You are on page 1of 110
eanet 15 pfisbena 4 ‘anjos de swedenborg 16 animal sonhado por cs. lewis 18 jum animal sonbado por kafka 2 jum animal sonhado por poe 24 " animais esféricos 24 ‘animais dos espelhos 26 dois animais metafisicos 28 "os antilopes de seis patas 5° —_— oaplanador 51 o-asno de trés patas 5% re cre. antis Metairie can, ave fenix 34 bahamut 57 : paldanders 59 | Be ‘a banshee 4 ee ee a reservados & ebesibecs 4 rua Bandeira Paulista 702 cj. 52 ‘ os ap 104552-002 — Sao Paulo—sP : ae De jason jp Hines a (08 brownies 49 o burak 5° CHAM: 960(@2)-3 87321 REG 120129 toc: N BRA: RGoOTs49a13 fix (1) 5707-550 0 cio cérbero 52 ‘wwre.compannhiadasletras.com.br ocatoblepa 54 o cavalo do mar 56 ‘0 cem-cabegas 58 ocentauro 59 ocervo celestial 62 cila 65 crocotas e leucrocotas 64 cronos ou hércules 65 um cruzamento 67 demédnios do judafsmo 70 os deménios de swedenborg 7. o devorador das sombras z2 os djins 74 odragio 76 o dragao chines 79 © dragio no ocidente 82 oduplo 85 o elefante que previu o nascimento de buda 8 os elfos 88 105 eld e 0s morlocks 89 acsfinge go as fadas 92 fastitocalon 94 fauna chinesa 96 fauna dos estados unidos 99 a fénix chinesa 101 o filho de leviata 105 o galo celestial 104 garuda 105 0 gato de cheshire os gatos de kilkenny 107 05 gnomos 108 hochigan 124 Jetiocentauros 125 0 kraken 129 Jeujata 151 | os lamed wufniks 132 as lamias 155 ‘a lebre lunar 154 os lémures 136 Vilith ig7 ‘9 macaco da tinta 158 a mée das tartarugas 139 a mandrégora 4: a manticora 143 o minotauro 145, co mirmecoledo 147 os monéculos 149 ‘0 monstro aqueronte 15? 0s nagas 154 o nesnds 156 as ninfas 157 as nornas 158 odradek 159 6) © pissaro da chuva 163 “Opassaro roca 16, © pelicano 166 8 peluda de la ferté-bernard 168 © peritio 16, 9s pigmeus 172 porea acorrentada 175 a@quimera i74 4 raposa chinesa 176 um “ain eseu cavalo 178 um réptil lo por is oon Porc. lewis 18; 88 sétiros 187 Sereias 188 08 seres térmicos 190 Aserpente etippla sg2 O nome deste livro justificaria a inclusio do principe “Hamlet, do ponto, do trago, da superficie, do hipereubo, dle todas as palavras genéricas e, talvez, de cada um de ‘nds e da divindade. Em suma, de quase o universo intei- ‘ro. Ativerno-nos, contudo, ao que ¢ imediatamente suge- “ yido pela locugio “seres imagindrios", compilamos um | manual dos estranhos entes engendrados, a0 longo do tempo e do espago, pela fantasia dos homens. 8 silfos ig4 osimurg 195 | Tgnoramos 0 sentido do dragio, como ignoramos 0 © squonk 197 sentido do universo, mas em sua imagem existe alguma talos 199 ‘coisa que se coaduna com a imaginagao dos homens, ¢ as- sim 0 dragdo surge em diferentes latitudes e idades. ‘Um livro dessa indole é necessariamente incompleto; cada nova edigio ¢ 0 niicleo de edges futuras, que po- dem multiplicar-se ao infinito. Convidamos 0 eventual leitor da Colémbia ou do Pa- raguai a enviar-nos os nomes, a fidedigna descriglo ¢ 08 hébitos mais conspicuos dos monstros locais. Como todas as misceléneas, como os inesgotaveis-vo- Jumes de Robert Burton, de Fraser ou de Plinio,'O liero dos seres imagindrios nao foi escrito para ‘uma leitura 0 tao-tieh 201 9s tgres do and 202 0s trolls 204 © unicérnio 205 © unicérnio chinés 207 ourdboro 210 , as valquirias ais Youwarkee 214 Ozaratén 15 9 a Beene Rye Mie 8 a a ‘eonsecutiva. Gostariam: i 105 que 08 curiosos ‘sem. como quem brinea com as formas Soe ladas por um caleidoscépio. a Sao miltiplas as for as fontes desta “silva de varia liga” elas estfo registradas em cada artigo, Perdoe: ea ma omissio involuntaria, ee eee ILB~ MG. ‘Martinez, seembro de 1967 F pare conteraplar a paisagen misis maravilhoss do munde |g prociso chegar ao siltimo andar da ‘Torre da Vitoria, em Chitor Existe ali um terrago circular que permite domi- © nar o horizonte inteiro. Uma escada em caracol leva ao van 96 tam coragem de subir os que nao acted terrago, tam na fabula, que diz 0 seguinte: Na escada da ‘Torre da Vitéria vive desde o inicio do tempo 0 A Bao A Qu, sensivel aos valores das almas hu- ae Vive em estado letargio, no primeiro degratn € 5° strata de vida consciente quando alguém sobe a esci- chinesa: cavalo-marinho costuma aparecer no litoral em da fémea; as vezes 0 capturam. A pelagem negra ; a cauda 6 longa ¢ varre o solo; em terra firme como os outros cavales, é mujto décil e pode percor- ‘num dia centenas de milhas. Convém nao banha-le ‘io, pois assim que vé a Agua recupera sua antiga na- za e se afasta nadando.” (Os etndlogos procuraram a origem dessa ficgio islami- nna ficgdo greco-latina do vento que fecunda as éguas. livro iii das Geérgicas, Virgilio versificou essa crenga. is rigorosa é a exposiglo de Plinio (vit, 67): “Ninguém ignora que na Lusitinia, nas cercanias do lisipo (Lisboa) e das margens do Tejo, as éguas viram a ‘cara para o vento ocidental e sfo fecundadas por ele; 0s po~ tros assim engendrados mostram admiravel ligeireza, mas morrem antes de completar trés anos.” Ohistoriador Justino conjecturou que a hipérbole “fi- hos do vento”, aplicada a cavalos muito velozes, originou ‘essa fibula. © cem-cabegas O cem-cabegas ¢ um peixe criado pelo karma de umas pa lavras, por sua repercussio péstnma no tempo. Uma das biografias chinesas de Buda narra que este encontrou al- guns pescadores que forcejavam com uma rede. Ao cabo de infinitos esforgos, puxaram para a margem um enorme peixe, com uma cabega de macaco, outra de cachorro, ou- tra de cavalo, outra de raposa, outra de porco, outra de ti- gre, € assim até o mimero cem. Buda lhe perguntou: “Nao és Kapila?” “Sou Kapila”, responderam as cem cabegas antes de Buda explicou aos discfpulos que, numa encarnagio an- ‘terior, Kapila fora um bramane que se tornara monge e su- perara a todos no entendimento dos textos sagrados. As ve- zes 0s companheiros se equivocavam e Kapila lhes dizia “cabega de macaco”, “cabega de cachorro” etc. Quando ele ‘morreu, o karma dessas invectivas acumuladas o fez renas- cer monstro aquatico, sobrecarregado com o peso de todas as cabegas que havia dado a seus companheiros. cemtauro é a criatura mais harmoniosa da zoologia fan- tica. As Metamorfoses de Ovidio chamam-no “bifor- ie”, mas no custa esquecer sua indole heterogénea € sar que no mundo platénico das formas existe um ar- {tipo do centauro, assim como do cavalo ¢ do homem. A lescoberta desse arquétipo exigiu séculos; os monumentos imitivos e arcaicos exibem um homem nu que ¢ inco- ,odamente adaptado & garupa de um cavalo. No frontao ‘ocidental do Templo de Zeus, em Olimpia, os centauros j& ‘4ém patas eqiiinas; do ponto do qual deveria sair 0 pesco go do animal sai 6 torso humano. Txion, rei da Tessélia, e uma nuvem a que Zeus deu a forma de Hera engendraram os centauros; outra lenda dé conta de que sio filhos de Apolo. (Ja se disse que “centau 10” é uma derivagio de gandharva; na mitologia védica, 08 gandharvas so divindades menores que guiam os cavalos do Sol.) Como os gregos da época homérica desconheciam ‘a equitagdo, conjectura-se que ao ver um némade tenham pensado que ele formava uma unidade com seu cavalo; € © alega-se que os soldados de Pizarro ou de Herndn Cortés também foram centauros para os indios. “Um daqueles a cavalo veio abaixo; e como os indios viram aquele animal dividir-se ‘em duas partes, dando ‘Por certo que tudo era uma coisa s6, foi tamanho o medo que sentiram que deram as costas gritando para os seus, dizendo que havia virado dois e admirando-se daquilo; 0 que nio foi desprovido de mistério; porque, se isso nfo sucedesse, presume-se que teriam matado todos os cris- tos”, reza um dos textos citados por Prescott. Mas os gregos, diferentemente dos indios, conheciam © cavalo; 0 verossimil 6 conjecturar que o centauro foi uma imagem deliberada, e ndo uma confusio ignorante, A mais popular das fabulas em que os centauros apa- recem é a de seu combate com os lépitas, que os haviam convidado para um casamento. Para os héspedes, 0 vinho era novidade; na metade do festim, um centauro embria- gado ultrajou a noiva e deu infcio, derrubando as mesas, 4 famosa centauromaquia que Fidias, ou um de seus discipulos, esculpiria no Partenon, que Ovidio cantaria no livro xi da Metamorfose, e que inspiraria Rubens. Os centauros, vencidos pelos lépitas, tiveram que fugir da Tessélia. Hércules, em outro combate, aniquilou a estir- pea flechadas. A ristica barbarie e a ira esto simbolizadas no cen- tauro, mas “o mais justo dos centauros, Quiron” (Iléada, Xt, 832), foi professor de Aquiles e de Esculapio, tendo instrufdo ambos nas artes da mmisica, da cinegética, da guerra ¢ até da medicina e da cirurgia, Quiron figura memoravelmente no canto x11 do Inferno, que por con- senso geral se chama “canto dos centauros”. Vejam-se a ‘esse respeito as finas observagbes de Momigliano, em sua edigo de 1945, 6 Plinio diz ter visto um hipocentanto; conservado em pel, que mandaram do Egito para o inmperadlor. ‘Na Ceia dos sete sdbios, Plutarco conta com humor que m dos pastores de Periandro, déspota de Corinto, levara, fa ele numa sacola de couro uma criatura recém-nasel- Ja que uma égua havia dado a luz ¢ cujos rosto, pescoge fagos eram humanos ¢ 0 resto