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Analice Eaatra Pillar (Org.) giram, tais como, interpretar, descrever, ver, olhar, observar. No entanto, nenhum deles contempla de modo adequado este ato. Este livro procura tecer uma abordagem ampla sobre os signifi- cados de leitura e as diversas possibilidades de leitura de imagens com base em teorias da arte e do ensino da arte, Ele comegou a ser organizado a partir das discusses, das palestras e das monografias dos alunos apresentadas nos Semninarios Avangados A Constru- cdo de Conhecimento em Arte, A Educagao do Olhar e A Esco- Ja Eletrénica, que ocorreram no Programa de Pés-Graduacao em Educagao da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, nos anos de 95 a 98, onde o foco incidiu sobre a leitura de imagens em. diferentes contextos. Os varios capitulos tém como fio condutor possibilitar uma reflexdo acerca dos conceitos de leitura, em espe- cial, a leitura de imagens; dos modos de constituicdo do olhar nas I interagoes do sujeito com o mundo; da educagao do olhar no ensi- no da arte em ciferentes linguagens visuais, Finalizando, gostaria de agradecer a todas as pessoas que se envolveram na elaboracao deste livro. E importante menctonar a grande contribuigo das professoras doutoras Ana. Claudia de Oli- Leitura ée releitura veita (PUC/SP) e Diana Domingues (UCS/RS).que, sensiveis a0 ensino de arte, trouxeram grandes contribuigdes teéricas acerca da arte contemporanea para se pensar a arte na escola. Um agradeci- mento especial a Ana Mae Barbosa (USP, ), com quem estamos: is i or acrersomix. rr eee cs Analice Dutra Pillar ‘Queria registrar, também, meus agradecimentos ao Programa de Pés-Graduagao em Educagao, em especial ao professor Nilton Fischer e a professora Margarete Axt, que viabilizaram e incentiva- ram a realizacao deste trabalho. Aos alunos dos Seminarios Avan- cados, pelas discussées e pela idéia de criarmos este livro. E aos colegas do Grupo de Pesquisa em Educagao e Arte (GEARTE), vinculado ao PPGEDU/UFRGS, pelas discussées e pelo auxilio de diferente formas. A educagdo do olhar no ensino das artes A partir dos anos 80, no Brasil, o ensino de arte comega a ser repensado em novas bases conceituais e revisado quanto a sua relacao com as pesquisas contemporaneas em arte. Os professo- res passaram a trabalhar nao sé a produgao da crianca e do adoles- cente, mas também a leitura da imagem e a contextualizag&o hist6- rica. Surgitam, também, as releituras, enquanto produgbes realiza- das com base em obras de arte. No ensino de arte, leitura e releitura tm sido uma prética amplamente difundida, sem que muitas vezes se compreenda o ‘que esta implicado nessas dimensées do conhecimento da arte. Assi, problematizar a leitura e a releitura no ensino de arte pode- 14 auxiliar a entender suas similaridades e diferengas no context da sala de aula. Leitura 10s anos, venho estudando e pesquisando acerca da itura da imagem, em geral, e da leitura da obra de arte, em parti- cular. E é um mundo. Poderiemos comegar considerando o que se entende por leitura? O que @ ler? O que est implicado no ato de Jer uma imagem, em especial uma obra de arte? H& muitos estuddos acerca da leitura e muitas definigdes, Marla Helena Martins (1994:31-32) diz que as intimeras concepeses vigentes sobre leitura podem ser sintetizadas em duas caracteri- za6es: (a) leitura como decodificagdio mecénica; (b)leitura como um processo de compreensdo. Essas duas caracterizages sao complementares, pois ao lermos precisamos necessariamente de ambas, Para compreender precisamos decoulificar e se apenas decodificamos sem compreender, a leitura nao acontece. As implicagées