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Poder Judiciário da União

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS

Quinta Vara Criminal de Brasília

Número do processo: 0733980-24.2020.8.07.0001

Classe judicial: LIBERDADE PROVISÓRIA COM OU SEM FIANÇA (305)

REQUERENTE: EDUARDO SEARA MACHADO POJO DO REGO

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITORIOS

DECISÃO

Trata-se de pedido de relaxamento e/ou de revogação de prisão preventiva, cumulado, alternativamente,


com pedido de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, formulado por EDUARDO SEARA
MACHADO POJO DO REGO, investigado na Operação “Falso Negativo” pela prática dos crimes de
organização criminosa majorada (Lei nº 12.850/13, art. 2º, §4º), dispensa irregular de licitação, fraude em
procedimento licitatório, superfaturamento de preços em prejuízo da Fazenda Pública (Lei nº 8.666/93,
arts. 89, “caput”, 90, e 96, III), e peculatos, nas modalidades consumada e tentada (CP, art. 312, “caput”,
c/c arts. 14, I e II), nos termos da denúncia oferecida e já recebida nos autos da Ação Penal nº
0730627-73.2020.8.07.0001.

A Defesa alega em síntese, a ausência dos requisitos ensejadores da prisão preventiva, especialmente no
que se refere ao “periculum libertatis”, visto que é pessoa idônea, com endereço fixo, ostenta uma carreira
de prestígio e não possui mais o cargo público de Secretário Adjunto de Gestão em Saúde da SES/DF.
Além disso, não há elementos que comprovassem que estaria de algum modo interferindo nas
investigações ou que queira evitar a aplicação da lei penal. Argumenta, ainda, que, das transcrições das
mensagens trocadas com o corréu RICARDO TAVARES MENDES, viu-se que ele não tinha intenção de
fraudar ou superfaturar os procedimentos de dispensa de licitação, pois era obrigado a cumprir as ordens
que eram dadas pelo ex-Secretário de Saúde do Distrito Federal, FRANCISCO ARAÚJO, conforme
previsão de suas atribuições em lei distrital e conforme os ditames previstos na Lei nº 8.666/90. Segundo
o teor das conversas juntadas, viu-se que o requerente, na verdade, entrava em divergência com as ordens
que lhe eram repassadas e, nos meses de maio e junho, mencionava as notícias relativas à presente
operação, e mostrava satisfação com as investigações que eram levadas a efeito, que certamente
incriminariam o corréu FRANCISCO, quando divulgadas na mídia. Asseverou que discordava da forma
como as dispensas eram conduzidas. Além disso, afirmou que o cumprimento de várias ordens se
justificaria por conta da situação emergencial decorrente da pandemia, nos termos do art. 4º, I, da Lei nº
13.979/20. Finalmente, afirma que não praticou nenhum ato dentro dos procedimentos licitatórios,
conforme narrado na denúncia e tampouco conhecia a empresa BIOMEGA MEDICINA DIAGNÓSTICA
LTDA., não podendo ser acusado de ter participado do esquema criminoso em apuração, a título de
conduta dolosa.

Número do documento: 20110514430944600000071917982


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Subsidiariamente, requer a substituição da segregação cautelar por uma ou algumas das medidas
cautelares diversas da prisão do art. 319 do CPP, diante da ausência de qualquer risco à instrução
processual, especialmente pelo fato de que colaborou com as investigações, especialmente por meio de
seu interrogatório após ter sido recolhido ao presídio, além de ter fornecido a senha de seu aparelho
celular e se mostrou colaborativo com o esclarecimento dos fatos. Além disso, afirma que é acometido de
“transtorno do pânico”, de modo que o cárcere pode agravar sobremaneira seu estado de saúde, máxime
pelo fato de que a perícia médica que seria realizada no presídio ainda não foi realizada, diante da
contingência de recursos humanos para tanto.