eqiiino. Chorava como crianga, ¢ todos acharam que se tratava de wm pres .0 terrivel. O sabio Tales olhou para ele, riu-se e disse : Periandro que realmente ndo poderia aprovar a condu- de seus pastores. ; No livro v de seti poema De rerum natura, Lucrécio aftr ‘a impossibilidade do centauro, porque a espécie eqiiina hega a maturidade antes da humana, e com trés anos 0 tauro seria um cavalo adulto e um menino balbuciante. se cavalo morreria cingiienta anos antes do homem.. ‘0 cervo celestial Nada sabemos da estrutura do cervo celestial (talvez por- que ninguém tenha podido vé-lo claramente), mas sabe- ‘mos que esses tragicos animais andam debaixo da terrae que no aspiram a mais nada seni sair para a luz do dia. Sabem falar e suplicam aos mineiros que os ajudem a sair. No inicio queriam suborna-los com a promessa de metais preciosos; quando falha esse ardil, os cervos perse- guem os homens e estes os emparedam firmemente nas galerias da mina. Fala-se também de homens a quem os cervos torturaram. A tradigao acrescenta que, se 0s cervos saem para a Juz, transformam-se num liquide pestilento que pode assolar o pais. Essa imaginagio é chinesa, e a registra o livro Chine- se Ghouls and Goblins (Londres, 1928), de G. Willough- by-Meade. ites de ser um monstro e um redemoinho, Gila era uma infa, por quem o deus Glanco se apaixonou. Este pedin a Circe, cujo conhecimento de ervas e magias era 1080, Circe se enamorou dele, mas como Glauco nio es- a Cila, ela envenenou as Aguas da fonte em que a ou- ‘costumava banhar-se. Ao primeiro contato com a agua, parte inferior do corpo de Cila se transformou em cies ladravam. Doze pés a sustentavam, e ela se-viu provida seis cabegas, cada uma com trés fileiras de dentes. Essa stamorfose a aterrorizou, e Cila se jogou no estreito que spara a Italia da Sicilia. Os deuses a transformaram em 1. Durante as tempestades, os navegantes ainda ouvem lo das ondas de encontro 4 rocha. . pe fabula esté nas paginas de Homero, de Ovidio de Pausanias. erocotas e leucrocotas Ctésias, médico de Artaxerxes Mnémon, recorreu a fon- tes persas para compor uma descricio da India, obra de valor inestimavel para saber como os persas do tempo de Artaxerxes Mnémon imaginavam aquele pais. O capitu- lo 52 desse repertorio oferece uma nota sobre o lobo-ca- chorro; Plinio (vin, 30) deu a esse hipotético animal nome de crocota e declarou que “nao havia nada que ele nao pudesse partir com os dentes e ato continuo digerir”. Mais precisa que a crocota é a leucrocota, em que cer- tos comentaristas viram o reflexo do gnu, e outros o da hiena, e outros uma fusio dos dois. E rapidissima e do ta- manho do burro silvestre. Tem patas.de cervo, pescoco, cauda e peito de ledo, cabega de texugo, cascos cindidos, boca até as orelhas e um osso continuo em vez de dentes. Vive na Etiépia (onde também hé touros selvagens, dota- dos de cornos méveis) e consta que arremeda com dogu- ra vor humana onos ou hércules Htratado Ditvidas e solugdes sobre os primetros principios, i neoplaténico Damascio, registra uma curiosa verstio la teogonia e cosmogonia de Orfeu, em que Cronos — ya Hercules — ¢ um monstro: segundo Jerénimo e Helénico (se & que os dois niio sto s6), a doutrina érfica ensina que no principio houve "Agua e lodo, com os quais a Terra foi amassada. Esses dois Principios aparecem como os primeiros: 4gua e terra. Deles ‘sain o terceiro, um dragio alado, que na frente exibia a ca: beca de um touro, atras a de um leo, e no meio o rosto de lum deus; chamaram-no ‘Gronos que niio envelhece’ e tam- bém ‘Héracles’. Com ele nasceu a Necessidade, que tam- bém se chama a Inevitavel, e que se dilatou sobre o univer- 's0 e tocou seus confins [...] Cronos, o drag, tirou de si uma tripla semente: o amido Eter, o ilimitado Caos e o ne- buloso Erebo. Debaixo deles pés um ovo, do qual sairia 0 mundo. 0 tiltimo principio foi um deus que era homem ¢ mulher, com asas de ouro nas costas e cabegas de touro nos flancos, e sobre a cabega um desmedido dragaoyigual a todo tipo de feras [...]” ‘Talver porque o violento e monstruoso parece menos proprio da Grécia que do Oriente, Walter Kranz atribui a essas invengdes uma procedéncia oriental. 10 um animal curioso, metade gatinho, metade cor- E uina heranga de meu pai. Em meu poder ele se de- Iveu por completo: antes era mais cordeiro que gato. ra é meio a meio, Do gato tem a cabega e as unhas, do iro 0 tamanho ¢ a forma; de ambos, 0s olhos, que sio jivos ¢ faiscantes, a pele suave e ajustada ao corpo, os \entos ao mesmo tempo dangarinos ¢ furtivos. Deita- ao sol, no vao da janela, vira um novelo ¢ ronrona; no 1po corre como louco e ninguém o alcanga, Foge dos ga ‘€ quer atacar 0s cordeiros. Nas noites de lua, seu passeio ito é a canaleta do telhado. Nao sabe miar ¢ tem hor- de ratos, Passa horas e horas de tocaia diante do gali- \eiro, mas jamais cometeu um assassinato. _ “Alimento-o com leite; é 0 que Ihe cai melhor, Sorve 0 jite em grandes goles entre seus dentes de animal de rapi- ‘ha. Naturalmente é um grande espetaculo para as criangas. "A hora da visita ¢ aos domingos pela manha. Sento-me om 0 animal sobre os joelhos, ¢ todas as criangas da vizi- "nhanga me rodeiam. “Formulam-se entio as perguntas mais extraordind- ias, que nenhum ser humano pode responder: por que 6 ‘existe 56 um animal assim, por que seu possuidor sou eu e ‘nfio outro, sera que antes j houve um animal semelhante, ‘© o que acontecerd depois de sua morte, serd que se sente 's6, por que nfo tem filhos, como se chama etc. Nao me dou ao trabalho de responder; limito-me a exibir minha propriedade, sem maiores explicages, As vezes as criangas ‘trazem gatos; uma vez chegaram a trazer dois cordeiros, Contrariando suas esperangas, nfo se produziram cenas de reeonhecimento. Os animais se olharam com mansidao com seus olhos animais e se aceitaram mutuamente como ‘um fato divino, Sobre meus joelhos, o animal ignora 0 te- mor e o impulso de perseguir. Aninhado contra mim, ¢ como melhor se sente. Apega-se A familia que o criou. Essa fidelidade nao é extraordinaria; é o reto instinto de um animal que, embora tenha na Terra iniimeros lagos politi- cos, ndo tem um timico consangiiineo, e para quem 0 apoio que encontrou em nds 6 sagrado. “As vezes tenho de rir quando ele resfolega ao meu re- dor, enreda-se nas minhas pernas e no quer se afastar de mim. Como se nio lhe bastasse ser gato e cordeiro, também quer ser cachorro. Uma vez — isso acontece com qualquer um — eu nao via como sair de dificuldades econémicas, estava a ponto de acabar com tudo, Com essa idéia na cabe: ga, me embalava na poltrona de meu quarto com o animal sobre os joelhos; tive a idéia de baixar os olhos e vi lagri- ‘mas gotejando sobre seus grandes bigodes. Exam dele ou eram minhas? Sera que esse gato com alma de cordeiro tem 0 orgulho de um homem? Nao herdei muita coisa de meu pai, mas vale a pena cuidar desse legado. “Tem a inquietude dos dois, do gato e do cordeiro, em- bora sejam inquietudes muito diferentes. Por isso seu cou- 68 _ sta. As veres salta para a polttona, apéia as patas da ‘em meu ombro e aproxima o focinho de meu ouvi- ‘como se falasse comigo, e de fato vira a eabega e me respeitoso para observar o-efeito de sua eommunicagao: agradi-lo, fago de conta que entendi e moyo a cabega. ‘salta para o chiio e brinca ao meu redor. "Talver a faca do agougueizo fosse a redengfo para esse al, mas devo recusé-la porque ele é uma heranga, Por terd de esperar até que seu alento acabe, embora as: ‘me olhe com razoaveis olhos humanos, que me ins- ao ato razodvel.” Kafka 69 deménios do judaismo Entre o mundo da carne e o do espirito, a superstigao ju- daica pressupunha um orbe habitado por anjos e demé- nios. O censo de sua populago excedia as possibilidades da aritmética. Egito, Babilénia e Persia contribuiram, ao longo do tempo, para a formagao desse orbe fantastico. ‘Talvez por influéncia crista (sugere Trachtenberg), a de- ‘monologia ou ciéncia dos deménios foi menos importan- te do que a angelologia on ciéncia dos anjos. Citemos, contudo, Keteh Meriri, Senhor do Meio-Dia e dos Verdes Calorentos. Uns meninos a caminho da esco- Jase encontraram com ele; todos morreram, exceto dois, Durante o século xi a demonologia judaica se povoou de intrusos latinos, franceses ¢ alemiies, que acabaram por eonfundir-se com os que registra o Talmude. ;deménios de Emanuel Swedenborg (1688-1772) no ‘ituem uma espécie; proceilem do género humano. individuos que, depois da morte, escolhem 0 inferno. esti felizes naquela regidio de pantanos, desertos, vas, aldeias arrasadas pelo fogo, lupanares e escuras ‘mas no céu seriam mais desditosos. As vezes desce re eles um raio de luz celestial; os demnios 0 sentem 10 uma queimadura e como um cheiro fétido, Acham- Donitos, mas muitos tém rostos bestiais ou rostos que meros pedagos de carne, ou no tém rostos. Vivemn no fo reciproco @ na armada violéncia; quando se unem -m-no para destruir-se ou para destruir alguém, Deus be:aos homens e aos anjos-desenhar um mapa do in- mo, mas sabemos que sua forma geral é a de um dem6- ,. Os infernos mais sérdidos e atrozes esto no oeste. , nao ter retirado o leite da boca da eriaingay nto do os animais do pasto, néo ter aprisionade os 8 dos deuses. mente, 0s quarenta e dois juizes o entregam ao Devo- “que pela frente ¢ crocodilo, pelo meio lef e, por. ‘ipopotamo”. ff ajudado por outro animal, Babai, a do qual sabemos unicgmente que é horrendo & Mhutarco o identifica com um tita, pai da Quimera. 