11 1565 1620, dos 107 Camaristas por mim conhecidos, a0 menos, 39, ov 36,4%, per- tenciam a familias de conquistadores. Cf. Joo Fragoso, “A Nobreza...” op. ctf, pp. 82-9 | Em 1648, o Provedor da Fazenda do Rio, Pedro de Souza Percira, afirmava que o dito cargo era exercido em comum com o de auvidor da Alfindega, “desde a fundagio da dita eapita~ nia”, o que Ihe dava o poder de intervir nas causas “...) movidas entre os mareantes € merca~ dores, sobre fretes, avarias, soldadas, entregas de mercadorias, cargas ¢ descargas” (AHU, CA, doc. 668), 04 seja, nos pleitos do porto. Sobre a Adminiscracao periférica no Rio Seiscentista, ver Joio Fragoso, “A Nobreza...", op, dit pp 60-62 ® Cf. Joao Fragoso, “A Nobreza...”, op. cit, p. 70. 8 A nobreza originaria da conquista precede os senhores de engenhos; nem todo dono de moendas era nobre. Cf. Joao Fragoso, “A Nobreza...", 0p. cit. Joito Fragoso Dossié Outra derivagio deste quadro foi a formagiio de uma economia, cujo funcionamento nao era ditado apenas pela oferta ¢ pela procura, mas tam- bém pela politica. A Camara, os oficios da coroa € as mercés, em geral, cria- vam para seus titulares possibilidades de acumulagio de riquezas 4 margem da produgao ¢ do comércio. Isto formava 0 que chamo de economia do bem comum, ou seja, em nome da Republica, uma elite se apropriava de recursos do ptiblico, naio somente dos escravos, mas também dos lavradores e dos co- merciantes, entre outros grupos sociais. Por meio destes mecanismos, a no- breza da terra foi capaz de adquirir parte do excedente colonial ¢ realizar suas forcunas. Na verdade, 0 “homem bom” antecedeu o senhor de engenho e nfo o inverso. Nestas condigdes, a economia do bem comum surgia como pano de fundo da produgio colonial. O dono de moendas, lavrador ¢ o negocian- te—~mesmo 0 ultramarino —atuavam num mercado dominado pela politica ¢, a0 fazerem isto, fragdo de seus ganhos ficava com os homens do governo." Portanto, a montagem da economia aguearcira no Rio teve por segredo nao somente o trabalho cativo, mas uma hierarquia social excludente de Antigo Regime Uma das bases materiais de tal sociedade cra dada pela sua apti plantagdo da cana-de-agticar. Neste momento, voltamos A questo do agticar de segunda, produzido no Rio. Evidente que a capitania contava com outras atividades,* porém a economia exportadora plebéia era seu alicerce. Isto, inevitavelmente, trazia varias seqiielas A vida da regifio, fendme- no que seria ainda mais agravado com o fim da Unia tos contra os holandeses ¢ com a queda do prego do agticar, em prinefpios da década de 1640." Um assento da Camara, de 07/02/1641, fornece um quadro do na io Thérica, com os confli- ¥ Nao é inteiramente sem motivo, que, das 197 familias que, em algum momento do século XVIL, tiveram engenhos de agticar, 120 tivessem a sua origem entre 1565 a 1620, ¢ mais de 2/ 3 antes de 1600, ou seja, no periodo da conquista, sendo que, destas 120, 73 descendiam de antigos oficiais do Rei e/ou de velhos Camaristas. Dos 295 senhores de engenhos conhecidos para todo o século XVIT, 155 (52,5%) sairam daquelas 73 familias de conquistadores. CF. Joao Pragoso, “A Nobreza...", op. city p. 59. CE. Joao Fragoso, “A formagao da economia colonial no Rio de Janeiro ¢ de sua elite senho- rial (séculos XVI ¢ XVI)", Jodo Fragoso, Maria de Fatima Gouvéa. & Maria Fernanda Bicalho. (Org,), op. ct, pp. 37-42. ** Em cartas da época, assinadas pela Camara e pelo governador da cidade, enviadas a Lisboa, sublinhava-se a pentiria da capitania ¢ a miséria de seus moradores, Cf. AHU, Codice 1279 — Relagiio de odos us comtratos ¢ mais rendas na capitania do Ria de Janeiro por suas origens ecriagées, 1733, 12, AHU, CA, doe. 218. 16 A nobresa vive em bandos: a economia polttica das methores familias da terra do Rio de Janeiro, século XVIE mai s preciso da economia do perfodo. Segundo ele, de costume, vinham do reino navios com mercadorias para venderem, em troca do agticar, porém neste ano os mereadores reindis nfio estavam aceitando o agticar como pagamento das compras ¢ dos créditos necessérios para a cidade ou, quando 0 recebiam, 0 faziam por um prego muito baixo, o que os moradores nfo accitavam — como resultado deste dilema, a frota estava, ainda, no porto."” Por este relato, fi- cam patentes as pressdes exercidas pelos comerciantes dos comboios sobre a cidade, ou seja, a reiteragao da economia local dependia, a princfpio, da “boa vontade” do capital mereantil europeu. Deste modo, 0 Rio de Janeiro se baseava numa tfpica economia en- quadrada no exclusivo colonial: seus ritmos navegavam ao sabor das flutua- goes do mercado internacional ¢ o capital mercantil reinol controlava, de maneira monopolista, 03 mecanismos de reprodugiio da economia local. Por conseguinte, parte da riqueza colonial ficava nas mos dos negociantes das naus. Porém, para infelicidade da capitania, tal enquadramento nfo era per feito, pois seu agticar nao era um produto-rei, mas sim plebeu, o que compli cava a vida dos fluminenses. Esta infelicidade se traduziu, por exemplo, nas queixas de 1669, feitas pelo procurador da cidade, frei Mauro de Assungio. Neste ano, Assunciio solicitava ao rei que as frotas do Rio fossem direto para 0 reino, proibindo que fizessem comércio na Bahia. Segundo o frei, os nego- ciantes reindis se interessavam, principalmente, pela venda de seus prod tos no Rio, por dinheiro. Com estas moedas, retiradas do Rio, 0s comercian- tes iam para a Bahia, onde compravam agticares mais finos ¢ tabaco. Para 0 Rio, isto significava a diminuig&io das suas exportages de agticar ¢ a redugio da capacidade de investimentos.'* Por este mecanismo, os negociantes das frotas obtinham grandes lucros com poucas despesas, ja que os “finos produ- tos coloniais” eram pagos, em parte, com as moedas fluminenses. Na verda- de, para a economia da Guanabara, 0 pacto colonial, a principio, naio se com- pletava, pois cla “devia” comprar da Europa, porém 0 mesmo nfo ocerria quando chegava a vez de vender suas exportagses. Por seu turno, aquele agticar plebeu gerava outros problemas para a cidade, como as dificuldades na reposigo fisica de sua escravaria. Na mesma correspondéncia, 0 frei Mauro de Assungao, em 1669, queixava-se dos ¥ Rio de Janeiro, Diretoria Geral do PatrimOnio, Estatistica e Arquivo, O Rio de Janeiro no século, XVII ~ Acérdaos e Vereangas da Senado da Camara, 1635-1650, 1935, pp. 41-42. “ AHU, AV (Rio de Janeiro ~ Documentos 4 4, doc. 48, tulsos), cx Toto Fragoso Doss tumbeiros ¢ do governador de Angola, que preteriam, no trifico de escravos, 0 Rio de Janeiro, em favor das capitanias nordestinas. Dez. anos mais tarde, outro procurador do Rio fazia a mesma reclamacao.” Assim, o quadro de uma economia escravista exportadora plebéia se completava: a prépria reprodu- Gao fisica de suas relagdes sociais tinha sérias adversidades. Claro esta que tal cendrio punha em perigo a continuidade da hierarquia social de tipo antigo no Rio de Janeiro. Apesar deste lastimavel quadro, € necessrio certo cuidado quanto a conclusées precipitadas. Em primeiro