You are on page 1of 29
MAQUIAVEL LGirclo-Ltiones| I Quot sint genera principatuum et quibus modis acquirantur QUANTOS SAO OS GENEROS | DE PRINCIPADOS E DE QUE MODOS SE ADQUIREM ‘Todos os estadlos, todos os dominios, que tiveram € tém império® sobre os homens, foram ¢ séo ou repti- blicas ou principados. Os principados ou sio hereditérios, nos quais o sangue do seu senhor tem sido principe ha Iongo tempo, ou so novos. Os novos, ou sAo em tudo no- vos, como foi Milo para Francisco Sforza, ou sio como frio do principe membros acrescentados ao estado heredi que os adquire, como € o reino de Napoles para o rei de Espanha. Estes dominios assim adquiridos esto ou acostu- mados a viver sob um principe, ou habituados a ser livres. E adquirem-se, on com as armas de outrem ou com as pr prias, ou por fortuna ou por virtude. ais amado. E, se “ios, € légico que com aantiguida- 2-8e as memérias nudlanga deixa 0 II De principatibus mixtis OS PRINCIPADOS MISTOS E, porém, no principado novo que residem as difi- culdades. Primeito ~ se nio € todo novo, mas como um membro ~, podendo a tudo junto chamar-se como que misto -, as suas alteragdes nascem primeiramente de uma dificuldade natural, que existe em todos os principados no- vos € que consiste em os homens mudarem de bom grado de senhor, acreditando que melhoram, e esta crenca os fa- zer pegar em armas contra ele, no que se enganam, porque véem depois por experiéncia ter piorado. Isto depende de uma ontra necessidade natural e ordindria, que faz com que ele precise sempre de ofender aqueles de quem se tor- na o novo principe, seja com gente de armas'!, seja com outras infinitas injirias que a nova aquisicio arrasta. De modo que tu'* tens por inimigos todos os que ofendeste ao ocupar aquele principado e n io podes manter como ami- gos aqueles que lé te puseram, por nao os poderes satis- fazer da maneira que eles haviam pressuposto, ¢ por nao poderes usar contra eles medicinas fortes, estando-lhes obrigado; porque ainda que alguém seja fortfssimo pel 7 seus exércitos, precisa sempre do favor dos naturais para entrar numa provincia, Foi por estas razdes que Luts XH, rei de Franca, ocupou de imediato Milao e de imediato a perdeu; ¢ bastaram para tha tirar, da primeira vez, as for- gas proprias de Ludovico, porque aqueles povos que the haviam aberto as portas, achando-se enganados quanto a opinio que tinham dele ¢ ao fixturo bem que haviam pres- suposto para si, ndo pude ‘am suportar 03 aborrecimentos com 0 novo incipe. FE bem verdade que, adquirindo-se depois uma se- gunda vez, 0s territérios revoltosos se perdem com mais dificuldade, visto que o senhor, agarrando a ocasifo da revolta, € menos escrupuloso a precaver-se, punindo 05 delinquentes, descobrindo os suspeitos ¢ providencian- do nos aspectos mais fracos. De modo que, se para fazer perder Milio 4 Fi ‘a vez, um du- aca bastou, da primei que Ludovico a rumorejar nas suas fronteiras, para a fazer depois perder & segunda foi preciso ter contra si todo 0 mundo € que os seus exércitos fossem aniquilados ou afii- gentados de Itdlia: 0 que nasce das supracitadas causas. No entanto, quer da primeira quer da segunda vez, ela foi-the tirada. As causas gerais da primeira ja foram exa. minadas; vesta agora dizer as da segunda e ver que remé. dios ele af tinha e quais pode ter alguém que esteja nos mesmos termos, para poder manter-se no que adquiriu, melhor do que fez a Franga Digo, portanto, que estes estados, que ao serem adqui- ridos se juntam a um estado antigo daquele que adquite, ow sfo da mesma provincia e da mesma lingua, ou nio sie. Quando sao, é muito facil deté-los, mormente quando nao esto habituados a viver livres: para os possuir com seg que os ¢ ches as costume acontec jormar embora costume. entre si duas cau inga, postos, ¢ com ose Ma ling as dificu indusivic remédios isto faria como fer outras o1 para lah tando 1s, dem rem grandes «¢ nfo € esy satisfeitos mais mot temer, se 0s estrang Pelo que, pode perc naturais para que Lafs XII, Je imediato a ra ver, as for- vovos que Ihe dos quanto haviam pres orrecimentos pois uma se- percem com ado a ocasisio se, punindo vovidencian- se para fazer vez, um du- para fazer ura si todo o lados ou afia- tadas causas, inda vez, ela 4 foram exa- er que remé- tue esteja’ nos jue adquiiu, serem adqui- daquele que Iingua, »s, mormente ura os possuir maguiaven com seg anga basta ter extinto a linhagem do principe que os dominava, porque, nas outras coisas, mantendo-se- -lhes as condigdes anteriores e nao havendo diferenca de costumes, os homens vivem tranquilamente, como se viu acontecer na Borgonha, na Bretanha, na Gasconha e na Normandia, que tanto tempo estiveram com a Franca; e embora haja af alguma diferenca de lingua, no entanto, costumes sao semelh: ates € podem facilmente conciliar-se ent si, E quem os adquire, querendo-os deter, deve ter duas cautelas, uma, que 0 sangue do seu antigo principe se extinga, outra, ndo alterar nem as suas leis nem os seus im- postos, de modo a que, em brevissimo tempo, se tornem!’ com o seu principado antigo um s6 corpo. Mas quando se adquirem estados numa provincia de Iigua, costumes e ordens diferentes, aqui é que estao as dificuldades ¢ € preciso ser muito afortunado € muito industrioso para os deter: E um dos maiores e mais eficazes remédios seria a pessoa que os adquire ir para la habitar; isto faria mais segura € mais duradoura aquela possessao, como fez © Turco na Grécia: mesmo observando todas as outras ordens para deter esse estado, se nfo tivesse ido para Id habitar, nao teria sido possivel det Jo. Porque, es- tando la, véem-se nascer as desordens € depressa se po- dem remediar; nao ando I4, da-se por elas quando ja sio grandes ¢ jér ‘Jo hé mais temédio. Além disso, a provincia ndo é espoliada pelos teus funcionarios, os sfibditos ficam satisfeitos por recorrer de perto ao principe, pelo que tém mais motivos para o amar, se quiserem ser bons, e para 0 temer, se quiserem ser de outra maneira. Quem de entre os estrangeiros quiser atacar esse estado tera mais cautela Pelo que, habitando 14, s6 com grandissima dificuldade 0 pode perder © outro methor remédio é mandar colénias para um ou dois lugares, que sejam como que grilhetas daquele ssdrio ou fazer isto, ou ter la bastante estado. Porque é nec gente de armas e soldados a pé. Nas colénias nao se des ps id as le muito; ¢ m despesa para si, ou com pouca, para manda e detém, ¢ somente ofende aqueles a quem tira 0s campos ¢ as casas para os dar aos novos habitantes, que sio uma nyfnima parte daquele estado; ¢ os que ele ofendle, ficandlo divididos e pobres, nao 0 podem jamais prejudicar; e todos os outros ficam, por um lado, sem ser ofendidos, pelo que deverdo aquietar-se, por outro, com medo nio fagam erros, inda assim nao Ihes acontega a eles los. Concluo que estas coldnias no té s, ofencem menos, € os a didos nao podem prejudicar, estando pobres ¢ divididos, omo se disse. Hi . Por isso, que notar que os homens ou se as as receitas desse estaclo, de modo que a aqu wansforma em perda; ¢ ofende muito mais, porque pre- judica todo esse estado ao deslocar com os alojamentos 0 seu exército, incémodo este de que se ressentem todos, ¢ cada um deles se to na seu inimigo: € s4o inimigos que o podem prejudicar, permanecendo vergados nas suas casas. Sob todos 08 aspe 3, esta guarda é, pois, intiil, tal como a das col6nias € titi. Deve ta como se disse, fazer-se chefe e defensor dos vizi- abém, quem esta muma provincia diferente, nhos menos potentes, pér eng nho em enfraquecer os 120. potentes de previsto, af sempre acor estiverem ¢ seja por me rom nos na eles entrara dem das co numa provi aderem a eh tem sido mi respeita a es alguma em ; juntos ¢ de af adqnirin eles de nasia cilmente poc os que so px dessa provin. depressa per detiver, cera Os rome servaran nias, cativara poténcia, reb jear 14 reput baste como e: © os etélios £ cedénios foi méritos dos a Ihes permitis io os que eles nados como 0 V ta tranquilida- ¢ Espanha, de Quo sunt ¢ odo administrandae ates vel principatus qui ante quam occuparentur los numerosos 1ato a meméria a para Roma, a longa du- possuidores:e | DE QUE MODO SE DEVEM , chamar cada suis legibus vivebant ran ADMINISTRAR AS CIDADES + estar extinto OU OS PRINCIPADOS QUE ANTES conheciam se- DE SEREM OCUPADOS VIVIAM COM idem AS SUAS PROPRIAS LEIS pve Alexandre © que tiveram Yirro € muitos: do vencedor, Quando os estados que se adquirem como foi dito esto acostumados a viver com as suas leis € em li- berdade, a querer-se det -los, existem wés modos: o pri- meiro, pé-los em rufnas; o segundo, ir para 1é habitar pessoalmente; 0 terveiro, deixé-los viver com as suas leis, extraindo-Ihes uma pensio ¢ criando lé dentro um estado de poucos*" que o conservem teu amigo, porque, sendo esse estado criado por esse principe, sabe que nao pode subsistir sem a sua amizade e sua poténcia e tem de fazer tudo para o manter; €, que nndo-a preservar, mais facil- mente se detém wma cidade habituada a viver livre, por meio dos seus cidadiios que por qualquer outro modo. tan 0s romanos. Os s, criando 4 um as. Os romanos, cia, desfizeram- a Grécia, qua- fazendo-a livre 1 sucesso, de tal zer-se de muitas orque, na verda- uir que nao seja ade acostumada de ser desfeito io na rebeliao o s, as quais nem ios, alguma vez ‘a ou providen- habitantes no a qualquer im- como fez Pisa servidio pelos Ws esto habitu- ngue é extinto, re no tendo, n de entre eles, bem: de modo \ mais facilida- se delas, Mas nais desejo “epousar a me que a via mais De principatibus novis qui armis propriis et virtute acquiruntur OS PRINCIPADOS NOVOS QUE SE ADQUIREM COM ARMAS PROPRIAS E VIRTUDE Ninguém se maravilhe se no que eu vou dizer dos principados em tudo novos, quer de principe, quer de estado, eu acluzir grandfssimos exemplos. Porque, cami- nhando os homens sempre pelas vias batidas por outro procedendo nas suas acgées por imitagio, nao se podendo as vias dos outros manter em tudo nem alcangar a virtude daqueles a quem a imit deve um homem prudente me. ter sempre por vias batidas por grandes homens e imitat aqueles que foram o mais excelentes, a fim de que, se niio chegar & sua virtude, dela exale ao menos algum odor: e fa- zer como os arqueiros prudentes, os qnais, parecendo-lhes o local que tém por designio golpear demasiado longinguo e nhecendo a quanto vai a virtude do seu arco, poem a mira bastante mais alto que o local almejado, nao para aleangar com a sua seta uma tio grande altura, mas poder com a ajuda de t4o alta mira atingir o seu de 133— sinqutaver Digo, pois, que nos principados em tudo novos, onde Digo, pe ip: nais ou menos aja um novo principe, se encontra dificuldade em os manter consoante € mais ou menos vir- 1¢ evento de pas- tuoso aquele que os adquire. E porque sar de privado a principe pressupée ou virtude ou fortuna, parece que uma ou outra destas duas coisas mitiga em par- te muitas dificuldades; no éntanto, aquele que esteve me- nos assente na fortuna manteve-se mais. Facilita também 0 principe ser constrangido, por nao ter outros estados, a ir pessoalmente habitar Ii Mas, para vir Aqueles que pela prépria virtude € nao por fortuna se tornaram principes, digo que os mais, excelentes so Moisés, Ciro, Rémulo, Teseu e semelhantes E se bem que sobre Moisés nao se deva disci, tendo sido um mero executor das coisas que Ihe eram ordenadas por Deus, deve contudo ser admirado, ao menos por aquela graca que 0 fazia digno de falar com Deus. Mas, conside- rando Ciro ¢ os outros que adquiriram ou fundaram reinos, achi-los-eis todos