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Jean Laplanche em Sao Paulo ‘DEPARTAMENTO DE PSICANALISE DO INSTITUTO SEDES SAPIENTIAE I gy eH te, INSTITUTO SEDES SAPIENTIAE DEPARTAMENTO DE PSICANALISE ‘Tradugio do texto La révolution copernicienne inachevée in La revolution copernicienne inachevde Jean Laplanche 1992, Ed. Aubier ‘Tradutoras Mania S. Deweik Psicanalista, Membro do Departamento de Psicandlise do Instituto Sedes Sapientiae. Maria de Lourdes Caleiro Costa Psicanalista, Membro do Departamento de Psicandlise do Instituto Sedes Sapientiae. (radugio nio oficial, para fins didéticos) Secretariado e Digitagiio Roseneide O. Batista Projeto Grafico e Diagramagio Plinio de Sousa - CPD - SEDES Capa ‘Alexandre Martins Fontes Redacao Administraciio e Correspondéncia Rua Ministro Godoi 1484 sala 24 ‘So Paulo - SP Cep: 05015-900 } Fone: (011) 262 - 8024 - Fax: (011) 873 - 2314 Setembro / 1993. ‘CONFERENCIAS - IEAN LAPLANCHE- 1 aL REVOLUCAO COPERNICANA INACABADA INTRODUGAO A TRADUCAO ‘A vinda do Dr. Jean Laplanche para Sio Paulo ¢ a necessidade de divulgar seu tiltimo texto “A Revolugdo Copernicana Inacabada” para os membros do Departamento de Psicandlise do Instituto ‘Sedes Sapientiae e, por extenséo, pata os patticipantes de suas conferéncias em Sao Paulo , foram as molas propulsoras do presente trabalho. ‘Emseu percutso, otextoretoma a revoluglo iniciada por Freud com sua teoria da sedugiona questio do “corpo estranho" que age internamente produzindo sintomas muito tempo depois da ago traumética ter ocortido. Ao colocar em questo a génese do sujeito psiquico, Laplanche fala de um " estrangeiro " chamado inconsciente. B “desse outro psiquico", o inconsciente, de sua origemnoserhumanoapartir de uma sedugéo otiginéria na qual o adulto propée & crianiga "significantes enigmiticos” a serem traduzidos, que se centram as réflexdes do autor no presente texto. "Apesar destas questdes ja habitarem o universo de vétias de suas obras, notadamente Vida e Morte, em Psicandlise e Novos Fundamentos para @ Psicandlise, o inovador deste texto est na tentativa de ir além do Froud, apontando aberturas através das quais pode se manter © copemicanismo de sua descoberta, ‘Com habilidade extraordindria e a partir de urcia ética singular, Laplanche faz falar os textos de Froud, extraindo de sua riqueza contradigées e lacunas, a partir das quais forja concepges originais ccujas consequéncias, tanto teéricas quanto clinicas, esto ainda por ser desenvolvidas. "Acstrangereidade interna mantida pela estrangereidade externa, a estrangereidade externa mantida por sua vez pela relagio enigmética do outro com seu priprio estrangeiro interno, eis, nas palavras do prdprio autor, o cere de sua proposta neste texto tio fecundo. ‘Quanto a tradugéo, foi o proprio Jean Laplanche, ttadutor da obra de Freud, quem nos fomeceu referéncias titeis de como proceder diante de adaptagées necessérias do texto, de licengas linguisticas por ele utilizadas e construgées em francés sem equivaléncia em portugués. Bele quem nos diz em sua obra Traduzir Freud que “a tradugdo submetida @ prova do estrangeiro éaquela que de forma nenhuma tenta domesticar ou aclimatar o texto, para fornecer uma espécie de andlogo dele, accitével para nossa mentalidade e, citando Antoine Berman, ressalta que a tradugio" & ‘o modo de existéneia por meio do qual uma obra estrangeira chega até nés enquanto estrangeira. Aboa tradugio mantém essa estranheza tomando a obra accessivel para nds". No nosso caso, tratava-se niio apenas de traduzir do francés para o portugués um texto qualquer, mas de traduzir um autor tico e sutil em sua forma de escrever, mantendo as caracteristicas idicssincrasias de seu estilo, Evitamos a qualquer prego "aplastrar” tradugio com interpretagies ¢ deduges de sentido e tentamos manter um Laplanche... Japlanchiano, Isto significa que resguardamos totgdes, “quedas” de uma frase para outra e evidenternente 0 uso de palavras inesperadas, repetigdes ¢, era certos momentos, a espontaneidade do uso coloquial da lingua francesa, Fazendo justiga ao autor, tratamos duplamente de evidenciar 0 contetido da idéia de “estrangereidade” que o texto propée