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CONSTANCE KAMII Universidade de Ilinois (Cireulo de Chicago) Universidade de Genebra (Suica) A Crianca e o Numero | Implicagdes Educacionais da Teoria de Piaget para a Atuagdo junto a Escolares de 4 a 6 anos 1 edigto - sbri 1964 2° edlgao - Abril 1088 2: edieio » Outubro 1988 if «57205 — 0 segunda, mais aprojndado no Apéndice,relacionado com Teena dost pracesos eduoactonats wiizados pelas sco ‘Ein ambos observase a busca de solugdes para ume edt capi de maior qualidade, nuts juste e democratic. ‘Einbora os tems abordados ainda possam ser mals expe: dos om cutvas obras, anuetades pola autora, cremos que ‘tique’ ora tomas em ios contri. posttaricnte para. 0 trabaio ie fodos os que estamos emperdados uniaeducapeo tae face jus 2 Unteligarcia, capacidade e direitos de noses Reina 8e Assis Faculdade de Eiucario — UNICAMP 27 de javiro de 1988 Introducao ‘Multas criangas de quatro anos podem enfileirar tantos pedacos de Isopor quanto os que a professors co Jocou numa fileira. Contudo, quando seu conjunto esta ‘espalhado como se vé na Fotografia 1, muitas delas acreditam que agora elas tém mais do que a professora. Quando as edueadores ouvem falar sobre este fend- ‘meno da néo-conservagéo, pensam inevitavelmente so- bre o que signifiea ensinar o nimero em sala de aula. Alguns concluem que as eriangas que nfo conservam Gdovem ser ensinadas a conservar o ntimero‘. Lavatell (1973), por exemplo, sugeria que a professora lembras- se & crlanea a correspondéneia um a um fazendo uma ponte (ver Quadro 1) com um limpador de eachimbo ligando cada elemento de um conjunto 20 elemento correspondente do outro conjunto, Bste tipo de ensino 6 AI (Gene 1. una svat deen nga « cmerar ane meter © spond wa ‘eaten ea ma be oblate fot mosfeade. fants, quando 2 tarta de ‘itigida da tarefa de conservagio é uma aplicagii erré- nnea da pesquisa de Piaget. Por isso, quanda eritieo tals tentativa de aplicapio da pesquisa de Piaget & sala de aula, perguntam-me: — “Enido, como ¢ que yoo’ prope o ensino do nimero? ‘— "Wao existe algum jelto de aplicar essa teoria na sala de aula?” B propésito deste ivro responder a essas perguntas. A pesquisa e a teoria de Piaget sio realmente iteis para © professor em sala de aula, e podem fazer uma grande diferenga na maneira de ensinar nimero elementar. Enfocarei a maneira pela qual o professor pode usar a teotia de uma forma prética discutindo os quatro tépl- cos seguintes: 1. A natureza do numero, 2. Objetivos para “ensinar” nimero. 3. Principles de ensino 4. SituagGes eseclares que o professor pode usar para “ensinar” nimero. Para os leitores que no estiverem familiarizados com a prova de conservacio do nimero elementar, gostaria de apresentar uma breve revisio (Inhelder, Sinclair e Bovet, 1914 pp. 275-277) AL Método Materials: 20 flehas vermelhas 20 fichas anuis ‘ianae tule Inelgertes atrave do sina dar reapeien core ‘evar tomorvap, sem pert ur els conte a= ‘ir g-natenca de ers tte epee ‘Naldexrgio sue sr see, x stansto pote parecer um tanto pa- Lo ‘A pessoa que realiza a experiéncia dispde numa fi- Jeirs aproximadamente 8 fichas azuis (pe!o menos 1)" f pede a erianea para coloear o mesmo nimero de suas fichas vermelhas dizendo: “Coloque tantas fichas ver- ‘melhas como eu cologuel as aziis ... (xatamente 0 ‘mesmo niimero, tantas quantas, nem mais nem menos) "A resposta da crianga é registrada em seu protocol. ‘Se neeessirio, quem realiza a experiéneis coloca entio fs flchas vermelhas e azuis numa correspondéneia um f um e pergunta a crianga se as duas fileiras tém a ‘mesma quantidade, 2. Conseroacdo © experimentador moditiea a disposisio das fichas Giante dos olhos atentos da crlanca, espagando-as em luma Gas fileiras, ou movendo ambas ao mesmo tempo (wer Quadro 2). Sio feitas entio as seguintes pergun~ tas: — “Bxistem tantas (0 mesmo niimero de) azuis ‘quantas vermelhas, ou hi mais aqui (seul) ou mais fAgut (vermelha)? Como é que vocé sabe? ecoc0c0e nin 2 Me nso es gad pu 4g ‘aw ote jeter, impala “von0" de “ooeogee 3. Contra-argumentagio 2. Sea crianea deu uma resposta correta em rela (glo & conservagio, 0 experimentador dia: — “Veja como esta filetra 6 comprida, Uma outra crianga disse que hi mais fichas nesta fileira porque la é mais comprida, Quem esté certo, ‘yoo! ou @ outra erlanga?” bb. Contudo se a resposia da erianea fol errada o experimentador a lembrara da igualdade ini- cial: — “Mas vocé nao se lembra de antes? Nos ‘colocanios uns ficha vermelha em frente de eada azul, A outra erianea disse que havia a mesma quantidade de vermelhas e azuis. Quem voo’ foha que est certo, voce ou a outra crianga?” 