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CRISE E REFORMA MONETARIA NO BRASIL | ~ A natureza da moeda e a gestdo monetéria Os sistemas monetérios modernos que ultrapassaram as limitagdes impostas pela consubstanciago das funcoes: monetérias em uma mercadoris particular (caso do ouro ou dos sistemas monetérios que prevaleceram até 0 inicio do século) so fundados exclusivamente na confianga e nao em automatismos relacionados a uma imaginaria escasser do metal ou a0 caréter supostamente natural da mercadoria~ moeda. Nos sistemas anteriores, 0 reconhecimento social ne- cessério para que uma mercadoria se transformesse em instrumento geral dos contratos, da troca e de defi critérios para av luecimento privado estava materializado em algo concreto, A moeda-mercadoria en- carnave diretamente a crenca @ a confianca de que cada ato articular de traca, de acumulacao de patriménios @ de divi- das privadas tinha seu valor relativo medido por um padrao que a sociedade aceitava como absoluto, Os limites da ava- liagao privada estavam postos ex-ante, através de um “teto” ‘que se movie muito lentamente, como dizia Hicks, o que im- unha restrigées as politicas nacionais de expanséo do eri- tério, produzindo frequentes crises deflacionérias. ‘Nos sistemas monetérios contempordneos, a moeda é ‘administrada em primeira instancia pelos bancos que tém o poder de avaliar 0 crédito de cada um dos centros privedos luis Gogeega de tale Balam ~ Proleeer Tila do Economia Soweto dg esasa da Cita Tocroign basnvahnenia eboe, ‘the Stale Gomes oo Ainlca~ Ezosonisn, Proven kuna UFR @ do Inatioce Exononis Se ticamen Séo Peulo em Perepectiva, 4 3-75, jonmar. 1890 Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo Jélio Sérgio Gomes de Almeida de produgio e de gerepdo de renda e, cam base nisso, emitir Obrigagses contra si préprios, ou seja, dinheiro. A criecdo. monetéria até aqui depende exclusivamente de que os ban- 0s sancionem a aposta privada. Em segunda instancia, 0 Estado, através do Benco Central, referenda ou ndo 0 cré- dito a que os agentes julgam ter direito e os bancos avan- ‘gam aos centros privadas de decis80. Em sua forma pura do existéncie, esse sistema néo permite ao Estado executar diretamente @ tarefa de integrar a moeda 20 cirouito mercantil, mas 0 obriga a permanecer como gerantidor ditimo dos contratos mercantis privados que fixam seus termos sob a forma monetéria. Somente um instrumento dotado de reconhecimento diretamente social, garantido pelo Estado ou por um organismo que represente 0s interesses gerais dos estratos mercantis e que esteja aci- ma doles € capez de assegurar a validade das decisées e dos critérios de enriquecimento privado nas economias capi listas. Keynes expressou a condicgo acima de forma absolu: tamente clara, Em um sistema monetiria baseado exclusi- vemente na confianga € no crédito, a moeda é aceita em suas trés fungdes ~ meio de circulacéo, padréo de precos @ reserva de valor - como instrumento dotacio de reconhe- simento social. Isto significa que os agentes privados reco- nhecem que: = 0 representante geral da riqueze, @ forms social do enri quecimento, nao pode ser produzida diretamente pelos agentes individuais; = nenhuma decisdo arbitréria 6 capaz de substituir o di- 63 jnheiro em suas fungdes por qualquer outra mercadoria ou ‘contrato particular. “O desemprego prospera’, dizia Keynes, “porque os homens querem 2 lua (um ativo imaginério dotado daque- las propriedades) “O Gnico remédio consiste em persuadir © pidblico de que lua e queijo verde so praticamente a mesma coisa e fazer funcionar uma fabrica de queijo verde [que o mesmo & dizer um Banco Central) sob a direcao do poder publico”. A possibilidade de produc3o ou substituicso or qualquer centro de decisto privado introduziria uma ameaca permanente de arbitrio na quantidade e no valor da moeda em beneficio préprio, incompativel com a natureza das relagdes mercantis e cam a acumulagéo privada de ri queza. I Por outro lado, 2 unidade do padrao monetério (manti de & medida que a moeda legal cumpre simultaneamente suas trés fungGes) oculta ume dualidade na gestao a moe- da. Se enquanto referéncia de cada produtor e centro priva- do de decisao sua gestéo tem que preservar sua forma di- rotamante social, esta gestéo nao pode se efetuar através de ‘uma relacao imediata do administrador da moeda (o Esta- do} com os produtores. Do contrério, introduzir-so-ia 0 mesmo risco do exercicio arbitrério do poder de monetiza- :80 que qualquer agente privado teria, caso fosse titular da prerrogativa de produzit ou de substituir 0 dinheiro. A dificuldade de apreenséo do significado da gestéo monetéria e de seus limites reside no fato de que ndo hé um. padrao que possa ser preestabelecitio ou considerado énico. A nfo submissao dos atos de gestso monetéria a interesses, particulares & impossivel de ser assegurada a priori. Alguns ‘economistas avogam 0 “Banco Central independente” com © propésito de garantir a fun¢ao “neutra” da moeda, Mas a concluséo é, no minimo, apressada. 0 que a independéncia do Banco Central admite & limitaco do poder e do arbitrio no exercicio da administra¢ao monetéria. O erro consiste em atribuir a possibilidade de no-neutralidade e de arbitrio 2 gestdo da moeda, quando na verdade a instabilidade & d= natureza das economias monetérias, O caso mais geral é re- presentado pela teoria monetarista, que julga ser possivel impor normas homogéneas cle gestéo monetéria aos cen- tros privados de decisdo, como se a estabilidade monetéria fosse uma decorréncia dirota © exclusiva da atuacdo do gestor. O moneterismo toma como um principio © que & na realidade, um resultado sujeito a condicdes: os agentes pr vados devem acreditar que a maeda legal naa pode ser pro- duzida ou substituida em suas funcées. O postulado mone- tarista admite que nao exister fatores de perturbaco mo- netaria origindrios das avaliacées privadas. implicitamente, supée que uma decisdo dos centros privados corresponde a0 que fora antecipado, vale dizer, que as expectativas so sempre cumpridas © que nd ha incerteza. Desta forma, qualquer desequilibria monetario nasceria do descumpri- mento, pelo Estado, das regras de gestao. Os sistemas monetirios modernos podem ser concebi- dos, em uma primeira aproximagao, como um sistema de cradito puro de Wicksell, onde as decisées privadas - envol- vendo conjuntamente bancos e produtores ~ presidem a ceriagdo da mods. Noles, a fungae do Banco Central 6 a de manter uma escassez relativa do ativo liquido compativel 64 com a demands de stivos com graus de liquidez e rentabil dade diferenciados. Em outras palavras, a fungao do adm nistrador @ a de estabelecer um sistema de precos que multaneamente assegure o caréter de riqueza aos ativos reais e titulos financeiros ¢ mantenha a confianca no padrao monetario. Uma “taxa natural” de juros - entendida como indice de preferéncia da sociedade pelo futuro ou a taxe que equilibra poupanca e investimento ~ era 0 que, segundo Wicksell, garantiria ambas as condicdes © deveria ser o cri- tério @ ser seguido pelas politicas monetéria © bancéria, de forma a evitar tendéncias inflacionérias ou deflacionérias, que segundo ele seriam cumulativas @ inexoréveis em um sistema nao regulado. ‘A objogao do Keynes quanto & “taxa natural” 6 que as, expectatives empresariais estdo em constante mutacao, pro- vorando alteragées subitas na hipotética texa natural, ou seja, na avaliacao do futura, de forma que o sistema de pre- gos dos ativos se moveria continua e independentemente das politicas bancéria e monetiria. 0 caso extremo & 0 da ““armadilha de liquidez”, em que o sistema de precos torna- +80 insensivel aos estimulos monetérios. A contribuicao de Keynes fol, assim, a de mostrar que os sistemas monetarios do tém Ancora natural e que 2 Unica possibilidade pars ope- rarem de forms estével é 2 de que o passado continue a se reproduzir no presente e determine as expectativas do fu- turo. Hé © suposto implicito de que o Banca Central no provoque com a sua politica a instabilidade, embora dele nfo se espere uma politica monetéria passiva: ele pode & deve agir dentro dos limites que Ihe s80 datos, no sentido de contrabalancar os efeitos instabilizadores das mudencas das expectatives dos centros privados de detisdo. S20 as diividas e incertezas nas avaliacées privadas que atingem, nag economias monetarias, a propria confianea na moeda e no seu gestor. A validacdo da riqueza capitalista nao se limita 8 neces- sidade de reconhecimento das antecipacdes que calocam em uso 0 estoque de capital produtivo, mas envolve simul: taneamente a aceitaco social, isto € a camprovacae pelos resultados monetérios das apostas privades que buscam ‘acrescentar @ riqueza material da sociecade. Nestas econo- mias, 08 produtores privados estéo escravizados 4 ditadurs do futuro ¢ 86 Ihes rests acreditar, adivinhando o que os ‘outros imaginam, que o futuro 6 a reproducao do presente. Esta convencao s6 pode se manter de forma precaria. Quando © future nao confirma o presente, o dinheiro que servia de mero veiculo para a valorizacao do estoque de ri- ‘queza e liquidacso dos contratos pelo valor antecipado ~ através da produce e da venda de mercadorias - torna-se um objeto perturbador, As crises monetarias podem ser interpretadas sempre como crises motivadas pela ruptura da avaliagao da riqueza sob um dado padre monetario, Ou ainda podem ser vistas como canseqiiéncia da incapacidade do Estado de impor li- mites 8 acumulacdo monetéria privada ou de regular 03 cri~ térios de avaliagao de riqueza dos centros