mantendo simultsneamente a estrangereidade da forma. ‘Ao longo do trabalho, com o objetivo de captar o sentido preciso de uma passagem ou de um termo recorremos textos auxiliares da propria obra de Laplanche, de Freud e de vatios pensadorese filésofos. Cada uma destas consultas resultou numa abettura e numa compreensio do texto inédita e rica, O conjunto de notas que acompanhiam a tradugdo & uma pequena parte destas pesquisas ¢ do aprofundamento que elas petmitiraro, Blas foram para nds uma espécie de andaime, estrutura auxiliar na construgio do sentido mais amplo do texto e que oferecemos ao leitor com a esperanga de que eles, possam Ihe ser vteis como o forain para nés. ‘CONFERENCIAS - JEAN LAPLANCHE - 2 de Laplanche cettamente suscitard. Finalmente, estas notas foram esctitas privilegiando eertos aspectos e trechos do texto em cettos Ingares que nos parecem nodais, O Ietor encontrard outros nés, outras formas de desfazé-los e criaré seus préprios. "Ariqueza do texto de Laplanche consiste em permitirjustamente esta multiplicidade e esta abertura, Mania. Decilk, Peicanalista ‘Merbro do Departamento de Psicandlise do Instituto Sedes Sapientiae. ‘Maria de Lourdes Caleiro Costa Pscanalista ‘Membro do Departamento de Psicanzlise do Instituto Sedes Sapientiae. ‘CONFERENCIAS -JHAN LAPLANCHE -3 APRESENTACAO Este volume reine meus principais artigos publicados em diversas revistas desde 1967. Sua disposigio no é temitica mas simplesmente cronolégica. Eles alinham uma reflexao psicanalitica ¢ constituera uma espéeie de contraponto aos diferentes livros publicados no mesmo periodo. Em sua sucessio no encontraremos ruptura, mas podetemos reconhecer um movimento que eu gosto de figurar como uma espiral: passar de maneita ciclica A vertical de certas pontos problemitices, a cada volta tomando um poueo mais de disténcia com telagéo precedente e desenhando mais nitidamente as opgies ¢ as difetengas. ‘Bno seio da experiéncia inaugurada por Freud- experiéncia indissoluvelmente clinica e tecrica- eu isia filoséfica- que se situa meu pensamento; nfo para polit as arestas ou aperfeigoar os detalhes, ras para fazé-lo trabalhar e, no sentido pleno das palavras, devolver-the a alma. “Tarefa evidentemente infinita e que o texto inaugural deste volume no pode ter como objetivo concluir: ele é, 20 contrétio, uma meditagéo sobre a necessidade de inintexruptamente reabrir a brepha original, outrora aberta pela estrangereidade do outro. Se ai nao estivesse o mago de nossa pratica © 0 novo de seu (te)eomego, a psicanilise nfo passaria de uma pobre e jd obsoleta engenharia da alma.(0) Jean Laplanche NT. Esta ¢ apresentago do livro “ La révolution copemicienne inachevée" do qual extraimos o texto cuja tradugio se segue. ‘CONFERENCIAS - JEAN LAPLANCHE-4 —— ne IN ‘2 3 : ‘AREVOLUCAO COPERNICANA INACABADA Eide forma curiosa que o destino da palavra revolugio esta ligado ao nome de Copérnido. O sentido ptopirlamente astronémico ou geométrico do termo é 0 tinico que existe om sua época e o tratado deste autor, De revolutionibus orbium caelestium, publicado em 1543, trata do movimento ciclico, eminentemente repetitivo, das esferas celestes.“ (© aspecto “revoluciondrio" dessas “revolugées” no esta entio mareado na terminologia © sé dezesseis anos satis tarde, em 1559, que Amyot, em suas imortais tradugSes de Plutarco, comega a fazer evoluir o termo: ilustragao, entre tantas outras, da Fungo criadora dos tradutores na evolugao da 5 Lingua. Alids, a nudanga de sentido é progressiva; com Amyot, a revolugio certamente significa uma mittagao brusca, mas éla permanece "prefixo", mareada de inicio por “varios sinais celestes"”), Nio disponho de documentos suficientes para seguir em detalhes a metabolizacio desta palavra, Seja como for, na época de Kant, depois de mais de duzentos anos, nosso temo modemo de revolugio ©) esta consolidado. Em 1787, com o segundo preficio da Critica da razao pura, revolugées cientificas ¢ revolugdes politicas andam aparentemente, pat ¢ passo: o pensamento de Copérnico constitue uma “revolugdo sibita na ciéncia da natureza”. Mas ao prego de que mal entendido Kant vai se apoderar disso como um modelo para