4. Quotidade ® © experimentador pede & erianca para contar as azuis e, quando ela termina, ele esconde as vermelhas € pergunta: — “Quantas vermelhas voeé acha que exis- tem? Vocé pode adivirhar sem eontar? Como é que voob sabe B. Niveis, ‘A Tabela | sintetign a ordem hierérquica do desen- volvimento, No Nive I, evianga nfo consegue fazer um conjunto que tenha omesmo niimero. Por iso é desne- ceasirio dizer que ela sinda no pode conservar a igual- dade dos dois conjun:es. Algumas dessas criancas dis- péem todas as fichat vermelhas aleatoriamente como (© Gaviade (qouty em nes « qoute om tone, dine de Ever ae nine sna Mero a olen 20 v8 no Quadro 3 (a). Blas s6 param de colocar suas fichas porque néo tém mais nenhuma para colocar. O ‘Quatro 3 (b) mostra uma resposta mais avancada no Nivel [As criangas que fazem iss0 nao dispdem exata- mente 0 mesmo nimero, mas usam cuidadosamente 0s limites espaciais das fileiras eomo um ervério para de- cidir sobre a "igualdade” das duas quantidades. (Quan- tio as crianeas ainda nfo construiram o iricio da estru- fiura mental do némero, que se vé no Quadro 5 (b), las usam o que lhes parece ser 0 melhor eritério, ou seja, neste eas, os limites espaciais dos dais conjuntos) No Nivel Il, que se encontra entre quatro ¢ cinco anos de idade, a erianga consegue fazer um conjunto com o mesmo niimero, mas no consegue eonservar essa jgualdade “. Quando a pergunta da conzervagéo lhe € feita, ela diz, por exemplo” — “Tem mais vermelhas porque as azuis esto todas espremidas.” Nive Nivel HL Nivel n e000 0000 cccooed a-9--0-= Finite lite As eriangas do Nivel III sio conservadoras. Dio respostas corretas a todas as perguntas, nio sfo confun- didas por eontra-argumentagées e dao um ou mais dos soguintes argumentos para expliear porque acham que tas duas fileiras tém 2 mesma quantidade: fa. “Bxistem tantas azuis quantas vermelhas porque jé fra assim muito antes, ¢ nés nao retiramos nada, clas 56 estavam espremidas.” (Argumento da iden dade) bo, “Nés podiamos enlocar todas as vermelhas do jeito que estavam antes, por isso néo hé mais azuis ou mais vermelhas.” (Argumento da reversibilidade) . Agul as vermelhas estéo numa fileira eomprimida, ‘mas hi espago en:re as fichas por isso dé na mesma.” (Argumento da compensacdo) ‘A conservagio néo é atingida imediatamente o, en- te os niveis IT e TZ, hi um nivel intermediirio. As criangas do nivel in‘ermediério dio resposta correla a apenas uma das perguntas quando se faz uma fileira 2 gree eee flear mais comprida, e em seguida a outra; ou elas hhesitam e/ou estdo sempre mudando de iiéia ( mais anuis,, no, vermelhas...ambas sao iguais| ‘Mesmo quando essas criangas dio respostas certas, rio podem justficd-las adequadamente. [A questo da quotidade mostra que a relagao entre tinguagem e pensamento no é simples. Algumas crian- fgn2 do Nivel IT do a resposta correta (“Tid oito azuis: por isso eu acho que também ha oito vermelhas.”), mas Densam que ha mais numa fileira do que na outra. Contado, a0 atingir o nivel intermediiio, as crlangas sempre dio a respsia certa & pergunta da quotidade. ‘Quando o educadores descobrem os niveis citados, freqilentemente pensam que Ihes cabe a tarefa de levar as eriancas ao nivel de desenvolvimento eaguinte. Na préxlima sepdo sobre a naturera do nimero, tentarel mostrar que essa é uma aplicacéo falst da teoria de Piaget, De acordo com ele, o nimero é consiruido por cada crianga a partir de todos of tips de relagdes que ela eria entre os objetos. Espero que a ciscussao escla rega também porque declarei anteriormente que o ensi- no direto da conservaedo é uma falsa aplieacio da teoria de Piaget. A Natureza do Niimero Piaget estabeleceu uma distingao fundamental en- lie tres Lipas de conhectmento eonsiderando suas fontes Dsicas e seu modo de estruturagdo: eonheeimento fi- s8ico, conhecimento légicc-matematico e conheeimento social (convencional) Coninecimento Fisico ¢ Légico-Matemitico Piaget concebeu dois tipos, ou