privados de deci séo, Mas nao hé ume regra fixa ou “adequada” de gestéo que equilibre a eseassez relativa dos ativas, guie o sistema de pregos e conduza ao crescimento sustentado e estivel, a nido ser na hipétese de uma imagingria, e ainda assim mu- tante, “taxa natural” de juros. Nas crises monetérias 6 rompida no $6 a unidade das fungdes da moeda, como também alteram-se as relacces preexistentes entre moeda ativa e moeda inativa. Nas cléssi- ‘cas recesses acompanhadas de deflacao, a dtivida recai so- bre o valor dos ativos reais (e dos bens cuja produgao facili- tam}, raz0 pala qual a fungao de reserva de valor da moeda absorve as demais, rompendo-se, por conseguinte, cit- cuito no qual o dinheiro & intormediério da troca. A crise aparece diretamente como “crise monetéria” ou “crise de crédito” porque a moeda bancéria é rapidamente destruida. ‘A moeda passa a representar a riqueza de forma absoluta @ @ demanda por saldos inativos domina os determinantes de sua posse, Nos processos inflacionarios agudos, ¢ a funcdo de meio de circulagdo que absorve as demais; um outro ative passa a servir de padrao de precos (e contratos) e de reserva de valor. A dtivida, neste caso, atinge diretamente moeda enquanto padrio adequado de referéncia de pregos, con- tratos € aveliago da riqueza. A “desmonetizagao” 6 a con- trapartida da fuga do dinhsiro, j8 que os agentes privados 1n3o mais véem nele um ativo dotado da propriedade de re- presentar um valor pela sua simples posse. No limite, a de- manda de moeda inativa (os motivos precaugéo e especula- (Go da triade keynesiana) baixa 4 zero, 0 que significa s des~ tituicao do dinheiro do rol dos ativos e a incapacidade total de gestao monetaria e regulaao da taxa de juros pelo Este- do. Duas conseqiiéncias nascem desta situago que corres onde & hiperinflacao: primeiramente, a funcdo de unidade de conta exercida pela moeda legal vai se tornando cada vez ‘mais limitada a mercados e a um piblico de menor informe- 680 ¢ baixa capacidade de passar adiante a moeda em franca dosvalorizagao; segundo, 0 sistema de pregos dos ativos se dissolve porque 0 ativo que servia as avaliacdes da riqueza privada desaparece. A substituigo por um outro ative, co- mo uma moeda estrangeira forte, corresponde & busca de- sesperada de protecao e de referéncia para a riqueza, Mas a instabilidade cambial @ um componente essencial da crise © a posse direta do novo ativo de referéncia 6 restrita 20s se- tores exportadores que, assim, passam a deter um inusitado poder. Ou seja, 0 recurso a este ativo corresponde ao des- dobramento da crise e no & sua solugo, porque nao & ca- az de restaurar a confianga em um padrao monetério que, 2 rigor, neste momento, nao existe. Os requisitos para a re- predugdo da riqueza real (investimento) continuam blo- queados; 0 novo ativo serve, imperteitamente, para avaliar 0 estoque de riqueza [é constituido e para permitir um fluxo irregular de producao e troca. II = A gosto monetéria da crise Tratamos no item anterior das fungées ds moeda e do significado teérico da crise e da gestéo monetéria. No pre- sente item abordaremos a crise monetéria brasileira, seus daterminantes, as relagdes entre @ crise monetéria, a crise cambial e a crise de financiamento do setor puiblico e a for- ma como o Estado assumiv a ruptura das fungdes moneté- ras através da “moeda indexada” ou “moeda financeirs Deveros retroceder uma década para analisar a crise monetaria brasileira. Os responsiveis pela condugao da po- Iitica econdmica julgavam que, sendo preservada a estrutura ‘S80 Paulo em Perspective, 41):62-75, jan.lmar, 1980 ‘empresarial privada e restaurado o equillbrio das contas externas nas novas bases que foram sendo impostas desde fins dos anos 70 ~ em termos de prego de combustivel, custo dos juros da divida externa e cancelamento dos fluxos ex ternos ao Pais -, estariam repostas as condicdes para que a economia reencontrasse a trajetéria do crescimento, Pensa- vam, assim, ser possivel enfrentar uma gravissima crise de financiamento ¢ alterar profundamente a relacao externa da moeda nacional e a composic3o dos mercados (entra mer- ‘ado interno e externa) sem violar critérios ¢ padroes de aveliagéo que regulavam 0 risco © as expectativas ne eco- nomia. A demonstracao'mais cabal de que @ politica de “a~ justamento” deixou marcas muito mais profundas na eco- nomia é que ~ a despeito da preservacao do setor privado nna recessdo, de seu répido ajuste patrimonial, além do ree- quilfbtio corrente alcangado nas contas externas (a partir dos mega-superdvits obtidos desde 1984) -, esta mergulhou fem crescente instabilidade e indotorminagao de sua trajeté- ria. Ao objetivo absoluto do “sjustamento”, vale dizer de politica adotada entre 1960 1984 para promover o ajuste do setor externo da economia face 4s mudangas internacio- nais, subordinou-se a gesto monetéria nesse perfodo. Ela foi 0 vetculo principal do ajustamento, porém sua execucao Tompeu critérios decisivos na regulacdo das avaliagées © ex- ectativas em uma economia cronicemente inflacionéria como a brasileira, sem que, findo © periodo, estes critérios tenham sido restaurados. Quanto @ desorganizagéo das expectativas, os fatores doterminantes foram os seguintes: = a forte instabilizagso das taxes de juros e o desali- nhamento dos indexadores (maxis, prefixacdes © expurgos da correrao monetéria), Isto comprometeu a utilizago da indexagao para fins da intermediagao financeira sob inflago destruiu a confignga nas paridades de valores patrimoniais edividas que a regra de indexagéo procurava preservar; ~ 0 ajustamente introduziu o risco de erédito na eco- nomia. Desde 0 pés-guerra, esta foi a crise de crédito mais profunda e mais protongada. Néo sé contraiu-se o crédito corrente dos bancos, como alteraram-se bruscamente as condicdes do financiamento 8 contratado (taxas de juros @ indexadores). O sistema de crédito antes da crise assegu- Fava ampla cobertura de liquidez as empresas @ taxas de juros favorecidas e servia como um colchao amortecedor da \certeza das antecipacdes empresariais sob inflagéo; = 0 ajustamento deliberadamente provocou a recess, também a mais longa e severa do pés-guerra, numa eco- Romia em que a orientagdo genérica “para o crescimento” servia para diluir incertezas e corrigir o curso das decisées com 0 minimo de perdas. © segmento empresarial das grandes corporagdes fol capaz de adaptar-se a estas reviravoltas da politica econd- ‘mica, mas isto custou uma forte aceleracao inflacionéria, 0 salto da inflagéo neste periodo corresponde ao ajuste das margens de lucra das grandes empresas para a defesa do wero corrente e da liquidez empresarial. Um custo elevado 65 {oi debitado & conta do setor pitblico pelo patrocinio do iste privada sob @ forma ce isencoss © incentives fscais, Subsidios © absoreio de vidas © compromissos financeiros. A divica externa foi assumiga pelo Estado, que para este fim uriizau-se de mecanismos monetérios (como 08 depdsitos ‘am moeda estranasira no Banco Central), das empresas es- tatais e da politica tariféria, Isto determinou profundo dese- auiltrio patrimonial no Banco Cental, além do compro. meter 0 autofinanciamento e a capacidade de sustentacao dos niveis de investimento das estatais. A orientacao do produce para o mercado externo, por outro lado, subtraia ‘ecurs0s tributéros @ a aesleracao de inflacao concorria para 4 queda dos valores reais da arrecadacio fiscal. Por fim, 0 governo utilizou-se largemente da prerroyative de gestor de ‘moeda para arbitra favores e interessas particulares através do antigo Oreamento Monetério. A reconstrucao das contas do setor publica hoje nos permite nao ter ddvidas de que a origem da crise fiscal, nesta etapa, esd inteiramente igada ao ajuste privado. A saida do ajustamento, portanto, nao s6 garantiu 0 ajuste privado © 0 reequiliorio externo corrente, mas tam- bém provocou 9 agravamento das inzertezas:intiaca0 alta, sem mais a confiange na indexa¢go, mas com @ percencéo da fravilidade da situacéo cambial e do aprofundamento da crise fiscal ede finenciamento do setor piiblico e das empre- sas estatais. No quadro international que provalacou apés 0 ajustamento, tornou-se evidente o sfestamento do Brasil dos mercados voluntérios de erédito e de capitas, e este fa- ‘tor 6 uma ameaca permanente de nova escalada de reajus- tes no valor externo da moeda, aompenhade de forte re- cesséo, ameagando assim desvalorizar a riqueza e os patti ménios scurmulados internament Em suma, 0 ajustamento, 8 medida que agravou as condigées de finansiamento do setor péibico e desorganizou 08 padrées de avaliagao @ risco das decisées empresariais, provocou a paralisia dos agentes que comandam o invest- ‘mento: 0 setor pitblico, acossado pela crise simultanoa- mente fiscal e financeira, ¢ 0 privado, lquido e “ajustado”, mas prisioneiro da incerteze e de ruptura des expectatives, ‘Uma segunda etapa ne condugao da politica monetéria corresponde & concluséo do “ejuste” privado e do setor ex- terno @ s9 estond até os dias de hoje. A politics monetéris, pat uma sucessdo de medides “ortodoxas” © mais recente- mente “heterodoxas", foi dominada polo objetivo de blo- quear @ explcitagfo da crise monetéria em ume hiperintla- Gio. Isto também implicou custos para o Estedo, na forma da concesséo de juros e de liquidez nos seus ttulos. Os altos custos financeiros e o estreitemento progressivo dos prazos da divide publica agravaram, evidentemente, o desequilibrio das contas fiscais © 0 financiamento do setor pico, mas devemos frisar que esta foi uma decorréneia da crise mo- netiria, ou