You are on page 1of 80
Caio Prado Jinior Florestan Fernandes CLASSICOS SOBRE A REVOLUGAO BRASILEIRA ‘Revnessho. POPULAR Copyright© 2000, by Eitora Expresso Popular Revo ‘na Carbo Gedo Martins de Acre Flo Projet grifio, apse dagamasio ZAP Design uo da caps: Mania di gas camponeas em Reif 1963. Aero anorphia Imre e acabameno Comite ISBN 85.97504-142 Agee afl dy ators pel libero d tes Todor or divs rseados. Nena pare dee veo pode ser rind repro em a autores da editor 4 iso: nvembra de 2005 EDITORA EXPRESSAO POPULAR us Aboligo, 266 Bla Vita CEP 01519.010 Sie Paslo SP ones: (11) 3112-0941 ‘venaléxpresnopopular come ‘ormexprsszopopular.combe Sumario APRESENTAGAO lini de rd Sampaio liao muda Sampaio A REVOLUGAO BRASILEIRA Cato Prad Junior (1966) (© QUE E REVOLUGAO Forse Fermaees (1981) SETE NOTAS SOBRE A'TEORIA DA REVOLUCAO BRASILEIRA lini de Arruda Sanyo J 149 APRESENTAGAO. Pinio de Arruda Sampaio Jr Plinio Arruda Sampaio Os dois artigos reunidos nesta coletinea sintetizam clementos fundamentais das reflexes de Caio Prado ¢ Florestan Fernandes sobre os dilemas da revolucio brasileira, Publicados em plena ditadura militar, eles respondem 3 necessidade de entender as tendéncias efetivas da luta de classes no Brasil apés a derrota das forcas populares em 1964, bem como de definir os desafios que deveriam ser enfrentados pela classe ope- réria para impulsionar as transformagées sociais ¢ po- liticas capazes de conciliar desenvolvimento econdmi co, democracia e soberania nacional ‘Ainda que movidos por uma preocupacio comum, Caio Prado ¢ Florestan Fernandes desenvolveram dis- tints interpretagdes sobre os dilemas da sociedade bra- sileira na segunda metade do século 20 Para Caio Prado, a partir do pés-guerra, o Brasil entrou em uma conjuntura revoluciondria que pos cem pauta a necessidade inadivel de consumar a lon- ga transicio do Brasil colonia de ontem para o Brasil nagio de amanha, Desde entio, a tarefa fundamental das forcas de esquerda deveria ser equacionada em torno da necessidade de dois objetivos: promover uma ampla reforma agréria ~ principal politica para equili- bar a correlagio de forcas entre o capital elo traba- Iho; e superar a dependéncia do capital internacional = tinico meio de viabilizar a formagio de uma base empresarial umbilicalmente vinculada a0 espaco eco- némico nacional, Nesta perspectiva, a ditadura mili- ‘ar representava um perigoso contratempo que deve- ria ser vencido para cvitar 0 risco de uma reversio neo-colonial. Na visio de Florestan Fernandes, 0 golpe militar de 1964 representoua consolidacio da revolugio burguesa no Brasil como uma contra-revolucio permanente. A interpretagio de que a burguesia brasileira havia se tor- nado definitivamente antisocial, antinacional ¢ antidemocritica leva-oa concluir que o capitalismo ha- vvia esgotado todas suas potencialidades construtivas. Por esse motivo, a set ver, a revolucio opersria des- pontava como a tinica via capaz de superar as mazelas do capitalismo dependent ¢ criat as condigdes hist6- ricas para o aparecimento de um Estado democritico ¢ independente. ‘Acima das diferencas no entendimento da especi- ficidade do momento hist6rico e no modo de ent tar os dilemas do capitalismo dependente, os dois att- ‘ores concordam em relagioa trés quest6es fandamen- tais, Primeiro, ambos rejeitam com vigor todo tipo de contemporizagio com o status quo, pois estio absoluta~ mente convietos de que os problemas fundamentais do povo brasileiro nao serao resolvidos se nao houver ‘uma ruptura radical com as estruturas sociais respon= siveis pela perpetuacio das gritantes desigualdades so- ciais herdadas da sociedade colonial e pela posigio de- pendente do Pafs no sistema capitalista mundial Segundo, Caio Prado e Florestan Fernandes rechacam a