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E. RIA? CONG APRECE.NDER ESSA MaTeRT i ola Andlise Discursiva do TEXTO na Esct SOLANGE LEDn GaLLo Este exemptar 4 redegao final da t, defendida por ° ow sda pola Comissio J 1.24149. ies Smt de hanes teimett: Mi nroke Ulgedora eg UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS (UNTCAMP) Texto ECE. NDER ESSA MaTeERIAzy Andlise Discursiva do TEXTO na Escola INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM (IEL) LINGUISTICA TESE DE DOUTORADO a oRreNTaBORA: nrA DRA ENE & [aRLaNOY { AGRADECIMENTOS Esta piigina estava reservada aos agradecimentos Giversos pera as pessoas aue tornerem possivel este trabaino, sega através de observacees em relacio 4s idéias aqui apresentadas, seja através de uma acothida calorosa nos dois anos que passei pesquisando na Franga, seJa através de deeafics motivadores que propuseram-me aqui no Brasil, seja finalmente através dd ensinamento do novo. Entre essas pessoas, primeiramente vém meus dois orientadores: Bhi ORLANDI, aqui no Brasil e Paul HRNRY, na Franga, todos o¢ dois incanséveis na dedicacto que dispenearam a esta pesquisa Mas devo agradecer ainda a Philippe COLOMINE, o professor to cheio de energia e carinho no seu trabalho com as criancas da escola priméria francesa onde recolhi os dados aqui apresentados; Roger TASTATRE, que teve tanta paciéncia em receber-me durante um ano nas suas salas de psicandlise, e com quem aprendi a mexer um pouguinho com os conceitos psicanaliticos que precisei mobilizar; Jacques RANCIERE que ajudow-me na aualificacag go trabalho e partictpou da banca de defesa; 4 Cléudia LEMOS, aue me é sempre uma energia positiva, uma motivacdo, uma instigadora, também & Suzi SPERBER, que tanto em Paris como aqui trouxe tanta confianca no trabalho, e sobretudo 4 Francine MAZIERE que fez tudo isso e mais, e mais, e mais Mas apesar de ter tanto a agradecer, e & tantos, eu venuncio a’ detalhar a intervenc&o de cada uma dessas pessoas ede outras nesse pereurso, para agradecer especialmente a minha amiga DENIDE MALDIDIER- Quando eu cheguei a Paris, era Denise que estava esperando-me no aeroporto. Depois ela explicou-me tudo sobre a cidade, para ter certeza que no final de uma Jornada chela ela poderia finalmente Geixar-me ao meu destino. Nessa ocasigo ela ensinou-me coisas surpreendentes para uma brasileir carte orange, carte bleu, tele carte, ete. Depois, foi ela ainda que ajudow-me a encontrar um apartamento em Paris, missto quae impossivel, mas néo para Denise. Foi também ela a fiadore do aparbanento. Foi ainda ela que serviu-me aquele ché quente nun domingo triste de saudade do meu fitho e do meu marido que ainda estavam no Brasil, e foi no seu ombro que eu chorei. Denise apresentou-me, no tempo que 14 fiquei, muitos amigos seus e muitas pessoas ligadas & Andlise do Discurso, e histéria da A.D., depois apresentou-nos cua mae, sua familia, depois ficou ao nosso lado durante esses dois anos, e vestia o Vitor com as roupas do seu sobrinho, e mimava Luiz com sues veceitas, e depois...,e depois..., € depois...Ela seguiu o desenrolar do meu trabalho, ela leu os rascunhoz, ela colocou-me perguntas —fundamentais. Por exemplo, um dia ela pediu que eu explicasse qual era a relacKo entre ae idéias que cu estava desenvolvendo em Paris, © as idélas da tese que eu havia defendido no Brasil. Essa quest&o forgou-me a refazer meu percurso © acertar as arestas. Colsas de Denise e de ninguém mais. Ela deveria fazer parte do juri de defesa desta tese no Collége International de Philosophie, no dia 10 de setembro de 1992. Ela recebeu, portanto, a versio definitiva do trabalho om Periestin no dia 19 de agosto © nesse mesmo dia ela enviou-me o bilhete que eu reescrevo: Ma chére Solange J’ai recu ton paquet juste au “monent od je quittaié Penestin pour aller au Colloque Saussure. Je I’ai parcouru de bout en bout (trés vite) et & quelques détails prés il m’a semblé avoir fait “un saut de géant"! L°intégration de Radio Cartable lui donne la chair qui Jui manquait. Je vais escayer de te le renvoyer au plus vite. muni de mes remarques et corrections. Bon courage. Je t“embrasse fort. Denise Somente cinco dias depois (no dia 25 de agosto) eu vecebi a versdo corrigida seduida ainda de um outro bilhete: Ma chére Solange Je cours 4 la poste avec ton manuscrit. Goume je te l’al dit dans ma carte postale, tu las considérablement améiioré en intégrant 1 expérience Radio~ Cartable. bes corrections que je propose portent essentiellement sur des questions de forme. Jvespere que tu pourres me lire et que tu seras d°accord. C'est trés génant de ne pouvoir discuter avec tol. Je te souhaite trés bon courage pour ta derniére course. Excuse-moi d’avoir pris quelques jours: au Colloque Saussure, ce n’étalt pas le réve pour se concentrer. As-tu des nouvelles de Paul? Je t’embrasse trés affectueusement, ainsi que luiz et Vitor. Je serai a Paris avant la fin de la semaine et je t’appellerai. Denise Depois de muitas chamadas telefénicas para seu apartamento na sexta-feira & noite, desisti e resolvi tentar novamente no dia seguinte. No sdbado pela manh&, Francine deu-me a noticia: Denise estava morta. Todas as sugestSes dadas por Denise estdo incorroradas A tese. Bu considero que teriem sido esses observactes que ela teria feito enquanto membro da benca exeminadora. Tu n&o sei como agradecer. Ka verdade eu nfo posao. Bu deixei Paria. Denise n&o estava no aeroporto. Eu nio voltarei & rua Navarre. Bu n&o esquecerei jamais. AGRADEGO FINALMENTE: & Unicamp e a todo pessoal do IEL que colaborou direta ou indiretamente para a realizagtio deste trabalho. a0 CNPq que financiou, para este projeto pessoal, dois anos de’ pesquisa na Franca. CAPES que financiou dois anos deste trabalho no Brasil. ao Collége International de Philosophie que concedeu-me @ honra de ser a primeira aluna a defender um trabalho naguela instituicdo e receber o primeira "Dipléme du Collége” PARA 0 MEU PAI SUMARIO ENTRODUGAD, . PRIMEIRA PARTE 0 SUJEITO DO DISCURSO...... 