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sta en fo publi oiginatmente em fone com lo TLE NOUVEL ESPRIT DU CAPITALISME por Editions Gallimard, Pars copyright © Editions Calimard, 199 copyigh & 200, Eto WME Martins Fontes Lie ‘Sis Paul, pra a presente ei cet orgy, pies cate de Ad ei FronexBsi cttePagnme Ae Pai ee de Radke Knee tu cain Misr ete Eng Ta = ce de Fron ox Sri (21 zr 15 send eee Cee ee Commer gent rai le Minin des Af engines et urupones Minced a Caudle Comune Calta. ne Connors na ie, le Minis d le Catr Ie Mite des Rains eee” - ino, pub n bil de Av Fram Br «programa da publi Care nant dade, ono cm 0 ps de Mins fran os eats Extere. “Pape 2 Anode Prong rsd 2 deen 15d nent) ora ee a omar ge! ase, pl Mitr Cause Mitre das Res - po Cominrink el fects po Minit ds Rel eateries cp, pe Mi ist da utara da Comunale” nage pbi te esto Cte national do — itr rnp art de cate ‘hr flop er mil i= mine foc c= 4 1 edigio 2009 ‘radugio IVONE C. BENEDETTI Revisio tecnica Bra Salo J ‘Acompanhament editorial aia Apart ds Santos Revisdergrifics Renato da Racha Carles ‘Gerald Alves PaginagSo‘Fottites ‘Studi 3 Dserolvimento Editorial ‘Dados Ineracionais de Ctalogacio na Pubicasio (CHP (Camara Briers do Lino, SE Brat) Botts Bae “O nove espiio do capitalimo / Luc Botan e ive Chi pelo wad Wwone C. Benedet revisto tenia rasio ttm Je S86 Paulo: Editora WME Martins Fontes, 200. “Tholo original: Le Nowvel pit du capitalise Bibiogafi. ISON 97685 7827.13 1. Capitaliamo Aspects sociais 1. Chinpetlo, ve Te tuo. op-or (00306342 Trdices para catilogo sistemdtic: {Capitalism = Sociologia 306-2 . “Todos os direitos desta ego reservados Editora WME Martins Fontes Ltda. ‘Rua Conselheio Ramalho, 330 01325-000 So Paulo SP Brasil "al (11) 3241.3677 Fax (11) 3101-1082 email: infouomfmartnsfontes.com.br htp[tawsxomfrartingfontes com. 0) L O DISCURSO EMPRESARIAL DOS ANOS 90 r Propomos aqui evidenciar a profunda transformagao do espirito do ca pitalismo durante os ltimos trinta anos: abandono dos tracos ideolégicos especificos que caracterizavam seu segundo estado @.0 advento de uma nova representacao da empresa € do processo econdmico. Esta tem o intuito de fornecer aqueles cujo engajamento é muito necessario @ ampliacao do capitalismo — sucessores ‘dos executivos — evidéncias sobre as “poas agoes” que dever ser realizadas (bem diferentes, como veremnosy das recornenda- ges feitas durante os anos 60), discurso de legitimagao dessas ages, pers- pectivas estimulantes de autorrealizacao, possibilidade de projegao num futuro remodelado em fungao das novas regras do jogo ¢ sugestao de no- vas vias de continuidade para os filhos da burguesia e de ascensao social pata os outros. 1, FONTES DE INFORMAGAO SOBRE O ESP{RITO DO CAPITALISMO [A literatura da gestao empresarial como normatividade do capitalism Para levar a termo este projeto, utilizaremos a literatura da gestao em- presarial destinada a executivos’. Essa literatura, cujo objetivo principal é in- rormar os executivos sobre as tltimas inovagdes em matéria de gestdio empre- sarial e diregao de pessoal, apresenta-se como um dos principais espaos de inscrigao do espirito do capitalismo. Na qualidade de ideologia dominante, 0 espitito do capitalismo tem, em principio, a capacidade de permear 0 conjunto das representagdes mentais Emergéncia de uma nova configuragio ideolégica Sendo literatura publica, destinada a obter adesao aos preceitos expos- tos e engajamento de grande ntimero de atores — em primeiro lugar, dos executivos cujo zelo e convicgao sao determinantes para a boa marcha das empresas —, a literatura de gestao empresarial nao pode ser unicamente orientada para a busca do lucro. Também deve justificar 0 modo como ele 6 obtido, dar aos executivos argumentos para que eles resistam as criticas que nao deixarao de surgir quando procurarem por em pratica as recomen- Jacdes dadas, e para que respondam as exigancias de justificagdo com as quais sero defrontados perante seus subordinados ou em outras arenas sociais das quais participem. A literatura de gestao empresarial, portanto, deve mostrar no que o modo prescrito de obter lucro pode ser atraente, in- teressante, estimulante, inovador ou meritorio. Ela nao pode se deter nos mo- tiwos e nos estimulos econdmicos. Deve respaldar-se em visdes normativas que levem em contd nao s6 as aspiragoes pessoais a garantias e a autono- Tia, mas também 0 modo como essas aspiragoes podem ser vinculadas a dima orientagao mais geral para o bem comum. Sem isso, nao seria possi- Vel entender por que a transmissao de modos operatérios voltados para a organizacao das empresas em ce-tos autores € exaltada por um estilo litico oud herpico, ou apoiada por referéncias numerosas ¢ heterécitas a fontes nobres e antigas, tais como budismo, a Biblia, Platao ou a filosofia moral contemporanea (Habermas, em especial). ‘Também importa ao nosso tema lembrar que o nascimento da gesto empresarial acompanhou, no inicio do século’, o surgimento desse novo corpo social de diretores-e administradores assalariados (designados mais tarde com o termo executivo ou, na Franca, cadre), a0 qual € progressiva- mente transferido o gerenciamento operacional das grandes empresas, ja que os proprietarios se confinavam ao papel de acionistas, salvo quando também se tornavam executivos dirigentes assalariados (Chandler, 1988). ‘Assim, a gestéo empresarial destinou-se desde a origem aqueles que, de- pois da crise dos anos 30, se tornariam os novos herdis da economia € 0s principais destinatarios do segundo espftito do capitalismo. A gestao em- presarial, que se apresenta como sistematizagio e inscrigao de praticas for- jadas no Ambito das empresas em regras de conduta de caréter geral, foi permitindo aos poucos a profissionalizagao dos cargos executivos. Henri Fa- yol, considerado um dos fundadores da disciplina, desejava criar uma “dou- Tina administrativa” que possibilitasse, por um lado, afirmar que a gestao empresarial era uma profissdo, com suas regras proprias, consumando as- sim a ruptura com uma diregao cuja legitimidade decortia da propriedade, e, por outro lado, abrir caminho para um ensino profissional. Nao é de sur- preender que os executivos tenham reconhecido suas proprias aspiracbes Emergéncia de wma nooa configuracio ideolégica executivos, do texto escrito para o ensino € part programas radiofnicos especializados), de tal modo que é grande a dificuldade para se atribuir a paternidade desses conjuntos ret6ricos a certos autores. Suas diferengas, frequentemente minimas, tém o resultado de oferecer a diversos atores pon- tos de apoio diferentes para que eles possam captar as orientagdes que se busca transmitir e com elas se identificar. Como ocorre com todo conjunto textual de destino performatico, sobretudo quando o numero ¢ a diversidade das pessoas que se procura convencer sao elevados, a variagao sobre alguns temas obrigatérios constitui uma das condigdes da eficacia na transmissa0 He uma mensagem que s6 pode ser difun ida modulando-se. Portanto, constituimos dois corpora que comportam cerca de sessenta textos cada um, 0 primeiro dos quais foi publicado nos anos 60 (1959-69) & o segundo, nos anos 99.(1989-94); no todo ou em parte, eles tratam da ques- tao dos executivos, ainda que estes possam ser designados de modos di- versos (gerente, diretor, chefe, dirigente...). Esses dois corpora possibilitam depreender uma representagao tipica daquilo que é recomendado as em= presas em cada um dos dois periodos considerados, no que se refere a0 tipo de executivo que deve ser empregado, a0 melhor tratamento que Thes deve ser aplicado e & natureza dos rebalhos que convém solicitar-Ihes. O Anexo 1 apresenta as caracteristicas dos textos analisados; 0 Anexo 2, bi- _liografia dos-corpora_Os corpora sesim constituidos (mais de mil paginas) foram tratados em dois tempos: Num primeiro tempo, foram submetidos a uma anilise classica baseada numa leitura extensiva visando & primeira identificagaio das preocupacoes dos autores, das suas solucdes para 0s pro- blemas da época, da representagao fetta das formas herdadas do passado que eles declaravam obsoletas, e dos diferentes argumentos apresentados para obterem a conversao de seus Teitores. Num segundo tempo, usamos 0 aplicativo de andlise Prospero@ (cf. Anexo 3) para confirmar nossas hipo- teses e validar, por meio de indicadores especificos presentes no conjunto dos textos, que nossa andlise realmente refletia um estado geral do corpus (e nao um vies pessoal relativo a certos temas que nos expusesse 20 risco de aumentar sua importncia) €, Por conseguinte, um estado geral da lite- ratura de gestao empresarial nos anos €m questao. A opsao foi essencialmente comparativa. 'A énfase recaiu nas diferen- cas entre os dois corpora, enquanto as constantes chamaram menos nossa atencao’. Louis Dumont (1977) observava que © método comparativo é 0 tnais eficaz quando se trata de estudar jdeologias, em especial quando elas suo as ideologias do mundo no qual 0 analista est mergulhado, cujos ele- mentos de relevo so dificilmente identificaveis sem um ponto de compa- ragdo externo. Aqui, a exterioridade sera fornecida pelo recuo histérico. 87 Emergéncia de uma nova configuraciio ideolégicn ta-voz dos artesios - amplamente majoritarios na Franca de meados do sé- culo XIX -, tinha razao, estatisticamente falando, contra Marx, cuja utopia do proletariado parecia fandamentada em situacdes que, na época, nao eram predominantes (Ansart, 1969). Criticando P. Laslett, quando ele diminufa o papel desempenhado pela Companhia Inglesa das indias Orientais e pelo Banco da Inglaterra antes do inicio do século XVIII, Fernand Braudel assim escreve: “J4 conhecemos 0 raciocinio e a toada: toda vez que se compara 0 volume de uma atividade de ponta ao ‘volume consideravel da economia de conjunto, a massa absorve a excegao na regra, 2 ponto de anula-la. Nao es- rou convencido. Os fatos importantes sdo aqueles que tam consequéncias, € é bom pensar duas vezes quando essas ‘consequéncias so a modemnidade da economia, 0 futuro’modelo’ dos’negdcios’, a formacio acclerada do capital e a aurora da colonizacao” (Braudel, 1979, vol. 2, p. 540). ‘Um dos elementos marcantes da literatura de gestao empresarial, quan- do a lemos para extiair as ideias-tipo do espirito do capitalismo nas duas épocas, é a preocupacao permanente ‘de mobilizacdo e motivacao do pessoal, sobretudo dos executivos: “Como dar sentido ao trabalho na empresa?” € uma das perguntas centrais que preocupam as duas geragdes, airida que sob aspectos diferentes. Esse fato importante acaba por nos confortar na escolha das fontes para a identificagao das transformagoes do espirito