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HISTORIA DATEIURA UMBERTO ECO Diegso etna fisabeta Soar! Coordenacs0 eitoral ‘anna Moria onsso Colaboraramcom 3 1edaq30 Fabio Cleto Federica Mateo Projet raico Polystudlo Diagramacdo Paola Berto Pesquisa iconogatica Siva Borahes! Produgso tecnica Sergio Daniot Ccp-trasi.Catalogagaorne forte Sncicat Naconal dos Editors de i705 Tradugdo de: Storia della ruttez3 Incluibibhografia Isat 978-85-01-07864°3 uestetica Hist 2. Grovesco-Histora 3.Arte -Flesofo Hitgnia 4 Arte flsofa~ Historia Titulo cop 1ni8s eae coumniss Copyright © 2007 RCS Libr SpA, Boman Todos os cits reservados. Proce 9 eproducao amazenamento ou tansmissde de partes deste Iurovatrovés de quaisquer meios sem prévaautoiz30 por eit Diretosexclusvos desta digo reservados pelo EDITORA RECOADLTDA ua Argentina 171 Rode Janeio, RJ ~ 20921380 ~Tel:2585-2000, Ampresso nails Primera impressa0 Outubro 2007 ‘Segunda impress Fevereito 2008 IsaN 978:85-01-07864°3 PEDIDOS PELO REEMBOLSO POSTAL Colea Postal 23052 Rode Janeio,R)- 20822970 Universidade Estadual de Maringa ‘Sistema de Biblotecas - BCE i Imagem G. Canale, Borgaro Torinese SUMARIO Introdugao. capitulo! O feio no mundo classico Capitulo A paixao,a morte, Capitulo © Apocalipse, o inferno eodiabo Capitulo lv Monstros e portentos Capitulo 0 feio, o cémico, o obsceno Capitulo Vil Odiabo no mundo moderno Gpitulo vil Bruxaria, satanismo, sadismo Capitulo x Physica curiosa Capitulo x O resgate romantico do feio Um mundo dominado pelo belo? Helenismo e horror A visao pancalista do universo A dor de Cristo Martires, eremitas, penitentes O triunfo da morte Um universo de horrores Oinferno As metamorfoses do diabo Prodigios e monstros Uma estética do desmesurado Amoralizagao dos monstros As mirabilia O destino dos monstros Priapo Satiras sobre o vilao e festas carnavalescas A liberacao renascentista Acaricatura Atradicao antifeminina Maneirismo e Barroco Do Satands rebelde ao pobre Mefistofeles A demonizacao do inimigo Abruxa Satanismo, sadismo e prazer da crueldade Partos lunares e cadaveres desventrados A fisiognomonia As filosofias do feio . Feios e danados . Feios e infelizes Infelizes e doentes 43 49 56 62 3B 82 90 107 1 13 16 125 131 135 142 152 159 169 179 185 203 216 241 257 an 282 293 302 O inquietante oxi 1. Afeiura industi Torres de ferro (0 Decadentismo ea luxiria e torres de marfim do feio fulo xt ‘Avanguarda eo triunfo do feio. 1. O feio dos outros OKitsch Camp O feio dos outros, o Kitsch eo Camp 3 O feio hoje Bibliografia essencial Referencias bibliograficas das traducées utilizadas indice dos autores e outras fontes Indice dos artistas Referéncias fotograficas 3n1 333 350 365 441 443 445 447 453 Tntrodugao Prdgesad Pierro A ead Pe or aaa Peru ero a 1s testemunhos € ead pe és dos tempos. J4 com 0 feio, foi diferent Pee ea do belo; gracas a esse: Rr Re ht Pen cde meng6es parentéticas e marginais. Po a Pe ik ee Cc se poderé deduzir o gosto de determinada Pere Mec CLC) ONT ct Cd a CII er st ia cored FORINT esl ail com a historia da beleza. Antes de mais Pe eta pe Ea dba re nee renee nent Eee uN aa Apr RIN aC Nicer ics femininos pintados por Picasso e ouvisse que os visitantes os consideram DN es Pete ner ce keg femininas cujos rostos s4o semelhantes aqueles representados pelo pintor. ere tec eek ue Re desfile de moda ou um concurso de Miss Universo, nos quais veria Peer tee Ne Cun nn Pe eed teeta desse tipo nem em relacdo ao belo, nem em relacdo ao feio, pois dispomos Pe cme et tea ices oe ae ane ec atc nunc ts TO CUR ut Rl CET uC) ere uot beleza ie a ! | fental. Para as civilizacdes arcaicas € para 0s povos dito chados arqueologicos e artisticos, mas nao de im se eles eram destinados a provocar del na civilizacao ocid primitivos, dispomos de textos tedricos que informe ‘0. ou mesmo hilariedade. estético, terror sat idental, uma mascara ritual africana poderia parecer Para um o horripilante - enquanto para o nativo poderia representar uma divindade benévola. Em compensacao, para alguém pertencente a alguma religiao poderia parecer desagradavel a imagem de um Cristo e humilhado, cuja aparente feitira corporea ndo-europé flagelado, ensanguienta mosao a um cristao, as em textos posticos e filoséficos (como, inspira simpatia e No caso de out por exemplo, a indiana, a japonesa ou a chinesa), vemios imagens e formas, mas, ao traduzir tanto as paginas de literatura quanto as filoséficas, é 5 culturas, quase sempre dificil estabelecer até que ponto determinados conceitos podem ser identificados aos nossos, embora a tradicao nos tenha induzido 2 transpo-los para termos ocidentais como “belo” ou “felo’ Porém, mesmo que essas tradugdes fossem confidveis, saber que numa determinada cultura entende-se como bela uma coisa que exibe, por exemplo, porcao e harmonia nao seria um dado suficiente, O que se entende, de fato, com estes dois termos? € curso da historia es mudaram de sentido até mesmo no ocidental. Quando comparamos afirmacées ted um quadro ou uma constru cas com 40 arquitetonica da mesma época, podemos Perceber que aquilo que é proporcional em um determinado século j8 Nao 0 € no outro: falando, por exemplo, da proporcao, um filésofo medieval pensava nas dimensoes e na forma de uma catedral gética: enquanto um tedrico renascentist fa pensava em um templo quinhenti Cujas partes eram reguladas pela seco urea ~ e para os renascentistas Pareciam barbaras e, justamente, goticas’as proporcées realizadas aquelas catedrais. Os conceitos de belo e de feio so relat de bel felo s20 relativos aos varios periodos historic citar Xendfanes de Colofao Tapecarias, , 110) 0u as varias culturas e, para Clemente de Alexar segundo Se maos tivessem o bois, os Cavalos € os ledes e pudessem, 0s i F em, como os homens, desenhar e criar obras Com estas maos, semelhantes ao caval pene ; 20 cavalo, 0s cavalos desenhariam as formas cles oF erg s Semelhantes a0 boi e hes fariam corpos tais quais Na Idade Média, Jacques de Vitry bri duo, quorum prior Orientalis, si Ocidentalis istoria), ao a0 louvar a beleza de tod. Provavelmente, os ciclopes, que tém u ‘Om aqueles que tém dois, como nés nos a OU COM as criatur Hiyerosolimat r jatanae, alte obra divina, admitia que admitia que se espantam c n olho s6, ssombramos com as de trés olhos... Consideramos Mais negro € cons ard eco em Voltaire feios os etiopes siderado mais belo’ Mais tarde 10 Dicionério filosético} ladeiro belo, oto kalén. Ele com seus dois bel Negros, mas, entre eles, Perguntem a um respondera que os olhdes redondos que se SPO 0 que é a beleza,o verd, Consiste em sua fémea, ee talarga e chata,o ventre amarelo Guiné:o belo consiste para dos, no nariz achatado. destacam na cabeca pequena, 2 gargan escuro, Interroguem um negro da nos olhos enfossa tum par de chifres, quatro patas err eo dorso ele na pele negra e ol Interroguem o diabo: dira que o belo € garras e um rabo’ Jegel, em sua Estética, anota qu eae sropria esposa, pelo menos cada namorado considera bela, alias, eee 2 propria namorada;e se 0 gosto subjetivo por tal pode-se dizer que isso é uma sorte .e‘acontece que, se nao cada marido a exclusivamente bela, Beleza nao tem nenhuma regra fixa jara ambas as partes...Quve-se dizer com frequencia que Uma Beleza fadaria a um chinés ou mesmo a um hotentote, embora o eito de Beleza inteiramente diverso daquele do rmos as obras de arte dos povos nao emplo, que brotaram de sua uropéia de: chines tenha um cont negro...