do ato de ler Em geral, todas as definigdes de ler implicam a existéncia de de um cédigo (abjeto/linguagem) e de um autor. Gadotti no texto O que é ler? (1982:16-7), diz que ‘pot meio de ebdigolingtistico, 0 autor comunica-se, em qualquer tempo ‘e espago, como leltor. Esse cédigo € normalmente representado pelo “texto”. Por isso, para saber 0 que é ler, tenho que saber, antes de iat Analice Dutra Pillar (Org.) mais nada, 0 que é um texto & 0 que é compreender urn texto. Texto ‘vem do latim, “textus", que significa “tecido, trama, encadeamento de ‘uma narragao, etc, De “texare’, tecer. Um texto é portanto algo aca- bado, uma obra tecida, um complexo harmontoso. Poderiamos dizer, ento, que a leitura de uma imagem seria a leitura de um texto, de uma trama, de algo tecido com formas, cores, texturas, volumes, ‘Maria Helena Martins (1994: 30) considera que a leitura é um processo de compreensio de expressées formais e simbélicas, nao importando por meio de que linguagem. Onde ler, contemporaneamente, @ atribuir significado seja a uma imagem, seja a um texto. Nelson Goodman, filésofo norte-americano e fundador do Pro- jeto Zero de Harvard, diz que o modo como se “lé" um rabisco depende do contexto em que ele se encontra, do marco grafico que o rodeia e do “contexto mental” do observador. (Goodman apud Gardner, 1987:76-7) Assim, um rabisco num desenho de crianga tem um significado, num mapa tem outro, num texto tem outro, O sentido vai ser dada pelo contexto grafico e pelas infor- mages que o leitor tem. ‘Ao ler, estamos entrelagando informacées do objeto, suas ca- racleristicas formais, crométicas, topoldgicas; ¢ informagées do leitor, seu conhecimento acerca do objeto, suas inferéncias, sua imaginago. Assim, a leitura depende do que esté em frente e atrés dos nossos olhos. A respeito do que observamos, Piaget (1976: 46) diz que tuma constatagio nunca @ independente dos instrumentos de registro de que dispée o suieito ¢ que estes instrumentos no sho puramente perceptives, mas consislam em esquemas pré-operatérlos ou opera trios aplicados a pereepeSo atual e podendo modificar os dados desta hum sentido, seja de preciso suplementar, seja de deformagao. Na teoria de Piaget, o que observavel depende das coorde- nagdes do sujeito. Entendendo-se por observaveis aquilo que a experiencia permite constatar por uma leitura imediata dos fa- tos. (1976:47) Dito de outra forma, as observaveis referem-se aos dados visiveis no objeto. J as coordenagdes dizem respeito as inferéncias, implicitas ou explicitas, que o sujeito considera ou 12 A educagao do olhar no ensino das artes utiliza como se a ele se impusesse, com todos os intermediérios entre esta evidéncia subjetiva e a necessidade ldgica.(p.47) As coordenagées esto relacionadas as constatagées, as reflexdes qh © sujeito faz a partir dos dados. Desse modo, 0 observével tem sempre a marca do conhey ‘mento, da imaginacao de quem observa, ou seja, depende das ¢ ordenacées do sujeito, das estruturas mentais que ele pos: momento, as quais podem modificar os dados. Assim, duas pi as podem ler uma mesma realidade e chegar a conclus6 iferentes. Isto porque, 0 que o sujeito apreende em rel objeto depende dos instrumentos de registro, das estruturas fais, das estruturas organicas especificas para o ato de co} disponiveis naquele momento. Pluralidades de leituras Cassirer (1960: 247) observa que, 0 dizemos que mos a nossa exp de vista da art tal pretenso “mesmo” ppodemos falar de uma e mesma coisa como a matéra d pntores. Pos o artista no retrata ou copia um certo objeto © que ele nos dé & a fisiono gem. Nesse sentido, o que é representado nao é 0 objeto, interpretacéo, a