do capitalismo. Sobre os textos centrados na mobilizagio dos executives ‘Nos anos 60, 0 que preocupa nossos autores 6a motivacao dos execu- tivos, a0 passo que nos anos 90 a maneira de engajar os executivos passa a sor atada apenas como um caso particular dos problemas suscitados pela mobilizagao geral de todos os empregados. Nos anos 60 os motivos de preocupasao quanto ao envolvimento dos executivos 40 variados. Pergunta-se como angariar para 0 capitalismo os me- Thores rebentos da burguesia: os dirigentes das Business Schools, por exem- plo, ficam preocupados quando “constatam a pouca atragao exercida pe!os negocios sobre as elites”, como afirma Marvin Bower, diretor-presidente da McKinsey e ex-presidente da Harvard Business School (Bower, 1968 ©)*. Deseja-se assim obter deles um envolvimento positivo sem falha’ ou evitar THUR desea dem do dcr sero sq pel Sia ©, pas. sing de outras fontes bibliograficas. "Voce pode comprar 6 tempo de um homemy voce pode comprar sua presenga sia em um ht gar, voce pode até mesmo comprar certo rsimero de ovimentos musculares por hora ou por dia, mas Bao pode comprar a lealdade, a dedicasio de coragbes © vmentes, Essas coisas precisam set ganhas” ~ ‘explica Fernand Borne (1966 ©). 89 Emergéncia de uma nova configura ideolégica empresa deve “tornar-se um lugar de construgao de sentido, de finalidades compartilhadas, em que cada um possa ao mesmo tempo desenvolver a au- tonomia pessoal e contribuir para 0 projeto coletivo” (Genelot, 1992 ©), pois, “como dizia Jean Giono,’o essencial nao é viver, é ter uma razdo para viver’. Mas acrescentava:’e isso N40 é facil” @Bellenger, 1992 ©). Dar sentido 20 sistema assalariado e espitito ac'capitalismo constitu, pois importante preocupacao dos autores da gestdo empresarial. Agora examina- remos quais foram as propostas feitas em cada época para dar-lhe resposta. 2. EVOLUCAO DA PROBLEMATICA DA GESTAO EMPRESARIAL DOS ANOS 60 AOS ANOS 90 Para evidenciar/4s transformagées do espirito do capitalismo ao longo dos tiltimos trinta anos, abordaremos sucessivamente, para cada época, 08 seguintes pontos: a) Que indagacées se fazem os autores? Estas refletem 0 medo como os problemas sao abordados e analisados em determinada época e o que esté implicito e subjacente @ priori. b) Que respostas e solu- ges 840 dadas? ¢) O que é rejeitado da situagao tratada? A imposicao de uma nova norma de gestao empresarial quase sempre é acompanhada pela cxitica a um estado anterior do capitalismo e a urna maneira anterior de ob- ter lucro; que deve’ ser abancdoractos para-dar lugar eum nove modelo: Veremos, assim, que os textos de gestao empresarial dos anos 60 criticam, explicita ou implicitamente, o capitalismo familiar, enquanto os textos dos sros 90 tém como principal alvo de contraste as grandes organizagées hie- rarquizadas e planificadas. A critica as praticas ¢ a0 habitos antigos, apre- sentados como ultrapassados, é 0 modo como se da a relacdo entre passa~ do e preserite nessa literatura sem meméria. ‘Anos 60: em defesa da administragio por objetivos Na literatura de gestdo empresarial dos anos 60 sao abordados dois problemas prioritariamente: por um lado, 0 problema representado pela grande insatisfagio dos executions e, por Outro, as dificuldades de gestiio asso- ciadas ao gigantismo das empresas. ‘Os exceutivos, que ~ conforme é repisado 0 tempo todo — constituem © valor da empresa, nao estao felizes restritos aos papéis que desempenham: em primeiro lugar, o de especialista técnico ~ 0 executivo tipico, na época, 6, acima de tudo, engenheiro — e, em segundo lugar, o de representante da dire- Go, transmitindo as ordens de cima e trazendo para cima os problemas de 1 Emergéncia de uma nova configuragio ideolégica to o reinado da pequena empresa podia configurar-se como 0 reinado da liberdade, os observadores se interrogam sobre os efeitos da burocratizagao | como valor distintivo do Ocidente em oposicao ao bloco comunista Des- se ponto de vista, a empresa capitalista parece comungaT dos mesmos in- convenientes da empresa coletivizada ou fascista” As solucGes para essas dificuldades chamam-se descentralizacao, meri- tocracia e administragao por objetivos. A batalha travada pelos autor’ dos- aoene 60 tem o objetivo essencial de impor essas novas modalidades de ges- to, Para poder dar aos executivos a autonomia & qual eles aspiram e des- centralizar a decisao de maneira capaz de limitar os inconvenientes do gi- gantismo purocratico — pois a decisao gerd entao tomada perto daqueles que sao por ela envolvidos ~, a administragao por objetivos apresenta-se como ‘um dispositivo particylarmente eficaz. A cada executivo & concedida algu- ve atibromia, mas eéfa continua bem enquadrada: por um fado, pelas des- crigdes de cargos, que possibilitam especificar com detalhes as margens da | suvonemia concedida; por otro, pela fixagdo, para cada um, de um objeti- \ ae vcoerente com a politica geral da empresa. O executivo passard a Ser jul- | gado com base na realizagao desse objetivo, ou seja, com base no maior ou menor sucesso de sua atividade, e nao com base na flexibilidade de sua es- pinha dorsal. Ele ganhard certa autonomia na organizacdo, tera meios a sua | disposicao e sera controlado, nao em cada uma de suas decisdes, mas pelo \ resultado global. Gracas a esse engenthoso dispositive, patroes