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Maria da Gloria di Fanti e Leci Borges Barbisan (orgs.) Aracy Ernst Pereira + Diana Pessoa de Barros Dominique Maingueneau * José Gaston Hilgert * José Luiz Fiorin Maria Cecilia Souza-e-Silva * Marlene Teixeira Rosfngela Hammes Rodrigues * Tania Maris de Azevedo Telisa Furlanetto Graeff + Valdir do Nascimento Flores ENUNCIAGAO E DISCURSO tramas de sentidos editoracontexto Copyright © 2012 das Organizadoras Todos os direitos desta edigio reservados & Editora Contexto (Ediora Pinsky Leda) Foto de capa Edouard Manet, La serveuse de bocks (leo sobre tela) Montagem de capa e diagramagio Gustavo S. Vilas Boas Preparagio de textos ‘Maria da Gloria di Fanti e Leci Borges Barbisan, Revisio Daniela Marini Iwamoto Dados Internacionais de Catalogacio na Publicacao (cio) (Camara Brasileira do Livro, sp, Brasil) Fnunciagio e diseruso / organizadoras Maria da Gloria di Fant ¢ Leci Borges Barbisan. ~ Séo Paulo: Contexto, 2012. Vitios autores. Bibliografa, ISBN 978-85-7244-741-6 1. Andlise do discurso 2, Linguistica 1, Fanti, Mana da Glétia di I, Barbisan, Leci Borges. 12-1139 DD-401.41 Indices para catilogo sistemitico: 1, Enunciagéo : Discurso: Linguistica 401.41 2. Estudos enunciativos : Discurso : Linguistica 401.41 Eprrora Conrexto, Diretor editorial: jaime Pinsky Rua Dr. José Elias, 520 — Alto da Lapa (05083-030 — Sio Paulo ~ sp name: (11) 3832 5838 contexto@editoracontexto.com.br worw.editoracontexto.com.br SISTEMAS DE ENSINO: PRODUCAO DISCURSIVA DE SENTIDOS SOBRE A EDUCACAO E O TRABALHO DO PROFESSOR Maria Cecttia SougzeSilva Varias publicages sobre a mercantilizacdo do ensino no Brasil tém sido trazidas a publico principalmente por educadores (Frigotto, 2005; Gentili, 2002; Saviani, 1997) e por alguns linguistas aplicados, mas sio ainda incipientes as pesquisas que se debrucam sobre essa questo do ponto de vista discursivo (Daniele, 2011; Matos, 2010; Mendes, 2008), relacionando-a 4 atividade de trabalho do professor e, inexis- tentes, parece-me, aquelas que fazem a triangulacio dessas questdes com 0 avango da tecnologia. Comegar a pensar essa relacio € 0 objetivo desta reflexdo, que carac- terizo mais como uma proposta dadas suas caracteristicas. Do ponto de vista tedrico, recorro, de um lado, a Krieg-Planque (2009/2010) e Maingueneau (1984/2008), e, de outro, a Fairclough (1996), e, em questdes relacionadas ao trabalho, a Schwartz (1992, 1997) e a alguns de seu comentadores, entre eles, Trinquet (2010). Os disparadores de tal articulacdo foram dois fatos de natureza diferente: a crescente disseminago, nas escolas privadas ¢ publicas, dos chamados sistemas apos- tilados de ensino, com repercussio na midia impressa e eletrdnica, e a traducio, por Salgado e Possenti, do livro de Alice Krieg-Planque (2009/2010) A nocdo de formula em andlise do discurso.* Sistemas apostilados de ensino: parcerias no campo educacional* A expressio sistemas de ensino vinha sendo utilizada até recentemente para desig- nar um grupo de escolas, ou um método de ensino, ou um modo de organizacio e articulacao de instituicGes, orgaos e atividades de educacao e ensino (de municipios, estados, do Distrito Federal ou da Unido), mas, de uns tempos para ca, além desse sentido primeiro, passou a indicar um dispositivo que consiste na produco e venda 118 Enunciagdo e discurso de produtos (material didatico) e servicos (assessoria pedagégica e administrativa impressa e on-line), por parte de instituicdes privadas em um esquema de franquia a escolas conveniadas. Uma caracteristica forte dos sistemas de ensino consiste em forne- cet apoio complementar a escolas e professores por meio de tecnologias educacionais, portal para alunos e educadores, cursos presenciais e a distancia para professores € gestores municipais, assessoria pedagdgica, acompanhamento do desempenho escolar e sistema de avaliacao. A maioria dos sistemas apostilados originou-se dos cursos pré-vestibulares, dos chamados cursinhos, que surgiram, na década de 1950, em decorréncia do aumento de jovens da classe média ascendente que disputava um ntimero reduzido de vagas nas universidades. Na década de 1970, o Anglo-Latino criou a chamada apostilacaderno (primeira designagao para sistemas de ensino?), instrumento que modificou o setor de material didatico nas areas de exatas, biologicas e humanas e estendeu aos primeiros parceiros 0 seu sistema de ensino para vestibulares.