Instado a se manifestar, o Ministério Público oficiou desfavoravelmente aos pedidos (ID 76139248),
argumentando, em síntese, que permanecem os requisitos da prisão preventiva, uma vez que a
circunstância fática do requerente não se alteram pelo só fato de ter sido exonerado do cargo de Diretor
de Aquisições Especiais da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, além do fato de que não houve
demonstração em contrário da ausência do “fumus commissi delicti” (demonstração da concreta e certa
existência de uma organização criminosa que se apossou da saúde pública do DF, sendo que EDUARDO
POJO exerceu papel fundamental na execução e continuidade do esquema criminoso para aquisição
fraudulenta e superfaturada de testes rápidos para detecção da COVID-19), especialmente porque foi ele
quem engendrou um esquema de recebimento de propostas de cobertura ou fictícias, de modo a dar
aparência de legalidade aos certames, sendo auxiliado pela pessoa de “KADU” nesse empreendimento em
tese delituoso. Além disso, conforme os elementos obtidos nos autos, o requerente teria entrado em
contato com os denunciados MAURO ALVES e ROBERTA CHELES, para que a empresa BIOMEGA
fosse beneficiada com o esquema fraudulento. E em relação ao “periculum libertatis”, consistente no risco
concreto à instrução criminal, justifica que, conforme entendimento do STJ em relação a outros réus que
tiveram seus habeas corpus submetidos por aquela corte superior, as buscas e apreensões não foram
suficientes para evitar a continuidade do esquema criminoso, não sendo suficientes outras medidas
diversas da prisão. Quanto ao estado de saúde do requerente, assevera que o réu está recebendo cuidados
especiais em razão de sua condição peculiar, custodiado que está em ala destinada a pessoas vulneráveis.
E tal enfermidade não é suficiente para ensejar a revogação da prisão, por tais razões, não cabe a
substituição da prisão por medidas cautelares diversas e o deferimento do pleito importaria em supressão
da instância superior, que ainda está apreciando o Habeas Corpus impetrado pelo requerente.

Finalmente, quanto ao pedido de extensão das medidas cautelares diversas concedidas a RICARDO
TAVARES, afirma que a situação daquele corréu é diferenciada em relação aos demais, de modo que se
revela totalmente descabida até mesmo pelo fato de que o requerente só tinha sido afastado
temporariamente do cargo quando foi preso, mas só deixou o cargo após a deflagração da Fase 3 da
presente Operação “Falso Negativo”.

É o relatório. DECIDO.

Passo a analisar o pedido de revogação da prisão preventiva sendo, que, aproveitando o ensejo, a
fundamentação a seguir servirá como decisão revisional, de ofício, dos requisitos ensejadores da
segregação cautelar, em atendimento a determinação legal prevista no art. 316, parágrafo único do
CPP, incluído pela Lei nº 13.964/19, inclusive para a recontagem do prazo, verbis: “Decretada a prisão
preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90
(noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.”

Verifico que o requisito “fumus commissi delicti” foi suficientemente demonstrado, conforme os
elementos obtidos pelo Ministério Público que justificaram sua prisão preventiva decretada pelo Exmo.
Senhor Relator Humberto Adjuto Ulhôa, fundamentando, suficientemente, as razões que ensejaram a sua
segregação cautelar, nos seguintes termos:

(...)

- EDUARDO SEARA MACHADO POJO DO REGO, Secretário Adjunto de Gestão em Saúde: POJO é o
terceiro membro na sucessão organizacional, tendo status de Secretário Adjunto, assim como RICARDO.
Percebe-se que POJO recebe comandos diretos do Secretário de Saúde e age na intermediação dessas
ordens com os demais subordinados e operadores da organização criminosa, os quais estão em células