mantém | S eontrole, ao mesmo tempo que realizam as reformas julgadas necessérias 1 pelos organizadores. Os executives ganham autonomia, e as empresas po- dem tirar proveito de uma forca de trabalho mais motivada'. yA dimensio de nogsas empresas aumentou tanto, que a imitagso das liberdades individuais se tormou azsunto de inteesse nacional. Como diz John Gardner: Todos tém razso de se preocuparem torn a ges soas ute que av grandes organizags impéem 20 nivduo, Uma socoaale We Seen rracterza.se, necessariamente, por uma organizagio complexa. Nio Ns ‘escolha. Por isso, preci- sere defender nos ao maximo dessas consideraveis coergBes” (Bower, 1968 °. + ehfns todos esses meios nBo passardo de’téricas'sem grande efeito, se no forem animados ‘por um espirito‘democrtico'dos drigentes. Esse problema gave, alids, apresenta-se tanto na empre- Pelle Go coletivista quanto na empresa capitalista” (Bore, 1966 ©) ferentes, por regimes politicos diferentes. Nao preciso lembrar-thes 9 ‘nacional-socialismo, nem reme- fers Pol enon, para que os senhores feconhecam, em Berlim ou em Moscov oque Detroit, com Ford, jé havia ensinado” (Devaux, 1959 ©). ve Drovavelmente nenhun dirigente trabalha com tanto empenho ¢ eficiia quinte aquele que | irige seu proprio neg. E precio dar mosras de entusismo edeterinasso| J Ele conta 0 resul- ag canta oesfergo, © problema da grande empresa, portanto,€ car condigies de trabalho nas Gals 0 executivo seja, 0 maidmo possvel, seu proprio patio, As melhores SETS conseguem fazer {Eso pondo cada executive numa situagao tal que ele seja plenamente responsivel por seus atos ¢ seus resultados” (Bower, 1968 ©). jo Emergéncia de uma nova configuracao ideoldgica liagdo também se caracterizam por acabar com a promogao por antiguida- de que 96 recompenta a fidelidade — valor doméstico por exceléncia mas nao a eficiéncia, bem como de reduzir 0 papel, injusto, das relagoes sociais | no sucesso de carreirat. | lids, é nesses temas que a discussao do “caso francés” se torna mais es- | pecifica. A eliminagao dos comportamentos vinculados a uma logica domés- tica é tarefa urgente na velha Europa, especialmente na Franca, ainda im- pregnada por um passado feudal de aliangas e privilégios. Por toda parte se \ encontram resquicios do Antigo Regime, e, seguindo o exemplo dos Estados Unidos, que tiveram a sorte de nunca terem sido submetides por esse tipo de regime e de terem sido constituidos jé de inicio como sociedade de iguais, 6 urgente darlhe o golpe de misericérdia. A adogao dos métodos america- nos, mais democraticos, mas também mais eficazes, é também sentida na Franca como uma quéStao de sobrevivéncia, pois o poder dos Estados Uni- dos é tal, que os autores franceses tém medo de nao conseguirem resistir a uma invasdo econémica (atingir a “eficiéncia americana”, mas “sem coloniza- “<0” [Froissart, 1969 ©]. Ver também a obra de Jean-Jacques Servan-Schrei- ber [1967 ©], O desafio americano, inteiramente dedicada a esse tema)*“*. Nos anos 60, a valorizagao do mérito se intensificou entre os mais con- -victos criticos do diploma por ele proporcionar vantagens para a vida inte’ ra‘. E forgoso constatar que pelos menos nesse ponto os reformistas da épo- ca fiacassaram, pois a ciitica caminhou até nossos dias quase sem mudangas- Na Franga, um certo conservadorismo pautou, durante muito tempo, o ritmo das promosies por coisas como antiguidade, fidelidade e — cabe dizer ~relagdes sociis (nas ‘quais o nascimento e as Spinides de classe valer mais do que o earéter)” (Bleton, 1967 ©) Eo queexplca a dferenca de aitude entre trabalhadores europeus ¢tabalhadores americanos. ‘Numa sociedadejover como a dos Estados Unidos; o peso das tradigbes os privilégios” reditatios’ so menores do que na Europa; [..] Numa sociedade envelhecida como a Europa, as barteiras socials Soo grandes; a permanéncia dos privilégios, mais intensa;e a oposito entre as classes, mas profunda” (De Woot, 1968 ©). vo oniesar nivel se observa, na maioria das sociedades tradicionals, atendéncia [..] a classfcar 3 |. . pessoas em categorias estaveis (castas sociais ou de elite), a venerar a estabilidade, a vincular a sorte de | Eada pessoa As suas caractersticas consideradas essenciais, mais do que & su ‘adaptagdo pritica a uma \ ago eficaz” (Gelinier, 1966 ©). “4"Na maioria das empresas americanas, a autonomia de agao € maior do que nas ew ppeias. Tal- ‘vez porque, como dizia Crawford Greenewalt,nossos métodos em negécios encarert © espirito da Re- Volicdo Americana, do modo como ele € enunciado na Declaragio de Independéncia ¢ 1 Constitui- (do. Seja como for, a prética de negécios na Europa é tl que a diregdo baixa dretrizes ‘mais detalhadas ‘eexerce um controle mais cerrado” (Bower, 1968 ©). Vimnos que, carecendo de citérios objtivos para apreciar as aptiddes dos execattt & sendo brigades a recorrer 3 intuigéo sobre o valor pessoal dos individuos 08 pales atribuem importaneia xcersva aos diplomas, como se ofato de ter passado um dia num exame fosse prova irrefutavel da ca- pacidade de ocupar postos elevados na hierarquia” (Froissat, 1969 ©). oe Emergéncia de uma nova configuragao ideolégien | cesso de simbolos retrégrados’ de dominagao, que se evite passar Por cima Jos subordinados, dirigindo-se diretamente as suas equipes’ mas sem sunea eliminar ou transgredir a