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como eserever com éxito a Se a palavra Acidente é o texto bastante com que a Policia ou os Bombeiros assinalam um sinistro, habitualmente um texto tem outras extensdes. O corpo humano fornece, parece-nos, um exemplo excelente para a com- preensdo do texto como um todo e das suas partes, nomeadamente dos seus pardgrafos. Mesmo com as admiraveis descobertas do genoma humano, o todo do nosso corpo nao deixa de ser constituido por partes, grosso modo, cabe¢a, tronco e membros. A cabega, por seu lado, tem olhos, boca, nariz ouvidos... Os olhos O paragrafo A DINAMICA DA ESCRI Para a significagéio global de um texto escrito concorrem varios segmentos gré- ficos que se sucedem uns aos outros em progressiva escala de grandeza e fungao sig- nificativas: fonema’®, palavra, frase, paragrafo. O pardgrafo é uma ampla parcela légica do texto, e uma unidade visual. Estas duas caracteristicas do paragrafo so processos de organizacao légica do texto e, simultaneamente, processos que facilitam a sua leitura. Um exemplo (que apenas visa vincar a necessidade da arrumagao ldgica do texto, porque as situagées concretas esto longe de caber nos limites de um esquema): ~0 paragrafo de abertura apresentard o tema ou problema nos seus aspectos essenciais; ~ cada um dos pardgrafos de desenvolvimento abordara um aspecto em que © tema ou problema se pode subdividi = 0 paragrafo de conclusdo retomard o essencial da mensagem, de modo a que perdure na meméria do leitor. Um paragrafo pode ser formado por uma sé frase ~ estratégia a considerar quando se quer, adequadamente, realgar algo. Com mais frequéncia, porém, € cons- tituido por uma sequéncia de frases. Qualidades do paragrafo: 101 ~a coeréncia (ligagao légica entre todo o material do paragrafo); -aunidade (uma sé ideia principal; tudo o que se apresenta no paragrafo deve estar relacionado com essa ideia); —aclareza. © Fonema: unidade minima transmissora de sentido. Veja-se as alteragdes de sentido produzias em dois fone- mas: ia (i+) - ta, ria, via, lia. a” eserever com éxito A ESCRITA 102 10.1. Exemplos de paragrafos * De um texto jornalistico Diagnéstico e terapéutica Cerca de um tergo dos deputados que 0s portugueses elegeram no dia 10 de Outubro - ha pouco mais de um més — ja nao esto na Assembleia da Repiblica e fizeram-se substituir pelos nomes que se thes seguiam nas listas partidarias. HA quem tenha ido para o Governo, ha autarcas que regressaram as suas céma- ras e ha quem pura e simplesmente tenha ido ganhar a vida para outro lugar mais rentavel do que o Parlamento, o que valha a verdade, nao é dificil para um quadro superior com algum nome no mercado. A estatistica das substituig6es [...] tem alguns dados significativos: metade da bancada socialista deixou a Assembleia, enquanto que, no PSD, a percentagem correspondente é de 20 por cento [...] A conclusdo inevitavel 6 que um siste- ma que permite tal distorgao dos eleitores precisa de uma reforma radical. Para usar palavras do presidente do Parlamento, que sabera melhor do que ninguém o que esta em causa, é necessaria uma verdadeira “revolug&o institucional" A |ei eleitoral 6 um dos elementos nucleares da reforma politica. Sdo ja conhecidas as intengdes de “aproximar os eleitores dos eleitos", propésito mil vezes. proclamado, mas até agora nunca concre- tizado. Isto faz-se criando, entre outras coisas, circulos uninominais, [. Nada disto 6 novo. Alias, a fase do diagnéstico esta hd muito ultrapassada. Que haja, finalmente, vontade politica para passar & aplicacao das terapéuticas. Bettencourt Resendes, *Editorial’, Diario de Noticias, 21-11-1999, p. 3 O facto/problema (paragrafo de abertura): Causas do facto Consequéncias do facto Solugo: reforma do sistema "Um dos elementos nucleares da reforma" Sintese (paragrafo de fecho: resume ¢ restaura 0 essencial da mensagem: voto de urgente reforma)'” 17 Bons paragrafos de sintese (conclusdo ou fecho) resumem ou restauram 0 que foi dito, mas devem fugir & simples repeticéo, que, assim, seria apenas uma redundancia. Bons pardgrafos de conclusdo implicam a arte de destacar 0 que