nogio ~ ainda hoje muito difumdida nos meios de esquerda - de que existiria uma burguesia nacional, com interesses antagénicos ao imperialismo, capaz de liderar as transformagées sociais decorrentes da revo- lugio democritica e da revolucio nacional. Por fim, 0s dois autores insistem que as forcas populares devem superar a tutela burguesa ¢ adotar uma linha politica auténioma, articulada em torno dos interesses estrat gicos do proletariado, 0 que coloca a consolidacio da uunidade de classe entre operirios e camponeses como tarcfa prioritiria das forcas de esquerda Embora as mudangas no contexto histérico exter= no ¢ interno exijam novas investigagSes ¢ novas refl des sobre os dilemas da revolugio brasileira, as co tribuigSes de Caio Prado e Florestan Fernandes per- manecem como referéncias basilares do pensamento socialista brasileiro, Aexplicagio de Caio Prado a respeito das causas da extrema instabilidade do capitalismo brasileiro a po- sigio dominante do capital internacional na economia € 0 forte desequilibrio na correlagio de forcas entre © capital eo trabalho ~ continua mais atual do que mun- ca, uma vez que as mudangas provocadas pela globalizacio dos negécios s6 vieram reforgar a tendén- ia A reversio neocolonial diagnosticada precocemente pelo autor. ‘Aanilise de Florestan Fernandes sobre a anatomia do padrio burgués de dominacio no Brasil ~ a sua ca- pacidade de impedir a emergéncia do povo na politica ~ tampouco perdew atualidade. Ao contritio, A slobalizacio dos negécios agravaa necessidade de a bur- guesia brasileira compensar a sua impoténcia para en- frentar a concorréncia internacional com a stta onipo- téncia para manipular as condigbes socioecondmicas ¢ ambientais internas. A dissolucio das condicées hist6- ricas muito particulares, externa e interna, que havia permitido 4 burguesia adquirir certo poder de barga~ nha em relacao a0 imperialismo, aponta para um perio- do de desgoverno ¢ grande turbuléncia social primeiro texto da coletinea, “A Revolugio Bras Ieira”, de Caio Prado, € uma reprodugio integral do primero capitulo de seu livro A Revolugao Brasileira, de 1966. Trata-se de um resumo bem objetivo da esséncia de sua interpretagio sobre método do materialismo historico como guia para a formulagio de uma teoria da revolugio (assunto estudado com muito cuidado em seus livros Dialéica do Conhecimento ¢ Notas Introdutérias 4 Légica Dialética). ‘A idéia fundamental deste capitulo é mostrar que a teoria da revolucio brasileira deve ser concebida como produto hist6rico de uma reflexdo coletiva, cujo segredo reside na necessiria relagio de miituo condi- cionamento entre teoria e pritica. A teoria como uma resposta aos problemas da sociedade e a priica como ‘uma agio transformadora orientada pela razio. A men- sagem do autor € cristalina. Quem quiser desvendar © segredo da revolucio deve rejeitar modelos abstra- tose preconcebidos e buscar a solugio dos problemas nas contradiges do processo hist6rico brasileiro. Nas suas palavras, “Nao € praticivel propor reformas que constituem efetivamente solugio para os problemas pendentes, sem a condicio de que essas reformas pro- postas se apresentem nos proprios fatos investigados. Em outras palavras, de nada serviria, como tantas ve~ es se faz, trazer solug6es ditadas pela boa vontade imaginacio dos reformadores, inspirados embora na melhor das intenges, mas que, por mais perfeitas que em principio e teoricamente se apresentem, nao en contram nos prprios fatos presentes ¢ atuantes as ci cunstincias capazes de as promover, impulsionar € re- alizar. Ede Marx a observacio tio justa e comprovada por todo o decorrer da Histéria, que os problemas sociais nunca se propdem sem que, ao mesmo tem- proponha a solugio deles que nao é, nem pode ser forjada