hierarquia. Ao contrario, ela deve se fun- damentada no mérito e na responsabilidade, ganhando nova legitimidade @ perdendo os vinculos domésticos que a tornam ineficaz e injusta. Também se deve notar que o projeto dos anos 60 foi realizado em | grande parte, visto que nos textos da época, que lemos, ainda se encontram. | frequentemente formas de deferéncia e expressdes de autoridade perten- | centes ao mundo doméstico, mas que depois desapareceram da literatura \ de gestdo empresarial. As dificuldades da desvinculagao em relacdo a0 mundo doméstico, inclusive naqueles que s40 porta-vozes da transforma- cdo, mostram, mais uma vez, a ancoragem da literatura de gestao empre- sarial numa realidade em que € preciso modificar as formas (e nao so ma- i nipular os signos) € ofnferem sinceridade aos autores quando estes expres sam 0 intuito reformista, pois na heranca doméstica eles selecionam com cautela (de modo mais ou menos inconsciente) aquilo que convém conser- var, aquilo a que eles continuam ligados € aquilo que é importante rejeitar. ‘Assim, por exemplo, Octave Gelinier (1963 ©), futuro diretor-geral da empresa de consultoria Cegos, onde atua como formador e engenheiro consultor desde 1947, liberal convicto e incansdvel defensor, na Franga, da administracao por objetivos, dedica varias paginas 4 espinhosa questao da “demissao dos executivos”. No final, devemos conciuir que cabe demitir um executivo, mesmo competente e eficiente, que tenha cometido malver- sages, por menores que elas sejam, € que, em compensacao, é injusto de- mitir um “velho colaborador que se tornou ineficiente”*. Ai esto duas vio- lagdes ao principio de eficiéncia, uma em nome da moral, outra em nome da fidelidade, que ele nao teve dificuldade em dissimular depois, ao men- cionar os riscos de desmotivacao dos outros executivos da empresa e, Por conseguinte, fazendo referéncia & obrigagao de eficiéncia: 0 argument re- térico segundo 0 qual “a ética compensa”, que alcangara grande sucesso com o movimento da ética nos negécios dos anos 90 (no qual, alids, o mes- {A posigdo ocupada no organograma indica suficientemente 6 nivel hierdquico, sem simbolos nites convo a5 diferengas na mobilia das salas. Minimizar esses simbolos néo @ eliminar a nogio de nivel hierarquico, inerente & empresa pelo fato de certas fungBes sere ‘mais essenciais do que outras para o cumprimento dos objetivs ou pelo fto de certas pessoas contribuirem mais do que outras para fixar esses objetivos” (Hughes, 1969 ©). b-O chefe, depois de definir as atribuicbes © os poderes de seus subordinados, nao deve intro- meter-se nas dreas delegadas” (Hugonmier, 1964 ©). 2 Domits pura e simplesmente o velho colaborador, que, moralmente, ¢ um dos fundadores da empresa, descarté-lo como ferramenta que ficou iit € cometer un ‘ma agao que provocaré, entre os em oe um cma dezastoso de inseguranca: prtanto, €inaceitavel”(Gelinier 1963 ©). cl ee Emergéncia de uma nova configuragio ideolégica grupos e de multinacionais, que, apesar de todos os esforcos, dificilmente prescindiro de hierarquias. Os motivos alegados para justificar essa carga anti-hierarquica muitas vezes sao de ordem moral e fazem parte de uma recusa mais geral as relagdes dominantes-dominados*. Também estao rela- Gionados com uma evolucao inelutavel da sociedade: os seres humanos ja nao querem ser comandados nem comandar’: A elevacao geral do nivel educacional explica, para outros, por que a hierarquia se transformou num- modo de organizagao superado’. Embora a hierarquia seja 0 alvo favorito, também ocorrem ataques a planificagdo, considerada rigida e baseada em dados quantitativos frios, que nao expressam a “verdadeira realidade”, e a todas as instancias associadas A autoridade (patroes, chefes, ordens etc.). As vezes sao utilizadas compara- ges desagradaveis com 0 exército, comportando, de preferéncia, referéncias os suboficiais - objéfos que servem de contraponto, simbolos dos peque- aoe chefes autoritérios —, a0 paso que, nos’afios 60, a metéfora militar (@ propésito, bastante rara) tendia mais 2o oficial a servigo de seu pafs, segun- do uma temética muito corrente nos anos 30-50 (ver, por exemplo, G. La~ ‘nirand, Le rile sociale de Vingénicur (O papel social do engenheirol, calcado no Réle sociale de Ioficer [Papel social do oficial], de Tyautey). Nao sendo, em momento algum, apenas criticos, os autores de gestao empresarial dos anos 90 imaginam — como veremos melhor adiante ~ grande ntimero de no- yas formas de organizacao que se afastam ao maximo dos principios hierér- quicos e prometem igualdade formal exespeito as liberdades individuais. Outro trago marcante dos anos 90 é que o tema da concorréncia e 0 da mudanca permanente e cada vez mais rapida das tecnologias ~ ja presen- tes nos anos 60 — ganham uma amplitude sem precedentes, e em pratica- mente todos os textos se encontram conselhos para a implantagao dessa 20 organograma e a hierarquia piramidal[.] designam aqueles que saber aqueles que po- dem ¢ aqueles que devem ‘geri, em oposiggo aqueles que néo sabem e no podem. Mesmo com a se can wontade do mundo, nessas condigées, entre as das categorias de pessoas, s6 pode ovo tina relagdo desprezadores-desprezados, pois aque que’nio saber e no podem’ so, jade saida, ~ tilizados” (Aktouf, 1989 ©). Tteditivel rump a Uberdade de escolha em todos os