You are on page 1of 3
Frangois Ascher, Metapolis: Acerca do futuro da cidade. Oeiras, Celta Editora, 1998, ix+240pp. . (tradugao de Alvaro Domingos) A Celta tem vindo a reforgar a sua ima- gem enquanto editora capaz de colmatar o défice de publicagées existente em Portugal nos dominios do urbanismno e da sociologia urbana. Com efeito, quer através da colec- cao Geografias (onde agora é traduzida Metapolis: ou l'avenir des villes, de Francois Ascher, Editions Odile Jacob, 1995), quer através da colecgao Sociologias, a Celta tem dado a estampa um significativo numero de obras onde a cidade e a cultura urbana se tomam objecto de analise. E neste rumo que pode ser enquadrada @ obra agora publicada. Contrapondo, de um lado, a concentragao da populagéo mundial nas grandes cidades (metropoliza- g40) ©, de outro lado, os discursos negati- vos que, sendo historicamente dominantes, se produzem acerca desta realidade urbana, Frangois Ascher sustenta que nos ‘encontramos face a uma nova forma urbana que designa por metapole. Partindo desta hipétese, Ascher, convencido da inevitabili dade da metropolizacao, procura dar res- posta a sete grandes quesiGes que Ihe per- mitem sugerir @ necessidade de mudarmos quer as formas de pensar as metrépoles, quer os modos de concepgao e de aplica~ 40 do urbanismo, quer ainda os modos de gestao dos conjuntos urbanos. Trata-se, no fundo, de salientar que o desafio das gran- Recensées des metrépoles é dotarem-se de um espirito de cidade, convertendo-se em metdpoles. A primeira grande questéo que o autor aborda é a do crescimento e da expansao das metrépoles. Afinal, 0 fenémeno da metropolizagao representa o fim das cida- dos, ou uma nova fase do processo de urbanizagao © uma nova forma de cidade? Tratando-se de uma questo antiga, outrora formulada em termos da relagao cidade- -campo, a ditvida acerca do futuro das cida- des (um futuro entre 0 florescimento conti- nuo @ a depress por asfixia proveniente do crescimento) 6 uma dtivida recorrente sempre que se verifica um avanco nos meios de transporte e de comunicagao. «Cada nova dindmica urbana provoca uma expectativa ou uma crenga no desapareci- mento das cidades» (p. 19). Em resposta a esta questdo, Frangois Ascher encara a metropolizagéo como uma etapa do pro- cesso de urbanizacéo que abre caminho ao surgimento das metépoles. A segunda grande questo que Ascher coloca prende-se com o papel da evoluggo técnica no rumo da urbanizagao. Esta quos- tao levanta um tol de diividas acerca do futuro das cidades. O desenvolvimento pre- sente das telecomunicagées e dos transpor- tes contribui para travar 0 crescimento das grandes cidades ou, pelo contrario, leva a intensificagao desse processo? As teleco- municagées substituem-se aos transportes ou estimulam-nos? Sera que estas novas técnicas agravam as desigualdades entre tertitorios ou potenciam novas oportunida- des de democracia e de equidade? 183 184 Recensoes Face a estas duividas, o autor manifesta desde logo a sua oposigéo a qualquer determinismo tecnolégico. A existéncia de novas técnicas n&o produz por si sé efeitos sobre as cidades. Os usos das novas tecno- logias derivam da sua capacidade de servi- tem as dindmicas sociais que sao valoriza- das @ as escolhas politicas que sao feitas. Sao estas forgas sociais @ politicas que temos de analisar em primeiro lugar se que- remos entender © papel das telecomunica- gdes e dos transportes no rumo da urbani- za¢&o. Acima de tudo, as novas tecnologias, permitem abrir caminho a novas formas urbanas como as metapoles, que sao espa- gos novos formados a partir do crascimento urbano. Como espago, as metapoles tem uma dinémica propria no tocante as activi- dades econdmicas e processos quotidianos € as tecnologias interagem na integragao desses espagos ao contrario de, como mui- las vezes se apregoa, estarem a conduzir a uma desurbanizagao e ao fim das cidades. A terceira preocupagéo do autor da obra é equacionar 0 inicio de um novo longo ciclo urbano. Até que ponto as novas dindmicas econémicas (as novas légicas empresariais, a complexidade ¢ a fiexibili- dade das actividades econémicas, a veloci- dade e a amplitude das transacgSes, o mer cado @ as novas formas de organizagao dos transportes) analisadas por Ascher cor- respondem a um novo ciclo urbano? Por outras palavras: sendo evidentes os sinais de entrada num nove ciclo econémico, mar- cado pela globalizagao, até que ponto 6 que este novo ciclo esta a originar novas formas urbanas? O ciclo econémico que fica para tras 6 © ciclo da «regulagao fordista». Em todos 08 ciclos existe uma coeréncia entre as caracteristicas principais desses ciclos, 0 tipo de cidades que noles se desenvolvem © as teorias sobre a cidade © sobre o urba- nismo que ai so produzidas. Nisto, o ciclo fordista foi marcado por uma forte coerén- cia. Taylor, Ford, Keynes e Le Corbusier 0 as personalidades que, representando varios dominios, simbolizam a coeréncia deste ciclo quanto aquilo que sao as ideias dominantes. Face @ desordem e a esirutu- ras desadaptadas, as cidades, tal como as fabricas de Taylor ¢ de Ford, tém de sub- moter-se a principios de organizagao cienti- fica, tm de adoptar métodos de simplifica- 0 e de especializagao, tém de gizar ins- trumentos de administragdo © de gestao. 