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Fundagio para o Desenvolvimento da Educagao Diretotia de Projetos Especiais educacgao com arte | idéias 31 Organizadores Devanil Tozzi | coordenagio geral Marta Marques Costa ‘Thiago Honério Sao Paulo, 2004 Os temas transversais no ensino de artes visuais Neide Nogueira! Educasio cot Marques Cost Direso 4. Ante L Tozzi, Devanil. [1 Costa, Macca Thiago. IV: Fundagio para o Desenvo V. Séxie IIL Honério, is Fi cou Introdugao Este artigo foi escrito a partir de reflexdes feitas durante a realizagio do curso “Arte Temas Transversais”, do Centro Universitirio Matiantonia—Ceuma— da Univer- sidade de Sto Paulo, em 2003, do qual participaram professores de Arte da rede estadual de ensino que trabalham com alunos dos Ensinos Fundamental ¢ Médio. Sendo assim, o presente texto tem as vantagens e desvantagens de sua circuns- tincia — é uma reflexio datada, que procura ser util antes de ser exaustiva Trata de determinadas questdes ¢ deixa outras na sombra, esta limitado 20 tratamento dos temas transversais de maneira geral sem aprofundar cada um deles. Parte da expectativa de que os professores fagam uma leitura dos textos dos temas transversais que compdem 0s Parimetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental. A intencionalidade, tanto do curso quanto deste artigo, é de afirmar e demonstrar a possibilidade de incluir 0 trabalho com os temas transversais na area de arte ¢ seduzir 0s professores para fazé-lo. © foco principal sio o para que ¢ 0 como inserit os temas transversais no trabalho com Artes Visuais, a partir de principios didaticos de inspiracio construtivista, e «que nio sio exclusivos do ensino dos temas transverszis. 1. eid Noguica€soislogae este em Educagia Atou na (oordenagio dos Pardmetos Curricular Nacional na latorario ds Referencias paras Fomagio de Profesor do MEC Aualment coor o Programa e Formac de Professors Albbetzadores da Coodenaorla de Estudos Normas Pedals Cen =a Serwaria da luca do Esta de io Paulo nua como poesora no Cento Unive Maranon — (euma— da USP 2. Pardmetros Curiculares ‘Nachnais (para Ersino Fundamental): presenta dos temas transesas Bras MEDASEF, 596. ptimeico item — Explicagées e pontos de partida — explicta o que sio temas transversais, a finalidade de sua inclusio na educacio escolar e a natureza da relagio deles com o ensino da Acte. segundo — A pritica da transversalidade na area de arte ~ procura expor a necessidade de um trabalho planejado, trata de questdes da condugio do trabalho com os alunos, bem como exemplifica como fazé-lo, 1. ExplicagGes e pontos de partida «a cidadania deve sercampreendida como produto de bistiiasvividas pelos grupos soca, send, nesie process, consttuida por diferente tipas de dieitas ¢ insttuigées. O debate sobre a questo da cidadania ¢ hoje diretamente relacionado com a discuss sobre osigni- ‘cada #0 conteido da demcracia, sobre as perspectinas ¢possibilidades de costragao de uma sociedade demoeritica? Ww © que sio os Temas Transversais Conforme exposto no texto “Apresentacio dos Temas Transversais” dos Pardmeiros Currieulares Nacionais, os Temas Teansversais so questbes que a sociedade brasileira esti vivendo e para as quais esta buscando caminhos, solugdes e/ou mudangas; probleméticas que atualmente constituem o centro das preocupacdes da populagio ¢ dos responsiveis pelos governos, tematizadas na proposta curricular: Etica, Pluralidade Cultural, Meio Ambiente, Trabalho € Consumo, Saiide, Orientagio Sexual. Esses temas formam um conjunto articulado, remeten- do-se uns aos outros, no qual a Etica tem um papel especial, uma vez que todos eles implicam ‘© ensino de valores ¢ atitudes coerentes entre si e em torno de principios que definem a vida democritica brasileira: Dignidade da pessoa humana; Igualdade de direitos; Participacio ¢ Co-responsabilidade pela vida social ‘A inclusio dos temas transversais no curriculo torna explicita a finalidade da educagio escolar de formar para o exercicio da cidadania numa sociedade democritica, ‘A democracia pressupSe igualdade de direitos — civis, politicos, sociais — e de acesso aos bens materiais e culturais produzidos pela sociedade; isso inclui o direito de participar do espago pibli- co, que é a instincia