0 PROJETO RADIO CARTABLE. SEGUNDA PARTE SOBRE 4 TEXTUALIZAGA, SOBRE U PROCESSU DE AUTENTICAGAD E DE LEGITIMAGAD....123 SOBRE A ESTRUTURA E 0 EVENTO. CONCLUSAD,. 6. eee ee errr BIBLIOGRAF IA, INTRODUG: © ensino da lingua materna se constitui em um projeto que JA é em si diferente dos projetos de ensino das diverses disciplinag como a geografia. a geometria, etc. Nosso argumento nessa directo 6 de que os alunos que chegam A Escola j4 sabem a lingua materna. A partir dai nos devemos explicitar o que esta contido na “disciplina escolar chamada Lingua portuguesa”. (1) Una primeiva tentativa de resposta é a que propce que essa disciplina escolar deve dar conta do aprimoramento da grafia (ortografia) © da leitura das palavras, frases textos diversos etc., ainda dar conta de anélises morfolégicas © sintéticas © dar conta dos sentidos através de andlises semaénticas (as interpretactes de textos entram ai}. Ou h& ainda os que privilegiam a apresentacio ¢ memorizacio de titulog e autores (e consequente conservacso) de textos literérios, considerados ai como modelaree (1) Aqui Se COlocA UMA quest&e complexa que diz respeito a uma disting%o possivel entre lingua materna @ Lingua nacional. @ propésite desse tema ver om trahaihes apresentados no seminaria: "La citoyenneté en France ef au Brasil" / 1990 en Paris ine prele) @ sepecificamante o artigo intitulado; "L“easeignement de la langue maternelle au Brésil du XIX siecle: la mere autre", de minha autoria. NOs nos abstemoe aqui dessa discussia @ passanas a considerar aqui a lingua-gaterna ensinada na Escola coms sendo coincidente com a lingua que o aluno Jj4 fala em casa quando chaga a Escola. Entretanto, mesmo diéhte dessa lista de possibilidades, nos parece, que restam sempre quests, gem resposta a respeito dos objetivos e raztes dessa prética. Quando se ensina, por exemplo, geografia aos alunos, 0 objetivo pode ser fazé-los conhecer 0 espaco fisico que eles habitam. Nesse cago trata-se, em grande parte, de transmitir informactes (por exemplo: altitude, longitude, clima, vegetacto), ou a prética de ensing da geografia pode estar bem préxima diseo (2) . No caso da matemética, por exemplo, pode-se aprender um “saber fazer” as operactes. Néo se trata de tranemitir um conhecimento, mas de fazer com que os alunos se apropriem dele: eles devem conhecer a "logica” que permite que as operactes sejam desenvolvidas, e Finalmente operar com os mimeros e sinais em qualquer outra situacto, mesmo Zora da Recola. J6 0 eneino da lingua materna 6 um caso bem complexo. (2) Yeremos 4 seguir que “as-coisaswa~saber" dependem de muitos tatores, incluinde uma tiliagse histerica & ideolégies da individue, que nao @ mera maquina de aprender. 1a 0 objetivo dessa prética pode parecer claro quando se circunscreve nos horizontes da alfabetizacao. Mas j4 dentro desse universo, née sio poucas as dividas e questdes que nos cclocamos, n&o s6 a respeito de métodos, mas sobretudo a propéeito dos cbjetivos que se tem ao ensinar. Esses objetivos n&éo s&io de maneira nenhuma passiveis de uma formulacio genérica do tipo: ensinar a ler e a escrever, ou simplesmente alfabetizar, $A aque alfabetizar pode significar incontaveis praticas e incontaveis consequéncias,como veremos 4 seguir. Mas a situacéo 6 ainda mais complexa quando nos voltamos para a “disciplina de lingua portuguesa”, depois do periodo de alfabetizagio, que é€ nossa quest&o mais especifica neste trabalho. “Quais sic os objetivos dessa pratica?” "Serd que eles podem ser comparados aos objetivos da disciplina de geografia, por exemplo, ou de matemdtica?” Ou, colocando a questo de outra maneira: “Seraé que a lingua materna se oferece como um conhecimento a ser ensinado? Km que medida? Para comegar ume -reflexao esse sentido, nos Ja diriamos de inicio que quando a lingua materna é disciplina @ ser ensinada, ela wma disciplina particular: © conhecimento.da_linguagem também 6 a conheoimente do sujeito. 4s quest0es sobre a linguagem fazem intervir a questo do sujeito, No nosso ponte de vista, sujeito de um Discurso. Assim, diremos que a linguagem comeca pelo interditado: h& © dito porque hé o interditardo. Estamos entendendo inter-ditado, aqui, de duas formas que se completam; inter-ditado enquanto dizeres em interligacto, rede de dizeres; e inter-ditado com um sentido J refletido de proibido, censurado, silenciado (3). Censura aqui née é entendida como algo que vem de fora da linguagem, mag um elemento constitutive. A censura esté ligada as determinacdes discursivas como vemos em Orlandi: (3) J4 refletide porque jA ha squi um trabalho de reflexto da escrita “dit" sobre ela mesma: ao Gi exclui-se a que nfo se disse, que se poderia ter dite mas que, no entanto, ja esté inter-ditado inte dito}, ne momento que se di cay dos Esse siléncio - 0 que n&o se pode ai dizer - 60 indicio dos “bordos" do