lugar, as vereangas aprescntadas de- monstram que a cidade tinha consciéncia de suas debilidades. Em segundo lugar, desde cedo, as melhores famflias da terra também sabiam de outro fato: a importdncia estratégica do Rio de Janeiro para o comércio ¢ a defesa do Adlntico sul luso e, ainda, da fragilidade militar da metrpole no perfodo considerado. Em outras palavras, o império precisava da “ajuda” do Rio para se manter naquelas paragens, ¢ a clite da capitania procurava valer-se de tais circunstancias, Em 1616, Martim de Sa pedia & coroa mercés pela ardua tare- fa, as custas de “muito de sua fazenda ¢ de seu pai”, de defender as costas das capitanias do sul,” ou seia, S4 sublinhava que a manutengio da costa néo era feita apenas pelos cofres reais Décadas depois, as préprias autoridades metropolitanas reconheciam a importancia da capitania. Em 1634, o Conde de Prado concedia ao entio governador da capitania o posto, antes ocupado por Martim de Sa, na (..) superintendéncia das matérias da guerra nas capitanias do sul e a admi: nistragdo geral dos indios nas mesmas costas, [porque] aquela capitania [Rio de Janeiro] é a mais opulenta daquelas partes [sul do Brasil], e que tem mais gente de guerra, canoas e indios (...) podendo acudir a onde for necessério.”! Passados dez anos, em meio aos preparativos para a reconquista de Angola, o Conselho Ultramarino recomendava ao governador da cidade, Fran- cisco Soutomaior, prudéncia e “brandura” com os moradores da cidade, ape- sar de eles merecerem “algumas demonstragées de castigo”. A razio para tal brandura era simples: faltavam recursos 4 Fazenda Real, portanto, a defesa © Idem, ibiden; SAU, CA, doe. 1367. » AHU, AV, x. 1, doc. 6 # AHU, AV, ex. 1, doe. 47. Is A nobreza vive em bandos: a economia politica das methores familias da terra do Rio de Janeiro, séeuto XVIE daquela parte do império — 0 Adantico sul — dependia “totalmente (...) da vontade ¢ unio do povo [do Rio de Janciro]”. A consciéncia da elite senhorial do papel do Rio na preservagao do império era, ainda, demonstrada em 1667. Neste ano, a Camara lembrava ao rei que a cidade, na guerra contra os holandeses, tinha auxiliado a Bahia e Pernambuco € na restauragio de Angola.* Em sintese, o Rio de Janciro tinha dificuldades em vender agticar € comprar escravos. Portanto, nao era o melhor exemplo de uma economia escravista exportadora. Em contrapartida, a sua posig4o geopolitica e, mais, a fragilidade militar portuguesa no Atlantico sul conspiravam a seu favor, ou seja, a cidade tinha, em tese, como barganhar com a coroa. A maior prova de tais negociagées é a propria permanéncia da produgao agucareira fluminense ede sua sociedade de Antigo Regime, independente das conjunturas do prego do agiicar, até finais do século XVII Deste modo, temos a oportunidade de estudar os mecanismos de reprodugio de uma economia cxportadora plebéia —e com ela o célculo empresarial de sua elite — que conseguiu existir a con- tragosto do capital mercantil das frotas. Para a nobreza fluminense, 0 referi- do agticar consistia no alicerce de seu status, pois fornecia os cabedais neces- sérios & manutengio da qualidade do grupo. A possibilidade de aquela economia existir insinua a interferéncia da politica nas suas engrenagens. Neste momento, é importante lembrar que, no Antigo Regime, a politica sempre interferia na produgao social, qualquer que fosse ela. Basta recordar que 0 grau de pertencimento ao topo dos estamentos era dado pelo acesso ao dominio da Reptiblica ¢ nao tanto pela ® AHU, CA, doc. 333. Nesta mesma conjuntura, porém do outro lado do Atlintico, o gover nador do Rio em 1646, Duarte Correia Vasqueanes ~ ele préprio integrante das melhores fa miflias da terra — declarava a Lisboa: o Rio de Janeiro “(..) €a mais importante Praga que Vossa Majestade tem neste Estado, de quem depende a conservacio das demais, pois dela [entre outros motivos] se conduzem mantimentos com facilidade das debaixo com que se socorre a Bahia em todas as ocasides” (AHU, UA, does. 455-438). Foge aos objetives deste trabalho analisar a reconquista de Angola; em outro trabalho, procurei demonstrar que tal proceso se deu em meioa negociagdes entre Rio de Janeiro e Lisboa: cf. Jo%o Fragoso, “Knights...” op. it ® Baltazar da Silva Lisboa, Anais do Rio de Janeiro, Rio de Janciro, Seignot-Pancher, vol. IV, 1835, pp. 67-71. & Bm 1691, 0 governador Luis Gésar de Menezes ¢ o8 camaristas afirmavam que 0 Rio de Janeiro, ao contrério de outras capitanias, tinha no agticar seu principal produto (AHU, CA, does. 1766-1679). O valor dos engenhos de agticar corresponde quase sempre a mais de 60% dos valores das mercadorias negociadas, de 1650.a 1698, no 1° Oficio de Notas da cidade. Cf. Joao Fragoso, “A formagito...", 09. cits p. 63. 19 Jodo Fragoso Dossié riqueza material.” Assim, fragdes da nobreza fluminense tiveram de elabo- rar uma cultura polftica/econémica que, ao mesmo tempo, desse conta de duas frentes: uma, interna, que Ihe garantisse legitimidade numa hierarquia estamental; outra, externa, das barganhas entre coldnia e metrépole. Antes de tudo, deve-se atentar para um termo medieval luso: bandos.” Resultavam dos embates entre as faces nobres. E, portanto, referia-se teia de aliangas que tais familias criavam entre sic com outros grupos sociais, tendo por objetivo a hegemonia politica ou a sua manutengio. Estes pactos cram com senhores de engenho nao nobres, oficiais do rei ¢ comerciantes, assim como com amplas redes de aliangas, que incorporavam elites de outras regides coloniais, autoridades em Salvador ¢ em. Lisboa. Inclufam, ainda, reciprocidades com segmentos subalternos da sociedade: lavradores, escra- vos, indios flechciros, etc. Através destas priticas, as melhores familias adqui- riam algo indispens4vel em suas disputas: a cumplicidade de outros estratos sociais. Mais do que isto, a composicao dos bandos legitimava a propria hie- rarquia estamental. Em realidade, a reiteragao da economia plebéia implicava na “uniaio do povo”, portanto, na existéncia de um bando que tivesse legitimidade so- cial. Nestas condigdes, as possibilidades junto aos centros de poder eram No Rio, provavelmente, as maiores fortunas eram de comerciantes, portanto, superiores aos nobres. O cristo-novo José Gomes da Silva, freqiiente dizimeiro na final do século XVI, entretanto, nao conseguiu postos da governanga, 0 que dificilmente pode ser explicado por sua “origem judaica”, pois outros, com a mesma cultura, como os Ximenes e 0s Medanha Souromaior, foram camaristas, além de se casarem com nobres cristdos-velhos, Isto reforga a idéia de que a riqueza material visava sustentar uma hierarquia de qualidades. Em realidade, em 1686 ¢ 1698, Gomes da Silva tivera, como sécios, nobres, vindos da conquista, ou seja, tinha clos com um dos bandos destc grupo: no caso, os Teles/Correia, Alids, em 1692, Lisboa denunciava que a Provedoria da Fazenda Real do Rio nfo devia ter permitido que ele arre- matasse 0s dizimos da época, pois nao tinha pago o criénio anterior: cf. Joio Fragoso, “Um. mercado dominado por ‘bandos’: ensaio sobre a légica econdmica da nobreza da terra do Rio de Janciro Sciscentista”; Francisco C. T: da Silva, Hebe M. Mattos. Todo Fragoso (Org.). critos sobre Histéria e Educagiio: Homenagem @ Maria Yedda Linhares, Rio de Janeiro, Mauad ¢ FAPER], 2001, p. 275. Curioso notar que cargos como de Provedor e Escrivito da Fazenda eram de propriedade de aliados dos Teles/Correia: ef, idem, ibidem, pp. 257 264. A expressiio bando, assim como seus conflitos, pode ser encontrada na histéria medieval portuguesa. Cf. Lufs Miguel Duarte, “Os Melhores da terra”, Themudo Barata (Ed.), Elites ¢ redes clienielares na Idade, Lisboa, Ed. Colibri e CIDEHUS-UE, 2001, p. 101. Da mesma forma, os embates de grupos pelo poder foram comuns no Antigo Regime luso (cf, Nuno Gongalo Monteiro, O Crepasculo das Grandes, Lisboa, Imprensa Nacional ¢ Casa da Moeda, 1998, pp. 203-233) ¢ no Estado da India: ef. Sanjay Subrahmanyam, O Impéria Asidrico Portu- gués, 1500-1700. Uma Histéria Politica e Econbmica, Lisboa, Difel, 1995, pp. 326-335. 