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Resiliência e mecanismos de proteção da criança e do

adolescente

Viver num mundo em que as demandas são cada vez mais


intensas e as adversidades exigem respostas prontas e diferentes
pode ser demasiado para a maioria das pessoas. Essas situações
acabam gerando tensão, rebaixamento da imunidade e,
conseqüentemente, adoecimento físico. Dependendo da estrutura do
sujeito, esses enfrentamentos cotidianos podem causar algum tipo de
transtorno psíquico (leves e passageiros ou graves e duradouros),
exigindo tratamento adequado.

As crianças e os adolescentes, além de sofrerem tensão indireta,


através da tensão dos adultos, levando-as também a algum tipo de
adoecimento, sofrem também das demandas dos adultos sobre elas,
possuem suas próprias exigências e tentam se adaptar a essas
situações. A intensidade da tensão sobre elas e a forma como reagem
e tentam responder ao ambiente em que vivem vai depender da
constituição desse mesmo ambiente, de como ele cobra, mas apóia,
de como ele impõe um viver, mas também o ensina, de como oprime,
mas ao mesmo tempo alivia.

A sociedade muda o tempo todo, mas ao mesmo tempo tenta se


conservar. Novos aspectos sociais, culturais, econômicos, jurídicos
são introduzidos no cotidiano das pessoas; no entanto, parte da
sociedade luta para manter velhos hábitos, velhas regras, antigas
visões de como as pessoas devem se comportar, causando um
embate acalorado, e algumas vezes violento, entre os grupos
inovadores e os grupos conservadores.

Dentro do campo das idéias inovadoras está o conceito de


resiliência, demonstrando que adaptar-se à realidade não é ceder
totalmente a ela, submeter-se, usar somente respostas prontas e
universais, acreditar no que a maioria impõe como crença: é sim
encontrar seu próprio caminho em meio às turbulências pessoais e
sociais, construindo suas próprias respostas e mantendo-se vivo, em
todos os sentidos.

A resiliência mostra ainda que o foco nas potencialidades é a


melhor maneira de promover enfrentamentos saudáveis e adequados
às adversidades do dia-a-dia e da vida como um todo; as pessoas
possuem fraquezas e às vezes ficam presas a elas, sem enxergarem,
e não permitindo que se enxerguem nelas, suas fortalezas e como
fazer uso adequado delas. Esse novo jeito de olhar, surgido a partir
dos anos 80, permite visualizar que, independentemente da
adversidade presente em algumas situações, existem mecanismos
protetores que logram proteger os sujeitos, criando neles a
possibilidade de ser tanto vulneráveis aos efeitos da adversidade
quanto resistir e construir positivamente a partir dela, revertendo seu
caráter de negatividade.
Os estudos de resiliência em geral, portanto também com
crianças e adolescentes, apontam sempre para uma dualidade que
movimenta a vida do sujeito, balançando ora para o saudável, ora
para o adoecimento. Essa dualidade gira entre o que se considera
risco e o seu oposto, proteção. Afirma que existem fatores de risco e
sua contraposição, fatores de proteção, atuando sempre na vida do
sujeito. Mostra ainda que esses fatores são flutuantes, não atuam por
si mesmos, mas necessitam estar intrincados e contextualizados,
levando-se em conta a cultura, o tempo e a estrutura da comunidade
em que o sujeito vive. Ou seja, que um risco não é em si mesmo, mas
é dentro de certas prerrogativas; que a proteção não é em si mesma,
mas sempre focada. Ambos possuem uma construção social, variando
de época e de cultura.

O que o conceito de risco indica é que existem fatores que


podem predispor o sujeito para o adoecimento; o que o conceito de
proteção indica é que existem influências que modificam e melhoram
a resposta de uma pessoa a uma situação de adversidade e operam
em pontos críticos durante a vida do sujeito (no caso dos fatores de
proteção, não significa necessariamente que eles representem
somente experiências agradáveis; eles modificam de forma positiva a
resposta do sujeito, mas não necessariamente diminuindo seu
sofrimento). Nesse cenário, a resiliência é considerada como o
resultado final de mecanismos de proteção que não eliminam os
riscos experimentados, mas encorajam o indivíduo a lidar
efetivamente com a situação e a sair fortalecido da mesma.

O que as pesquisas mostram é que diferentes fatores interagem


entre si ao longo do tempo, alterando a trajetória do sujeito. Nesse
sentido, opta-se por utilizar os termos mecanismos de risco e
mecanismos de proteção, mecanismo tendo essa idéia de algo que
está sempre em movimento, em ebulição, dando voltas, fixando-se,
confluindo-se e mobilizando-se. São esses mecanismos que vão
apontar se determinados fatores em um determinado sujeito
(indivíduo, família ou comunidade), com sua cultura, no seu tempo,
serão considerados ou não como risco; se numa determinada família,
para uma determinada criança, se alguns fatores podem ser
considerados de proteção ou não.