admirdveis ¢, se se consideram as suas acgées e ordens particulares, nfo parecem discrepantes das de Moisés, que teve tio grande preceptor. E, examinando as acces € a vida deles, nao se vé que outra coisa tivessem da fortuna além da ocasiao, a qual thes deu matéria para af poderem introduzir a forma que Ihes pareceu. Sem essa ocasido a virtude do Animo ter-se-thes-ia extinto, e sem essa virtude a ocasiao teria vindo em vio. Era, pois, necessdrio a Moisés encontrar no Egipto 0 povo de Israel escravo € oprimido pelos egipcios, a fim de que eles*, para sair da servidao, se dispusessem a segui-lo, Convinha que R6mulo nao coubesse em Alba € fosse enjeitado ao nascer, a querer-se que ele se tornasse fers sem tudo novos, onde contra mais ou menos € mais ou menos vir- uue este evento de pas- on virtude ou fortuna, 5 coisas mitiga em par- aquele que esteve me- vais, Facilita também o ‘er outros estados, a ir propria virtude e nao pes, digo que os mais Teseu e semelhantes. va discuti, tendo sido + eram ordenadas por a0 menos por aquela a Deus. Mas, conside- now fundaram reinos, ve consideram as suas zcem discrepantes das eptor: E, examinando € outra coisa tivessem hes den matéria para 1es parecen. Sem essa s-ia extinto, e sem essa neontrar no Egipto 0 ido pelos egfpcios, a lo, se dispusessem a \ coubesse em Alba € € que ele se tornasse saguiave rei de Roma e fundador dessa patria. Era preciso que Ciro encontrasse os persas descontentes com 0 império dos me- dos, ¢ os medos amolecidos ¢ efeminados pela longa paz. Teseu no podia demonstrar a sua virtude se nao encon- trasse os atenienses divididos. Tais ocasides, portanto, fi es fe zeram estes homens felizes, ¢ a excelente virtude del ‘com que aquela ocasiao fosse conhecida, com o que a sua patria foi enobrecida e se tornou felicissimna, semelhantes a estas, Aqueles que por vias virtuos: se tornam principes adquirem 0 principado com di- ficuldade, mas com facilidade 0 detém; ¢ as dificuldades que eles tém a adquirir principado nascem, em parte, das novas ordens e modos que sio forcados a introduzir E deve-se con para fundar o seu estado e a stia seguran siderar que nao existe coisa mais dificil de tratar, nem mais de lidar que en- duvidosa de conseguir, nem mais perig cabecar a introdugio de novas ordens. Porque o introchi- tor tem por inimigos todos aqueles que beneficiavam das ordens antigas e por tibios defensores todos aqueles que beneficiariam das novas, tibieza esta que nasce em parte por medo dos adversiirios, que tém as leis do seu lado, em parte da incredulidade dos homens, os quais no acredi- tam verdadeiramente nas coisas novas, se néo virem pascet dai uma firme experiéncia. De onde nasce que, de cada vez que 0s que so inimigos tém ocasido de atacar, fazem-no militantemente, enquanto 0s outros defendem tibiamente: de modo que junto a eles, se corre perigo. E necessario, portanto, querend discorrer bem sobre este aspecto, examinar se estes inovadores subsistem por si mesmos ou se depenclem de outros, isto é se para levar por diante a sua obra precisam de pedir ou podem as verdadeiramente usar a forca. No primeiro caso, saem-se sempre mal e nao levam por diante coisa alguma; quan- do, porém, dependem deles préprios e podem usar a for- (a, entéo € que raras vezes correm perigo: daqui nasce que todos os profetas armados tenham vencido e os de- sarmados se tenham arruinado, Porque, além das coisas ja ditas, anatureza dos povos é inconstante ¢ é facil persuadi- ‘Tos de uma coisa, mas € dificil manté-los firmes nessa petsiiasao: ¢ por isso convém estar ordenado de modo que, quando eles ja no créem, se possa fazé-los crer pela fora. Moisés, Ciro, Teset € Romulo nao teriam podido™ ‘Tazerihes observar por muito tempo as suas instituigdes se tivessem estado desarmados, como aconteceu no nos- so tempo a frei Jeronimo Savonorola, o qual se arruinou com as suas ordens novas, mal a multidao comecou a nao acreditar nele, ¢ ele nao tinha maneira de manter firmes os que tinham acreditado nem de fazer acreditar os des- crentes. Por isso, esses assim tém grandes dificuldades a conduzir-se e todos 0s seus perigos estéo a partida, ¢ vem de os superar com a virtude. Mas uma vez que os tenham superado ¢ que comecem a ser venerados, tendo aniquila- do os que tinham inveja da sua qualidade, ficam potentes, seguros, honrados e felizes. Ato altos exemplos quero jumtar um outro que é menor, se bem que tenha alguma analogia com eles, € espero que me baste por todos os outros semethantes: € Hierao de Siracusa, Este, de privado tornou-se principe de Siracusa, € também ele nao conheceu da fortuna sendo a ocasitio. Com efeito, estando os siracusanos oprimidos, escolheram-no para seu capitao, pelo que mereceu ser feito principe deles. E foi de tanta virtude, mesmo na fortuna de privado™, que 0s que escrevem sobre ele dizem: quod —136 | XIV Quod principem deceat circa militiam O QUE CONVEM A UM PRINCIPE NO RESPEITANTE A MILICIA Deve, pois, um principe nao ter outro objective, nem outro pens: mento, nem tomar coisa alguma por sua fora a guerra e suas ordens e disciplina. Porque essa 6 Ginica arte que se espera de quem comanda, e € de ta- manha virtude que nao sé mantém aqueles que nasceram principes, como faz muitas vezes os homens de fort una privada treparem a essa graduacdo. E inversamente, vé-se que, quando os principes pensaram mais nas delicias que has armas, perderam o seu estado. E a primeira causa que te faz perdé-lo € negligenciar esta arte, e a causa que te faz adquiri-lo é ser mestre desta arte. Francisco Sforza, por estar armado, de privado tornou-se duque de Milio; os filhos, por fagirem aos incémodos das armas, de duques tornaram-se privados. Porque, entre outras causas de mal que te acarreta, 0 estar desarmadlo faz-te desprezivel, 