pélos, de conheci- ‘mento — 0 conhecimento fsieo num extremo e 0 égico- matematico no outro. © conhecimentofisica 60 conhecimento dos objetos a realidade externa. A cor e o peso de uma plaqueta ‘sio exemplos de propriedadesfisicas que esto nos obje- tos na realidade externa, e podem ser conhecidas pela observagao, O conhecimento de que a plagueta cairé quando a deixarmos solta no ar & também um exemplo de conhecimento fisio, Contudo, quando nos apresentam uma plaqueta vermelha e uma azul, e notamos a diferenca, esta dife- renga é um exemplo de pansamento logico-matematieo. ‘As plaquetas si0 realmente passivets de observacao, mas a diferenca entre elas nd. A diferenca 6 uma reiagao criada mentalmente pelo individuo que relaciona os dois objetos. A diferenca nio esti nem em uma plaqueta hem em outra. Sea pesioa no colocasse os objetos dentro desta relaeio, para ela nio existiria a diferenca, Outros exemplos das relages que o Individuo pode cvlar entre as duas plaguetas sio: parecidas, mesmo 14 peso € duas.& tao corveto dizer que as plaquetas verme thas © azuls io parecidas, quanto dizer que elas sio diferentes. A relagio ma qual uma pessax colnca os fobjetos é uma decisio sua. De um ponto de vista as duas plaquetas si diferentes r de outro elas sao parecidas, [Be a pessoa ceseja comparar a jeso das duas plaquetas, @ provavel que diga que os objetos sio “iguals” (em peso). Se, contudo, quiser analisar os objetes numeriea~ mente, dité que eao "dois". As duas plaguetas sio opser~ vaveis, porém sua “natureza dual” no & ‘O ndmero é a relagio eriada mentalmente por cada individuo ‘A erianga progride na construgao do eohecimento tégico-raatemético pela ecordenacao das rlagdes sim- ples que anteriormente ela criox entre os anjetos, (© conhecimento. I6gico-matematico consiste na evordenagio de relagies, Por exemplo ao coondenar as relagies de igual, diferente e mais, a erianga se tora apta a dedurir que ha mais contas no murdo que con: tas vermelhas e gue ha mais animais do que vacas. Da mesma forma é coordenando a relacdo entre “dois” © “dois” que ela. deduz que 2 +2=4,eque2™ 2=4 Evora e aot sea wr numero percept, eb tamer pod 5 semen tency fc dao oe a ce Assim, Piaget reconhecia fontes internas e externas do conhecimento. A fonte do conheeimento fisico (assim ‘como a do conhecimento social) & parcialmente'” ex terna ao individto. A fonte do conhecimento logieo-m temético, ao contririo é interna, Esta afirmacio serd esclareeida pela diseussio que se segue a respeito dos dois tipos de abstracio através dos quais a orianea cconstréi o conhecimento fisico ¢ 0 légico-matematic. A Construcio de Conlecimento Fisica e do Conheciment Lagico-Matematie: Abutracio Reflexiva e Empiriea A visio de Plaget sobre a natureza ligico-matemi- tice do mimero esti em aguda contraste com a visio ddos professores de matemitica encontrada na maioria dos textos. Um texto tipieo de matemétiea moderna (Dunean et al. 1972) declara, por exemplo, que 0 miime- ro" uma propriadade dos conjuntos, da mesma mane ra que idéias como cor, tamanho e forma se referem a propriedades Gos objetos” (pig. T80) ‘Assim apresentam-se as erlangas conjuntos de ‘quatro lépls, quetro flores, quatro balies e cinco lipis, por exemplo, para pedir-Ihes que encontrem os eonjun- feos que tenham a mesma “propriedade de niimero”. Este fexeteicio reflete a suposicso de que a crianga aprende conceitos sobre o niimero a0 abstrair a “propriedade de iniimero” a partir de varios eonjuntos, do mesmo modo ‘que elas abstraem a cor ¢ outras propriedades fisicas ‘dos objetos. Na teoria de Piaget, a abstracdo da cor a partir dos ‘objetos 6 considerada de natureza muito diferente da abstracdo do nimero. As duns sio, de falo, tao diferen- tes, que até se distinguem por termos vlferentes, Para (© A eo st ute recto armen ear a cre ‘a abstragio das propriedades a partir dos obetos, Piaget fnsot o Lermo abstracio empirica (ou simples). Para a fabstragdo do nimero, ele usou o termo abstracao re- fleziva Na abstrapao empitiea, tudo © que a ctianga fax é {focalizar tama eerta propriedade do objeto e ignorar as foatras, Por exemplo, quando a crianga abstrai a cor de tom objeto, simplesmente ignora as outras propriedades tals como 0 peso eo material de que o objeto ¢ felto (isto 6 plistico, madeira, metal, et.) Em