melhor, da imobilizagao crescente imposta ao gestor da moeda. Por isso, a cada momento om quo é evita- do 0 desenlace da crise, também se aprofundam divides @ incertezas sobre 2 qualidade do padrde monotéri, cujo limite @ 8 percepedo, pelos centros privados, de que a sobe- rari de moede estatel pode se tornar insustentavel E claro que convivemos nesta otape com desequilbrios estritamente fscais e de financiamento & medida aue nao avangamos ne superagéo dos problemas agrevados pelo 68 ajuste e pele rupture do financiamento externo. Na verdade, ‘em muitos pontes cruciais, regredimos: a estrutura de gasto piiblico tornou-se mais rigida, bem como aumantou a re- sisténcia de setores a tributagao, & redugao de favores, sub- sidios © incantivos; o crédito comprimiu-se violentamente no sistema financeiro @ 0 risco do grande devedor destes anos (0 setor piblico) comprometeu ainda mais o seu cré- dito. Mas @ importante destacermos a ordenacéo dos fatos, para colocar em evidéncia seus determinantes. Nesta etape, © desafio privado a0 gestor da moeda se sobrepse as crises fiscal e de financiamento, acentuando-as. Isto explica em ‘grande medida os sucessivos fracassos das tentativas isola- das de ajuste e de reformas nos campos tributério, do gasto pibblico ¢ das condicées de financiamento do setar publico, Com excero do Plano Cruzado, que nutriu a esperanca do restaurar de fato a unidade das fungées da moeda, a {gestéo monetéria recuou para o reconhecimento da quebra desta unidade. Admitiu a crise monetéria ¢ chamou-a a si, tentando circunscrevé-Ia aos ativos de emissao estatal para com isso ir legitimando o “dinheiro velho” (o cruzeiro, 0 cruzado, 0 cruzado novo) em pelo menos uma de suas fun: ‘goes (meio de circulagao) e evitar através do “dinheiro fi- anceiro” que as fungdes de padrao de precos @ contratos @ do reserva de valor fossem exercidas diretamente por moe- da estrangeira forte. Estamos nos raferindo ao desenvolvi- mento das “quase-moedas”, ou mais propriamente do dl niheiro indexado. E importante observer que a existéncia das duas moe- das, correspondendo eo fracionamento da unidade moneté- ria, introduz uma efetiva inércia na inflacgo. As teorias de inétcia se habilitam a explicar a resistencia 8 queda da taxa de inflac3o no Brasil se tomadas como uma descricdo do automatismo da formacao de precos e da generalizacao do “imposto inflacionério”. Este ditimo deriva do fato de que a convivéncia de duas moedas habilita ao lucro inflacionério todos os agentes (e no apenes os bancos) que captam ou compram na moeda de transacao (ou sob um critério que se aproxime dela) e empresiam ou vendem na “moeds inde~ xada". Esta tem sido @ base de lucros extraordinarios para muitas empresas bancos que safram do ajustamento re- cessivo com enorme capacidade de geracao ou moblliza¢o de liquidez baixo grau de endividamento ou comprometi- mento financeiro. 0 Cruzado mostrou que mesmo uma pre- céria e temporétia reunificacao das fungdes monetérias esti longe de ser neutra em seus efeitos sobre a rentabilidade empresarial. As margens brutas de lucra das grandes cor- poragées comprimiram-se violentamente, assim como 0 lu- ero sobre 0 patriménio dos bancos. O aparente ajuste © 8 eficiencia do setor privado deverao passar ainda pelo teste do resistancia de um periodo de estabilizagao, j4 que 20 Ihe ser petmitido tornar liquido e absorver o lucro inflacionério climinaram-se ao mesmo tempo os constrangimentos que 0 obrigavam a respeitar as normas de operacéo de uma eco- nomia mercantil capitalista. Na economia brasileira, ficaram suspensos os sentidos da concorréncia @ economicidade (relacao prego-custo), O enriquecimente transformou-se em um fenémeno puramente patrimonial ¢ arbitrario. No foi um processo daliberado de gestio monetéria 0 ‘que conduziu & "moeda indexada’. De um ponto de vista, podemos entendé-lo como um desvirtuamento do sistema da indexacao introduzido pelas reformas de meados dos 60, que tinham como propésito regularizar os contratos e per- mitir a amplisgao da intermediacao financeira em uma eco- omia cronicamente inflacionéria. Mas foi a prépria con- corréncia privada que requereu o “dinheiro financeiro” de ‘emisséo ou de garantia do setor publica: a) os segmentos ‘empresariais liquidos (e mesmo pessoas fisicas de maior endimento © acesso & informagao) demandavam “moeda indexads”, uma vez que a incerteze afastara de suas deci- des a acumulacao de capital real (investimanto). O risco de perda patrimonial (por movimentos imprevistos nas cota- 960s, taxas de juros e indexadores) desaconselhava na for magéo de seus portidlios os titulos negocivais em Bolsa e aplicagdes a juros de médio e longo prazos; b) do lado dos bancos, um titulo pablico que assegurasse rentabilidade @ liquidez preenchia duas condi¢ées para sua operagao lucre- tiva: primeiro, compunha 0 porto bancério como 0 ativo de menor risco, 6 que a liquide folgada transformara as grandes empresas de davedoras am credoras do sistema bancério: segundo, a rentabilidade e a liquicez do titulo pi- bblico permitiam aos bancos se ajustarem ao encurtamento dos praz0s exigido pelos aplicadores e, além disso, que ab- tivessem renda a partir da simples captacdo monetéria (de- pésitos a vista). 0 titulo puiblico passa entdo a ser a base do genho ban- rio: na intermediacao do “dinheira financeiro'” (que subs- tituiu @ funcéo bancéria da intermediaedo financeira) e na absorgaa do "imposto inflacionério”. Estas so anomalias de um sistema baneério em que a existéncia da “moeda in- dexada’’ permitiu uma completa adequacdo & crise moneté- ria, Mas, como devemos lembrar, também so anémalos a operacio da empresa 0 0 critério patrimonial do enriqueci- mento. Constitui igualmente um desvirtuamento a funcéo que passam a desempenhar o insirumento da indexagao e 05 titulos de divida pulblica, Estes deixam de ser vereulo de financiamento do setor ptiblico para servirem de lastro & ‘moeda indexada”, além de base a arbitragem entre “di- nheiro velho” e “dinheiro financeiro” exercida por quem gera ou tem acesso privilegiado & liquide. Grandes empresas, bancos e exportadores detém esse. poder privilegiado. Essencialmente, a gestio monetéria da crise constituiu em aperfeicoar a “moeda indexada” a cada Todada em que o poder privaclo ameacava a prerrogativa de gestor ds moeda exercida pelo Estado, Trataremos dos li- mites da politica monetaria nos préximos itens, Para encertar, 0 registro de que, em sua forma mais de- senvolvida, 0 “dinheiro financeiro" ou 8 “moede indexada’ corrasponde aos passivos bancérios de emissao por um dia que rendem a taxa overnight @ cujo principal lastro é 0 titulo piblico, atuaimente a LFT, Como observou Keynes, a distin- G0 entre débito e dinheico deve respeitar as peculiaridades de cada momento e cada caso. © encurtamento de prazos © ‘as crescentes facilidades de resgate aconselham, no caso brasileiro, a tomar os depésitos de poupanca e os depésitos a prazo como dinheiro. Englobemos todos estes direitos I- quidos e indexados na categoria de “quase-moedas”. S80 Paulo om Porspectva, 4{1:63-75, jan.fmar. 1990 Ill — A financeirizacdo dos precos ‘As quase-moedas cumprem genericamente a fungéo de recompor a unidade monetéria. Com isto, 0 Estado reassu- me formaimente a condicdo de gestor da moeda, mas sem readquirir 0 controle da politica monetéria, A crise vai im- pondo limites pragressivas & gestéo monetéris, em um ‘quadro de crescente instabilidade, A ameaca de hiperin‘la- so torna-se cada vez mais presente diante do precério sis~ tema de avaliagées que as quasa-moedas @ a felsa unidade monetéria buscaram preserver. Os fatores decisivos pare a perda de eficécia da politica monotiria @ as razbes que a fazem sucumbir as arbitragens dos agentes estao localizados nas mudiangas profundas que sofreram 08 ativos, 0s mercados para sua negaciacao © os critérios do sua posse. De um ponto de vista microeconémi- c0, estas mudengas podem sempre encontrar justificativa nos processos de “defesa" desenvalvidos pelos agentes contra @ desvalorizagao patrimonial que @ alta inflacso pode causar. Mas no plano macroeconémico estas transforma- (GOes S80 responsavels pelo aparecimento de obstéculos quase intransponiveis & aplicacao de politices convencio- nais de estabilizacao. © problema nao fica inteiramente definido pela consta- taco de que os ativos financeiros indexados tenderam a cconcentrar as decisées quanto & posse de riqueza, determi nando 0 desvio de recursos do investimenta e da praducaa, Isto correspondeu, em algum grav, 8 realidade dos anos 80 no Brasil, Uma indagagio mais relevante €a que busca des- vendar as condigdes que evitarsm uma concentrecao einda maior nos ativos financeltos. A questa ¢ pertinente: & me- dids que 9 inflagdo foi se acelerando @ foram se apertei coando os métodos de indexacao a curto prazo, na forma das “quase-moedas”, também se ampliaram os diferenciais| do risco © protecdo entre os ativos reais e financeiras, A ‘questo paderia ser aprofundada ainda mais: quais as forcas que se opuseram a tendéncie de concentragao entre os ati- vos reais? De que forma se deu a concentracso dos ativos fi- nanceiras na “moeda indaxada"? 