0 que 6 uma daquelas mas famas de que o principe se deve guar- dar, como adiante se dird, Porque entre alguém armado fio, no € alguém desarmado nao ha qualquer propors: —1a1 € légico que quem esta armado obedeca de bom grado a quem esta desarmaco e que o desarmado esteja seguro en- tse servidores armados. Porque, existindo num deles dles- dém ¢ no outro suspeigao, nao € possivel que actuem bem em conjunto. E por isso um principe que nao entenda da mnilicia, além de outras infelicidades, como disse, nao pode ser estimado pelos seus soldados nem fiar-se neles. Jo deve, portanto, levantar jamais o pensamento deste exercicio da guerra; ¢ na paz deve exercitar- se ainda mais do que na guerra, 0 que pode fazer de dois modos: um, com as obras; outro, com a mente. E, quanto as obras, além de ter bem ordenados e exercitados os seus, deve andar sempre em cagadas: habituar através elas 0 corpo aos incémodbos e, entretanto, aprender a natureza dos solos, conhecer como se erguem os montes, como desembocami os vales, como se estendem as plani- cies, entender a natureza dos rios e dos pauis, ¢ por nisto andissimo cuidado. Este conhecimento é ttil de dois modos: prim 10 seu territ6rio, ro, se aprender a conh pode entender melhor as defesas do mesmo; depois, atra- vés do conhecimento ¢ da pratica desses solos, compreen- der com facilidade qualquer outro solo novo que Ihe seja necessatio inspeccionar. Porque os outeiros, os vales, as plantcies, 0s rios, 05 pauis que existem, por exemplo, na Toscana tém com os das outras provincias certa semethan- a, de tal mancira que do conhecimento do solo de uma provincia se pode facilmente chegar ao conhecimento do: outros. E ao principe a quem falta esta pericia falta-lhe o principal do que deve ter um capitio, porque ela ensina~ lea encontrar o inimigo, arranjar alojamentos, dirigit os exércitos, ordenar as batalh: sitiar as terras com vanta- gem wa. lot tempos ra. Eq amidde naquel nosso € poderia nés quit se retire Ihes, a dem o¢ corrobe destas ¢ os exére tivesse « Mi ci dos hor rolas, [ bretude tenha s pre dia Alexanc quanto tidade, era con por Xer vom grado a a seguro en. n deles des actuem bem entenda da se, nao pode eles. oe mento € exercitar- de fazer de 1 mente. E, exercitados uuar através aprender a os montes, m as planf- € por nisto itil de dois iterritério, epois, atra- compreen- ue Ihe seja >s vales, as semplo, na semelhan- lo de uma imento dos falta-lhe 0 ela ensina- 5, dinigir os som vanta AFilopémen, principe dos aqueus, entre outros louvores que os escritores Ihe fizeram, esta que nos tempos de paz nunca pensava sendo nos modos da guer- ra. E quando estava no campo com os amigos parava amitide ¢ discutia com eles: «Se os inimigos estivessem naquela colina ¢ nés nos encontrassemos aqui com o nosso exército, quem de nés teria vantagem? Como se poderia, conservando a ordem, ir-Ihes a0 encontro? Se nés quiséssemos retirar, como terfamos de fazer? Se eles se retirassem, como terfamos de segui-los?» E propunha- nes, andando, todos os casos que mum exército po- dem ocorrer, escutava a opinido deles, dizia a sua e corroborava-a com razées, de tal maneira que, por meio destas continuas cogitagées, nao podia jamais, ao guiar 08 exércitos, nascer imprevisto algum para o qual ele nao tivesse o remédio, Mas, quanto ao exercicio da mente, deve 0 prin- cipe ler as histérias e nelas considerar as accées dos homens excelentes, ver como eles se governaram nas guerras, examinar as causas das suas vitérias e der- rotas bretudo fazer como fez no passado qualquer homem imitar alguém que antes dele , para poder fugir a estas ¢ imitar aquelas; ¢ so- excelente que se propés tenha sido louvado € glorificado ¢ de quem teve sem- pre diante de si os gestos e as acces: como se diz que Alexandre Magno imitava Aquiles; César, Alexandre; Cipitio, Ciro. Quem quer que leia a vida de Ciro escrita por Xenofonte reconhecera depois na vida de Cipiéo quanto essa imitagio Ihe trouxe gléria € quanto, na cas- ade, Cipiao tidade, afabilidade, humanidade e liberali¢ era conforme aquelas coisas que de Ciro foram escritas por Xenofonte. So estes modos assim que deve observar um principe sabio; ¢ nunca em tempos de paz estar ocioso, mas com indliistria fazer deles capital de que se possa valer na a fim de que adversidad 1 fortuna, quando se modificar © encontre preparado para Ihe resist Reste dew amigos. F ceio que, mormente dens dos « coisa que que nao verdade se deveria e se de aspectos mente en ar um principe tar ocioso, mas possa valer na lo se modificar XV De his rebus quibus homines et praesertim principes laudantur aut vituperantur AS COISAS PELAS QUAIS OS HOMENS E PRINCIPALMENTE OS PRINCIPES SAO LOUVADOS OU VITUPERADOS Resta agora ver quais devem ser os modos e governos de um principe, quer com os stibditos, quer com os amigos. E porque sei que muitos escreveram sobre isto, re- ceio que, escrevendo também eu, seja tide por presuingoso, mormente por me afastar, ao debater esta matéria, das or- dens dos outros. Mas, tendo a minha intengio sido escrever coisa que s veniente ir atras da verdade efectiva da coisa do que da sua ja titil a quem a escute, pareceu-me mais con- imaginacio. Muitos imaginaram reptblicas € principados que nao foram jamais vistos nem se soube se existiram de verdade, Porque é tanta a distancia de como se vive a como se deveria viver, que aquele que deixa o que se faz por aquilo que se deveria fazer, mais depressa conhece a sua rufna do que a sua preservagao: porque um homem que em tocos os aspectos queira fazer profissio de bom arrufna-se forgosa- mente entve tantos que no si0 bons. Donde, € necessatio, tes. maguiaven querendo-se um principe manter, aprender a poder ser nao bom ¢ usé-lo ¢ nao usa-lo consoante a necessidade Deixando, pois, de