0 devorador das sombras Existe um curioso género literario que ocorreu indepen- dentemente em diversas épocas e nagGes: o guia do morto nas regides ultraterrenas. O céu e o inferno de Sweden- borg, as escrituras gndsticas, o Bardo Thédol dos tibetanos (titulo que, segundo Evans- Wentz, deve ser traduzido por “Libertagdo por intermédio da audigo no plano da pés- morte”) e 0 Livro egipcio dos mortos nao esgotam os exe- plos possiveis. As “semelhangas e diferengas” dos dois til- ‘timos mereceram a atengao dos eruditos; baste-nos aqui repetir que para o manual tibetano 0 outro mundo é tao ilusbrio quanto este, e para o egipcio ¢ real e objetivo. Nos dois textos encontramos um tribunal de divinda des, algumas com cabega de macaco; nos dois, uma ponde- ago das virtudes e das culpas. No Livro egipcio dos mor- tos, uma pena e um coragdo ocupam os pratos da balanga; no Bardo Thedol, pedrinhas brancas e pretas. Os tibetanos tém demdnios que agem como furiosos verdugos; os egip- cios, 0 Devorador das Sombras. morto jura nao ter sido causa de fome nem causa de choro, nao ter matado e niio ter mandado matar, nao ter roubado 0s alimentos funerérios, nao ter falsificado as 8 Segundo a tradigao islamica, Alé fez os anjos com luz, os djins com fogo e os homens com pé. HA quem afirme que ‘a matéria dos segundos é um fogo escuro sem fumaga Foram criados dois mil anos antes de Adio, mas sua estir- pe nao chegara ao dia do Juizo Final. Al-Qazwini os definiu como “vastos animais aéreos de corpo transparente, capazes de assumir varias formas”. No infcio aparecem como nuvens ou como altos pilares inde- finidos; em seguida, conforme queiram, assumem a forma de um homem, de um chacal, de um lobo, de um leo, de um escorpido ou de uma cobra. Alguns sio fiéis; outros he- reges ou ateus. Antes de destruir um réptil devemos pedir The que se retire, em nome do Profeta; é licito mata-lo se no obedece. Os djins s4o capazes de atravessar uma pare- de macica ou de voar pelos ares ou de tornar-se brusca- mente invisiveis. E comum chegarem ao céu inferior, onde supreendem a conversa dos anjos sobre acontecimen- tos futuros; isso Ihes permite ajudar magos e adivinhos. Gertos doutores thes atribuem a construgio das piramides ‘ou, por ordem de Salomio, filho de Davi, que conhecia 0 ‘Todo-poderoso Nome de Deus, do Templo de Jerusalém. ™ jionados em varandas ou balledes, jogam pedras nas também tém o habito de raptar mulheres bonitas. itar suas depredagSes, convém invoear 0 nome de “Misericordioso, o Apiedado, Sua moradia mais fre- do as ruinas, as casas vazias, as cisternas, 05 105 © 0s egipcios afirmam que sto a causa das tem- de areia. Acreditam que as estrelas cadentes sito Jangados por Alé contra os maléficos djins, lis é seu pai e seu lider. O dragao possui a faculdade de assumir muitas formas, mas essas formas sao inescrutaveis. Em geral o itaagi- nam com cabega de cavalo, cauda de serpente, grandes asas laterais e quatro garras, cada qual equipada com quatro unhas. Fala-se também de suas nove semelhangas: seus chifres se assemelham aos de um cervo, sua cabega & do camelo, seus olhos aos de um deménio, seu pescoco ao da serpente, sua barriga & de um molusco, suas escamas as de um peixe, suas garras as da Aguia, as plantas de seus pés as do tigre e suas orelhas as do boi. Ha exemplares desprovidos de orelhas e que escutam pelos chifres. E ha bitual representa-lo com uma pérola, que esté pendura- da em seu pescogo e que simboliza o Sol. Nessa pérola esta seu poder. Se a tiram dele, é inofensivo, A historia Ihe atribui a paternidade dos primeiros im. peradores. Seus ossos, dentes e saliva gozam de virtudes medicinais. Pode, conforme sua vontade, ser visivel ou invisivel aos homens. Na primavera sobe aos céus; no ou- tono afunda na profundeza das aguas. Alguns enzecern da asas € voam com impulso préprio. A ciéncia distingue di- versos géneros. O dragao celestial transporta nas costas os 6 10s das divindades e nao deixa que’eles eaiam sobre a; o dragio divino produz 0s venitos @ as chuvas, ra o bem da humanidade; o dragao terrestre determi ‘6 curso dos arroios e dos rios; o dragdo subterraneo conta dos tesouros vedados aos homens. Os budistas am que 08 dragSes nfo so menos abundantes do (0s peixes de seus muitos mares concéntricos; em al- lugar do universo existe uma cifra sagrada para ex sar seu numero exato. O povo chinés acredita mais dragées do que em outras deidades, porque os vé com a freqiiéncia nas nuvens cambiantes. Paralelamente, speare havia observado que hé muvens com forma le dragio (sometimes we see a cloud that’s dragonish). dragao governa as montanhas, vincula-se & geoman- mora perto dos sepulcros, est associado ao culto de nnfiicio, é 0 Netuno dos mares e aparece em terra firme. reis dos drages do mar vivem em palécios resplande- ites sob as Aguas e se alimentam de opalas e de pérolas. IA cinco desses reis: o principal esta no centro, os outros juatro correspondem aos pontos cardeais. Tém uma légua comprimento; quando mudam de posig&o, provocam jlisdes entre as montanhas. Esto revestidos de uma ar- dura de escamas amarelas. Sob 0 focinho tém uma bar- as pernas e a cauda sao peludas. A testa se projeta sobre olhos chamejantes, as orelhas sio pequenas ¢ grossas, a ‘boca estd sempre aberta, a lingua ¢ comprida e os dentes 0 afiados. 0 halito faz ferverem os peixes, as exalagbes do corpo os assam., Quando sobem a superficie dos oceanos ‘produzem redemoinhos e tufdes; quando voam pelos ares ‘causam tormentas que destelham as casas das cidades jmundam 0s campos. Sao imortais e podem comunicar-se 2 entre si apesar das disténcias que os separam e sem neces ‘sidade de palavras. A cada trés meses fazem seus informes anuais aos céus superiores. ‘cosmogonia chinesa ensina que 0s dez mil seres (o mun~ )) nascem do jogo ritmico de dois principios complemen. ¢€ eternos, que sio o yin €0 yang. Correspondem ao ‘a concentragio, a obscuridade, a passividade, os nu- ‘os pares e o frio; ao yang, 0 crescimento, a luz, 0 im- Iso, os niimeros impares ¢ 0 calor. Simboles do yin sitio sulher, a'Terra, a cor laranja, 0s vales, os leitos dos rios 0 tigre; do yang, o homem, o céu, @ azul, as montanhas, pilares, o dragao. (0 dragao chinés, o Lung, é um dos quatro animais gicos. (Os outros so 0 unicérnio, a fénix e a tartaru- } No melhor dos casos, 0 dragiio ocidental ¢ aterrador, ‘no pior, ridiculo; o Lung das tradigdes, em compensa ,, tem divindade e é como um anjo que fosse também 0. Assim, nas Memérias histéricas de Ssu-Ma Ch’ien 108 que Conficio foi corisultar 0 arquivista ou biblio~ -ario Lao 'Tsé e que, depois da visita, manifestou: “Os pissaros voam, 0s peixes nadam ¢ os animais cor- ‘O que corre pode ser detido por uma armadilha, 0 que la por uma rede e 0 que voa por uma flecha, Mas ai esté 7” © dragao; nao sei como cavalga no vento nem como chega 40 c6u. Hoje vi Lao Tsé e posto dizer que vi o dragio.” ‘Um dragio ou um cavalo-dragio surgiu do rio Ama- Telo e revelou a um imperador 0 famoso diagrama circu- lar que simboliza 0 jogo reciproco do yang e do yin; um rei tinha em seus estabulos dragées de sela ¢ de tiro; ou: tro se alimentou de dragGes e seu reino foi prospero. Um grande poeta, para ilustrar os riscos de sua eminéncia, péde escrever: “O unicérnio acaba como fiambre, o dra gfe como empadio de carne”. No I Ching (Livro das Mutages), 0 dragio costuma significar 0 sabio. Durante séculos, 0 dragio foi o emblema imperial. O trono do imperador foi denominado Trono do Dragao; seu rosto, 0 Rosto do Dragao. Para anunciar que o impe- rador havia morrido, dizia-se que havia subido ao firma- mento montado num dragio. A imaginagio popular associa o dragio as nuvens, & chuva t4o desejada pelos agricultores e aos grandes rios, “A terra se une ao dragio” & uma locugio habitual para fazer referéncia & chuva. Por volta do século v1, Chang Seng-Yu executou uma pintura mural em que figuravam quatro dragées. Os espectadores 0 censuraram porque omaitira os olhos. Chang, aborrecido, voltou a empunhar 98 pincéis ¢ completou duas das sinuosas imagens. Entao “oar se povoou de raios ¢ trovées, o muro se fendeu e os dragdes subiram ao céu. Mas os outros dois dragdes sem olhos nao safram do lugar”. O dragio chinés tem chifres, garras e escamas, ¢ seu espinhago é todo erigado de pontas agudas. & comum 80 senté-lo com uma pérola, que tem olhdbite de engo- ya cuspir; nessa pérola esta seu poder. Se a tiram dele, eae nos fala de um homem temaz que, 80 cabo trés anos extenuantes, dominou a arte de matar ara: , ¢ pelo resto de seus dias ndo topou com urna tiniest runidade de exercé-la. o dragao no ocidente ‘Uma serpente grossa ¢ alta com garras e asas talvez seja a descrigao mais fiel do dragio. Pode ser negro, mas con: vém que também seja resplandecente; a0 