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0 inconsciente — do sentido do significante ao gozo da letra: um estudo lacaniano” The Unconscious from the Meaning of the Significant to the Jouissance of the Letter: A Lacanian Study El inconsciente — del sentido del significante al goce de la letra: un estudio lacaniano Everton Fernandes Cordeir ‘Marcia Maria Rosa Vieira Luchina’” Universidade Federal de Minas Gerais Doi: http://dx.doi.org/10.12804 /revistas.urosario.edu.co/apl/a.4317 Resumo Esse artigo propo discuti 0 percurso terico do psica- nalista francés Jacques Lacan, ao distinguir letra do campo do significante, ndo apenas do ponto de vista de literalidade e estruturalocalizada do significante, mas como elemento que vineula algo da ordem pulsional, do gozo. Assim, Lacan sugere pensar 0 inconsciente como letra, indo além da nosdo do inconscieute estru- turado como uma linguagem. Nos anos 1970, a partir danocto de enxame de significantes estar-se-ia, enti. sob a perspectiva de um inconsciente “letrificado”, real, tendo em vista a possibifidade de a letra trazer a dimensto de falingua, noga0 que evidencia um 2020 entrevisto no sem sentido dos significantes. Finalmente, 6 artigo apresenta uma discussio contemporanea acerca dedois estatutos do inconseiente:transferencial eral. + Ete antigo oe ws Palavras-chave: inconsciente, letra, g0z0, real. psi canilise. Abstract The goal of this article is to discuss the theoretical trajectory of French psychoanalyst Jacques Lacan in distinguishing the letter from the field ofthe signifier, notonly ftom the point of view of literalness and of the localized structure of the signifier. butas an element that cntails something of the pulsation of the unconscious, of the field of jonissance. Lacan proposes a conceptt- alization of the unconscious as letter, going beyond the notion of the unconscious structured as language. In the 1970s, based ou the notion of an ensemble of sig- niflers, and fio the perspective ofa real, “letterized” inconscious that accounts for the possibility that the ‘originalmente de uma disseayto de mestrado intitlada “Jocquer Lacan: O inconsciente, do seatido do significante a0 gozo da letra ~ um estudo teiico”, defendida em 2015, no Programa de Pox-Graduagio em Psicologia (Estue dos Psicanaliticos) da Universidade Federal de Minas Gerais (uric), soba erientagdo da Prof* Dr* Mércis Maria Rose Vieira Luchina ++ Corespondéncia, Cone cletrinico: evertonf.cordezoS4 @ymal.com, 096 Corea elesnisnanacia toss @albo.com (Coma citar este aicula: Cordero, EF, © Lushina, M. MR. V. (201 © lnconssiente — do sentido do significant 20 zoz0 da letra: um esto lncaniana, vances en Pricologia Latinoamericana, 33(3), 883600, dois bip:/dx.do.org10.12804 revistas rosario edu.co ap a1317 ances en Pscologaatnoameicann ogo (Calabi / Yo. 3503] /p. 583-000 12017 119Me2145-4515 m1 583, ‘= Everton Fernandes Cordeire, Marcia Maria Rosa Vieira Luchina letter has the dimension of language. within the pers- ppective of an unconscious “as letter” he pointed to the Joy derived from the nonsensical nature of signifiers. Finally, the paper includes a contemporary discussion ofthe two registers of the unconscious: the transferen- ‘ial and the real Keywords: Unconscious, letter, jouissance, real, p choanalysis Resumen Este artieulo propone diseutir el recorrido teorico del psicoanalista francés Jacques Lacan, al distinguir la Jetta del campo del significante, no desde el punto de vista de literalidad y estructura localizada del signi- ficante, sino como elemento que vincula algo del or den pulsional, del gozo. Asi, Lacan sugiere pensar el inconsciente como letra, yendo mis allé de la nocién del inconsciente estructurade como un lenguaje. En los alos 1970, a partir de la nocién de enjambre de significantes, se estaria entonces bajo la perspectiva de um inconsciente “letrado”, real, teniendo en cuenta Ia posibilidad que la letra trae a la dimension de la Iengua, nocién que evidencia un gozo entrevisto en el sin sentido de los significantes. Finalmente, el articulo presenta una discusion contemporanea acerea de dos. estatutos del inconsciente: transferencial y real Palabras clave: inconsciente. letra, g0z0, real, psico anslisis, Na trajetéria do psicanalista francés Jacques Lacan (1901-1981), 0 Semindrio 18, de 1971, examina a possibilidade de haver um discurso que niio fosse da ordem do semblante, Lacan (1971/2009) confere ao termo semblante um es- tatuto de equivoco ligado & prépria ordem signi- ficante: “Esse semblante é o significante em si” (p. 14). Assim, ele situa a letra, nfo como efeito dos discursos atravessacdos pelo sentido do significante, ‘mas como um modo de abordar o real enquanto impossivel: Se algo chamado inconsciente pode ser semidito ‘como estrutura linguageira,¢ para que finalmente se nos apareya o relevo do efeito de diseurso que até entio nos parecia impossivel, ov seja, o mais- de-gozar. Seri que isso significe, seguindo uma de minhas formulagdes, que, na medida em que ra como impossivel, ele funcionava como real? [..1 0 discurso inconsciente[..] € a emergéncia de uma certa fungao do significante, O fato de cle haver existide até entdo como insignia ¢ juse tamente a razio de eu o haver situado para voces no principio do semblante. Mas as consequéncias de ua emergencia, sso ¢ que deve ser introduzido para que alguma coisa mude—algo que no pode mudar, porque isso nao & possivel. Ao contri por um discurso eentrar-se como impossivel por seu efeito, que ele teria alguma chance de ser um discurso que nao fosse semblante (Lacan, 1971/2009, p. 21) Pode-se localizar, em Lacan, wm movimento que vai do inconsciente estruturado como uma linguagem em diregao ao real da letra dasarticu- Jada de sua vertente de sentido? E 0 que propde o presente artigo, pesquisa tedrica (Couto, 2010), em que se utilizou 0 método histérico-sistemitico privilegiando uma aporética critica, de corte sin- crénico, que compreende as elaboragtes concer- nentes & natureza, fungio e desenvolvimento do conceito investigado: a relagiio entre as nogdes de inconsciente. lettae significante. Relagao aqui nao recortada no Primeiro Classicismo (Milnes, 1996) ou Primeiro Ensino de Lacan (Miller, 2003) nos ‘anos 1950, nem tampouco num desenvolvimento dincrOuico de seu arcabougo conceitual. Contex- tualmente, o presente estudo se delimita no Lacan dos anos 1970, quando formula novas elaboragbes sobre a letra em suas articulagdes com 0 g070 e sas repercussdes na teoria do inconsciente nesse ‘iltime petiodo de sew ensino. Assim, esta pesquisa ‘busca apontar como esses conceitos serelacionam