* Por volta dos anos 1980, outros cursinhos comesaram também a se transformar em Sistemas. © material elaborado por eles, em formato de apostilas, resumindo trés anos de ensino médio em algumas centenas de paginas, funcionou como fator determinante do seu sucesso inicial. Na década de 1990, acelerou-se a expansio dos sistemas de ensino. Um motivo forte foi a crise das escolas particulares, decorrente, por paradoxal que seja, do estancamento da inflacdo. Até entao, grande parte delas, como parte do préprio marketing, mantinha uma estrutura de alto custo, pagando coordenadores ¢ orienta- dores, que produziam material em apoio aos livros didaticos. Parte desse ganho era aplicado no mercado financeito. No fim dos anos 1990, no entanto, com o controle da inflaco, tais escolas se viram, de stibito, alijadas de parte de seus rendimentos. A crise se instalou no setor é a “importacao” dos sistemas de ensino de outras instituicdes como Anglo, Objetivo, COC; etc. surgitt como solucao, permitindo que as escolas tivessem um quadro mais restrito de funcionarios ¢ evitassem gastos extraordinarios com preparo de material didatico. Na virada do século XX para 0 XXI, os sistemas buscaram mais um mercado, a escola ptiblica:* levantamento junto aos municipios paulistas i ica que, apenas no periodo de 1994-2006, dos 645 municipios, 161 estavam adotando ou tinham adqui- tido os sistemas apostilados (Adriao et al., 2009), levantamento mais recente mostra que esse indice tem aumentado: 44% das cidades paulistas ja estao utilizando os sistemas,’ resultado que confirma o incremento de parcerias entre as administragdes municipais e o setor privado para a consecucio da oferta educacional. Orgaos ligados ao governo nao reagiram, que se saiba, por meio de pegas publicirarias ou de politicas de valorizagao do livro.* Ja os detentores dos Sistemas tém recorrido macicamente a publicidade, tanto em revistas especializadas, como a Nova Escola (Matos, 2010), quanto em jornais de grande circulacao. E as editoras de Sistemas de ensino 119 livros didaticos passaram também a investir na criagio de sistemas de ensino, como & © caso da AticaScipione, controlada pelo grupo Abril, que comprou recentemente © Sistema Anglo, ¢ também da Saraiva, a quarta maior editora de livros didaticos e paradidaticos do Brasil, que lancou, oficialmente em junho de 2010, o Agora Sistema de Ensino para a rede publica, oferecendo linha completa de material didatico para educagao infantil, ensino fundamental ¢ médio. Grupos estrangeitos comecam a entrar nesse mercado. A Pearson, responsivel pelo segmento editorial e de informacao digital que controla o jornal Financial Times, comprou parte do Sistema Educacional Brasileiro (SEB), que compreende quatro das chamadas “marcas”, uma delas voltada apenas para escolas pitblicas. A Pearson. esta em busca de outras aquisigdes e grupos estrangeiros como o britanico Cognita, maior rede de colégios do Reino Unido, e o americano HMH (Houghton Mifflin. Harcourt) tém mostrado interesse em investir no setor.? Esse mecanismo parece estar consolidando, no campo da educagao, as cha- madas fusdes, transformagées ja ocorridas em outros setores da economia, com a integracao dos mercados em escala mundial. O Governo Federal, ainda na época do presidente Luiz Inacio Lula da Silva, pensou em fixar limites para o funciona- mento dos sistemas de ensino, mas recuou com medo de que o mercado educacional brasileiro fosse colocado pela Organizagio Mundial do Comércio (OMC) na mesa de negociagées do Acordo Geral para o Comércio ¢ Servigos." Nesse cenario, e como professora-pesquisadora atuando na interface entre analise do discurso e linguistica aplicada, na linha linguagem e trabalho, encaminho trés quest6es nos proximos itens: Como apreender, discursivamente, os sentidos que circulam sobre os sistemas de ensino? Qual o impacto da tecnologia sobre esse dispositivo? Que saberes priorizar para conhecer o trabalho do(a)s professore(a)s em escolas que adotam tais sistemas? Como apreender, discursivamente, os sentidos da expressao sistemas de ensino?" ‘Uma abordagem discursiva dos fatos sociais implica tomar 0 discurso como objet, analisando-~ € questionando-o segundo conceitos € categorias especificas, no caso, recorrendo a nogio de formula, tal como definida por (Krieg-Planque, 2009/2010, p.9):! “um conjunto de formulagées que, pelo fato de circularem em um momento e um espago publico dados, cristalizam questdes politicas e sociais que essas formulagdes contribuem, ao mesmo tempo, a construir”. Podese, a partir dessa definicdo, dizer que a expresso sistemas de ensino é uma formula? O. 120 Enunciagéo e diseurso fato de tentar apreender os discursos sobre sistemas de ensino como uma sintagma em via de tornarse uma férmula, portanto uma protoférmula, hipétese que levantamos, é um dos procedimentos préprios a anilise do discurso. Parto do principio de que tal sintagma esta adquirindo vida prépria e ja sofre algumas das restrigdes que pesam sobre o estatuto de uma férmula: carater cristalizador, inscri- do em uma perspectiva discursiva, funcionamento como referente social e aspecto polémico (p.9). Retomo cada um deles, sempre com base na autora. ay (2) O carater cristalizador da formula se manifesta pela relativa estabilidade de um significante, identificado por uma materialidade linguistica particular ¢ por miiltiplas pardfrases. Por seu cardter cristalizado, a