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eeTnlom krancis Trinta Anos esta Noit: ISBI ‘i mt Paulo Francis cra colunista politico ¢ cultural da Ultima Hora, no Rio, ¢ estava na redagio do jornal quando, na noite de 31 de marco de 1964, chegou a noticia de que o general Olimpio Mour havia se revoltado contra 0 presidente Joao Goulart, e que o governador de Minas Gerais, Magalhaes Pinto, tinha aderido e estabelecido um gabinete revolucionario. Francis conhecia pessoalmente s principais personagens desse momento histérico, de Jango a generais como Ladario Teles, 0 comandante do Terceiro Exército. De 31 de margo a 3 de abril, conyersou com grande parte desse elenco politico e militar e, neste livro, conta o que ouviu, 0 que sabe e tenta fazer sentido da derrubada de Jango, acontecimento’decisivo para o Brasil de hoje, de 1994. Aqueles que eram adultos em 31 de margo de 1964, considerando-se 21 anos como maioridade, terdo hoje, no minimo, 51 anos; e, de acordo com as estatisticas, os brasileiros siio um povo jovem, com 70% entre vinte e trinta anos de idade. Para Francis, a visio que essa maioria, nem sequer nascida iu, tem do episdio é nebulosa ou simplista: ou Joao quando Jango « Goulart era um paladin do progressivismo ou um agente da s. E esta comunizagio do pai simplificagdo que Trinta anos esta noite visa desfazer, introduzindo: sombras cinzentas neste retrato em preto e branco. Este livro 6 uma memoria pessoal e nao um texto didatico sobre 1964, O autor pa do politico ao histérico, Analisa, por exemplo, a relagao que 0 suicidio de Getilio Vargas, em agosto de 1954, ca rentineia de Finio Quadros, em agosto de 1961, tiveram com a queda de Goulart, em 1964. Ao mesmo tempo, apresenta um quadro do Brasil nas décadas de 50 ¢ 60, um pais sem inflagio ¢ superpopulagiio, e de sua eapital cultural ¢ politica —o Rio de Janei ainda cidade maravilhosa. Trinta anos esta noite é um testemunho da derrubada de Joao Coulart por um participante do acontecimento, 6 qual estava longe dle ser inevitdvel. Sem a pretensiio de ser dono da verdade, o autor ac dita que é importante que se conhega a versio de alguém informado sobre os que tombaram em 1964, para que a histéria nem sempre seja escrita apenas pelos vitoriosos. ZECA GUIMARRES/ESTADO Paulo I e cultural de O Estado de ancis 6 comentarista politico \. Paulo, no qual assina a coluna “Diario da corte”, distribuida para varios outros jornais. ta da Rede Globo S também de Teley romente ‘toe da Globosat, Escreveu , duas novelas e sete livros al. dois romances, de anilise politica ¢ culun PAULO FRANCIS TRINTA ANOS ESTA NOITE 1964 O que vi e vivi CowPanita Das LETRAS Copyright © 1994 by Paulo Francis Capa: Victor Burton Foto da capa: Sénia Nolasco Preparacao: Stella Weiss Indice onomastic: Otacilio F. Nunes Jr. Revisto: Eliana Antonioli Cecilia Ramos Dados Internacionais de Catalogagao na Publi (Camara Brasileira do Livro, se, Bras Francis, Paulo ‘Trinta anos esta noite: 1964, 0 que vie vivi / Paulo Franeis, — S40 Paulo : Companhia das Letras, 1994. ssn 85-7164-369-5 1, Brasil - Historia - Revolugdo de 1964 1. Titulo. 94-0326 eop-981.08 indices para catilogo 1, Brasil: Histéria, 1964-1985 981.08 2, Revolugio de 1964 : Brasil : Historia 981.08, 1994 Todos os direitos desta edigio reservados & EDITORA SCHWARCZ LTDA. Rua Tupi, 522 01233-000 — Sao Paulo — sp Telefone: (011) 826-1822 Fax: (011) 826-5523 INDICE AVisoa0s, Navegantes nck dnoTs- Oe ol eet 2. ete O 1964... Cronologia de um golpe (ou revolug40?) .........:0seeeeee Obpresidemteaosvivo....2-. Ao que é sua marca registrada. Enio é comunista, talvez 0 ulti- mo na face da terra, tirando Pr Kim Il Sung e Cia.). Lembro que George Orwell, ao escrever 1984, queria chaméa-lo de O ultimo homem na Europa, o ultimo ho- mem livre... Talvez um livro por escrever, ainda que as circuns- tancias sejam outras e que o embate liberdade versus comunismo tenha de ser reequacionado em outros termo as_isso sfo ou- mio é um escoteiro. Nao quer fazer mal a ninguém. Quer apenas o bem. Acredita que, devidamente es- clarecida a questao, todo mundo aderiria de coragao aberto ao comunismo. Na volta de Sao Paulo, sugeriu que pardssemos 0 carro para uma visita 4 Academia Militar de Agulhas Negras, dos cadetes do Exército. Achei que nao serfamos bem recebidos. ‘‘E por que nao??’, perguntou Enio. ‘‘Afinal, como contribuintes do impos- to de renda, ajudamos a sustentar Agulhas Negras.’ Ele é carte- siano assim. Lembro que, num hotel em que dormimos, ele me deu as provas da autobiografia de Charles Chaplin, para possiveis cor- reg6es na tradugdo. Li, desapontado, aquele texto de vangléria, pena de si proprio, sem 0 menor molho. A vida sexual pedofila le Chaplin, pelo pouco que sei, deve ter sido fascinante. Mas, escrevendo, a brasileira, Chaplin envergou um fraque, sem sen- so de humor, sem explicacéo da mecdnica do poder, de como se sobe 0 pau-de-sebo em Hollywood, sem alegrias e decepgdes fun- dadas em fatos; 0 que se tem, em suma, é um discurso intermi- navel de autojustificacdo sentimentaldide. Larguei no meio e disse a Enio que ele havia comprado nabos em saco e que os nabos estavam podres. Enio, o astro-rei, discordou, respondendo que © livro resplandecia e que, bom ou ruim, venderia, uma observa- co sagaz. Foi um best-seller, mas morreu. Ninguém lembra uma passagem sequer. @ No Rio, fui trabalhar como editor free lance da Civilizacao Brasileira. Colaborei na edigao de uma biografia de Trotsky, em trés volumes, de Isaac Deutscher — O profeta armado, O profe- ta desarmado e O profeta banido —, que nao se esperava fosse publicada por um comunista como Enio. Recebeu pesadas criti- cas do Partid&o. Nelson Werneck Sodré foi um dos raros comu- 16

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