minado momento. Nelson Goodman (1978:25-6) afittm ‘oalho seleciona, organiza, diserimina, associa, classifica absoluto séo climplices terrivets. Assim, ha uma construo de conhecimentos visuals. © de cada um est impregnado com experiéncias anteriores, agoes, lembrancas, fantasias, interpretagdes, etc. O que sa € 0 dado real, mas aquilo que se consegue captar e interph acerca do visto, 0 que nos € significativo. Desse modo, podem 13 Analice Dutra Pillar (Org) lancar diferentes olhares e fazer uma pluralidade de Jeituras do mundo. A leitura critica do mundo Paulo Freire (1995:8) considera que aprender a ler, a escre ver, alfabetizar-se é, antes de mais nada, aprender a ler 0 mun- clo, compreender o seu contexto, néo numa manipulagdo mecd- nica de palavras mes numa relagdo dinémica que vincula lin- gquagem e realidade. ° 1a desta néo possa prescindir da continuidade da leitura daquele. luagem ¢ realidade se prendem dinamicamonie. A compracns3o do texto a ser aleancada por sua leitura critica implica a percepcao das relagbes entre texto e contexto. (p.11-2) Parafraseando Paulo Freire, Luis Camargo diz que a leitura da imagem precede a leitura da palavra. Nesse sentido, o primeira mundo que buscamos compreender é o da familia, a casa onde Moramos, 0 quintal onde brincamos, a pracinha, o bairro onde vivemos, a cidade, 0 estado, o pats. Tudo isto marcado fortemente por nosso lugar social, nossa origem social. E, ao buscar compre- ender, estamos fazendo leituras desse mundo. Leitura cri prazerosa, envolvenie, significativa, desafiadora. Leitura, que inserida num contexto social e econdmico, é de natureza educativa ¢ politica, pois nossa maneira de ver o mundo é modelada por questdes de poder, por questdes ideokigicas. Ler é aprender as significacées de um objeto. Conforme Freire (1982: 4-5), ler 6 adentrar nos textos, compreendendo-os na sua relagso dialétien ‘com 0s seus contextos e © nosso contexto. O contexto do escritor € 0 contexte do leitor. Ao ler eu preciso estar informando-me do contexto social, politico, ideolégico, histérico do autor, Eu tenho de situar 0 autor num determinado tempo (..) Quando eu teio um autor eu prec- so ir me inteirando do contexto dele, em que aquele texto se const- Mas agora eu preciso também de um outro esforgo: de come relacionar o texto com o meu contexto, O meu contexto histéri 59 nfo € o do autor. O que preciso é ter clara esta relacio entre © contexto do autor e o contexte do leitor, 14 A educagao do olhar no ensino das artes A leitura da obra de arte Venho abordando até aqui a leitura da imagem, mas a leitura da obra de arte é de natureza diferente. Segundo Aumont (1995:259), a obra tem uma inventividade nitidamente superior 4 de qualquer outra imagem. Ler uma obra seria, entao, perceber, compreender, interpretar atrama de cores, texturas, volumes, formas, linhas que constituem uma imagem, Perceber objetivamente os elementos presentes na imagem, sua temética, sua estrutura. No entanto, tal imagem foi produzida por um sujeito nurn determinado contexto, numa deter. minada época, segundo sua visdo de mundo. E esta leitura, esta percepséo, esta compreensdo, esta atribuicao de significados vai ser feita por um sujeito que tem uma histéria de vida, em que objetividade e subjetividade organizam sua forma de apreensio e de apropriagao do mundo. Considerando que ler é atritui icado, como se atribui significado a uma obra de arte? Como se da sentido? Como se compreende? Conforme Martins (1994: 17), ‘quando comegamos a organizar os conhecimentos adquirdos, a partir das situagSes que a realidade imp3e e da nossa atuacéo nela; quando ccomecamas a estabelecer relacdes entre