20 A nobreza vive em bandas: a economia politica das melhores familias da terra do Rio de Janeiro, stoulo XVI ampliadas. Com isto, garantiam-se as vendas de agticar e as compras de cati- vos. A presenga de um bando dominante era chave na continuidade da socie- dade colonial do Rio. Entretanto, fique claro, a facgiio vencedora cabiam os beneficios da economia do bem comum; portanto, um maior conforto diante de seus pares. Talvez isto agugasse as lutas entre bandos nobres. Esbogo das estratégias da nobreza L-A engenharia parental Entre as estratégias da nobreza, como cra previsivel, destacavam-se as aliangas parentai te t6pico. As fontes disponiveis sao escassas ¢ minha intengio no é fazer um, estudo demografico ou de uma antropologia de parentesco da elite. Limitar me-ci somente a expor um fragil quadro das praticas maritais do grupo? Parto de uma populagio adulta senhorial de apenas 441 pessoas, nas- cidas ou criadas no Rio, para o vasto periodo entre 1565 ¢ 1700: 237 homens ¢ 204 mulheres, sendo, respectivamente, 155 ¢ 130 descendentes de conquis- tadores, ou 2/3 do total (285 de 441). Estes 2/3 no causam surpresa, pois a maior parte dos domicilios senhoriais vinha do quinhentos. A supremacia dos conquistadores era, ainda, percebida entre os matriménios de ambos os se- x08. De 351 casérios, 211 pertenciam Aquele grupo e 140, nao. Os que chega- ram depois de 1600 tiveram menos chance de casar seus filhos; portanto, 0 is. Antes de continuarmos, devem ficar claros os limites des- mercado matrimonial foi controlado pela nobreza da conquista. Quanto aos soltciros, prevalecia mais a condigao sexual do que as origens “sociais”. Para os rapazes, esta cifra era de 16% em 237 candidatos ¢, entre as raparigas, cafa para 1,5% de 204. Isto sugere que 0 conjunto das familias senhoriais privile- Daf a magnitu- Entre 1662 € 1698, ob- servei o valor de 110 escrituras de vendas ~ engenhos, terras, sobrados, ete. — giava os seus rebentos femininos nas aliangas matrimonii de dos dotes recebidos, pelos noivos, de seus sogro: ® A fonce basica foi as genealogias de Rheinganwz, of. cit, As estimativas demogréficas para 0 Rio de Janeiro da época so precarias ¢ foram aprescntadas em Joao Fragoso, “A nobreza...", op. cit. Sobre os aspectos demograficos da elite colonial para outras éreas da América lusa, entre outros, ef. Alida Metcalf, “Fathers and sons: the politics of inheritance in a colonial Brazilian township”, Hispanic American Review 66 (3): 455-84; Muriel Nazeati, op. cits Sheila de Castro Faria, A Coldnia em Movimento, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1998; Silvia Briigger, Minas Patriarcal ~ Familia e Sociedade, Niter6i, PPGHS ~ UF (tese de doutorado, inédita), 2002. Para um étimo aporte metodoldgico, ver Linda Lewin, Politica e parentela ua Pararba, Rio de Janeiro, Record, 1993, Jodo Fragoso Dossié do 1° Oficio de Notas: elas somaram 51:123$572. Na mesma época, 12 dotes reuniam 15:992$960. Apesar de os dotes representarem somente 11% daque- las vendas, corresponderam a 31% de seus valores. Estes ntimeros falam por si da importancia das noivas nos acordos politicos ¢, mais, do impacto destes no funcionamento da economia considerada, Deixando de lado a taxa de solteiros ¢ retendo apenas os casados no periodo, a amostragem € ampliada para 927 pessoas, das quais 517 mulhe- res.” No caso, trata-se de confrontar as opgdes das familias senhoriais — qui- nhentistas ou nao ~diante de quatro tipos de c6njuges: os oficiais do rei vin- dos de fora, 08 senhoriais, os conquistadores e os nao senhoriais. Entre 1565 © 1630, as descendentes quinhentistas praticamente monopolizaram os ofi- ciais do rei. Seria o caso do casamento, por volta de 1610, de Maria de Mariz com 0 capitio Joo Gomes da Silva, Maria era filha e neta de conquistadores. Jo%io Gomes da Silva, ex-governador da Fortaleza de Santo Ant6nio, na Bahia, ocupara, no Rio, a capitania do Forte de Sao Joao ¢, depois, a provedoria da Fazenda Real. Repare-se que este perfodo fora de montagem da agucarcira ¢ do governo na regido. Portanto, estes oficiais traziam para as ca- sas de seus sogros emolumentos € mercés reais, além do mando politico. Dat se explica que, dos 18 casos conhecidos, 16 fossem absorvidos pelos quinhen- tistas. Para os oficiais, tais matriménios significavam entrar numa jovem eli- te, contudo ja portadora de terras, prestigio social ¢ postos na governanca. No periodo 1631 ¢ 1700, o ntimero de noivas foi de 456, 0 que melhora a compreensao das priticas maritais. Uma vez consolidada a sociedade, as ntipcias das mogas quinhentistas com oficiais do rei diminuiram e quase 50% (126 de 257) se casaram com maridos senhoriais. Para as descendentes de nto conquistadores, esta cifra foi de 40% (79 de 199), A proximidade destes nit- meros insinua uma maior troca de cOnjuges entre os dois grupos de famflias senhoriais. Portanto, no periodo abordado, a nobreza da terra e os demais segmentos senhoriais mudaram snas politieas maritais. Talvez um fendme- no que explique isto seja a revolta contra Salvador Correia de $4e Benevides, em 1660. O bando de Benevides baseava-se, principalmente, nos oficiais locais do rei e menos na nobreza da terra e nos demais donos de moendas. Depois conomia * CE. Joao F ”, op. cit, * Neste caso, juntei & populagio dos nascidos e/ou criados na regio os que nela chegaram j4 adultos. goso, “Um mercado. A nobresa vive em bandos: a economia politica das melhores familias da terra do Rio de Janeiro, século XVIT daquela sublevacao ¢ do afastamento de Benevides do Rio, os ‘Teles/Correia assumiram 0 poder e, como os seus adversérios, apostariam em outro tipo de aliangas. Tiveram a preocupagao de criar uma larga rede de sustentagao poli- tica, reunindo antigos € novos domicilios com engenhos.® Isto resultou na multiplicagdo de casamentos senhoriais de diferentes matrizes. Daf nao ser estranho que, de 1663 a 1700, mais de 30% das 325 mogoilas senhoriais, inte- grantes ou nao da velha governanga, encontrassem maridos entre descenden- tes de conquistadores. Por seu turno, 0 crescimento de matriménios intra- senhoriais acarretaria na maior freqiiéncia de unides entre parentes.