formula implica certa concisao, é facilmente reconhecivel e, consequentemente, pode funcionar como significante partilhado, como lugarcomum de debate. Embora haja formulas que se cristalizam em um sé morfema lexical, como crise, liberdade, suas formas privilegiadas tém carater relacional e se materializam em sequéncias que apresentam as seguintes estruturas: (i) nomes compostos [sem-teto, sem-documento]; (ii) sintagmas do tipo N + preposicao + (artigo) + N, [cortina de ferro], [teologia da libertacao]; (iii) sintagmas nominais com adjetivos denominais [fratura social], [segregacdo racial], [saldrio-familia] c (iv) nominalizacdes [nacionalizacdo], [mundializagao]. Em se tratando de sistemas de ensino, cuja materializagao se da preferencialmente pela sequéncia marcada como (ii), ha algumas variantes, como sistema apostilado de ensino, sistema estruturado de ensino, sistemas apostilados, sistemas de apostilas, ma- teriais apostilados, redes de ensino estruturado, apostilamentos, apostilas/sistemas, etc. O carater cristalizador da formula permite justamente tais variantes, possibilita colocar em relacao diferentes “termos”, criar significacdes e correspondéncias novas, aceitas ou rejeitadas pelos interlocutores. A polissemia, a ambiguidade de algumas formulas, como feminismo, permite passagens de um campo de pertencimento a outro, de uma acep¢ao a outra. A polissemia, de modo geral, facilita o regime “formulaico” do léxico, porque permite maior circulagio e polémica, favorecendo os conflitos interpretativos. A nogao de formula, embora necessariamente se cristalize em formas bem identificadas, nao é uma nogao linguistica; é, antes de mais nada, uma nocio discursiva que opera na lingua, isto é, a ordem, que ¢ propria da lingua, € posta a funcionar segundo 0 proceso discursivo delimitado por certa conjuntura; portanto, o sentido nao é, apenas, da ordem da lingua, antes decorre dos posicionamentos discursivos que, por sua vez, sio de ordem sécio-historica. Ainda que algumas formas tenham uma aptidao particular para se transfor mar em formulas, nenhuma sequéncia é “pré-programada” para assumir essa Sistemas de ensino 121 (3) (4) peculiaridade e, inversamente, nenhuma esta, a priori, totalmente excluida da possibilidade de chegar a condicao de formula. Na maior parte das vezes, deter- minada sequéncia preexiste formalmente a sua chegada a condigio de formula. E o que acontece com o sintagma sistemas de ensino que nao constitui uma forma nova, mas vem assumindo um uso particular, como explicitamos anteriormente. As formulas constituem um referente social em um espaco ptiblico dado e sao objeto de debates, em varias reas: religiosa, politica, juridica, cientifica, jornalistica, etc.; elas tém, portanto, um carater histérico. Como referente so- cial, a formula € un siguu nowriy, isto €, evoca alguma coisa para todos num dado momento, portanto, ela passa a ser conhecida por um amplo expectro de pessoas. Em determinados momentos, todo mundo é obrigado a se situar em relacao a determinado sintagma, a fazé-lo circular de uma maneira ou de outra, lutando para impor sua propria interpretagio (Maingueneau, 1991, p.85). Ser um denominador comum dos discursos é constitutivo de uma formula como referente social ¢ esta caracteristica esti cada vez mais presente com 0 mbora quase todos eles relacionados ao campo educacional, como (a) 0 Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino de Sao Paulo (Sieesp): “a orientacao pedagégica (das apostilas) gratuita e a possibilidade de associarse a uma marca forte e reconhecida pelos pais sio poderosos atrativos para as escolas particulares”; (b) os préprios pais dos alunos: “nao adianta enfeitar. O futuro é o vestibular. E vocé quer o melhor para o seu filho, afirma J.F, mae de trés filhos, todos educados com apostilas dos Sistemas”; (c) alguns prefeitos ¢ secretatios de Educagao; (d) empresirios e publicitarios, como Roberto Justus; (e) fundages, como a Lemann, cujos resultados de pesquisas se referem aos indices obtidos pelas escolas ptiblicas na Prova Brasil. sintagma sistemas de ensino, que comeca a circular em diversos setores O carater polémico da formula é indissociavel de seu estatuto como referente social: € porque ha um denominador comum, um terreno partilhado, que ha polémica. As formulas participam do “peso da histéria”, ao contrario dos slogans publicitarios, dos titulos de filmes e de livros, etc. - os quais, por mais circulantes e cristalizados que sejam nao so, na sua maior parte, portadores de problemas sociopoliticos. A formula pde em jogo modos de vida, recursos materiais, direitos e deveres dos individuos, relacdes de igualdade ou de desi- gualdade entre cidadaos, etc. Em relagao aos sistemas de ensino, a polémica vem ganhando espago na midia. Temos indicios de que a prescric¢ao do trabalho do(a) professor(a) é considerada pelos defensores dos sistemas como garantidora de aprendizagem (i) e (iii) e, por seus opositores, como uma mecanizagio do trabalho (ii) e (iv). Os argumentos contra passam também por uma polémica telacionando ensino publico/verba publica x ensino privado/verba privada e, ainda, livreiros e autores de livros didaticos (v) e (vi). 