politica da sociedade, seja através de dispositivos de representacio, como acontece quando elegemos representantes para os cargos da estrutura do Estado (presidente, de- putados, senadores, vereadores, governadores, prefeitos), seja diretamente, através das organiza- Ges da sociedade civil (movimentos sociais, ONGs, associagSes, etc). Entretanto, para que haja democracia nao basta a existéncia de leis e instituigdes livres. E preciso também, entre outras coisas, que os cidadios sejam democriticos. Assim, ensinar as novas gera- gBesa viver democraticamente & condigio para a existéncia de uma sociedade democritica. Portan- to, quando os professores ensinam os alunos a serem democriticos, estio construindo uma socie- dade democtitica. Em outras palavras, ralizam a tarefa da escola, seu papel como instituigio social, de ensinar os alunos a atuarem como cidadios. No contexto brasileiro, profundamente marcado pela desigualdade social, pela violéncia, es- pecialmente nos grandes centros urbanos, por um fraco sentido de responsabilidade social e por uma ideologia individualista que leva muitas vezes a atitudes de corrupgio, por vezes nos parece impossivel realizar essas idéias. Com tudo isso, nossa sociedade tem dado poucas pro- vas de que é possivel ¢, principalmente, de que vale a pena ser democritico. E 0s professores muitas vezes se sentem impotentes. 128 Nio se trata realmente de uma tarefa simples em nenhum lugar do mundo. Mas por isso mesmo é ‘do importante ‘A questio & Como se ensina alguém a ser democritico? A ser responsivel pela vida social? O que é preciso ensinar para formar cidaddos participantes de uma sociedade democtitica? Como se implementa o desejo de ser um deles? A verdade é que se sabe pouco sobre isso, Principalmente se considerarmos o quanto a sociedade atual & complexa, 0 fato de que coexistem sistemas de valor diferentes e conflitantes, que o mundo de hoje tem na rapidez das mudangas uma de suas caracteristicas € que as referéncias que nés, adultos, temos nao foram construfdas em situagdes semelhantes & que vivemos. Sem diivida, as dificuldades, os obsticulos, as contradigées so muitas. Mas, se focarmos a atengio no que a escola faz, isto é, naquilo que é da sua pritica, ¢ nos 4. Delia Lemer Ler eeerever a excl eal, 0 poste eo ees, Bort Alegre: perguntarmos sobre o que a escola pode fazer por ser escola, qual o trabalho que _ mel, 200. compete 20s professores exatamente porque so professores € estio onde esto, fazendo 0 que fazem, com certeza encontraremos iniimeras respostas. Nio se trata de pedir aos professores que fagam algo que nio € do seu trabalho ou que esté além das possibilidades reais. Parafraseando Delia Lerner, a idéia é trabalhar com “o real, o possivel, ¢ 0 necessério™. ‘Transversalidade: uma op¢io didatica para atender As necessidades da aprendizagem Para encontrarmos respostas is perguntas sobre o que e como ensinar, é necessirio nos perguntar- mos também sobre as necessidades de quem aprende, o que ¢ como. A proposta de transversalidade, isto é, de inclu o tratamento dos temas transversais nas deeas de ensino, atende as necessidades da aprendizagem por parte dos alunos, das quais destacamos: concretude ¢ significado; continuidade e sistematicidade; atengZo & complexidade. Conoretude ¢ significado Estamos nos referindo a criangas ¢ adolescentes para os quais a compreensio de conccitos como ‘idadania, democracia, espaco pablico é um desafio a ser enfrentado. Da mesma forma, os valores 129 € as atitudes, tais como responsabilidade, respeito, justiga, didlogo, etc, nfo sio dons natursis — necessitam ser aprendidos. ara que os alunos os aprendam precisam ser apresentados em situagdes reais que tenham sentido «significado, dai a necessidade de serem tratados no interior das questdes sociais que vivenciam, ‘As eas de estado, como a Arte, tradicionalmente trazem contetidos necessirios a essa formacio, mas nem sempre articulados A realidade social e/ou vida dos alunos, 0 que impede que eles atribuam sentido & sua aprendizagem. Quando isso ocorte, os alunos estabelecem uma relagio de cexterioridade com o conhecimento e sua aprendizagem é apenas superficial. Ao contritio, quando oaprendizado de conhecimentos universais se articula 4 realidade