discurso. e 6 “em torno desses bordos, @ tomando apoio em seu efeito que vai se executar a@ fantdstica sinfonia do ume do infinito, do singular © do disperso. " Nac podemos deixar de observar, antes de continuar, que essa 6 uma das contribuigdes mais importantes da andlise de discurso, a de colocar como base de sua teorizacéo esse movimento necessirio entre o um eo plural, a unidade ea dispersic, como pares necessdrios a que eu acrescentaria o mesmo e o diferente, a pardfrase e a polissemia. A partir do reconhecimento desses bordos do discurso, A.Lecomte(81) fala sobre o fato de que hé un significante impossivel que 6 rejeitade. Sho os limites de cada formagdo discursiva. (4) ORLANDI, BE. « Ae formas do silsncio Ne movimento sentidos, 1997. ed. da Unicamp (pg-474) a7 Assim, no nosso ponto de vista, dizer que o dito constitui-se na relac&o com o inter-ditado, n&o 6 exatamente © mesmo que dizer que o “construido” constitul~se na relacéo com o “pré-construido”, j& que o “pré-construido” 6 um efeito, o que nBo é o caso do inter-ditado. Naquilo que diz respeito & gramdtica, o interditado é evidente. Parte-se do interditado. Ou ainda pode-se dizer que a aramética de uma lingua constitul-se em um inventdrio de inter-ditados, na medida em que ela “seleciona dizeres". Qa pares correto/incorreto, aceitdével/nio aceitdével etc, fazem uma referéncia empirica superficial que ¢ andloga ao interditado fundamentai ¢ aos inter-ditados discursivos determinados pelas formagtes discursivas. Deste ponto de vista oa interditades postos pela gramética (n&o aceitavel, incorreto, etc.) se vaseiam em alguma coisa que € fundamental na formuiagio de toda gramatica: auilo que nip se diz, edo que n&o se tem coneciéncia, e que € 0 que efetivamente determina os inter- ditadoa. Mas n&o € desse ponto de vista que se trabalha a gremética da lingua dentro da disciplina “lingua portuguesa”. Para que a gramética” fosse trabalhada desse ponto de vista, acreditamos que antes de mals nada seria preciso levar a sério o fato de que 0 sujeito se constitul enquanto tal sempre em um discurso, © que essa constituicas tem efeitos no interior da propria estrutura da lingua, como veremos nos préximos capitulos Nés acreditamos, entao, que ossa analogia que existe entre o interditado da gramdtica da Lingua e o interditado fundamental © discursive, poderia ser explorada na disciplina de lingua portuguesa de muitas maneivas, sempre partindo das determinagtes bésicas, como J4 Gissemos, até chegar acs resultados Linguisticos sses dados linguisticos poderiam ser observados e estudados, entao, como consequéncia de tais determinacdes. Mas na verdade, o que nés vemos, geralmente, na prética pedagégica, é o deavirtuamento dessa relacto em proveito de uma relagtio entre os interditados da gramética e os interditados socisis. 0 que nde se diz" (0 que é 0 interditado fundamental) fica em analogia ao que “nao se deve dizer” por raztes convencionais, sustentades © finalmente pelo disourso pedagégigo: “é porque é" (5) . eito tica pedagégica 6 tendo inconsciente, 56 alienacto. E na directo do que " porque é" vem, inclusive o ditado, ele mesmo, nas aulas de portugués, cuja realizacéo depende de se saber “grafar" o que se ouve. Nada se comenta, no entanto, sobre o fato de que aprender(ou nfo) 4 grafer nfio garante absolutemente a escrita. Fica mais clare, também, que o ditado & menos o que pode ser dito e mais o que se diz efetivamente (nfo se discute 0 ditado, se reproduz), e assim também o interditado, que 6 menos o que néo pode ser dito e mais o que nfo se cogita dizer. (3) GRLANDI, €. - @ linquacem e seu tuncionamento. 1987. Pontes @d. (2a.ed.) Ver "D discurso pedagégico: a circularidade" @ “Para quem ¢ © diseurso pedagégico?" 19 20 Em alguns casos esses interditados gramaticais sic poatos em analogia com interditados da “comunicacéo", que produzem sentido para os principios de “falar bem para bem se comunicar” etc. Também aqui néo sio levados em consideracio nem © inconsciente do sujeito, nem as determinacdes discursivas. ‘Tudo se resume em “fatos linguisticos” que sozinhos devem dar conta inclusive des sentidos todos. # como se. por exemplo, o enunciado “Verbas da Uni&o n&o chegam aos municipios” pudesse ser completamente explorado sem a refer€ncia 4s determinactes discursivas de tal enunciado, E tudo funciona, ainda, como se o aluno pudesse aprender e repetir em outras ocasites a “forma” de enunciades como esse (considerados corretos do ponto de vista da forma), mesmo sem ter havido, para o aluno, qualquer referéncia ao discurso jornalistico. © que quer dizer que na Escola nfo existe a preocupagéo com a posicio de sujeito dentro de um discurso, porque nela tudo se passa como se houvesse um objeto a ser estudado, isento de uma determinacto discursive (no minimo, a do discurso pedagégico, no caso) apenas lingua, como se essa fosse um objeto. aL Este 6 0 caso de grande parte do material que serve de subsidio para os professores de lingua portuguesa da nossa rede estadual de ensino, como podemos observar no trecho exemplar que segue: Recuperar efetivamente 0 didlogo como uma forma ativa de recuperacay da palavra de outrem é uma tarefa que oa professores de Portugués deven considerar bdsica para a resoluedo de outros problemas: a ‘difleuldade em expressar-se, oraimente ow em forma escrita, em escrever sem cain na repeticdo de clichés, ou sem limitar-se ao mero agrupamento de observacdes