campos aimenta, com o ind\- idualnono crescent, a exighnciae a possibilidade de autonomia pessoal. tempo dos chefes autor thos passou. Nao s6 os subordinados jf nao acetam a autoridade, como também os proprios superiores 108 Passo ala ver menos capazes de assumi-la, no préprio momento em que se teria mais neces Sade de disciplna para fica 3 altura da complexidade das exigincias do ambiente” (Crozier, 1989 ©). ae Sento constituda por especialistas’eruditoy, a organizacio moderna deve ser uma organizs- co de iguais, de colegas, de associados. Nenhum conhecimento é predominan's, cada conhecimento Syulgedo segundo sta contribuigio para a obra comum, ¢ nao segundo uma Preerss superioridade csr Renato, Diso realla que a otganizagio modemma no pode ser uma organtza¢io de patties tc subordinados, mas uma equipe organizada” (Drucker, 1993 ©) he 99 7 Emergéncia de uma nova configuracio ideolégica ‘As coisas sao diferentes nos anos 90. Encontram-se, no Novo Mapa" miindi, os “velhos pafses capitalistas” enfrentando a emergéncia de um terceiro polo capitalista na Asia, com o Japao em primeiro lugar — cujo su- cesso na penetragao no mercado americano provocou um verdadeiro cho- que e alimentou grande quantidade de mudangas administrativas -, segui- do pelos quatro dragées (Taiwan, Coreia do Sul, Cingapura € Hong Kong), em meados dos anos 80 achava-se que durante muito tempo eles seriam ts tinicos emergentes. Durante os anos 90 se somarao 0s paises do Tercei- ro Mundo (em nosso corpus sao poucos OS seus vestigios, pois este se de- tém em 1994), que abandonaram a politica de desenvolvimento com subs- tituigdo das importagdes, adotando a politica de concorréncia dos paises desenvolvidos e a politica de exportagio, & semelhanga daquilo que cons tituiu o sucesso do Japfo e dos quatro dragées (primeiro na Asia, em seguida na América Latina e, depois da queda do muro de Berlim, nos ex-paises co- munistas, aparentemente convertidos a0 capitalismo); a Africa continuou nao figurando na representacao dominante. Assim, no corpus dos anos 90, a Africa negra e a América Latina também continuam ausentes (uma tini- ca mengao ao Brasil). A Asia, em compensacao, entra em massa, com 24 mencoes (14 das quais pata o Japao), e os paises da Europa ocidental esto mais presentes: Alemanha (13), Itélia (6), Suica ©), Espanha, Irlanda, Sué- cia (3), enquanto os outros paises sao citados uma tinica vez. A Franga, com 82 mencies, e os Estados Unidos, com 24, também fortaleceram sua pre- senca. A Unido Soviética (ou os paises dela oriundos) e os ex-paises do Leste desapareceram. A evolucao das mengdes dos paises nos dois corpora di uma boa medida da “globalizacao” (bem relativa) na representagao que 0s autores fazem da gestao empresarial. Os patticipantes ativos do jogo capitalista da concorréncia deixarao de ser — conforme dizem ~ algumas centenas ce milhes de pessoas ¢ logo passardo a ser varios bilhoes (Thurow, 1997). Com essa ideia na cabega, 0s autores dos paises desenvolvidos transformam a concorrénéia em ponto de grande importancia de sua argumentasao, principalmente porque a desa- celeracao do crescimento dos tltimos vinte cinco anos € © aumento do ntimero de desempregados reforcam a convicgao de que o desenvolvimen- to econémico se tornou mais dificil, e a luta econémica, impiedosa. Os progressos incessantes da informatica, da imagem e do som (do “vir- tual”), por outro lado, sao frequentemente citados e constituem os exemplos tipicas que deverdo servir de molde a todas as evoludes tecnoldgicas. Os dispositivos propostos pelos autores dos anos 90 para fazer face as questées identificadas formam um impressionante amontoado de inova- cSes administrativas, que podemos tentar articular em torno de algumas 101 Emergéncia de uma nova configuraciio ideolégica uma mirfade de fornecedores, servigos terceirizados, prestadores de ser” Fiigos e trabalhadores temporérios que possibilitam variar os efetivos segun- ‘No a atividade, empresas coligadas. Fala-se entao em rede de empresas’, (Os proprios trabalhadores — conforme nos dizem — devem ser organi- ~zados em pequenas equipes pluridisciplinares (pois elas s0 mais compe- tentes, flexiveis, inventivas ¢ aut6nomas do que as secoes especializadas dos anos 60), cujo verdadeiro patrao € 0 cliente’, tendo um coordenador, mas n4o um chefe*. O processo de transformacao da antiga organizagao para fazé-la coin- cidir com esse modelo chama-se reengenharia (reengineering) (Hammer & Champy, 1993 ©). Além disso, as equipes nao sio compostas apenas de pessoal permanente da empresa. Nelas se encontram fornecedores, clien- tes, consultores, espgcialistas externos. Eos membros de uma mesma equi- pe nao funcionam gbrigatoriamente juntos do ponto de vista fisico, pois os progressos nas telecomunicacoes Ihes permitem trabalhar:a distancia’. O trabalho ai também se dé em rede, pois as fronteiras da empresa se tornam indistintas, visto que a organizacao parece feita apenas de um acimulo de vinculos contratuais de duragao maior ou menor. O desenvolvimento dos produtos novos gracas a engenharia simultanea (Midler [1993 ©] fala de engenharia “concorrente”) € 0 exemplo tipico da equipe ideal, inovadora por definicao, miiltipla, aberta para fora e focalizada nos desejos do clien- te: As equipes sao o lugar da ‘autogesto € do autocontrole. Emvithude desses novos dispositivos, 0 principio hierarquico € desmon- tado, e as organizagdes se tornam flextoeis, inovadoras e muito competentes. a "As organizagées evoluem para un modelo constituido por és ries de elementos: umm niicleo central permanente formado por pessoal administrativo e pessoas com ‘especialidades consideradas e5~ tratégias (no delegaveis exteiormente), uma rede de onganizasies.