£,na verdade, se considerar gens de seus deuses, por fantasia como dignas de veneracao e sublimes, poderdo nos parecer idolos dos mais monstruosos, assim como sua muisica pode soar aos NOssos vidos da forma mais det Por sua vez, aqueles povos verao as nossas esculturas, pinturas e misicas como insignificantes ou feias Muitas vezes, as atribuicdes de beleza ou de felura eram devidas nao a critérios estéticos, mas a critérios politicos e sociais. Hd uma passagem de 10s econdmico-filoséficos de 1844) que recorda como a iro pode suprir a feiura:"O dinheiro, na medida em que possui a propriedade de comprar tudo, de apropriar-se de todos os objetos, é 0 objeto em sentido eminente...Logo, minha forga sera tao din grande quanto maior for a forca do meu dinheiro...0 que sou e posso ndo portanto, efetivamente determinado pela minha individualidade. Sou ' posso comprar a mais bela entre as mulheres. Logo, nao sou feio, na medida em que o efeito da feiura, seu poder desencorajador, é anulado pelo dinheiro, Sou, como individuo, manco, mas o dinheiro me da vinte € quatro pernas: donde, nao sou manco...Meu dinheiro nao transforma todas as minhas deficiéncias em seu contrério?" Ora, basta estender essa reflexao sobre o dinheiro a0 poder em geral e poderemos compreender alguns retratos de monarcas dos séculos passados, cujas feicdes foram devotadamente eternizadas por pintores cortesdos, que com certeza nao tinham nenhuma intencdo de ressaltar os seus defeitos e que talvez até tenham dado o melhor di si para suavizar seus tragos. Mesmo assim, tals personagens nos parecem, sem sombra de duvida, bastante feios mo em seu tempo); no entanto, ram ( provavelmente o eram, mesn dotados de um tal d dos de um tal carisma e de um tal fascinio devido a sua onipoténcia, Liditos os viam com olhos de adoracao, Enfim, basta ler um dos mais bi que seus los contos de ficcao cientifica contemporanea, A sentinela, de Fr Poranea, A sentinela, de Frederic Brown, para ver como a relacao entre normal e monstruoso, aceit di ‘vel e horripilante, pode ser invertida se o NOs para o monstro es Estava ens !ava ensopado e coberto de | cede de pacial ou do monstro espacial para jama,tinha fome, frio e estava a mais ns: ' J t 4s culturas (ou at tentou, desde F 30. a um modelo esta > Niet c lo dos idolos, que dida da perfeicac ‘adora lea > n delha nas coisas, consid >ma da feiura sao definidas em referéncia a um e anoga a todos os entes, como fazia Platao na F bela uma panela construida Toma: egras artesanais, ou 9, 8), para que quino (Sum de uma correta proporcao e da luminosidade ou clareza, pe e, portanto, un exibir todas e sentido, considerava felo somente aquilo que fc proporcionado, como um ser humano com uma cabeca eno! mas eram ditos feios também os seres que Tomas ino sentido de “diminuides;ou seja = como dird is falta um Guilherme de Alvernia (Tratado do bem e do mal), 205 Ait pee M im olho (ou até trés, pois € possiv ntar membro, que tém apenas um ol im defeito de integridade também por excesso). Portanto, eram mo feios os erros da natureza, que os artista snhuma compaixao ~ , para o mundo jectos formais d pernas curtissimas, definia como “torpes impiedosamente definidos co’ tantas vezes retrataram sem nef 's hibridos, que fundem inadequadamente os asp‘ animal, o% duas espécies diversas. O fei poderia, entao, ser definido simplesmente como 0 contrario do belo, mesmo um contrario que se transforma com a mudanca da idéia de ‘07 Uma historia da feidra coloca-se come contrapanto simétricc seu opost de uma historia da beleza? ra e mais completa Estética do feio, elaborada em 1853 por Karl ima analogia entre o feio eo mal moral. Como o ma A prim Rosenkrant, raca ul € o pecado se opdem ao bem, do qual sao 0 inferno, assim 0 feio € 0 inferno do belo” Rosenkrantz retoma a idéia tradicional de que 0 feio é 0 contratio do belo, uma espécie de possivel erro que o belo contém em si de modo que toda estética, como ciéncia da beleza, é obrigada a enfrentai também o conceito de feidira, Mas é justamente quando passa das definic6es abstratas para uma fenomenologia das varias encarnacdes do feio que ele nos faz entrever uma espécie de “autonomia do feio’ que o transforma em algo bem mais rico e complexo que uma série de simples negacdes das varias formas da beleza. Ele analisa minuciosamente o feio da natureza, o feio espiritual,o feio na arte (e as diversas formas de incorrecao artistica), a auséncia de forma, a assimetria, a desarmonia, o desfiguramento e a deformacao (o mesquinho, 0 débil, o vil, o banal, o casual e 0 arbitrario, o tosco), as varias formas de repugnante (0 desajeitado, o morto e o vazio, o horrendo, o insosso, 0 nauseabundo, 0 criminoso, o espectral, o demoniaco, 0 feiticeiresco, 0 satanico),|sso tudo é demais para que se continue a dizer que 0 feio 6 0 simples oposto do belo, entendido como harmonia, propor¢ao ou integridade. Se examinarmos os sindnimos de belo e feio, veremos que, enquanto se considera belo aquilo que é bonito, gracioso, prazenteiro, atraente, ieee een en ,, , , ‘pcional, fabuloso, Saeelig fen teansae ae apreciével, espetacular, asqueroso, desagradavel, fates com hae er indecente, imundo, SUjO, oe en ie Spee ee eae ‘monstruoso, horrivel, hérrido, ee Renee or ucmenda, Retiteee ee terrivel, terrificante, nauseabunde,étido, apavorante,ignob decgre ee ee , fe, ndbil, desgracioso, desprezivel, pesado, falar das formas ignados ) magico, enquanto para todos os ciagao mpre uma no hot nos animal a determinada >mo expressivos a undo’ desejavel: bast de alegria do glutao diant 20 estético, mas an semelha aos gru > aos arrotos emitid em algumas civi para rr F aprovacao depois de uma refeicao (embora nestes casos de etiqueta).£m geral, em todo caso, parece que a ex lo provoca aquilo que Kant (Critica do juizo) definia como s desejo de possuir tudo aquilo que gradavel ou de participar de tudo aquilo que n s parece bom, © juizo de gosto diante da visa de uma flor provoca um prazer do qual se qualqu ej de posse ou de consumo. Nesse sentido, alguns filésofos erguntaram-se se é possivel pronunciar um juizo estético de feitira, v to que 0 feio provo: a reacdes passionais, ersao descrita por Darwin. Na verdade, deveriamos, no curso de nossa historia, distinguir as manifestacdes do feio em si (um excremento, uma carcaca em decomposicao, um ser coberto de chag s emanando um cheiro Nauseabundo) daquelas do feio forme ou seja, desequilibrio na relacao organica entre as partes de um todo. Imaginemos encontrar na rua alguém com a boca desdentada: 0 que nos perturba nao ¢ a forma dos labios ou dos poucos dentes restantes, mas 0 fato de os dentes nao estarem acompanhados dos outros que deveriam estar naquela boca. Nao conhecemos a pessoa, aquela feitira nao nos envolve passionalmente e, no entanto - diante da incoeré incompletude daquele conjunto -, nos sentir a ou autorizados a dizer que aquele rosto ¢ feio. Por isso, uma coisa é reagir passionalmente ao nojo provocado por um inseto pe ajoso ou uma fruta apodrecida, outra é dizer que uma pessoa