desconexas, @ ineapacidade de compreender uma enunciacko (desde a mais trivial até 0 texto completo e complexe) € dar-lhe uma resposta adequada. (VIEIRA,Y. 1983) 8 Para nossos propésitos, preccupa-nos especialmente o fato de que nas teorias normativas desse tipo (que desembocam em prdticas andlogas) “a exclusto fundamental do aujeito” (relacionada ao inconsciente e ao discursivo). ¢ trabalhada como uma exclusio ao mesmo tempo imediata e secundaria que se pode sintetizar falando que esse tino de prdtica, ao invés de propiciar, difioulta ao suieito-aluno a experiénoja de autoria. Voltamos, assim, A questo inicial Qual 6 0 objetivo da prdtica do ensino da lingua materna?” "Serd que ela tem por objetivo o dominio (sempre relativo) das formas orais ¢ escritas da lingua?" Se considerarmos essa hipotese como valida, enté&e a questéo reaparece: "Seré que privilegiando-se © uma —nomenclatura “gramatical” (do tipo “oragéio subordinada substantiva subjetiva", “objeto indireto” ete) que deverd ser “adequada” acs diversos “casos gramaticais’ (que €. como j& dissemos, uma das maneiras mais frequentes de mobilizacio de um conhecimento gramatical) se esté no melhor ceminho para o dominio ave se procura"? Nés néo acreditamos nisso. Nos acreditamos que as andlises gramaticais podem ser centrais em exercicios de reflexces linguisticas filos6ficas, etc. que poderim ser desenvolvidos como fechamento de um cuidadoso trabalho anterior de producto de “TEXTO", onde uma determinada posiclio de sujeito de discurso tivesse sido ocupada pelo aluno, posi¢fio essa que permitisse & producko do efeito-AUTOR, o que nfo é possivel na posic&o exclusiva de sujeito do discurso didatico-pedagdgico. Quando nés comparamos 0 ensino de lingua materna com o ensino de matemstica, por exemplo, percebe-se nos dois cagos a expectativa de wm aluno produtor. Isso quer dizer, um aluno que, enquanto sujeito do discureo pedagégico, seda capaz de produzir, a partir de algumas referéncias, uma operacto "nova". Mas, se no caso da matemitica a regeréncia 6 “logica” (ou, pelo menos, a referéncia @ “a légica”), esse nfo & (desde Port Royal), o caso para a lingua materna Chegamos a uma conclustg radical: diferentemente de todas as outras disciplinas € préticas escolares, a apresentac&o de uma teoria, ou simplesmente o fato de se ter uma teoria de base, a apresentagio de modelos e contetdos e © treinamento através de exercicios de fixacHo, ntio garantem a produg&o linguistica dos alunos porque néo hé nenhuma referéncia logica a ser dada, nem nenhum contetdo prévio a ser transmitido. Isso tudo sem falar na relaco vital entre linguagem e sujeito, como j4 mostramos anteriormente. Na verdade, 0 contetda..da disoiplina de lingua materna Adentificacae._com_oa _contefidas de todas as _outras disciplinas, que sto também _trabalhadas a partir da lingua. hbase de elementos calculéveis para a producto de um texto, ois que esse é sempre . Entao, a wmica garantia que podemos ter como profeesores de lingua portuguesa, 6 a de propiciar condictes para que nossos alunos possam se inscrever em posictes~ sujeito de discursos onde o efeito AUTOR 4 possivel, ou seja, em outros discursos que nfo sejam somente circulares e auto-avaliatives, como € 0 caso do discurso diddtico— pedagégico. Para tanto 6 preciao” propor a inscrigtio efetiva nesees discursos, e n&o simplosmente “emprestar” deles fragmentos linguisticos para um estudo que se desenvolveré fora de condictes de producio adequades a tais produgdes, dentro apenas de tubo de ensaio que se transformou a Escola. Por tudo isso, acreditamos que em relagéo ao ensino de lingua materna € absolutamente necessério abandoner os esterestipos pedagégicos que fazem referéneia a um aluno receptor, um professor emissor e um contetido a ser ensinado, pois nessa prética os elementos que estic em jogo constituem-se de outra maneira. 26 Na base de toda prdtica de ensixio da lingua materna podemos observar lingua, linguagem, escrita, oralidade, discurso, texto, significado, sentido ete. Cada uma dessas nogdes tem un tratamento bem preciso dentro de uma teoria linguistica geral, segundo os diferentes autores e as diferentes abordagens. Porém, nas prdticas de ensino de lingua materna, geralmente todos essas nocdes séo esquecidas (ou muitas vezes desconhecidas enquanto noctes linguisticas), © o que se pratica 6 © grafismo, a ortografia, a leitura, as interpretactes, as andélises gramaticais etc. quando un professor esté ensinando seus alunos a escrever, qual é 0 conceito de escrita sobre o qual ele se apoia?; quais so as conviceées teéricas que orientam sua prética?; como ele elabora a relac&o teoria-pratica?; como ele trabalha, por exemplo, o que 6 0 discursivo ¢ 0 que é 0 textual na linguagem? Geralmente o que se tem é wma concepeag de aluno— aprendia (que assimila consciente e analiticamente o que lhe 6 apresentado) e a escrita como representando a oralidade praticada pelo aluno, onde a leitura 6, entto, decodificacéo do cédigo escrito. Na base desse tipo de concepeo esta a confusio entre eserita e arafia tomadas por uma coisa s6. No entanto, sabemos que se a escrita grdéfica produgz paiavras, silabas e letras, hd outras formas de escrita, nfo necessariamente grdficas, onde tais noctSes n&o existem. Esse tipo de observagdéo jd estava de certa forma em Freinet, quando ele dizia que uma crianca. poderia, por exemplo, produzir os textos de um Jornal, sem ter conhecimento nenhum de escrita alfabética ou gréfica (7)- Nesses casos, ¢ na situacdo real de producHo que a escrita faz sentido, mesmo quando a forma escrita n&o é completamente dominada, ou até em casos em que ela € minimamente dominada. (7) PREINET.A. - L’école moderne francaise, Guide Fratique pour l'organigation matérielle, technique et pédagogique ce ‘ecole populaire, Cinquieme édition Edititons Rossignol, Montmarillan(Vienne). 