lado as coisas imaginadas acerca de um principe, e discorrendo sobre aquelas que so ver dadeiras, digo que tados os homens, quando se fala deles, mormente 0s principes, por estarem postos mais alto, sio referidos por algumas desta qualicades que Ihes acarretam censura ou louvor. E assim é que um € tido por liberal, outro por mesquinho — para usar um termo toscano, porque ava ro na nossa lingua é também aquele que por rapina deseja possuir, 20 pa 80 que mesquinho chamamos nds ao que se abstém demasiado de usa 0 se um € tido por dador, 0 outro por rapace; um por cruel, 0 outro por piedoso; um traidor, 0 outro fiel; um efeminado € pusilanime, 0 outro feroz e corajoso; um humano, o outro arrogante; um lascivo, © outro casto; um integro, 0 outro astuto; um duro, 0 outro transigente; um ponderado, 0 outro ligeito; um religioso, © outro incrédulo, ¢ assim por diante. Eu sei que qualqui um admitiré que seria coisa muito louvével encontrar-se tum principe com toclas aquelas das supracitadas qualidades que sao tidas por boas. Mas porque nao se pode té-las to- das, nem observar teiramente, pelas condigdes humanas que nao o consentem, é necessdrio ele ser tio prudente que saiba fugir & ma fama dos vicios que Ihe tirariam o estado ¢ guardar-se daqueles que nao Iho tiram, se the € possivel: mas, sendo impossfvel, pode-se aqui com menos escrtipulo deixar andar. E também nao se preocupe de incorrer na ma fama daqueles vicios sem os quais dificilmente pode salvar o estado, Porque, tudo bem considerado, encontrar-se-A algu- ‘ma coisa que parecerd virtude e que, seguindo-a, seria a sua nufna, ¢ alguma outra que parecerd vicio € que, seguindo-a, dela nasce a sua seguranca € bem-estar Comecane lidades, d entanto a liber por tal, ofende como se deve u 1nd fama do sev tre os homens de lado nenhu neira que um } semelhantes ob por fim, se quis extraordinariar todas as coisas que comecara ¢ prezado por ca que, tendo con premiado pouc riclita a qualqu: De crudelitate et pietate; et an sit melius amari quam timeri, vel ¢ contra A CRUELDADE E A PIEDADE; E SE E MELHOR SER AMADO QUE TEMIDO GUO CONTRARIO Descendo seguidamente &s outras qualiciades ja adu- zidas, digo que todo © principe deve desejar ser tido por piedoso e nao por cruel; no entanto, deve prestar atengio para nao usar mal esta piedade. Gésar Bérgia era tido por cruel; no entanto, essa sua crueldade tinha recom- posto, unido e reduzido & paz ¢ & fidelidade a Romanha. que ele foi muito mais Se se considerar isto bem, vet piedoso que 0 povo florentino, o qual, para fugir a0 nome de cruel, deixou destruir Pistoia, Deve, portanto, um prin- cipe nio se preocupar com a mA fama de cruel para manter 105 seus stibditos umidos e fiéis, visto que com pouquissimos exemplos ser mais piedoso do que aqueles que por dema- siada piedade deixam prosseguir as desordens, dle que nas: cem morticinios ou rapinas. Porque estas costuniam ofen- as execugdes der uma comunidade™ inteira, a0 passo qui ro1 waquiaver que vém do principe ofendem um particular: B, entre todos os p de cruel, por estarem os estados novos repletos de peri- rincipes, ao principe novo é impossivel fu P ao nome: 808. Diz Virgilio pela boca de Dido: Res dura et vegni nowitas me lalia cogunt/ moliri et late fines custode tueri®, No e nto, deve ser ponderado no crer € no movimentar-se, nao ter medo de si mesmo e, temperado pela prud rncia ea hu- manidade, proceder de modo que a demasiada confianca nao o faca incauto e a demasiada desconfianca nao o torne intolerdvel Daqui nasce uma disputa: € melhor ser amado que temido, 0 0 contrario? A resposta é que se quereria ser uma coisa ¢ outra, mas, uma vez que é dificil acumulé- -las, € muito mais nro ser temido do que amado, se tiver de faltar uma delas. Porque dos homens pode-se dizer que, no geral, sao ingratos, voltiveis, simuladores dissimuladores, arredios aos perigos, avidos do lucto; € enquanto Ihes fazes bem eles so todos teus, oferecem-te © sangue, os bens, a vida e os filhos, como disse acima, quando a necessidade esta distante; mas, quando esta se aproxima de ti, revoltam-se, ¢ aquele principe que se fundou totalmente palavras del despido de outros preparos, 8s, encontrando-se rruina-se. Porque as ami- zades que se adquirem por compra, e nao por grandeza € nobreza de animo, recompen: sam-se mas ndo se rém Os homens tém menos eserfipulo em ofender um que se faz amar do que um ©, a prazo, nao se podem paga que se faz temer, porque © amor é mantido por um vin- culo de obrigacio, o qual, por os homens serem ruins, a qualquer ocasido de interesse proprio é rompido, ao Passo que o temor é mantido pelo medo a pena, que nao te abandona jamais. Deve, né modo q Porque ele pc do e nao odi: ver dos bens mulheres del contra o sang tifieacéo com. do, abster-se esquecem ma patriménio; ¢ nao faltam me nas encontra outros; ao inv faltam mais d Mas quar de govert necessario nac sem esse nom posto a algum Anibal, conta. de homens de bater em terra nem entre el na sua boa fort sendo da sua « com a sua inf seus soldados, para fazer aqu tavam, E os au um lado esta s motivo dela ular. E, entre todos sivel fagir ao nome s repletos de peri- dura et regni novitas tueri®®. No entanto, mentar-se, ndo tet prudéncia e a hu- masiada confianca afianga nZo o torne ror ser amado que a é que se quereria e é dificil acumulé- do que amado, se s homens pade-se veis, simuladores € vidos do lucro; € steus, oferecem-te como disse acima, mas, quando esta uele principe que es, encontrando-se se. Porque as ami- nao por grandeza mas no se tém omens tém menos amar do que um untido por um vin- mens serem ruins, vio rompido, ao do & pena, que nao se temer de Deve, nao obstante, o principe faze! lio. modo que, se nao adquire 0 amor, fuja do Porque ele pode muito bem ser ao mesmo