122 Eaunciagio ¢ diseurso (i) Passo a passo, os livros das redes oferecem teoria, aplicacdo, exercicios e provas. Essa ajuda permite ao professor sair da decoreba e botar a cabeca dos estudantes para funcionar. (Claudio Moura e Castro, Satanas apostilado, Veja, edi¢io 2022, ano 40, n.33) (ii) Padronizase 0 ensino, deixase de contemplar as diferentes realidades das escolas e dos interesses dos professores, os quais, nao podendo escolher o instrumento de trabalho que se adapte a sua maneira de ensinar e a seus alunos, dificilmente serdo bem-sucedidos (...). (Associagao Brasileira dos Autores de Livros Educa- tivos - Abralc, sobre um artigo da revista Veja e a localizagio de Satanas. Disponivel no site: www.abrale.com.br) (iii) (...) essas institwicdes (que adotam sistemas de ensino) passaram a contar com um material que diz claramente 0 que fazer em cada aula. O plano de aula garante a aprendizagem. (Claudia Costin, vicepresidente da Fundagio Victor Civita) (iv) “Franquias” podem dar certo em atividades passiveis de serem padronizadas. O ensino, seja ele em qual nivel for, ndo pode. (Internauta anonima, professora universitaria; blog do jornalista Luis Nassif) (v) A “educacdo é prioridade em nossa administragdo” e os investimentos nas novas apostilas destinam-se a garantir ensino gratuito de qualidade e a proporcionar “condigées iguais de aprendizagem de nossos alunos da rede priblica com os das escolas particulares”, porque, “com isso, eles poderdo ter as mesmas chances de buscar no futuro um lugar no concorrido mercado de trabalho”. (Prefeita de Pederneiras, Jomal da Cidade de Bauru, 27/03/2009) (vi) Os sistemas apostilados custam, no minimo, dex vezes mais que os livros fornecidos pelo MEC. E fato grave, porque o municipio gasta verba que deveria ser usada na melhoria das instalagées escolares e das condigées de trabalho do professor, para oferecer material diddtico que apenas substitui os livros oferecidos gratuitamente pelo Governo Federal. (Associa¢ao Brasileira dos Autores de Livros Educa- tivos - Abrale, sobre um artigo da revista Veja e a localizaco de Satanas. Disponivel em: www.abrale.com.br) (vii) (...) se realmente existe a disponibilidade de recursos financeiros ora considerada, por que seria mais interessante para o municipio de Porto Feliz gastar todo ano R$600.000,00 com apostilamento (...)? Para que gastar se 0 Ministério da Educacdo oferece livros gratuitamente? (Elcio Siqueira, 2007, do Tribunal Contas de Sao Paulo) Apenas por esses excertos, depreendemos que o sintagma sistemas de ensino ganha sentidos distintos, respectivamente, por parte dos defensores e dos opositores da introdugao desse dispositivo na educagao. Explicitada a ultima das coerdes para que um sintagma aceda ao estatuto de formula, perguntase: como mensurar tais Sistemas de ensino 123 propriedades? Segundo Krieg-Planque (2009/2010), essas caracteristicas no sio mensurdveis apenas em termos de presenca ou auséncia, porque a formula é um objeto que se situa num continuum. Suas propriedades ocorrem de modo desigual € sio mais ou menos bem preenchidas. Assim, uma sequéncia é mais ou menos cristalizada segundo preencha mais ou menos bem um certo numero de critérios e seja percebida mais ou menos claramente como formando um bloco. Também o carter discursivo da formula é mais ou menos forte na medida em que os usos determinam mais ou menos o destino formulaico da sequéncia. Seu carater de referente social vunbém ¢ relativo: a sequéncia se impde, mais ou menos, come passagem obrigatéria dos discursos produzidos no espago piiblico. Finalmente, ha uma gradacao na polemicidade ocasionada por uma formula, ha sequéncias pouco questionadas, outras medianamente polémicas e outras altamente problematicas. E 0 que dizer da sequéncia sistemas de ensino? Sem duivida é um sintagma que esta adquirindo vida prépria. Caracteriza-l lo ou nao como formula vai depender da continuidade desta proposta que, em linhas gerais, prevé o estudo dos discursos produzidos por diferentes midias, passagem obrigatéria em uma anilise que visa & caracterizacao das formulas. As midias esto entre os principais atores aptos a garan- tir a difusdo da sequéncia em vastas areas do espaco publico. Embora importantes nos processos de construcao das férmulas, elas raramente sio suas criadoras, antes “constituem plataformas de langamento de formulas que chegam a elas frequen- temente pela periferia” e impul squ gente das letras, juristas e representantes de organizages governamentais. “As midias tém, na fabricacao das formulas, o papel de publicizagao, mas aparecem mais frequente- mente como operadoras da circulagio do que