1987. 28 Para Tfouni (8) existe escrita e letramento sendo: detramento 0 fendmeno sécio-histérico, e gue investigé—lo implica estudar as transformagtes que ocorrem em uma sociedade quando suas atividades passem @ ser permeadas por um sistema de esorita cujo uso é generalizado. (pg.5) sendo o letramento um processo no gual esta encaixado outro (a alfabetizagao), precisamos também considerar que existem letramento(s) de natureza varlada. inclusive sem presenga de alfabetizacto. — (pa.6) Ede se notar que em uma sociedade letrada, as atividades de leitura e eserita est&o na base de quase todas as outras atividades. Assim, existem tarefas de leitura e escrita (ou eventos de Jetramento) que permeiam a vida cotidiana e que se impéem em maior ou menor grau 4a todos os individuos que compdem uma sociedade, sejam eles alfsbetizados ou nfo. (pg.7) (8) TEOUNT, L. "A Eserita ~ Remédie ou Veneno’ Frevtextos de Alfahetizacss. vel.ll., no prete. Hnteo Tfouni propde um “continuum” como eixo crescente de um Ietramento, possivel mesmo nos casos de analfabetismo. Eeeas pesquisas mostram, cada uma com seus propésitos especificos, que a questo da escrita tem dois aspectos, aseim como uma moeda e suas duas faces, insepardveis e ao mesmo tempo inconfundiveis: o aspecto da letra e 0 aspecto do texto. Esses dois aspectos nem sempre sto percebidos ou explorados separadamente no ensino de lingua materna. Finalmente em termoa mais ideolégicos nés poderiames nos colocar a ueguinte queatde: "Send que 0 aluno, ao deixar a Escola, esté preparado para entrar em um processo de legitimagfo de uma sua posicio através da escrita?” Justamente, entfo, na tentativa de avancar no campo do ensino de lingua portuguesa, propomos aqui o conceito de TEXTUALIZAGAO. Eese conceito serd observado em funcionamento dentro de uma experiéncia ocorrida na Franga com uma clusee do primeiro grau equivalente a uma Sa. série brasileira. Para adiantarmos de maneira bem répida e superficial a nocéo de TRXTUALIZAGAO daremos o seguinte exemplo: Quando a crianga escreve uma carta para um colega, mesmo que n&o haja mais do que meia dizia de tracos que lembram vagamente letras, marcando a folha de papel (folha essa que a crianca guarda cuidadosamente dentro do envelope, cola 0 selo, eto.), nessa prdética a rianca esta textualizando, meamo sem estar escrevendo, ou melhor, mesmo sem estar produzindo uma escrita alfabética. # claro que tal producto pré-alfabética deveré atingir uma gatrutura mais sofisticada, para a qual ela se direciona na pratica de TEXTUALIZAGAO. Para compreendermos o funcionamento dessa prdtica, teremos que observar ai o sujeito de base, que é sempre o sujeito de um disourso no circular, além de ser um sujeito do discurso didético-pedagégico. Esse sujeito, esta em relacto de simultaneidade com o sujeito do inconsciente e como sujeito da enuncisc&o, mas tem sua especificidade que permite a prdtica de TEXTUALIZACAO, como veremos a seguir. PRIMELIRA PARTE DEPOIS QUE MEU PAI MORRKU KU COMPREENDI QUE So PUDE ACKITAR AQUELA MORTE PORQUE SOU UM SUJEI'TO SEMPRE DIVIDIDO § POR ESSA RAZAO MEU PAI NAO ERA NAQUELK MOMENTO DA MORTE TODOS OS PAIS QUE TIVE SOBRE 0 sugErzo a Face 4s particularidades do ensino de lingua materna, que inclui sempre as questoes do sujeito, nosuas observagées nos mostram que o Discurso que sustenta esse ensino, ou seja, 0 Discurso Diddtico-pedagégico, justamente por causa do seu funcionamento, n&o permite a posic&o-sujeito necesséria & producto do efelto AUTOR. Na verdade, esse discurso rejeita essa posicko-sujeito. Aqui nés n&o fazemos veferéncia nem ao sujeito da enunciacdo, ecujas marcas sio explicitas (ou pressupostas). nem ao sujeito psicanalitice (do inconsciente), que estdé na base de toda produ¢fo de linguagem, mas que n&o é exatamente efeito produzido pelo discurso, mas efeito produzido pela prépria linguagem. O discurso, sendo a linguagem em funcionamento, inclui necessariamente a ideologia e seu efeito-sujeito difere, portanto, do éfeito-sujeito da linguagem. Em nosso ponto de vista, que 6 0 da A.D., o sujeito do discurso sé conetitui justamente em uma posicao Limite entre o que é de dimensto enunciativa eo que & de dimenstio inconsciente, sem se limitar a nenhum dos dois aspectos, pois ai se inclui, especificamente, o aque é de dimensio ideolégica. & Bay Para compreender a constituices dessas diferentes dimenstes de sujeito, seja a dimensfo enunciativa, seja a dimenséo inconscicnte, seJa a ideolégica, parece necessério considerar logo de inicio as proposicdes lacanianas relativas ao sujeito dividido. Aseim, a partir de uma teorla do significante desenvolvida por Lacan através de um retorno a Freud, nés temos a relacto G/s enquanto separagfo. A barra que esté entre Significante e significado nao representa mais uma relagio (como em Sauseure), mais sim um sujeito barrado, irromediavelmente dividido Trata-se de uma teoria do significante em que ee encontra a materialidade da diferenca mais arcaica e constitutiva do sujeito sob a forma de un significante: a significante sempre substituido. A linguagem ai é a condictio do inconsciente e 0 cuseito 6 colocado como efeito da Linguager Lacan néo deixe nunca de relembrar que a descoberta Freudiana parte da histeria, da sinserig&o de una letra no compo: “A fala, na verdade, é dom de linguagem, e a Linguagem nao é imaterial. Bla é um corpo sutil, nas 6 um corpo. 