contrapartida, a abstracio reflesiva involve @ construgio de relagées entre os objetor, As relagées, como disse anteriormente, nao tém exisvineia na real dade externa. A diferenca entre uma ficra e outra ndo texiste em uma ffeha ou outra, nem em nenhuma outra parte da realidade externa. A relagio ertre os objetos txiste somente nas mentos daqueles que podem erid-la © termo abstragio construtina poderia ser mais técil de entender do que abstragho refleziva, pera indicar que esta abstragio & uma construcio feita yela mente, a0 invés de representar apenas 0 enfogue sobre algo ja exlstente nos objetos. ‘Tendo feito a distingio entre a abstraedo reftexiva a empiriea, Piaget prosseguiafirmanco que, no &m- bito da realidade psicaldgica da erianea, nio é possivel ‘que um dos tipos de abstragio exista sem o outro. Por texemplo, a erianga no poderia construir a telagao dt Ierente se néo pudesse observar proprisiades de dite renga entre os objetos. Da mesma forma, a relagao dois seria impossivel de ser construida se as etianeas pensas- ‘2om que os objetos reagem como gotae Wigua (que se combinam © se transformam numa go:a). Por outro lado, a erianga niio poderia consiruir 0 coshecimento Fisieo se ela ndo tivesse um sistema de reteréncia 16g\¢0- ‘matemitico que Ihe possibilitasse relacionar novas ‘observagdes com um conhecimento ja existente. Para Dereeber que um eerto peixe é vermetho, por exemplo, a erianea necessiin possuir uum esqueima classificatorio para distinguir 0 vermetho de todas as outras cores. Bla também precisa de um esquema claasifieatério para distinguir peice de todos os outros objetos que ja co- nheoe Portanto um sistema de referéncia Vigien-matems- teo (construida pela abstragio reflexiva) & necossario ara a abstragdo empirica, porque nenhum favo pode- ia ser "lido” a partir da realidade externa se cada fato fosse um pedaco iselada do conhecimento, sem nenhu- mma relapao com o conhecimento jé consiruido numa forma organizada, Assim, durante os estigios sensério-motor e pré- operacional a abstracio reflexiva ndo pode acontecer Imdependentemente da empiriea, mais tarde, entretan- to, ela poder ocorrer sem depender desta tittima. Por exemplo, se a crianga j4 construiu 0 niimero (por abstragao retlexiva), ela serd eapaz de operar sobre os aifimeros e fazer § +5 e 5 x 2 (por abstragao rellexiva), © fato de que a atstragio rellexiva nao pode corre: independentemente das primeiras construgées de rela- es felias pelas erlangas tem implicagdes importantes para o ensino do nimero, Este principio implica que a ‘rianga deve colocar tods os tipos de contetido (obje- tos, eventos e acdes) centro de todos os tipos de rela~ es para chegar a construir o mimero, Este principio ser8 elaborado brevemente, logo abaixo, e no Capitulo 3 (sobre os principics de ensino). A distinglo entre os dois tipos de abstragio pode parecer pouco importante enguanto a erianca esté aprendendo os pequenos nimeras, digamos até 10, Can- tudo, quando ela pressegue em direedo a ntimeros maio- res tals como 999 © 1000, fica clar que & impossivel aprender eada niimero até o inflnito através da abstra- 40 empiries @ partir de conjuntos de objetos ot figs as! Os niimeros nao sio aprendides pe'a abstracio reflexiva, A medida que a crianga constréi relagées, Como essas relacdes sao eriadas pela mente, 6 pos: ®sivel entender mimeros como 1.000.002 mesmo ‘que ‘nunca tenhiamios visto ou contado 1,000,002 objetos num conjunte, A Construcio do Niimeros a sintese da ordem da inclusio hierirquica O niimero, de acordo com Piaget, 6 uma sintese de dois tipos de relagdes que a crianga elabera entre os objetos (por abstracdo reflexiva). Uma é ¢ ordem ea outta & a incluso hierdrquica, Gostaria de iniciar a discussio através do que Pia- get entendia por ordem. Todos os professors de erian AS pequenas potlem observar a tendéncia, eomum entre elas, de contar objetos saltando alguns, ou de contar o mestno objeto mais de uma vez. Por exemplo, quando se dio oito objetos a uma erianga eapaz de recitar “Um, dois, trés, quatro..." corretamente até der, pode ser que ela termine de contar garentindo que Ind dea objetos, ao conti-los da maneira que aparece ‘no Quadro 4(a). Essa tendéncia mostra qu> a crianca no sente a necessidade légica de colocar as objetos nii- ma determinada ortem para assegurar-se de que nao salta nenhum nem conta o mesmo duas vez. 96 pode os nos assegurar de que nio deixamos de contar ne- rnbum objeto, ou de que ndo repetimas nenhum, se 0s clocarmes eit urdem. Contude, néo necessario que & crianga coloque os abjetos literalmente numa orden, spacial para arranjé-los numa relagio organizada, O el importante ¢ que posta ordeni-les mentalmente come se vé no Quadro 4(b) |s5 consegue quantifiear o conjusto numericamente se pader coloeé-los tocios numa finiea relacéo que sinte- fire” order“ © mchisao hierarquica quatro 4). 