4 aplicacao da teoria da selecdo de cartelra a um pro- blems de distribuigao macroeconémica de atives deveria, fem primeiro lugar, suspender 0 suposto de perfeita substi- tuicdo entre ativos reais, ativos financeiros e dinheiro. Deve- ria pelo menos qualificar as condigées em que & possivel admitir @ substituigi. Do ponto de vista de cada agente, 0 movimento correto seria o da substituicdo, nas carteiras, dos ativos reais por outros contrétualmente protegidos cont 2 inflagdo @ dotados de maior liquidez. Do ponto de vista ‘macro, no entanto, a busca de liquider e de protecto nfo ode ocorrer para 0 conjunto do sator privado, salvo no ca- 80 de uma mudanca correspondente na situaeao patrimonial do setor puiblico ou na ampliacao da propriedade de n: sidentes. A auséncia de intervengso publica provacaria uma queda generslizada dos precos dos ativos reais, induzids pela busca individual de substituicio. Teorieamenta, os pre- ‘908 deveriam baixar até que fosse alcancado um reeauillbrio 6 das avaliagdes em termos das vantagens de rentabilidade, risco @ liquidez entre as vérias classes de ativos. Esta éuma outra forma de dizer que a economia daveria ser projetada fom uma recessao aberta, acompanhada de deflagao de pre- 0s @ da depreciacéo dos ativos que compaem a riqueza re~ produtiva, © economista Irving Fisher descreveu este fend- ‘meno nos anos 30 como uma crise de “debt-deflation”. Em ‘uma economia industrial moderna, com enormes imobiliza~ g608 de capital estruturas de mercado oligopolizadas, & evidente que @ busca de substituicao entre ativos, prépria de uma decisio pura de carteira, tende a levar em conta o isco de desvalorizago patrimonial e também o de perda de posi- co no mercado. Mesmo em uma economia com estas ca- recteristicas ume crise de liquidagdo paderia ocorrer, mas seria necessaria uma brusca e violenta contracéo do crédito para forcar a recessao e provocar a depreciagao do estoque de capital existente. No caso brasileiro, 0 “éxito” do ajuste privado, apesar da recessio do inicio dos anos 80, indicou que esta forma de solugao da crise estava descartads. O Es- tado comprometeu sua situagio financeira e ptrimonial na salvaguarda da riqueze privada, Mas 0 ajuste privado impe- diu apenas 0 desenlace da crise de liquidacao. Néo foi acompanhado de um reordenamento das avaliagdes e das expectativas capaz de restaurar as relagées de rentabilidade esperada entre ativos de natureza diferente, porque expec tativas de longo prazo nao se alteraram. Em situacdo de relativa estabilidado das expectativas € dos padrées de risco, alguma variante do principio do custo total pode ser considerada uma boa aproximagao para des- crever a formacéo dos pregos. Nes versées inspiradas om Kalecki e Steindl, os precos acompanhariam 0 custo primé- tio, acrescido de uma margem de lucro que deve cobrir os custos indiratos, além de deixar ume margem liquida para o ‘empresério destinada a assegurar os planos de expanséo da firma, Mas na situagao que estamos descrevendo 2 forme- ¢80 de procos revela o que realmente 6: um poder que os possuidores de ativos reprodutiveis detém para defender 0 seu valor. Sustentar no rendimento corrente @ nos precos dos bbens 0 valor patrimonial dos ativos privados requer um ele- vadissimo grau de monopélio. E, sobretudo, requer que setor privado obtenha renda e aumente sus liquidez finan- ceira fora do circuito gerado pelo gasto empresarial produti- vo. Podemos considerar que o ajustamento concentrou enormemente a atividade econdmica no Pals © aumentou o ‘rau de monopélio e que a restricao as importacdes, provo- cada pele crise externa, protegeu extraordineriemente os setores internos. No plano macroecondmico, foi necessério que 0 Estado ampliasse o seu endividamento sob a forma da “moeda indexada’ para atender 20s novos critérios de ‘isco e preferéncia pola liquidez do sotor privado e sustentar sua rentabilidade corrente. A coberture de liquidez oferecida pelo Estado através de seu endividamento na “mosde inde- xada” acentuou 2 deformacao do sistema de pregos dos bens na economia brasileira, Tomemos agora os ativos reais. O bloqueio ao crédito Internacional ¢ as trensferéncias de recursos ao exterior que foram impostos ao Pais determinaram uma conseailéncia importante: 0 favorecimento do uso de ativos produtivos para exportacgo em relacdo aos ativos voltados & vends doméstica. Neste caso, um proceso semelhanto a0 quo jé foi descrito seria desencadeado se de fato fosse exercido generalizadamente 0 impulso de cada um para produzir para venda na liquidez forte: os ativos “néo-tradables" decli- nnariam de preco no curso de uma recesséo até que as van- tagens relativas de uso dos ativos novamente se equilibras~ som. A alternativa que se colocou no caso brasileiro foi tam- bém a de que 0 processo nao se desenvolvesse ao nivel dos valores de mercado dos ativos reais, mas sim através dos progos dos bens que eles podem produzir. Estamos chamando a atenco pars 0 fato de que a for- macao de precos dos bens adaptou-se para impedir que uma crise de liquidacao de grandes proporgées refletisse integralmento as “forcas de mercado”. Estas, como herancs do sjustamento, determinaram um profundissimo reorde- namento entre os ativos que formam @ riqueza acumulads no Pals, em termos dos pardmetros que definem as avalia. ‘ces quanto ao seu valor futuro @ dos padrées de liquidez & protecdo das vérias classes de ativos. A crise somente foi evitada, portanto, porque 2 soviedade brasileira vem admi- ‘indo um rau acentuado de inflagdo para preservar os va~ lores patrimoniais privados. Estes s8o valores que nao po- dem ser comprovados, vale dizer, sia direitos que néo po- dem ser exercidos porque se desvalorizariam; apenas sao confirmados escrituralmente @ cada perfodo pela inflacso. Esta, como vimos, 6 também fonto de ganhos extrsording- rios para importantes setores na economia, € por esta razdo tendeu @ perpetuar-se como norma em torno de qual se re~ produzem os valores ¢ se organizam os interesses empre- sariais e, além destes (crescentemente, porém de forma de- sigual), também de demais fracées da sociedade, Nesta eco- nomie, a negagio do valor da moeda é necesséria para afir- mar 0 valor da riqueza, do lucro e até de rendas do trabalho assalariado, Vejamos como readaptou-se a formago de precos na crise, As vantagens dos ativos reais voltados 8 producao para exportacéo sobre os ativos cuja uso dlestina-se ao mer- cado interno tém origem em dois fatores. O primero deles refere-se & natureza da formacéo das expectatives de des- velorizagao cambial em uma economia alijada dos fluxos de financiamento externa e comprometida com elevados pa- gamentos financeiros 20 exterior. Nestas condicées, as re- servas internacionais so antecipadamente consideradas Inelésticas as desvalorizardes cambiais @ a0 manejo da taxa de juros interna, que nao & capaz de estimuler 0 ingresso de capitais no Pats. Isto significa que, se @ expectativa de des- valorizagéo cambial se confirma, nao hé ume veriacSo com- pensatéria nas reserves que garanta @ estabilidade do cam- bio no futuro, Se ela néo se confirma, a queda nas reservas sinalize automaticamente na direc de uma perda de con- fianca na moede nacional enquanto padrao de avaliagao da Fiqueza, Os movimentos financeiros de dolarizegao podem + tornar incontroléveis. O Banco Central reage pavioviana- vente subindo as taxas de juros, nao para incentivar a en- ada de capitais e compensar 2 perda de reservas, mas para sitar a dolarizagao e 0 colapso do padre monetério nacio- al. Ao invés de aplacar a polarizacdo das antecipagées no nso da mosda estrangeira, este movimento aponta para ma inevitavel expanséo do estoque de quase-moedas e, ortanto, da liquide? financeirs e para 0 avanco da inflacso. Jos pafses endividados da América Lating, a inelasticidade as reservas as desvalorizacdes ou sua extrema sensibilide- le aos “atrasos” percebidos do cémbio, juntamente com ineficdcia da taxa de juros na regulacao de novos fluxos de apitais, sao fatores decisivos para explicar os fracassos des »oliticas de estabilizagao que ndo conteram com decisive Ipoio externo. Servem também para explicar 0 sucesso dos »rogramas de estabiliza¢ao do México e Bolivia, Quanto 20 Wéxico, aliés, ndo se sabe dizer até quando sera possivel nanter @ inflagdo sob controle sem nova rodada de finan- siamento em moeda forte, porquanto seu déficit do balango Je pagamento em transagdes correntes jé alcanca niveis muito elevados, com a economia semi-estagneda. Pelas raz6es acima, a indexagdo que os agentes antec ‘am pare 0 cémbio pode ser considerada a mais perfeita, no entido de que os possuidores de ativos em délar sao de- entores de um monopélio que podem usar contra 0 con- Unto da socledade, ameagando permanentemente o valor Ja moeda nacional ~ seja através de imposipao de desvslori~ :agbes cambiais ou de exig@ncia de taxas de juros elevadas 10 plano interno, C2mbio e juros, nas condicdes descrites de srise externa, apresentam um grau de complementariedade vara quem detém o poder de gerar liquidex em délar. O orimairo define o contravalor em moeda nacional de uma dada venda no mercado externo; os segundos determinam ‘9 ganho financeiro possivel derivado da liquidez gerada. Assim, dados os precos internacionais, a indexagao do cambio nas bases que apontamos corresponde a um meca~ rnismo automético de preservagdo das margens de lucro (ou da relacao cimbio-salério) da exportagao, 0 que confere um maior grau de certeza a priori a decisso empresarial de uso dos ativos para produzir para o mercado externo. © outro motivo de vantagem do uso do capital para ex- portacao esté na periodicidade frequente da indexacao cam- bial. A desvalorizagao disria (introduida em 1985) corres onde a um estigio maximo de aperfeicoamento da indexa- Gio, © no € por acaso que ela esté referida 8 atividade que gera a liquidez no ativo mais escasso nesta economia, 0 d6= lar, Permite, por outro lado, algo da maior relevancia: a pro- duc3o para