4s palavras so presaa dentro de todas as imagens corporais que cativam 0 sujelto; elas podem ongrosser @ histeria, identificar-se a0 objeto do penis, representar a torrente de urina da anbicko uretral, ou o excremente retido pelo prazer avarento . @ portanto 0 significante que é Jocalizado na letra, e¢ gue af encontra sua inscrigso material." 0 significante que Lacan pés em relacdo com 0 significado no algoritmo do signo n&o tem a responder com sua axisténcia a nenhuma sienificacto, diz Lacan: o significado nfo tem a significar. 08, 0 significante possut duas propriedades: Be ‘se veduzir a elementos diferenciais ultimos” e compor-se segundo leis de uma ordem fechada”, aompondo assim uma cadeia significante, sob @ qual escorrega o significado, que nag 6é lecalisdvel. Escorregamento do significado, e estruturacdo constitutiva do significante: o algoritmo sanssuriano encontra-se sem a funcdo de significapio que Ihe havia assinalado seu fundader. Essa transformacdo, aparentemente minima, conaiste "sowente” em ler diferentemente a barra do algoritmo: S/s. Fara Saussure, essa barra introduz uma relagao e um paralelismo; para Lacan, ela introduz uma separacdo: o significante @ 0 significado estéo separados por una barreira "resistente a significacdo. (1) (J) CLEMENT, O.5, ~ Litterature et psychanalyse " La strategie du langage Larousse. Paris. W97A Revue Libtkéreture n.3 octopre Essa separagto, que resulta na separacio do sujeito ( sujeite dividido), foi bastante trabalhada por M.Pécheux @ seu grupo de pesguisadores. Na época do exame oritico que seguiu a primeira fase da Anélise do Discurso (na virada dos anos 80), essa reflexio gira em torno da questéo da heterogencidade, como foi exposto por D.Maldidier (2): Relendo hoje esses textos (5) ¢ mantendo o fio de uma estrita cronologia, uma impress&o global se Impde. A questo do sujeito é de um certo momento em diante colocada sob 0 signo da heterogeneidade. Bu poderia diser, parodiando o proprio tiche2 Pécheux, que 0” primado tedrico do outro sobre o mesmo se impos. Aquilo que nos anos precedentes procurou~se através da contradic&o marxista ou dos enganos de interpelacéo ideolégica, inscreve-se, entdo, sob o termo “heterogenetdade”. (2) MALDIDIER, 9, — Liingui¢tude du Discours Textes de Michel P®cheux ~ 1990. Editions das Cendres. Faris PEDHELM,M. @t al. ~ Waterialité Discursive, 1981. Presses Unive de Lille Efeito de moda, sem divida, mas também recurso a uma categoria” descritiva susceptivel de ser netrabalnada, (pg.67) Era nessa direco que trabalhava J. Authier quando propés dois tipos de heterogeneidade: uma heterogeneidade constitutiva e outra heterogeneidade = mostrada ou enunciada(4): Todo discurso se encontra constitutivamente atravessado Por “outros discursos” e pelo “@iseurso do outro". O outro nfo é um objeto (exterior, de quem se fala) mas ume condiggo constitutiva; por qué se fala) do discurso de um sujeito falante que nfo ¢ a fonte primeira do seu discurso. Lembrar-se disso nfo descarta o campo da descricdo Linguistica. ~ “Heteragéneite montrée et ragangite constitutive: éléments pour une approche de l'aukre dans le discours". DELAY Revue de Linguistique n.26. 1982. Centre de recherche de ViUnaversiké de Paris VILL. Ao contrapio, inserevem-se no campo das formas de heterogeneidade mostrada. @ outro encontra-se, ai, designado como objeto do diseurso através de um mecanismo enunciativo, que em diversos exemplos disso(...), parece ser eonstruido como tomada de distancia da parte do sujeito falante em relacéo a uma parte do seu discurso. Se essas descrigdes linguisticas permitem um vefinamento indiseutivel que leva em consideracao a enunciacdo, 6 importante assinalar o quanto esse mecanismo da distancia dita, explicitada por um Jocutor em relag&o a uma parte do seu discurso, € inpedutivel a divis&o que o constitui, ele e a sua fala. As | formas de heterogeneidade mostrada, no discurso, nfo so um retrato fiel,uma manifestagaio direta mesmo parcial- dessa realidade incontorndvel que 6 a heterogeneidade constitutiva do discurso: elas si os elementos da representagdo -fantasmagérica- que o locutor (se) da de sua enunclagio.” (pg. 141) 40 im seguida a autora explicita sua tese nos termos que seavem: "A heterogeneidade mostrada nag é um espelho, no discurso, da heterogeneidade constitutiva do discurso: ela também n&o 6 “independente”: ela corresponde a uma forma de negociagao -obrigada- do sujeito falante com essa heterogencidade constitutiva - inevitdvel mas que Ihe é necessério desconhecer; ea forma normal dessa negociacdo assemelha-se ao mecanismo da denegagdo." (pg.143) Segundo Authier, quando = 9 ~— cujeito = “marca explicitamente” no seu discurso 08 += pontos de heterogeneidade, primeiramente ele “circunscreve 0 outro e afirma que o outro naovestd em todo lugar", assim, ele “institui aigerentemente o resto desse discurso como sendo bem dele, o locutor”. Bm segundo lugar ele afirma que "o discurso em geral é potencialmente, completamente homogéneo". AL Finalmente ele afirma, pela “posicdo metalinguistica na