sineronicamente e formam uma espécie de rede, «que nao anula outros momentos do ensino de Lacan 5840 vances en Psicologia Latnoomericnn / oye [Colombo / ol. 35() pp. 583-000 £2017 1189H22145-4515, ‘ inconsciente do sentido do signincante a0,goz0 da letra: um estudo lacaniano = sobre o inconsciente, mas especifica um momento importante e complexo de sua obra. Consideragdes sobre a letra em Lacan No inicio dos anos 1970, as elaboragbes de La- can sobre a letra caminham na diregao de orientar construgdes de pontos importantes da experiéncia analitica. A letra, subordinada ao campo da fala ¢ do significante articulado, vai, a partir de outro estatuto, tomar-se referéncia importante no iltimo ensino de Lacan sobre o inconsciente. Periodo no qual se verifica uma promogio da escritae da letra fiente a0 significante (Mandil, 2008). Asrelagbes entre letra e signifieante nem sen- pre foram passiveis de uma definicao precisa em Lacan (Milner, 1996; Mandi, 2003). Se no Seminé- rio sobre “A Carta Roubada” (Lacan, 1955/1998c) letra se encomra na fungtio de transmissio (etter) de una mensagem, ao mesmo tempo em que ne- Ia ha outra natureza inerente stia materialidade (liver), ela esti ai relacionada com sua vertente significante. O conto de Edgar Allan Poe serve para Lacan estender as teorizagdes sobre o significante no inicio de seu ensino, Lacan (1955/1998c). a0 comentar que a singularidade da carta/letra est em “poder sofier um desvio que ela tem um trae {eto que Ihe é proprio” (p. 33). encontra na no funcionalidade do significant, o fato deste nao se limitar 4 fangao de transportador de uma mensa- gem (Mandil, 2003). Na Instancia da letra no inconsciente ou a razdo desde Freud (Lacan, 1957/1998d), a letra é pensada soba primariedade do significante como elemento tipografico, equivalendo auma estrutura fonemitica, através da qual Lacan visa trazer pa- 1800 primeito plano das reflexdes psicanaliticas a primazia da ordem simbélica, sobretudo no que se refere ao campo da fala (Mandil, 2003), Segundo Milner (1996), Lacan emprega duuas nogoes rela- cionadas: a literalidade da letra eo sentido do sig- nifieante, Todavia, diz o autor, “asnogdes de letra ede significante se obscurecem mutuamente: nem, ances en slo atnoameicna eyes (alambil / Uo. 3903} pp. 583-600 /2017/SSMezT#S~#519 M585 o cariter significante nem o caréter literal da ma- tematica poderiam receber status inteiramente determinado” (Milner, 1996, p. 97). No inicio dos anos 1970, Lacan ir distingnuir de maneira mais aprimorada, as nogies de letra e de significante, Distingao que constitu um dos pivds do que Milner (1996) denomina Segundo Classicismo Lacaniano. No Primeiro Classicismo, ter-se-ia 0 periodo que se segue, principalmente, a Funcio e campo da fala ¢ da linguagem em psicandlise (Discurso de Roma, 1953), e os des- dobramentos referentes a énfase no significante e na estrutura de lingtagem do inconsciente. Porém, a imprecisto das nogdes de letra e significante caracteriza uma das instabilidades desse periodo, © que, destaca Milner (1996), vem estabelecer 0 Segundo Classicismo, como um momento em que Lacan tenta transmitir a psicanilise através dos matemas, levando em conta a operacao de literali- zagio promovida pela logica e pelas mateméticas. Consoante Milner (1996), se a distingao entre letra e significante se confiunde no Lacan dos anos 1950, ela se esclarece e se aperfeigoa no Segundo Classicismo, no inicio dos anos 1970. O signifi- cante, sendo somente relagdio, representa “para” €€ aquilo por meio do qual ele representa. Assim. ele s6 se define pela oposigao e nfo adquire valor sendo por sua combinatéria encamada no campo das relagdes de diferenga com outros significantes. Sendo somente relagio de diferenga, o significante 6 sem positividade, sem qualidade e nao idéntico a si, Ao passo que a letra & capaz do principio de positividade e de identidade consigo mesma, € qualificada, no sentido de ter uma fisionomia € de encarnar wma materialidade, tum suporte sen- sivel, um referente (Milner, 1996). Diferente do significante que s6 existe em oposigao a outro, a letra, com suas qualidades e identidade, pode ser rasurada, apagada, abolida. E, sendo deslocavel, € manipulavel, empunhavel, transmissivel: Por essa transmissibilidade propria, es trans- mite aquilo que ela ¢, no meio de um diseurso, 0 ‘= Everton Fernandes Cordeire, Marcia Maria Rosa Vieira Luchina suporte; um significante ndo se transmits e nada se transmit: ele representa, no ponto das cadeias onde se encontra,o sueito para um outro sianii- cante (Milner, 1986, p. 104-108), Na sétima ligdo do Seminario 18, Lacan se refere a letra a partir de um jogo com a palavra Literatura e, fazendo um chiste (Witz). diz Litura- terra, $6 depois vai buscar fundamentagao léxica, pois “no me submeto forgosamente a etimologia quando me deixo levar pelo jogo de palavras com que as vezes se cria o chiste” (Lacan, 1971/2009, p. 105), justfica. Assim, Lacan (1971/2009) con- ‘rape literatura (do latim, littera, de letra) a lite raterra (do latim, Iitura, rasura) e traz, também, outro campo seméntico, o litter (lixo), para se referir a dimensao de resto irredutivel, atribuida letra na perspectiva de lituraterra. Ao também partir do equivoco dos jogos de linguagem, Lacan (1971/2009) se compara ao escritor irlandés James Joyce, cuja escrita leva-o a deslizar de “a letter para a litter”, isto &, “de ‘uma carta/letra para um Lixo” (pp. 105-106). Diz que Joyce nada ganharia se houvesse se subme- tido a “psicandlise” com Jung, que, segundo sua biogratia, fora-Ihe oferecida. Isso porque, ao fazer da letra Titeirativo — litiére de Ia lettre, lugar de dejetos, lixo -, Joyce vai direto “ao melhor que se pode esperar da psicandlise em seu témino” (Lacan, 1971/2003e, p. 15). Assim, Lacan aponta para uma forma singular de operagao da escrita como resto inredutivel as dimensdes de sentido, Demodo que. fazer lixo da letra joyciano seria“o primeiro exemplo de um uso da letra que nao seria do semblant porque estaria exatamente rompendo coma fimo de encobrimento que &a esséncia da ordem significante” (Rego, 2005. p. 210). Lacan (1971/2003c) retoma do Seminario sobre 4 Carta Roubada a outra natureza da carta/letra, que nao a dos efeitos da mensagem que ela trans- mite, Sendo suporte material e estrutura localizada do significante, a letra tem valor de matéria distinta do praprio significante que ela carrega. Mas isso “niio equivale a fazer metifora da epistola”, pois segundo Lacan (1971/2003c), “o conto consiste cm que se transmita como um passe de magica a ‘mensagem, com que a carta faz peripécias sem. ela” (p. 17). O nao