tempo temi- do € nao odiado, 0 que alcangara sempre que se absti- ver dos bens dos seus cidadaos, dos seus stibditos ¢ das mulheres deles; e mesmo que Ihe seja preciso proceder contra o sangue de algum, fazé-lo quando houver jus- tificacho conveniente e causa manifesta. Mas, sobretu- do, abster-se dos bens dos outros, porque os home esquecem mais depressa a morte do pai que a perda do patriménio; depois, os motivos para Ihes tirar os bens nao faltam nunca, e aquele que comeca a viver de rapi- nas encontra sempre motivos para ocupar o que é dos angue eles sio mais raros e outros; ao invés, contra 0 faltam mais depressa Mas quando o principe esta com os exércitos e tem a multidao dos soldados, entao é de todo de govern: necessario no se preocupar com o nome de eruel, porque sem esse nome no se tem jamais exército unido dis s admiraveis accdes de posto a alguma operacio. Entre a ntbal, conta-se que, tendo um exército enorme, mescla de homens de uma infinidade de nagées levados a com- bater em terra alheia, jamais af surgiu alguma dissensio, nem entre eles, nem contra © principe, tanto na ma como na sua boa fortuna, O que nao pode nascer de outra coisa sendo da sta desumana crueldade, a qual, em conjunto com a sua infinita virtude, 0 fez sempre, aos olhos dos seus soldados, digno de veneracio € terrivel; e, sem el: para fazer aquele efeito, as outras suas virtudes nao bas- tavam. E 0s atitores, pouco judiciosos nisto, admiram por um lado esta sua acca, por outro condenam o principal motive dela waquiaver Que seja vertlade que as outras suas virtudes nao te- riam bastado, pode-se avaliar por Cipiao, excepcional néio s6 no seu tempo mas em toda a histéria das coisas que se sabem, cujos exércitos se rebelaram em Espanha, 0 que nao nasceu de outra coisa sendo da sua demasiada pieda- de, a qual havia dado aos seus soldados mais licenga do que convinha & disciplina militar. Isto mesmo Ihe censurou no senado Fabio Maximo, que Ihe chamou corruptor da mi- licia romana. Os locrenses, tendo sido destruidos por um. delegado de Cipido, nao foram vingados nem foi por ele punida a insoléncia desse delegado, tudo fruto daquela sua ném, querendo-o desculpar no senado, disse que havia muitos homens que i at natureza transigente, De tal modo que alg sabiam melhor nao errar do que punir os ervos. Semelhante natureza teria, com o tempo, manchado a fama ea gloria de Cipiio, se ele tivesse com ela perseverado no império; mas, vivendo ele sob o governo do senado, esta sua danosa qualidade nao s6 se ocultou, como Ihe trouxe gléria. Coneluo, pois, voltando ao ser temido e amado, que amando os homens a gosto deles e temendo a gosto do principe, deve um principe sAbio fundar-se naquilo que € seu € no naquilo que € dos outros; deve somente por engenho em furgir do édio, como se disse, p SER V Quao lou. dada e viv quer um 0 ente nosso tempo te que tiveram en m, com a astt no fim superar de. Deveis, pc um com a prio do homen meiro muitas v do, Portanto, ¢ a besta € 0 hor pes veladamen como Aquiles ¢ virtudes nao te- ‘ido, excepcional ia das coisas que Espanha, 0 que emasiada pieda is licenca do que Ihe censurou no orruptor da mi- strafdos por um nem foi por ele sito daquela sua ém, querendo-o tos homens que ros. Semelhante fama e a gloria do no império: esta sua danosa xe gloria, > e amado, que, mendo a gosto se naquilo que fe somente por XVIII Quomodo fides a principibus sit servanda DE QUE MODO DEVE SER MANTIDA PELOS PRINCIPES A PALAVRA DADA. Quao louvavel seja num principe o manter a palavra dada ¢ viver com integridade e no com asticia, qual- quer um 0 entende. No entanto, vé-se pela experiéncia do nosso tempo terem feito grandes coisas aqueles principes que tiveram em pouca conta a palavra dada € que soube- ram, com a astiicia, dar a volta aos cérebros dos homens; e no fim superaram aqueles que se findaram na sincerida de. Deveis, pois, saber que ha dois géneros de combate: um com as leis, outro com a forca. O primeiro é pré- prio do homem, o segundo das bestas. Mas porque o pr meiro muitas vezes nao basta, convém recorrer a0 segun- do, Portanto, é necessério a um principe saber bem usar a besta € 0 homem. Este aspecto foi ensinado aos prin pes veladamente pelos autores antigos, os quais descreves como Aquiles e muitos outros dos antigos principes foram -195— HAQUIAVEL dados a criar ao centauro Quiron, para que os tutelasse sob a a disciplina. O que nfo quer dizer outra coisa ter por preceptor alguém meio besta ¢ meio homem — sendo que € preciso a um principe saber usar uma e outra natureza: € uma sem a outra nao dura. Estando, pois, um principe necessitado de saber usar bem a besta, deve pegar na raposa € no leo: porque o leo nao se defende das armadilhas, a raposa nao se de- fende dos lobos; precisa, pois, de ser raposa para conhecer as armadilhas e leo para assustar os lobos. Aqueles que se atém simplesmente ao ledo nao entendem isto. Nao pode, portanto, um senhor prudente, nem deve, observar a pala- ra dada quando tal observancia se volta contra ele e se ex- tinguiram os motivos que o fizeram prometer. E, s€ os ho- mens fossem todos bons, este preceito nao seria bom. Mas, porque eles sfo ruins e nao a observariam para contigo, tt também nao a tens de observar para com eles; nem faltaro jamais a um principe motives I imos para mascarar a inobservancia. Sobre isto, poder-se-iam dar infinitos exem- plos modernos ¢ mostrar quantas pazes, quantas promessa ficaram frritas € vas pela falta de palavra dos principes: ¢ aquele que melhor soube usar a raposa foi quem melhor se saiu. Mas esta natureza € necessdrio sabé-la mascarar bem nde simulador e dissimulador: e sio tao simples e ser os homens, obedecem tanto as necessidades presente \e engana encontraré sempre quem se deixe que aquele nar, Dos