que vivem, podem aprender ater responsabilidade sobre 0 que acontece quando consomem, a perceber ¢ se posicionar a respeito das discriminagSes e preconceitos, a cuidar da saiide pessoal e coletiva, etc. Com isso vio podendo compreender que fazem parte de uma coletividade que depende de cada um e de todos para existir, que 0 que todos fazem tem conseqiiéncias na vida comum, etc. Continuidade ¢ sistematicidade Essa aprendizagem nio se faz pontualmente. tempo e trabalho pedagégico sistematico para ‘que siga num processo de ampliagio aprofundamento ¢, com isso, promova o desenvolvimento das capacidades envolvidas, como 2 de analisar a realidade, estabelecer relagdes de causa ¢ efeito, por principios, compreender motivos ¢ conseqiiéncias, sensibilizar-se, tar conclusSes com autonomia, respeitar opinides diferentes das suas, etc. A cada ano da escolatidade, os objetivos tragados como metas da educagio escolar vio se tornando realidade desde que o trabalho pedagé- sgico acompanhe e cresca com 0 desenvolvimento dos alunos. Atengio & complexidade Exatamente por serem questdes concretas, reais, as temiticas sociais sio extremamente complexas, € sua compreensio demanda conhecimentos de diferentes disciplinas. Por outro lado, cada uma delas, subsididtia de um campo de conhecimento, necessariamente veicula determinadas concep- ‘Ges e valores a respeito das mesmas questdes. Por exemplo, 0 conhecimento do corpo humano ¢ de aspectos referentes ao sexo é um tema tradicional da Biologia, mas, com maior ou menor grau de explicitagao e intencionalidade, também da Educagio Fisice, da Histéria, da Geografia ¢ da 130 Arte. Cada uma dessas dreas aborda a questio sob uma perspectiva e, juntas, oferecem aos alunos 1 possibilidade de construir uma concepgio ampla ¢ um conjunto de valores pelos quais orientem suas pritcas e atitudes pessoais. O ensino de arte € temas transversais Em primciro lugar: embora na arte possa existr a objetvidade, nao ba nentralidade, pois «a linguagem & em si sempre expressisa. Em segundo lugar: vale fisar que na arte 6 se formulam imagens de espagos vvidos, munca alga espego absoluto ou qualguer tipo de conceituagao abstrata, Nisa, a arte difere da matemticae até mesmo da fulosfi.A arte representa sempre a expressio dirta de valores que se orginam no priprio viver. Dei, @ partir de tantasvivéncias diferentes, existem tantosesilos diferentes: gbtce,renasentsta arvoca,roménticy realise, impresinista, expresonit, et O fato de a arte nio ser neutra, de expressar valores, faz com que sua interpretagio seja uma possibilidade de refletir sobre eles de modo explicito. O que nio significa transformar as obras ¢/ou sua leitura em motivo de proselitismo, nem de se atribuir a elas a chancela de bem ou mal, corretas ou incorretas. Quando se propde uma reflexio é justamente para levantar diferentes leituras, diferentes interpretades, diferentes possibilidades e, assim, criar oportu- nidade de que os alunos convivam com a diversidade. A leitura de uma obra é sempre uma ‘obra em aberto. A leitura coletiva de uma imagem é um exercicio de diflogo, de respeito a idéias diferentes, necesstios 20 desenvolvimento da capacidade ética e 4 construgio de rela- ges de autonomia moral. Um exemplo, Leituras de imagens de propaganda' em contraposigio de obras de Aste Pop, tais como as de Andy Warhol, criam uma situagio didética favorivel para trabalhar com os alunos alguns contetidos do tema Trabalho e Consumo, tais como (os que se referem & “constatacio e anilise da influéncia da publicidade na vida cotidiana”. Ao orientar a leitura, 0 professor pode intencionalmente problematizat as interpretagdes para que os alunos reflitam sobre essas questdes ao mesmo temn- po em que vio se apropriando das informagées relativas forma e a0s recursos de imagem utlizados pelos autores. 