fazer da letra metafora da epis- tola se refere ao fato de que a carta é portadora de uma mensagem, de um significante, “na medida em qne ela 0 carrega em seu envelope” (Lacan, 1971/2009, p. 107). Contudo, no conto de Poe, a carta faz peripécias sem a mensagem e produz, efeitos em seus detentores sem que a mensagem, seja dada a conhecer, Porém, nfo se deve confindir letra com significante, pois, nao ser metéfora da epistola faz da carta/letra um elemento em que se produz um apagamento da mensagem e dos efeitos significantes que ela veicula, situando-a, assim, em uma materialidade desarticulada de sentido. ‘Nao bastou a Lacan reafirmar a materialidade da letra como estrutura tipogtifica localizada do significante, ou um significante esvaziado de sen- tido. Nos anos 1970, Lacan busca abordar a letra am conexio com o campo pulsional, 0 campo do 020. Ao promover a letra sobre o sentido do significante, interessa a ele o fato do significante no possibilitar responder por tudo o que se passa ‘em uma psicanélise (Vieira, 2005: Mandil, 2003). ‘Duas dimensies da letra: sentido e gozo, saber inconsciente e real Lacan recorre & metafora do litoral para arti- cular as duas dimensdes da letra: sentido e gozo: saber inconsciente ¢ real. O litoral, distinto da fronteita, é um campo inteiro e completamente estrangeiro e heterogéneo frente a outro, com 0 nal nfo possui nenhuma reciprocidade, nenhum, denominador comum, Contudo, ao mesmo tempo mn que separa mar e terra, 0 litoral também con- {nga esses dois campos, fazendo existir um furo na descontinuidade da passagem de um campo ao outro (Mandil, 2003), Para Lacan (1971/2003¢). a letra se situa na condigdo de “literal a ser flndado no litoral’ 586 m fvacesen Psicologia Latinoomericnn/ oye [Colombo / ol. 35() pp. 583-000 £2017 119He2145-4515, ‘ inconsciente do sentido do signincante a0,goz0 da letra: um estudo lacaniano = (p. 109), enlagando os dois campos descontinuos © heterogéneos da experiéncia analitica: 0 saber articulado na cadeia significante e 0 gozo, Pres- tando-se tanto ao goz0 quando ao saber, a letra/ litoral € aquilo que faz borda no furo do saber. Ela desenha, faz contomo ao que escapot ao discurso. do semblante, encontrando-se no litoral do fro «que hé no limite daquilo que a cadeia significante produziu de significado (Rego, 2005). E nesse li- mite da interpretagdio que surge a questao do gozo, que envolve a experiéncia analitica, e sobre o qual € curioso constatar como a psicanalise se obriga “a reconhecer o sentido daquilo que a letra, no entanto, diz ao pé da letra, [..] quando todas as suas interpretagdes se resumem ao goz0" (Lacan, 1971/2009, pp. 109-110). A dimensdo litoral da letra nao impede que o inconsciente seja estruturado como uma linguagem, ‘onde ela tem instineia, E necessério, entio, saber como 0 inconsciente comanda a fungio da letra introduzida como ituraterra, Enquanto instru- ‘mento apropriado a inscrigio de um discurso que nfo fosse do semblante, a letra nao é imprépria para servir Aquilo que foi apontado em A instaneia da Letra, como podendo designar a substituigao significante na metifora ou o deslocamento sig- nificante na metonimia (Lacan, 1971/2009). Ela “simboliza facilmente, portanto, todos esses efeitos de significante, mas isso de modo algum impde que ela, a letra, seja primaria nesses mesmos efeitos para os quais me serve de instrumento”. diz Lacan (1971/2009, p. 110). Para Rego (2005). Lacan nao se refere aqui a uma estruturagao temporal —prima- ria ou secundaria — da letra, mas sim, topologica, onde algo na lingwagem convoca o literal para 0 litoral. Lacan (1971/2009) pondera que, ‘Nada do que eserevi, com a ajuda de letras, so breas formagbes do inconsciente, para resgati-las daquilo com que Freud as enuncia mais simples- ‘mente, como fatos de linguagem, nada permite ‘confundir, como se tem feito, aletra com 0 signifi- ‘cante, O que eserevi coma ajuda de letras sobre as ‘ances en stoi otinoameicna ene (alambil / Uo. 390 pp. 583-600 /2017/ISSMezT#S~#515 5B formagdes do inconsciente nfo autoriza a fazer da Jetra um significante, ea Ihe atibuir, ainda por cima, ‘uma primazia em relagdo ao significante (p. 110), as “nuvens” terra Lacan se refere a uma rota de retorno de uma viagem ao Japao, em que, da janela do avi, vit Por entre as nuvens, a planicie siberiana. Refe- réncia a qual ele s6 foi possivel se ater, devido a0 contato que tivera com a escrita japonesa, na qual experimentara essa dimensao de litoralidade da letra (Rego, 2005) E foi assim que me aparece, iesistvelmente numa circonstincia a ser avardada na meméria, isto 6, entre as muvens, o esconmento das iguas, ‘nico trago a aparecer, por operar ai ainda mis do que indicando orelevo nessa latitude, naguilo aque é chamado de plaice sberiana, uma plani- cie realmente desolada, no sentido proprio, de qualquer vegetagdo, a io ser por teflexos, re- flexos desse escoamento, que empurram para 8 sombra aquilo que nfo reluz (Lacan, 1971/2008, p13). © escoamento visto por Lacan era compara do a.um buqué, indo do conjunto, a partir de um centro, para um espalhamento, por meio do qual ele distingue 0 trago primario ¢ a marca de seu apagamento, uma rasura, pela qual o sujeito é de- signado (Rego, 2005: Lacan, 1971/2005). Contudo, Lacan (1971/2009) situa a letra como “rasura de trago algum que seja anterior” (p. 113). Assim. distintamente de um trago primério e a rasura que © apaga, e de cuja conjuncao se origina o sujeito, Lacan separa a rasura do trago e diz que a facanha de uma caligrafia consiste em produzir sozinha, definitivamente, uma rasura sem a anterioridade do trago. Litura pura, rasura pura, cuja fungao seria “reproduzir a metade com que o sujeito subsiste” (Lacan, 1971/2009, p. 113), sta metade outra, ‘= Everton Fernandes Cordeire, Marcia Maria Rosa Vieira Luchina objeto perdido, 14 onde o sujeito subsiste em busca dessa metade sem par. A letra/rasura seria andloga a uma terra coberta de Tituras, “sucesso de tragos que se recobrem, ca- da um deles buscando em seu gesto, como tentativa de aproximagao, a palavra apropriada para designar aquilo que se quer dizer” (Mandil, 2003, p. 50) Aproximagao do que é irrepresentivel e impossivel dese escrever. Se Lacan faz referéncia a caligrafia, enela introduz a dimensao de uma rasura sozinha, ele esta pressupondo a inexisténcia de um referen- cial gramatical, do Outro que ordena a escrita e sta corregao normativa? Pergunta que se formula a partir do momento em que Lacan (1971/2009) co- Toca em xeque a ordem do discurso e do semblante, ‘Nao é A toa que ele faz referéncia a Aristéfanes & sua pega ds muverss, na qual o