exemplos recentes, ha um que eu nao quero si- lenciar, Alexandre VI ndo fez jamais outra coisa, nao pensou jamais em outra coisa sendo em enganar homens, € sempre encontrou substrato para o poder fazer: E no how: —196— ve jamais um ly var € que afirms observasse; no € conforme desej mundo, Aum prit todas as s necessirio pare tendo-as € obse recendo té-las, mano, integro, de modo a que tomar-te 0 cont cipe, emormen das aquelas cois bons, estando « de actuar contr a humanidade, ele tenha um at da fortuna ea acima disse, né entrar no mal, Deve, pois saia jamai das supracitada ele pareca todo todo humanids mais necesséic Os homens em indos, porque o véem aquilo qi que os tutelasse sob vutra coisa ~ ter por omem ~ senao que € outra natureza: € sitado de saber usar ae no leao: porque a raposa nao se de- posa para conhecer bos. Aqueles que se em isto. Nao pode, vve, observar a pala a contra ele e se ex- ometer. E, se 0s ho- ao seria bom. Mas, am para contigo, tu neles; nem faltarao os para mascarar a dar infinitos exem- quantas promessas rra dos principes: € foi quem melhor se bé-la mascarar bem re sio tio simples sssidades presentes, apre quem se deixe ue eu no quero si ais outra coisa, néo enganar homens, € ler fazer. Endo hou- waguiaver fe jamais um homem que tivesse maior eficdcia no asseve- rar e que afirmasse com mais juras uma coisa, que menos a observasse; no entanto, os embustes resultaram-lhe sempre conforme desejava, porque conhecia bem este aspecto do mundo, Aum principe nao & pois, necessério ter de facto todas as supracitadas qualidades, mas € realmente scessdrio parecer t@-las; atrever-me-ei, alids, a dizer isto: tendo-as ¢ observando-as sempre, elas sto danosas, e recendo té-las, so titeis, como parecer piedloso, fiel, hu- mano, integro, religioso, e sé-lo, mas ter 0 Animo edificado de modo a que, precisando de nao ser, tu possas ¢ saibas tomar-te o contrdrio. E tens de entender isto, que um prin- cipe, e mormente um principe novo, nao pode observar to- das aquelas coisas pelas quais 0s homens so chamados de bons, estando amitide necessitado, para manter o estado, de actuar contra a palavra dada, contra a caridade, contra a humanidad , contra a religido. E por isso € preciso que oa virar-se consoante os ventos ele tenha um Animo dispos e, tal como da fortuna ea variacio das coisas Ihe mand acima disse, nfo se afastar do bem, se puder, mas saber entrar no mal, se necessitado. Deve, pois, um principe ter grande cuidado nao Ihe saia jamais ca boca uma coisa que nao esteja repleta das supracitadas cinco qualidacdes; € que, a0 uv ele pareca todo piedade, todo fidelidade, todo integridad todo humanidade, todo religiao. E nao ha coisa que seja lidade mais necessirio parecer ter do que esta tiltima qu Os homens em geral julgam mais pelos olhos que pelas aos, porque 0 ver toca a todos, sentir toca a poucos: todos véem aquilo que tu pareces, poucos sentem aquilo que tu 197— é i € esses poucos nao se atrevem a opor-se opinido dos muitos que tm a majestade do estado que os defenda. Nas accdes dle toclos os homens, ¢ mormente dos principes, em que ndo h4 wm tribunal para onde reclamar, olha-se € ao resultado. Faca, pois, um principe por vencer € por manter 0 estado: os meios serao sempre julgados honrosos por todos serao louvados, porque o vulgo prende-se € com © que parece ¢ com o desenlace das coisas. E no mundo no existe seniio vulgo, pois os poucos nao tém aqui higar quando os muitos tém onde se apoiar. Certo principe dos tempos actuais, cujo nome nao convém dizer, nunca prega outra cois: senio a paz ea palavra dada, e tanto de uma como de ontra ¢ inimicissimo. E uma e outra, se as tivesse observado, ter-Ihe-iam por mais de uma vez tirado quer a repulacio quer o estado. DC Mas come se faz met outras quero d geral: que o pr em fugir aquels e todas as vere: encontraré nas, bretudo 0 faz 0 pador dos ber se deve abster nao se tira ner 86 se tem dec se refieia de m desprezivel € 5 pusilanime, irr guardar como suas acces se fortaleza; quer ores que em Ttélia per- ‘omo o rei de Napoles, ~se-4 neles, primeiro, pelos motivos que ja depois, ver-se-4 que rimigos ou, precaver-se dos gran- perdem estados que n exército em campo, lesandre mas aquele © tinha muito estado os € da Grécia, que 0 tar que sabia cativar 0 stou mais anos a guer- > dominio de algumas , que estiveram mui- acusem, por té-lo de- Joléncia. Com efeito, ‘os pensadlo que estes comum dos homens, -mpestade -, quando yensaram em fagir € € 0s povos, fartos da ma chamar. Uma tal € realmente um mal esse; porque nao se evante. O que ou nao eguranga para ti, por rde ti; € $6 sao boas, fesas que dependem XXV Quantum fortuna in rebus humanis possit et quomodo illi sit oceurrendum QUANTO PODE A FORTUNA NAS COISAS HUMANAS E DE QUE MODO SE DEVE FAZER-LHE FRENTE Enao me € desconhecido que muitos tiveram ¢ ém_ vin as do mundo sao de tal modo opiniio de que as c je 08 Homen nem tém, alids, into, julgo pe de_metade das wiaquiaver Nios ruinosos que, quando se irritam, alagam as plantcies derrubam as drvores ¢ 0s edificios, levam terreno de um lado, poem-no no outro: cada um foge adiante d 8, todos cedem ao seu imp 10, sem se Ihes poderem opor em parte alguma. E, se bem que eles sejam assim feitos, daf nao re- sulta que os homens, quan estilo ter tranquilos, nao possam tomar providéncias, quer com amparos, quer com I » dle modo que, crescendo depois, eles se encami- nhem por um canal ou o seu impeto nao seja tio danoso nem (do desenfreado. Acontece de modo semelhante com demonstra ordenada virtude para the resist sua poténcia onde nao es i, ela volta os seus imps s para onde sabe que nao estio feitos os acudes nem 0s amparos para a ¢ ter. E, se v6s considerardes a Itélia, le destas modificagdes ¢ a que as pds em marcha, yereis