exportacao pode prescindir de parametros de antecipacao de custos que protejam as margens de lucro de variacées imprevistas durante o periodo de produgao. O nt- val @ a velocidade de inflagao introduzem este tipo de risco, 3 menos da indexaco freqliente e com o grau de “*pertel- 780” esperado do cambio, Todos os setores de producéo para o mercado interno ou externo procuraram aperfeicoar axpedientes de redugo do tempo de producao (que aqui eve ser entendido no sentido amplo, envolvende a circula- So Paulo em Perspectiva, a(1:63-76, janw/mar, 1990 Bo). Estes s80 08 cesos da regulagéo dos estoques @ do en- curtamento dos prazos de venda, mas o perfodo de produ- 0 propriamente por fatores técnicos, até certo ponte in- comprimivel. Por estas razdes, o critério de custos correntes sobre os quais se aplica 0 mark-up para a formagao dos pre- 605 das mercadorias no pode ser mantido, exceto sob 0 ri 0 elevadissimo (e crescente com a velocidade da inflacao) de quebra de rentabilidade, ja que os préprios custos devem ser antecipados sob condigies de incerteza. A propésito, 0 ‘custo de salério com periodicidade de reajuste mensal (a tualmente) © uma regra de indexagdo, na prética, defesada & © nico item de custo com relative estabilidade durante o periodo de producso. Entendemos por “financeirizagéo dos pregos” s genere~ lizagto da referéncia & taxa nominal esperada de juros de curtissimo prazo como critério para os ajustes de pregos dos bens. Dado que este taxa & também a que corresponde ao rendimento esperado da riqueza inativa (om particular na forma das “quase-moedas") e dada ainda a conexéo que, ‘como vimos, pode ser estabelecida entre c&mbio ¢ taxa de juros, este critério atende & condigao da formagéo de pregos de atuar compensetoriamente aos diferenciais de isco, proteoao @ liquidez que se abriram ao longo da crise entre riqueza ative ¢ inativa e entre 0 uso de ativos destinados 8 produgio para mercado interno e para exportaco. Tal base para a formagao de pregos introduz efetivamente uma inér= cia, mas corresponde também a uma forma de dolerizacdo da economia sem a referéncia direta 8 moeda estrangeira. A Instabilidade das taxas de juros, ou a instabilidade financeita de um ponto de vista mais geral, fica, por outro lado, incor= porada diretamente aos precos em uma extenséo muito maior do que © impacto dos encargos financeiros sobre 0 custo de produgéo. Podemos considerar isto como um sin= toma de que o critério keynesiano do “custo de uso” dos ativos generaliza-se e domina @ formacéo de precos. Convém lembrar que este 6 0 preco que a sociedade brasileira vem pagando para que 8 decisdes passadas de acumulegéo de riqueze privada sejam presentemente legiti- madas na auséncla dos padrées que so adequados as eco- nomies capitalistes para a avaliagéo dos valores patrimo- pias, © outro panto a ser lembrado é que o Estado & quem absorve 0 nus apontado ecima, dada sua condigso de ges~ tor de moeda ou, no caso, das “quase-moedas”. IV ~ A polarizacao da riqueza e a crise da gestdo moneté- Entre os ativos financeiros podemos admitir a hipstese de substituigao. Esta ¢ ume decorréncia de prépria natureza destes stivos, em que retorno & forma dinhsiro é assegu- rado contratualmente, no caso das aplicacées a juros, ou através da organizacdo de mercedos para negociagéo & vista dos titulos, como ocorre com as aplicagées “de risco”. Em ‘outras palavras, o “afastamento” da liquidez dos ativos fi- nranceiros 6 uma funcao exclusivamente do tempo 0 prazo de vencimento da aplicacdo caracteristico dos ativos a juros @ ou 0 prazo médio de negociacao nos mercados spot para as, aplicagdes “de risco”. A acumulecdo de ativos reals nao é acompanhada de garantia de retorno datado & liquidez, nem (98 mercados esto orgenizados para se prestarem, em gerel, & sua pronta negociagdo. Esta diferenga configuraria uma desvantagem aos ativos que compéem a riqueza real, mas compensatorismente eles detém a propriedade reprodutora, ‘o que abre ums dupla possibilidade de preservacéo de seu valor sob a forma social da riqueza (vale dizer, no dinhsiro} 1) regular, através do fluxo da producdo corrente, a escassez ou @ redundancia relativas dos ativos reprodutivos e 2) pro- teger seu valor através da fixazao dos procos dos bons para cuja producéo estes ativos servem. O risco tipico que se apresenta ao detentor de ativos reais & o de que estas alter nativas no bastem para confirmar as ostimativas foitas no inicio de cada periodo de producéo. No Brasil, foram neces- sérias uma gravissima retrag8o dos investimentos (uma virtual paralisagao dos fluxos Ifquidos da nova riqueze real) 2 uma forte reacéo dos precos da producéo corrente para “ajustar” 0 estoque de capital real & rentabilidade esperada por sous detentores. 0 retorno a liquidez, nas formas jé descritas para os ati- vos financeiros, permite a revisdo periédica das decis6es de portili, de maneira que é possivel reduzir 0 risco tipico dos ativos reais. Mas persiste a ameaca de que alteracées em varidveis no controlades diretamente por seus detentores 80 apresantem antes do retorno & liquidez, Inadimpléncia do devedor e variagbes nas taxas de juros ou mudancas bruscas nas condigdes de negociacdo dos mercados spot so fatores de risco, diante dos quais sé desonvolvidos mocanismos formais de salvaguarda (como garantial e técnicas de diver- sificago de aplicagSes. Historicamente, porém, os ativos fi- nanceiros sempre estiveram sujeitos & desvalorizaglo pro- vocada pela inflagio. O risco da inflago vem sendo neutrali- zado pela indexaggo, que pretente garantir 0 poder de com- pra dos ativos financeiros. E importante sublinhar que, com a existéncia de merca- dos financelros desenvolvidos, a acumulacéo de riqueza fi- nanceira se distribui por uma variedade de titulos ¢ valores, englobando mosda e aplicacées a juros e de risco com dis- tintos graus esperados de protecao @ rentabilidade, Como protepao e rentabilidade devem ser antecipadas para os pe- riodos de iliquidez (vale dizer, pelo tempo de permanéncia dos titules em carteiral, cada agente detentor de riqueze fi- nanceirs pode “escolher” uma carteira da ativos. Em suma, hd ume diversidade de opinides que em um modelo simpli- ficado de dois ativos (moeda e titulos a juros) pode ser re- tratada, como Keynes 0 fez, segundo as opinides dos pélos “baixista” - formado por aqueles que antecipam 0 aumento da taxa de juros ee queda dos precos dos titulos— e “altis- 1a" constituido por aqueles que prevéem a queda da taxa de juros @ a conseqiiente elevacdo dos precos dos titulos. A efetividade da politica monetéria vai depender da existéncia desta diversidade de opinides: ela serd eficez se através da taxa de juros conseguir regular as opiniées predominantes estes pdlos e, desta forme, induzir mudancas na composi- 7 ¢80 dos pont. Nao seria possivel reduzir a taxa de juros, or exemplo, $2 todos estivessem firmemente concentrados om expectativas "baixistas”. Para retratar 0 cas0 brasileiro, vamos considerar os se- quintes stivos: moede, ou o “dinhelro velho” (M), quase~ meoedes (QJ, titulos a juros (7) e valores negociados em mercados spot (V) (como agdes, contratos futuros, ouro e 6lar paralelo). Devemos admitir alta substituicse entre eles. ‘A aquisigdo cle um determinado ative abodes 20 crtério do sua velorizacéo real esperada em um certo periado, célculo que vai depender, alm de avaliegao do rendimento préprio do ativo, da cobertura que ele promete pers o risco da infia~ fo e para o risco puro de capital {ignoremos o risco de ina~ dimpléncia do devedor). O valor real esporado da posse de Lum ativo pode entéo ser definido como: Wy = pp, onde W_, € 0 valor real realizével esperado para a posse do ativo Ji € 0 prego real esperedo do ativo J e J, € 0 valor no~ minal de eplicagao no inicio do periodo. = , constitul o crité- ic rio fundamental de revisdo das posicées de carteira, Para cada um dos tipos de ativos que selecionamos, © prego real esperado = apresenta caracteristicas particulares: ~ para a moeda, equivale simplesmente 20 inverso do indi ce de procos esperado ltyq = 1/ph = para os titulas a juras, depende do rendimento nominal que’a aplicacao promete, da eficacia que se atribui a indexa: oe da aveliagao do risco de variagdo das taxas de juros durente © periode contratual, fator que pode determinar jerda de capital: x, ='T.q,, ondor, &0 indice que avalia perda de capital: 2 = "Tay, onder, €0 Indice que aval © rendimento global do titulo, incluida uma parcela de cor- rego monetéria além da taxa de juros das aplicegées a pra: 20, € 4,60 indice de variagéo esperada do valor nominal do titvlo para negociacéo au resgate antes do prazo de venci mente; — para 0$ valo.es negociados em mercados 8 vista, depende da variagto real esperada dos prevos spot do ativo (m= “y, fonde qy €0 indice antecipada de preco spot futuro do ativo}: = pare ‘as quase-moedas, onde se supde que nao hajs risco de capital devido a0 prazo reduzido de iliquidez, é fungao de txa real de juros esperada de curissimo prazo (rq = “ey onde 1, ¢@ taxe nominal de uros de curto prazol. © que se assistiu na economia brasileira ao longo dos anos 80, no campo finaneeiro, foi a progressiva thcapacidade de formacéo das antecipacdes dos precos esperados =, ¢, conseqiientemente, dos valores esperados dos ativos firvan- celros, Em todos os casos, 0 problema apresentou-se na forma de crescente ctivida sobre o rendimento esperado dos ativos diante da evolucéo dos precos. 