comediante gregzo rompe com os semblantes: © que se sevela por minha visso do escoa- ‘mento, no que nele a rasura predomina, ¢ que, 20 se produzir por entre as auvens, ela se coniusa. com sua fante, pois que é justaments nas mavens que Aristéfancs me conclama a descobrir 0 que acontace com 0 sisnifcante, ou sa, o semblante porexcelénca, se ¢ de sua ruptura que chove esse feito em que se precipita 0 que era matéria em suspensio (pp. 113-114, grifo nosso). Para Rubio (2007), a evocagiio das mivens de Aristfimes, feita por Lacan, consiste em “demons- ‘rar a conexo entre o significante e o semblante. cuja muptura deixa entrever os efeitos de goz (p- 139), Lacan (1971/2003c) questiona que, se a rmuptura da mivem dos semblantes dissolve 0 que constituia forma, fendmeno, meteoro, e sobre 0 qual a cigueia opera ao perpassar o aspecto, “no ser também por dar adeus ao que dessa ruptura dariaem gozo que o mundo, ou igualmente o imun- do, tem ali pulsao para fignrar a vida?” (p. 22) A comiédia de Arist6fanes faz alusio as nuvens como representantes das particularidades mutan- tes do pensamento e das palavras que servem para tudo (Rubio, 2007). De modo que, por sua textura vaporosa, volatil e instivel, as mavens aludem a0 significante, o semblante por exceléncia, Como 0s, significantes, as nuvens tocam no campo do pare- cer, criando 0 equivoco das pareidotias encontradas no intercémbio de suas imagens. Mas, também, elas possuem um componente de violencia, que gera raios, trovoadas estrondosas e tempestades, “elemento dramitico que vincula dois campos heterogéneos: 0 do campo do pensamento (etéreo, volatil) e 0 do corpo na sua materialidade escato- Idgica de resto e dejeto” (Rubiao, 2007. p. 137) Para Miller (2011), em Lituraterra, a doutrina do significante é apresentada como meteorologia, diferindo-se da mecanica estrutural da cadeia sig- nificante, pela qual Lacan se refere ao significant como elemento claro, distinto ¢ fiandamental da linguagem, ¢ de que também dependem as fét- mulas da metifora e da metonimia, Com o temo, nuvem, Lacan se distancia da referéncia a cadeia significante, uma vez que a nuvem consiste num elemento que nao se distingue ¢ de onde nao se pode reconhecer a possibilidade de isolar ele- ‘mentos discretos. Desse modo, Lacan reintroduz © significante como ‘uma nuvem de onde comega a produzie-se umn otejamento, Esse gotejamento percebide por en- {reas muvens, que oculta um espeticulo de alaum ‘modo anulado, impressiona como se chovessem rasuras, riseaduras, E como se se reencontrasse tum dos primeiros esquemas de Saussure, que imn- plica também, como antes da dstingao dos elemen- tos, um esquema nebuloso (Miller, 2011, p. 29). significante, que antes se encontrava na ter- 1a a mottificar 0 corpo, agora assume a forma de ‘nuvemn em suspenso no c&u a precipitar. Por sua vvez, na terra, nao existe semio vegetagao, reflexos e erosdes, barrancos que sutlcam 0 goz0 eo signi- ficado, que chovem do significante. Se o signifi- ante locatizado na nuvem ilustra supostamente 0 que o simbélico tem em comum com o semblante. 586 m vances en Psiooga Latnoomericnn/ oye [Colombin/ ol. 35(]p.583-000 £2017 119He2145-4515, ‘ inconsciente do sentido do signincante a0,goz0 da letra: um estudo lacaniano = ‘no campo do real se abrem sulcos prontos para dar acolhida ao gozo (Lacan, 1971/2009), Lacan identifica a escritura e a letra com os stlcos ca- vados pela precipitagaio de gozo, no real, quando as nuivens dos semblantes se rompem. As nuvens, carregadas de chuva, enquanto campo simbélico, sii muvens de significantes, semblantes por exce- léncia, algo de nebuloso que nao se captura, mas que comporta um elemento que escorre— 0 g070. Elemento que, retornando a nuvem, faz parte de sta mesma natureza, Isso aponta para uma di- ‘mensdo de g0z0 que a linguagem comporta, que ‘nao apenas sentido ¢ interpretagao significante. Aquilo que se rompe e se precipita sobre a terra faz suleos, escrita, ravinas, imagem exemplar das ranhuras das letras que passam a veicular essa substincia gozante. Ou seja, “o que se evoca de 2020 ao se romper tim semblante, é isso que no real se apresenta como ravinamento das aguas” (Lacan, 1971/2003¢. p. 22). Uma constelacao de insignias: Lacan € 0 sujeito japonés ‘As particularidades da lingua japonesa também serviram para Lacan demonstrar como o sujeito japonés é um sujeito dividido pela linguagem como em toda a parte, mas que “um de seus registros pode satisfazer-se com a referéncia a escrita, € 0 outro, com a fala” (Lacan, 1971/2003c, p. 24). Assim, tem-se, no um sujeito dividido entre 0 significante S1 articulado ao $2. mas “um sujeito que se satisfaz oscilando entre o escrito 0 fala- do, entre a letra e 0 significante” (Vieira, 2005, p. 93). € dai o fato de o sujeito japonés escrever uma coisa e falar outra. A letra, apoio do signifi- cante, também & promovida como um referente que muda 9 estatuto do sujeito, de modo que 0 suijeito em sua identificagao fundamental, nao se apoia apenas no trago undrio das identificagbes, advindas do Outro, mas em um “eéu constelado™ (Lacan, 1971/2003e, p. 24), Ressaltando o fato de Lacan (1960/1981) ja ter se referido a “constelagio, ‘ances en Pscloga otnoameicann ope (Calabi / ol. 3503p. 583-000 12017 12145-4515 m1 569 dessas insignias que constitui para o sujeito 0 Ideal do En” (p. 686), Miller (2012) destaca a mengiio do termo constelagio e nao cadeia, como também a troca do termo significante por insignia. Lacan introduz uma oposicao entre cadeia e constela- sao, distinguindo a identificagao fundamentada nos tragos agrupados na cadeia significante, onde SI representa o sujeito para S2, e o sujeito surge dividido nesta representacao (8). Ao referir-se a constituigfio do Ideal do Eu co- mo constelagio de insignias, Lacan aponta para ‘uma redugao do Outro como cadeia significante. O significante “vale como insignia sempre e quando estiver solto, isto é, fora do sistema” (Miller, 2012, . 