é desproporcional ou um retrato ¢ feio no sentid jlo em que & malfeito (0 feio artistico ¢ um feio formal). e todas as teor' im lembrar que quase conhecido que sos dias, tém re uma representacao feio artistico,é 10s da Grécia aos no: + redimida po! ‘a, 14480) fala da possibilidade epelente e Plutarce a de feiuira pode a tria aquilo que tistica, 0 feio imitado yesenta¢so a na represe f je beleza da uma reverberagao di gis poetis) diz qu .cebe como que menos diversos:o feio em si, 0 feio formal mbos.O que devemos ter quase sempre, serd possivel int iros tipos de feitira com ente a0 folhear as paginas deste livro é qu Jo terceiro tipo muitos equivocos, Na Idade Média, ‘omna-se bela cul dois prim im determina\ as em testemunho! aio diia que a imagem do diabo t 3s seria isso mesmo que os fiéis ma sua feitira Mee nas de inauditos tormentos infernais nos ais jas? Nao reagiam, talvez, com terror e angustia ‘omo uma feiura do primeito tipo, enregelante e 19 a para nds a visio de um réptil que nos ameaca? v Joricos no consideram intimeras varidveis individuais, iiossincrasias e comportamentos desviantes. Se é verdade que a experiéncia da bele ica uma contemplacao desinteressada, um scente perturbado pode, no entanto, ter uma reacao passional diante 4a Venus de Milo. mesmo vale para o feio: uma crianga pode sonhar d ite, aterrorizada, com a bruxa que viu no livro de fabulas e que, para seus outros coetaneos, era apenas uma imagem divertida. Provavelmente vitos contemporaneos de Rembrandt, em vez de apreciar a mestria com cionado na mesa de dissecacao, \daver fosse verdadeiro ~ assim ardeio talvez nao possa olhar Guernica de sado, revivendo o terror de sua que ele representava um cadaver si podi 10 de modo esteticamente desintere Dai a prudéncia com que devemo p prudéng que devemos nos preparar para prosseguir esta nossa historia da feiura, em suas variedades, em suas multiplas declinacdes,na diversida le de reacdes que suas varias formas estimulam, s,uanees comportamentas com que se reage a elas. Considerando, a ad quando tinham razdo as bruxas que, no primeiro ato de Macbeth, gritam: "Belo é feio, feio é belo, etd Lh eel eo Cu cet Lint Ter ee eee essere iy eee peheatanoL er rT ea ae todos 0s seres que no encamavam tals proporcées fossem vistos conio Cee Ue a O ideal grego da perfeicao era representado pela kallokagathla, termo que nasce da unido de kdilos (genericamente traduzido como“belo") Ni ee au ee Lor ea ee ae ee uma série de valores positivos). Observou-se que'a virtude de ser kalos ea Se tenet eee bchterneaieneieline seats ec eT at eee ae digno, de coragem, estilo, habilidade e conclamadas virtudes esportivas, Miilheteha aC ee ei ae eee literatura sobre a relacéo entre feldia fisca e feidra moral. eta de cosas fess Pago VV 30) Parti 0 3 apts do bel, do hom dane Si spore a do TE supoes igualmente e de todos howem, independ de is € de aus qe so como 6m om ms de home de fogo ov te sMSobre esas cosas, Parménides muita veres duvidel se deveriamos Consideri-las como as precedentes OY yma forma em issn por a tens centeza 3 ree de og Pe 2 of ‘qualquer outra coisa desprovida de Cum, ante que xe ar xu das ua forma separa, qe € por ter, versa dao qv cas com 35 = Oh, no. creo que tis coisas, assim ‘como as vers, asim elas io, Acreditar ‘que existe uma forma separada de cad tia dels seri, eu temo, demasiado ose tee dC) prazer ma fea, Nio poderiamos ¢, através da experiéncia de diversas belezas, tenta alcancar a 'o.em Si, da Beleza hiperurania, da Beleza como Idéia amor pelos jovens ao qual Sécrates se dedica, o que lo Alcebiades, ja bel ta-se aqui de itrompe no banquete doria de Socrates, Ihe partilhar da sab ido o pro Enesse contexto que Alcebiad © famoso elogio da aparente feitira m0 aspecto externo de um sileno, mas que Sconde uma profunda beleza interior crates, que t sob estes nico dislogo o n-se diversas idéias de 9 esquema simplist plica. Ea civilizag 640, como se in a feitira como oposto da 20 grega sempre esteve conscienté Te do elogio, mais tardio, de um outro ser oo.mas de alma nobre e rico de sabedoria, Esopo, ee TTersites Home ‘ada, M, 1BISs mes fe Dos cert (se. Ka) peito arcade giboso, ¢ inha 0 pe sntuda cabeca umas faltipas; Sch npre a Ulisses € 0 Pelides, Monta verope Esopo, 0 feio Romance de Bsapo 1 (36. LID ‘ Paap. o grande benfetor da humanid ‘hols, foi esravo por condicio, mas na Fri Je nascimento figio de Ame C), nojente = eS ee repeleme 3 Cin a eabeva pontagn Sais alvaceo,Paixinho, com pes Shor, bragoscurtos, vesgo, beicud if ainda mais grave Ademais - deficienc 1 deformicade -,nilo possuia o dom que di palavra, alem de ser gago e totalmente Socrates como Sileno Plato (sée. VV aC) Digo, com efeito, que ele (Socrates) se muitissimo com aqueles silenos parece muitssimo x sxpostos nas oficinas dos escultores, que fgutas na mao e que, quando aber meio, evelam em seu interior efigies cle Aero oe po, Mas 0 mundo grego foi atravessado também por outras contradicOes. ago velo an Na Repablica, considerando que o feio como falta de harmonia é o 1630-168; tes contrario da bondade de espirito, Platao recomendava que se evitasse a jee representacao das coisas feias para os muito jovens, mas admitia que, no fundo,existiria um grau de beleza préprio a todas as coisas, na medida em que se adequassem a idéia que Ihes correspondia; portanto, pode-se dizer que ¢ bela uma jovem, uma jumenta, uma panela, cada uma dessas oisas sendo, no entanto, feia em relacao a precedente, Arist6teles,na Postica,ratificava um principio que seria universalmente aceito no decorrer dos séculos, ou seja, de que se podem imitar belamente a8 coisas felas - e desde as origens, admirava-se o modo como Homero havia bem representado a fealdade fisica e moral de Tersites. Enfim, vejamos como, mais tarde,em ambiente estdico, Marco Aurélio reconhece que também o feio, também as imperfeicoes, tais como as rachaduras na crosta de um po, contribuem para a atratividade do todo. Princo este que (como veremos no préximo capitulo) domina a visio Patistica e escolstica, nas quais ofeio é redimido pelo contexto € Contribui para a harmonia do universo, Imitar belamente r 2, Helenismo e horror so grego era obcecedo por muitos tipos de felira e maldade, Nao O mundo oe terse a oposicao entre apolineo e dionisiaco: embora nos ilenos ébrios e comicamente repugnantes, la proeza a resistencia de é necessario reme r cortejos de Baco aparecam s justamente no Banquete elogi Sécrates as mais generosas libagoes. Perm: de ambiguidade a respeito do papel da musica, que estimula paixoc da a estética pitagorica vé a musica como aquilo que realiza as leis fa harmonia. ja-se como uma bel janece, no maximo, uma sombra ideais, as regras matematicas da proporcao ed {as zonas subterraneas onde sao ‘omo Ulisses e Enéas) aventuram-se Na cultura grega restam, porém praticados os Mistérios e os herdis (c has névoas sinistras do Hades, do qual Hesiodo ja nos contava os horrores. ‘A mitologia cléssica é um catdlogo de inenarrdveis crueldades: Saturno ddevora os proprios filhos; Medéia os massacra para vingar-se do marido infiel;Tantalo cozinha ofilho Pélops e serve sua carne aos deuses para desafiar sua perspicdcia; Agamemnon nao hesita em sacrificar sua filha figGnia para agradar aos deuses; Atreu oferece a Tiestes a carne de seus filhos; Egisto mata Agamemnon para roubar-lhe a esposa Clitemnestra, que sera morta por seu filho Orestes; Edipo, embora nao 0 soubesse, comete tanto parricidio, quanto incesto...