as experiencias e a tenlar resolver problemas que se nos aprasentam - ai ento estamos proce- dendo lelturas. Desse modo, uma leitura se torna significativa quando estabe- lecemos relagées entre o objeto de leitura e nossas experiéncias cle itor. Nos anos 70, surge uma série de pesquisas acerca da leitura de imagens, desde trabalhos com criangas pequenas até com profissi- onais e estudiosos da area de artes. Ha os estudos de Feldman (1970), Housen (1983) e Parsons (1992) sobre a compreensao ea leitura de obras de arte. Gardner (1987) tem um estudo interessan- te sobre Conceitos e erros das criangas a respeito das artes, onde aborda algumas concepeses de arte explicitadas por criangas eadolescentes. No Brasil, a partir dos anos 80, comecam a apare- cer dissertagdes e teses sobre a problematica da leitura de ima- gens, seja da propria produgao da crianga seja de obras de art. 15 Analice Dutra Pillar (Org) Ha uma diversidade de modos de produgdo de sentido, de modos de se entrar na obra como as abordagens bioaréfica, esté a, formal, iconolégica e semidtica. Cada uma dessas leituras bus- a, por caminhos diferentes, exificar sigrificados. Pode-se, ainda, privle- giar numa leitura mais os aspectos sensoriais, emocionais ou racionais. © que se pode observar nas leituras, feitas por professores com alunos do Ensino Fundamental e Médio, é que, numa prime ta instancia de apropriagao dessas diferentes leituras, ha um certo encantamento por autores ou artistas que abordam uma determi- nada concep¢ao de leitura. Isto, em muitos momentos, faz com que a leitura aprisione a obra, crie significados fechados, torne-se uma atividade técnica e nao prazerosa. E importante lembrar que a marca maior das obras de artes plasticas @ querer dizer 0 indizivel, ou seja, néo é um discurso verbal, é um didlogo entre formas, cores, espacos, Desse modo, quando fazemos uma leitura, estamos explicitando verbalmente relagdes de outra natureza, da natureza do sensivel Todo educador que mexe com arte precisa, entéo, encontrar uma maneira de trabalhar com os principios bésicos dessa linguia- gem, sem perder a complexidade da arte. A esse respeito, Fayga Ostrower (199 1:22} diz que é preciso ser claro e simplest...), sem simplificar demais, Dar uma idéia da arte em sua complexidade eda multiplicidade de niveis de significado sempre renoudveis Ao tratar 0 problema da complexidade da arte, Ostrower (p.22- 23) diz que na pseudo-simplicidade, nessa redugao simplista dos problemas (da arte) a. um denominador comum mais baixo, falsifica-se tudo 0 que pode ser natural curiosklade. O saber se redu a formulas ocas, ind tels. Endo s6 faz-se de conta que ji se chegou a todo conhecimento de todas as respostas, como também se desestimula © processo de aprendizagem através de indagacdes ¢ hipéteses. Elimina-se o ser in teligente e sensivel das pessoas, Elimina-se a curiosidade, a poesia, a pesquisa. nosso olhar no € ingénuo, ele esté comprometide com nosso passado, com nossas experiéncias, com nossa época ¢ lu- gat, com noss0s referenciais, Nao hé 0 dado absoluto ¢ nao se pode ter uma Unica visio, uma sé leitura, mas se deseja lancar los olhares sobre umn mesmo objeto. Poder transitar por abor- 16 A educagdo do olhar na ensino das artes dagens diversas ou inter-relacionar possibilidades de leitura é algo complexo que exige algum tempo, muito estudo, muita sensibilid dee a coragem de criar hipéteses e de testé-las Para Cassirer (1960:287), a profundidade da experténe| humanai...) depende do fato de sermos capazes de variar no 30s modos de ver, de podermos alterar as nossas visdes da lidade. “Isso porque” o olhar artistico néo é um othar pas que recebe