149). Isso implica em que o sujeito se tome pelo ‘Umm, por uma substincia, “campo em que ele se hipostasia no Ideal do Eu” (Lacan, 1960/1988, p. 686). Com o termo tomista “hipostasia”, La- can nfo esté se referindo a uma representagiio significante entre S1 e S2, mas a uma posigio de substincia, de hipostase do sujeito. na qual ele & ‘Um sozinho (Miller, 2012). Como Vieira (2005) destaca que, ao apresentar 0 Ideal do Eu como uma constelago de insignias, Lacan deixa indicado que os tragos que o su- {sito toma emprestados a0 Outro podem funcionar como significantes eivilizadores que, além de re- presenté-lo, fazem com que seja reconhecido pelo Outro, mas podem também se soltar do sistema significant, serem extraidos da eadeia significante, se transformarem em insignias que existem four seul, absolutamente 86s [..] Redutores do Outro, esses signficantes soltos (desencadeados, portan- to!) operam fora do sistema simbolico na sua face representativa e comunicativa, fandada na logiea simbélica, Neste sentido, eles operam como letra (pp. 98-99). Solto do sistema, 0 estatuto do significante opera como letra, unidade niio diferencial nem referente no campo da linguagem (Milner, 1996), mas significante sozinho, que, como tal, nao ‘= Everton Fernandes Cordeire, Marcia Maria Rosa Vieira Luchina significa nada. O $1 ¢ Um-entre-outros, e nfo para com os outros no sentido de serem articulados (La- can, 1972-1973/1985). A referéncia a constelagaio de insignias abre margem para um giro tedrico na teoria do inconsciente de Lacan, ao elevar 0 sig- nificante @ categoria de letra que nao faz cadeia (S1-S2), mas “S1, $1 que soa em francés essai, um enxame significante, um enxame qe zumbe” (Lacan, 1972-1973/1985, p. 196). Para Lacan (1972-1973/1985), esse Uin dos Sis do enxame, encarna em Jalingua (lalangue) algo que resta indeciso entre o fonema, apalavra. a frase, € mesmo todo o pensamentor “é o de que se trata no que chamo de significante-mestre. E 0 signifi- cante Um" (p. 196). Com Jalingua, Lacan inaugura ‘um novo aparelho conceitual originaio da lalacdo (do latim, lallare), do cantarolar para adonmecer, do arrulho da crianca que nao fala, mas emite sons disjuntos de qualquer sentido e nao separados de um estado de contentamento. Lalingua evoca a lingua emitida antes da linguagem estruturada sintaxicamente, onde a significagao ainda nao se encontra e nfo tem a ver com nenhum léxico. E a “rasura de traco algum que seja anterior” (Lacan, 1971/2009. p. 113), pois falta em seu campo uma ordem, um tratamento das palavras e do sentido que se convenciona a elas (Soler, 2012) A fimo da fala e da linguagem enquanto men sagem enderegada ao Outro é, agora, secundaria © derivada de Jalingua (Miller, 2000). Esta nao possuii o cardter dialégico da fala, servindo para coisas inteiramente diferentes da comunicacéo, posto que opere enquanto gozo: “Se a comunica- $40 se aproxima do que se exerce efetivamente no 2020 da lalingua, & que ela implica a réplica, dito de outro modo, 0 diélogo. Mas Jalingua, sera que ela serve primeiro para o didlogo? [.,.] nada éme- nos garantido que isso” (Lacan, 1972-1973/1985, pp. 188-189), Antes secundario a estrutura de lin- ‘guagem, cuja faneao era metabolizé-lo em signifi- cantes, 0 2070, com Jalingua, ganha sua primazia E, assim, a linguagem enquanto aquilo “como 0 que o inconsciente é estruturado, diz Lacan, [..] de comeso, ela nao existe. A linguagem é 0 que se tenta saber concernente a fingao da lalingia” (Lacan, 1972-1973/1985, p. 189) ‘A muptura da linearidade, do movimento de associagao e representagdo (S1 — S2) da cadeia significante tera como consequéncia, outro esta- tuto do sujeito. O sujeito constelar, situado na perspectiva do enxame introcuz, com a nogao de letra, a desconexio dos significantes (S1/ /S2) no inconsciente (Vieira, 2005). A letra se atrela a la- Jingua, na medida em que subsiste 1a onde o isso fala sozinho, sem didlogo, no inconsciente, que nese caso consiste, diz Lacan (1972-1973/1985). em “que 0 ser, falando, goze e, acrescento, nio queira saber de mais nada [...] nao saber de coisa alguma” (p. 143), 0 inconsciente, do sentido ao gozo: transferencial e real esse sentido, teriamos dois modos de conceber oestatuto do inconsciente? Aquele da articulagio em cadeia (S1 — $2) em que um significante repre- senta 0 sujeito para outro significante: e 0 outro da existéncia dos Uns do enxame de significantes (SI, 81, S1), que se inscrevem como letra? Um. inconsciente discursive captado na linguagem falada e um inconsciente escritural (letrificado), que se sustenta “ali onde 36 hi S1, letra que se repete” (Vieira, 2005, p. 164)? Considerando esta suposigao, pretende-se, agora, discutir esses dois modos de concepgio do inconsciente, situando as indagagdes verificadas no campo teorico sobre uma nogao do inconsciente, calcado na estrurura da linguagem e a outra no gozo da letra que de- sarticula 0 sentido e se coloca como real. Como, ressalta Lacan (1971/2009): “sera preciso eu des- tacar'uma oposigao. A escrita, a letra, esta no real, €0 significante, no simbélico”(p. 114), Tratam-se, assim, de duas nogdes do inconsciente, que auto- res psicanalistas contemporaneos tém discutido, 590 m vances en Psion Latnoomericnn/ ope [olombin/ ol. 35()p.583-000 £2017 119221454515, ‘ inconsciente do sentido do signincante a0,goz0 da letra: um estudo lacaniano = a partir de interpretacdes dos textos de Lacan: 0 inconsciente transferencial e inconsciente real (Miller, 2009; Soler, 2012). Otermo “inconsciente real” nao é uma expres- sdo encontrada diretamente no texto de Lacan, mas, deriva de uma formulagao en passant, encontrada no Prefiicio @ Edigéio Inglesa do Seminério 11, escrito em 1976 Quando o esp de um laps ~ou seja, visto que 56 eserevo em francés, 0 espago de um lapso ja ‘no tem nenhum impacto de sentido (ou inter= pretagio), s6 ento temos [se tem a] certeza de estar no inconsciente. O.que-se sabe, consigo [..] Notemos que a psicanélise, desde que ex-siste, smudou. Inventada por um solitaio, teosizador ine ‘contestivel do inconseiente (que s8 #0 que se eré, digo: O inconsciente, seja, ofeal~caso se acredite cm mim), ela ¢ agora praticada aos pares, (Lacan, 1976/2003, p. $67, arifo nosso). Pata Miller (2009), esse escrito “merece ser ido de perto” (p. 12), uma vez que Lacan o escreve apés proferir O Seminério, liso 23, O Sinthoma (1975-1976), Chama atengao a disjungao entre © inconsciente e a interpretagio, numa exclusto entre fncao da interpretacdo e funcao do incons- ciente. O que se acredita saber da articulagao do inconsciente é posto em vacilagao, de modo que Lacan segue no sentido avesso de sta tese anterior do desejo inconsciente como sua interpretacdo, ‘marcante, por exemplo, no Semindrio 6, O De- sejo e sua Interpreracio (Miller, 2009). Se para Lacan, 0 desejo é algo a ser colocado no cere da teoria e da experiéncia analitica, trata-se de fazer, um enlagamento entre o desejo e a interpretacao. Tendo como energia psiquica a libido a ser inves- tida nas marcas mnémicas deixadas pela primeira experigncia de satisfagto, o desejo marca a depen- déncia do sujeito dos significantes advindos do ‘Outro, que o constituem na linguagem. E assim, a experigneia analitica flindada na fala deve se ances en Plog atinoameicna eyes (Calabi / Uo. 3903 pp. 583-600 /2017/ISMeDT#S-#515 M1591 esforgar por fazer emergir algo além da demanda do sujeito, sendo ai situado 0 desejo inconsciente como suia interpretagao Contudlo, no Preféicio, Lacan entncia uma sepa- ragdio, umia desconexio entre o significante do lapso © 0 significante da interpretagao (Miller, 2009). 