*! Do perfodo 1631-62 a 1663-1700 estes enlaces passaram de 18 (em 131 mogas) para 75, ou 23% de 325. Algo semelhante ocorreu com os vizinhos. Naquele iltimo perfodo, das 65 noivas, cujo domicilio paterno era conhecido, 34 es- posaram vizinhos, o que Ihes ampliava o poder local. Por conseguinte, com o passar do tempo, diferentes familias senhoriais optaram por uma maior endogamia sangilinea e geogrifica, o que resultava no fortalecimento do grupo social, mesmo dividido em bandos, nas fregue- sias € no Senado. Este cuidado com o poder local se mostraria vital com 0 tempo.2? Neste sentido, temos as relages de compadrio, estabelecidas nas pias batismais. Infelizmente, somente para a freguesia de S40 Gongalo tenho noticias, Para 1635 a 1660, trabalhei com 106 registros de batismos de livres, dos quais 18 criancas descendiam de familias senhoriais ¢ tinham padrinhos da mesma origem. Quanto aos padrinhos, dos 84 afilhados de origem popu- ™ Este bando era encabecado por velhos aliados de Benevides, como os ‘Teles Barreto ¢ 03 Barcelos. Apés 1661, tais familias procuraram realizar paz com seus antigos adversdrios , com isto, garantir a governabilidade de seu bando. Gf. Jodo Fragoso, “Knights...", op. cit; idem, “Um mereado...", of. cit. » Entre os Teles/Correia a endogamia parental foi um trago marcante, Os Teles Barreto, 08 Silveira Soutomaion os Andrade Machado © os Andrarie Araiijo descendiam do mesmo tron- ¢o quinhentista: os Pontes. Até finais do século, as unides entre primos ou destes com tios 1m repetir-se. Por seu turno, outras “casas” se juntariam a tal tronco. Este fora 0 caso dos Gago da Camara, dos Barcelos Machado, dos Frazao ¢ Correia. Com isto, os lagos da ctipula do bando se tornaram parentais, o que fortaleceu a sua unidade. ® Outra préitica dos bandos para reforgar seu poder nas freguesias era a de impedir a compra de engenhos do grupo por estranhos. Quando um dos aliados vendia sua fibrica, ela, em ge- ral, era adquirida por pessoas do bando. Isto criava uma situagio em que o mercado de enge- nhos tinha forte presenga de tais grupos. Os aparentados, entre 1650 e 1698, responderam por cerca de 1/3 dos valores de engenhos em cartorio. Este tema foi desenvolvido por Joao Fragoso, “A formagio...”, 0p. cif. p. 62; idem, “Um mercado..”, op. city, p. 283. 2 Jodo Fragoso Dossié lar, 43 eram de “casas” senhorias, e 41, de fregueses populares; em quatro batizados, fiquei em diivida, Estes ntimeros demonstram a capacidade das familias senhoriais de estabclecer relagdes de compadrio; batizaram 61, ou 57,6%, do total analisado, sendo o predominio dado ao grupo chefiado por Jerdnimo Barbalho, lider da revolta de 1660 contra os Benevides. A este ban- do pertenciam, entre outros, os Gomes Bravo, os Castilho Pinto Lobo Perei- ra ¢ os Martins Ribeiro. Como de costume, tais familias estavam unidas por clos sunguineos ¢ de compadrio. Da mesma forma, procuravam fortalecer 0 seu poder local através de lagos com os moradores, de distintas qualidades, da freguesia, Daf aparecerem em 30 batismos, ou seja, 28% do total, e quase a metade dos 61, feita por senhores. Daqueles 30, 24 eram criangas do povo.® Entretanto, nao se pode esquecer que as redes € seus niimeros cram mutiveis.+ Outro componente importante nas pritica 0 pactos com os demais segmentos sociais, em particular os de origem mer- cantil. A maior atengZo para com os casamentos intra-senhoriais nao repre- sentou o abandono daquelas aliangas. De 1631 a 1700, 111 noivas das melho- res casas, entre 257, “escolheram” parcciros nado senhoriais como maridos, fendmeno que nao deve causar grandes surpresas. Muitos conquistadores e seus descendentes se dedicaram ao apresamento ¢ A venda de indios, ao tra- fico de escravos da Guiné € a outras atividades comerciais, Para eles, o que importava era manter a hegemonia na hierarquia estamental, 0 que, sem ca- bedal, seria dificil. Assim, nao foi excepcional o matriménio, em 1638, de Pantaleao Duarte Velho, negociante no Prata e traficante de cativos, com Maria Coutinha, descendente da familia de conquistadores Azeredo Couti- aho, Poderia multiplicar os exemplos, porém basta lembrar que, neste tipo s parentais da nobreza cra * Este predomfnio dos “Barbalho” merece alguns retoques. Quase metude dos pais das 84 criangas “plebéias” escolheu compadres também do povo, Assim, as camadas subalternas tie nham scus préptivs ununjus de sociabilidade, Alem disto, cerca de 40% dos padrinhos senho- tiais nao eram do bando estudado. Exisciam, portunto, outras redes senhoriais na freguesia Caria Metropolitana de Niter6i (CMN), Livro de Barismos de So Gongalo. Agradego a Sheila de Castro Faria 0 acesso a fonte. * Uma vez sufocada a revolta de 1660, a importancia do grupo dos Barbalho, pelo menos tem- porariamente, diminuiria. Os batismos sugerem isto, Entre 1662 a 1664, estudei 42 cerimé- nias, das quais 0 grupo apareceu em apenas cinco, sendo trés de parentes seus. A mesma fon- te insinua o fortalecimento de um novo bando na regidio, os chefiados pelos Gurgel do Amaral, que batizaram sete criangas — quatro do povo. Cf. CMN. * CE, Jodo Fragoso, “A formagio...", op. cits idem, “Lim mereado...", op. cit A nobrexa vive em bandos: a economia politica das melhores familias da terra do Rio de Janeiro, século XVIT de acerto, os conquistadores ofereciam ventres, dotes e prestigio para os mercadores ¢, em troca, conseguiam o tal cabedal. Para 0 comerciante, este ajuste representava, ainda, maior facilidade de realizar negécios num merca- do influenciado pelas melhores famtlias da terra, Por tiltimo, Pantaledo ¢ ou- tos negociantes nao viviam no capitalismo, mas sim no Antigo Regime; para eles, subir de vida significava serem donos de engenho ¢, melhor ainda, no- bres. 2- Redes de alianga supra-regionais Ao longo do sciscentos, principalmente, as familias que encabegavam 0s bandos teceram redes de parentesco supra-regionais. Na verdade, isto fora, inicialmente, conseqiiéncia da prépria conquista da Guanabara por fragdes de clites de diferentes areas, como vimos. Algumas delas se desdobraram em ramos regionais, com posigdes de mando nas suas vilas de origem e, simulta- neamente, nas terras fluminenses. Mais tarde, o mesmo fendmeno ocorreria com outras familias de igual status: migrariam para o Rio, mantendo ligagdes parentais com a regido de origem, por meio de niipcias em sucessivas gera- ges. Assim, foi constituida uma verdadeira teia politica de elites regionais, cuja ago era sentida no centro do poder colonial: Salvador. Um bom exem- plo disto foram os pactos entre os Gago da Camara, os Soutomaior ¢ os Albu- querque Maranhio, no bando Teles/Correia. Em 1645, Izabel da Camara, filha de Pedro de Gago da Camara ~ capitao da Fortaleza de Santa Cruz, no Rio — casou-se com Matias da Albuquerque Maranhao, neto de Jerdnimo de Albu- querque ~ governador do Maranhao em 1614 —e futuro governador da Parai- ba, em 1657. Na geragao seguinte, Apoldnia, filha de Isabel ¢ Matias, espo- sou seu primo-irmao André Gago da Camara. André era filho de uma Silveira Soutomaior e uma de suas irmis se tornaria esposa, em 1679, de outro primo- iro: Francisco da Silveira Soutomaior, que fora ouvidor-sindicante do Rio ¢ desembargador no Tribunal da Relacio da Bahia, em 1680. Completando estas aliangas supra-regionais, temos os trés casamentos de Salvador Correia % Gf. Joao Fragoso, “A formagao...”, op. cit., p. 40. Além de Pantaleo, outro exemplo cemblemitico é de Antonio Cardoso de Azevedo, Este comerciante, vitivo, casou-se com Paula Rangel, em 1660; ela, descendent dos Azeredo Coutinho ¢ Mariz, Em 1665, Cardoso, oucra ver vitivo, esposa Lucrecia Viegas, vinda de uma casa senhorial de inicio dos seiscentos. Além disto, sua nova esposa era filha de Lucas do Couto, alferes da fortaleza de Sao Joao © que tinha a guarda dos navios que passavam pela barra. Em finais do século, © mesmo Antonio arrematava no Senado o imposto da aguardente da tetra. 