mesmo tempo se costuma exigir que exale baforadas de fogo e fumaga. O que antecede se refere, naturalmente, a sua imagem atual; 05 gregos parecem ter aplicado seu nome a toda serpente de bom tamanho. Plinio relata que no verao 0 dragiio tem desejo de tomar sangue de elefante, que é in- crivelmente frio, Ataca-o de repente, enrola-se nele e lhe crava os dentes. O elefante exangue cai no chao e morre; 0 dragio também morre, esmagado pelo peso do adversa. rio, Lemos ainda que os dragées da Etiépia, em busca de melhores pastos, costumam atravessar o mar Vermelho emigrar para a Ardbia. Para executar essa faganha, qua- tro ou cinco dragdes se abragam e formam uma espécie de embarcagao, com as cabegas fora da Agua. Outro capt tulo é dedicado aos remédios extraidos do dragao. Ali se 16 que seus olhos, secos e batidos com mel, produzem um linimento eficaz contra os pesadelos. A gordura do cora- go do dragiio guardada na pele de uma gazela e amarra da.ao brago com os tenddes de um cervo assegura 0 éxito 8 0s litigios; também os dentes, amarrados ao corpo, tor- 08 senhores indulgentes e os reis bem-humorados. O sxto menciona com ceticismo um preparado que torna, homens invenciveis. f, elaborado com pélo de leo, com medula desse animal, com a espuma de um cavalo que de ganhar uma corrida, com as unhas de um ea- horro e com a caudae a cabega de um dragio. _ No livro xt da Miada lé-se que no escudo de Agame- mn havia um dragio azul e tricéfalo; séculos depois os \tas escandinavos pintavam dragées em seus escudos € iipiam cabegas de dragdo na proa das embarcages. ‘0s romanos, o dragiio foi insignia da coorte, como'a a da legidio; essa ¢ a origem dos atuais regimentos de ages. Nos estandartes dos reis germanicos da Inglater- havia dragdes; 0 objetivo de tais imagens era infundir terror aos inimigos. Assim, no romance de Athis 1é-se: Ce souloient Romains porter, Ce nous fait moult @ redouter No Ociderite, o dragio sempre foi considerado malvado. jo Miguel, sao Jorge) era vencé-lo € maté-lo. Nas lendas Anicas, 0 dragio ¢ sentinela de objetos preciosos. As- do século vin, hé um dragio que durante trezentos anos ‘0 guardido de um tesouro. Um escravo fugitivo se escon- ‘de em sua caverna ¢ furta um jarro. O dragao desperta, dé- conta do roubo e resolve matar o ladrdo; de vez em #00 romanos costumavam portar/Iso nos torua extremamente temiveis, 85 ‘quando desce até a caverna e a revista cuidadosamente (Admirivel idéia do poeta, atribiuir ao monstro essa insegu- Yanga tio humana.) O dragdo comega a devastar o reino; Beowulf persegue, Iuta com ele e o mata. As pessoas acreditaram na realidade do dragio. Em meados do século xv1, ele foi registrado na Historia ani- ‘malin, de Conrad Gesner, obra de carater cientifico. O tempo desgastou consideravelmente o prestigio dos dragses. Acreditamos no leao como realidade e como sim- bolo; acreditamos no minotauro como simbolo, jé que nfo acreditamos nele como realidade; o dragio talvez seja 0 mais conhecido, mas também © menos afortunado dos ani- mais fantasticos. Parece-nos pueril e costuma contaminar de puerilidade as historias em que est presente, Convém niio esquecer, contudo, que se trata de um preconceito moderno, talvez provocado pelo excesso de‘dragdes exis- tentes nos contos de fadas. Porém, no Apocalipse de so Joao, fala-se duas vezes no dragao, “a velha serpente que éodiabo e é Satanés”, Analogamente, santo Agostinho es- reve que 0 diabo “6 ledo e dragio; leXo pelo impeto, dra- go pela insidia”. Jung observa que no dragio estio a ser pente e 0 pissaro, os elementos da terra e do ar. erido ou estimulado pelos espelhos, pelas Aguas e pelos néios gémeos, o conceito do duplo é comum a muitas na~ E verossimil supor que sentengas como “Um amigo é ‘outro eu”, de Pitigoras, ou o “Conhece-te a ti mesmo” nico se inspiraram nele. Na Alemanha chamaram-no Doppelganger: na Escicia, fetch, porque vem buscar (fetch) homens para levé-los para a morte. Encontrar-se consi- @ mesmo é, por conseguinte, funesto; a tragica balada Ti- onderoga, de Robert Louis Stevenson, fala de uma lenda bre esse tema. Recordemos também o estranho quadro How They Met Themselves, de Rossetti; dois amantes se sncontram consigo mesmos no crepisculo de um bosque. Seria 0 caso de citar exemplos andlogos de Hawthorne, toiévski e Alfred de Musset. | Para os judeus, contudo, o aparecimento do duplo ni era ppressigio de morte proxima, Era a certeza de ter alcangado o estado profético, Assim 0 explica Gershom Scholem. Uma tradigao recolhida pelo Talmude narra o caso de um homem busca de Deus que se encontrou consigo mesmo. No relato “William Wilson”, de Poe, o duploé a cons- jéncia do heréi, Este o mata e morre. Na poesia de Yeats, 85 9 duplo é nosso anverso, nosso contrério, aquele que nos ‘complementa, aquele que nao somos nem seremos. Plutarco escreve que os gregos deram o nome de “ou- to eu” ao representante de um rei. \entos anos antes da era crit, a rainha Maia, no Ne~ ‘sonhou que um elefante branco, vindo da Montanha de , entrava em seu corpo. Esse animal ontrico tinha seis, que correspondem as seis dimensdes do espago hin- ico: em cima, embaixo, atris, a frente, esquerda e di- . Os astrologos do rei previram que Maiadaria é luz um. \ino, que seria imperador da Terra ou redentor da espé- humana. Confirmou-se, como se sabe, a tiltima hipétese. Na india, o elefante é um animal doméstico. A cor bran- significa humildade e o ntimero seis ¢ sagrado. Sao de estirpe germanica. De seu aspecto pouco sabemos, exceto que sifo sinistros e diminutos. Roubam gado ¢ rou- bam criangas. Além disso, divertem-se com diabruras me- nores. Na Inglaterra deu-se o nome de elf lock (cacho de elfo) a um cabelo emaranhado, pois se acreditava que fos- se obra de elfos. Um exorcismo anglo-saxao atribui-lhes a faculdade malévola de arremessar de longe mimisculas flechas de ferro, que penetram na pele sem deixar rastro e que causam dores nevralgicas. Em alemio, a palavra para pesadelo é Alp; os etimologistas derivam essa palavra de “elfo”, dado que na Idade Média era comum a crenga de «que 0s elfos oprimiam 0 peito dos que dormiam e lhes ins- piravam sonhos horrorosos. eléi e os morlocks. hheréi do romance The Time Machine (A maquina d6 :po), que o jovem Wells publicou em 1895, viaja, me- te um artificio mecinico, para um futuro remoto. cobre que o género humano se dividiu em duas espé- .s: 08 eldi, aristocratas delicados e inermes que moram ociosos jardins e se nutrem de fruta, e 08 morlocks, es- 1e subterrdnea de proletarios que, & forga de trabalhar 10 escuro, ficaram cegos, e que continuam pondo em mo- .ento, instados pela mera rotina, méquinas enferruja complexas que nada produzem. Os dois mundos si jidos por pogds com escadas em espiral. Nas noites sem 1, os morlocks surgem de sua clausura ¢ devoram os e/6i 0 heréi consegue fugir para o presente. Como timico feu traz uma flor desconhecida e murcha, que vira pé ‘e que florescera depois de milhares de séculos. ‘A esfinge 40s monumentos egfpcios (chamada “androes finge” pot Herédoto, para diferencié-la da grega) é um lefo exiirado no solo e com cabega de homem; represen- tava, imagina-se, a autoridade do rei, e vigiava os sepul- ros ¢ 05 tetplos. Outras, nas avenidas de Karnak, tém cabeca de carneiro, o animal sagrado de Amon. Nos mo- mumestos da Assiria hé esfinges barbadas e coroadas, e a imagem ¢ Costumeira nas gemas persas. Plinio, em seu catiloge de animais etiopes, inclui as esfinges, de que descrewe ma 86 caracteristica: “a pelagem pardo-aver- melhada € 98 peitos iguais”. A esinge grega tem cabega e peitos de mulher, asas de passaro® COMPO © pés de ledio. Outros Ihe atribuem corpo de cachorT0 € cauda de serpente. Conta-se que assolava 0 pais de Tebas, propondo enigmas aos homens (pois pos- sufa yor humana) e devorando aqueles que ndo sabiam resolyéJos. A Edipo, filho de Jocasta, perguntou: “Que ser tem quatro pés, dois pés ou trés pés, ¢ quan- tos mais tem, mais fraco 62”! «Asim gH, VeFSZO mais antiga. Ox anos Ibe adicionaram a metifora rd dipo respondeu que era o homeét, que quando peque~ arrasta sobre quatro pés, quando mais ereseido anda re dois e na velhice se apbia num bastdo, A esfinge, de- do 0 enigma, jogou-se do alto de sua montana, Quincey, aproximadamente em 1849, sugeriu uma mnda interpretagao, que pode complementar a tradi- sal. O sujeito do enigma, segundo De Quineey, nao € to o homem genérico quanto o individuo Edipo, des. lido e érfao em sua manhé, sozinho na idade virile ado em Antigona na desesperada e cega velhice, rensforma a vida do homer num s6dia. Hoje o enigma é formulado, ‘Qual & 0 animal que anda com quatro pés de manhf, cb dois jo-dia-e com 16 tarda? Seu nome se vincula ao vocibulo latino fecum (fado, destino). Intervém magicamente nos assuntos dos ho- mens. Jé se disse que as fadas so as mais numerosas, as mais belas e as mais memoraveis das divindades meno- res. Nao esto limitadas a uma s6 regio ou a uma s6 época. Os antigos gregos, os esquimés e os peles-verme- Ihas contam histérias de heréis que obtiveram o amor dessas fantasticas criaturas. Tais aventuras so perigo- sas; a fada, uma vez satisfeita