¢ ‘nao uma hierarquia tradicional, © crarsérie de subsistemas fornecedores satélites (empresas, ou individues trabalhando a distancia), com garantiavaravel de atvidade (e emprego)” (HEC. 1994 ©). 1b “O organograma da empresa seréinvertido: os clientes ficario no venir dessa pirémide inver- tia; abaivo Ficard 6 pessoal em contato com a clientela; mais abaixo,estars 2 direcio, cujo papel & tra- pathar para o pessoal da primeira linha” (Tapscott e Caston, 1994 ©). 5 As equipes de agio de processo, formadas de varias pessoas de uma £6, nao tém necessi- dade de patroes; mas sim de treinadores(..] Os patroes radicionais define © distribuem o trabalho. ‘hs propras equipes se encarregam disso. Os pales tradicionais supensebon fiscalizam, controlam ae ere akatlo' medida que ele passa de um posto de trabalho para outo. As proprias equipes Se encarregam disso. Os patides tradiionais quase nao tem lugar nom ‘ambiente reconfigurado” (Hammer e Champy, 1993 ©). 3 “As tecnologias informaticas e telemticas separam o lugar € 0 momento ‘de produgao em rela- 0s atividades de suporte,preparaio e back ofce. Por isso cada vez Dee TS trabalhard‘no escritério’ $rabalhar permanentemente na fdbrica seré apenas um caso- limite “Também nela, a heranga da era in- Pa ae re er Tecnologias nao tem razdo para se instaurar definitvafnente, Muutos exes repre- scntantes, agentes de manutencio e treinadores trabalharao longe do empregador. Est chegando a ‘empresa virtual” (Morin, 1994 ©). a 103 Emergéncia de wma nova configura ideolégica mento dos trabalhadores sem recorrer & forga, mas dando sentido ao tra~ balho de cada um**. Gragas a esse sentido compartilhado, ao qual todos aderem, cada um sabe aquilo que deve fazer sem que ninguém precise mandar. Imprime-se com firmeza uma direcdo, sem set preciso recorrer a ordens, ¢ 0 pessoal pode continuar a autogerir-se. Nada The é imposto, pois ele adere ao pro- jeto. O ponto fundamental desse dispositivo é o lider, precisamente aquele que sabe ter uma visao, trans! iti-la e obter adesao dos outros". Provavel- mente esse € 0 ponto mais fraco dos novos dispositivos, pois tudo recai nos ombros de um ser excepcional que nem sempre sabemos formar ou mes- mo recrutar, sobretudo em quantidades suficientes, pols todas as empresas precisam dele. De modo mais geral, a nova gestao empresarial esta povoa- da de seres excepcjonais: competentes para numerosas tarefas, aperfei- coando-se continudmente, adaptaveis, capazes de autogerit-se e de traba- Thar com pessoas muito diferentes. E, no final, nos dizem pouca coisa sobre a contribuicao das empresas para o desenvolvimento dessa categoria dé tra- balhadores: as organizagées vao tornar-se “capacitantes”, a organizagao das competéncias vai tornar-se ponto essencial, e novas profissGes S40 cria- das, como a do coach, cujo papel € propiciar acompanhamento personali- zado, que possibilite a cada um o desenvolvimento de todo o seu poten- Gal, Na verso que se esforca mais por designar uma posicao institucional para os coaches, estes so responsaveis pelo treinament .. Em vista do conjunto das reformas propostas pelos autores de gestao em- presarial, nao admira que o executivo, ‘tal como era concebido nos anos 60, Pomece a perder terreno. O proprio termo cadre, na Franca, que pressupoe hierarquia e status, passa a Ser rejeitado. Os cadres passam a ser vistos como agentes da burocracia que precisa ser destrufda. Nesses discursos, 0 status do a “As visdes mais ricas € ‘mobilizadoras s40 as que tem sentido, que respondem a aspiragbes” @ellenger, 1992 ©) 4 z +A visio confere sentido; ela aponta para o futuro: transcende os objelivos de curto prazo, inse- “nN cn et vo x6 a mis as AMD A PON ‘im como os grandes desafios, a visio desperta a capacidade coletiva” (Crozier e Séieyx oats 1994 ©), "0 lider é nomeado pelo grupo, € aquele com 0 ‘qual, consciente ou inconscientemente, todos se vdenificarn, Graas& ua infuncia, 3 ua arte de vis « 35 508 orientagSes, ele eria uma corrente {que incta cada um a superagio, 8 confianga ¢ 3 iniiativa” (Cruellas, 1993 ©). Mat ae dere sabem estimullar os outros COM & Pujanga¢ 9 STINE AT de sua visio, dando on ena eres to tazeno algo de importante que poder ar epnons oe 50 batho” (Moss Kanter, 1991. ©). e “Todas as formas de treinarmento -mencionadas acima devem ser geridas, e um servigo de for- ‘magio dependente de um depertamento do pessoal nao cumpre e552) tarefa. Assim, uma populacao res- trita de gestores realizaré os processos de treinamento titeis & empresa. E tarefa desses gestores-forma- dores: 0 acompanhamento do desenvolvimento dos empregados” (Aubrey, 1993 ©). 