25 Joao Fragoso Dossié Vasqueanes, filho do velho governador Duarte Vasqueanes, e também inte- grante dos Teles/Correia: 0 primeiro, em 1659, com a descendente de Joao Pais de Barros, antigo governador de Pernambuco, entre 1619 © 1620; 0 se- gundo, em 1676, coma filha do mestre-de-campo na Bahia e futuro governa- dor do Rio, Pedro Gomes; em 1679, com uma parenta do chanceler da Rela- ¢%o da Bahia, entre 1667 € 1680, Jofio de Aratijo Goes. Provavelmente, existia uma “divisao do trabalho” entre as familias de um bando: algumas se dedicavam mais as aliangas locais, enquanto outras, aos clos com facgdes das elites de distintas capitanias da América. Os casa- mentos dos rebentos de José Barcelos Machado, por exemplo, serviram para costurar pactos dos ‘Teles/Correia com potentados de distintas freguesias do Rio, como Iraja ¢ S40 Gongalo. Simultaneamente, os Barcclos tinham lagos com os Gago da CAmara/Soutomaior, pois um de seus filhos era gento dos primeiros ¢ aparentado dos segundos. Assim, o dito bando, como outros, pro duziu uma engenharia de matriménios, interligando aliangas com poten dos de freguesias e de capitanias, sendo que tais priticas se repetiriam no tempo. Na €poca, a nogio de parentesco nao se esgotava no sangue. Integran- tes de um bando cram, com freqiiéneia, denominados de “aparentados”. Portanto, os pactos passavam, também, por outras vias. Exemplo disto foi a proximidade do ouvidor do Rio, em 1676, e, depois, desembargador da Rela- cao da Bahia, Pedro de Unhio Castelbranco, com os Teles/Corrcia.* As unides com ministros do rei eas aliangas supra-regionais como arma de um bando podem ser ilustradas pela destituig&io do governador interino do Rio, JoXo Tavares Roldao, em 1680. Ele fora alvo de acusagées, pelos camaristas, entre eles Joo Manuel de Melo, integrante dos Teles. O desem- bargador-sindicante, nomeado por Salvador, foi Francisco da Silveira “Ant6nio de S. M. Jaboatio, “Genealogia Baiana”, Revista do Instituto Histirico e Geografico Brasileiro, vol. 191, Rio de Janeiro, IHGB (org. por Afonso Costa). Jaboatio, 1946, 13-57; Joto Fragoso, “Knights...”, 9p. cit. Outras familias manteriam estas priticas de cm cada geragiio parentes de diferentes regides se casarem. Ver, por exemplo, o caso dos Rendo y Quevedo, Silva Leme. Cf Luiz Gonzaga da Silva Leme, op. cit. & Neste ano, 0 governador da cidade, Matias da Cunha, denunciava Pedro de Unhao Castelbranco por distribuir oficios de escrivao da cidade, prerrogariva que nfo era sua. No mesmo documento, o governaclor acusava o Provedor Tomé de Souza Correa de desvios nos contratos dos impostos, como seu pai ~ Pedro de Souza Pereira — fazia (AHU, CA, doc. 1290); Stuare Schwartz, Burocracia e Sociedade no Brasil Colonial, Sao Paulo, Perspectiva., 1979, p. 34. A nobrexa vive em bandos: a economia politica das melhores familias da terra do Rio de Janeiro, séeulo XVI Soutomaior, que deu parecer negativo ao governador. Em carta a Lisboa, Roldao denunciava Soutomaior de imparcialidades, pois tinha na cidade va- rios “irmaos e parentes” prejudicades pelo seu governo. O Ultramarino, como resposta, acatava o parecer de Soutomaior.” Curiosamente, 0 novo governa- dor escolhido foi Pedro Gomes, na época sogro de Salvador Correia Vasqueanes. Talvez este seja um bom exemplo da sintonia das politicas dos bandos em diferentes esferas, quais sejam: 0 reforgo do poder local, facil tando 0 acesso ao Senado, e as redes junto a Salvador. Ouso de amplas tcias de poder como recurso dos Teles/Correia é bem demonstrado no conflito entre o governador Mathias da Cunha, em 1676, ¢ ‘Tomé de Souza Correia ~ provedor da Fazenda do Rio ¢ acusado de desvios nos impostos. Este processo fora parar no Conselho Ultramarino, que reco- mendou uma sindicancia, alertando que “(...) seré conveniente nao se encar regar ao ouvidor [Pedro Castelbranco] que esti servindo por ter estreita ami- zade com este provedor”. Mais adiante, 0 conde, presidente do Conselho, trouxe uma “consulta da fazenda”, aconselhando que 0 caso fosse julgado “(...) sem assisténcia de alguns Ministros, por se entender que seriam suspeitos nestas matérias”.*” O bando tinha anuéncia do ouvidor da cidade e suas in- fluéncias chegavam ao Conselho Ultramarino. Nao sei qual foi o resultado de tal inquérito, porém, no ano seguinte, a Camara do Rio escrevia sobre os inestimaveis servigos prestados por Tomé Correia, Em 1688, ele seria o vedor do Estado da {ndia.* Em suma, 0 bando envolvia os camaristas, 0 ouvidor do Rio ¢ 0s conselheiros no Ultramarino. 3 - A distribuigho de dédivas. As estratégias dos bandos se baseavam em reciprocidades, em dons ¢ contradons. Isto estava presente nos casamentos — basta lembrar os dotes ~ assim como na distribuigaio de dédivas: serventias de oficios régios e de no- meagées para postos militares, Estas préricas estaheleciam elos com nobres * AHU, CA, doc. 1615. AHL, CA, docs. 1286-89. Em 1686, varios dos personagens do bando Teles se encontra- iam no casamento dos filhos de Pedro de U. Castelbranco ¢ de Pedro Gomes, sendo a madri- nha, Isabel Camara, esposa de Soutomaior. Esta ceriménia também sancionava a paz com Matias da Cunha, na poca governador do Brasil, padrinho dos nubentes, cf. Schwartz, ap. Git., p. 280, Portanto, o compadrio servia para referendar antigas aliangas e realizar a paz entre adversirios. 4 AHU, CA, docs. 1332-133; AHU, [ndia - Livro das Monges, n® 55%, Fols. 23-24. a7 Jodo Fragoso Dossié € com os grupos subalternos coloniais; desnecessirio dizer que reciprocida- de nao significa igualdade, tanto mais no Antigo Regime. Os cargos de provedor da Fazenda e de juiz de 6rfios eram proprieda- de, respectivamente, dos Frazao Pereira e dos Teles Barreto, ambos do mes- mo bando. Entre 1670 ¢ 1690, tais cargos passariam, como serventias, pelas maos de outros integrantes do grupo. Da mesma maneira, foram usados para atrair novos aliados fazer a paz com antigos adversérios.” A mercé da serventia, a principio, era privilégio do rei, e somente em certas circunstan- cias podia ser concedida pelo governador da localidade.