0 apso — que, enquanto formagao do inconsciente, implica significagao e se situa no dominio dos efeitos de sentido da interpretagao significante — quando ja se encontra desprovido de sentido, € aquilo que atesta estar no inconsciente, que ja ‘go suporta nenhum impacto de sentido (Lacan, 1976/2003b). Nessa frase, diz Miller (2009). pode ficar impereeptivel, por ser colocado na abertura—na abertura desse texto [por se tratar de um preficio], mas no fechamento do Semindtio sobre Joyce -, 0 fato de cla admitir, sea lermos tal como 0 fago aqui, que S1 nao representa nade, cle ndo é um significante representative. Isso ataca © que consideramos como o proprio principio da operacdo psicanalitica, uma vez que a psicanalise tem seu ponto de partida no estabelecimenta mic imo S1 — S2 da transferéncia (p. 13). Se oinconsciente é mobilizado a partir da trans- feréncia que o causa, na medida em que atualiza sua realidade e articula a representacao do sujeito entre SI e $2, destaca-se a condigaio do sujeito en- quanto suposto saber, uma vez que, sendo efeito de significantes, nao pode ser substancializado, no sendo suposto sendo “pelo significante que o repre- senta para outro significante” (Lacan, 1967/2003a, p. 253). Na Proposicdo de 9 de outubro de 1967 sobre o psicanalista da Escola, Lacan destaca a transferéncia no comego da psicandlise e o sujeito suposto saber que “é, para nds, 0 eixo a partir do qual se articula tudo 0 que acontece com a trans- feréncia” (Lacan, 1967/2003a, p. 253). O matema da transferéncia mostra como “o stiposto desse sujeito coloca o saber em seu lugar de adjacéncia da suposigao” (Lacan, 1967/2003a, p. 253): ‘= Everton Fernandes Cordeire, Marcia Maria Rosa Vieira Luchina s >s 8 (SLS%..S%) Figura 1: Matema da tansferéncia Fonte Lacan, 1967 2003, p. [Na figura 1, sobre a barra, situ S de um sujeito que implica, na forma de um en- derecamento ao Outro, um significante qualquer (Sq). supondo outras coisas mais, em termos de sentido, A cadeia minima $1 — S2 é, entao, ho- méloga ao matema lacaniano, na medida em que 1 € 0 significante da transferéncia em sen lago com $2. um significante qualquer” (Miller, 2009, p- 13), Soba barra, 0 representa, como resultado, © sujeito em posigio de significado que implica, dentro dos parénteses, “o saber, supostamente pre- sente, dos significantes que esto no inconsciente, significagito esta que faz as vezes do referencial ainda latente na relagao terceira que 0 liga a0 par significante-significado” (Lacan, 1967/2003a, . 254), Nesse sentido, Miller (2009) prope que 0 inconsciente, tomado.no status de posigao suposta do sujeito, & um inconsciente transferencial, um inconsciente que pode ser interpretado, uma vez que, a0 longo de uma anzilise, “é pela transferé cia que tomamos presente, mobilizamos ¢ lemos © inconsciente” (p. 14). Miller (2009) aponta certa “negacao” desse inconsciente transferencial, quando, na frase ini- cial do Prefiicio, Lacan diz que 0 espago de um lapso ja nao tem nenhumn efeito de interpretagtio ou sentido, Ou seja, tem-se a certeza de se estar no inconsciente, quando nao se opera a conexao da transferéncia, quando nao ha conexao entre Si @ S2. Desse modo, Miller destaca um termo sar- treano, empregado por Lacan — 0 enr-si @ 0 para- -si ~, detendo com interesse os pedagos da frase “se tem certeza”, “o que se sabe, consigo (on Je sait, soi)”, a partir dos quais afirma nao se tratar do inconsciente que Lacan articulou no registro da intersubjetividade ou no da inter-significéncia (S1-S2), mas de um se (on) que se sabe consigo, sozinho, cortado, de um inconsciente que nao faz amizade, pois “no ha amizade que esse incons- ciente suporte” (Lacan, 1976/2003b, p. 267), Esta amizade, como “expresso genérica com a qual designamos 0 lago entre 0 Um e 0 Outro” — e através da qual a escansao do espago de um lapso. permite passar por um movimento amistoso de ajuda a associagao livre — nao existe enquanto suporte desse inconsciente (Miller, 2009. p. 16) Ressalta-se, também, no Prefiicio, a palavra histoeria, quando, a0 se referit a0 dispositive do passe como o momento de verificagao da his- igdo da andlise, Lacan (1976/2003b) iz que, depois de uma andlise, “o analista s6 se Instoristeriza por si mesmo” (p. 568). Histoeria comporta, assim, uma associagdo entre as palavras histeria e historia. A historia requer a articulagdo do Um com o Outro, estabelecida no dominio da simbolizagio como “condigdo de existéncia para arealidade”, uma vez que “o que nao esté escrito no simbélico in-existe” (Miller, 2009. p. 34). Por sua vez, na histeria, 0 Um articulado ao saber advindo do campo do Outro (S1-S2) possibilita a simbolizacao de um sintoma no nivel do corpo, transparecendo a incidéncia no inconsciente, do discurso e do desejo do Outro. A histoeria se en- contra, portanto, no ambito do inconsciente trans- ferencial, discurso do Outro articulado na cadeia significante (Miller, 2009) Ao dizer que somente se est no inconsciente quando 0 espago de um lapso jé nfo tem nenhum, impacto de sentido ou interpretacdo, e que nio existe amizade que esse inconsciente suporte, Lacan faz vacilar a articulagao do inconsciente na palavra € na producao de sentido da histéria Nese caso, inconsciente nao é interpretativo, visto que S1 esta sozinho e desarticulado da cadeia de significantes, nfo se encontrando, portanto, no dominio da histoeria, Assim, ha no inconsciente, uma dimensao simbélica relacionada a histéria, € ‘uma dimensao real, do isolamento de S1s da cadeia significante, que testemunham um rompimento da historia do sujeito (Miller, 2009), Isso faz retornar torister 592m fvncesenPsiooga Latnoomericnn/ oye [Colombo / ol. 35(] pp. 583-000 £2017 1189H22145-4515, ‘ inconsciente do sentido do signincante a0,goz0 da letra: um estudo lacaniano = ‘a uma variante do “significante no real”. pelo qual Lacan, nos anos 1950, definit inicialmente a alu- cinagao na psicose. Lacan (1954/1998b). a partir de Freud, discute © processo de simbolizagao priméria na constitui- do subjetiva, Para que algo entre na histéria do sujeito, é preciso que um elemento —a castragao —seja simbolizado primariamente (Bejahung). A alucinagao, a0 contritio, 80 retorno de um contes do que escapou a essa simbolizagio priméria, nao sendo incorporado na historia do sujeito no nivel do simbélico. Assim, a alucinagao se contrapde a todo processo de estruturagao do inconsciente constituido nos significantes articulados na historia do sujeito (Lacan, 1953/1998a,). De modo que 0 psicético, diz Lacan, é testemunha do inconsciente, que se mostra a céu aberto, ao passo que o neuré- tico da um testemunho encoberto de sua existén- cia, convocando a decifragio, a uma restauragio auréntica do sentido que ele testemunha e partitha no discurso dos outros (Lacan, 1955-56/2008). A alucinago, portanto, coloca em cena esse elemento que nfo se submete as leis da cadeia significante, restando erratico. do lado de fora da simbolizagao (Lacan, 1954/1998b). Como otermo, Verwerfing. Lacan define a nogio operadora da psicose, distinguindo-a do mecanismo do recalque (Ferdréingung) na neurose. A Verwerfimg — fora clusdio — tem 0 sentido de expulsio, supressiio € rejeigdo de uma simbolizagio (Lacan, 1955. 