sua paixdo, pode sacrifi- car seus amantes. Na Irlanda e na Escécia dizem que elas vivem em re sid@ncias subterréneas, onde aprisionam as criangas e os homens que costumam seqitestrar. As pessoas acreditam que elas possuiam as pontas de flechas neoliticas exu- madas nos campos, as quais conferem infaliveis virtudes medicinais. As fadas gostam da cor verde, do canto e da misica. No fim do século xvit um clérigo escocés, 0 reverendo Kirk, de Aberboyle, compilou um tratado que se intitu- la A secreta repiiblica dos elfos, das fadas e dos faunos. Em 1815, sir Walter Scott mandou imprimir 0 manus- . Dizem que o st. Kirk foi levado pelas fadas porque fa revelado seus mistérios. Nos mares da Ivilia a fade ygana trama miragens para confundir os navegantes Jos perder o rumo. 93 fastitocalon A Idade Média atribuiu ao Espirito Santo a composigio de dois livros, O primeiro era, conforme sabemos, a Biblia; 0 segundo, 0 universo, cujas criaturas encerravam ensina. mentos imorais. Para explicar este Ultimo, compilaram. se 08 fisidlogos ou bestidrios. De um bestidrio anglo-saxio resumimos 0 texto que se segue: “Falarei também neste cantar da poderosa baleia. erigosa para todos os navegantes. Esse nadador das cor rentes do oceano recebe o nome de Fastitocalon. Sua for- ma é ade uma pedra rugosa e da a impress de estar co- beria de areia; 0s marinheiros que o véem pensam que é uma ilha. Amarram seus navios de alta proa a falsa terra e desembarcam sem temer nenhum perigo, Acampam, acendem fogueiras e dormem, rendides. Entdo o traidor submerge no oceano; vai para suas profundezas e deixa que 0 navio ¢ os homens se afoguem na sala da morte, ‘Também costuma exalar da boca uma doce fragrancia, ‘que atrai os outros peixes do mar, Estes penetram em ‘suas fauces, que se fecham e os devoram, Assim o dem6- nio nos arrasta para o inferno.” ” sma fabula esta presente no livre As mile wma na lenda de so Brando e no Paraiso perdido de , que nos mostra a baleia dormindo “na : ae a er, . Brinca e salta nos descampados, brandindo seu es- ‘e seu machado. fauna chinesa peixe hua, ou peixe-serpente-voadora, ras tem asas de passaro, Seu aparec seca. dg hau das montanhas parece um cachorro com Fosto em. E muito bom saltador e se move com a velo le de uma flecha; por isso se acredita que seu apare- lento pressagia tufSes. Ri de modo provocador quando ‘© homem. chiang-liang tem cabega de tigre, face de homem, quatro cascos, longas extremidades e uma cobra entre os dentes. (Os habitantes do Pais dos Bragos Compridos tocam 0 lo com as méos. Subsistem dos peixes apanhados na ‘ira do mar. Na regido a oeste da Agua Vermelha vive o animal chamado ch’ou-ti, que tem uma eabega de cada lado. Os habitantes de Ch'uan-T’ou tém cabega humana, asas de morcego e bico de passaro. Alimentam-se exclu: sivamente de peixe cru. Os homens-marinhos tém cabega e bragos de homem corpo e cauda de peixe. Emergem a superficie das jas Fortes. O hsiao parece uma coruja, mas tem rosto de homem, corpo de macaco e cauda de cachorro, Seu aparecimento ‘pressagia secas rigorosas. "A serpente musical tem cabega de serpente e quatro Faz um barulho que lembra 0 da pedra musical 0 ping-feng, que vive no Pais da Agua Magica, pare- tum poreo negro, mas tem uma cabega em cada ex- Os Asing-hsing parecem macacos. Tém rosto branco orelhas pontiagudas. Andam eretos como homens e sobem nas drvores. emidade. © Asing-tien & um ser acéfalo que, depois de travar © cavalo celestial parece um cachorro branco de cabe- combate com os deuses, foi decapitado e ficou para sem- ‘ga preta. Tem asas carnosas e voa. pre sem cabega. Tem os olhos no peito, e o umbigo é sua ; I 97 Na regitio do Brago Esquisito, as pessoas tm um bra# g0 € trés olhos. Sao fantasticamente habeis ¢ fabricam ‘carraagens voadoras, nas quais viajam pelo vento. ti-chiang & um passaro sobrenatural que vive nas Montanhas Celestiais. vermelho, tem seis patas e qua- ‘tro asas, mas nfo tem rosto nem olhos. Tai Ping Kuang Chi dos estados unidos mitologia dos acampamentos de machadeiros de in e de Minnesota inclui criaturas singulares, nas certamente, ninguém munca acreditou, hidebehind sempre est atras de alguma coisa, Por ‘voltas que um homem desse, sempre o teria atras de ‘¢ por isso nunca ninguém o viu, embora tenha mata: fe devorado muitos lenbadores. 0 roperite, animal do tamanho de um potro, tem um que lembra-uma corda, que usa para lagar os coelhos is velozes. | O teakettler deve seu nome ao ruido que produz, seme- inte ao da agua fervendo na chaleira para fazer chy Ita fumaga pela boca, anda para tras e foi visto rarissit vezes. 0 axehandle hound tem a cabega em forma de macha- ‘do, o corpo em forma de cabo de machado, pernas reforga- ‘das, e se alimenta exclusivamente de cabos de machado, Entre 0s peixes da regido estdo os upland trouts, qu fazem ninhos nas érvores, voam muito bem e tém med da agua. _ Bxiste também 0 goofang, que nada para tris para que no Ihe entre agua nos olhos e “é do tamanho exato do peixe-roda, s6 que muito maior”. Nao esquegamos 0 goofius bird, passaro que constréi o ninho ao contrério e voa para trés, porque nao quer saber para onde vai, e sim onde esteve. O gillygaloo fazia ninho nas encostas escarpadas da fa- mosa Pyramid Forty. Punha oves quadrados para que no rolassem e se perdessem. Os lenhadores cozinhavam esses ovos e os utilizavam como dados. 0 pinnacle grouse tinha s6 uma asa, que Ihe permitia voar apenas numa diregio, dando infinitamente a volta num morro cénico. A cor da plumagem variava conforme a estagdo e conforme a condigio do observador, Jivros candnicos dos chineses costumam decepeionar, me Thes falta 0 carater patético a que a Biblia nos umou, De repente, em seu razodvel decurso, uma ‘idade nos comove. Esta, por exemplo, registrada no ul dos Analectos, de Confiicio: | “Pjisse 0 Mestre a seus discfpulos: Que baixo cai! Ja faz spo que no vejo em meus sonhos o principe de Chu.” Ou esta, do livro 1x: | 60 Mestre disse: A fénix nfo aparece, nenhum signo i do rio. Estou acabado.” refere a uma 0 “signo” (explicam os comentaristas) se taruga magica. Quanto &fé~ jandecentes parecido favo real. Em épocas pré-historicas, itUosoy, ‘vel testemunho do favor celestial. O macho, ‘que tinha trés pemas, habitava 0 Sol. inscrigo no casco de uma tar ‘nix (feng), é um pissaro de cores resp "com 0 faisiio ¢ com 0 ps " visitava os jardins e os palacios dos imperadores vi ‘como um visi ‘No primeiro século da nossa era, o imprudente ateu ‘Wang Ch'ung negou que a fénix constituisse uma espécie " fixa. Declarou que, assim como a serpente se transforma, ‘em peixe e a ratazana em tartaruga, 0 cervo, nas épocas de prosperidade geral, costuma assumir a forma do unieérnio, eo ganso a da fénix. Atribuin essa mutagio ao “liquide _ propicio” que; dois mil trezentos e cingtienta ¢ seis anos antes da era crist, fez que no patio de Yao, que foi um dos imperadores-modelo, crescesse grama escarlate. Como se vé, sua informagao era deficiente, ou antes excessiva. Nas regides infernais hé um edificio imagindrio que se chama Torre da Fénix. ho de leviata ria naquele tempo, num bosque a margem do Rda- e Arles e Avignon, um dragio, metade animal € peixe, maior que um boi e mais compride que Jo. E tinha os dentes agudos como a espada e chi- os dois lados, e se ocultava na agua, e matava os fo- jiros e afundava as embarcagées. E viera pelo mar da ia e fora gerado por Leviata, crudelissima serpente a, e por um animal chamado Onagro, que nasce na 9 galo celestial De acordo com os chineses, o galo celestial é uma ave de plumagem de ouro, que canta trés vezes por dia, A pri- meira, quando 0 Sol toma seu banho matinal nos confins do oceano;a segunda, quando o Sol esta no zénite; a ilti- ma, quando afunda no poente. © primeiro canto sacode 0s céus e desperta a humanidade. O galo celestial é ante- passado do yang, principio masculino do univers. Dispe de trés pés e faz seu ninho na arvore fu-sang, cuja altura chega a centenas de milhas e que cresce na regio da au- tora, A vor do galo celestial é muito forte; seu porte, ma- jestoso, Pde ovos dos quais saem pintos de crista verme- ts ae renee @ seu canto pela manha. Todos os galos da Terra descendem is coterie do galo celestial, que também 1u, segundo deus da trindade que preside ao pantedio’ co, costuma cavalgar a serpente que enche o mar, fave Garuda. Vishnu é representado em azul e munido , Garuda, com asas, rosto e garras de Aguia, ¢ tronco e de homem. 