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inferiores, para que tudo saia perfeito nas dispensas de licitações. Percebe-se, ainda, que POJO também
tem a tarefa de lidar diretamente com as empresas fornecedoras de testes e informá-las do que é preciso
para que “tudo saia perfeito na dispensa de licitação”, recebendo instruções de o que a empresa deve
apresentar, instruções estas vindas de células compostas por membros de escalão inferior, a exemplo de
EMANNUEL. Atua articuladamente com IOHAN STRUCK, Subsecretário de Administração
Geral-SUAG, na tramitação do procedimento licitatório direcionada à contratação da empresa de interesse
do Secretário da Saúde, ou seja, na prática de atos administrativos visando unicamente atender aos ensaios
da organização criminosa. Nesse sentido, contando com o apoio dos subordinados ERIKA MESQUITA
TEIXEIRA e EMANNUEL DE OLIVEIRA CARNEIRO, respectivos Gerente de Aquisições Especiais e
Diretor de Aquisições Especiais - GEAQ/SUAG, combinaram nos bastidores – conforme demonstrado
pelo laudo pericial do aparelho celular de IOHAN e de JORGE CHAMON – as providências
administrativas a serem adotadas para que a LUNA PARK BRINQUEDOS se sagrasse vencedora da
dispensa de licitação nº 16/2020. Feito o ajuste, cada um deles proferiu despachos e outros andamentos no
procedimento de modo que, ao final, a LUNA realmente foi consagrada vencedora. Exemplo disso foram
os comandos dados por EDUARDO POJO no grupo do WhatsApp intitulado de “PRIORIDADES” para
que fosse oportunizado à empresa LUNA PARK o prazo para cumprir as exigências editalícias, tal como
descrito no item 51 da inicial da ação cautelar. Em corroboração, trocas de mensagens entre EDUARDO
POJO e EMANNUEL demonstram a preocupação de POJO em saber se a empresa LUNA PARK havia
mandado a documentação que faltava. Outra demonstração de atuação concertada entre POJO e IOHAN
em atendimento à determinação do líder FRANCISCO ARAÚJO é conversa entre ambos no aplicativo
WhatsApp a respeito do quantitativo de testes rápidos que deveria constar no projeto básico do 2º
procedimento analisado – drive thru. Após insistência de FRANCISCO ARAÚJO no montante de
100.000 testes, EDUARDO POJO informa essa alteração a IOHAN – haja vista que até então seriam
90.000 testes – que, por sua vez, responde em seguida ao informar o cumprimento da ordem e envia o
projeto básico atualizado. Além disso, foi captada mensagem de voz em que POJO ajusta com JORGE
CHAMON a aposição de prazo exíguo no projeto básico para apresentação de propostas nessa 2ª
contratação, tudo isso para frustrar o caráter competividade e, assim, deixar o caminho aberto para que a
BIOMEGA saísse vencedora.

(...)

E a demonstração do “fumus commissi delicti” foi robustecida, em razão dos elementos informativos
obtidos na “terceira fase da Operação “Falso Negativo – FASE 3”, conforme fundamentado na decisão
que decretou sua prisão preventiva (ID 73092561):

(...)

A sequência de mensagens e os áudios são estarrecedores. Ou seja, a população do Distrito Federal, na


área de saúde, está absolutamente desamparada, especialmente considerando que o servidor público que
lidava com as contratações participava e anuía com todas as ilegalidades. O áudio entre eles, oriundo do
dia 5/7/2020, dois meses após a homologação do certame, é estarrecedor:

“Sabe quando você não quer acreditar?”, “Por que que não faz as coisas direito?”, “Eu estava
muito indignada lá na testagem, justamente por conta disso, cara!”, “Todo dia chegava teste marca
diferente né? fabricante diferente, a especificidade era diferente...” “...ninguém tá nem aí, sabe? Pro
ser humano...se a pessoa vai morrer vai, se não vai...eles não ‘tão’ nem aí, eles só querem saber de
ganhar dinheiro!”. Em 05/07/2020, às 19:46h, EMMANUEL diz: “Qual a marca dos testes que vcs
usavam?”, “Ah tá, cada dia era um”, “Triste”, “E ganharam muito dinheiro viu”. Em 05/07/2020, às
19:47h, WANESSA responde: “eco, wodfo” e, em áudio explica que lembrava apenas “desses dois”,
em referência ao eco e wodfo, que “a cada semana, a cada quinze dias” mudava a marca. (grifo
nosso)

(...)