4 Sobre so, a neste nimero (eas, a igi 207.0 artigo "Vises efits ‘iterpretando images da vida ‘ontempordnea nasa deals", euciana Moura, BL A imaginaza nia 6 como rugere a eimoogia,afaculdade de formar imagens da realidad; lab afaculdade de formar imagens que ulrapassam a realidad, ue cantam a reaidade. EE uma faculdade de sobre-bumanidade. (..) A imagem percebida e a imagem criadaséo duasinstancias poiguicas muito diversas ¢ seria necessiria uma palaora especial para designar «imagem imaginada. Tudo o gue dito ‘nor manuais sobre a imaginagio repradutora deve ser ereditada& percapgio ed meméria. A 5.6. Bache “Leauetles Peer eeieacsiba limaginago criadora tem fungies completamente diferentes da imaginayéo repradutora. A Pessanha, Bachela Mont la pertence essa fungio do irreal que & priquicamente tio stil quanto a fungao do real coerce ilentementeevocada pelos psicélegos para caracterar a adaptagio a realidadeetiguel pee aeeai eae _fregitentementeevocada pelos psicilogos para caracterizar a adaptagiod realidadeetiquetada i. das tas, 1988. por valores sociais$ Produzir arte é criar algo que nfo existia antes. A imaginagio criadosa permite pensar/criar novas formas de ser no mundo; desenvolver a capacidade de propor alternativas, de propor o que poderia ser. Esse pensar 2 realidade sem se submeter a ela pode alimentar a capacidade dos alunos para laborar projetos de vida e de sociedade pautados em valores e principios de justiga, de solidarieda- de, de reptidio violéncia e & disctiminagio. Por outro lado, a0 fazer seus trabalhos os alunos tém a possibilidade de elaborar suas questdes pessoais em relacio a essas temiticas: sexualidade, agressividade; sua visio pessoal da realidade e de si proptios, daquilo que legitimam e querem para si. Assim é a que a arte afeta e desenvolve a sensibilidade; ctia a possibilidade de intervir na realidade com uma contribuigio pessoal e singular. Fica assim evidente que incluir os temas transversais nio significa deixar de trabalhar os contetidos ce cepacidades prdprios da area de arte nem transformé-la num instrumento de ilustragZo, ou ape- nas de divulgagio de idéias outras. Principalmente nio significa tirar dos alunos a possibilidade de usuftuir a arte — pelo contritio, pois, além de nio serem incompativeis, potencilizam-se mutuamente. A pratica da transversalidade na Area de arte O momento do planejamento: intencionalidade e sistematicidade Tudo isso 36 aconteceri de modo consistente e capaz de realmente ter significado na vida dos alunos se for um trabalho constante, sistemético, continuo e progressivo. E, para tanto, precisa necessariamente ser planejado. 132 © planejamento permite articular os diferentes niveis do cucriculo a0 planejamento das aulas, fazendo com que estas sejam a realizacio paulatina e continua dos objetivos da educacio escolar: 0 planejamento anual da escola é orientado pelo curriculo escolar e o planejamento bimestral ou ‘mensal de cada professor é, por sua vez, uma busca de concretizagio do planejamento anual da ‘escola, ¢ assim por diante, até o nivel do planejamento de projetos ¢ seqiéncias diditicas voltadas para o ensino de contesidos especificos. Nao é possivel gerenciar 0 processo de aprendizagem ¢ desenvolvimento dos alunos sem usar 0 planejamento como instrumento organizador ¢ orientador da pritica docente. Sem ele as agoes pedagégicas ficam ao sabor dos acontecimentos € nfo garantem que o trabalho educativo, a apren- dizagem do que gostariamos de ensinar, realmente acontega. Em outras palavras, o planejamento possibilta realizar a intencionalidade, a sistematicidade e a processualidade do trabalho pedagégico. E esses slo requisitos bésicos para o trabalho com os temas transversais. Explico. A formagio que os temas transversais propdem necessita, para se efetivar, que a aprendizagem — ¢ portanto 0 ensino — acontega continuamente e durante toda a escolatidade, de modo explici- 10, isto é os alunos precisam saber o que se quer ensinar-Ihes € 0 que se espera que aprendam; e sistemitico, no sentido de que se realize em atividades organizadas, __potimentse ates seqilenciadas (quanto ao grau de dificuldade e de elaboracio que apresentam como 6 Nas atidads, os cones, ‘xontzoe siuitaneamente. 