Mecanismos são processos que ligam determinado risco às suas


conseqüências, possibilitando sua compreensão mesmo quando as
conseqüências variam, permitindo essa visão de duas maneiras:
como mediadores (nesse caso os mecanismos são dinâmicos e não
diretamente observáveis) ou moderadores (amplificando, reduzindo
ou mudando a direção da correlação entre riscos e respostas). Nem
sempre isso é claro para o observador, pois os mecanismos de risco
envolvem uma rede complexa de acontecimentos anteriores e
posteriores ao evento-chave (por exemplo, uma tentativa de suicídio
do adolescente e todos os fatores que o levaram a esse momento).
Considera-se importante identificar os mecanismos de risco e
mecanismos de proteção como forma de antecipar resultados
negativos ou positivos no processo de desenvolvimento da criança e
do adolescente, não se esquecendo de levar em conta os fatores
culturais e comunitários com relação a que tipo de variável se
considera risco ou proteção. Talvez o mais adequado fosse investigar
os mecanismos situacionais e do desenvolvimento que possam
indicar o modo como os fatores de risco e de proteção funcionam,
pois esses fatores atuam em momentos e em situações pontuais da
existência do sujeito, exigindo dele uma resposta que geralmente não
é contextualizada, mas fruto de suas experiências com situações de
adversidade anteriores, pois tanto a vulnerabilidade quanto a
proteção são processos interativos que se relacionam com momentos
específicos da vida de cada pessoa, assim como acontece com a
resiliência. A resiliência e a vulnerabilidade são, portanto, resultados
de combinações entre os variados processos de risco e de proteção
que interagem em contextos específicos da vida de cada um.

Apesar dessas considerações colocadas pelos estudiosos de


resiliência, podem-se apontar alguns mecanismos de risco e
mecanismos de proteção que podem ser gerais, aceitos em todas as
comunidades e em todas as culturas, e girando em torno das crianças
e dos adolescentes. Mecanismos familiares, da escola, da
comunidade proximal são os mais citados.

Nesse sentido, pode-se afirmar o seguinte: mesmo em meio a


adversidades constantes, as crianças e adolescentes que se
desenvolvem adequadamente são aquelas que contam com laços
afetivos positivos com pelo menos um cuidador familiar (um dos pais,
um irmão, avós ou pais substitutos); experienciam poucos e curtos
distanciamentos de seu cuidador primário, principalmente durante o
primeiro ano de vida; encontram apoio emocional na comunidade,
geralmente de um professor, de amigos íntimos ou de um pastor ou
padre; possuem atributos individuais, como flexibilidade, confiança e
capacidade para buscar apoio na família ou na comunidade; e
possuem sentido de humor e de criatividade. Os fatores individuais e
os familiares ou comunitários sem complementam, pois nada adianta
uma criança ter habilidades pessoais se não consegue respostas
positivas no ambiente em que vive.

Dinamicamente isso representa os cuidados constantes dirigidos


às crianças e aos adolescentes por seus responsáveis (em todos os
níveis de sua sociabilidade), as expectativas positivas neles
depositadas, suas relações de apego seguro, a coesão entre os
membros da família, a existência de pelo menos um tutor de
resiliência interessado no cuidado da criança e do adolescente, capaz
de substituir, momentânea ou permanentemente, os seus
responsáveis diretos.
Podemos citar ainda alguns fatores de risco familiares, tais como
comunicação crítica exagerada e falta de respeito, indução de
sentimentos de culpa como forma de controle, supervisão deficiente
por parte dos pais, falta de limites ou limites não claros, etc; e seus
opostos, funcionando como fatores de proteção, como paternidade
democrática, adultos sempre acessíveis, responsáveis e atentos às
necessidades das crianças e dos adolescentes, regras claras e
realistas, expectativas altas, porém apropriadas à idade,
fortalecimento do autocontrole, da competência social e da auto-
estima, etc.

Por fim, pensando em medidas de prevenção de adoecimento de


crianças e adolescentes, uma intervenção psicossocial deve
considerar os fatores proximais de uma forma integral, ou seja,
visualizar não somente os atributos do indivíduo, mas também da
família, da escola e da comunidade como um todo.
O papel da comunidade e da sociedade deve sempre ser levado em
conta e ser cobrado, pois essas medidas preventivas para serem
exitosas dependem que o desenvolvimento da criança e do
adolescente se dê em um ambiente em que eles possam
experimentar, calculando os riscos e ao mesmo tempo sendo
protegidos pelo seu entorno.

Para promover a resiliência em crianças e adolescentes é


possível de se identificar quatro mecanismos gerais de proteção que
podem ser fortalecidos por meio de intervenções: 1-reduzir os
mecanismos de risco; 2-reduzir as reações em cadeia que aumentam
a possibilidade de outras crises; 3-fortalecer os mecanismos
protetores e reduzir as vulnerabilidades; 4-encorajar a estima e a
eficácia familiares e individuais com o enfrentamento bem sucedido
do problema.

Podemos citar como características da criança e do adolescente


resiliente a capacidade de enfrentar de forma pró-ativa os problemas
cotidianos, controle adequado das emoções em situações difíceis,
demonstrando otimismo e persistência frente ao fracasso, habilidade
para manejar de maneira construtiva a dor, a frustração e outros
sentimentos perturbadores, habilidade para obter apoio dos demais e
para estabelecer amizades duradouras no cuidado e apoio mútuos,
competência nas áreas social, escolar e cognitiva, que lhes permitem
enfrentar criativamente os problemas, uma maior autonomia e
capacidade de observação e sentido de humor.

QUEM DESEJAR A BIBLIOGRAFIA UTILIZADA PARA A TECITURA


DESTE TEXTO É SÓ ME PEDIR

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