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No que se refere ao representado EMMANUEL DE OLIVEIRA CARNEIRO, viu-se, das conversas
obtidas por meio de aplicativo de comunicações, que desde março deste ano, o Ministério Público, em sua
representação, trouxe diversas conversas do dia 20/3/2020 entre ele e EDUARDO POJO, vangloriando-se
de responder a outros processos perante do TCDF, especialmente no que se refere à análise de caso de
superfaturamento de medicamentos destinados ao tratamento de Hepatite tipo “C”, visto que não foram
sequer responsabilizados pelo TCDF, nem mesmo foi-lhes determinada recomendação da Corte de Contas
nesse particular, motivo de piada e orgulho entre eles. Conforme faziam pouco caso do Membro do
Ministério Público de Contas do Distrito Federal, disseram que as compras relativas às substâncias
ALFAEPOETINA e RIBAVIRINA teriam sido “500 vezes” mais caras e não foram responsabilizados,
motivo pelo qual concluem que se tais compras teriam justificativa para aquisição, o que mais não teria?
EMMANUEL continua dizendo que “arrasou muito” e que “saiu ILESO”, pois, segundo seus cálculos, o
superfaturamento teria ocorrido em 4100% (quatro mil e cem por cento). Não bastasse isso, ficou
constatado que EMMANUEL, que se encontra na mesma situação fática de EDUARDO POJO, diante do
engajamento e das diligências empregadas para a consecução dos fatos criminosos aqui investigados,
anteriormente demonstrados na FASE 2 desta Operação, estava muito bem a par de todo o esquema em
tese delituoso e cumpria, dolosamente todas as determinações ilícitas, sempre causando elevado prejuízo
ao Distrito Federal por meio das dispensas de licitação direcionadas e superfaturadas, levadas a efeito pela
SES/DF, a comando do ex-Secretário de Saúde FRANCISCO ARAÚJO. Nesse sentido, é o teor do
diálogo transcrito no Relatório nº 17/2020 da Divisão de Investigação do GAECO/MPDFT, em que
EDUARDO POJO, falando com “Eduardo Amor”, afirmou que o Secretário de Saúde sempre quer que
compre “roubando”: A pessoa identificada como “Eduardo Amor”, trata-se de EDUARDO DE SOUSA
PAULA, cônjuge de EDUARDO SEARA MACHADO POJO DO REGO.

Em 05/05/2020, às 13:45h, POJO afirma: “eu acho que o círculo está se fechando”, “ele BERRAVA e
falava que daqui a 15 dias ele não estará mais aqui”, “se eu não conseguir comprar testes”, EDUARDO
diz: “Vixe amor”, “Mas ele quer que compre roubando”, “Fica mais difícil né”, POJO responde:
“SEMPRE AMOR”, “SEMPREEEEEEEEE”, “não tem uma que dá certo”, “é impressionante”,
EDUARDO comenta: “Então”, POJO completa: “as que ele não se mete”, EDUARDO: “Se fizesse certo
já tinha comprado”. (grifo no original) Houve, ainda, mensagens trocadas entre EDUARDO e
EMMANUEL ainda mais concretas. EMMANUEL revela espanto, inclusive, quanto ao preço “oferecido”
pela LUNA PARK, a loja de brinquedos que foi beneficiária do esquema delituoso, qual seja de R$
180,00 (cento e oitenta reais) por unidade de teste para detecção da COVID-19, preço, inclusive, que foi o
mais alto dentre os lances oferecidos pelas outras participantes, possivelmente meras figurantes do
certame, visto que, à época, em março deste ano, cada um dos testes custaria apenas R$ 9,00 (nove reais),
conforme arquivos encaminhados entre eles. Além disso, a proposta da empresa LUNA PARK, de que já
tinha posse antecipadamente, foi transmitida a EDUARDO POJO, sem qualquer assinatura, antes mesmo
de qualquer formalização ou publicação do resultado do procedimento de dispensa de licitação, a indicar,
estreme de dúvidas, a ciência da ilicitude de todos os fatos relacionados às compras de testes rápidos.

Finalmente, no que se refere à atuação de ERIKA MESQUITA TEIXEIRA, Gerente de Aquisições


Especiais, suas ações nos procedimentos de interesse da organização eram executadas por ordens diretas
de EMMANUEL CARNEIRO e IOHAN STRUCK, geralmente transmitidas a esses por EDUARDO
POJO, o qual se articulava com os demais integrantes da cúpula da saúde e com as empresas privadas,
ficando suficientemente demonstrado que ela executou diversos atos nos processos de dispensa de
licitação que ocasionaram prejuízo milionário ao erário do Distrito Federal.