0 profes press diferencias desafio aos alunos, quanto 4 complexidade das aprendizagens esperadas),avaliadas _—parustberoquee quandofecx, ° demodo apromorer arena. replancjadas, fem dos alunos. Sabre o aprender ‘ensnares diets tps de Por outro lado, a concepsio de cidadania que orienta a proposta de trabalho com citi, ea Anton bala, “Os os temas tranaversais exige que a formagio dos alunos Ihes dé condigées de com= “ots Cl Car tall, Oconsrutivomo na sala preender as questdes sociais, mas também de atuar no mbito social. Paraisso.a eau, a, 19. compreensio é absolutamente necesséria, mas insuficiente. E preciso também que- reratuare saber como fazé-lo. Hi, portante, aprendizagens que vio além de informacdes e concei- tos. E preciso contemplar contetidos de diferente natureza: além dos conceitos, as informagdes, os procedimentos, os valores ¢ as atitudest Como incluir os temas no planejamento da area de arte ‘Ao fazer o planejamento do seu trabalho, o professor decide e se prepara para como e quando ensinar ‘0 que considera importante ensinar. Os pontos de partida a considerar para essas decisdes sic: 133, Os objetivos gerais — intengdes educativas do Projeto Educativo ¢ Curricular da escola, Os alunos — 0 que jé sabem, 0 que é significativo no seu contexto de vida, o que o professor ¢ a escola consideram essencial que aprendam, o que desejam aprender. Os objetivos e conteiidos de Arte ~ naquilo em que se articulam com os objetivos e contetidos dos temas transversais, de modo que nio haja o abandono de uma coisa pela outra, nem relagdes mecanicamente estabelecidas. Desse modo, as atividades sio planejadas para colocer em pritica as atitudes que se deseja incenti- -var,tais como o diflogo entre diferentes pontos de vista, a solidatiedade com as dificuldades e/ou necessidades de outros, o respeito a diferentes formas de expressio, etc. E possivel eleger obras para 0 trabalho com os alunos que tratem das temiticas com diferentes visdes, seja através de seu contesido ou de sua forma ¢/ou técnica. A leitura de obras de arte pode ser uma pritica de reflexio sobre os temas transversais que inclui andlise de con- “LikroxPatsdeAtepan _cepgSes, valores, costumes, etc. Por exemplo, em Artes Visuais, ao tratar da repre~ SaBtsees pare..6547. — sentacio do corpo nu nas obras artsticas, crise a possibilidade de trabalhar a concepgio de corpo que inclui a dimensio da sexualidade, como propde o tema transversal Orientagio Sexual; também hi uma clara integracio entre o “conhecimento de diferen- tes técnicas e procedimentos artisticos de diferentes sujetos ¢ culturas”” ¢ 05 objetivos e conteidos do tema transversal Pluralidade Cultural. O momento da condugio do trabalho com os alunos (.) A relagio com o saber 0 sentido dos saberes esto vinculados@ identidade, @ imagem de si mesmo, @insegao nas relates sociaise ao itinerrio pessoal ox familiar (..) Acreditar (que a escola & um lgar de ura rao porque nela so constraides¢transmitido saberes sigifcaesquecer que esses sabres alimentam prticase politics. (..) Em seu livro Ensinar:agir na urgéncia e decidir na incerta, Philippe Perrenoud define bem a natureza extremamente complexa do trabalho do professor, especialmente no que se refere & docéncia, Sugere também que o momento da atuagio é orientado pelo planejamento mas tem algo a mais, nfo se resume a ele, nem € a sua aplicagio fiel & realidade. O trabalho com os alunos é um outro 134 momento, um momento para o qual o planejamento é essencial, porque orienta, prepara, subsidia mas ao é suficiente em absoluto. Esse limite nfo diminui em nada sua utlidade, apenas aponta a necessidade de considerar também a relagZo direta com os alunos quando entram em jogo as xclagdes interpessoais ¢ a relacio com o conhecimento mediadas pelas representacSes, pelas expe- siéncias prévias, saberes ¢ expectativas dos alunos e do professor, pelo seu autoconceito, ete Ensino e aprendizagem de valores e atitudes* ‘Uma das caracteristicas marcantes dos temas transversais é ter explicitamente associados a eles valores a serem ensinados ¢ atitudes a serem incentivadas. Este € um ponto importante que gera inseguranga nos professores na hora de atuar com os alunos, pois hi na sociedade, € portanto, centre os alunos e professores, distintos sistemas de valor, o que torna as questdes sempre polémicas ¢ sujeitas a diferentes interpretagSes, pontos de vista, tomadas de posicio. Sobre isso, antes de mais nada, € importante lembrar que, sendo a escola laica ¢ democritica, os valores que cabe a ela censinar sio aqueles que regem a sociedaide € que estio referendados pelas leis e cédigos do pais, como a Constituigio, a Declaragio dos Direitos Humanos, etc. A escola nfo pode