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‘maneira inaudita. A humanidade luta contra isso, As cles inventaram trens e carros, a fim de “eliminar 9 maximo possivel o fantas- magérico entre os eres humanos” ealeancar 9 ““tercurso natural a "paz da almas” tad pesto sera, porém, muito mats forte. Assim, eles inventaram, depois do correio, © telefone ea telegrafia, Kafka, entio, extrai disso a con. slusdo: “Os fantasmas ndo morrerio de fome ‘mas nés afundaremos"™, s fantasmas de Kafka também inventa- am, nesse meio-tempo, a internet, o smartpho. ne, 0 e-mail, 0 Twitter, o Facebook e 0 Google Glass. A nova geragdo de fantasmas, a saber, 6s digitais, se tornam, assim diria Kafka, mais vorazes, mais audazes e barulhentos. As mi- dias digitais nao iriam de fato “além da for- a humana”? Elas ndo levariam a um répido, nao mais controlavel aumento dos fantas- ‘mas? Nao desaprendemos com elas, de fato,a pensar em uma pessoa distante ea tocar uma pessoa proxima? A Internet das Coisas produ novos fan- tasmas. As coisas, que antigamente eram mu- das, comegam, agora, a falar. A comunicacao automitica entre as coisas, que ocorre sem qualquer intervengio humana, fomneceri novo sustento para fantasmas. Ela é como que con- durida por mios fantasmagéricas. Os fantas- mas digitais cuidariam talvez para que tudo em algum momento saisse de controle. A nar rativa The Machine stops [A maquina para], de EM. Forster, antecipa essa catistrofe. Enxames de fantasmas arruinam o mundo. A historia da comunicagio se deixa des- crever como uma crescente iluminagio da pedra. O meio dtico, que envi informagio na velocidade da luz, termina definitivamen- tea idade da pedra da comunicagio. Mesmo 6 silico aponta ainda para o silex latino, que significa seixo, A pedra surge frequentemente em Martin Heidegger, e, de fato, como exem- plo favorito da “mera coisa’ Ela & algo que se furta & visibilidade. Em uma prelegdo antiga, Heidegger observa: ‘[..] uma mera coisa, uma pedra, nio tem luz ems”. Dez anos mais tar de ele escreve no artigo sobre a obra de arte: “A pedra pesa e manifesta o seu peso. Mas enquanto esse peso nos pesa, ele recusa, ao _mesmo tempo, todo penetrar nele™. A peda como coisa € uma figura contréria& transpa ‘éncia. Ela pertence Terra, i ordem terrena, representa 0 velado ¢0 cerrado, Hoje, as coisas Perdem cada vez mais em significado, Ela se submetem as informagdes. Essa, porém, ape nas oferecem novo sustento a fantasmas: "Nao 4 coisa, a informagdo é 0 econémico, socal, politico, concreto. Nosso ambiente se tornavi- sivelmente mais fraco, nebuloso, espectral” A comunicasio digital toma no apenas forma espectral, mas também viral, Ela €con- tagiante na medida em que ela ocorre imedia- tamente em planos emocionais ou afetivos. contigio & uma comunicagao pés-hermenéu- tics, que nio dé verdadeiramente nada a ler fou pensar. Ela nio pressupde nenhuma is tura, que se deixa acelerar apenas de mancira limitada. Uma informasio ou um conteado, mesmo com significincia muito pequena, se espalha rapidamente na internet como uma «epidemia ou pandemia. Nenhuma outra midia <écapau desse contigio viral. A midia eserita é Jenta demas pra iso. ‘Como pedras e muros, segredo pertence dordem terrena. Ble ndo € compativel com a produgio e disseminagio aceleradas de in- formacio, Fle éa figura contréria & comuni- casio, A topologia do digital consiste de es- pagos planos,liss e abertos. O segredo, em contrapartida, da preferéncia a espagos que, com seus entalhes, masmorras, esconderijos, cavidades € oscilaes, difcultam a dissemi- nagio de informacoes, (Osegredo ama o silencio. Assim, o secreto se distingue do fantasm KS pra pela nossa casa: “Em todo 0 caso, 0 vento & para o ndmade aquilo que 0 solo é para o sedentirio, [..] Ha algo fantasmagérico (..] isso, O vento, esse fantasmagerico intocavel ue da impulso aos nomades e a exjo chama- do les abedecem, € uma experiencia que se tomou apresentavel para nés como calcula e computacdo™. A sua alta complexidade fay das coisas digitais fantasmagéricas eas faz in- controléveis. A complexidade, em contrapar- tida, ndo é marca do segredo, ‘A sociedade da transparéncia tem 0 seu lado avesso ou invertido, Ela é de certa pers: pectiva, um fendmeno de superficie. Por tris ou abaixo dela se abrem espacas espectrais que se furtam a toda transparéncia. © Dark Pool, por exemplo, designa 0 comércio anénimo comércio de alt ‘mercados f- nanceiros &y fantasmagéricas de comércio ¢ de comunt cago vio “além’, como Kafka ditia, “da forga humana’, Elas levam a acontecimentos espec trais imprevisivels como 0 Flash Crash”. Os mercados financeiros atuais também gestam monstros que, por causa de [sua] complexida- ‘de mais clevada, podem fazer suas atrocida des [Unvesen]incontrolados. Chama-se Tora por assim dizer, rede subterranea em que se pode cicular de maneirainteiramente andni- ima, Ela €0 mar profundo digital na rede, que sefurtaa toda visibilidade. Com a transparén- cia crescente, também cresce a escuridao.

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