Como dito, ERIKA não tinha elevado poder decisório, muito embora tenha executado atos relevantes e,
sem os quais, as fraudes executadas pelo grupo não poderiam ter sido levadas a efeito. Dentre estes atos, é
fácil identificar a proteção e a prioridade conferidas à empresa LUNA PARK. Nesse sentido, ficou
demonstrado que, sob as ordens diretas de EMMANUEL, ERIKA assinou despacho encaminhando o
processo da LUNA PARK para alocação de recursos na ordem de R$ 16.200.000,00, valor este que se
refere, exatamente, ao montante descrito na proposta da LUNA PARK para fornecimento de 90.000 testes
rápidos, o que se deu por volta de 18 horas do dia 30 de abril, podendo-se concluir que ela também tinha
conhecimento de que a LUNA PARK já havia sido escolhida antes da formalização da vitória nos autos,
exatamente porque FRANCISCO ARAÚJO sequer havia declarado a LUNA como vencedora do certame.
A ordem para pagamento da empresa parceira transitou pela cadeia de comando e alcançou a Gerência de

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Aquisições Especiais, que foi prontamente executada por ela. Também assim, após o término dos prazos,
viu-se por meio do Laudo nº 54.039/2020, e do Relatório nº 17/2020/DI/GAECO, que EDUARDO POJO
e EMMANUEL conversaram sobre a necessidade de solução para o “caso LUNA PARK”, tendo
EMMANUEL determinado à ERIKA que executasse a tarefa de forma a não deixar rastros e dificultar
futura investigação ou auditoria, ao que POJO exclamou “Ótimo!” (...)

E o “periculum libertatis” permanece hígido, considerando que não foram apenas poucos crimes
praticados, visto que o ora requerente e os demais membros ligados às atividades principais da
organização criminosa tiveram contra si denúncia recebida narrado suficientemente a prática de seis
crimes: organização criminosa majorada (Lei nº 12.850/13, art. 2º, §4º), dispensa irregular de licitação,
fraude em procedimento licitatório, superfaturamento de preços em prejuízo da Fazenda Pública (Lei nº
8.666/93, arts. 89, “caput”, 90, e 96, III), e peculatos, nas modalidades consumada e tentada (CP, art. 312,
“caput”, c/c arts. 14, I e II), a demonstrar maior concretude das imputações postas, pelo menos no atual
momento processual, visto que a ação penal foi recentemente instaurada.

Entretanto, vários outros elementos concretos justificam a permanência do “periculum libertatis”, embora
os servidores públicos envolvidos já tenham sido exonerados de suas funções.

Primeiro, nos autos da MISOC 0729949-58.2020.8.07.0001, quando foi deflagrada a FASE 3 da


Operação Falso Negativo, somados aos elementos obtidos na fase anterior, nos termos dos Relatórios de
Análise do GAECO/MPDFT, verificou-se que o requerente foi um dos principais articuladores do suposto
esquema delituoso, visto que era responsável, de forma permanente e reiterada, na realização, por sua
própria iniciativa, de realização de “pesquisas de mercado” e “cotações de preços” e, mesmo assim ele
próprio viria a assinar os projetos básicos das diversas dispensas de licitação superfaturadas, muito
embora não tivesse ele tais atribuições. Além disso, assinava todos os expedientes determinados por
FRANCISCO ARAÚJO e agia em fina coordenação com os demais réus, especialmente IOHAN
STRUCK, EMMANUEL CARNEIRO e EDUARDO HAGE, no sentido de operacionalizarem a suposta
competição, com empresas participantes a título de meras figurantes, para fins de adjudicação dos
contratos para fornecimento de testes rápidos para detecção de COVID-19 a empresas favorecidas pela
cúpula da Secretaria de Saúde do Distrito Federal.