exorbitar esses limites nem ir além desses valores. ‘Mas ha ainda outra questio importante: € o fato de querermos que os alunos, 20 aprender os valores ¢ a0 desenvolver as atitudes que acreditamos desejéveis, também aprendam a ser crticos, conscientes das contradigdes da realidade, ¢ nao se tornem pessoas passivas e meramente obedien- tes. Queremos que saibam analisar as situagdes reais ¢ perceber tudo o que esti em jogo para que tomem posi jo e ajam com autonomia. Legitimagio de valores é diferente de obediéncia cega a regras predefinidas. & se- gui-las por compreender seu sentido ¢ razio de ser, analisar situagdes novas e/ou 8 Sibeiso, ros FONsde Arte a, , de aedesta8 ies, complexas ¢ considerar diferentes fatores para se posicionar; é seguir principios por desejo préprio € no por imposicio e/ou medo de castigo. Ora, isso exige que a aprendizagem ni seja feita de qualquer forma. E necessétio que esteja articulada 20 processo de desenvolvimento de capacidades éricas, tis como a de analisar agic a partir de principios, refletr sobre os valores ¢ as normas, consteuir juizos de valor considerando diferentes pontos de vista, respeitar ¢ ser respeitado, usar 0 didlogo, etc. Para isso, a questio metodolégice faz toda a diferenga pois o que 0s alunos aprendem depende em muito da metodologia adotada, do modo como aprendem. 135 ‘io é possivel format para a cidadania sem uma metodologia que incorpore os principios demo- criticos nas relagées entre professores € alunos, entre alunos € nos préprios procedimentos de aprendizagem. E impossivel aprender a participar de um coletivo, com responsabilidade pela vida em co- mum, se a tinica experiéneia que se tem é a de ouvir ou ler e repetir informagSes por escrito ‘ou numa chamada oral. Ao contritio, se para aprender os diferentes contetidos das diferentes matérias tenho que atuar em equipe, trazer colaboracées para um trabalho comum, dizer 0 que penso, fazer anilises e demonstrat 0 que digo, negociar com outros que tém pontos de vista ou informagées diferentes das minhas, analisar critica e respeitosamente a produgio de outros, dividie tarefas para um objetivo comum, estarei desenvolvendo as capacidades neces- sirias para ser justo, responsivel, respeitoso, resolver questdes pelo dilogo. Ou seja, é a didatica que cria a situagio real em que os alunos vivem a aprendizagem e com isso desenvol- vem as capacidades que colocam em uso. Mas tudo o que planejamos nio acontece porque planejamos. Ea nossa intervengio que favorece a aprendizagem, o desenvolvimento ¢ a atuagio dos alunos na sala de aula. ‘Muitos professores se perguntam sobre a legitimidade de sua intervengio em situagdes como a discussio de valores e de questdes que demandam tomada de posicio, Imaginam que, se os alunos devem tornar-se auténomos, eles no deveriam intervir, pois isso tiraria a liberdade deles, o que ‘fo seria democritico, Esse engano leva muitas vezes a telagdes pouco significativas, problemas de disciplina, deixando os alunos numa situagio de abandono intelectual e afetivo. Os alunos s6 pode- fo fazer 0 longo caminho para totnarem-se pessoas éticas, solidéria, erticas e responsiveis se tiverem 0 apoio de adultos. Intervir nio significa determinar sempre o que deve set feito, resolver as questdes pelos alunos e dirigic tudo, Para ajudar 0s alunos a avancar, os professores precisam problematizar, apoiar, orien- tar, esclarecer, coordenar ages ¢ colocar limites claros. Para manter um clima democratico em sala de aula o professor precisa fazer fluir os diferen- tes pontos de vista e promover o debate ¢ 0 respeito fs idéias de todos, criando uma relagio de confianga para que o debate acontega e para que todos sintam que podem realmente tomar posigdo em relagio aos temas debatidos e também as questdes do cotidiano. Um ponto inicial pata isso € 0 de explicitar os principios que orientam a sua propria atuagio, buscar ser coeren- te com cles e corrigie-se quando acontecerem incoeréncias ~ pois clas sempre acontecem, ja que nio somos perfeitos. 