* Assim, os Frazio os Teles, de certa mancira, reinventaram este expediente conforme seus in- teresses. Os Teles “ofereciam” também serventias de offcios de que nao pos- suiam a propriedade. Em 1680, 0 ouvidor-sindicante, José da Rocha Pitta, queixava-se do desembargador Francisco da Silveira Soutomaior, de nomear “alguns oficiais das serventias dos oficios de escrivao dessa cidade apadrinha- dos seus” entre os quais pessoas de menor qualidade. Dentro da légica das dadivas, o capitulo 18 do Regimento das Frontei- ras de 1660 oferecia étimas oportunidades. Por ele, os capities de infantaria podiam escolher subordinados para suas companhias. Assim, em 1662, 0 capitio Luis Machado Homem, dos ‘Teles, nomeava como alferes os irmios Manuel Barbosa Pinto ¢ Diogo $4 da Rocha, integrantes da tradicional famf- lia quinhentista dos Rangel, portanto, vitais na Repiiblica.* 4- Com “meus criados, escravos ¢ tndios”: 0 “poder social” da nobresa A legitimidade social dos régulos no s6 dependia das reciprocidades com os senhores e com 0 povo. Sua autoridade se completava ¢, com isto, 0 © Isto pode ser ilustrado pela coopracao de Francisco Brito de Meireles, que, juntamente com seus cunhados, foi contra os $4, na revolta de 1660-61. Nas tiltimas décadas da séenlo XVI, Francisco adquiria a serventia de provedor da fazenda e casava um dos seus na familia dos Correia: Joao Fragoso, Histirias de trésilhéus: notas sobre a consolidagto da elite senhorial no Rio de Janeira seiscentisra, Rio de Janciro, Departamento de Histéria, UFR], 2000 (texto inédito), ® Ordenagies Filipinas, Livro I, t. XCVI, 1 € 3. Lisboa, Fundagto Calouste Gulbenkian, 1985, * Arquivo Nacional (AN) Provedoria da Fazenda Real do Rio de Janeiro (PFRR))., c6d. 61, ¥. 7, 477-478, “AN, PFRRR)J, céd. 61, vol. 4 “ AN, c6d. 61, PFRRJ vol. 3, pp. 5 A nobrexa vive em bandos: a economia politica das melhores familias da terra do Rio de Janeiro, séeulo XVI desenho do bando, quando os dons ¢ os contradons incluiam os indios e os escravos da Guiné. Por se tratar de uma socicdade estamental baseada no trabalho cativo, sem aquelas no existiria uma estratificagao de tipo antigo e muito menos os seus bandos. As pesquisas sobre indigenas para o perfodo tratado sao ainda poucas, poréma figura do indio flecheiro cada vez mais se impée: scja nas investidas no sertio, na defesa contra os inimigos externos da coroa e nos embates intranobreza. Portanto, para além do genocidio ¢ do cativeiro, nao ha de se estranhar a existéncia de reciprocidades entre nobreza ¢ indigenas: ¢ isto desde 0 infcio da colonizagao.*? Estas praticas talvez expliquem a defesa dos flecheiros aos engenhos de Salvador Correia de Sé ¢ Benevides, em 1645, contra as investidas das tropas do governador da cidade, Francisco Soutomaior, que, narrando o episédio a Lisboa, afirmara que o principal da aldeia, locali- zada naquelas terras, “(...) nfio conhecia, nem obedecia senao ao General Salvador Correia de Sa”.** Deste modo, os flecheiros consistiam no brago armado dos bandos. Ainda em finais do século XVII, participavam dos conflitos intranobreza. Em 1690, 0 ent3o. governador Luis César de Menezes escrevia que, em uma escaramuga dos Gurgel do Amaral contra os Teles/Correia, os primeiros con- caram com 30 indios.” O crescimento da economia baseada na escravidao africana acarreta- ria, igualmente, a multiplicagao de reciprocidades com 0s cativos da Guiné. Neste momento, é importante lembrar do agticar de segunda da regiao e, portanto, das suas dificuldades no trafico atlantico de escravos. Provavelmen- te, isto tornava mais sensiveis aquelas negociagoes. Para a década de 1650, possuo listagens de cativos negros de dois en- genhos da cidade. Neles, diferentemente de outras dreas escravistas novas, © Este artigo nao comporta a andlise desta época. Ck John Monteno, op. cit., © Maria R. Celestino Almeida, “Os [ndios ¢ a Conquista do Rio de Janeiro”, Os [ndias Aldeados no Rio de Janeiro Colonial, Instituto de Filosofia ¢ Ciéncias Humanas, UNICAMP (cese de doutorado, nédita), 2000. Para os relatos da adogao de praticas indigenas ~ poligamia, antropofagia, etc. —pelos europeus, ver Manuel da Nébrega, Cartas Jesuiticas, n® 1, Belo Horizonte, Ed. Itatiaia; Sio Paulo, Ed, da USP, 1988, pp. 196-197. Para as aliangas entre colonos ¢ principais indige- nas, ver Luls, op. cz, 1956, € Franco, op. eit., 1989, pp. 191 ¢ 192. Sobre a “troca de favores” ntre segmentos da populagio indigena com os lusos no Rio, ver Knivet, op. cif, pp. 183-272. AHU, AV, ex. 2, doc. 57. © AN. Correspondéncia dos governadores do Rio de Janciro, Céd. 77, vol. 3:21¥, 29 Joie Fragoso Dossié nao se observou um grande desequilibrio entre os sexos. Dos 155 arrolados, 40% eram mulheres, o que facilitava a constituigao de familias, Daqueles 155, 57% dos cativos estavam unidos por lacos de parentesco. A presenga de fa- milias escravas era mais forte numa fazenda de Campos que, em 1692, com- binava pecuiria e agticar." Reunia 225 cativos, dos quais 215, ou 95,6%, man- tinham parentesco; nao descarto, porém, uma superestimativa de tal cifra. Mesmo considerando problemas com a representatividade dos dados, con- sistem em unidades de épocas e produces distintas, com tragos demogrficos proximos. Aquelas fontes nao informam a idade das “pegas”, portanto, foi impos- sivel perceber a estabilidade temporal de tais familias. Entretanto, 0 uso dos registros de batismo de escravos negros de Sao Gongalo permite uma visio, ainda que fragil, sobre o tema, Entre 1646 ¢ 1668, analisei 319 registros de criangas: neles constam 244 mies € 20 senhores/plantéis.*) Daquelas mies, ‘5 apareceram mais de uma vez com o mesmo cOnjuge, portanto, 22,5% das uni6es escravas analisadas (244) cram estaveis; ou, 0 que é 0 mesmo, tiveram mais de um rebento. Estas tltimas responderam por 130 criangas, ou 40,7% de todos os registros, Deve-se atentar para o fato de que tais planréis pos- sufam até duas décadas de existéncia, sendo 17 (dos 20) com mais de 10 anos. Portanto, a amostragem retine tanto “recém-casados” como antigas unides, algumas com mais de seis anos, Entre os registros de Jeronimo Barbalho, duas familias possufam tal perfil ¢ apresentaram quatro filhos. Francisco Barreto de Faria, do bando adversario ~ Benevides — tinha um casal que, em 11 anos, teve cinco rebentos Assim, as relagdes entre senhores € escravos na regitio se traduziam, aparentemente, na estabilidade de familias escravas. Perceba-se que um dos engenhos acima analisados pertencia a Baltazar Leitdo, que, além de nobre © Ultrapassa os limives do texto a demografia dos escravos africanos «0 uso de indigenas como cativos. Entretanto, nos dois engenhos existiam indigenas; o de Mangaratiba (ECV) contava com 30 {ndios, dos quais 26 unidos por parentesco. Inventatio post mortem de Baltazar Leitao, 1656, doc. 930 Arquivo Histérico do Mosteiro de Sto Bento; Escritura de venda e troca de engenhos entre Salvador Correia de $4 e Benevides ¢ José Rendon (ECV), 1652. Cartério de Notas do 1° Offcio de Notas, AD trega que faz. Vicente Joo da Cruz a0 