e registra a impressdo das coisas. E um olhar eo) trutivo, Desse modo, compreender uma imagem implica olhat ¢ trutivamente a articulacao de seus elementos, suas tonalidades, linhas e volumes. Enfim, aprecié-la Ler uma imagem é saboreé-la em seus diversos signifieat criando distintas interpretagies, Rubem Alves (1922: 155-6) dl has suas origens sabor e saber séo a mesma © verbo I “sapare” significa, a um tempo, tanto saber quanto ter sabop ‘experimentar © gosto das coisas: comé:las.O stibio & aquelé QU mhece nao 36 com os olhos, mas especialmente com a conhece s6 com os olhos conhece de longe, pois a visio ely cia; muito de perto 2 gente no ve nada, Quem conhece Cah conhece de perto, pois s6 se pode sentir © gosto daquile gulf dentro do compo. Ao considerar 0 prazer da leitura, Alves (p.157) comentil * pode desejar. Pois © paz tempo. Quem esté no prazer nao deseja que ele chegue a0, Barbosa (1992: 123) afirma que a leitura é, pa natureza, flexivel, maltipla, diversa, sem.uma hierarquia pret fabelecida que defina uma leitura methor do que as outra Aprender a ler é aprender a explorar um texto (uma imagem), Jenta ou rapidamente, dependendo da intengao do leitor. E bus car compreendé-la : Las Analice Dutra Pillar (Org.) Releitura No ensino da arte, a leitura tem sido concebida como also " imais te6rico e a releitura, um fazer a partir de uma obra, Reler é ler Tiovamente, é reinterpretar, é criar novos significados, Quando in- lorpretamos, através da pintura, um objeto do meio ambiente na- | ou construido, um objeto do nosso cotidiano, feito pelo ho- lam, estamos fazendo releitura? E quando interpretamos, em pin~ | uma obra de arte, uma imagem produzida por um artista & Jura? Depende dos nossos proposites. Se a idéia é recriar 0 objeto, nstrutlo num outro contexto com novo sentido, penso que sim. ‘A questio da releitura é bastante complexa. Procuraret, entéo, 1 aigumas relacdes entre releitura e copia; releitura, citagao & ntoxtualidade. Releitura e copia fim nome da Proposta Triangular, muitos professores esiéo balhando releitura como cOpia. Colocam uma obra de arte para alunos copiarem. O que se quer com isto? Apreender as for- a modo como o artista organizou a composi¢4o? Qual o 16 objetivo com esta atividade? Criticam-se as folhas {eograladas para colorir ¢ da-se a obra de arte para copiar. Hé uma grande distancia entre releitura e copia. A cépia diz fspelto ao aprimoramento técnico, sem transformagao, sem ferpretaco, sem criagao. Ja na releitura ha transformacao, inter o com base num referencial, num texto visual que pode estar explicito ow implicito na obra final. Aqui.o que se busca @ a criacdo e nao a reprodugao de uma imagem. Muitas ctiticas s4o feitas a Proposta Triangular por considera- rem que o fazer nessa proposta é releitura, entendendo releitura 1o cépia. Até onde conheco os pressupostos da Proposta, pos- so afirmar que ela é uma concepeéo contemporanea do ensino de arle que pode abarear ou nao a releitura como criac&o. Releitura, citacao ¢ intertextualidade Varios artistas, tanto de outras épocas como contemporane- 6, inchiem citagSes em seus trabalhos. As maneiras de citar é que 18 A educagéo do olhar no ensino das artes podem ser interessantes. As citagGes so jogos intertextuais que o artista faz para se amparar, para gozar, para legitimar-se. Os cien- tistas cjtam muito para legitimar-se. O artista quando cita, o faz para criar, Nossa relagdo com as imagens se organiza de diferentes ma- neiras. Um dos modos de se relacionar com a tualidade, Pefuela’, quando fala de intertextualidade, fala de uma relagao com a imagem, de uma relagdo de amor com a imagem. ‘Apesar de contemporanea, a