£ um mundo dominado pelo mal, no qual as criaturas, mesmo as belissimas, realizam ac6es ‘feiamente” atrozes. Neste universo, vagam seres assustadores, odiosos por serem hibridos que violam as leis das formas naturais: ver,em Homero, as Sereias (que nao. cauda de peixe, mas aves de rapina), Cila e Caribdis, Polifemo, a Quimera} em Virgilio, Cérbero e as Harpias, e iqualmente as Gorgones (com a cabeca erigada de serpentes e as patas de javali),a Esfinge, de rosto humano sobre poset enue es da kallokagathia, foram inspirados também por pei ifestacoes do horrendo, de Dante aos nossos dias. Tanto é stv eapeptsreia ela oer em paginas como as de Clemente Al ae sce cma lexandrino ¢ Isidoro de Sevilha, as monstruosidades descritas pelos anti a ntigos para a falsidade irae i90s para demonstrar a falsidad um corpo leonino, as Eri © Minotauro, posteros fanta I ne [As Sereias Homero (séc. aC) ‘dessa, XI, 2545 Has de as Sereias Primero deparar, cuja harmon bementa € Fascia OS ‘Quem se apropingua esto CGpost e fics nao regoziar nos doces lates (Que a vocal melodia de buman feunes, Surde avante: As orelhas dos teus com cera tapes Ensurdegam de todo. ‘Ouvias pores, Gontanto que do mastro ao longo estas de pes e mios atad te se, absorvido no prazet, fordenares que te sok, mais forga Liguemze ca (0 companhetos Dal pass 1 via note aponto Que te cumpre seguir tu mesmo a escolas, 15 dots penedos, que os Supremes chamar Errantes, onde fremem de Anfite Ondas azuis As Harpias| Visio (sé. 12.6) Breida, I, 219-222, 25-229 has do grande Jonio, em grego Stotades, Nas prs me receber nests ilhas Mora a cruel Celeno e as mais Harpias Monstro maior, em divinal Nagel, Nem peste mais vor brotou di Exige Tem laxo imundo vente Aves nojoss, ‘com divinos rcsts, Magros,palidos sempre Cila © Caribalis Homero (séc. 1K a.¢) diss. XU, 62.67 Onde a lar se aloja 0 monsero Gi, Como tenrinhos cies, Dox proprios deus pemas doze informe: Dentug ‘os colmilhos cheios De negra morte Polifemo Homero (séc. XG. Oidisseia, IS, 111-143, 218-2: 290300 Seus rebanhos ali desconversivel Gigante pustorava, em separado, do $6 consigo maldades ramina Eko, sevo ¢ em silencio, a dois agar No chio como uns clezinhos fos machuca Eo eérebto no chio corre espargido, Eos membros 135 hes devora tudo, Fibra, enfranha, oss mole ou medulosc Qual farinto leto: chorando, as palmas, Em desespero e grita, a Jove algamos. Pleno de humanas carnes © amplo vente, Leite bebe 0 Ciclope a grandes sores, Eentre as ovelhas na cavern estira-se oO E ressupino eal ¢, a cervig grossa, dobranido, a0 sono domador se rende A jimpar na embriague7, ressona € arrou, Vomita 0 vinho came humana em postas ( Cérbero Virgilio (sée. 1.6) Breida, V1, 426-433 om trifauce ltr Getbero ingente Deitado em cova oposta, Seus serpentinos colos Langathe a vate Lum Sonorento bolo De mel ¢ confecoes que, a8 tr gangantas| Eseachando glutio, raivoso engole, E,05 costados em t etorpecide Por toda a gruta 0 corpo enorme esta Gustave Moreau, Aquimera 1867, Cambridge (Mas. Fogg Are Museum pdginasseguntes John Wiliam Waterhouse, Uisses eas sereias 891, Melbourne, National Gallery 0s infernos Hesiodo (sée. VIL aC.) Teogoniia, 736-773 Trata-se ¢ 1m local tetro, esqul até mesmo os deuses odeiam, E uma chegaras a tocar seu fundo, pois ante i para cd sem te conceder respito (.) Lit esta a horrenda casa da tenebrosa Noite, coberta de lividas nuvens. Antes dlesta, bem plantado sobre as pera, filho de Japeto rege firmemente 0 amplo ‘céu com a cabega © com as mios Bem naquele ponto, Noite e Hemera cencontrando-se, trocam siudagdes na hora fem que — uma para stir € outra para das juntas contemporaneamente, mas sempre uma dekas, do lid de fora, vai percorrendo a terra, enquant dentro, fica a espera de que surf, agort para ela, o momento de sain. Uma leva aos Terestres a Juz que a tudo ilumina; a sua vez, a fosea Noite com seu outea, pe rmanto de densa caligem, cartega nos bragos Hipno, iio de Tanatos, ©.) Hélio, 0 esplendente, nunca os no céu, nem quando dele a primeiro, pkicido e grato aos homens, gira sobre a terra € sobre a vasta extensio do man, © outro, a0 contro, tem um bronze no peito: arrebata os homens para rio mais deixa-los até mesmo dos deuses imortais € inimigo, Embaixo, mais adiante, ergue-se a ribombante morada do deus subterrinec r possante Hades ¢ da assustadora Cre eee core Cea cet ney Peetu eet cre) CSC oe Bun OO Mt eee ny Dees Cea eee ed Pe tn cues ee eacie e eane CCC Rui ee CM et eeu ee ot BUS OeCac cicero Dc oe kee ce SOE A Rc ae ee SCG ee Ne com 0 mundo ciistéo: de um ponto de vista teolégico-metafisico, todo OS a ae ee uc enue COE a ae eee ake ae oe Ro TE CMe eke et atc OTe uC es Dr We te Oe cy na beleza de todo o ser. Com o Génesis, eles aprendiam que, ao final do sexto dia,"Deus viu tudo o que tinha feito, e era muito bom’ (1,31), Ce eae tr eee) DO RS ea ee acy Dee Oe ees ee eRe ee Coenen ee ee Eu re ay conceito de origem platénica e Calcidio (século IV d.C), em seu Comentario ao Timeu, falava do“espléndido mundo dos seres gerados... Cee cso influenciada por uma obra de cunho mentario aos nomes divinos, do pseudo- 10 inexausta irradiagag universo aparece com jionisio Areopagita. Aqui o univ i rd Priel na grandiosa manifestacdo da difusividade da beleza le esplendores, uma gf : ae eas ma cascata ofuscante de luzes: 0 Belo supra-substancial primeira, uma c tir dele, dissemina-se causa da Beleza que,a par eee a jedida. Ela € causa da harmonia ‘Aldade Média seré muito neoplatdnico (século V), 0 Con d undo a propria m entre todos os seres, segun fa ren e do esplendor de todas as coisas, e expande sobre cada uma, sob a forma de fulgidissima luz, as efusdes de seu raio manancial que as fazem belas, chama a si todas as coisas, e portanto é justamente denominada Beleza recolhendo em si mesma tudo em tudo” (Nomes divinos, IV, 7, 135) No rastro do Areopagita, Escoto Eriugena (séc. IX) vai elaborar uma concep¢ao do cosmo como revelacao de Deus e de sua beleza inefavel através das belezas ideais e corporais;e se difundira sobre a venustidade de toda a criacao, das coisas semelhantes e das dessemelhantes, da harmonia dos géneros e das formas, das ordens diferentes de causas substanciais e acidentais compreendidas em maravilhosa unidade (Adivisao da natureza, 3).