qual ele se coloca, sua mestria de sujeito falante, a mesma que permite separar o "um" do “outr seu discurso dos outros; e, mais ainda, ele e seu pensamento da lingua que ele olha do exterior, coma (se fosse) um objeto”. Nés queremos aproximar essas proposigbes de Authier daquelas de Lacan no texto “O estddio do espelho como formador da fungto do EU". (5) Hasta compreender o estddio do espelho como uma identificagag no sentido pleno que a andlise dé a esse termo: a saber a transformapfo produsida no sujeito quendo ele assume uma imagem (.. A assumpefo jubilosa da sua imagem espeonlar pelo ser ainda mergulhado na impoténcia motora, e a derendéncia do amamentamento que esté o Pequeno howen nesse estado infana, por tudo nos parece nanifestar, em wma situacdo exemplar, a matriz simbélica na qual o ja se precipita em wna forma €O) LAGAN, J. ~ "Le stade du miroir comme formateur de la fonction du Je” gerits éditions du Seuil, 1964. Paris primordial, antes de se objetivar na dialétioa da identificaga ao outro ¢ antes que a linguagem lhe restifua no universal sua func de sujeito. Hesse 6 um estado particular do sujeito, melhor compreendido através do termo "precipitacso", conforme vemos LEMOS, M.T. (6): N&o dé para entender o estddio do espelho pelo que vem antes, 2 estado do esnelho ad pade ser entendido numa _dimenefo de sincrania. # 0 momento em que uma certa configuragéo se ordena, ¢s3@ configurac&o 6 que determina, a posteriori, o que ela vem solucionax. BE nesse sentido que Lacan fale de precipitacdo (...) Isso deve ser entendido numa perspective sincrénica pela simultaneidade em que é preciso considerar esses aspectos; a simultaneidade em que uma solug&o se apresenta ao mesmo tempo que o problema gue ela vem solucionar, de uma imagem que cobre uma falta que ela mesma (6) LEMOS, Met “D Estadia do Espelho coma formador da fungio de Eu tal como nos @ revelada ne experiéncd analitica” ine fas surgir, de um Eu que se forma ao mesmo tempo em que, noutre cena, algo reclama voz. A alienagdo eomo condicéo de exiatir. a presenca inelimitavel do paradoxo, na medida em que, no momento em que ele se acredita sendo, é onde 0 sujeito esta mais alienado, mais outro. © fundamental aqui, segundo LEMOS, ¢ que apesar de o estdédio do espelho evidenciar o momento em que o imagindrio produz um "Eu", esse Eu reclama » palavra que falta, e que 6 functo do simbé{iico: Evidentemente que néo dé pra dizer quem é esse “ele” da frase ‘ele se v8 visto pelo Outro”, i380 indica a prdépria impossibilidade de falar do sujéito. Mas essa frase indica a estrutura de olhar cocmo uma relegdo em que, a falta de barra no outro (e, portanto, a falta de barra no sujeito) corresponde um carte efeito de inéresa, de peralista, que, no entanto, néo peoderia deixar de sofrer abalo, daslocamento, dada awa dependancia 20 wimbglica, como indicamos. 44 Ou seja, como esse olhar 6 manifestacao do Outro, é impossivel ele nfo introduzir alteridade. Ele gerd o préprio lugar onde emerge alteridade. quero dizer que é& impossivel que esse. olhar fosse “puramente"” imagindrio. Essa dialética imagindrio-simbélico é fundamental para entender 0 eatddio do expelho, sen&o pensanos que hd um olhar “primitivo”, anterior 4 palavra, anterior ao lugar simbdlico do sujeito. Nés queremos finalmente fazer uma aproximac#o entre, de um lado a idéia lacaniana de experiéncia de espedacamento e formagBo do “eu” através de uma identificago a wma imagem refletida; e de outro lado a idéia de heterogeneidace constitutiva trabalhada por Authier. © sujeito, enquanto sujeito falante, estdé sempre-J4 denegando, mais ou menos, a experiénoia de espedacamento, em outros termos, a heterogeneidade constitutiva. - 45 Entretanto, née pensamos que denegar a heterogencidade constitutiva nfo significa necessariamente negar a alienacko de si produzindo uma forma de heterogeneidade enunciativa mostrada. Existe algo intermediaric. Nés diremos, sim, que o estddic do espelho, quando ele inclui o lugar simoélico do sujeito (a dialética imagindrio— simbélico) coloca j4-e-sempre uma forma de heterogeneldade que n&o corresponde as formas de heterogeneidade enunciativa, mesmo se pensarmos nas formas de heterogeneidade mostrada, n&o marcada, conforme foram propostas por Authier. Como formas n&o marcadas a autora cita o discurso indireto livre, a ironia, o pastiche, a Imitacio. Mas, nos parece que as formas ndéo marcadas, contidas no termo mais vasto de heterogeneidade enunciativa, ainda nto correspondem a isso que Lacan identificou como as formas produzidas através da “identificacao especular” 46 ‘Mas para isso precisamos incluir o simbélico aqui Porque Nap hi condicso de pensar em _posicéo sem pensar _em_aimbélico 0 que coloca/sustenta © sujeito nessa posicao pela qual ele pode receber sua imagem, Incrustar-se ali, solidificar-se ali, no ponto em que sua imagen e seu olhar se encontram no campo do outro é a palavra, a palavra do outro que procede ao reconhecimento dessa imagem. Essa imagem nao poderia ser nada para o sujeito se néo fosse pela possibilidade de ser nomeada, incluida entre os objetos que existem, isto 6, os objetos nomeados no discurso. (LEMOS, 1.7.) A imitagéo, a ironia, o pastiche ou o discurso indireto 80 concebides assim justamente porque ha um digcureo de um “outro” que ai esté pressuposto. © sujeito nesse caso 4 um efeito de discurso produzido através do enunciado 6 de um “outro” pressuposto, sujeito da