4 pig gla [aro 100. 4 koa mw. Sart Toe | SPs tts ie Se a ondenajao fosse a Unica operagao mental da cerianga sobre 0s objetos, estes nao poderiam ser quan tifieados, uma vez que a crianca os eonsideraria apenas lum de cada ves, em vez de um grupo de muitos 20 ‘mesmo tempo. or exemplo, depois de contar oito objetos axran- jades numa relagio ordenada como se vé no Quadro 3(a), a erianca geralmente diz que ha oito, Se the pedir~ nas entao que nos mostre os oito, as vezes ela aponta para p ultimo, (0 oltavo objeto). Esse comportamento Indien que, para essa erianca, as palavras um, dois, t7és, tte, sfo riomes para elementos individuals de uma série, tomo Jodo, Mara, Sueaninha... Pedro. Portanto, quan ddo the perguntemos quantos sio, a crianga responde 0 tiie chega até Fedro. O nome Pedro serve para o dltimo Hhalviduo da sie e ndo para o grupo todo, Para quan~ fiflcar os objetos como um grupo, a crianga tem que Gblocé-los numa relagio de incluaio bnierdrquien Reta felagio vista no Quadro 5(b), significa que a crianca inclu mentalmente um em dois, dois em trés, és em (quatro, ete. Quando the apresentamos eito objetos, ela » a en greta rat rae te ae AR Tw ET sio de dao" anaes entender quo afl € Sits tuts aang tf ete oe css por expos ringer Soo ‘Rts em minatue aton So memo tanh, tae) Hiora ate nemo sedena cohen pre assure de ‘Sheen steve rclevante depos aus obo 0 fi eomtad. ‘nhs tes acon objeto seen exer ds 8c ‘Mea ome sunt onto eet € nao imjera so obo can itor uaa gi sem u ol ‘Em seguida faz-se a pergunta: — “O que é que voce yi? para que 0 examinador possa prosseguir com ‘guma palavra que venha do voeabulitlo da erianga. Enntdo, pede-ce & crianga que mostre “todos os animais “todos os eachorros", e “todos os gatos” com as pala- ‘yas que a eriarga tiver usado (p. ex.: cachorrinho) ‘Somente depois de assegurar-se sabre a compreen~ da evianga a respeito dessas palavras é que 0 adulto faz a seguinte pergunta em relacdo a incluso de clas tes: "Existem mais cachorros ow mais animais?” | resposta tipiea das eriangas de 4 anos 6: — “syfais cachorros”, quando entio 0 adulto pergunta: — “Mais do que o que?” A resposta da criance de quatro anos é: "Do que gatos", A pergunta que o examina dor faz, em outras palavras, 6: “Existem mais cachor- ros ou mais amimais?", mas o que as eriancas peque- has “ouvern” é — “Existem mais eachorros oa mais gatos?” As eriangas pequenas ouvem uma pergunta fiferente daquela que o adulto fez porque, uma ver. que flag seeclonaram mentalmente o todo (animais) em ‘duas partes (gatos e cachorT0s), a tinea coisa sobre & fqual podem pensar so as duas partes. Para elas, na~ Quele momente, 0 todo nao existe mais. Blas eonseguem Sensar sobre o todo, mas nio quando estio pensando Sobre as partes, Para comparar o todo com wma parte, f crianga tem aue realizar duss operagées mentais a0 fnesmo tempo — cortar o todo em duas partes e recolo~ ‘car a8 partes juntas formando um todo. Isto, de acordo tom Piaget, é precisamente o que as criancas de quatro ‘anos nio conseguem fazer. 2 Bntre sete e oito anos de idade, a maior parte do pensamento das erianeas se torna flexivel o bastante para ser reversivel, ‘A reversibilidade se refere a habilidade de realizar rmentalmente ages opostas simultaneamente — neste fas, eortar o todo em duas partes e reunir as partes num todo, Na agao fisica, material, nfo & possivel fazer Guas coisas opostas simultaneamente. ontudo, em hhossas eabers, isle € pussivel quando o pensamento se tornot bastante mével para sor roversivel. Somente ‘quando as partes puderem ser rounldas em sua mente que a crianga padera “ver” que ha mais animais do ‘que eachorros. B por isso que Piaget explica a obtengéo da estru- ura hlerdnquica da imelusio de classes pela mobilidade