0 movimento do urbanismo moderno pode, assim, ser visto como um taylorismo & escala da cidade. E, além disso, um movi- mento que se faz acompanhar por politicas keynesianas com o objectivo de desenvol- ver uma cidade do «bem-estar» que se esperava pudesse alcangar uma tripla tinali- dade: abrigar o operariado massificado e as novas classes médias; estimular a econo- mia através do financiamento puiblico e dos equipamentos colectivos e da habitagéo social; e favorecer a industrializacao das actividades de construgao e de obras publi- cas através de uma procura maciga (p. 57). A crise que fragmenta a coeréncia do ciclo fordista 6 marcada por novas légicas econémicas que se repercutem nas formas de gestio das cidades ¢ nas toorias urba- nas @ urbanisticas. Neste quadro, as cida- des estao a aprender a flexibilizar-se @ 0 novo ciclo econémico parece estar a condu- zir inequivocamente a um novo ciclo urbano. Sendo a metapole um vasto e hetero- géneo territério sem limites fisicos precisos, marcado pela mobilidade quotidiana e pela dissolugao das relacdes de proximidade, interessa saber, por um lado, em que sen- tido evoluem nesses espagos as praticas sociais e os modos de vida e, por outro lado, como se situam face a fragmentagao crescente a cidadania ¢ as dindmicas comunitarias. Sao estas duas questdes que Ascher aborda de modo a problematizar as acgdes colectivas necessarias a vivéncia urbana no contexto do futuro das metapo- les. Neste plano, 0 autor constata que o rumo da urbanizagao é marcado por uma complexificag&o e individualizacaéo dos modos de vida, dindmicas que, por difundi- rem uma ideologia de escolha, levam Ascher a sustentar que a cidade se esta a converter num hipermercado de modos de vida. E baseando-se nestas tendéncias que © autor discute, analisando varias dimen- sées, a possibilidade de as novas realida- des citadinas desenvolverem uma cons- ciéncia de pertenga a uma colectividade urbana. As duas ultimas questdes tratadas pelo autor da obra remetem para o papel do urbanismo no quadro da organizagao da vida urbana nas grandes aglomeragdes. Por um lado, face a incerteza quanto ao futuro das cidades e a existéncia de um sis- tema internacional aberto, o planeamento utbano deixa de ser sobretudo uma activi- dade técnica para ser uma actividade poll- tica, passando a basear-se na negociacao, no estabelecimento de compromissos e parcerias e na promogao de iniciativas de marketing urbano. Por outro lado, 0 urba- rnismo tem como desafio maior reformular 0 espago puiblico nas metépoles, construindo ai lugares urbanos, «no duplo sentido de agradavel e de propicio & urbanidade» (p. 177). Embora 0 titulo da obra possa deixar transparecer que estamos perante uma obra de natureza prospectiva, 0 texto é acima de tudo de natureza interpretativa. A reflaxao de Ascher a volta das tendéncias de concentragao de pessoas e oportunida- des nas grandes cidades vale sobretudo pelas questOes que levanta e pelas pistas de pesquisa que permite delinear. Paulo Pelxoto Recensoes Giuseppe Fajertag e Philippe Pochet (orgs.), Social Pacts in Europe, Bruxelas, European Trade Union Institute / Observatoire Social Européen, 1997, 198 pp. Publicado conjuntamente pelo Instituto Sindical Europeu (ISE) e pelo Observatério Social Europeu (OSE), instituigées dedica- das ao estudo das relagdes laborais no contexto ouropeu, Social Pacts in Europe sintetiza dois workshops promovidos por ambas @ que reuniram sindicalistas e uni- versitarios por forma a discutir as implica. des tedricas bem como as experiéncias nacionais de pactos sociais na Europa, em especial nos anos noventa Este livro, que G. Fajertag e P. Pochet organizaram conjuntamente, surge na sequéncia de outros trabalhos editados pelo ISE relativos aos debates em torno do emprego/desemprego (nomeadamente alguns Discussion & Working Papers) e @ evolugéo dos processos de negociagao colectiva na Europa Ocidental em que estes autores vém participando activamente. Embora alguns desses estudos dessem ja conta de temas @ tépicos de reflexdo abor- dados em Social Pacts in Europe, este livro constitui um dos melhores contributes para a compreensio dos sistemas de relagdes laborais dos paises da Europa Ocidental, em especial para discussao da nogao de «pacto social» que, grosso modo, se reporta aos acordos firmados entre gover- nos e parceiros sociais (capital e trabalho), que aqui sao analisados em dez paises (Italia, Alemanha, Irlanda, Belgica, Suécia, Notuega, Finlandia, Dinamarca, Portugal e Holanda), Reformulando a ideia de que o pacto social se justifica mais nos paises cujos mercados de trabalho sao atravessados por indmeros problemas, Social Pacts in 185

You might also like