0 rosto é branco, as asas escarlates, ¢ 0 dourado. Imagens de Garuda, lavradas em bronze ou ‘peda, costumam coroar 0s mondlites dos templos. Em ior existe um, construido por um grego, Heliodoro, yo de Vishnu, mais de um século antes da era crista. (No Garuda-Purana (que é 0 décimo sétimo dos Pu- ou tradigoes), o douto passaro declara aos homens igem do universo, o carater solar de Vishnu, as ceri- mnias de seu culto, as ilustres genealogias das casas descendem da Lua e do Sol, 0 argumento do Ra- ¢ diversas noticias referentes & versificagio, & ‘itica e & medicina. No Nagananda (Alegria das Serpentes), drama comi- o por um rei no século vil, Garuda mata e devoral 1a serpente por dia, até que um principe budista Ihe sina as virtudes da abstinéncia. No tltimo ato, 0 arre- 105, " pendido faz voltarem a vida os oss0s das serpentes devo- _ tadas. Eggeling acha que essa obra é uma sétira brama nica ao budismo. ‘Nimbarka, mistico de data incerta, escreveu que Ga- ‘ruda é uma alma salva para sempre; também so almas a coroa, os brincos e a flauta do deus, mp inglés existe a locugio grin like a Cheshire cat (“sorrit ficamente como ium gato de Cheshire”). Sugeriram-se ‘explicagdes. Uma, que em Cheshire vendiam queijos forma de gato que ri. Outra, que Cheshire 6 um conda- ‘palatino, on earidom, e que essa distingao nobiliérquica usou a hilaridade dos gatos. Outra, que nos tempos de Ri- srdo mt houve um guarda florestal, Caterling, que sorria fe snte ao bater-se com os cagadores furtivos. blicado em 1865, Lewis Carroll dotou o gato de Cheshire capacidade de desaparever gradualmente até nao dei- xar mais que 0 sorriso, sem dentes e sem boca. Dos gatos Kilkenny, conta-se que lutaram furiosamente e se devo taram até néo sobrar mais que as caudas. O conto data do Sao mais antigos que seu nome, que 6 grego, mas que os clissicos ignoraram, porque data do século xv1. Os etimo- logistas atribuem-no ao alquimista suigo Paracelso, em cujos livros aparece pela primeira vez. ‘Sio duendes da terra e das montanhas. A imaginagio popular os vé como andes barbudos, de tragos toscos grotescos; usam roupas pardas ajustadas ao corpo e capuz monéstico. Tal como os grifos da superstigfo helénica ¢ oriental e os dragdes germanicos, tém a misstio de tomar conta de tesouros ocultos. Gnosis, em grego, & “conhecimento”; tem-se conjectu: rado que Paracelso inventou a palavra “gnomo” porque eles conheciam e podiam revelar aos homens 0 exato lu- gar em que os metais estavam escondidos. livro citado por uma inteligéncia divina ndio podemos — jmitir nada de casual, nem mesmo o nimero de palavras ‘a ordem dos signos; assim 0 entenderam os cabalistas, € dedicaram a contar, combinar e permutar as letras da da Escritura, instados pelo desejo de desvendar os ar- nos de Deus. Dante, no século xitt, declarou que todos os thos da Biblia tém quatro sentidos: o literal, o alegérico, moral e o anagégico. Escoto Erigena, mais coerente com nogio de divindade, j4 afirmara que os sentidos da Escri- ura sio infinitos, tal como as cores da cauda do pavao real. sdos que procuraram no texto divino foi a criagao de corgtinicos, Sobre os deménios, afirmou-se que podiam jormar criaturas grandes e macigas como 0 camelo, mas fio finas e delicadas, eo rabino Eliezer negou-lhes a facul= Jade de produzir algo de tamanho inferior a um grio dé evada. “Golem” foi o nome dado ao homem criado,por_ ombinagées de letras; a palavra: significa, literalmente, ‘uma matéria amorfa ou sem vida”. No Talmnde (Sanhedrin, 656) lemos: ~ "Se os justos quisessem criar um mundo, poderiam antes da oragao da noite, o rabino se: fazé lo. Combinando as letras dos ineffveis nomes de ar 0 selo da boca do golem e este ‘Deus, Rava conseguiu criar um homem eo enviou a Rav "u pelas ruelas escuras e destrogou 10 Zera, Este lhe dirigiu a palavra; como o homem nao res n seus passos. O rabino, no fim, pondia, o rabino lhe disse: mpeu o-sélo que o animava. A criatura ari “fis uma criagdo da magia; torna a teu po. .quitica figura de barro que ainda hoje se “Todas as sextas-feiras dois mestres costumavam estu- de Praga.” dar as eis da Criagio e criar um bezerro de trés anos, que ‘em seguida aproveitavam para a ceia.”! " Bleazar de Worms conservou a formula necessitria nstruir um golem. Os pormenores do empreent A fama ocidental do golem ¢ obra do escritor austri cam vinte e trés colunas in-félio e exigem o conheci- co Gustav Meyrink, que no quinto capitulo de seu ro- 10 dos “alfabetos das duzentas ¢ vinte e uma portas™ manee onirice Der Golem (1915) escreve: lie é necessério repetir sobre cada um dos érgios do go- Na testa deverd ser tatuada a palavra emet, que sig- “A origem da histéria remonta ao século xvil. De acor- ica “verdade”. Para destruir a criatura é preciso apa- do.com perdidas formulas da cabala, um rabino? cons- ar a letra inicial, porque assim resta a palavra met, que truiu um homem artificial — o chamado golem — para gnifica “morto”. que este tangesse as sinetas na sinagoga e se ocupasse dos trabalhos pesados. No era, contudo, um homem como os outros, ¢ s6 0 animava uma vida fosca e vegetativa. Esta durava até a noite e devia sua virtude a influéncia de uma inscrig&o mégica que lhe punham atras dos dentes que atraia as livres forcas siderais do universo. Uma tar- 1 Igualmente, Schopenhauer esereve: “Na pagina 325 do primeire voli ‘me de sua Zauberbibliodhek (Biblioteca migica), Horst sintetiza assim a outrina da visiondria inglesa Jane Lead: Aqueles que possuem forga ma {gia podem, a sou arbitrio, daminar e renovar 0 reino mineral, o reino ve getal eo reino animal; basteria, consequentemente, que alguns magos se pPusessem de scordo para que toda 2 Criagio voltasse ao estado paradisi 0" (Sobre a vontade na natureza, Vi). 1 Judah Loew ben Berabel. “Monstros alados”, diz Herddoto dos grifos, ao narrar sua guerra ininterrupta com 0s arimaspos; quase tio impre- ciso quanto ele é Plinio, que fala das grandes orelhas e do bico eurvo desses “passaros fabulosos” (x, 70). Talvez a descrigao mais detalhada seja a do problematico sir John Mandeville, no capitulo 85 de suas famosas Viagens: “Desta terra (Turquia) os homens irdo a terra de Bic tria, onde ha homens cruéis e astutos, e naquela terra ha Arvores que dao Ia como se fossem ovelhas, com a qual se faz pano. Naquela terra ha ypotains (hipopétamos) que 4s vezes moram na terra, as vezes na Agua, e siio metade homem e metade cavalo, e s6 se alimentam de homens, quando conseguem encontré-los, Naquela terra h4 mui- tos grifos, mais do que em outros lugares, e alguns dizem que eles tém a parte da frente do corpo de guia e a par- te de tras de lefio, e essa é a verdade, porque ¢ assim que eles so; mas o grifo tem 0 corpo maior do que oito ledes € 6 mais forte do que cem Aguias. Porque sem diivida consegue levar voando até seu ninho um cavalo com 0 ca- valeiro, ou dois bois jungidos quando saem para arar, que tem grandes unhas nos pés, do tamanho de cor- de bois, e com elas fazem- se copos peo ‘costelas, arcos para atirar.” Em Madagascar, outro famoso viajante, uviu falar do passaro roca e no inicio achou que falando do uccello grifone, o passaro grifo (Viagens, Na Idade Média, a simbologia do grifo & com bestidrio italiano diz que ele significa o deménio; em eral, ¢ simbolo de Cristo, e assim é explicado por Isido- fo de Sevilha em suas Etimologias: “Cristo ¢ leto porque yeinae tema ores guia, porque, depois da ressurreigao, abe aos bus”. No canto xxix do Purgatério, Dante sonha com um triunfal puxado por um grifo; a parte de dguia é dourada, a de leo é branca misturada com vermelho, 1 significar, segundo os comentadores, a natureza hu- mana de Cristo." (Branco misturado com vermelho da a ‘cor da carne.) Outros entendem que Dante queria simbolizar o papa, “que é sacerdote ¢ rei. Escreve Didron, em sua Iconografia ‘erista: “O papa, como pontifice ou aguia, se eleva até 0 trono de Deus para receber suas ordens, ¢ como leiio ou rei, anda pela Terra com fortaleza ¢ vigor”. 2 Eles evocam a descrigio do espoto mo Cantico dos cintidos (5, 10-1): Meu amado, branco e vermelho [...}; sua eabega feito ouro”. ns. haniel, kafziel, azriel e aniel Na Babilonia, Ezequiel teve uma visio com quatro ani- ‘mais ow anjos, “e cada um deles tinha quatro rostos e qua- ‘tro asas” € “a figura de seus rostos era rosto de homem, e rosto de ledo do lado direito, e rosto de boi do lado esquer do, ¢.a0 mesmo tempo os quatro tinham rosto de 4guia”. Avangavam para onde os levasse o espirito, “cada um na diregéo para a qual estava voltado seu rosto”, ou seus qua- tro rostos, talvez crescendo magicamente em quatro dire- ‘Bes. Quatro rodas “que de tio altas eram horriveis” se- guiam os anjos e estavam cheias de olhos em toda a cireunferéncia. Memérias de Ezequiel inspiraram os animais do Apo- calipse de sao Joao, em cujo capitulo 4 lemos: “E diante do trono havia uma espécie de mar de vidro semelhante ao cristal; € no meio do trono e ao seu redor, quatro animais cheios de olhos na frente e atras. “Eo primeiro animal era semelhante a um ledo, ¢ 0 segundo animal semelhante a um bezerro, ¢ 0 terceiro animal tinha rosto de homem, e o quarto animal era se- melhante a aguia que voa vy “Fos quatro animais tinham cada um seis asas em vol- corpo; e por dentro estavam cheios de ollios; ¢ niio ti- repouso nem de dia nem de noite, dizendo: § , Santo é o Senhor Deus Todo-Poderoso, #, e que ha de vir” ‘ No Zohar (Livro do Esplendor) acrescenta-se que 05. ro animais se chamam Haniel, Kafziel, Azriel ¢ Amiel, -gue olham para 0 Oriente, 0 Norte, o Sul e o Ocidente. "Stevenson ponderou que se havia coisas assim no eét, ‘que nao haveria no inferno? Chesterton se inspirou no .0 citado do Apocalipse para sua famosa metfora da noite: “Um monstro feito de olhos”. Hayoth (seres vivos): assim se chamam os anjos qué- suplos