Nesse exato sentido, confira-se o teor da representação ministerial nos autos supramencionados:

(...) Nesse sentido, conversas capturadas no aplicativo whatsapp no aparelho telefônico de EDUARDO
POJO, conforme análise levada a efeito pela Divisão de Investigação do GAECO (Relatório nº
17/2020/DI/GAECO – em anexo), comprovam a ausência de freios éticos de EDUARDO POJO e,
especialmente, de EMMANUEL CARNEIRO. As conversas analisadas mostram que para tais
investigados pouco se importavam como seriam de como seriam executados os desígnios determinados
pelo chefe da organização criminosa, FRANCISCO ARAÚJO, demonstrando a ausência absoluta de
escrúpulos, especialmente de funcionários públicos que deveriam zelar pela saúde da população do DF,
além da forma sorrateira como agiam nos bastidores. Para eles, o que importava era que não fosse
deixado qualquer rastro nos procedimentos ilegais realizados, evitando a identificação dos crimes por
parte dos investigadores. Ademais, a intimidade com a empresa era tamanha que chegaram a apelidar a
LUNA PARK de “Brilha la Luna[1]”. Confira-se a fraude executada por ordem de EMMANUEL e
com anuência de POJO, anunciada no dia 30/04/2020 - Relatório nº 17/2020/DI/GAECO (para melhor
compreensão, a narrativa da cobrança da documentação da LUNA PARK está acostada ao Capítulo III
desta cautelar):

A pessoa identificada como “Emmanuel GDF”, trata-se de EMMANUEL DE OLIVEIRA CARNEIRO,


Diretor de Aquisições Especiais da SES/DF, alvo da OPERAÇÃO FALSO NEGATIVO – FASE 2.

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Em 30/04/2020, às 12:29h, POJO afirma: “mas pede para a Erika subir Brilha la Luna e mandar para
o JORGE.”, “por favor”. Emmanuel diz: “Já pedi”, POJO completa: “Pede para ela te avisar”,
“quando estiver ok”, “obrigado”, EMMANUEL então explica: “Orientei ela a subir toda a
documentação em um único arquivo chamado HABILITAÇÃO LUNA, pra dificultar uma possível
auditoria posterior”, POJO exclama: “OTIMO!”.

(...)

Logo em seguida, em debates que mostram claramente a ausência de documentos essenciais para a
qualificação da LUNA PARK, EMMANUEL assevera e garante a POJO, em áudio, que tal situação está
simples de resolver, detalhando e explicando como se daria o esquema criminoso a garantir a vitória da
LUNA na respectiva dispensa. Nesse ponto, a participação de CHAMON e IOHAN também foram
essenciais para o sucesso do plano desenvolvido por EMMANUEL, demonstrando que cada membro
tinha função delimitada para o eficaz funcionamento do mecanismo da organização criminosa, estando a
saúde pública abandonada à própria sorte. Vide as conversas e o áudio entabulados ainda no dia 30 de
abril de 2020 (Relatório nº 17/2020/DI/GAECO):

Em 30/04/2020, às 14:45h, EMMANUEL diz: “O que vc vai conversar em particular com Iohan é sobre
o processo de testes, como vamos fazer pra Luna apresentar o restante da documentação.” , POJO
afirma: “se ela não tem, ela não ganha”, então EMMANUEL encaminha áudio explicando que a
situação “está simples de resolver”, “que ela (em referência a empresa LUNA PARK) não tem licença
sanitária e não tem a AFE...”, que seriam os requisitos mínimos para a habilitação técnica, mas, que o
JORGE teria afirmado que faria a habilitação técnica “...mesmo sem esses documentos...”.

Perceba como servidores da SES/DF se organizam para habilitar empresa que não possui os requisitos
mínimos para o fornecimento dos testes rápidos, criando, inclusive, artifícios para dificultar o trabalho
do controle interno do órgão, ou seja, buscando “dificultar uma possível auditoria”.

(...)

Há mais. As conversas entre EMMANUEL CARNEIRO e EDUARDO POJO, somente em um único


dia do mês de março de 2020 (20/03/2020) e em plena pandemia, revelam o absoluto descaso de tais
indivíduos para com o patrimônio público e que a organização criminosa tem tentáculos em dezenas de
contratos da saúde pública. Aliás, os dois se vangloriam de responder a processos nos órgãos de
controle e de deles escapar, exaltando a certeza da impunidade; fazem pouco caso do superfaturamento
de medicamentos destinados ao tratamento de doença gravíssima como a Hepatite C (Alfaepoetina e
Ribavirina); tratam como piada a ausência de estimativa de preços e, quiçá, de projeto básico de uma
determinada contratação; comentam com desdém do relevantíssimo e indispensável trabalho da
respeitável Procuradora do Ministério Público de Contas, Dra. Cláudia Fernanda, dentre muitas outras
aleivosias. A conversa travada é extremamente desagradável, mas sua transcrição é necessária para
alertar o perigo que tais indivíduos representam para a sociedade, caso permaneçam em liberdade. Note:
há centenas de fatos que ainda precisam ser minuciosamente investigados. Todas as mensagens foram
extraídas do aparelho celular de EMMANUEL CARNEIRO e constam do respectivo laudo de perícia
criminal.