sua propria filosofia? Diremos algo sobre isso mais adiante. ‘A revolugo de Copémico em astronomia invooada, como se sabe, em Freud, como a primeira umilhagdo, a primeira ferida nateisiea infligida ao homem pela cléncia, Vale a pena precisar em que ela consiste, sem antes nos preocuparmos com sua telagdo com a psicanélise. A histéria da astronomia, que remonta como se sabe, 4 mais alta Antiguidade assiria, babilénica depois grega, nfo énada menos que linearnaquilo que diz respeito a seu problema maior que podemos assim enunciar: constatamos movimentos eizculares to univetso, mas Finalmente, o que é que gira em. tomo do qué? I simples e pedagdgico opor Ptolomeu a Copérnico, o geocentrismo ao heliocentrismo; mas tenhamos em mente que uma revolugo nao é jamais tio revolucionétia quanto acredita ser: no passado ela tem predecessores e naquilo que prope como abertura, trazemsi também possibilidades de recaidas potenciais. Finalmente, o que se aftonta e se alterna, durante séculos e mesmo milénios de teorias astronémicas, sio duas linhas de pensamento, uma ptolomaica e outra dita copemicana, com pensadores notéveis tanto de um lado quanto de outro. Piolomeu, que se situa no século T14.C., niio é mais que o resultado de uma longa e dupla tradiggo que remonta pelo menos ao século IV ou V a.C; de uma parte os fildsofos: os pitagdricos, Plato, Aristételes e de outra parte os “sdbios”, mais préximos: da _observagio, astronomos, gedgrafos ¢ matematicos, Eudoxo de Cnido (408-355), o primeiro que recompée os deslocamentos das asttes a partir de movimentos circulares; Autolicus (século TVa.C-), Hiparco de Nicéia (séoulo Tla.C.) ao qual devernas o primeiro grande catélogo das estrelas, enfim 0 préptio Ptolomen (138-180 d.C.) que propde a “grande sintese”"( Meyaan Evvtok a) 5 Quanto a linhagem copernicana, como sabemos, ela vai se seguir numa descendéncia brilhante através de Galileo, Kepler, Newton e depois, mais além, na revolugéo einsteiniana; o que se ignora goralmente é que ela remonta explicitamente ao séoulo Hla.C., com o genial Aristarco de Samos de : quem Copémico conhecia os trabalhos. Fica-nas dele seu Tratado sobre as grandezas e distéincias do sol eda lua, onde ele tema audicia de calcular esses parimetros, com uma aproximagio surpreendente paraalguns dentre eles, e isso gragas & observagao ea célculas trigonométrices originais. Massobretudo sabemos que ele 6 o primeizo a propor um sistema heliocéntrico, incotrendo assim-jé no mundo gtego-na acusagio de impiedade. Esta revolugtio copernicana, que estariamos entio no direito de designar como “atistarquiana”, quais questées pée em jogo ? Podemos distinguir aqui o plano astronémico eo plano filoséfico-antropolégico. Do ponto de vista astronémnico trata-se de explicar os deslocamentos dos diferentes corpos celestes com relagao 4 terra, Deixo de lado um certo mimero de iniciativas importantes, mas contudo extrinsecas em relagio a mudanga de perspectiva copemicana.Assim a ptioridade dada ao movimento circular: ela (CONFERENCIAS - JEAN LAPLANCHE -5 “fid6 Ser secolocada:em.questio pot Copémnico, Assim a redondeza da-terra:-claé.admitida na, « Antiguidade desde o século IVa.C.. O que estd em questio nfo é nem mneswio a rotagao da tetta sobre ~ mesma, responsivel pela altemnfinoia dos dias e das noites. Atribuida & Herdclides, esta hipétese dé & em si mais que ma mudanga de coordenadas com relagio ao,que mostra a observagio da vida cotidiana: a rotagdo imutdvel da esfera estelar com relaglo a terra." De fato, e sem entrar em detalhes, que pée em xeque uma rotagéo pura e simples da esfera dita dos “fixos"(digamnos: o conjunto das estrelas longinquas) sio os deslocamentos de diferentes corpos celestes em relagdo a esta esfera: 0 sol, ‘lua eenfim os “planetas”. Enfim e sobretudo, porque o movimento desses astros errantes, desgarrados © esafiam toda explicagao sitaples num sistema onde a terra permanece como centro de referéncia. "A questo maior de toda astronomia até ¢ incluso a sintese ptolomaica, se situa ento sobre a via de um extravio inicial, & a partir de uma hipétese de base errénea que se trata de achar, de inventar, i ‘quais movimentos regulares e