como suas criadoras ou iniciadoras” (Krieg-Planque, 2009/2010, p.118-119). Depois de depreendidas as ocorréncias e variantes do sintagma sistemas de ensino em circulagéo na midia, 0 que pode, em um primeito momento, ser feito via um programa de estatistica textual como o WordSmithTools composto por trés jonadas por pi adores, inrelectua ferramentas, entre elas 0 WordList, que serve para medir a frequéncia com que cer- tas palavras ou expressdes aparecem nos textos do corpus (BerberSardinha, 1999), recorreremos, também a algumas das contribuicdes de Maingueneau (1984/2008), mais especificamente ao principio do primado do interdiscurso para tratar de duas das caracteristicas da formula, seu carater discursivo e polémico. Invocar o primado do interdiscurso, isto é, a precedéncia do interdiscurso sobre o discurso significa “propor que a unidade de analise pertinente nao é 0 discurso, mas um espaco de trocas entre dois ou mais discursos” (p.20). Esse espaco, o espaco discursivo, é construido pelo analista a partir de um conhecimento sobre os textos e de um saber historico. Tal proposicao coloca o interdiscurso como espaco de regularidade pertinente, do qual os diversos discursos so apenas componentes. Pode-se, entio, dizer que, “em ter 124 Enunciagéo e discurso mos de génese, os discursos nao se constituem independentemente uns dos outros para serem, em seguida, colocados em relacdo, mas eles se constituem, de maneira regulada, no interior de um interdiscurso” (p.21). Esse modo de pensar o interdiscurso faz com que a interacdo semantica entre os discursos seja compreendida como um processo de interincompreensdo regrada, isto é, cada discurso introduz o Outro” em seu fechamento, traduzindo seus enunciados soba forma de “simulacro”, cuja construcao ¢ diretamente proporcional ao confronto aberto entre esses discursos, a polémica. Dois niveis podem ser depreendidos nesse proceso: por um lado, um nivel de interagao constitutiva, decorrente do fato de que a polémica nfo advém do exterior; por outro lado, um nivel responsavel pela hete- rogeneidade mostrada, no qual o adversario ¢ interpelado diretamente, ocupando, entio, lugar de destaque a citagao, que da visibilidade a “fragmentos localizaveis do Outro”. A incompreensio que se apreende por intermédio da atividade polémica pode ser mais ou menos profunda, mas a polemizagao com o Outro é a garantia mesma da identidade de um discurso. A relagao entre os sistemas de ensino e a chamada tecnologizagao do discurso: uma pista para andlise?™ Falamos no item anterior que uma caracteristica forte dos sistemas de ensino € fornecer apoio complementar 4s escolas e professores por meio de tecnologias educacionais: portal para alunos e educadores, cursos a distancia para professores e gestores municipais, etc. Apoiada em conversas informais com profissionais que claboram material para sistemas de ensino € com professores atuantes em tais sistemas, avango a seguinte hipotese a partir de Fairclough (1996): as praticas discursivas que permeiam a rede que caracteriza e cerca 0s sistemas de ensino estao sendo afetadas pelo que o autor designa como tecnologizagdo do discurso,!° entendida como “a incorpora- ao de formulas institucionais ¢ praticas de circuitos que englobam trés dominios: pesquisa, formulagio ¢ treinamento” (p.71). Embora os elementos da tecnologiza- cdo possam ser encontrados em praticas discursivas mais antigas, desenvolvidas por especialistas em discurso persuasivo e manipulativo, com a finalidade de oferecer treinamento em habilidades sociais (entrevistas pessoais, falar em publico), “a configura. co sistematica ¢ institucionalizada a caracteriza como um processo contempordineo que tem ocasionado mudangas na cultura do trabalho, em escala internacional, em diferentes setores, educagao, industria e servicos” (p.71).'° Sao cinco as caracteristicas da tecnologizacao do discurso: emergéncia de “tecnologos do discurso”, mudangas istemas de ensino 125 no modo de controle de praticas discursivas, formulagao € projecao de técnicas discursivas livres de contexto, simulacio estrategicamente motivada do discurso e presséo para a padronizacdo de praticas discursivas. Acreditamos que 0 conjunto dessas caracteristicas materializase de maneira combinada, mas para uma teflexio mais acurada vamos traté-los isoladamente, alias, como o faz 0 proprio autor. Os “teendlogos do discurso” contemporaneos sao pessoas que tém relagao com o conhecimento ~ cientistas sociais, ou consultores especialistas, cujas intervengdes na pratica discursiva carregam uma aura de “verdade” - e que mantém relagdes institucionais fortes, isto é, atuam de acordo com praticas e rotinas aceitas em determinadas organizac6es, sio recrutados internamente ou sao contratados para participar de projetos especificos. Um dos efeitos da tecnologizagao do discurso tem sido a mudanca no modo de controle das priticas discursivas, que estio