intertextualidade nas linguagens arlisticas nao 6 novidade. No Renascimento ¢ no inicio do século XX, podemse observar obras que remetem a outras obras. Estamos constantemente estabelecendo relacdes, relacionan- do textos, relacionando nossos conhecimentos, nossas informe- 6es. Pefiuela fala de alguns mecanismos que despertam a relagao intertextos. Ao tratar a intertextualidade, Peftuela se vale da teoria sobre 0s espelhos. O espelho plano, o convexo, © concave produzem imagens que crlam uma relag&o intertextual com seu referente. O espelho é um texto que me cita a mim mesmo como se eu fosse outro texto.Essa relago intertextual cria uma aparéncia. A ima- gem plana é mais semelhante a mim. O espelho cOncavo cria uma imagem bem maior que a minha imagern natural. O espelha con- vexo cria uma imagem bem menor do que meu rosto é. Cada um dos espelhos deturpa de certa maneira a imagem que eu sou. A relaco intertextual € um modo de criar, é um jogo de espe- hos. Ha duas modatidades de intertextualidade: (1) explicita: que cita a obra referente; (2) implicita: que esconde a obra referente. Para ilustrar a interlextualidade explicita poderfamos mencio- nar a obra Las meninas de Velazquez, onde ha, no fundo do qua- dro, a representacao de um espelho, © qual se confunde com os outros quadros, A obra tem tamanho aproximado do natural e, ao nos colocarmos em sua frente, dé a sensacao de estarmos senda pintados. © espelho no fundo nao ¢ real, cita alguma pessoa que esteve é no lugar que cu estou. O espelho cita uma posigao e ndo uma imagem, Picasso fez muitas relelturas dessa obra, mas sempre se apropriands da imagem e recriando em seu universo proprio. Palestra proferida no Seminério Arte na Esccla, realizado em Porto Alegre (RS) em 1990, 19 __Anattice Dutra Pillar (Org) ‘Quanto a intertextualidade implicita, esta evidencia-se na obra Noite Estrelada de Van Gogh, a qual tem uma relacdo formal com a Grande Onda de Hokusai, pois se pode ver o mesmo movimen- to da onda no céu de Van Gogh. ‘A intertextualidade rompe, dilata as fronteiras entre os textos. ‘A intertextualidade em linquagens nao-verbais mostra uma leitura das imagens de outros artistas sem dizer uma palavra. Picasso nao escreveu sobre Velazquez, mas a relagao que ele fez de Velazquez & especifica, ndo-verbal Na releitura, um artista parte da obra de outro artista para criar © seu trabalho. Textos que se inter-relecionam langam uma nova juz sobre a questao da releitura Coneluindo, poderiamos dizer que, ao lermos uma obra de arte, estamos nos valendo de nossos conhecimentos, artisticos ou nao, para dar significados a obra. A leitura s6 se processa no dié- Jogo do leitor com a obra, o qual se da num tempo e num espa¢o preciso, Nesse sentido, nao hé uma leitura, mas leituras, onde cada Lum precisa encontrar modos miiltiplos de melhor saborear a ima- gem, J4 na releitura, entendida como tum diélogo entre textos visu- als, intertextos, podemos nos valer ou nao de dados objetivos que a obra referente contém para criarmos. Considero, portanto, que leitura e releitura sao criagdes, produgdes de sentido onde busca- ‘mos explicitar relagdes de um texto com 0 nosso contexto. Referéncias Bibliograficas ALVES, Rubem. O retomno e terno. Campinas: Papirus, 1992, AUMONT, Jacques. A Imagem. Campinas: Papirus, 1995. BARBOSA, José Juvéncio. Alfabetizagdo e leltura, Sto Paulo: Cortez, 1990. CANIZAL, Fénerdo Peftuela, A metéfora da intertextualidade. In: BARBOSA, ‘Ana Mae; FERRARA, Lucrécia f& VERNASCHI, Elvira. O ensino dos artes ‘nas universidades. Sao Paulo: EDUSP, 1993. CASSIRER, Ernst. Ensoio sabre o homem. 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