capi- to-mor Agostinho de Carvalho, da fizenda do Visconde Asseca, 1692, 1° Livro de Notas do fubelitio de Campos; agradego a Sheila de Castro Faria a consulta desta fonte, * No periodo, existem 1.019 batizados escravos de 297 senhores. Daqueles totais, 236 catives (23%) eram de 192 (65%) donos com até dois batismos. Estudei 20 das 23 senhores que regis- traram 10 ou mais cativos. Estes 20 donos batizaram 319 cativos (31,3% do total). Cf. CMN. 30 A nobreza vive em bandos: a economia politica das melhores familias da terra do Rio de Janeiro, século XVI da terra, possufa negécios com Angola. As demais unidades eram dos Benevides de $é, familia cujo poder € cuja riqueza dispensam comentitrios. Pois bem, estes senhores, mais os Barbalho ¢ os Barreto Faria, apesar de po- derem repor seus cativos via Atlantico, tinham parte expressiva de seus plantéis formada por familias escravas, 0 que dé a estas empresas mais um perfil de aldcias do que de uma tradicional de plantation. So que parece, a idéia de negociagdo entre senhores e escravos nao era apenas uma figura de retorica, Nao custa lembrar a idéia de W. Kula de um “coeficiente de opres- sio praticdvel” nos fcudos poloneses:® caso tais empresirios nao levassem em conta isto, as barganhas com os camponeses, suas unidades sucumbiriam. Algo semelhante, provavelmente, ocorria na Guanabara, Neste sentido, € interessante notar que, na fazenda campista dos Benevides, havia instalagdes para moer a cana dos escravos. Portanto, além de plantagées, cativos tinham como beneficié-las, ou seja, o senhor fazia investimentos em moendas para 0 uso de sua escravaria; isto ilustra aquelas negociagées. Os batismos sugerem, ainda, a existéncia de redes de sociabilidade de escravos que ultrapassavam os engenhos. Por exemplo, as cativas de Jeréni- mo Barbalho tiveram, ao menos, nove afilhados em outros plantéis. Assim como as “crias” de Barbalho receberam madrinhas escravas de distintos se- nhores. No caso de Barreto de Faria, cinco ¢ 10 de seus cativos foram, res- pectivamente, madrinhas e afilhados de escravos de outros senhores. Ainda para Barreto, 0 casal de 11 anos € cinco filhos, acima referido, teve dois re- bentos com padrinhos de plantéis diferentes. Portanto, uma mesma familia escrava era capaz de manter, simultaneamente, compadrios com cativos de distintos engenhos. Pelo menos, outros sete dos 20 plantéis com mais de 10 batizados se inserem na mesma situacio: a estabilidade da familia aparece associada a elos de compadrios entre senzalas de engenhos diversos. Evidentemente, os exemplos apresentados nao permitem generaliza- Ses, porém insinuam redes de saciabilidades escravas que atravessavam a freguesia, Estas teias podiam ser ou nao entre cativos de senhores aparenta- dos, contudo, em qualquer das condigdes, elas existiam. O que me importa € sugerir a hipotese de barganhas com escravos como pritica da nobreza e, mesmo, a existéncia de uma certa coincidéncia de interesses entre mbos. Baltazar Leitio foi, em 1652, procurador do contratador dos direitos de Angola no Rio. Ck. AN., PFRRJ, e6d. 61, vol. 1, p. 100. Witold Kula, Teoria Econémica do Sistema Feudal, Lisboa, Prescnga, 1979, p. 42. 3t Jodo Fragoso Dossié A dificuldade no trafico angolano, provavelmente, distinguiu a demografia escrava do Rio da de outras éreas. Entretanto, qualquer capita- nia bascada na escravidao tinha na politica um trago vital. A produgio escra- vista dependia da hierarquia de qualidades. Afinal, os cativos tinham de se perceber como agentes de qualidade inferior 4 de seus donos; sem isto a pro dugao nao ocorria. A continuidade das relagées de produgio era refém da politica. Evidentemente, tais negociagdes ocorriam em meio a conflitos en- ue senhores ¢ escravos. Existiam as revoltas escravas ¢ os quilombos, assim como os acordos de paz e a repressio a tais levantes, por senhores e seus ca- tivos. Daf a preméncia da negociagao.™ Além daqueles tragos gerais da sociedade escravista, para a nobreza, 0 acesso ao mando da Republica ¢, portanto, ao apice da hierarquia social no era automdtico. Isto criava um cendrio tenso para ela, gerando facgdes adversdrias, fendmeno que tornava mais urgente a busca, pelos diversos ban- dos, da legitimidade dada pelos escravos. Parece-me que um dos melhores exemplos do envolvimento dos es- cravos em tal sociedade era a sua participagio nas lutas entre bandos da no- breza. Em 1691, 0 reitor da Companhia de Jesus relatava a Lisboa os ataques &s suas fazendas, em Campos, pelos negros de José Barcelos ¢ de Martim Correia Vasqueanes: (...) armados com flechas, dardos e armas de fogo foram a um dos currais (...) investindo aos tiros [os] negros que (...) nele [viviam], matariio dois (...) de xando muitos feridos ¢ todos molestados (...). Ameagando os que [voltassem] aquele sitio os haviam de matar e ainda nio satisfeitos queimaram as casas e derrubaram o dito curral.** Esta singela passagem retrata conflitos entre bandos, onde os agentes eram escravos. Reparem-se ao menos duas coisas: = primeiro, os escravos estavam armados: um bom {ndice para medir o “sucesso” das negociagdes com as senzalas. O embate entre cativos armados insinua que eles se viam como parte dos bandos da nobreza em conflito; 8A repressio de quilombolas por indios ¢ escravos de nobres da terra era comum nas cartas a Lisboa. Em 1646, 0 governador Duarte C. Vasqueanes isto pedia a Manue! Homem Albenaz (AHU, CA, docs. 789-826). “ AHU, CA, doc. 1779, Ainda no século XVIII, 0 envolvimento de escravos ao lado de seus senhores era comum. Em 1756, 0 governador Gomes Freire sugere 0 nome de Gregério de Moraes Castro Pimentel como sargento-mor da guarnigao do Rio, entre outros motives, por ter debelado um quilombo com seus escravos (AHU, CA, doc. 19241). Cf. Silvia Lara, Caz pos da Violéncia, Rio de Janeiro, Paz ¢ Terra, 1988, pp. 130, 193 e passim. 32 A nobreza vive em bandos: a economia politica das melhores familias da terra do Rio de Janeiro, século XVIT ~ segundo, as fazendas invadidas foram danificadas € seus cativos, fe- ridos. Neste momento, é importante recordar que as fazendas do Rio eram compostas por familias de escravos que possufam, além de suas vidas, plan- tages. Por conseguinte, nos embates senhoriais ndo s6 estavam em jogo os interesses destes escravas tinham, igualmente, algo a defender, Assim, a imagem do bando, camo expresso de uma hierarquia de tipo antigo, se completa. mas também os dos escravos. Nos conflicos, as familias As estratégias dos bandos e a economia plebéia Enfim, seja pela natureza do agticar carioca e/ou em razio de a socie- dade colonial se basear no Antigo Regime, o fato foi que a nobreza da terra seiscentista produziu uma cultura politica que possibilitou a sua sobrevivén- cia. Mais do que isto, tal cultura garantiu a propria existéncia da economia plebéia fluminense. Ao longo das décadas de 1660 ¢ 1670, os camaristas do Rio freqtientemente se queixavam a Lisboa de questdes como: 0 descaso das car fluminense; a preferéncia dada pelos cumbeiros ao nordeste, em detrimento do Rio, e a falta de moedas.