You are on page 1of 16
ESTUDOS A MORTE DAS FADAS: A LENDA GENEALOGICA DA DAMA DO PE DE CABRA Luis Krus MALATESTA E O ANARQUISMO PORTUGUES Joao Freire CORPORATIVISMO E INDUSTRIALIZACAO: ELEMENTOS PARA 0 ESTUDO DO CONDICIONAMENTO INDUSTRIAL J. M. Brandao de Brito OS MONARQUICOS E O ESTADO NOVO DE SALAZAR Manuel Braga da Cruz «MISSIONARIOS NUM BARCO A REMOS»? MODOS ETNOLOGICOS DE CONHECIMENTQ COMO DESAFIO A HISTORIA SOCIAL Hans Medick CRITICAS E_DEBATES. A IDEOLOGIA DO FASCISMO REVISITADA: ZEEV STERNHELL E OS SEUS CRITICOS. Antonio Costa Pinto COMUNITARISMO, ESTRATIFICACAO SOCIAL E RELACOES DE PARENTESCO Albert Silbert Malatesta e o anarquismo portugués Joao Freire 1. O principio ‘A ascensio da Internacional em Portugal fora tao rapida como a sua queda. As primeiras experiéncias de luta aberta, politica e econmica, contra o regime burgués; a divisdo entre centralistas e anti-autoritérios que percorreu toda a Internacional; ¢ outras causas de enfraquecimento especificamente portuguesas — tiveram como consequéncia que, bem depressa, as ideias da Internacional apenas ficassem institucionalmente representadas em Portugal pelo socialismo politico marxizante Durante uma quinzena de anos apés a visita de Lorenzo, Mora e Morago, a presenga publica da tendéncia bakuninista é praticamente inexistente, se bem que existam militantes ¢ tentativas de organizacdo — porém com escassos resultados E decididamente apés a visita de Elisée Reclus a Lisboa, em 1886, que o entusiasmo renasce, se formam grupos, publicam-se jornais, cresce a agitacao. Desde ai, pode considerar-se que se trata jé, claramente, de um movimento anarquista, aut6nomo e perfeitamente independente da corrente marxizante, consciente de si, dos seus objectivos ¢ dos seus adversarios. No plano ideoldgico, é um anarquismo comunista, teorizado na época por Kropétkine e veiculado por um jornal como Le Revolté que tinha em Reclus uma das suas principais figuras. No plano sociolégico, tanto quanto pode saber-se, os militantes anarquistas desta primeira geragao sao predominantemente urbanos — porém ja com uma distribuicéo geografica que permite falar, desde 0 inicio, em implantagao na- cional, e nao apenas focalizada em Lisboa ou Porto. Do ponto de vista ocupa- “cional, parece haver uma mistura curiosa de produtores independentes (sapatei- 10s, alfaiates, etc.), de operarios fabris e oficinais (metaliirgicos, tabacos), de pequenos empregados (de escritério, etc.) e de intelectuais, pequenos-burgue- ses e profissdes liberais. Finalmente, no ha quase noticia de mulheres nestes primeiros grupos militantes. 1 JOAO FREIRE — LS.C.T.E. (AREA DE SOCIOLOGIA DO TRABALHO); ARQUIVO HISTORICO-SOCIAL. presente texto foi extraido e adaptado de uma comunicagéo intitulada «Influéncias Malates- tianas em Portugal, apresentada ao Coléquio de Estudos sobre Errico Malatesta, realizado em Mildo em Setembro de 1982, por ocasiao do 50.° aniversirio da sua morte M@ Ler Historia N.6 1985 35 1 Malatesta Entre 1886 e 1896 terdo existido cerca de 40 grupos anarquistas ¢ uma vintena de publicagdes propagandisticas, as mais importantes das quais foram A Revolucdo Social, A Revolta e A Propaganda. A «propaganda pelo facto» chegou igualmente até nés, justamente com a discussao sobre o papel central que os operarios (0 movimento operirio) deve- ria, ou nao, desempenhar na revolugao social. H4 algumas violéncias (meno- res, quando comparadas com outros paises, no mesmo momento), mas sobre- tudo uma grande violéncia verbal. Como quer que seja, 0 anarquismo preo- cupa as instituigdes da monarquia constitucional, que fazem contra ele passar medidas repressivas, sobretudo a famosa lei de 13 de Fevereiro de 1896, onde © simples propagandear do anarquismo é criminalizado e passivel de deporta- cdo para Timor. Esta represséo faz certamente quebrar o tipo de desenvolvimento dos gru- pos e da agitacéo da década anterior mas, sobretudo, ao forcar 0 tempo de uma certa reflexao, vai fazer alterar a estratégia. Por volta do fim do século (e tal como em Franca), os anarquistas portugueses voltam de novo a preocupar- -se prioritariamente com as associagdes de resisténcia operaria, com os sindi- catos, procurando sacudir 0 controlo que sobre elas exercia 0 partido socia- lista, € a sua letargia. Mas, simultaneamente, abria-se também uma fase de aproximago com o revolucionarismo republicano, em forte desenvolvimento — 0 que é uma particularidade do caso portugués. Esta nova estratégia canalizou para o derrube revolucionério da monarquia © potencial «violentista> existente e lancou, por outro lado, as bases de uma influéncia decisiva que os libertarios viriam a conseguir no movimento