do Livro de Ezequiel; para o Sefer Yetzirah, sao dez niimeros que serviram, com as vinte e duas letras do alfabeto, para criar este mundo; para o Zohar, eles des- ‘ceram da regio superior, coroades de letras. Os evangelistas tiraram seus simbolos dos quatro ros- ‘tos dos hayoth; Mateus ficou com o anjo, as vezes huma- ‘no e barbado; Marcos, com o le&o; Lucas, com o boi; Joao, com a guia So Jerénimo, em seu comentario a Eze- quiel, procuron refletir sobre essas atribuigdes. Diz que ‘Mateus ficou com o anjo (0 homem) porque destacou a " natureza humana do Redentor; Marcos com o le&o por: © que declarou sua dignidade real; Lucas com o boi, extiblé ~ ma do sacrificio, porque mostrou seu carter sacerdotal; Jodo com a aguia por seu vo ardoroso. Jam pesquisador alemio, o dr. Richard Hennig, locali- za a origem remota desses emblemas em quatro signos do zodiaco, que distam noventa graus um do outro, O us Teo € 0 touro nao oferecem a menor dificuldade; 0 anjo foi identificado com Aquario, que tem cara de homem, e a guia de Joao com Escorpiio, repelido por ser conside- rado de mau agouro, Nicolau de Vore, em sen Diciondrio de astrologia, também apresenta essa hipdtese e observa que as quatro figuras se retmem na esfinge, que pode ter abega humana, corpo de touro, garras e cauda de leo e asas de aguia. sure os indios sioux, Haokah usava os ventos como bar stas para fazer ressoar 0 tambor do trovio. Seus chifres onstravam que também era deus da caga. Chorava ndo estava contente; ria quando estava triste. Sentia o io como calor e 0 calor como frio. a7 FURG - NID Fiosto, no canto xxi do Fuarioso, ia no preste Joo, fabuloso imperador Harpias,em grego, significa “as que rebatam”. No inicio, foram divindades § maruts dos Vedas, que brandem armas os) e que ordenham as nuvens. Para a Teogonia de Hesiodo, as harpias so divindades aladas, ¢ de longa @ solta cabeleira, mais velozes que 03 passaros e 0s ventos; para o livro ut da Eneida, aves com rosto de donzéla, garras encurvadas e ventre imundo, pa lidas de fome que nao conseguem saciar. Descem das montanhas e maculam as mesas dos festins, Sao invulne- riveis e fétidas; tudo devoram, guinchando, e tudo trans- formam em excrementos. Sérvio, comentador de Virgi- Ho, escreve que assim como Heécate é Proserpina nos infernos, Diana na Terra e Lua no céu, e a chamam de “deusa triforme”, as harpias sao firias nos infernos, har- pias na Terra e demdnios (dirae) no oéu. Também as con- fundem com as pareas. Por decreto divino, as harpias perseguiram um rei da Tracia que revelou o porvir aos homens ou que com- prou a longevidade ao prego de seus olhos e foi castiga- do pelo sol, cuja obra havia ultrajado. Preparava-se para comer com toda a sua corte, ¢ as harpias devoravam ou contaminavam os manjares. Os argonautas afugenta- yam as harpias; Apolénio de Rodes e William Morris (Life and Death of Jason) narram a fantastica historia, a8 ng dra de lerna Tifao (filho disforme da Terra e do tartaro) e Equidna, que era metade bela mulher e metade serpente, geraram ahidra de Lerna. Segundo Diodoro, o historiador, ela con. tava cem cabegas; para a Biblioteca de Apolodoro, nove, ‘Lempriere nos diz que esta iltima cifra é a mais aceita; 0 horror é que, para cada cabeca cortada, brotavam duas no ‘mesmo lugar. Afirmou-se que as cabegas eram humanas e que a do meio era eterna, Seu hilito envenenava as Aguas e secava os campos. Até quando ela dormia, 0 ar pego- nhento que a cereava podia significar a morte de um ho- mem. Juno a criou para que enfrentasse Hércules. Essa serpente parecia destinada eternidade. Sua toca se localizava nos pantanos de Lerna. Hércules e Io- Jau foram atrés dela; o primeiro cortou-lhe as cabegas ¢ © outro foi queimando as feridas sangrentas com uma tocha. Hércules enterrou a ultima cabega, que era imor- tal, debaixo de uma grande pedra, ¢ onde a enterraram deve continuar, odiando e sonhando. ‘Em outras aventuras com outras feras, as flechas que Hércules molhou no fel da hidra causaram ferimentos mortais. jm caranguejo, amigo da hidra, n heréi durante o combate. Este 0 @ 0 fex subir aos céus, onde hoje € a¢ o de CAncer. Para manifestar impossibilidade ou incongruéncia, Vir- gilio falou em cruzar cavalos com grifos. Quatro séculos depois, Sérvio, 0 comentador, afirmou que os grifos si animais que da metade do corpo para cima so 4guias da metade para baixo, ledes. Para dar mais forga ao tex- to, acrescentou que eles nfo gostam de cavalos... Com 0 tempo, a locugio Jungentur jam grypes equis' tornou-se proverbial; no inicio do século xvr, Ludovico Ariosto lem- brou-se dela e inventou o hipogrifo. Aguia e lefo convi. vem no grifo dos antigos; cavalo e grifo no hipogrifo de Ariosto, que ¢ um monstro ou uma imaginagio de segun- do grau. Pietro Micheli ressalta que 6 mais harmonioso que 0 cavalo alado. Sua descrig&o pontual, que parece escrita para um di cionsrio de zoologia fantastica, pode ser encontrada no Orlando Furioso: “0 corcel nao é de faiz-de-conta, mas natural, porque um grifo 0 gerou com uma égua. Do pai tem as penas e 1 Cruzar grifos com cavalos. 1s patas dianteiras, 0 rosto e © bic; as ouitras par mile, e se chama hipogrifo, Vém ( ito raros, para falar a verdade) dos dos mares glaciais.” primeira mengfo a estranha besta é ande corcel alado.” “Dutras oitavas transmitem 0 estupor e o prodigio do" i que voa. Esta é famosa: E vede Voste e tutta la famiglia, E chia finestre e chi fuor ne la via, Tener levati al ciel gli occhie le ciglia, Come I'Beclisse 0 la Cometa sia. Vede la Donna un'alta maraviglia, Che di leggier creduta non saria: Vede passar un gran destriero alato, Che porta in aria un cavalliero armato? ‘Astolfo, em um dos cantos finais, desencilha o hipos grifo eo solta. on nas janelas e nas raat Hi a Tov epee toda famiia/ Exton nana «ma a BE endo ao ob elhos¢sobrancelhan/ Camo se fsseoHelips ou um Gomne ee Vio a mulher ma alta maravilha,/ Em que no era assim 180 fell cavalo armado. ‘ror/ Grande cores alado vin pasar,/ Levanido no ar um caval 195, ‘Descartes afirma que 0s macacos poderiam falar, se qui- sessem, mas que resolveram guardar siléncio para niio se rem obrigados a trabalhar. Os bosquimanos da Africa do Sul acreditam que houve um tempo em que todos os ani- mais podiam falar. Hochigan nao gostava de animais; wm dia desapareceu, ¢ levou consigo esse dom. ronte, Claudiano e 0 gramatico bizantino Joao Tzetzes jonaram, cada um de sew lado, 0s ictiocentauros; nos sxtos clissicos nfo se encontra nenhuma outra referéncia Jes. Podemos traduzir ictiocentauros por centauro-pei- , a palavra foi aplicada a seres que os mitélogos ‘também faram de centauro-tritées. Sua representagio é fre- siente na escultura romana e helenistica. Da cintura para 1a sio homens, da cintura para baixo so peixes, e térm ‘tas dianteiras de cavalo ou de ledo, Seu lugar & no corte- {das divindades marinhas, ao lado dos hipocampos ‘Awomori. Sem divida algum r ter as diregdes, pois no sul os ter jentes e é mais facil imaginar um mo certo mode, esse animal ¢ andlogo a0 adigdes frabes e ao Midgardsprm da Edda. ‘Em certas regides ¢ substituido sem vantagem. i escaravelho dos terremotos, 0 jinshin-mushi. Te de dragio, dex patas de aranha ¢ é coberto de f animal subterraneo, néo submarino. Segundo uma passagem de Séneca, Tales de Mileto ensi- nou que a terra flutua na Agua, como uma embarcagao, ¢ que a Agua, agitada pelas tormentas, causa os terremotos Os historiadores ou mitélogos japoneses do século vit nos propdem outro sistema sismolégico. Em uma pagina famosa, lemos: “Sob a terra — de planicies juncosas — jazia um ‘kami (um ser sobrenatural) com o formato de um barco € que, ao mover-se, fazia a terra tremer, até que o Mag- no Deus da ilha de Cervos enfiou a lamina de sua espa- da na terra e atravessou sua cabega. Quando 0 kami se agita, o Magno Deus se apéia na empunhadura, e 0 kami se aquieta outra vez.” (0 punho da espada, lavrado em pedra, sobressai do solo a uns poucos passos do templo de Kashima. No sécu. Jo xvull, um senhor feudal cavou seis dias e seis noites sem chegar ao fim da lamina.) Para 0 vulgo, o jinshin-uuvo, ou peixe dos terremotos, 6 uma enguia de setecentas milhas de comprimento que 16 ur Como era o gigante Khumbaba, que protege a montanha de cedros da despedagada epopéia babilénica Gilgamesh, talvez a mais antiga do mundo? George Burckhardt tra- tou de reconstrui-lo (Gilgamesh, Wiesbaden, 1952); eis aqui, traduzidas, suas palavras: “Enkidu, com um machado, derrubou wm dos cedros. ‘Quem entrou no bosque e derrubou um cedro?’, pergun- tou uma voz enorme. Os herdis viram Khumbaba aproxi- mar-se. Tinha unhas de le&o, 0 corpo revestido de ésperas escamas de bronze, nos pés as garras do abutre, na testa os chifres do touro selvagem, a cauda e 0 érgio gerador aca- bavam em cabega de serpente.” No canto ix de Gilgamesh, homens-escorpides — que da cintura para cima chegam ao céu e da cintura para baixo afundam nos infernos — tomam conta, entre as montanhas, da porta por onde sai o Sol. © poema consta de doze partes, que correspondem aos doze signos zodiacais. io-do-mar ou cobra-do-mar dos arabes. Em 1752, 0 