£ nao ha autor medieval que ndo retorne a este tema da pankalia, ou beleza, de todo o universo. Para uma identificacao tradicional de Belo e Bom, dizer que todo o Universo era belo signifcava dizer que também era bom ~ e vice-versa Como concilar esta persuasio pancalista com o fato evidente de que existem no universo 0 Mal e a deformidade? A solucao foi antecipada por Santo Agostinho, que fez da justificacao do Mal em um mundo criado por Deus um de seus temas fundamentais 'No Sobre a ordem, Agostinho argumentava que haveria, é verdade, condenado ha de estar em meio ‘antos milhées de outros danado pelo fedor que exalam. (. Mais Penam (digo) pelo fedor, pelos gritos & pelo apemto, pois estario no inferno uum sobre o outro, come welhas amontoadas 2s em tempo de invemno (..) Donwle, viri depois a pena da imobilidade (..) De moxk que © dank inferno no dia fia ficar sem mudar de lugar e sem poder mover nem tum pé, nem uma flo, enquanto Deus for Deus. Seri acormentado 0 ouvido com gritos ontinuos « prantos dos pobres lama ertanga que chora? Miseros que tendo de ouvir danad continuamente para tox a redores! Seri com a fome; 0 danado Mas iio tees nunca wma migalha de pac er também wm sede tal que 10 Ihe bastara tox a gua do mar mas dele ndo teri uma gota sequer uma gota era 0 que Epubio. imp) YA pena que mais atormenta os do sentidos do condenado € 0 f inferno, que atormenta 0 tato (..) Também nesta terra a pena do fogo granule 4 diferenga entre 0 noss Fogo € aquele do infer que S Agostinho diz que 0 nosso parece pintado (.. De modo que 0 misero seri crcundado pelo f uma acha dentro da fornalha. 0 danado tera um abismo de foge ahuixo dele, um abismo acima © um abismo a0 redor. Se ele ta, ¥8, ou respira, ilo toca, nio vee nem respira outa coisa sendo fog Estar no fogo con ms RO como peixe na agua Mas este fogo nio estara somente 10 redor do danado, mas entrar também em suas visceras para de moo cerebro dent da abe, oa dentro das ossos: cada danado fornalha de fogo (..) Se o infer Se etemo, no sera infer A pena que no chia muito nao ¢ vuma grande pena, De um enferme corse um apostema, de ui out se queima uma sgangrena, a dor ¢ grande, mas como acab es pouco, mio € grande o Mas que pena sera, cou aquela operigio de ccontinuasse por uma. sen 5 fam mes intro? Quand e bastante long toma doe nds Othos, uma dor ‘edema, torna-se insuportivel, Mas por que flo dle dor? Mes Comedia, uma musica que dr demas ou seguisse 0 dia i indo se poderia suportar pelo ted E se durasse um més? Um ano? 0 que seri o infermo? E onde nio se fouve sempre a mesma comécia ow de no hi Pee T Cs Gs ou fan Oe ea sears ere Inferno moderno Jean-Paul Sar Entre quatro par * INES ~ (Othe para ele sem mi A (Pawsa) Calma! Ji entendo.. ja Luca de Lida tiptico do Juleo Fino detalhe 1527, Leiden, Musée Municipal de akenhal eentendi porque nos botarsm juntos. GARCIN ~ Cuidado com 0 que Vai INES — Voce vai ver que idiotice Idiota como uma floe! Nao tem tomura fisica, no € verdadk? E, no de ser castigado, né? Ninguém vem fim, 56 nds, juntos, nao € iss £ dl ato que esti faltando alguem aqui GARCIN = CA mela 102) E, eu se pessoal, isso. S’0 08 proprios clientes que fazem 0 servigo, com ESTEE ~ 0 querendo dizer? Mas o inferno serd uma obsessio nos séculos sucessivos e nos sermoes ‘quaresmais barrocos (ver Marchelli e Santo Alfonso Maria de’ Liguori) fie! é aterrorizado por uma descrigao dos tormentos infernais que supera a violencia dantesca, mesmo porque nao é redimida pelo sopro da arte. A idéia do inferno retorna até em uma perspectiva existencialista e atéia quando, nos dias atuais, Sartre encena um inferno contemporaneo, em sua peca Entre quatro paredes: se somos definidos pelos Outros quando estamos vivos, por seu olhar impiedoso que revela a nossa feitira ou a nossa vergonha, ainda podemos nos iludir com a possibilidade de que esses outros nao nos ‘vejam como somos. No inferno sartriano (um quarto de hotel de luz sempre acesa e porta fechada, no qual és pessoas que nunca tinham se visto antes, terdo de conviver eternamente),a0 contratio, ndo se pode escapar do olhar do Outro e vive-se apenas de seu desprezo. Um dos personagens grita: “Abram, abram, vamos! Eu aceito tudo: as botinadas, os ferros,o chumbo quente,(..) quero sofrer para valer..” Mas em vao:”..fornalhas, grelhas...Ah que piada. Nao precisa de nada disso:0 inferno sao 0s Outros” 3. As metamorfoses do diabo No centro do inferno reina Lucifer, ou Satanas, se preferirmos. Mas Sata, -avam presentes anteriormente. Existiam en diversas culturas varios tipos de deménios, como seres intermediarios que as vezes sao benévolos e as vezes malévolos (embora no Apocalipse também 0s ‘anjos” sejam coadjuvantes tanto de Deus, quanto do aspecto monstruoso: no Egito o 0 diabo, o deménio ja est deménio) e, quando malévolos, de monstro Ammut, hibrido de crocodilo, leopardo e hipopétamo, devora 0s condenados no além-tumulo; existem seres de feigOes bestiais na cultura mesopotamica; em varias formas de religiao dualista existe um Principio do Mal que se opée ao Principio do Bem. Ha o diabo como Al-Saitan na cultura islamica, descrito com atributos animalescos, assim como existem varios deménios tentadores, os gul, que assumem 0 aspecto de mulheres belissimas, Quanto & cultura hebraica, que influencia diretamente a crista, € 0 diabo, assumindo a forma de serpente, quem tenta Eva no Génesis e na tradicao, interpretando alguns textos biblicos que parecem se referir a outra coisa, como em Isaias e Ezequiel, ele estava presente no inicio do mundo como © Anjo Rebelde que Deus precipitou ao inferno. Sempre na Biblia, encontramos meng6es a Lilith, monstro feminino de origem babilénica que, na tradicao hebraica, transforma-se em deménio feminino com rosto de mulher, jongos cabelos e asas e que era vista, na tradicao cabalistica (0 alfabeto de Ben-Sira, séc VIl1X), como a primeira mulher de Adao que depois se transformou em deménio. Mas pode-se acrescentar também o dem6nio do meio-dia do Salmo 91, que aparece inicialmente como anjo exterminador, mas na tradi¢ao monastica se transforma em tentador da carne, e as numerosas alusoes a Satanas em varias passagens, onde ele vai aparecendo como 0 Caluniador, © Opositor, como aquele que insta para que Deus ponha J6 a prova, como © Asmodeu em Tobias. a Sabedoria (2.23-24) dird:"Deus criou o homem para a incorruptibilidade e 0 fez imagem de sua propria natureza; foi por inveja do diabo que a morte entrou no mundo. Nos Evangelhos, 0 diabo nunca é descrito, salvo pelos efeitos que provoca, ‘mas, além de tentar Jesus, ele é expulso varias vezes do corpo dos endemoniados, é citado pelo proprio Cristo e & definido de forma variada como 0 Maligno,o Inimigo, Belzebu, o Mentiroso,o Principe deste mundo. acter, rex Alone, A queda dor i sais, 14:1 sencesor rolocaret me Batalh Ipocalipse Um sinal entre Miguel € 0 Dr: Parece ébvio, também por motivos tradicionais, que 0 diabo deve ser feio. Ele jé é evocado assim por S80 Pedro ("Irméos, sede sobrios & Vigilantes! Eis que 0 vosso adversario,o diabo, vos rodeia como um leao a rugir, procurando a quem devorar’) € é descrito na forma de varios ‘animais nas vidas dos eremitas. Em um crescendo de feiuira, invade pouco a pouco a literatura patristica e medieval, sobretudo aquela de cardter devocional 0 diabo aparece para Rodolfo, 0 Glabro; bandos de diabos aparecem em narrativas de viagens a paises exdticos, como em Mandeville, ¢ por varios séculos circulam lendas pias sobre o "pacto com 0 diabo": 0 diabo tenta 0 bom cristao e 0 faz firmar um pacto, que hoje diriamos faustiano, ‘mas geralmente 0 cristo consegue escapar de suas armadilhas no final A lenda medieval de Cipriano também fala de um pacto com o diabo: um jovem pagao vende a prépria alma ao deménio para possuir a jovem ‘amada, Justina, mas,finalmente, tocado pela fé da donzela, se converte € ruma junto com ela para 0 sacrificio. O tema sera retomado em seguida por Calderén de la Barca, em seu O magico prodigioso (1637). Mas uma das verses populares de maior sucesso desde os primeiros séculos cristaos foi a Lenda de Teofilo: o protagonista, diacono na Cilicia, caluniado junto 20 bispo, é privado de sua dignidade. Para recuperé-la, Teofilo encontra 0 Diabo gragas ajuda de um magico judeu; ele Ihe pede que venda sua alma e renegue Cristo e a Virgem. Firmado 0 pacto, Teéfilo recupera 0 posto, mas depois de sete anos vivides como pecador se arrepende, implora durante quarenta dias 4 Virgem, que intercede junto a seu filho e consegue reaver 0 pergaminho fatal, festituindo-o a Teofilo, que o queima e da testemunho. Ppuiblico de seu erro e do milagre. Alenda de Teofilo pode ser encontrada em Paolo Diacono, no Speculum Historiale de Vincent de Beauvais, na Lenda durea de Jacques de Voragine, em um poema de Roswita, em Rutebeuf e na literatura inglesa © espanhola ~ pata nao falar de seu retorno no Fausto goethiano. Uma das mais eficazes representagdes do milagre de Te6filo pode ser vista no timpano da igreja romanica de Souillac, com uma sequiéncia de imagens (definida como antecipadora dos quadrinhos) que acompanha o desenvolvimento da histéria: embaixo, a esquerda, © diabo estende 0 pergaminho a Teofilo, direita, o didcono assina © no alto aparece a Virgem que desce do céu para retomar o documento do diabo, Nesta escultura, 0 diabo ja aparece feio, periodo, ainda nao é representado em t mas, segundo as imagens desse toda a sua feilira,e num mosaico de S. Apollinate Nuovo, em Ravena, datado de cerca de 520, ele é fepresentado como um anjo vermetho,€ somente a partir do século XI ue ele comeca a aparecer como um monstro dotado de cauda, orelhas animalescas, barbicha caprina, artelh também asas de morcego. 105, patas e chifres, adquirindo padre Teil faz lumpactocomo diabo, sex, Timpano de Soullac Acta sanctorium Truculento ertivel de Forma, grande de cabs de prescogc macilento de squilido de bacha, peludo nas orelha ke fronte sinistro de olhos, fetido de boca, eqtino de dentes, lancando chamas da boca, turvo nas goelas, amplo de libio, espaventas de boca, saliente de peito, eseabroso de cealeanhar. Rodolfo, © Glabro € 0 diabo Rodolfo, o Glabro (sée, XXD Gronicas, V Fatos do por vontade de Deus, ustamente comigo, tempos até hem recentes. Quando residia no monasterio do, Beate Leodegitio, em Champeaux, uma noite antes da hora das matinas, apareceu-me a0 pé do leito uma figura de homtnculo de aspecto tenebroso. No que me fot passivel ddistinguir,tinha modesta estatura, pescogo. fino, rosto chupado, olhos nigerrimos, fronte encrespada de ru boca protuberante, labios inchados, queixo Jo, barba caprina, orelhas estreito € 3. AS METAMORFOSES 00 DIABO hirsuta © pontiagudas, cabelos hittos e desgrenhiados, dentadkira canina, ern alongado, peito saliente, dorso coreunda nidegas que balangavam, roupas suas; cestavi apressado e com todo © corpo em agitagio, Agarrou uma ponta do colchio de palha onde eu estava e sacuch a cama com terrivel violencia; depois falou: “Ta rio ficaris mais neste local” Ao despertar sobressaltado, como agontece 3 Yezes por ‘causa do susto, vio ser que descrevi Rilhando os dentes, repetiy varias vezes: io fiearis mais aqui.” Precipitadamente pale da cama e corn pe de, jogandorme aos pes do aar do sntisimo pai Benedito, fiquet por longo: tempo aterrorizado, Tentava trazer a meméria com a maxima atengao todos os mal los € as culpas graves que voluntariamente o por descuid, tinha comeaido desde a infincia, E como nem 1 de Deus tinhat alguma vee me induzido a penitencia ow 1 reparagao de tudo isso, jazia dolente € desvanecido ¢ nao me vinha nada de melhor a dizer que estas simples palavras: Senhor Jesus, que vieste para a sl dos pecadores, em virude da tua imens misericordia, tem piedade de min! As tentagdes de Santo Ant6nio " sat > dent nt s poderes contra rio da duracdo Cristo" assim que AniSnio 7 Fo loca enc pO por uma chicotada : O éxtase da tortura ‘ ’ a : » fac No mei do pio, em pen» : : painter con pean se © diabo em toda a sua monstruosidade nao apenas impera,aterrador ! cad chicotada tok mene em miniaturas e afrescos, mas ja tinha sido evocado vividamente nos ta bem pod ane Ssmohmino.cveis, relatos das tentagoes sofridas pelos eremitas (ver por exemple, a Vida de * o data, frente frente, 4 wa visa, Pracotee Santo Anténio de Atandsio de Alexandria). Nesses textos, ele assume mend aoe tes : ore arb também o aspecto convidativo de jovenzinhos amb/guos ou prostitutas impudentes,a tal ponto que, nos tempos modernos, entre romantismo wiravolta quase blasfematoria do tema feidra do diabo tentador ea Jora do diabo e os langores e decadentismo, tem lugar uma re\ da tentacao, destacando-se, mais do que a oe Mates forca do eremita que resiste,a imagem ten wwe do tentado (como em Flaubert, por exempl wa 6S Sar da esquerda para ‘Abracay, Blzebuth, a, Deus Haborym, de Colin de Pancy, Dictonnare infernal Paes lon 1863, principe dos demenies Silogeu fantasmagorico de todas as feidras diabdlicas, o Baldus (1517), escrito por Te6filo Folengo sob 0 pseudénimo de Merlin Cocai, é um Poema herdico-cémico grotesco, galhofeiro e goliardesco, a0 mesmo tempo parddia da Comedia dantesca e antecipacao do Gargantua ‘abelaisiano, do qual infelizmente é impossivel dar um exemplo antol6gico, pois ou é saboreado em seu latim macarrénico ou, traduzido, Perde todo o sabor. Entre as varias e picarescas aventuras do protagonista ge Seus amigos encontra-se, no livro 19, a batalha contra uma grande Hi ms SRE eens Por uma colagem de formas animalescas: Toros aan ig Us0s€ porcos com chifres, mastins de trés pernas, pied Fbbes nae cabes#8 de Gigante com focinhos de lobo, micos, sib oes, Pabuinos, grifos metade ledo e aguia, metade dragao, corujées com partes de mi ; lorcego, monstros com bicos de mocho e bracos Mas a moral dessa batalha diabo nao € derrotado, poi sobretudo na ambicao dos Dimensdes do diabo Em seus escritos, Lutero ird identificar muitas vezes 0 pontifice romano tanto com 0 diabo quanto com o Anticristo. Lutero obcecado pelo diabo e a lenda reza que, em uma de suas aparic6es, ele 0 expulsou jogando-lhe um tinteiro. Mas mesmo sem a lenda, em suas Conversas mesa aparecem invectivas deste tipo: “Muitas vezes expulso 0 diabo com um peido. Quando me tenta com pecados tolos, digo-Ihe: Diabo, ontem mesmo eu te mandei um peido: colocaste na conta?” (122). Ou entao: “Quando acordo, eis que logo chega o diabo e disputa comigo até que eu Ihe diga: ora, vem lamber meu cu... Porque ele nos atormenta antes de mais nada com a diivida. Em compensacao, temos o tesouro da Palavra. Deus seja louvado" (141). Contudo, jd em Lutero e em seguida na tradicao protestante ganha espaco uma concepcao (que nao sera partilhada pelos fandticos protestantes que, mais tarde, darao inicio a persequi¢ao de feiticeiras e feiticeiros suspeitos de terem feito pactos com 0 deménio, como veremos no cap. Vil) segundo a qual o diabo identifica-se com os vicios dos quais se torna simbolo. De fato, a maior coletanea demonoldgica publicada em ambito protestante, 0 Theatrum diabolorum (1569), um grande volume de cerca de setecentas paginas, aborda todos os aspectos da demonologia (calcula-se até mesmo que o ntimero dos diabos ¢ 2,665.866.746.664), porém nao nomeia os diabos