105 Emergéncia de uma nova configuracio ideoldgica sigao aos engenheiros, mais voltados para a técnica. Do mesmo modo, a sgestao empresarial (management) contrapoe-se a “administracao”, tal como a realizado eficiente das capacidades presentes nos seres humanos se dis- tingue do tratamento racional de objetos e ntimeros. Qs autores franceses dos anos 90, assim, utilizam o terme ‘manager em oposi¢ao ao termo cadre para demarcar as qualidades das-pessoas mais ajustadas ao estado atual do | capitalismo e ao ambiente feito de vincertezas” e “complexidade” no qual estao imersas as empresas. Os managers nao procuram dirigir nem dar or- dens; nao esperam ordens da direcao pata aplicd-las. Entenderam que es ses papéis esto superados. Tomam-se ‘entio “animadores de equipe” (ani- mateurs d’équipe), “catalisadores” (catalysateurs), “yisiondrios” (Visionnaires), “coaches” (coachs), “inspiradores” (donneurs de souffle). “inspirador” é uma personagem propria de Hervé Sérieyx (©). Tal como outros autores dos ‘anos 90, que careceth de vocabuldrio para designar o novo her6i da empre- sa, ele foi levado a forjar uma expresstio bem sui generis. Rosabeth Moss Kanter, por sua vez, fala dos “atletas da empresa”; Meryem Le Saget, de “manager intuitivo”; Lionel Bellenger, de “pros” (profissionais qualificados). Outras designagées, como coach, animador ou “*parteiro”, si0 usadas Pot varios autores. Como jé ndo podem se apoiar na legitimidade hierdrquica, nem mani- pular as esperangas de carreiras, como no passado — pois, com a redugao da altura das pirmides, existem, muito menos oportunidades de “subir” dentro da empresa -, como precisam por para trabalhar em seus projetos todas as espécies de pessoas sobre as quais tém pouco poder formal, os gerentes de projetos s6 podem impor-se pelas “competéncias” e pelo “carisma”, circuns= ever os atores gracas a eficacia de sua “sede de relagdes pessoais”, que Ihes propicia informagbes e auxilio; precisam mobilizar as energias pelo poder de Sua “visdo” e pelas suas qualidades de “parteiros” do “talento” alheio e de seres capazes de desenvolver potenciais. & de suas qualidades pessoais que eles extraem a autoridade que os transforma em “Iideres”, nao de uma po- sigdo estatutéria qualquer. Alias, eles recusam os “simbolos do poder” (tais como: grande nimero de secretarias, tlevador e restaurante privativos, salas suntuosas). A autoridade que adquirem sobre suas equipes esta ligada a eonfianga” que Ihes é depositada, gragas 3s Sua qualidades de “comunica- cao” & “atengao” que se manifestam no contado direto com os outros. Nem sequer contamos com o voeabulro necessinio PAM falar dessas novas relagbes. Os ter- mos superiores’e‘subordinados’ parecem pouco Previss © ste as palavras’ patrao’e empregadios’im- plicam uma nogio de controle e direitos que, n= Pidade, os gestores nem sempre rem” (Moss Kantet, 1991 ©). jo Emergéncia de wma nova configuragia ideol6gion 109 \ quisas independente ou a uma universidade, sendo consultado sobre pon- tis especificos. Nao se exige que dirija equipes, pots esse 60 papel do ge- | rente de projeto. Para que cada um possa desenvolver 0 talento que Ihe é proprio da maneira mais produtiva — © gerente de projeto na mobilizacéo das pessoas € 0 especialista no desempenho técnico —, os autores de ges- tao empresarial consumam a ruptura entre os dois perfis, ao passo que nos anos 60 esperava-se poder fazer de todo engenheiro competente um ge- \ rente de projeto, gragas a um bom “sistema de administragao” (bom pla- i nejamento e bom proceso de fixagao de metas’). Embora, dentro dos conhecimentos técnicos uteis a diregao de uma empresa, a gestio empresarial, no que se refere ao controle e ao dominio | do fator humano, seja equivalente aquilo que representam as ciéncias da engenharia para as maquinas ¢ as coisas, cabe evidenciar 0 fato de que a nova gestao empresfial ainda é gestao ‘empresarial, no sentido em que aca~ amos de defini-la, ou seja, no sentido de continuar a encertal dispositivos de controle, ainda que de natureza diferente dos dispositivos associados ao segundo espirito do capitalismo. De fato, pode-se considerar a histéria da gestdo empresarial como @ historia da sofisticagao permanente dos meios de dominar ‘aquilo que ocor- re na empresa e em seu ambiente. Se, em Taylor € Fayol, considerados os fundadores da gestdo empresarial como disciplina, os sere jnumanos S40 0 ~~ ponio principale aplicagao-dos controles (o par homent-maquina em Taylor, organizagao geral em Fayol), mais tarde, a vontade de dominio, com certs subdisciplinas da gestdo empresarial, se estenderd para além do controle das maquinas e do pessoal. Com a estratégia empresarial, desenvolveu-se o dominio dos mercados e da concorréncia; com 0 marketing, dominio do circuito de distribuicao, dos clientes e de seus comportamentos aquisi- tivos; com a gestao de compras, 0 controle dos fornecedores; com as rela- Ges pitblicas, o da imprensa e dos poderes politicos. Do mesmo modo, no pessoal, cada categoria passou a ser alvo de dispositivos especificos: o taylo- Emo foi inventado para controlar os operarios, ¢ 4 administrago por ob- jetivos, para enquadrar os executivos’ hoje em dia, 0s dispositivos da “go- ‘yernanga corporativa” (corporate governanice) destinam-se ao controle dos mais altos dirigentes das grandes empresas. FTradicionalmente, o jovem engenheio, ao longo de sua cares podia prever promogbes su~ cessivs, como chefe de ses30,chefe de departamento € talvez até diretor[.-]. Assim se expressa 0 Te- se ent do mézito e este & 0 simbolo do sucess. [.] Um Por especialista no se torna neces

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