136 Nas intervengées, consciente ou inconscientemente, colocamos nossos prdprios valores, concep- .g6es, expectativas. Dai que 0 trabalho com os temas transversais pede dos professores também ‘uma tomada de posigio coerente, um comprometimento pessoal com as questbes tratadas ¢ uma atitude de busca de formagio permanente. Para dar vida ao tratamento das questbes sociais é necessirio criat situagSes didaticas para trabalhar as suas dimensGes pessoal (0 que diz respeito as nossas priticas e atitudes) e macrossocial (0 que diz respeito a0 que ocorze na sociedade, as leis, politicas publicas, cenésio internacional, etc), in- centivando o estabelecimento de relagdes entre o que se faz na escola ¢ 0 que acontece na comuni- dade e na sociedade em geral. Os meios de comunicagio sio uma excelente fonte para um trabalho como esse, Esse ponto nos leva a outro, que diz respeito aos conteiidos de natureza procedimental dos temas transversais. Todos eles propdem priticas que demandam um saber fazer a ser ensina- do para os alunos. Esse aprendizado é essencial, pois informagées e conhecimentos nao séo suficientes para que tenham condigdes de atuar efetivamente e é nas priticas que as atitudes podem ser desenvolvidas. ‘Um ponto importante é no se restringir a situagdes didaticas estritamente escolares, como é da nossa tradigio. I preciso fazer coisas de verdade: que tenham significado social e pro- movam mudancas, fagam diferenga na realidade. B isso que permitiré aos alunos perceberem a possibilidade e a validade da sua atuacio, construir uma imagem de si como alguém que tem com que contribuir, compromissar-se com a sua comunidade, Talvez 0 maior némero de ‘experiéncias desse tipo seja dos trabalhos sob o tema Meio Ambiente, mas os demais temas também podem e devem ser trabalhados dessa forma. Por exemplo, a pesquisa em fontes primérias dos diferentes grupos culturais que compéem a comuni- 9. Sores, vers PONS de Ae dade; a promogio de exposi delateeoarstin es espeticulos attisticos abertos a comunida- de; projetos em que alunos mais velhos ensinam 0s mais novos, ou que vo trabalhar com arte em outras instituigdes, ensinando o que aprenderam ou como monitores de atelié, promovendo workshops em eventos da comunidade, etc., sfo possi- bilidades de, fazendo e aprendendo Arte, aprender a atuar no meio social. Pluralidade Cultu- ral € 0 tema que nos vem A mente em primeiro lugar, mas dessa forma podem ser teabalhados também contetidos de Trabalho e Consumo (valorizagio do lazer, por exemplo), Orientagio Sexual e Sade (concepsio ampla de satide coletiva) ¢, com certeza, Etica (solidariedade, didlogo, respeito mituo)’. Ou seja, do ponto de vista dos temas transversais, 03 conteidos procedimentais sto priticas sociais. 137 E claro que essas atividades implicam um trabalho pedagdgico de planejamento, orientacio, aval ago ¢ intervengio dos professores, producio ¢ reflexio dos alunos, pois sio atividades de apren- cdizagem e fazem parte de sua formacio. Nao sio extracurriculares: precisam estar inseridas e em consonancia com 0 processo educativo escolar, Em resumo, o tratamento de questdes socizis de modo transversal a0 ensino dos conteidos das ‘reas possibilita aos alunos a atribuicio de sentido 4 aprendizagem e mobiliza interesses, promo- vendo uma aprendizagem significativa. Como dito no inicio, os Temas Teansversais sio questdes vitais da sociedade e estio em meio a pprocessos de debate, decisio e mudanga ¢, portanto, conhecé-las demanda uma constante atualiza- io. Os professores podem conseguir isso estudando as publicagées que tratam desses assuntos, desde os livros dedicados a professores até os que sio elaborados para os alunos (nem sempre ccoerentes com as concepgies que se quer trabalhat) ¢ 0 que é publicado pelos meios de comunica- fo, através dos quais se pode acompanhar os debates que a sociedade vem fazendo a respeito. O uso sistemético desses sltimos permite tratar os temas transversais como acontecimentos atuais em proceso, como conhecimentos, idéias ¢ medidas que vio sendo tomadas conforme a socieda- de vai construindo sua histéria, Os professores nio precisam ser especialistas em cada um dos temas para desenvolver um bom trabalho com os alunos, mas precisam interessarem-se por eles ¢ dedicarem-se a compreendé-los. como cidados e como profissionais da educagio. Bibliografia BRASIL. Secretatia de Educagio Fundamental, Pardmetras Curriaulares Naconais. Arte. 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