0 rendimento es- perado ere dificil de prever nos perfodos mais longos © as eventuais perdas de capital estiverem sujeitas & instabilidade acentuada das texas de juros, Isto equivale a dizer que, no ‘caso dos titulos a juros, apropriados 3 intermediacao finan- ceira (ativo T), © dos haveres negociados em mercado lative Vi, 08 valores de r/P, Gy © dyjp Poderiam softer inesperada substancial queda, Para a moeda (ativo M), podemos con- siderar que havie um alto grau de certeza, mas neste caso de perda do valor do ativo, Cabe acvertir que 0 risco de desvalorizacéo dos ativos financeiros estaria presente mesmo na hipdtese de estabili- dade da taxa de inflagao, bastando que ela se sustentasse em um nivel elevado. © que @ persistente aceleracéo infla~ ciondria observada durante os anos 80 introduziu foi um componente adicional de incerteza nas antecipages dos pregos e na utilizacao dos indexadores. ‘A indexagao formal, mesmo na modelidade posfixada, do se sustenta enquanto fator de estabilizacSo das anteci- pagdes se a infiacdo & alta ou, menos ainda, se esté sob constante ameaga de eceleracao. Isto se deve a0 risco de mudanca de indexador, de expurgos, prefixacdes ou perdes derivadias de aplicaggo dos “‘choques” antinflacionérias. Sob inflaco muito elevada e forte tendéncia de aceleracio, surge um outro motivo de agravamento de incerteza: as defasagens entre 0 periodo de colata dos procos que serve 8 fixacdo do indexador e os precos atualmente praticados. ‘As quase-moedes (ativo Q), sobretudo na forme da “moeda indexada”, se distinguem dos demais ativos néo sé pelo rendimento que prometem, mas, antes de mais nade, pela sua elevada liquidez. Nas condigdes descritas, a “moe- ds indexada” passa a se constituir na Gnica forma de prote- G80 do valor da riqueza financeira. A impossibilidade de se proceder &s antecipacdes com um minimo grau de certeza obriga & concentragéo das decisées de acumulagéo finan- ceira na “moeda indexada'’. Isto feito sob 0 suposto de que € possivel a qualquer momento rever a deciséo e alterar correspondentemente 2 composicao do portfélo. Em outras palavras, ‘ep/p € 0 prego real que pode ser previsto com a maior certeza porque & passivel de répida reviséo com pe ‘queno risco de perda de capital. Desta forma, 38 quase-moedas tenderam a absorver erescentemente a riqueza financeira, inclusive no caso dos agentes cuja estrutura de recursos comportaria aplicagdes de risco ou a praz0s mais dilatados. Isto explica a grave de- sintermediagéo financeira ocorrida no Brasil nos anos 80. Por outro lado, 08 “aperfeigoamentos” que foram introduzi- dos por bancos e pelo Estado na forma quase-moeda leva~ ram & submisséo da demanda da moeda pare transagées as motivagées especulativas. O desiocemento das carteiras e da demanda de moede para as quase-moedas foi, por estas ra- 2606, quase integral. Restaram apenas posicées pouco ex- pressivas na “moeda velha' (ativo Mi} ¢ em valores (ativo V). 0s ativos a juros que serviem & intermediacao financeira (2 tivo T) virtualmente desapareceram ou perderam suas ca~ racteristicas de instrumento de intermediag’o para se transformarem em quase-moedas. Devemos ressaltar as mudangas decisivas que tiveram lugar no sistema financeiro partir do processo descrito acima: = 2 intermediacdo financeira regrediu aos padres anterio~ ree bs reformas bancSria e financeira de meados dos 60. Os titulos da divida publica, como jé vimos, deixam de servir a0 ‘So Paulo em Perspectiva, (1:62.75, jan.tmar. 1990 financiamento do setor piiblico para lastrear a “moeda inde~ xada"; = a cléssica segmentagao da demanda de moeda pelos mo- tivos transacao, precaucao e especulacao perde sentido. To- dos 0s motivos sé0 absorvides pela demanda de “moeda indexada”, que é essencialmente especulative; = a8 instituigdes, empresas e individuos formadores de po- sigdes financsiras passam a stuar como se todos fossem agentes “fluidos” (a expressdo 6 de Hicks}. A formarao de posigGes “sélidas”” no aguerdo de retorno @ longo prazo po- deria ceuser perdas irreversiveis, dada a instabilidade da economia, Preservar 4 liquidez para antecipar possiveis mu- dances do quadio financeiro é @ estratégia tipica do agente fluido, que vai dominando todas as acées de pequenos ou grandes investidores, aplicadores individuais ou institucio- nas. Esta situagdo ou estado das expectativas corresponde, de um ponto de vista koynesiano, & constatagao de que vai se formando uma preferéncia absolute pela liquidez, con centrada nas quase-moedas, ou uma polarizacgo radical das opinides e antecipagées financeiras, onde todos se tornam “paixistas”. Isto tem conseqiéncias importantes sobre os limites da _gesto monetéria e 0 manejo da taxa de juros pelo Banco Central. ‘Ao lado da polarize¢o da riqueza financeira nas quase- moedas, os demais ativos @ mercados tiveram suas dimen- ses restringidas. Mas, @ despeito disto, passam a cumprit papéis importantes. 0 pequeno estoque de moeda serve de base a0 lucro inflacionério que os bancos disputam entre si, lenquanto os mercados de risco passam a ser o locus por ex- coléncia da ospeculacdo financoira, Essos mercados exercem internamente um papel semethante ao da especulagao cam- bial na formago do valor externo da moeda. Fornecen uma sinalizagao para a fixago de taxa de juros de curtissimo pra- 70 no nivel que seria necessdrio para preservar o valor es~ perado da “moeda indexada” e, assim, manter as posicées neste ativo. O poder e a ressonincia da sinalizacSo origind- ria destes mercados relacionam-se diretamente com sua re- duzida dimensao, diante da dimenséo dos direitos ecumula~ dos sob @ forma liquide e protegida da riqueza. Isto significa que, se a gestéo monetéria tentar resistir 20 ajuste das taxes de juros, um deslocamento ainda que marginal das quase~ moedas para os mercados de risco — incentivedo pela ex- pectativa do valorizacio induzida pelos intermedi rios finan- ceiros ~ somente poderd ser absorvido por um aumento das cotagdes. Este 6.0 movimento que referenda 0 ganho espe- culativo dos operadores destes morcacos e que vem amps- rando 2 proliferagdo de instituigées financeiras neste ramo. A percepgao de que a reacdo dos precos spot venha a ser muito forte, de sorte a contaminar outros precos ¢ valores. Jeaso das hens estocdveis, como matérias-primas @ bens durdveis, imévels e até terras}, pode detonar uma corrida para a formacio de posicdes em stivos reais e bens, levando A destruigsa das quase-moedas. Isto equiveleria @ uma ruptura definitiva do padra0 monetario, 4 que nem mesmo n as quase-moedas ou a “movda indexeda” seriam capazes do preservar a confianga dos agentes, Na hiperinflacao esta confianca néo mais existe, 0 que leva cada detentor de ri- queza, como Gitimo recurso, a formar estoques em ativos “fortes ou simplesmente em bens. (© mesmo processo pode ser desencadeado @ partir de ‘uma tentativa de monetizacao da divida publica com propé- sito de reduzir o déficit financeiro do setor puiblico ou por um rebaixamento deliberado das taxas de juros com 0 obje~ tivo de guiar as expectativas de precos. Se as expectatives do se alteram imediatamente, considerados os tamanhos relativos dos mercados, a ago dos operadores financeiros Induziré reagdes dos agentes “fluidos’. Isto pode detonar a temida “Onda de desconfianea”, a ndo ser quo o gestor da moeda recue em seus propésitos de “estabilizagao” e, no- vamente, reafirme o valor da “moeda indexada”. Daf serem permenentes, por razdes estritamente monetérias, as ten dancias de aumento dos custos financeiros nos orcamentos piblicos e de crescimento da divida publica. Nao € o tame- nho da divida em relagdo ao PIB o fetor relevante para a avaliagéio dos riscos de uma hiperinflagao aberta @ sim a magnitude da riqueza acumulada sob a forma de quase- moedas ~ lastreadas em titulos publicos ~ diante dos aca~ nhados mercados alternativos @ da inelasticidade a curto prazo da oferta de novos titulos. E neste sentido que a gestéo monetaria no Brasil per deu efetividade: ela n3o 6 capaz de guiar as expectativas determinar as taxes de juros porque esté prisioneira da po- larizagao da riqueza financeira nas quase-moedas. Esta po- larizacdo foi patrocinada como meio de recompor a precéria unidade das funcdes da moeds. Dela se nutre agora o mer- cado financeiro que, sem funcéo intermediadora, especiali- z0u-se em especular contra esta falsa unidede. € ela quem comanda a politica monetaria e os movimentos das taxas de juros. \V — A reforma monetéria Principios da reforma A felsa_unidade monetéria propicieda pela “moeda in- dexada” vem impedindo que @ hiperinflacao se explicite. Determina, no entanto, uma dinamica de pregos e dos mer- cados de ativos extremamente perversa. A instabilidade do pregos e 2 ameaca de ruptura sao crescentes. Por outro la- do. @ atraga que as quase-moedas exercem vai concen- trando todo tipo de saldos monetérios, poupangas e riqueza financeira, praticamente englobando todos os agentes: indi- viduos € produtores, investidores institucionais, rentistes © especuladores. Todos, na pritica, especulam contra a moe- da, Nestas condigdes, torna-se impossivel 0 movimento na diragéo oposta, vale dizer, um processo que recomponha os critétios adequados da formacao de precos, restaure as di- mensées relatives dos mercados financeiros ¢ recupere os padres de avaliacio 9 risco da posse das diferentes classes n de ativos. Um “efelto riqueza” de enorme potencial instabi- lizedor pode ser desencadeado, se a tentativa de reordena- mento & abrupta, buscando, de um s6 golpe, alterar radi- calmente as expectativas, ou ainda se a politica de estabiliz 80 4 gradativa. Teoricamente, neste caso, 3 reacomodacso da riqueza financeira poderia nao apresentar