ereseente do pensamento da erianga, Por essa razio to importante que as eriancas possam co.oear todos 08 tipos de eontetidos (objetos, eventos, ¢ agées) dentro de tdos os tipos de relacoes. ‘Quando as erlancas colocam todos os tipos de con- ‘widos om relagdes, seu pensamento se to:na mais mé- vel, e um dos resuliados desta mobilidade é a estrutura Togico-matematica de niimero vista no Quadro 5(b). © Conhecimenta Légico- Matematica ¢ Social (Consencional) A teoria do niimero de Piaget também é contréria 0 pressuposto comum de que 0s conceltos numéricas podem ser ensinados pela transmissio social, como 0 Conhecimento social (eonvencional), especialmente 0 Ato de ensinar ae eriangas a cantar. Exemplos da canbe ‘imento social (convencional) sio os que se telerem a fatos como de que o Natal sempre ocorre a 25 de dezem= bro, que uma drvore é chamada de droore que algumas pessoas cumprimentam-se em certas_cireunstincias, apertando as maos, e que as mesas no foram feitas para que se figue de pé sobre elas ‘) origem fundamental do conheelmento social sio fas convengées construidas pelas pessoas. A caracteris- tiea principal do conhecimento social é a de que possi uma natureza amplamente arbitraria. © fato de que flgains povos celebram o Natal, enquanto outros nfo 0 fazem, @ um exemplo da arbitrariedade do connect ‘mento social. Nao existe nenhuma razdo fisica ou 1égi- fa para que 0 dia 25 de dezembro seja de algum modo eonsiderado diferente de qualquer outro dia do ano, Da mesma forma o fato de que uma drvore sefa chamada drvore é completamente arbitrario. (© mesmo objeto pode ter diversos nomes em Iin- ‘guas distintas, uma vez que no existe nenhuma rela- fo fisica ou lOgiea entre um objeto e o seu nome. Por fanto, para que a erlanca adquira o conhecimento s0- cial 6 indispensivel a interferéncia de outras pessoas. A afirmagéo anterior nio impliea que a interferén- cia de outras pessoas baste para que a crianea adquira © conhecimento social. Assim como 0 comhecimento fisieo, 0 conheeimento social é um conhecimento de ccontelido e requer tra estrutura logico-matemétlea fara sua assimilagio e onganizagio. Assim como a Grianga necessita de uma estrutura Logico-matematiea para feconhecer um peixe vermello como tal (conhect frento fis), ea necessita a mesma estrutura légico- matematica para Teconhecer uma palavra obscens co- mmo tal (conheeimento social). Para reconhecer uma palavra obscena a erianga necessita fazer dicotomias ntre -palavras obseenas’ ¢ "palavras que nso ao obo feenas”, ¢ entre “palavras” “Ludo o mais", A mesma festrutura ldgico-matemtica 6 usada pela eviana para fonstrair tanto 0 conhecimento fisico quanto 0 social. ‘As pessoas que acreditam que cs conceitos numé: eos devem ser ensinados através da transmissio social falham por néo fazerem a distingio fundamental entre ‘o canhecimento aceial e o 1égico-matemitico No conhe fimento légico-matematico, a base fundamental do conhecimento & a prépria erianga, e absolutamente nada é arbitririo neste dominio. Por exemplo, 2++3 dé fo mesmo resultado em todas as culturas. Na realidade, toda cultura que construir alum sistema ce mates tica terminaré construindo exatamente a mesma mate ‘matica, porgue este é um sistema de relagies no qual absolutamente nada é arbitrério, Para citar um outro exemplo ca natureza universal e ndo-arbitriria do eo: Inhecimento ligico-matematico, podemos dizer que hé mais animais do que vacas em todas as culturas. ‘As palavras um, dots, trés, quatro so exemplos de conheeimenta social. Cada idioma tem um conjunto de palavras diferente que serve para o ato de contar. Con: tudo, a idéia subjacente de niimero pertence ao conhe- cimento logico-matemitico, o qual é universal Portanto, a visio de Piaget contrasta cam a erenca de que existe um “mundo dos mimeras” em diregéo a0 qual toda crianga devo ser soeinlizada, Pode-se afirmar Que ha consenso a respeito da soma de 24-3, mas nem. © mimero, nem a adigio estio “lé fora”, no mundo s0- lal, para serem transmitides pelas pessoas. Pode-se fensinar as eriangas a darem a resposta correla para 243, mas ni ser possivel ensinar-Ihes ciretamente 5 relagses que subjazem esta adigfo, Da mesma forma, 6 as eriauigan de dois anos posers ver a dilerenga entre luma pitha de irés blocas @ uma de dez. Mas isto mio Jmptica que o niimero esteja “id fora”, no mando fisieo, ara ser aprencico através da abstragio empitica .