Diante desses fatos graves, considerando, ainda, o alto poder de influência que o réu EDUARDO POJO
detém no Distrito Federal e o provável domínio dos fatos aqui investigados pelo agora réu, nos termos
narrados na denúncia inclusive, não há dúvida de que, caso venha a ser posto em liberdade, possa também
assim proceder.

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Segundo, porque, apesar de não mais ostentar o cargo, é inegável que a forma como atuou na SES/DF
para a realização de diversos procedimentos licitatórios possivelmente fraudados e superfaturados
ensejam a manutenção de sua segregação cautelar. O seu envolvimento no esquema delituoso investigado
é elevado, que graças a sua atividade intensa, conseguiu que o certame de dispensa de licitação fosse
homologado em favor das empresas LUNA PARK e BIOMEGA MEDICINA DIAGNÓSTICA LTDA,
com justificativas fictícias para que os preços fossem de fato pagos em valores altíssimos, com
dilapidação provável do patrimônio público do Distrito Federal.

E tudo isso se deu no exercício de cargo da mais alta confiança do corréu FRANCISCO ARAÚJO, de
Secretário Adjunto de Saúde do Distrito Federal, não sendo crível de que acatava todas as ordens do então
Secretário de Saúde cegamente. Conforme se viu das transcrições de elementos de informação dos autos,
ele bem sabia do esquema criminoso em apuração, e deveria e poderia agir para EVITAR o desenlace dos
atos praticados. Ora. Se realmente discordava das atitudes do seu ex-chefe, deveria ter de tudo feito para
impedir a continuidade dos certames, ou deixar o cargo em seguida, para após delatar o esquema às
autoridades competentes.

Ao invés de zelar pelo patrimônio do Distrito Federal no exercício do cargo, teria, ao contrário,
dolosamente, em conjunto com os demais para que as propostas comerciais fossem anexadas aos
procedimentos licitatórios de dispensa de licitação. Cumpre ressaltar que não procedem as alegações de
que agia como um simples “assessor” do então Secretário FRANCISCO ARAÚJO FILHO, estando
obrigado a cumprir todas as determinações que lhe eram repassadas. Obviamente, os dispositivos
pertinentes da Lei nº 8.666/93 e as normas distritais relacionadas ao exercício do cargo de Secretário
Adjunto se referem a atividades LÍCITAS. Ao contrário, por meio da Lei nº 8.112/90, da Lei
Complementar Distrital nº 840/11 e os códigos de ética dos servidores públicos federais e distritais (para
não dizer, ainda, os princípios constitucionais previstos no art. 37 da Constituição Federal e os ditames da
Lei de Improbidade Administrativa), depreende-se facilmente o dever do servidor público agir em favor
da legalidade dos atos do serviço público, inclusive contra seus superiores.

Em outras palavras, quando se trata de tutela do patrimônio público, nunca será permitido que o servidor
público pratique atos dolosos que prejudiquem o erário e colaborem com o enriquecimento ilícito próprio
ou de terceiros, sob pena de responsabilidade criminal, precisamente o caso do ora requerente.

Como bem destacado ainda pelo Ministério Público, o teor de seu interrogatório se revelou com várias
contradições, e, em certas passagens, o requerente ainda afirma, no caso da empresa de venda de
brinquedos LUNA PARK, que não houve qualquer justificativa para a sua aprovação e adjudicação do
contrato.