56/2008: Lacan, 1958/1998e). De modo que “tudo © que & recusado na ordem simbélica, no sentido da Ferwerfimg, reaparece no real” (Lacan, 1955- 56/2008, p. 21), Ouseja, aquilo que no processo de estrituragao do sujeito nao soften uma afirmagao, (Bejahung) primordial no conjunto de significantes, resta do lado de fora da simbolizagao, excluido da realidade psiquica. E nao podendo retornar na historia do sujeito, no dominio do inconsciente, do recalque ¢ 0 retomo do recalcado, retorna no sem sentido do real, do qual a alucinagao é teste- munha. Assim, na psicose, nao ha uma assungao 0 inconseiente estruturado como linguagem. pois, ances en Pskclogaatinoameicann eget (Calabi / ol. 3503p. 583-000 12017 /1SMe2T45-4515 m1 593, este “permanece exchuido para o suijeito nfo assu- mido — mas, porque ele aparece no real” (Lacan, 1955-56/2008, p. 21). O inconsciente esta presente na psicose, mas nfo funciona, pois porta um signi- ficante que se coloca exterior ao sujeito, uma vez que, Ihe sendo dado primitivamente, nao entrou no encadeamento simbélico de sta histéria, ficando solto no real, como um significante puro (Lacan, 1955-56/2008) Joyce e suas epifanias Em 1975 ¢ 1976, Lacan profere 0 Semindrio 23, dedicado a Joyce, Se, no Semiindrio sobre A Carta Roubada & em Lituraterva, Lacan faz te- feréncias aos trocadilhos (a letter, « litter) feitos no cenaculo do escritor (Lacan, 1955/1998c) e sobre 0 fato de que, ao fazer lixo da letra, Joyce vai direto ao melhor que se pode esperar de uma psicanstise em seu término (Lacan, 1971/2003¢). essas referéncias nao sdo sem consequéncias para ateotia da clinica do iltimo periodo de seu ensino. Segundo Vieira (2005), néo seria despropositado co encontro de Lacan com a lingua japonesa, que o Jevaa afirmar que o sujeito japonés. além do trago ‘unétio, também se apoia num céu coustelado para suia identificag#o. Assim, 0 sujeito das insignias constelares lhe abre passagem para suas “iltimas elaboragdes, nas quais a cadeia significante e 0 enwame de letras desembocam na escritura topo- logica” (Vieira, 2005. p. 165). ‘Uma vez que o Preficio foiredigido logo depois do Seminario 23, por que motivo ele “merece set lido de perto” (Miller, 2009, p. 12)? Qual arelaga0 entre o espago de um lapso que j4 nao comporta sentido ou interpretacio e 0 teor do seminstio so- bre Joyce, tendo em vista que referéncias a esse escritorirlandés perpassam sutilmente alguns dos textos de Lacan? Quais as consequéncias disso para a interpretacao analitica e para o estatuto da letra no inconsciente? ‘No Senrinévio 23. Lacan se serve da topologia do n6 borromeano para tragar uma perspectiva ‘= Everton Fernandes Cordeire, Marcia Maria Rosa Vieira Luchina notivel no timo tempo de set ensino, comumente conhecido como a clinica do sinthoma ox a clinica borromeana— que pode ainda ser denominado, com Miller (2003), 0 Ultimo Ensino de Lacan, ou ainda, © petiodo da Desconstrugio, se nos ativermos & proposta de Milner (1996). Segundo Lacan (1975-1976/2007), a palavra ssinthoma (de sinthome, no francés) remete & antiga forma de escrita francesa da palavia symptome, de origem grega, O né borromeano ~ originario do brasdio da familia dos Borromeos no Século XV € que servin como recurso topolégico aos desen- volvimentos da matematica de Guilband —enlaca trés aros de cordas de barbante equivalentes. Sua caracteristica é a de que 0 rompimento de um dos aros implica na liberagao de todos 0s outros, Pode-se construir uma cadeia borromeana com mais de trés nds, desde que se respeite tal carac- teristica (Kautinan, 1996), Lacan se utiliza de tés, cordas de barbante, nomeando cada uma delas, como Real, Simbélico ¢ Imaginério (RSI), sendo a configuragao do né borromeano, a representa- (fo estivel do enlagamento desses trés registros. Contudo, ele considera um erro pensar que 0 né borromeano de trés, seja uma norma em relagio aos trés registros como tre fungdes que s6 existem uma para outra em seu exerciciono ser que, 20 fazer n6, julga ser hhomem, A perversio [perversion] ndo é definida porque o simbélico, o imaginirio eo real estao rompidos, mas sim, porque eles ji sto distntos, de modo que ¢ preciso supor um quarto [6] que, nessa ocasito, € 0 sindhoma (Lacan, 1975-1976/2007, p.20-21). Assim, para Lacan (1975-1976/2007) & “pre- ciso supor tetradico 0 que faz 0 lago borromeano” (p. 21). A citada perversto tem o sentido de ser somente pére version (em diregao ao pai) do né — homofonia na lingua francesa com perversion. Desse modo, Lacan se refere a existéncia, nio apenas do Nome-do-Pai, mas de uma pluralizagao de nomes-do-pai, dos quais cada sujeito se ser- ve para estabelecer o lago de RSI: “O pai é um, sinchoma ow wm sintoma, se quiserem” (p. 21). © Nome-do-Pai &, entdo, esse quarto né capaz, de enlagar os trés registros: O real denominado como ex-sisténcia, ou seja, 0 que esti fora de to- da © qualquer significagao: o simbélico, que faz faro no real, insistindo em uma significagao: e 0 imaginario, que fomece consisténcia A imagem, corporal, conferindo uma identificagao do sujei- to com o corpo (Lacan, 1975-1976/2007, p. 49). Assim, o Nome-do-Pai equivale a um dos nomes do sinthoma: NP = ¥ (figura 2) Lacan recorre & topologia dos nds para let & formalizar o que se passa com Joyce, Sua arte que, como ja dissera, vai de a letter pata a litter constituira o paradigma do sinthoma, supléncia da firmeza filica, Para Lacan (1975-1976/2007), © sentido ¢ algo situado no campo entre o imagi- nario e 0 simbélico, e 0 sinthoma, um attificio do qual se Janga mao para reparar o erro da cadeia borromeana, Assim, na ocorréncia de um erro no qual o simbético vena a se soltar, 0 meio de re- parago & 0 sinthoma, que “permite ao simbélico, 0 imaginério e ao