\ plicaco da Taveta de Conservacio para os Educadores ara on edusadores, area de conserva Feo sa prinelpalmeste na episterologia. A epistemologia & S dead do conteeimento que formula perguntas como: Gaal € a naturza do namers?™ © "De gue 000 as enna chegerm a conhecer 9 mimeo? Piaget is ent tart de cnerard pra respondents poe te penguatas. Com. eta tarefa, pIovou qe © Bier nda iguma cosa tonhesidainatamente, pot {hug ou empiicamente, pla observagto, O fato de {ue ae erances poqenas nfo eonservam o mero fee dos cnce ane Tetra que ontmerondo &eonne- tide tnataments eleva taitn anos para ser contra. See punsive e er cesdo pela obserragd, seria SSrclente para crangas Ge menos de cinco aioe serem et Roenepondenci umn asm entre as uss fe aba saborem que et ola conjuntos do Quadro 2 fons Rimerme cuantidace, Piaget também prov, com tarola de conervaga, que es conceit umicos Sa tho saguirdes através da tnguagem. Se asa 5- seas ertangas nao diam que "ha oo em cada felza thas a mais comprida tem mais” Com esta imltasautrasprovas, Piaget ¢ s6us co- tnborstores demonstraram que numero ¢ agua ci- were enn eer humano constrét através da ciagd0 © SeMibathso ce reagbes Por ease da const in- Sfavat de nimero, € que vemes a seqiéncla do desen- om rere ma a ct arama ee ares hanes ee eneatra nam nel de tans tai a, volvimento sumarizada na Tab, 1. No nivel {a erianga nao pode nem fazer um conjunto que tenba o mesmo smimero, No nivel If, toma-se apta para faz2r Isto por- {que comepou a constrvir a estrutura l6gico-matematica (mental) de niimero que se v8 no Quadra 5ib).. Contu- do, esta estrutura emergente ainda nao é suficiente- mente forte para permitir-ihe a conservaed> da igual- dade numérica dos dois conjuntes. No nivel I, ela eonstruiu una esiruture numétiew yue se tornou bas- ante forte para habilita-la a ver os objetos numeriea mente, em vex de espacialmente, ‘Observe que quando a crianga ainda ndo tem a cestratura (mental) de nimero nos nivels Te TT, ela Dpaseia seu julgamento no espago, ou na percepedo de srontaras, ‘No nivel I, como se vé no Quadro 8(b), ela usa os limites das fileias para fazer um eonjunto que tenha “a. mesma quantidade”. No nivel II, quando ume fileira ultrapassa os limites da outra, como se vé no Quadro 2, a eriange eonelul que esta filelra tem “mais”. A erian- ¢2 que ndo tem a estrutura de mimero usa a melhor coisa que Ihe otorre para faver julgamentos quantita tvs, isto 6, utiliza a nogia de espago, Contwo, quando la jé tiver construido a estrutura de niimeto, 0 espago ‘cupado pelos objetos se torn irrelevante, pois @ crian- {tt jlgamentes quantities impondo ama ext fura numérica aos nimeros ‘Embora a tarefa de conservaedo tenha sido eonee- Dida para responder a perguntas epistemo égicas, ela também pode ser usada para responders perguntas, Psleolégicas referentes ao ponto em que s encontra ‘ada crianca na aeqiéneia de desenvolvimento. Conte: do, seria um absurdo que os eduradores treinassem as Stlangas no sentido de que elas dessem resposias de nivel mais elevado a esta tarefa. A razio desta minhs posigdo € a de que o desempentio na tarefa é uma coisa Co desenvolvimento das infra-estruturas mentais us- tradas no Quedro 5(b), é eutra coisa totalmente dife~ ente. Os educadores devem favorecer o desenvolvimen: to desta estrulura, em ver de tentar ensinat as eriancas fa darem respistas corretas ¢ superticiais na torela de conaervagio. Resultades ricontrades em outta prova podem esclarecer a diferenga entre o desempenho na mest, ea infreestratura mental al presente. Passo agora & Giseutir brevemente os aspectos mais signiflcativos de tama prova chamada coneridade, que foi conduzida por Morf (1962) em eolaboragio com Piaget. Veremos que fembora a estmitura mental de miimero esteja bastante ‘bem formada em tomo dos cinco para 08 seis anos, possibilitando a maioria das erianeas a conservacio do iniimero elementat, ela nfo est sufleientemente estru- fuurada antes dos sete anos € meio de idade para per rmitir que a ctianea entenda que todos os miimeras cc1t~ ‘ecutivas estio conectados pela operacéo de “-+1". Na tarefa de ccnexidade, Morf apresentou 9 cubos (de em de tamanho) a uma erianga, como se vé no Lado ‘A do Quadro 6(a). Colgeau