tradicionais, mas os diabos da blasfémia, da danca, da luxtria, da caca, da bebida, da tirania, da preguica, do orgulho ou dos jogos de azar. —_ Enquanto tem inicio a reforma protestante, morre Hieronymus Bosch, cujos seres infernais sao hibridos que fazem pensar nas colagens diabdlicas do Baldus, mas estdo muito distantes da iconografia precedente. Nao nascem da mist acos de animais conhecidos, mas tem uma autonomia oriunda de pesadelos e nao se sabe se vém do abismo ou vagam, observados, em nosso mundo. As criaturas que assediam o eremita no fentacoes de Santo Anténio nao sa0 os deménios da tradicao, maus demais para serem levados a sério. Quase divertidos, como ersonagens carnavalescos, eles sao bem mais insinuantes. A respeito de Bosch, falou-se, ndo por acaso, de “demoniaco na arte’ de fermentos heréticos, de apelos ao mundo do inconsciente, alusdes alquimicas e antecipacoes do surrealismo, Antoni de se ad Artaud refere-se a ele no contexto teatro da crueldade” como um dos artistas que souberam reve ado obscuro de nossa psique. Bosch era membro de uma Confraternidad de Nossa Senhora, de espitito conservad 0 lor, mas voltada para uma reforma mes, de modo que suas representagoes fazem pensar antes em {ime série de alegorias moralizantes sobre a decadéncia daquela época licias ou em O carro de feno, nao temos apenas visoes ulftireas do além, mas também enas aparentemente delicadas, sensuais rivelmente inquietantes, do mundo dos prazeres tetrenos que ha de nos levar ao que ha de nos levar ao inferno. Bosch parece quase antecipar 0 rum diab espirito do The diabos lorum:o que oferece nao sao visoes do: existentes, mas antes imagens dos vicios da sociedade em que vivia Cy on con PP Cod © mundo cléssico era muito sensivel aos portentos ou prodigios, que CEU eae ee ee recur Cee Uta ec a nC UCR Ree ee ene RC no Livro dos prodigios de Giulio Ossequente (que, no século IV d.C,,anota Ree ee ees Seu ae ees et eo nu ee kee kau UC Pees Meet hae ur ae een aula que sobre as mesmas bases tenham sido concebidos, pelo menos em Pe une tr ace Pen card Ceo ues ec Merc RUE Cit) Re ete eee eau cute eC eS ee ae) crocodilo, mas que passou para a tradicéo como 0 Leviat. Ctésias de Cnido CO Cra CUO UC eC Murer coe Ree) Bo ee a aR a Cen ee Me he ee Rear Pree et Ske ee ee Re ned Doe OCT er eRe Oe nee ear ry COUN eae ee Cn eee mete Oe eerie ce ued cs Dt eer CME ee eed Do ance cue tt ee cue eet han UT Neen Me au MRM Cees Paes furor das tempestades. : iy 0 androgino pelo, F de cada um que fendi, mandlava Apol na peda 0s portentos a mem Giulio: Ossequente (sée. 1V) a renllda an f 2 ele i + funda sto felpas para ck , He Se artasta sob ' z mo uma cal pty a teimador d Iv, MONSTROS EPORTENTOS ‘Aeconcre eg ‘ontraes homens deletireetlavraye histoire du bono Alexandre, Royal ms, 20,8 XX 51 seenv, Londres, Brits Library As aventuras de Alexandre © romance de Alexandre, I 33 ee. XW) habitada por selvagens semelhantes a olhos de foge ee € parecem ledes. Com eles havia também outros seres que se chamam Otis: ni ti r om Ot fem um 6 pelo 1 corpo, s40 altos quatro cabitos ¢ ‘omprides como tuma langa, Assim que directo, Cobriam-se m pels defo, ern fortissimas ¢ trein: i foramen ewes paso Combate ® atingiamos, mas eles pém nos atacavam com hastoes e Soldados. No dia sey i crn is, No da segue, resol encontramos, as, feras com leds, mas que tin Partimos em seeuid echegamos mel: havia um @ de pélos om > pas rdenet au 0 ie * encarurnos com seu olhar seh ‘Ordenei entio ‘Que apresentasse dian TT lang: : aM|-Se CONF NOS OULFOS se especie, 405 milhares, © nosso exército tinha quarenta mil homens: ordenei entio {que pusessem fogo aos visto do f¢ ados ¢ eles, 3 escaparam, Capturamos que niio aceitaram comida por oito dias e Morreram. Tais seres nao falam. como os humanos, mas latem como os cies, Uma estética do desmesurado Estas e outras noticias acabaram alimentando o surgimento daquela que foi definida como estética hispérica A latinidade classica ja havia condenado o estilo dito ‘asiatico” (e depois “africano’), em oposicao ao equilibrio do estilo “atico’ Este estilo era considerado feio também pelos padres da Igreja, conforme testemunha a seguinte invectiva de Sao Jeronimo (Adversus Jovinianum |):"Existem atualmente tantos escritores barbaros e tantos discursos que os vicios de estilo tornam confusos, que nao se compreende mais nem quem fala, nem do que fala, Tudo se incha e se relaxa como uma serpente doente que vai se despedacando enquanto ensaia suas volutas (..) Mas de que servem tais bruxarias de palavras?” Entre 0s séculos Vile X assiste-se, porém, a uma reviravolta do gosto, pelo menos em uma area que vai da Espanha as ilhas Britanicas, tocando a Galia. A estética hispérica € 0 estilo de uma Europa que esta vivendo seus *séculos obscuros’ uma Europa na qual, com a decadéncia da agricultura, © abandono das cidades, o desmoronamento dos grandes aquedutos e das estradas romanas, em um clima geral de barbarizacao, em um territorio coberto de florestas, os monges, os poetas, 0s iluminadores também véem o mundo como uma selva obscura, habitada por monstros, atravessada por caminhos labirinticos A pagina hispérica nao obedece mais as leis tradicionais da proporcao: aprecia-se a nova musica dos incompreensiveis neologismos barbaricos, privilegiam-se as longas cadeias de aliterages que o mundo classico consideraria pura cacofonia, preza-se ndo a medida, mas antes 0 gigantesco e o desmesurado. Sobretudo os monges irlandeses que, naqueles séculos dificeis e desordenados, haviam conservado e reconduzido a Europa continental uma certa tradi¢ao literaria, movem-se no mundo da lingua e da imagina¢ao visual como, justamente, em uma floresta ou como 0 irlandés sao Brandao vagava pelos mares ~ ancorando-se em uma horrivel baleia confundida com uma ilha e encontrando Judas prisioneiro em um rochedo, batido e atormentado pelas ondas marinhas. Entre os séculos VII e IX, talvez em terras irlandesas (mas certamente nas ilhas Britanicas), surge o Liber monstrorum de diversis generibus, que além de descrever monstros de todo tipo, comenta sua variedade. Ele nos diz (livo Il): "S2o sem duivida infinitas as raas de feras marinhas que om corpos desmesurados como altas montanhas, sacodem com seus peits as ondas mais gigantescas e as extens6es de agua quase erradicadas das profundezas (..) Sugando com horriveis redemoinhos as Aguas ja agitadas pela grande massa de seus corpos, dirigem-se para a praia een a calor tum espetaculo aterrorizante’ Neste clima, surge na Irlanda is ornado de espléndidas letras capitulares nas quais triunfam os entrelacs, rendas labirinti inticas em que aparé jun sep ee parece, junto com figuras divinas, pennee crate: monsrusas de odo tipo Sao formas de anime estilados, Pe imiescas entre folhagens impossiveis que cobrem paginas sige crrarneesore os matvos sempre gua de um tape, embora cada nha wn de voraroes ep tesente de fat uma invengio diverse.