efeitos explo: vos, mas para que isto fosse verdadeiro, seria necessaria uma distribuigéo da riqueza financeira em carteiras diversifi- cadas e em complexos de opinides e avaliacées divergentes, que iria se alterando aos sinais de mercado. A polarizacso da riqueza financeira nas quase-moedas, em um quadro de opinides em que todos s80 unanimemente “baixistas", no admite estas hipéteses. E nesta perspectiva que podemos entender a afirmacdo de alguns analistas de que © tinico instrumento de politica econdmica ainda eficaz na atualidade é a taxa de juros. Ad- mitem implicitemente a irreversibilidade do quadro @ to ‘mam como um dado que 8 gestéo monetéria deva sancionar passivamente todas as dividas e movimentos especultivos, ‘em toro & riqueza financeira. Foi esta, alids, a diretriz de politica econémica sequida apés 0 Plano Verdo. Precos e controles cambiais foram liberados ¢ 0 Banco Central 1 unciou a qualquer tentativa de estabilizer a taxa de juros. Esta, na pratica, tornou-se também “livre”, 20 sabor da es- peculagéo promovida pelos operadores financeiros, quando no era manejada no sentido de antecipar os movimentos especulativos dos mercados de isco, sancionando toda e qualquer pressao dos operadores. A politica econémica de 1989 © deste primeiro trimestre de 1990 determinou, assim, um over'shoating na economia, em termos da instabilizacéo de pregos, da crise cembial e do déficit financeiro do setor piblico, servindo como uma prévia do que pode vir a ser ‘2 implantacdo de uma politica dita liberal hoje no Pais. Co- mo mostraram os balangos de grandes empresas @ bancos de 1989, esta 6 a melhor maneira de fazer valer 0 que nao vale e de propiciar lucros inflaciondrios para quem detém o poder discricionério sobre moede na forma fracionada como ela se apresenta no Brasil. Por outto lado, deixa uma certezs entre analistas © agentes da economia: a de que somente medides radicals sero capazes do restaurar é legitimidade da riqueza e dos patriménios acumulados e afastar o fantasma da hiperinfla- so. Sobre esta questo, dois conjuntos de opinides extre- mas se formaram: de um lado, 0 dos que advogam uma profunda reforma do Estado; de outro, 0 dos que nao véem outra saida sendo 0 “calote” da divida interna. Ambos com- portam muitas variantes, que aliés so de fundamental im- portancia porque, seja qual for 0 encaminhamento para um ‘u outro lado, ha a questo decisiva da justice social envol- vida nas reformas. Redugéo de salérios, faléncia da peque- nos produtores, sscriticio de fundos sociais ou da poupanga popular no s6 seriam injustos como incapazes de resolve: uma erise cula natureza é monetéria ¢ sleangou a maior gra- vidade, Uma reforme do Estado que envolva reforma fiscal, reforma administrativa e privatizagdo de empresas estatais, dove ser orientada para permitir a recuperacao da capacida- de do gasto w do investimento puiblico no campo sacial e da infra-estrutura, mas nunca para dar validade @ uma riqueza ficticiamente acumulada, 0 que equivaleria a sacrificar as fragées menos protegidas da sociedade, 0 servidor ¢ 0 pa- triménio piblico para preservar a riqueza e o lucro inflacio- ‘nério do grande capital. Deveriamos ter claro que, em um momento como 0 que atravessamos hoje, seria precisa- mente este o contetido de certas propostas pretensamente neutras € consagradas pela teoria econémica, como @ que prega a reforma fiscal, com o objetivo de neutralizar o déficit financeiro do setor piblico. Apenas ums orientacao de ro forma fiscal poderia pleitear contetida de neutralidade e jus- tiga: uma reforma concebide em torno 80 imposto sobre a riqueza e 0 patriménio. Em particular, concorreria para uma. répida recuperacao fiscal do Estado a instituicdo de um ca- pital evy, uma imposi¢éo cobrada de uma s6 vez, através de ‘uma aliquota sobre as grandes riquezas financeiras € 0 pa- triménio Iiquido das grandes empresas, de preferéncia re- troagindo 2 31/12/89 para captar a riqueza que pode ter sido deslocada apds esta data. No contexto das crises monetéries dos nos 20, Keynes defendia esta medida como a mais justa, mas nas condi¢des brasileiras até mesmo ela pode ser ineficaz devido 8 ago dos grupos de pressdo e do poder hoje t8o cristalizado dos detentores de riqueza. Por outro lado, no tempo que mediaré entre a antincio da reforma e sue execugSo, a situacao finenceira do Pais poderé se agre- var de tal forma que a hiperinflagdo seria inevitével, € crucial ‘que seja promovida uma reforma fiscal, apoiada particul mente no capital levy, explicitamente destinado a financier um programa social para o Pafs, A reforma monetéria colo- ca-se em uma outra dimens&o e sob um objetivo que difi- Imente a reforma fiscal seria capaz de atingir: a restaura- 980 definitive da unidade da moeds, © assim chamado “calote” contém vérias alternativas. Um caso limite podemos tomer da experiéncia alema do apés II Guerra Mundial, em que os saldos financeiros per= deram velor quando da introdugdo de uma nova moeda na proporcao média de 100 para 6,5. Um outro exemplo 60 da Argentina, que recentemente converteu titulos da divida pu= blica de curto prazo em titulos de longo prazo, representan- do isto uma efetiva desvalorizacdo dos saldos preexistentes na proporcao do deségio na negociacao dos titulos conver \idos. Finalmente, uma outta possibilidade no caso brasi- Ieiro serie de que 0 governo simplesmente retirasse o lastro em titulos pablicos que dé 4 “moeda indexeda”, de forma ue 08 bancos no mais pod ir quase-mosdas. Note-se, porém, que neste caso a inevitével monetizagéo ne vyelha moeda que teria lugar desencadearia uma onda arra~ sadora de consumo (um “efeito-dissaving” semelhante 20 que Nurkse descreveu na hiperinflacdo alen& de 1923) uma desenfreada busca de formacao de estoques em ativos, Inclusive ativos reals (um “efeilo-portt6lo” semethante, mes de intensidade muito maior do que este que presenciamos ros titimos meses). A hiperinflaco, neste caso, se encarre- geria de desvalorizar a riqueza em fuga, So Paulo em Perspeetiva, 1):63-76, januimar. 1890 (© ponto a ser levado em conta nestas variantes & que fom todos os casos os detentores da riqueza financeira sio tratados indistintamente: pequenos e grandes poupadores, especuladores e fundos de poupanca, bancos e empresas que em outra situacio poderiam deslocar recursos para o fi- nanciamento, 0 investimento e a ampliaggo da producao. Tendem, por outro lado, a punir os menos geis em rever posigGes e os que detém limitado poder de efetuar opera~ 608 ilagais (como o envio de recursos para o exterior). O objetivo de uma reforma monetéria no deve ser 8 destrui- G20 das inslituigdes que mobilizam recursos financeiros € poupancas ou a ruins dos agentes produtivos que detém saldos financeiros, mas sim 0 de estancar 0 contetido espe- ‘culativo que suas agdes apresentam no momento, recuperar ‘suas funcdes © a contribuicdo deles esperada na formacao do emprego e do produto nacional. Uma reforma monetéria deve, portanto, atender a mul tiplos requisitos, como os de natureza estritamente moneté- ria, quais sejam, o de resgater a unidade monetéria, 2 con- fianca no gestor da moeda @ a destina¢o produtiva do po- der de compra @ da riqueza acumulada, Mas também deve ‘observer 08 objetivos de justice social na distribuigio de eventuais perdas ou Gnus da reforma, de proteco & pou- panga popular, além de concorrer para o reerguimento fi: nanceiro do setor piblico. A reforma monetéria © programa a seguir respeita esses requisitos e objeti vos. Ele tem por base a criagdo de uma nova moeda © @ sus pensio condicionade da liquidez na mosda antiga (cruzado novol. Nao promove desvalorizacées arbitrérias da riqueza financeira, mas téo-somente restringe sua liquidez para fins néo-produtivos. A contribuie30 a0 investimento, a produgso fe a0 desenvalvimento do mercado de capitais & 0 critério fundamental pera a conversao plena dos saldos em cruza- dos novos & nove moeda, bem como para o retorno integral da liquide do estoque de riqueza. Para @ grande maioria de detentores de ativos e aplicagdes financeiras, sequer se colo- cam 0s condicionantes acima, de forma que converséo & no- va moeda & plena e automitica. Para que nao haja incentivo ao deslocamento de saldos financeiros pare 0 consumo (um “efetivo cissaving”) durante a vigéncia do programa, esté previsto um prémio de juros para uma “‘cademeta de poupanca especial”, contendo as mesmas caracteristicas de atual, porém rendendo 0 dobro de juros pare aplicagdes sem resgete durante o prazo de.um ‘A reforma monetéria nao pretende promover de ime: diato qualquer reforma no sistema de indexacdo e no siste ma finanesiro, 0 que no entanto seré absolutamente neces sério para preservar condicdes de estabilidade da moeda e de financiamento da economia com vistas 20 crescimento futuro. Tampouco contempla em si uma raforma fiscal, em= bora contribua para a reducdo dos encargos financeiros que asfixiam atualmente os orgamentos piiblicos. Simultanea 8 mente & reforma monetiria, deveria ser enviada ao Con- ‘gresso Nacional uma proposta de reforma fiscal concebida em torno & instituicso do capital levy e 8 uma reviséo pro- funda de aliquotas e incidéncias dos impostos existentes, além de subsidios e incentivos fiscais. A reforma fiscal vise reordenar © setor publico também com vistas a0 cresci- mento futuro da economia @ deve ter a direcao do atendi mento ds demandas sociais em substituic3o ao atendimento das demandas empresariais que prevaleceram nas uitimas décadas no acesso aos recursos e bens pibblicos. Para a reforma monetéria ficam reservadas tarefas cru- ciais, como as de estancar ¢ atual forma dominante de re- produgao da riqueza, restaurar a confianca na moeds e re: conduzir os agentes privados e pilblicos as funcées produti- vas a eles correspondentes na saciedade. Eis os pontos principais da reforma monetiria | ~ Cria anova moeds. 