outros 30 blocos aproxima- ddamente sobve uma régua, em fila, €deixou eair um de | feada ver para comegar o arranjo linear marcado como B Depois de assegurar-se da compreensio da crianea acerea do fato de que B podia ser aumentado pela queda fontinua de blocos da régua, ele fazia a seguinte per~ frunta: "Se et continuar deixando os bloeas eairem tm um, terei exatamente o mesmo niimero agui (B), € faqul (A)" 20s pete anos ¢ meio de tduile, as criangas pensavam que a resposta era tio ébvia que a perzunta ra estiipida Contudo, antes desta idade elas nio esta~ ‘yam tio sequras, % \ ie LJ Quando o adulto continuava delxando cair um nioco de cada Yea e-perguntaa, depais de acinar rats um dees, aos dls grupos agora tha o mesmo ra tan crane iia ea oe subltamente, declaravam. que B inna demas. Quando se Ines peruntava se havia in mamento eh ue ar uantidade era exaamente 48 eMTAS, a4 Crlangas respondlam "Nilo, durante mito tempo B Bo inna obasania, mas de repente na dea Sorat rer iSaehiees oe aoe » Para essas sriancas era possivel passar diretamen: fe de “néo bastante” para “cemais”, sem passar por “exatamente o mesmo nimero", Outras diziam que era lmpossivel comparar as duas quantidades por que A era uma pilha 2 B uma linha. Outras ainda falavam sobre necessicade de contar os blocos. Esta respasta era um tanto sofisticada, mas disfarcava a auséncia, de certeza légica. Ao perguntar & crianga se contar era f nice yussibiidade de conseguir o mesmo niimero, Morf descobrin que as criancas freqlentemente men~ cionavam este procecimento pratico porque niio podiam elaborar uma dedugéo légica. Para as ctiangas que ha iam eonstruido a estrutura légico-matemétiea de nt ‘mero, a resposta era tio dbvia que contar era supérfluo, A tarela tomou-se ligeiramente mals diffeil quan- do se passou a usar um grande niimero de continhas de vidro de 3 mm de diametro, Mort apresentou a crian- a um fraseo contendo de 50 a 70 contas. Entio, de dentro de um pedaco de papel dobrado como se vé no Quadro 6(b), ele deixava eair uma conta de cada vee em outro frase. $6 a partir das sete anos © meio a ito anos se toma ébvio para as erianeas que deve hhaver umn momento em que as duas quantidades si0 exatamente igueis. Accrianga se torna capaz de deduair a necessidade logiea de passar pelo “mesmo niimero”, na tarefa. aci- ma, quando ela constréi a estrutura logico-matemtica @e niimero que the permite realizar esta dedugio. Se la construir a estrutura légico-matemstica de manei- a sélida, tornar-se-é eapaz de raciocinar logicamente ‘numa ampla variedade de tarefas mais dificels do que fda conservagao. Contudo, se ela for ensinada a dar ‘meramente respostas corretas & tarefa de conservacéo, nko se pode esperar que prossiga em direcio a racioc nos matemiticos de nivel mais alto. x0 Finalmente, a construgéo do nimero seonteve gra: ddualmente por “partes”, 20 invés de tudo de uma vez ‘A primeira parte vai até aproximadamente 7, a segun~ dda até 8 — 15, © a terceira até 15 — 30 (Piaget © Sue- sminska 1941, Prefdeio A 3% edigao). No entanto, mesmo estando apta a conservar com 8 objetos, isto nao signi- fiea que a crianga possa necessarlamente conservar quando se usam 30. O principio de ensino que pode ser foncebido na vase cesta estruturagao progressiva € 0 de que, para a construgio dos grandes niineros, 6 im- portante facilitar o desenvolvimento dos mesmes pro- ceessos cognitives que resuitaram na construgio dos pequenos niimeros. Se as criangas constroa os peque- nos niimeros elementares ao colocarem todcs os tipos de coisas em todos os tipos de relagées, elas devem per- sistir ativamente na mesma espécie de pensamento para completar a estruturueio do resto da série. 4m conclusio, a estrutura légico-matematica de niimero néo pode ser ensinada diretamonte, uma ver que a crianga tem que consirui-In por s1 mesma. Contude, nfo sugiro a implicago pelagégioa de que a tiniea coisa que 0 professor pode fazer & sentar esperar Hi certas coisas que um professor pods fazer para eneorajar as criangas a pensar ativamente (a colocar colsas em relaeGes),estimulando, desta forma, 0 desen- Volvimento desta estrutura mental Blas serdo discutidas nos dois préximas capitulos como objetivos prinefpios de ensino da teoria de Piaget, LT "

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