passando do nivel institucional local para um nivel transinstitucional, mudanga essa acompanhada de outra que envolve a natureza do vinculo dos especialistas, antes restritos a uma instituic’o em particular (seja em educacao, direito, medicina), agora recrutados externamente, com critérios também gerados externamente. Essas mudancas esto ligadas 4 questio da legitimi- dade dos tecndlogos do discurso: anteriormente baseada em seu poder e prestigio no ambito da profissao, agora baseada na ciéncia, no conhecimento e na “verdade”. Outro efeito da tecnologizacio tem-se manifestado na formulacio e projecio de técnicas discursivas preparatérias para o desempenho de detcrminadas ativida des, como entrevistar, dar palestras, aconselhar, a fim de tornélas mais “efetivas ¢ agradaveis”.|” Tais técnicas, muitas vezes advindas do marketing e propaganda, sio projetadas para cooperar “livres de contexto” justamente para possibilitar sua utili- za¢do em varias outras situagdes, principalmente em treinamentos nos quais ha um. foco sobre a transferibilidade de técnicas, conforme a expressao: ensinar para transferir. Ainda como caracteristica da tecnologizacao, encontra-se a implementacao de determinadas t nicas discursivas que se caracterizam pela simulagdo de formas in- terpessoais originadas em outros lugares; pela apropriacao institucional dos recursos da conversacdo, a chamada conversacionalizagdo, que simula interagdes informais; e, ainda, pela aparente democratizacao dos discursos institucionais. Trata-se de técnicas que abrem fronteiras entre o privado ¢ o institucional. Finalmente, a iltima carac teristica da tecnologizacao do discurso é seu direcionamento para a padronizacao e normatizacao das praticas discursivas em diferentes tipos de trabalho. Transpondo a fala de Fairclough para nosso contexto, podese dizer que a equipe de tecndlogos que elabora material para os sistemas de ensino inserese em duas categorias, conforme os sistemas de ensino sejam vinculados ou nao a cursinhos ou a escolas. No primeiro caso, essa equipe € composta por professores do proprio cursinho, os quais ou tém contratos de autoria e recebem dividendos percentuais 126 Enunciagio e discurso de acordo com as vendas, ou assinam contratos de cessao de direitos autorais, ela- borando as apostilas como uma atividade de prestacdo de servicos, tecebendo por empreitada. Jé em se tratando dos sistemas de ensino no vinculados a cursinhos ou a escolas, os tecndlogos so constituidos ou por equipes de especialistas (académicos ou professores de estabelecimentos conceituados com formagao sélida), ou por autores de editoras. Os especialistas sao contratados por demanda, cedem os direitos autorais e recebem por empreitada (prestacio de servicos), j4 os autores sio contratados seja para transformar seus livros em apostilas, seja para elaborar novos originais para compé-las. Em ambas as sittiagdes, os contratos siio especificas para essa atividade € 0 percentual recebido como direitos autorais ¢ menor do que aquele recebido em relacdo aos livros. As vezes, ha uma mistura entre os modelos de cessao de direitos e de autoria, outras vezes, as equipes de especialistas sao contratadas por CLT apenas para elaboracao de apostilas. Sintetizando este item, pode-se dizer que as caracteristicas apontadas por Fairclough funcionam como pressdes centralizadoras e padronizadoras da pratica discursiva. Tais caracteristicas, a semelhanga do que ja foi dito em relacio as formulas, nao sio mensuriveis apenas em termos de presenga ou auséncia e suas propriedades devem ocorrer de modo desigual. Conhecélas implica conhecer o mecanismo de produgao dos sistemas e também a atividade de trabalho dos professores, ai com- preendido o circuito em que eles se movimentam. Que saberes priorizar para conhecer o trabalho dos professores que utilizam os sistemas de ensino? Encontrar caminhos para responder a esta questo impde ao estudioso da linguagem o diilogo com outras disciplinas, procedimento caracteristico das pesqui- sas em linguistica aplicada, que tem estabelecido vinculos com diferentes areas do saber: a psicologia, a educacao, a sociologia, a filosofia, etc. A abordagem tedrico- metodoldgica de nosso grupo tem combinado enfoque dos estudos da linguagem com a problematica das relagdes de trabalho construidas pela ergonomia da atividade,” cujas contribuigdes se fizeram sentir nao s6 pelo aporte metodolégico, fundamental para a compreensao e transformagao das situagdes de trabalho, mas também pelo resultado de suas pesquisas, que fizeram aflorar a variabilidade constitutiva das ati- vidades de trabalho, propiciando cond: es para dar visibilidade a distancia sempre existente entre o que era prescrito pela organizagio (que pressupunha um trabalhador apenas executor) e o que era efetivamente realizado e, como tal, implicava varias modalidades de recomposigao (Wisner, 1996; Guérin et al. 1997/2001). Sistemas de