11 ~ Fixa regras de conversio dos saldos existentes nesta data 4 nova moeda: 1. Meio circulante: ao par, imediatamente. 2. Depésitos (@ vista, remunerados e @ prazo), open, fundos de curto prazo e demais aplicacées ~ pessoa juridica a) 80 par, contra apresentago da folha de paga mento; bb) 20 par, contra recolhimento do ICMS para a com- pra de mercadorias; ©) a0 par, contra recolhimento do capital levy: 4} 20 par, contra aquisigéo de Titulos do Desenvol- vimento Econémico (TDE ~ prazo de § anos, cor- regdo pelo IPC e juros 8% a.a.); el 20 par, contra apravacao por érgé0 competente (8NDES, CEF, 88, Finep] de programas de inves- timento; 4) 20 par, contra inversdes no Programa de Privat zagao de Governo: 9} 20 par, contra aquisi¢so de apdes novas de em- presas com projetos aprovados nas condicdes do item “e"; h) a0 par, contra crédito novo & atividade produtiva (no caso da carteirs prépria de bancos e institui- (Ges financeiras}, respeitados os limites de expa so do crédito pela Comisséo de Politica Monet 14 1) os haveres em cruzados novos serio corrigidos monetariamente pela variacao do IPC até 0 mo- mento da conversao 4 nova moeda; i) 08 direitos de converséo s80 inegociéveis e in- transferiveis; K) 08 direitos de conversto se extinguem em 3112094, 3 Depésitos (& vista, remunerados, a prazo, de pou- panca) open, fundos de curto prazo e demais aplica- 005 ~ pessoas fisicas: a) a0 par, imediatamente para os saldos de valor atual até NC2S 200.000,00; b) acima deste valor: ~ 90 par, contra retirada mensal de valor atual de até NC2S 100.000,00; = a0 par, contra aquisicao de imével sob condi- 608 a serem definides; = a0 par, nas condicées de “c”, “d",""f" eg", do item 2; = 0 saldo dofinide om “a” o nao utilizado polo perfodo de 12 meses render o equivalente a uma “eademeta de poupenga especial” com juras de 12% a, = valem as condicées “i”, "i" do item 2, Acesso a nova moeda @ & poitica monetéria Instituida a reforma monetéria, a questio imediata a enfrentar & 8 do acesso a nava moeda, enquanto nao se re- compdem as expectatives de longo prazo e se reorganizam ‘os mercados finanesiros. De fato, é tamanho 0 desequilibrio presente na composi¢éo da riqueza social que nao bastard estancar a reprodugao da riqueza financeira. € de se esperar um longo periodo até que os prdprios sinais de mercado e a gest8o monetéria (através de mecanismos convencionais) voltem a operar e possam presidir uma distribuic30 na for- ma de riquoza, quo aprosonte maior equil za ativa e no-ativa e menor dependncia de desequilfbrios do setor publica, Haveré um meio-tempo de intensa especulacao apostas na mudanca de politica econémica. Esta deverd manter-se ativa porque o reequilibrio dos estoques exigiré lum controle estrite dos fluxos. Mas 0 quadro no qual ope rar ainda sera marcado pela incerteza nas antecinacdes, de modo que as mudancas na forma da riqueza no imedisto period apds a reforma terdo cardter predominantemente especulativo e desestabilizador do programs. Por isso sera necessério cumprir com rigor a reforma quanto as regras de conversio, Serd necessério ainda estabclecer limites quanto 0 acesso & nova moeda pelos agentes econémicos. Serd este um momento peculiar da economia e de seu ‘ovo padréo monetério, em quea confianca na nova moeda entendida como a crenga pelos agentes privados de que ela vo sera produzida ou substituida arbitrariamente) ainda 10 se consolidou. Por isso seré de crucial importéncia im- edir que os centros de deciséo privados, ou até mesmo 0 tor piblico, disponham de poder de acesso a ela, que nao aja através das relagées mercantis do circuito corrente de rodugéo-renda A reqra ¢ para todos. Para o setor ptiblico deve prevale- er um teto de financiamento na nova moeda, segundo uma valiagdo fiel das suas necessidades de financiamento para ue possa ser rigorosamente cumprido. Neste momento, Nuito mais importante do que discussdes sobre a megnitu- Je do déficit publico & a percepcdo dos centros privedos de Jecisdo de que o acesso 8 nova moeda por parte do préprio estor ndo Ihe conferird um poder diferenciado. Quanto a0 setor privado, hd questées fundamentais a serém tratadas. A primeira delas é quanto ao acesso 8 nova moeda a partir dos direitos monetérios acumulados no pas sado. Se esses dirsitos puderom ser exarcidos de forma in- discriminada, reproduziremos inteiramente 0 quadro atual. ‘As regras de conversdo limitam esta via de acesso, Isto sig- nificaré apenas o rompimento com o pasado, um ato cru- cial para dar partida ao processo de rasgate das funcdes ‘monetarias, mas que nao esgota o problema, Ha que se le- var em conta 0 acesso corrente & nova moeda: 0 acesso através do crédito @ 0 acesso privilegiado que as condicées externas da economia dao aos exportadores. Nao basta definir uma mete monetdéria como a expan- ‘80 zero para a nova moeda ou querer fixar a taxa de cém- bio. Vimos como é complexa a politica monetéria face 8 na- tureza mutante das avaliagdes e expectativas, 0 que ndo admite regras rigidas de gestéo. Por outro lado, a formacso das expectativas quanto & taxa de cambio pode inviabilizar a sustentagao da estabilidade cambial. Nas atuais condicoes, 0 problema torna-se mais grave de ambos os lados: do lado a politica monetéria, porque a reforma agravaré em um primeiro momento 9 utiliza¢ao de instrumentos classicos de controle da oferta de moeda (como o open market}, quando precisamente serao maiores as incertezas das decisées. Do lado cambial, porque impossivel que a reforma contemple medidas de regulecéo das reservas no momento em que o Pole atravessa uma gravissima criso cambial. 0 principal instrumento de politica monetéria no perfo- do de implantaglo da reforma serd o crédito bancério, A ruptura da liquidez devide 4 reforma talvez provoque ondas de liquidago de ativos (como déiar, ouro @ estoques!, po- dendo determinar uma recessso na economia, o que ndo desejvel. O crédito fécil, por outro lado, pode concorrer para que néo se forme a confianca na nova moeda. A polft- ‘ca monetéria deverd ser manejada com extrema sensibilida- de: deve garantir as provises de moeda a partir da deman- a formada pela ampliacao da circulago industrial mas, a0 ‘mesmo tempo, recusar-se a sancionar as pressées para que ie @ circulagao financeira, dado que o movimento fi- ‘So Paulo em Perspective, 4l1):63-75, jon.lmar. 1990 nanceiro neste perfodo ter, como observamos, caréter ‘eminentemente espoculativo, Seré necessério criar instrumentos especiais para que seja exercida a politica monetaria a partir do crédito: = instituigd0 de depésito compulsério de 100% sobre os acréscimos dos depésitos de todos os tipos: = criagdo, no Executivo, de ume Comisséo de Polttica Monetéria, cujas principais func&es seriam: fixagio de limi~ tes de crédito por instituigéo financeira e acompanhamento da execugio da politica monetéria, com fixaggo de metes mensais. Certamente seré uma imposiggo do momento a decre- tag2o de intervengo nos bancos. O éxito da reforma deter- minaré uma brusca queda de rentabilidade no setor bancé- rio. A intervencéo seré proviséria e visaré eviter 0 erro do Plano Cruzado. Neste, a politics bancéria permitiy uma ex- ploséo do crédito em cruzado para que os bancos reajustas- sem seus portélios e procurassem recompor a rentabilidade abalada pela queda da taxa de inflacdo. Na questo cambial, o problema apresenta-se de forma ainda mais grave. A fixago da taxa de cambio e a suspen- so de pagamentos de toda ordem ao exterior so medidas necessérias, mas no suficientes para assegurar a estabili- dade da rela¢do externa da nova moeda. Este & 0 calcanhar de Aquiles da reforma, que terie uma chance de &xito quase integral se partisse de uma situeeSo mais folgada quanto as reservas cambiais e se fosse vidvel regular sues variagdes ‘com os instrumentos convencionais ou mediante o crédito internacional. © pior dos mundos soré tontar exercer con- trole sobre as expectativas cambiais através de desvaloriza- e6es do cambio, Isto nao apenas teré efeito nulo sobre as reservas, como tornaré, de salda, insustentével a menuten- 0 da estabilidade interna do valor da nove moeda. © Unico fator de efetiva estabilizacéo nesta matéria con- sistiria no apoio externo ac programa brasileiro de reforms, Mas isto sé pocleré ser negociado apés a sua implementa- sao. A reforma monetéria no pressupde 0 congelemento de pregos, mas este poderé ser adotado sob um critério parti- cular: 0 estabelecimento de uma regra minima e geral para 08 precos, dada a indeterminago dos eritérios atuais de sua formagao, A gravissima desorganizacao dos mereados que culmi- na na polarizagéo dinheiro-bens reforca @ possibilidade do lume fuga em massa da moeds, Nesta situscdo, infelizmente, 2 recomposic¢o dos mercados @ a restauragio das expecta tivas de longo prezo passam por um controle arbitrério ds liquidez e exigem um enorme grau de concentragio das de- cis6es. A antecipacio das medias fiscais e monetérias pelos agentes privados impede 0 Estado de regular a economia através de medidas convencionais, Neste caso, a prépria efl~ cécia das providéncias fiscais fica inteiramente subordinada a0 sucesso da reforma monetaria. O grau de arbitrio na exe ‘cugo desta seré proporcional ao estado de panico, . 5

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