Em terceiro lugar, a sua influência política certamente implica risco à ordem pública, pois, como se viu, o
esquema em tese delituoso relativo às dispensas de compras de testes rápidos para detecção de COVID-19
envolvendo as empresas LUNA PARK BRINQUEDOS e BIOMEGA, só veio a ser interrompida após as
prisões dos servidores públicos. Consequentemente, caso venha a ser posto em liberdade, existe a
possibilidade real de que outros procedimentos de dispensa de licitação em curso, além daqueles que já
foram executados, com suposta malversação de recursos públicos, por meio de conluio de empresas
vencedoras dos certames, participação de empresas como “meras figurantes”, a fim de dar falsa
legitimidade aos certames, com direcionamento a empresas escolhidas pelos réus, que possivelmente
venceram o certame com propostas superfaturadas, possam ser mantidos ou continuados por sua
determinação ou influência aos servidores da SES/DF.

Cumpre ressaltar, nesse particular, que a sua situação jurídica em nada se assemelha com o corréu
RICARDO TAVARES, posto em liberdade mediante monitoração eletrônica e outras medidas cautelares.
Como se viu, RICARDO só foi libertado porque havia deixado o cargo uma semana depois da Operação
“Falso Negativo – FASE 1”, o que permitiu a interpretação de que ele, por sua própria iniciativa,
permitindo a formação de um novo juízo quando à redução da sua periculosidade, no que se refere ao
abuso de poder no exercício do cargo público que detinha. Mas o mesmo não ocorreu em relação ao
requerente EDUARDO POJO, visto que só foi afastado temporariamente do cargo após a sua prisão,
tamanha a confiança que gozava do principal articulador das fraudes em apuração, FRANCISCO

Número do documento: 20110514430944600000071917982


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ARAÚJO, o que ensejou sua permanência no cargo. Poderia ser possível que retornasse caso sua prisão
tivesse curtíssima duração, apesar disso não ter ocorrido.

E, em terceiro lugar, o fato de o réu estar acometido de “transtorno do pânico”, por si só, não basta para
desconstituir o decreto da prisão preventiva. Conforme atestado pelo Ministério Público e conforme dito
pela Defesa, ele vem sendo cuidado adequadamente, estando preso em ala destinada a pessoas
vulneráveis, sendo que o laudo médico sobre sua condição de saúde ainda não foi realizado por razões de
contingência de pessoal.

Assim sendo, não há qualquer motivo para considerar que sua prisão seja uma forma de medida cruel,
máxime pelo fato de que não há nos autos qualquer elemento indicativo de que ele tenha sofrido
quaisquer abusos durante sua segregação cautelar, a justificar a revogação da medida.

Consequentemente, o “periculum libertatis” permanece pelo fato de que as investigações, por meio dos
elementos de informação obtidos nas conversas realizadas por meio de aplicativo de mensagens
instantâneas, que, enquanto estava em liberdade, há tempos já tinha o hábito de fazer homologações de
licitações superfaturadas, tendo sido constatado que fez isso em anos anteriores, relativamente a dispensas
de licitação com preços muito maiores do que aqui apurado, no que se refere a remédios para o combate
da Hepatite “C”, em conluio, provavelmente, com EMMANUEL CARNEIRO e JORGE CHAMON, com
base no mesmo “modus operandi” aqui descoberto.

Logo, diante de tudo isso, é forçoso concluir que o pedido de revogação da prisão preventiva não merece
ser acolhido, pois não houve alteração das condições fático-probatórias que decretaram a prisão do
requerente.

Consequentemente, não é o caso de se aplicarem medidas cautelares diversas da prisão, que se mostram
insuficientes para garantir a ordem pública, evitando-se a reiteração criminosa por influência ou
direcionamento de condutas a servidores que trabalham na SES/DF e também a empregados e dirigentes
das empresas LUNA PARK BRINQUEDOS e BIOMEGA MEDICINA DIAGNÓSTICA LTDA., a
conveniência da instrução criminal, evitando-se a destruição de provas, por sua própria iniciativa ou por
meio de terceiros.

Diante de todo o exposto, INDEFIRO os pedidos de revogação da prisão preventiva e substituição por
medidas cautelares diversas de EDUARDO SEARA MACHADO POJO DO REGO.

P.R.I.

Após, arquivem-se os autos, com as providências de praxe.

BRASÍLIA, DF, 4 de novembro de 2020 17:45:42.

ANA CLAUDIA DE OLIVEIRA COSTA BARRETO

Juíza de Direito

Número do documento: 20110514430944600000071917982


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