£ uma complica : mes, ignorantes de qualquer re simetiajem uma sinfona de cores dlcades de ova os arcs ae do limao a0 malva. Quadrupede impensaveis fi introduzisse lelicadas, do rosa ao amarelo-laranja, saa nadtupedes stars ibréus com bcos de cine oe 's contorcidas como um atleta de circo que "ga entre os joelhos, revirando a cabeca e inicial de uma letra, compondo a icos coloridos eA oe ras iniciais,insinuam-se linha apés linha 3. Amoralizacao dos monstros Como estes “felissimos” monstrinhos eram compreendidos pelos monges devotos? Certamente da mesma maneira como serdo apreciados outros seres disformes colocados nas margens das paginas iluminadas (os chamados marginalia) e nos capitéis das igrejas romanicas nos séculos sucessivos. Os medievais consideravam 0s monstros atraentes, assim como nos fazemos com os animais exdticos do jardim zoolégico: prova disso € a €nfase com que um rigorista como sao Bernardo (na Apologia a Guilherme) condena as esculturas dos capitéis, sob as quais é evidente que os fiéis se detinham com gosto excessivo (embora a eficacia com que as descreve leve a crer que ele também as observava mais do que o devido):"O que faz nos claustros (..) aquela ridicula monstruosidade, aquela espécie de estranha formosura disforme e deformidade formosa? O que estao a fazer ali os imundos simios? Ou os ferozes ledes? (..) Podem ser vistos muitos corpos sob uma tinica cabeca e, vice-versa, muitas cabecas sobre um unico corpo. De um lado, emerge um quadrupede com cauda de serpente, de outro, um peixe com cabeca de quadripede. La um animal tem aspecto de cavalo e arrasta posteriormente uma meia cabra, aqui um animal cornudo tem traseiro de cavalo. Em suma, mostra-se por toda parte uma tao grande e tao estranha variedade de formas heterogéneas que se tem mais gosto em ler tais marmores que os cOdices, em ocupar a inteira jornada ‘admirando tais imagens uma a uma que meditando nas leis de Deus.” SSeS Também os monstros $80 fithos de Deus Agostino (se. VV) 4 cidade de Deus, X18 Pergunts-se, além diss dos filhos de Noe ou, melhor mr exces também procedem, se hai squem esses tambem P ‘cents rics de homens intra dos eto, que alguns se € crivel que de Adio, de propa Ironsirvosos de que ahi Life, Ase im of Jos para ts, que Outros nsuem ambos 08 d Ja de mulher, © que de homer a esqverd de servindose camalmente deles im e dio 3 hz alernativamente, geram ¢ d jo tém boct Também contam que alguns ce vivem exclusivamente do af, respirado pelo nariz. Mirmam que outros tem um Civado de altura por isso 08 Breges Os ‘chamam de pigmeus € que em algumas tenides as mulheres concebem aos cinco de igual mado, exisiem homens de velocidade expantosa e que, no verio, Ueitados de costa, se defendem do sol com a sombra dos proprios pés. (.) Deus, ador de todkis as coisas, conbece onde uando € 0 que € ou foi oportuno crar € ixtemas, conhece a beleza do universo e a semelhanga ou diversidade das partes que Mas, de fato,o mundo cristo jé havia realizado uma verdadeira “redenc3o" Griador equivocido no niimero de dedos do homem. (..) Em Hipona-Diarrito ha un hhomem que tem a planta dos pes em, ras extremidades, e assim também as mos. Se houvesse alguma nagio com igual tara, acrescentar-se-ia Aquela curioss e surpreendente historia. Negaremos, por fss0, que tal homem se origina do pret ioradores poderiam, glorando-se da Fmpune vaidide tnlarse de nagbes de eee tn de pinion fou que, se homens, descendem de Ada do monstro. Como ja vimos (no capitulo 2.1) a propdsito da visdo pancalistica, Agostinho dizia que os monstros eram belos enquanto criaturas de Deus.O proprio Agostinho (na Doutrina crista) tentou regulamentar a interpretacao alegérica das Escrituras Sagradas, advertindo que é preciso descobrir um sentido espiritual, além do literal, quando 0 livro sagrado parece se perder em descricoes aparentemente supérfiuas de edras, plantas ou animais. Mas para entender qual € o sentido espiritual de uma pedra preciosa ou de um animal, era preciso ter a mao uma “enciclopédia® que dissesse qual o significado alegérico daquelas coisas. Nasceram assim os bestiérios moralizados, nos quais cada criatura mencionada (nao importa se real ou legendaria) era associada a um ensinamento moral. O primeiro texto a entrar no mundo cristéo com esse cardter foi 0 Fisiélogo, escrito em grego entre os séculos Ile Ill de nossa era e traduzido €m seguida para o latim, além de varias linquas orientais, istando cerca dé uarenta animais, pedras e arvores. Depois da descricdo de cada ser, 0 Fisiologo mostra como e por que cada um deles é 0 veiculo de um Ensinamento ético e teol6gico, 0 ledo, por exemplo, que segundo a lenda aPaga as proprias pegadas com o rabo para escapar dos cacadores, \ansforma-se em simbolo de Cristo, que apaga os pecados dos homens a Licome, tem vtes des proprétés ddesonimau, ts 3401, 1566, Pars, Bibiotneque Sainte-Genevieve Do Fisislogo Gee. 1D (© unicémio € um pequeno anima semelhante a0 cabrito, mas ferocissiny cacador nao consegue se aproximar dele por causa de sua extraordinaria forga Tem um so ch meio da eabeca Como fxzem para caciclo? Expoem uma virgem imaculada, © animal pula em seu regago € ela o amamenta € 0 condu? 20 palicio do rei, O unicOrio € uma imagem fo Salvador: de fato (.) ele fez morada no venire da verdadeira ¢ imaculada Vingem Maria clefante. Nele nao existe desejo de ceonjungio eamal: quando quer ge filhos, dirige-se para o Oriente, perto do paraiso, onde se encontra. uma arvore chamada mandrigora. A femea colhe nrimeiro o fruto da drvore, oferece a0 nae fncita, para que ele também prove. Depois de comer, 0 macho nproximacse dla femea € unese a ela (.) ‘Quando chega a hora do parto, entra em tum lago até que a agua chegue 2 alura de suas mamas e depois dé A luz 0 seu filho na Agua € este timo fica de joethos € suga seu seio (.,) A natureza de tdlefante & assim: se cai, nao € capaz de relhios. De que modo cai? Quando quer dormir, apGia-se em uma dirvore € os igadores, que conhecem a natureza do ono da clefante, serram parcialmente 0 {100% irvore. © animal chega para se encosta, ‘ai junto com a drvore € comeca a langar altos bramidos, Outro elefante 0 ouve € 2AGKO.00S MONSTROS 5, AMORALIZAGAO OC nos a bramir« ré-lo; poemse re elefantes, mas nem assim ‘onseguem erguer 0 que esti cai; eniao, pac xis rami e ches tenfim, um pequeno elefante, poe sua {romba embaixo daquele e 0 ergue ¢ O elefante ¢ sua feémea sto, portanto, imagens de Adao ¢ Eva: quando estavam nas delicias do paraiso antes da transgressio, nao conheciam a uni ‘armal ¢ 0 acasalamento. Mas quando a mulher comeu o fruto da arvore, isto € ‘da espiritual mandrigora, ¢ oferecet-o a0 hhomem também, entao Adio conheceu 1 mulher € gerou Caim sobre as aguas maléficas (..) Veio entio o grande elefante, isto & a Lei, € nao foi capa, Ue ergué-lo; depois vieram doze elefante {sto &, profetas, mas cles também nao cconseguiram reerguer 0 homem caido: depois de todos estes, veio o sunt lcfante espiritual e, enfim, reergueu 0 omem. O Fisi6logo disse da vibora que rosto de homem ¢ a femea, ‘macho ten rosto de mulher: até o umbigo tem forma jumana, enquante a cau € de crocodilc A femea nio tem vagina, mas apenas uma especie de buraco de agulha. Quando 0 ‘em sua boca e ela, depois de engolir 0 Sémen, decepa os genitais do macho, que norte instantaneamente, Quando os filhos erescem, devoram ventre da mie (..) As viboras Xio, portanto, parricidas rmatricidas. Bem comparou Joo as viboras nos fariseus: da mesma forma como a

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