real continuarem juntos. ainda que, devido a dois erros, nenhum mais segure 0 outro” (p. 91). Lacan (1975-1976/2007) relaciona o sintoma de Joyce a uma caréncia radical da fungaio paterna para esse escritor, Nao se trata da caréneia de wm, pai real, mas de uma Verwerfung de fato, que tes- temunha a demissio do Nome-do-Pai. A solugéo, apresentada nesse caso é 9 que Lacan chama de nome proprio, Ou seja, Joyce, a0 fazer com sta escrita um nome préprio, opera uma compensacao, da caréncia do Nome-do-Pait or que nie conesber 9 caso de Joyce nos te ‘mos seguintes? Seu desejo de ser um artista que fosse assunto de todo o mundo, do maximo de gente possivel, em todo aso, ndo ¢ exatamente compensagao do fato de que, digamos, seu pai jamais foi um pai para ele? Que nao apenas nada 594 vances en Piolo Latnoomericnn/ ope [Colombo / ol. 35(] pp. 583-000 £2017 119He2145-4515, ‘ inconsciente do sentido do signincante a0,goz0 da letra: um estudo lacaniano = Figura 2: Os tes anis RS, I, ligados pelo sinthoma (S) Fonte: Lacan, 1975-1976, p. 15 the ensinou, como foi negligente em quase tudo, exeete em confid-lo aos bons padres jesuitas, & Iateja diplomitica?[..] Nao ha nisso alguma coisa como uma compensagio dessa demissio pate, dessa Vorwerfung de fato, no fato de Joyce ter se sentido imperiosamente chamado? Essa é a palavra que resulta de um monte de coisas que ele esereveu. E a mola propria pela qual o nome proprio ¢, nele, alguma coisa estranha (Lacan, 1975-1976/2007, p. 86). Assim, a arte da escritura de Joyce constitui 0 nome proprio de seu sinthoma. E, se é 0 Nome- -do-Pai aquele que nomeia e permite sustentar a realidade psiquica, na falta dele é preciso inventar como Joyce o fez, um nome préprio, uma invencio sinthomatica, artificio singular “que da & arte da qual se & capaz um valor notavel” (Lacan, 1975- 1976/2007, p. 59). Lacan, de um modo jocoso. comenta que Awancesen stoi atnoameicns ene (alombil / Uo. 3903} pp. 583-600 {2017 /SSNezT#S~#915 M1595 ‘como ele [Joye] tinha o pau um poueo mole, se assim posso dizer, foi sua arte que suprit sua firmeza félica. E é sempre assim. O falo ¢ a con- {jungao do que chamei de esse parasita, ou seja, 0 pedacinho de pau em questio, com a fungao do flo, E € nisso que sua arte é o verdadeito fiador de seu falo (Lacan, 1975-1976/2007, p. 16). Segundo Soler (1998), Lacan reconhece na escrita joyciana uma literatura que desordena 0 sentido, e que aponta para um paradoxo entre a arte da literatura, que pressupde uma articulagio entre letra e sentido, e a arte da “riscadura” (Soler, 1998, p. 93), que Joyce empreende no decurso de suia obra, Nos escritos de Joyce. o que se encontra é uma arte que deprecia o simbolo condensador de sentido, Ha mais “riscadura” — coisa estrantia, nas palavras de Lacan ~ do que escrita a se ler, mais, lieuraterra que literatura, Todavia, nao se trata de uma escrita qualquer, mas de uma invenc&o, um work in progress com a letra, que vai se afastando ‘= Everton Fernandes Cordeire, Marcia Maria Rosa Vieira Luchina e se desarticulando da lingua inglesa — lingua ma- tema do escritor — indo na contraméo da significa so e da via do sentido, para desembocar no sem sentido dos significantes, numa tentativa sempre frustrada de tocar o impossivel (Buleao, 2008). Se 0 equivoco constitni uma arma contra 0 sinthoma, sendo entao “preciso que haja alguma coisa no significante que ressoe” (Lacan, 1975- 1976/2007, p. 18), a interpretacao analitica do sintoma pressupde a existéncia de um significante recaleado, que, nesse equivoco da fala do sujeito o faz emergir. Diferentemente, Joyce se utiliza do equivoco para fazer existir (ex-sistir) 0 ineonsciente fora do campo da interpretagao e do significante articulado ao outro na cadeia simbilica. De modo que, ao subtrair a letra da cadeia de sentido. Joyce a desconecta do inconsciente, fixando-a pelo goz0 (Soler, 1998) Arelagio de Joyce com sua escrita aponta pa- raa existéncia de uma aversio do escritor ao que € evidente, a metafora produtora de efeitos de sentido (Soler, 1998). Isso pode ser constatado no que Joyce denomina como epifanias, fazendo referéncia A técnica de tomar uma manifestagao, cena ow frase, isolando-as de qualquer contexto, de modo que se apresentam frequentemente em formas frazmentirias de didlogos, como significan- tes puros, isolados de toda significado. instantes, descontinuos, residuios de palavras, imagens, cenas © sonhos, ressonfncias ¢ ecos (Millot, 1993), As epifanias de Joyce foram coletadas separadamente em cademos, na forma de pequenos fragmentos de textos que ocorrem na terceira pessoa, isolados do contexto narrativo, em transmissdio impessoal € estitica, que permitird seu enxerto posterior a0 Iongo de sta obra (Mandil, 2003), Se as epifanias ocupam na obra de Joyce um. lugar singular, trago que testemunha uma expe- rigncia inefavel ou espiritual inaugural, “sobre a qual fundou a certeza de stia vocacao de escritor” (Millot, 1993, p. 144), elas sao também um bura- co negro no universo joyciano, pois maream um niio senso radical, O termo epifania (emprestado da liturgia catélica), nfo intitula simplesmente os poemas em prosa dos escritos de Joyce, uma vez, que nao se tratam de poemas, mas a0 modo de “aerdlitos, pedras caidas de outro mundo”, consti- ‘tiem-se frases anédinas que “cativam muito mais por seu carater enigmitico que por seu valor poé- tico” (Millot, 1993, p. 144), Representam, assim, “um fracasso cuja razao deve ser interrogada: se valem como trago de uma ocorréncia espiritual, parecem representar mais seu residuo, seu dejeto do que sua expresso” (Millot, 1993, p. 145), ow seja, sua liteiralixo, Millot (1993) tece uma comparagao entre a experiéncia espiritual dos misticos e as epifanias de Joyce, Para ela, 0 encontro com o real em si mesmo opaco e resistente ao sentido, que se impde como incontestavel e incontomavel, e que chega ao sujeito como que vindo de fora, numa estranheza radical com tudo o que foi vivido antes, ¢ algo em. comum nos dois casos. Contudo, tal ocorréncia exige ser simbolizada, historicizada, integrada no tecido dos dizeres, onde cada um tem seu lugar de sujeito. O mistico é esse que se esforga por inscre- ver stia experiéneia em um discurso religioso. que seja susceptivel de Ihe fornecer sentido. Contudo, comenta Millot (1993), a paricularidade, sempre singular, do vivido nto se esgota a erequer ainda a invengto de um dizer nooo seo mesino do dissurs0 ond lea se insereve, fim de transmit essa singulaidade aque insite E assim que os istics fazem obras de posta: quando inventam as mstforas que pro-

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