ordenados é preéiso supot para salvar as aparéncias (isto é, para dat conta das aparéncias) obsetvadas nos movimentos dos planetas “, Como a multiplicagao de "esferas", tendo por centto.a tetra, 6 suficiente apenas para os movimentos do sol e da lua, é preciso apelar para toda uma série de movimeritos adventicios, sempre circulares mas excentrados, depois excentrados uns com telago aos outros:“excéntricos", ."epiciclos”, "deferentes",etc. Todas hipdteses altamente ‘mateméticas que mobilizam a engenhosidade, emesmo o génio dos astrénomos, até a summa ptolomaica que vai permanecer durante quatorze séculos a Biblia da astronomaia, Suma & qual é quase imposstvel adicionar qualquer coisa, dado sua complexidade. Um sistema onde cada detalhe inexplicado, longe de tecolocar em questio 0 conjunto, tomou-se uma hipétese ad hoc, suplementar. Sobrecarga ; bloqueio: pode-se sonhar com o que se tomou, com certo gran de complexificagio, a metapsicologia freudiana quando se comegou a acumular certas insuficiéncias através de novos:conceites, sem ge ‘preocupar em saber se eles se integravam ao conjuunto ou se no seria o conjunto a ser’ reconstruido.®) © que esta em jogo, com aquilo que comodamente chamamos “tevelugiio copernicana”, 6 uma questo de “centragdo" que, de infoio parece estar limitada a uma mudanga de centro astrondtico (a terra, ou 0 sol) mas que abze para consequéncias bem mais vastas. O heliocentrismo, ponto de vista adotado por Copérnico, traz de cara uma imensa simplificago, 20 menos potencial: a idéia que hoje nos parece banal, que a terra é um planeta em érbita como os outtos ‘em torno do sol, no simplifica tudo: a forma circular das érbitas obriga a manter uma quantidade de hipéteses adventicias, epiciclicas'e outras. Mas a via esté aberta em dirego a progressos unificadores; nfo somente simplificagSes mas, também entiquecimentos indefinidos: o sistema nao esté mais “entupido”’;nio é somente uma barreizafisica do mundo quese foi pelos ares, mas também uma barreira epistemoldgica. ‘Aimensidio do universo, emesmo sua infinitude, é uma consequéneia da teoria heliocéntrica ¢ jé pereebida como tal desde a época de Aristarco. Isto, a partir da objegio seguinte: se a tetra estivesse em movimento, mudando entio constantemente o ponto de vista que é 0 seu, as posiges dos “fixos” “uns em relagao aos outtos,’as constelagies” deveriam softer modificagdes e deformagbes..., 0 quenéo 6 0 caso. Donde uma dupla conclusio possivel: ou a teoria de Atistarco- Copémico ¢ falsa... ou entiio as estrelas esto, com relagao a nds, a una distancia sem medida comum com as distiincias internas ao sistema solar. ‘A idéia restrita de heliocentrismo era apenas uma etapa: a revolugéo copernicana abria parcialmente sobre a auséncia de centro, Num mundo de distincias quase infinitas, toma-se absurdo tentar conservar ainda uma das estrelas entre as outras, sol ou sistema solar, como centro. ‘De modo correlativo, se 0 “centro” do mundo pode estar em todo lugar ¢ que sua “eirounferéncia std em Inger nenhum’ ©) Decentragdo do nosso mundo, infinitude do mundo, esta dupla afirmagio desembocava, tanto no tempo de Aristareo como no Renascimento, na acusagéo de impiedade. Se 0 homem nfo esté mais no eentro do universo, no somente as cosmogonias e géneses tniticas so contraditas, mas todos os panteons forjados & imagem do homem, ou centrados sobre 0 homem, so desvalorizados. ‘Mas sem diivida, todo o aferramento da humanidade a visio ptolomaica tem uma raiz mais profunda. Quando Freud fata de fetida nareisica a este propésito, é de uma humilhagio do homem de carne, do homem empirico, que ele quer falar. ‘CONFERENCIAS - JEAN LAPLANCHE - 6 Mas é preciso ir mais longs & somente o homem em sa existéncia concteta que se. acha humilhado por se encontrar em lugar-nenhum, no seo da imensidio do universo: a revolucao copernicana é talvez mais radical ainda ao sugerir que o homer, mesmo como sujeito cognoscente, nio é osistema de referéncia central do que ele conhece. Nao maisestrelas que gravitam em tomo dele, no mais reconhecem elas o primado de nosso conhecimento. Tnversamente, se 0 descentramento copernicano abre para um progresso indefinido (ainda que através de crises) do conhecimento, é sem diivida porque ele afirma implicitamente que o homem nao 6, de modo algum, a medida de todas as coisas. Assim, o descentramento e a infinitude do universo seriam anunciadotes deuma infinitude do saber © de um descentramento epistemoldgico, de outra forma dificeis de aceitar “). ( NT.A) Dessa ligagao potencial entre descentramento astronémico e déscentramento do sabet, encontrarei a prova em trés pensadores, que serio evocados brevemente por sua telagao com Copérnico, Kant, no 2° preféeio da Critica da Razfo Pura, evoca as “revoliigdes" cientificas suscetiveis de servir de modelo a "toda metafisica fatura que poderd se aptesentar como eiéncia". # imediatamente Copérico que é invocado, iia medida ei que teve a idéia de “fazer gitar o observadot e de deixar, ‘por outro lado, as estrelas ei repouso" Segundo Kant, a tnetafisica deveria "fazer uma tentativa ‘semelhante"... Ora, longe de nés propor um descentramento & maneita de Copémico, é justamente um recentramento ptolomaico que Kant quer entiio operar: longe o ‘ato da intuigao de um lado ¢ os conceitos de outro "se regularem sobre 0 objeto", convém inverter as coisas, admitindo que ¢ 9 objeto que se “regula” sobre a "natureza de nossa itituigao" e sobre os “conceitos de nossa razio”, 1), ‘No quero discutir aqui o significado do idealismo kantiano, ) mas nao posso deixar de achar petturbador que um movimento de deseentramento radical seja invocado como apoio de um recentramento nao menos radical. ‘Atinica maneira de salvar Kant é evidente: letibrar que nfo hé riada de comum entre a ciéncia fisica “"mnundana" por natureza eo conhecimento metafisico, cujas conidigdes de possibilidade estao prescritas pela filosofia transcendental. O sujeito empltico estd em conformidade com Copérnico, ele é levado ino se sabe para onde, no movimento. do universo. O sujeito transcendental, este, petranece fiel a Ptolomeu: é sobre ele que.se regula movimento dos corpos celéstes que sio apenas “objetos em geral”. Que sejat Mas neste caso, porque invocar a iniciativa de um para fundar a do outro, e isto contra a corrente? (NT.B) Hi, no entanto dois autores, apés Kant, para no nos contentarfios com este isolamento demasiado simplista entre o empirico é o transcendental, e isto ema dois sentidos diametralmente opostos. Trata-Se antes de maisnada de Husserl, o tltimo Hussetl, aguéle a quer se atribue notadamente o pensamento de Merleau - Ponty. Este tiltimo eitava jé na "Fetioritnologia da Percepgao” um texto husserliano de 1934 cujo titulo é em si um programa completo:" Umstutsz der Kopemikanischen Lehre: die Erde als, Ur-Arche beweg sich nicht que pods ser aduzido por: *‘Subversfo da doutrna copernicana: a tera como arco otiginatio, néosemove" “”), Assim cofno serd o caso em Merleau-Ponty, trata-se justamente de reintroduzir no ego “constituinte”, 6’ Set humaiié ‘coin sua "came", seu “solo” natal, a Terta enfim que é sua motada otigindria, ”o ato" qué ele paititha ‘com os animais, Bum texto surpreendente porque, malgtado cettas hesitagdes e niiinerases pontds dbscittos, ele combate a “tevolugdo copernicana” em seu proprio terreno, pretendendo mesmo recentté-la, Pois o “ego apodictico” que volta a , ser "ptolomaico” & ao znesmo tempo o sujet consttuinte © 0 sujeito de came, contingents, que teh os ‘pés nesta “Terra”. (NT. C) Isto para mostrar que © que estd’ em jogo na revolugio copemicana - aceitagio ou recusa - vai finalmente além do simples dominio técnico da ciéncia astronémica. Meu segundo testemunho a este propésito soxé daquele chamado Marr. Nome hoje esquecido, mas que teve em sua épocd lima feputagao bem triste. E um lingtiista russo (1864-1934) que viveu antes da revolugao de 1917, depois radicalizou suas idéias sob a revolugo e no inicio do stalinismo, no que veio a se chamat "a nova teoria da linguagem". Ele se tornou utna espécie de Lyssenko da lingiiistica: ‘0 marrismo foi considerado como sinénimo de marxismo em lingilistica e todos os que nfo fizessem_ juramento de obedigncia absoluta se achavam perseguidos, obtigados a auto-ctiticas ¢, as vezes,

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