** Parte destes proble- mas foi amenizada, quando ocorreu a “uniao do povo”, sob a hegemonia dos Teles/Correia ¢ estes estabeleceram aliangas supra-regionais, inchis Lisboa. Em 1678, 0 capitdo Ignacio da Silveira Vilasboas, juiz ordinario ¢ do dito bando, obedecendo ao Senado, prendia os mestres € 0s comerciantes das frotas, obrigando-os a estabelecer os pregos do agticar ¢ do frete na Camara, 5 No ano seguinte, os vereadores agradeciam ao rei o privilégio de o Rio ter, no final de cada ano, até quatro naus de cativos, vindos de Luanda, 0 que contrariava as velhas atitudes dos governadores ¢ dos traficantes de Angola. Outro problema delicado era a moeda. Por diversos meios, os merca- dores das froras dela se apropriavam, reduzindo a sua capacidade de investi mento e, portanto, as possibilidades de reprodugao da hierarquia de tipo an- tigo do Rio, Para evitar tal carestia, na década de 1670, a Camara propunha a Lisboa solugdes aplicadas em outras ocasides: “(...) tendo as ditas moedas frotas para com 02 veem em nome do bem comum. © Gf. Jotio Fragoso, “Knights...”, op. cit AHL, AV, cx. 4, doc. 107. A retengao da frota pelos camaristas, como vimos, niio foi uma novidade na histéria do Rio, porém tal ato sempre dependeu do grau de legitimidade social da governanea na sociedade. ® AHU, CA, doc. 1367; AHU, AV, ex. 4, doc. 115. 33 Jodo Fragoso Dossié maior valor nesta praga do que nas outras (...) do Brasil n&io tem conta ao ne- gécio a levarem desta terra para outra praga (...)”. Na verdade, a nobreza pretendia que a moda do Rio tivesse maior valor nominal do que a do reino, garantindo a sua permanéncia na cidade, A principio, tal proposta referendava velhas préticas de acumulagao do capital mercantil; via circulagao, ele se apropriava de parte da riqueza social. Portanto, as melhores familias da terra cram favordveis aquilo que, posterior mente, a historiografia chamaria de pacto colonial. Entretanto, nao ha de se esquecer que aquela solucao vinha da nobreza, que pretendia vender 0 acti- car plebeu ¢ impedir a fuga de moedas da economia que conheciam. A no- breza apostava que os comerciantes se veriam coagidos a preferit um agticar de segunda a uma moeda “podre”, sem validade cm outras paragens, fend- meno que, no final, contrariava os interesses dos mercadores reindis; além de consistir numa ameaga a autoridade monetéria metropolitana, Nao foi sem motivo que oconselheiro do rei para a fazenda, em 1689, via nela o resultado de “(...) moradores sem lei ¢ sem ordem [que] tinha{m] dado a moeda valor aseu arbitrio”. Este tiltimo parecer bem demonstrar a delicadeza daquela proposta, pois implicava na manutengio das patacas no Rio; moedas de ficil adultere ¢40 ou de cerceio do seu valor intrinseco em relagZo ao extrinseco — 0 que contrariava Lisboa. Quando a capitania aplicou a dita proposta, foram postas em teste as estratégias do bando Teles/Correia. Em 2/12/1679, 0 governador Manuel Lobo, com a aprovagio do desembargador-sindicante Joiio da Rocha Pita e do governador-geral Matias da Cunha, nao cumpriu a ordem de Lis- boa, qual seja: alterar o valor das patacas, marcando-as, de modo a impedir 0 seu cerceio."! Em 1681, Lisboa voltaria a ordenar que 0 governador Pedro Gomes seguisse a lei de 1679. A resposta de Gomes repetia os argumentos » AHL, AV, ex. 4. doc. 91; ef, AHU, AV, ex. 4, doc. 115. Sobre a anterioridade desta pratic ver Joao Fragoso, “Knights...”, ap. at. A politica de aumentar 0 valor nominal da moeda em, relacdo ao seu intrinseco criava uma situagio de desvalorizagiio do dinheiro da cidade, o que reduzia o prego real do agticar exportado ¢ aumentava os custos das importagoes da capicania Desnecessirio sublinhar as semethancas com as préticas cambiais estudadas por Gelso Furta- do na economia exportadora brasileira. A grande diferenca é que Furcado as percebe para as primeiras décadas republicanas. Cf. Celso Furtado, Formagdo Econémica do Brasil, Si Paulo, Gia, Ed. Nacional, pp. 155-195. AHU, CA, doc. 1769. & BN., Documentos Hist6ricos, 1951, vol. 92, p. 27. Sobre as atitudes da nobreza diante da moeda, na década de 1640, ver Joo Fragoso, “Knights...", op. cit. a4 A nobreza vive em bandos: a economia politica das melhores familias da terra do Rio de Janeiro, século XVIT de seu antecessor: a dita lei prejudicava o bem comum.* Seis anos depois, a corte seria mais categérica: mandava que fossem tomadas medidas contra as moedas cerceadas, Antes de decidir qualquer coisa, o governador Joao Fur- tado de Mendonga convocou uma junta de camaristas ¢ principais pessoas da cidade, que “(...) uniformemente aconselharao que toda a alterago que houvesse na moeda seria em grande prejuizo desta capitania [em razdo] de resultar [em] reduzir ao seu valor intrinseco”. Completava, ainda, a junta, (..) que como o dinheiro que hoje hd nesta Conquista sendo cerceado nao pode passar para esse reino porque nele se nao hé de accitar conforme ordem de VM. sem que tenha o peso declarado nela, nem pode passar-se para outra parte por esta mesma razio, ¢ por valerem nesta terra as patacas dois vinténs [a] mais do que é nesse reino. Com isto, era garantida a safda do agticar, ao invés da moeda. Por isto, o governadot comunicava a Salvador que nao podia cumprir as ordens da corte, pois “V.M. me encomenda tanto que nao tome nenhuma resolugao sem sera satisfagiio de seus vassalos, os quais me pedem agradeca”.* Estas atitudes dos governadores reafirmam que a economia do Rio depencia da politica. Afinal, um governador, para levar a bom termo sua admi- nistragao, por motivos ébvios, tinha de ter o apoio de um dos bandos da épo- ca. Neste cenério, os Teles/Correia agiam, o que davaa cidade capacidade de negociagao com Lisboa No final do século XVII, a hegemonia dos Teles Barreto seria debilita- da. Cisdes internas surgem no grupo, € outro bando, dos Amaral Gurgel, ad- quiria mais forga. A fragil paz na nobreza logo terminaria. Com isto, a capaci- dade de barganha do Rio com Lisboa € o capital mercantil das frotas se viam reduzidos. Apesar destas dificuldades, algumas das melhores familias da terra manteriam seu status e, mais, utilizando cultura politica sciscentista, continua- riam no citculo do poder no século seguinte. Entretanto, isto é outra hist6ria.® + AHU, GA, 1427, 1681 © AHU, CA, doc. 1612. * Em 1687, Pedro de Souza Correia, dos Teles/Barreto, era assassinado, scndo os suspeitos 08 Gurgel (AFIU, CA, docs. 1621-22). Em sua defesa, os Gurgel afirmaram que Souza Corre! fora morto por aliddos da vitima, o que sugere disputas entre os Teles/Correia (AHU, CA, does. 1670-78). Quanto is dificuldades da economia da cidade no perfodo, ver o impacto da reforma monetiria imposta por Lisboa a partir de 1688 (AHU, CA, doc, 1769 ¢ anexos); e as dificuldades com o trffico de escravos angolanos em 1695 (AHL, AV., cx. 6, doc. 35). = Cf, Joo Fragoso, “Afogando em nomes”, Jopoi - Revista de Histbria alo Programa de Pas- Gradiagaa em Histéria Social da UFRJ, Rio de Janeiro, UFRJ / 7 letras, n®5, pp. 51-60. 35

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