dinamarqués Eric Pontoppidan, bispo de gen, publicou uma Histéria natural da Noruega, obra 10sa por sua hospitalidade ou credulidade; em suas pa- ginas 1é-se que o lombo do kraken tem uma milha e meia comprimento e que seus bragos podem abarcar o maior os navios. O lombo se ergue do mar como uma ilha; Eric ontoppidan chega a formular esta regra: “As ilhas flu- antes sdo sempre krakens”. ‘Também escreve que 0 kra- yn costuma deixar turvas as 4guas do mar com wma des- ‘earga de liquido; essa sentenga sugerin a conjectura de que ‘0 Kraken seja uma versio aumentads do polvo. Entre as pegas juvenis de Tennyson, uma é dedicada 10 kraken. Diz, literalmente: “Sob os trovées da superficie, nas profundezas do mar abissal, 0 kraken dorme seu antigo nao invadido sono sem sonhos. Pilidos reflexos se agitam ao redor de seus flancos sombrios; vastas esponjas de crescimento e altura ilenar se inflam acima dele, e nas profundezas da luz en- 199, ‘em celas secretas e grutas maravilhosas, polvos “@hormes e incontiveis batem ¢om bragos gigantescos a _ Yerdosa imobilidade. Ali jaz ha séculos, e hd de jazer, far ‘tando-se no sono de imensos lagartos marinhos, até que o fogo do Juizo Final aquega o abismo. Entio, para ser visto ‘uma s6 ver por homens e anjos, rugindo surgiré e morre- ri na superficie.” dotado de quatro mil olhos, quatro mil orelhas, quatro narizes, quatro mil bocas, quatro mil linguas e quatro pés. Para locomover-se de um olho a outro ou de wna 0s lamed wufniks Ha na Terra, e sempre houve, trinta e seis homens retos cuja ‘missio é justificar o mundo perante Deus. Sio 0s lamed wuf- niks, Nao se conhecem entre si e so muito pobres. Se um homem chega a saber que ¢ um Jamed wufnik, morre ime- diatamente, e um outro, talvez em outra regio do planeta, toma seu lugar. Sem suspeitar, esses homens sii 0$ pilares secretos do universo, Nao fosse por eles, Deus aniquilaria 0 género humano. So nossos salvadores e néo saber. Tiss crenga mistca dos judeus foi exposta por Max Brod Sua remota raiz pode ser encontrada no capitulo 18 do Génesis, quando o Senhor declara que nao destruiré a ci dade de Sodoma se nela houver dez homens justos. Os drabes tém um personagem andilogo, os Auth. do 0s clissicos latinos ¢ gregos, as larmias viviam na “ca. Da cintura para cima tinham a forma de uma lin- ‘mulher; para baixo, a de wma serpente, Alguns as defi- am como feiticeiras; outros como monstros malignos io possulam a faculdade da fala, mas seu silvo era melo- fioso, Nos desertos atraiam os viajantes, para depois devo- p-los. Sua origem remota era divina; provinham de um dos muitos amores de Zeus. Na parte da Anatomia da me- ancolia (x621) que trata da paixio do amor, Robert Burton conta a historia de uma Jamia que assume forma humana ‘ seduz um jover filésofo “nlio menos gracioso que ela”. "Leva-o para seu palicio, situado na cidade de Corinto, Con ‘vidado para o casamenito, o mago Apoldnio de Tiana cha- tma-a pelo nome; imediatamente a lamia e o palécio desis jparecem. Pouco antes de morrer, John Keats (0795-1821) se " inspirou no relato de Burton para compor seu poems Os chineses, por sua vez, falam da n uma de suas vidas anteriores, passou ft 1t4-lo, uma lebre se atirou no foge. Gx Buda enviou sua alma para a Lua. Ali, a lebre tritura num morteiro magico pompdem o elixir da imortalidade. Na lingu ar de certas regides, essa lebre se chama “o do sbre preciosa”, ou “lebre de jade”. " Acredita-se que a lebre comum vive até os mil jue seu pélo fica branco quando ela envelhece. Nas manchas da Lua, 0s ingleses acreditam divisar a for ma de usm homem; duas ou trés referéncias ao “homem da Lua”, ao man in the moon, sio encontradas em Sonho de uma noite de verdo. Shakespeare menciona seu feixe de es- pinhos ou arbusto de espinhos; ja um dos versos finais do | canto xx do Inferno fala de Caim e dos espinhos. O comen- tario de Tommaso Casini a esse respeito evoca a fabula toscana de que 0 Senhor deu a Caim a Lua por prisio ¢ 0 condenou a carregar um feixe de espinhos até o fim dos tempos. Outros, na Lua, véem a Sagrada Familia, e assim Lugones escreveu em seu Lundrio sentimental: Yesté todo: la Virgen con el nito; al flanco, San José (algunos tienen la buena fortuna De ver su vara); ¥ el buen burrito blanco ‘Trota que trota los campos de la luna.* ‘+ Nada falta: a Virgem e 0 Menino; 20 lado/ Sio José (alguns cor muita sorte/ Véem seu cajado); e bom burrinho branco/ Trota {que trota nos campos da Lua. oe 135, ‘Também foram chamados de “larvas”, Diferentemente dos lares da familia, que protegiam os seus, os lémures, que eram as almas dos mortos malvados, erravam pelo mundo infundindo horror aos homens. Imparcialmente torturavam os impios e os justos. Na Roma anterior a {é de Cristo, celebravam-se festas em sua homenagem du- rante o més de maio. As festas se chamavam lemirias. Foram instituidas por Rémulo para apaziguar a alma de Remo, a quem havia executado. Uma epidemia assolou Roma, e 0 ordculo, consultado por Rémulo, aconselhou aquelas festas anuais que duravam trés noites. Os tem plos das outras divindades eram fechados, e era proibido celebrar casamentos, Era costume jogar feijées sobre as sepulturas ou consumi-las pelo fogo, pois a fumaga afu- gentava os lémures. Os tambores ¢ as palavras magicas também os espantavam. O curioso leitor pode interrogar os Fastos de Ovidio. que antes de Eva foi Lilith”, 1é-se num texto nebo a Sua lenda inspirou ao poeta inglés Dante Gabriel Ros: ti (1828-82) a composigéo de Kien Bower. Lilith era a serpente; foi a primeira esposa de Adio ¢ Ihe dew ering sons and radiant daughters (filhos resplandecen- e filhas esplendorosas). Depois, Deus criou Eva; Lilith, 1 vingar-se da mulher humana de Adio, convenceu-a a [provar do fruto proibido e a conceber Caim, irmio ¢ assas ‘fino de Abel. Essa é a forma primitiva do mito, seguida por Rossetti. No decorrer da Idade Média, sob ainfluéncia da palavra Jayil, que em hebraico quer dizer “noite”, ele | foi se transformando. Lilith deixou de ser uma serpente ‘para ser um espirito noturno. As vezes é um anjo que go ‘yerna a geragio dos homens; outras, deménios que assal< tam os que dormem sozinhos ou os que andam pelas corey © das. Na imaginagio popular costuma assumir a forma | uma silenciosa mulher alta, de negros cabelos soltos. “Esse animal é muito comum nas regides do norte e tem quatro ou cinco polegadas de comprimento; é dotado de ‘um instinto curioso; os olhos parecem cornalinas ¢.0 pélo & negro-azeviche, sedoso e flexivel, macio como um ‘travesseiro, Gosta muito de tinta nanquim, e, quando as pessoas escrevern, senta-se com uma mao sobre a outra e as pernas cruzadas esperando que terminem, e bebe o resto da tinta. Depois torna a acocorar-se e fica quieto.” Wang Ta-hai (4792) Yu, o Grande percorreu e mediu com seus passos as nove ontanhas, os nove rios é os nove pantanos e dividiu a em nove regides, proprias para a virtude e a agricul- ura. Conteve assim as Aguas que ameagavam inundar 0 ¢.a Terra; os historiadores contam que a divisio que imps ao mundo dos homens lhe foi revelada por uma uga sobrenatural ou angelical que saiu de um arroio. 4 quem afirme que esse réptil, mie de todas as tartaru- gas, era feito de Agua e de fogo; outros Ihe atribuem uma bstincia muito inenos comum: a luz das estrelas que for- m a constelagio de Sagitario, No casco lia-se um trata~ ‘cosmico intitulado Hong Fan (Regra Geral) ou um di grama das nove subdivisdes desse tratado, formado por \tos brancos & pretos. Para os chineses, o céu & hemisférico e a Terra ¢ quae angular; por isso consideram a tartaruga uma imagem OW modelo do universo. As tartarugas, além disso, particlpam longevidade do cbsmico; é natural consideré-las animals “espirituais (junto com 0 unicérnio, o dragio, a fénix ¢ ot gre) e que os dugures procurem pressigios em sua carapaga. 30 ¥ # site ‘Than-Qui (tartaruga-génio) é o nome da que revelou mandragora | @ Hong Fan ao imperador. 10 0 borametz, a planta chamada mandrdgora é limnl- fe com o reino animal, porque grita quando a arrancamy “esse grito & capaz de enlouquecer os que o ouvem (Romene Julieta, w, 3). Pitagoras chamou-a de “antropomorfa”; 0 agrénomo latino Licio Columela, de “semi-homo”; e Al- }erto Magno escreven que as mandrigoras representam a hhumanidade, inclusive com a distingdo dos sexos. Antes, Plinio havia dito que a mandrégora branca ¢ o macho, € a " preta, a fémea. Também que os que a colhem desenham trés circulos com a espada em torno dela e olham para 0 poente; o cheiro das folhas ¢ tao forte que costuma emude- cer as pessoas. Arrancé-la era correr 0 risco de passar por terriveis calamidades; 0 ultimo livro da Guerra dos judeus, de Flavio Josefo, aconselha que se recorra a um cao ades- | trado. O animal morre depois de arrancar a planta, mas as folhas servem para fins narcéticos, magicos ¢ laxantes. ‘A suposta forma humana das mandragoras sugeriti & superstiggo que elas crescem ao pé dos patibulos. Browne (Psewdodoxia epidemica, 1646) fala da gordura dos énfor- cados; o romancista popular Hanns Heinz Ewers (Alrau- ne, 1913), do sémen. Mandragora, em alemio, ¢ Alraune; 1

You might also like