que é um campo sem acudes e sem qualquer amparo. te virtde, Porque se ela estivesse amparada por convenien como estéo a Alemanha, a Exspanha e a Franca, esta cheia ow no teria feito as grancles modificagdes que fez, ou nem E com isto « teria vindo para spero ter dito o bastante getanto a opor-se & fortuna, no gera Mas, restringindo-me mais as particularidades, digo que se vé este principe te sucesso" hoje e arruinas amanha, sem o ter visto mudar a natureza ou alguma qua- © que aio nascer, primeiro, dos motives que atras ente expostos, isto é que o principe que e na fortuna, assim que ela muda, arruina- se, Creio també m que seja bem-sucedido aquele cujo moclo le proceder condiz com a qualidade dos tempos e, de modo hante, que seja mal-sucedido aquele de cujo proc 05 tempos discordam. Porque se ve os homens, nas coisas ‘onduzem ao fim que cacla um tem diante, isto &, glé- 33— via e riquezas, iro com impe um com pacii com estes dst dle dois cautel €, de modo se pendores dist 0, © que no tempos, que ¢ Daqui nasce as mente, sunten: ums leva por de também a com cauitela é niGaS Gus o's iilas) Se oF fey le no miles iene pred na6 Se pode d Sa taba | eaininhar por Bom sair dela. ele Etempo di dat, ar tempos e com O papa petuosan conformes ae: um fim feliz. ¢ ade Bolonha, Zianos, nio ag Franga, tinha ¢ . alagam as planicies, Jevam terreno de um adiante deles, todos dlerem opor em parte sim feitos, daf nao re smpos tranquilos, no n amparos, quer com pois, eles se encami- ) nao seja tio danoso todo semelhat icia onde nao es af, ela volta os seus + feitos os agudes nem onsiderardes a Itélia, tue as pés em marcha, 2m qualquer amparo. conveniente virtude, 4 Franga, esta cheia Ges que fez, ou nem ro ter dito o bastante articularidades, digo > hoje € arruinar-se reza ou alguma qua- os motiv 1S que atrés 1e 0 principe que se ela muda, arruina- Jo aquele cujo modo s tempos e, de modo ele de cujo proceder homens, nas coisas m diante, isto é, gl6- ria € riquezas, procederem variamente: um com cauiela, ou a, outro com arte; iro com impetuosidade; um pela viol ia um, um com paciéncia, outro com o seu contrario; ¢ ca e também, com estes distintos modos, pode ld chegar. E de dois cautelosos, um atingir 0 seu designio, o outro nfo; €,de modo semelhante, terem igualmente sucesso dois com penclores distintos, sendo um cauteloso ¢ outro impetuo- 80, 0 que néio nasce de outra coisa senao da qualidade dos tempos, que se conformam ou nao com o proceder deles. Daqui nasce aquilo que eu disse, que dois, actuando distinta e, surtem o mesmo efeito; e dois, actuando igualmente, uum leva por diante o seu fim € © outro nao. Disto depen- de também a modificagéo do bem; ‘ nid Gue 6 seu GoveTTIO Sea Bait, Cle val tendo sucesso; com cautela € pacigiitia € OF tempos © as coisas giram de is, Se 08 eipas Eas Coikas SS mudam, arruina-se, porque ele nao imtida 6 MASAO de proceder. E nko se enconwa h nie tio prtidente que se saiba acomodar onque no se pode desviar daquilo para que a natureza o inclina, seja tanibein poigie, tendo alguém prosperado sempre a aminhar por uma vid, H&6 86 pode persuadiclo de que seja bon sair dela. E por is50 6 homem cauteloso, quando para ale tempo de passar A impernosidade, nio 0 sabe fazer dai, arruina porque, se se mudasse de natureza com os tempos € com as coisas, nfo se mudaria de fortuna papa Jiilio TT procedeu em todas as suas acgdes im- petosamente € encontrou os tempos ¢ as coisas to IF conformes a esse seu modo dle proceder mpre surtiu um fim liz. Considere-se a prime a empresa que ele fez, a de Bolonba, vivia ainda my r Jodo Bentivogli. Aos vene- zianos, nao agradava; ao rei de Espanha, tio-poucos com es sobre tal empresa. E ele, no en- Franga, tinha conversag 2a3— maquiaver tanto, coma sua ferocidade ¢ impetuosidade, movimentou- -s€ pessoalmente para aquela expedic&o. Tal movimento deixou suspensos e paralisados a Espanha e os venezianos, estes por medo, aquela pelo de que tinha de recuperar todo 0 reino de Napoles; por outro lado, arrastou atras de sio rei de Franca, porque, vendo-o este rei movimentar € desejando fazé-lo seu amigo para rebaixar os venezianos, Julgou nao poder-Ihe negar os seus exéreitos sem mani- festamente 0 injuriar. Com 0 seu movimento impetuoso, Jillio levou, pois, por di te © que jamais outro pontifice, com tocla a humana prudéncia, teria levado, Porque, se ele espe se para sair de Roma com os acordos firmados ¢ todas as coisas ordenadas, como qualquer outro pontifice teria feito, jamais teria tido éxito, porque o rei de Franca teria tido mil desculpas e os outros ter-Ihe-iam metido mil hn dos. Quero deixar ficar as suas outras accées, que foram todas nelhantes € todas Ihe correram bem. Ea brevida- de da vida nio Ihe deixou sentir 0 contrério; porque, se tivessem sobrevinclo tempos em que fosse preciso proceder com cautela, seguir-se-ia dai a sua ruina: nao se teria ja- mais desviado daqueles modos para os quais a natureza 0 inclinava Concluo, pois, que, modificando a fortuna os tempos € estandlo os homens obstinados nos seus modos, so bem-sucedidos enquanto estes e aqueles concordam e mal- -sucedidos quando eles discordam. Eu julgo realmente isto, que seja melhor ser impetuoso que cauiéloso, porque a for- tuna'éitlher e é necessario, querendo-a ter debaixo, vergé “Wee acometé a. E vé-se que ela se deixa vencer mais por estes que por aqueles que procedem friamente, , por isso, como mulher, é sempre amiga dos jovens, porque so menos cautelosos, mais ferozes ¢ mand lam nela com mais audécia, ~234— Considera © pensand corriam tempo. existia matéria de the introduz universo dos he coisas a favor d guma vez houve disse, era neces que 0 pove de conhecer a grat tivessem oprimi que os ateniense querendo conhe necessario que a

You might also like