ensino 127 Aatividade humana esta no centro das preocupacées da ergonomia francesa e também da ergologia, entendida como um modo de investigagiio, um espaco epistemo- légico - lugar de anlise do processo da relagio meio de vida e trabalho -, que oferece um quadro apropriado para integrar aportes das diversas disciplinas que tratam do trabalho, todas necessarias, embora nenhuma seja suficiente (Schwartz, 1992, 1997). A semelhanga da ergonomia da atividade, a perspectiva ergolégica ultrapassa a nogao de trabalho tal como vem sendo entendido no mundo capitalista - isto é, como uma tarefa remunerada segundo leis de mercado, submetida a contratos, regras, leis e prescrigdes em diversos niveis - c busca, antes, apreendélo como atividade humana. E no espaco entre o trabalho prescrito ¢ o trabalho efetivamente realizado que se inscreve a realidade da atividade humana entendida, segundo a abordagem ergoldgica, como “um impulso de vida, de satide, sem limite predefinido, que sintetiza, cruza e nutre tudo aquilo que as diferentes disciplinas tem apresentado separadamente: 0 corpo/o espirito, o individual/o coletivo, o privado, o profissional, 0 fazer e os valores, o imposto/o desejado, etc.” (Schwartz e Durrive, 2008). A formalizacao dessa concep¢ao encontrase em um principio tedrico-metodolégico intitulado disposi dinamico de trés polos (DD3P), no qual o termo polo indica um lugar virtual onde se articulam os saberes constituidos, os saberes investidos e a gestao de valores. Ha sempre uma dialética, um compromisso, um encontro entre esses polos, parame- tros indissociaveis e presentes em toda a situagio de trabalho (Schwartz, 1997)2° O polo dos saberes constituidos referese a todo o conjunto de prescrigdes © normas que se encontram antes da realizaco do trabalho, a tudo aquilo que é ivo formalizado, ensinado e consultado, sob diversos supottes: livros, manuais, orga- nogramas e, ainda, softwares, computadores, novas instalacdes, ete. Esse conjunto, que constitui as chamadas normas antecedentes, abrange todas as prescrigdes a que estdo sujeitos os trabalhadores, no caso, professores que lecionam em unidades que adotam os sistemas de ensino. Jao polo dos saberes investidos refere-se a dimensfo conjuntural, a experiéncia pratica, concreta, ao aqui e agora de cada trabalhador, no caso, de cada professor em cada situagao de trabalho. Em toda atividade de trabalho os trabalhadores colocam em pratica seu saber pessoal para preencher e gerir a distancia prescrito/realizado. Esse saber é o resultado da historia de cada um, de sua experiéncia profissional e de outras experiéncias sociais, familiares, culturais, esportivas. Saber investido € saber constituido sao, assim, complementares ¢ indispensdveis para se compreendet qualquer situacao de trabalho porque constituem os dois lados de toda a atividade. Passa-se, entao, a compreender o trabalho como um debate sempre renovado entre normas antecedentes e as renormalizacoes, historicamente contextualizadas e bali- zadas pelo nivel local de atuagao concreta do trabalhador. Finalmente, 0 terceiro polo, talvez o mais desconhecido e o mais enigmatico, implica estabelecer uma consonancia entre esses dois saberes. E, portanto, o polo 128 Enunciagiio ¢ diseurso do trabalho considerado como uso de si, como gestdo e valores subjacentes as escolhas, decisées a serem tomadas no cotidiano a partir de imperativos diferentes, gestio de imprevistos, gestdo de relacdes sociais, gestao de crises também e, finalmente, gest’io de si - dessa entidade em parte opaca ao préprio ser humano que faz a experiéncia de si mesmo por meio da atividade laboriosa (Schwartz, 1997). E aqui o lugar das reavaliagdes, do tratamento de valores que esto enraizados nas gest6es da atividade. O ser humano, como todo ser vivo, esté exposto as exigéncias ou normas emitidas continuamente, e em quantidade, pelo meio no qual ele se encontra. Contudo, para existir como ser singular ele tenta, permanentemente, reinterpretar essas normas, renormalizilas segundo seus valores. Gerir a complexidade do trabalho implica vivenciar as chamadas “dramiticas do uso de si”, que podem ser observadas no coti- diano, em situacdes nas quais entram em jogo, simultaneamente, os imperativos do setor econdmico - produtividade, eficiéncia, manuten¢ao do proprio emprego - € aqueles dos valores nfo econémicos: solidariedade, respeito, ética (Trinquet, 2010). Explicitados esses trés polos temos pistas para a formulacao de algumas quest6« Quais sdo as prescrigdes comuns aos virios sistemas de ensino? Que praticas discursivas esto em circulacao na producao de materiais? Como compreender 0 cotidiano de trabalho dos professores? Para concluir, uma questao metodolégica Ainda, segundo a perspectiva ergol6gica, responder as questdes formuladas no item anterior implica promover, isto é, fazer funcionar os Grupos de Encontro de Trabalho, os GRT, um método ao qual a ergologia recorre (Schwartz e Durrive, 2003/2010) para operacionalizar o dispositivo de trés polos, procedimento que exige determinada interacio pesquisador/trabalhador a fim de possibilitar a circulagao de discutsos e que possibilitem a construgo conjunta de conhecimentos sobre a atividade desenvolvida. Dialogo esse intitulado processo socrdtico de duplo sentido” (Schwartz, 1997) que ocorre entre os pesquisadores, considerados “detentores” dos saberes instituidos, e os atores sociais, no caso 0s professores, no aqui e agora do seu trabalho, detentores dos saberes investidos, imprescindiveis para a compteensao da arividade de trabalho. Essa ideia, a primeira vista, pode parecer um pouco obscura, mas trata-se, antes de tudo, de uma questao de postura por parte do pesquisador, uma aceitagao de certo “desconforto intelectual”, nas palavras de Schwartz (1997), que nos faz partir do pressuposto de que jamais estaremos seguros para tentar compreender e analisar as atividades humanas porque sempre ha o imprevisto e 0 imprevisivel. Sistemas de ensino 129 Notas Parte desta reflexao foi publicada no livro Linguistica aplicada e sociedade: ensino & aprendivagem de ingucs no contexto brasileiro. Campinas, Pontes Editores, 2011 O livro resulta, segundo a prépria autora, da combinacio de trés fatores: tese de doutorado, posteriormente adaptada para publicagio, demandas sobre alguns pontos tratados na tese e uma vontade editorial coletiva. Parte das informagdes referentes a este item foram obtidas em M. Leis, (/d) Sistemas de ensino versus limos Aidaticos:vésas faces de wm enfrntamento, As informacdes referentes a0 Anglo estio disponiveis em hetp://angloparademinas.blogspot.com/2008/03/ sistema-deensino html. [Acesso em: 18/09/2012.] ‘O Anglo mantém convénio com 600 escolas particulares. © Objetivo, além das 700 escolas privadas conweniadas, fez acordos com prefeituras espalhadas pelo pais. COC congrega mais de uma dezena de unidades escolares _proprias e mais de 200 escolas conveniadas na rede particular. Outros grandes sistemas de ensino:Pitigoras (Belo Horizonte) e Positivo (Curitiba). © Matéria publicada no jomal © Estado de S, Paulo, cademo Vida, A15, 23 ago. 2010, Materia publicada no jornal © Estado de S. Paulo, cadlerno Vida, 21 jul. 2011. © Sobre a relagdo livro didatico e sistemas de ensino, ver Souza etal. (2007). ° Materia publicada no jornal Folha de S. Paulo, caderno Mercado, 03 set. 2011. "© Matéria publicada no jornal © Estado de S, Paudo, caderno Notas e InformagSes, A3, 25 jul. 2010. Avisamos o letor que estamos recuperando as consideragdes de Krieg Planque (2009/2010) essencinis para nossa pesquisa. Recorremos as aspas somente quando julgarmos muito pertinent. A nogio de formula também pode ser considerada sob uma perspectiva mais ampla: “enunciados curtos cujo significante ¢ significado sio considerados no interior de uma organizacio pregnante (pela proséia, rimas incernas, metaforas, antiteses... © que explica que sejam facilmente memorizaveis" (Maingueneau, 2008, p.75). "Outro" com maitiscula, indica posicionamento discursvo; nao coincide, portanto, com seu homdnimo lacaniano. Devo esta sugestio a D. Maingueneau. Discurso, entendido como pritica social referente a qualquer uso da lingua escrita ou falnda. Order de discus: configuracio geral de prticas discursivas de uma sociedade ou de uma de suas instituigSes. Optamos por usar apenas a desig autor, no artigo em questio, toma como ponto de referéncia a Gri-Bretanha e um dominio de trabalho, a educagio superior. Pesquisas, no seror de servigos, jé conclutdas na Franca por Boutet (2008) e, no Brasil, por Algodoal (2002), constataram o emprego desta técnica, também observada em artigo de Souza Silva e Rocha (1999). Tese de doutorado que analisou a revista Melhor Gestdo de Pessoas (Borim, 2011) constarou essas caracteristi também observadas em pesquisa em curso em empresa cujas atendentes relacionamese com seus clientes, via chat (Anjos, 2011). Recusandoa abordagem mecanicista decorrente, em grande parte, da organizacio cientifica do trabalho, segundo a qual © homem, como a maquina, pode ser reduzido tarefa que executa, a Ergonomia Situada ot da Atividade aborda o trabalho como atividade, elemento central, organizador ¢ estrururante dos componentes da situagao de trabalho, ® Mais informacdes sobre esse dispositivo, consular o site http://Avww.ergologie.com. Situagdes em que no ha somente Socrates, aquele que sabe, e coloca questes aos trabalhadores, aqueles que devem responder, mas também o processo inverso. Dai o duplo sentido. peitions diecunsivas Bibliografia Apaifo, T. etal. Uma modalidade peculiar de privatizagao da educacao piiblica: a aquisigao de “sistemas de ensino” or municipios paulistas. Educagto & Sociedade, v.30, n.108, p.799818, out. 2009. Disponivel em: www. cedes.unicampsbr. Acesso em: 18/08/2011. Atoopoat, MJ.A. de O. 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