por nenhum cérebro iluminado, mas se apresenta, ¢ ai hi de ser desvendada e assinalada, no proprio contexto do problema que se oferece, ¢ na dinimica do processo em que essa problemitica se propée”. segundo texto do livro, o artigo de Florestan Fernandes, “O que € Revolucio”, publicado original- mente em 1981 (pela colecio “Primeiros Passos” da Editora Brasiliense), di uma visio panoramica dos pa~ drdes da revolugio burguesa na historia do capitalis- mo. © objetivo especifico é mostrar a particularidade da revolugio burguesa no capitalismo dependente ¢ os desafios que devem ser enfrentados pelos que lutam pela revolucio operiria no Brasil. Escrito para a rilitincia de esquerda, 0 artigo resume ideas disper- sas em virios livros, cuja principal referéncia é seu clés sico A Revolugdo Burguesa no Brasil. Nao 6 0 caso de uti= lizar esta apresentacio para fazer um resummo lipertado de assuntos que estio bem explicados no texto, mas, dada a complexidade do tema, para facilitar a compre- ensio dos leitores ainda nao habituados ao dificil estilo, de Florestan Fernandes, talvez valha a pena sistemati~ 2ar as principais questées levantadas pelo autor nos seis capitulos deste optisculo. No capitulo, “O que se deve entender por revolt- 0?", o autor discute o drama da revolucio burguesa atrasada no capitalismo dependente. A incapacidade de as burguesias dependentes levarem a revolucio demo- critica e a revolucio nacional is tiltimas conseqiiéncias acaba fazendo com que tempos historicos distintos se misturem em uma mesma situagio concreta, pondo frente a frente dois processos revolucionérios: uma revolugio burguesa, que se afirma como contra-revo~ lucio, ¢ uma revolucio operitia, que aponta para 0 so- cialismo. Sua idéia central é de que “A burguesia tem pouco que dar ¢ cede a medo. O proletariado cresce com a consciéneia de que tem de tomar tudo com as proprias maos e, em médio prazo, aprende que deve passar tio depressa quanto possivel da condicio de fiel da ‘democracia burguesa’ para a de fator de uma demo- cracia da maioria, isto 6, uma democracia popular ou ope Em “Quem fiz a revolugio2”, Florestan Fernandes ressalta papel fundamental das classes sociais como promotoras das grandes transformagoes sociais que caracterizam a civilizacio ocidental. Ele destaca que a capacidade revolucioniria das classes sociais € deter minada pelo contexto hist6rico que condiciona a tuta de classes em cada formagio social. © amadurecimen- to do processo revoluicionsrio e seu desfecho final exi- gem circunstincias muito particulares. Seguindo as di retrizes clissicas de Lenin, Florestan Fernandes rest me as condigées de uma situagio revolucionsria nos seguintes termos: “1) impossibilidade para as classes dominantes de manter sua dominacio sob uma forma inalterada; crise do ‘vértice’, crise da politica da classe dominante, o que cria uma fissura pela qual os des- contentes ¢ a indignacio das classes oprimidas se abrem tum caminho, Para que a revolucio estoure nko & sui ccicnte, habitualmente, que ‘a base no deseja mais’ vi ver como antes, mas é ainda necessério que “o cume no o possa mais’; 2) agravamento, mais do que é co- ‘mum, da miséria e do desespero das classes oprimidas, 3) intensificaco acentuada, pelas razies indicadas aci- mma, da atividade das massas, quie se deixam pilhar tran~ giiilamente nos periodos ‘pacificos’ mas que, no pet ‘odo tempestuoso, sio empurradas, scja pela crise no seut conjunto, seja pelo pripro ‘vérice’, para uma acio histérica independente”. Entretanto, para que © movi- mento final da revolucio tenha um desdobramento construtivo, abrindo novos horizontes para a socieda~ de, torna-se necessirio uma condicao adicional: “(..) a revolugio nio surge de toda situagio revolucionsria,

You might also like