jé foi dito, de modo a que os destinatdirios fixe o ponto-chave da mensagem. * De um texto literario como escrever com | A porta range nos gonzos, a menina entra pé ante pé, e para um instante a ori- entar-se no quarto, onde o siléncio de sesta e de sonho parece escorrer, com a meia luz, das cortininhas brancas da jane- la quadrada. A esquerda, na sombra do recanto, esté a cama de grades que ja foi dela e serve agora de berco ao irmao. Avanca com cautela, dé volta a cama dos pais, e aproxima-se. Para o ver bem tem de se erguer nas pontas dos pés. Depois, equili- brando-se com esforgo que faz estremecer a cama toda, trepa a grade: o irmao esta deitado de costas, calado e quieto, com os punhos fechados, mas nao dorme. Os colhos abertos, de um escuro azulado, sem expresso, olham em frente, ainda incapa- zes de ver ou de organizar em visao cons- ciente 0 caos de imagens indecisas que 0 espiam da penumbra. Aos pés dele, enros- cado, 0 gato preto dorme: nao sai dali, 6 como um pajem de guarda ao amo. Amenina sacode a cabega para arredar © cabelo negro, que Ihe cai em ondas man- sas para a cara. Agarra-se bem para nao se despenhar, inclina-se mais e, por algum tempo, espia o irmao com uma curiosida- de ardente nos olhos pardos, inteligentes, arregalados de meditagao. Ele agita a cabega, tenta focar os olhos, reconhecer a mancha claro-escura que Ihe se the imobiliza em frente: e de repente agita as maos em movimentos mal coorde- nados, rola a cabega, contrai e chupa nas gengivas duras 0 labio inferior, e deixa escapar um débil som — vagido, sorvo, beijo, desejo de exprimir... O rostinho rosa- do e mole arrepela-se num esgar de reco- Nhecimento, que é jd sorriso e de alegria. José Rodrigues Miguéis, A Escola do Paraiso, Lisboa, Circulo de Leitores, 1986, pp. 12-13 1° paragrafo. O autor apresenta a perso- nagem: uma menina a entrar num quarto, e a ambientar-se a "meia luz" desse espago. 2° paragrafo. A menina fixa-se no seu objectivo: ver o irmao; relato dos sucessi- vos esforgos e do progressivo resultado — observagao do bebé. 3° paragrafo. A menina afasta obstaculos e consegue um melhor plano de observa- go 4° paragrafo. Visdo do irmao nesse novo plano. A DA EscRITA A DINAMI 103 A DINAMICA DA EScRIT 104 10. 2. Extensao do paragrafo A extensdo dos paragrafos depende do tipo de texto, do estilo do seu autor, dos destinatarios e do suporte que transmite o texto (jornal, livro, net, poster...). Como destacada unidade légica, como unidade visual, o paragrafo ¢ um instru- mento que deve facilitar a tarefa dos leitores. Em consequéncia: uma correcta avaliagdo dos leitores, das suas capacidades ou disponibilidades deve ser o critério controlador da maior ou menor extensdo do pardgrafo. Se 0 desenvolvimento de um tépico ou ideta implicar um paragrafo demasiado extenso, 6 preferivel o seu desmembramento em tépico e subt6picos, em diferentes paré- grafos. Os critérios a nao esquecer devem ser sempre os da legibilidade - expor logica- mente e facilitar a leitura. De facto, uma ideia, um tépico, se decomponiveis, so, néo raras vezes, mais eficazmente compreensiveis se comunicados em diferentes paragrafos. 10. 3. Indicadores de paragrafo Tradicionalmente 0 inicio de paragrafo é identificado na escrita por comegar um Pouco mais a direita do que as demais linhas. Modernamente, com o processamen- to de texto em computador, 6 frequente o paragrafo ndo ter marca especifica de comego, optando-se pela introdugao de uma linha em branco a separar e identificar pardgrafos. Em qualquer dos casos, o fim do paragrafo é assinalado com um sinal de pontuagao forte. 10. 4. Ligagdo légica entre paragrafos Um texto nao é uma colagem de paragrafos, mesmo que isoladamente bem cons- truidos; 6 uma unidade, uma interactividade. Por isso ha que ndo esquecer a articulagéo Iégica entre os paragrafos (ligagdes por adicao, por oposicao, causa, consequéncia, etc.) © 0s articuladores do discurso (palavras ou expressdes ou até frases que expressam essa ligagao ou coesao). ‘A.unidade do texto 6 uma teia resultante da interligagao de todas as suas partes.

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