operi- rio. E certo que houve tensdes e por vezes rupturas entre as duas vias (cujos protagonistas eram tratados, na giria, de «intervencionistas» e «puristas», res- pectivamente). Mas, a distancia, os resultados podem ser julgados francamente positivos: por um lado a monarquia caira pela insurreicao de Outubro de 1910, onde © povo urbano desempenhou um papel activo e a accao das carbondrias (anarquistas e jacobinas) se mostrou importante; por outro lado, 0 movimento sindical desenvolvia-se espectacularmente sob 0 impulso e a bandeira dos libertirios. Ja atrés dissemos da influéncia ideolégica de Kropétkine e do anarquismo comunista em Portugal. E curioso, por exemplo, que 0 colectivismo (bakuni- nista) que em Espanha tinha nesta altura tanta forga ainda, nao tenha qualquer presenca significativa entre nés. Mas devemos desde j assinalar 0 facto de, entre os anarquistas-comunistas, Malatesta s6 tardiamente comecar a ser conhecido em Portugal. * Errico Malatesta, italiano, 1853-1932, foi uma das grandes figuras do movimento anarquista histérico. Por um lado, tendo aderido a seccio italiana da 1.* Internacional em 1871, € uma das personalidades que faz a transigio desta época bakuninista do anarquismo, para as fases posterio- res, da grande guerra e das revolugdes proletirias do século xXx. Por outro lado, no. plano ideolégico, rompeu com as concepyes «colectivistas» daquela primeira época para advogar as, so comma oe gs has aga 1 es ERRICO MALATESTA sarn'is'tint : {orto mesmo tempo. Hetres una tara nena te Ure que 0 aisha nom) it “sper i pean ‘ecion © Eafe Mite ‘ow aaene tales 4 noe lin da Boles, 10 de joao de 1911 (Core camara, TLamesto sto peder saison 0 tou denje, Am Malatesta sta & faner tain metiae «a cere oo ‘Crd Fatermaloeat ou eam sada. Te Fad be sen gran Rae cerehoceees oc tae {anval Se Sons ica Capen Ve echo dergoreers ergo tc dori te ties das Eta cata signiativa, vad de tm the mile gla da abject pola ctetataternacenal, foes ponce Salt fees pon pide obtor Oa ide de La BataileSydon Senet famco wacanesr Tite am retrate qe jg nt dle de vezes, em mma» que saben joventude do noen Bografte, iets nay Samara go see sopra dade biograns ise 853: tm porta Batedante de medion, ns 18 anos face ij vale ‘Tern polido snriguecer« ncun iterator de ost iss, dae das noneseidcias uma interpretapdo memes cde. Stperioe qe Ibe al selites doe nose; ‘Tree eile ums larga ¢ moviceniada vida ‘nus preferin sempre a ale torn e samo Bacunine, ganda » ashe, entande Fats ope desoure x slabsrapl pur’ in ds owas. Sp eso, pee weap «| Fins Bicta falar um da com ele para perccber que tee fla conienade, qarndo grants soured idan gina by Taltows cee te eariquece& me revolugao, um «insurreccionalistas, vem, apesar disso, a moderar um tanto o tom deste discurso na fase terminal da sua vida em que, manietado pelo fascismo, reflecte sobre 0 balango das revolugées falhadas (como a da Itlia ou da Alemanha) ¢ sobre 0 amargo sucesso das revoluges vitoriosas mas desviadas e desnaturadas (caso da Rissa). IH © 0 anarquismo portugués 38 & Malatesta Parlamentar no Movimento Socialista sairé em 1914 ¢ 0 Programa Socialista Anarquista Revoluciondrio apenas em 1919. E também significative notar que no melhor livro teérico da nossa produ- cdo nativa, nesta época, Malatesta seja apenas citado, de passagem, como um dos italianos da Internacional, sem qualquer referéncia ao seu papel te6rico® De facto, a introducao do pensamento malatestiano esta estreitamente liga- do & vinda para Portugal de Neno Vasco, apés uma década de permanéncia no Brasil *. Neno Vasco fora para S. Paulo em 1901. Ai dirigiu varios jormais anar- quistas, estreitou lacos com militantes de origem italiana e , A Sementeira, n.° 48, Outubro 1912. '° Significativamente, 0 Comité Confederal da CGT, na sua mensagem aos proletitios de Franca, confessa: «Si ces efforts ne paraissent pas avoir donné ce qui nous étions en droit d'attendre, ce que la classe ouvriére espérait, c'est que les événements nous ont submergé». La Bataille Syndicaliste, Paris, n.° 1193, 2 de Agosto 1914. eo anarquismo portugues 43 1 Malatesta polémica. A 22 de Novembro «Anarquistas esquecidos dos seus principios» de Malatesta; a 29 «A pretensa bancarrota da Intemacional» de Kropotkine; a 13 de Dezembro 0 manifesto dos russos de Genéve «Ao proletariado interacio- nal»; a 27 «Kropétkine e a guerra» de Malatesta; a 10 de Janeiro de 1915 «Duas tendéncias na luta anarquista» de Zisly; a 24 , A Sementeira, n.° 69, Maio 1917. % Ver Joao Freire: «Caducidade © modemidade de Kropétkine: entre reforma € utopia», A Ideia, Lisboa, n.° 20-21, Abril 1981 e Volontd, Mild, n.° 2 / 1981.

You might also like