enunciacio. Nés dizemos bem pressuposto © nfo alienado. a7 Essas propesictes vao ao eneontro do problema discutido por P-Henry em Le mauvaisoutil (7). Nesse texto ele questiona a maneira como o sujeito 6 introdugido na teoria da enunciacdo, e por essa via o autor conatréi toda uma critica, da pressuposicéo e das noctes co~ ligadas (os implicitos, oe subentendidos etc.) & qual Ducrot reeponde sob a forma de posfécio na mesma obra. Nessa discussto, o que nos parece essencial ¢ o fato que a idéia de um “pré-construido”, no sentido de P.Menry, desata uma discussio bem mais vasta da relagdo sujeito- linguagem (compreendendo aqui seu nivel simbélico, imagindrio e real) que aquela que a “pressuposig&io" pederta propor. Q conceito de "pré-construido”, elaborado conjuntamente por P.Henry e M. Pécheux, aparece pela primeira vez proposto enquanto tal em Vériiés de la Palice (9), nos seguintes termos: 7) HENRY, P. = Le meuvais oukil 1977. editions Klincksieck. Paris. Traduzide ne Brasil sob o titulo: & forramenta imperfeita por CASTRO de P., F. ~ Ed. Unicama. 199: (2) PECHEUK, M. - Varites de 1a alice 1975 Ceol. THEORIES dirigée par Althusser) Maspero- Faris “trad. para g port. Semantic dascurso L9G. Eoitora da Unicamp., Campinas. 48 Nag deveriamos considerar que hd separagao, distancia ou discrepancia na frase entre o que é pensado antes, em outro lugar ou independentemente, e 0 que esté contido na afirmacao global da frase? Foi isso que levou P.Henry a propor o term “pré- construido" para designar o que remete a uma construcio anterior, © exterior, mas sempre independente, em oposic&o ao que & “construido” pelo enunciado. Trata-se, em sum, do efeito discursivo ligado eo encaixe sintdtico. (pg.99) Q "“pré-construide” 6, portanto, isso que estd em posigéo de anterioridade ou exterioridade em relacho ao enunciado em um encadeamento sintético, e ele nao se confunde com a pressuposicio aque, na sua prépria definig&o, como na sua marcac&o empirica no discurso, faz intervir um sujeito de enunciagtio, mesmo quando ele n&o é intencional. ag Eo mesmo acontece no caso da “heterogeneidade mostrada n&o marcada”, que apesar da auséncia de wma marca expliciia do sujeito-da enunciacéo, é de qualquer maneira uma forma de heterogeneidade- enunciativa mostrada (hé un sujeito da enunclac&o). Por oposicio, o “pré-construido” € o efeite do que esta sempre-jé-14, mesmo nos casos em que o sujeito no denega gua alienacSo mostrando um tipo de heterogencidade (nao se constitus em sujeito da enunciacio). En outras palavras as formas de heterogeneidade mostrada mostram o outro (através de um sujeito de enunciacdo) dentro do Outro (o sempre-$4-14); entretanto, 6 igualmente possivel a constituic&’o de um “outro” cuja heterogeneidade n&o seja necessariamente mostrada: o “um” que nfo se constitui ¢: tabelecendo uma separagio de um “outro” em relacto a si mesmo (ao mesmo tempo que ele nado & mais o Outro). 0 sujeito do Discurso 6 uma posico, enguanto o sujeito da enunciago é uma referénoia. A crianga, ao repetir a proposices da mie, por exempli “O bebé vai nandé", n&o pressupde um “outro” pols néo ha nada além do “outro”, porém, mesmo ele estando dentro de uma alienagtio nfo negada de si-mesmo, seja como for, o sujeito se constitul ai, no minimo e primeiremente através de re- producto. 9 “outre” (efetivade pela crianga) coincide como Outro (que constitu sua determinactio) mas nfo 6 o mesmo (coincide, mas af é o mesmo) (9) Na base dessa relacto de duas presences simulténeas: @ presenga de um “construido" (efetivado - “o bebé val nand") e do seu ofeito (um efeito de “pré-construido”, que € igualmente determinante do sentido - “o bebé vai nana") é que encontra-se o sudeite do discurso . (10) (9) Ver nos trabalhos de LEMOS, Claudia (Unicamp) da Area de Aquisigaa da Lingagem, essa questac da constituigae do sujeito especialmente posicionade entre a tala da mie (na chmenste do simbélico) © a imagem, Gada pela mie, de um corpo préprie (na dimensxo do amaginarsie) (19) Gostaria de registrar aqui wma discussao o reupeits desse panto que tivemos eu # Denise Maldidier pels pars @la o “pré~construida” estaria necessariamente articulado em am encadeanento gintatico, coms per exemple @ oragae relative na relag’o com & principal etc. Eu dizia a Denise que au @u estava propende um alargamenta da nogite evidenciando b efeite de “pré-construide" em uma construgao onde nao ha una operagso sintaética na base de sua produgso Portante, eu estava propondo que a “pré-construida" 0 sujedto que ai se constitui n&o é um sujeito de enunciacfo «que nega sua_—s alienagfio = mostrando = uma heterogeneidade como no caso, por exemple: bebé nig vat nané", ou cimplesmente: "aio nand" (a negacéo pressupde a afirmagéo, ela pressupde por consequéncia o sujeito da enunciacko afirmativa,” mostrando-o = através = dessa pressuposicse}. Ao contraric, o sujeito do discuran pode ser efeito de coincidéncia entre suas determinagdes e sua efetivactio quando essas se produzem simultaneamente. 0 sujeito do discurso pode existir mesmo onde o sujeito de enunciacto nfo existe. # necessério assinalar bem o fato de que estamos proponds, finalmente, uma diferenciacto entre o que é 4 negacto da alienagtio de si mesmo (que pode nfo existir na linguagem, em casos em que o “eu” no se constitui, como acabamos de ver), @ do que 6 a denegacdo da neterogeneidade constitutiva, essa sempre presente na constituictio do sujeito, razfo mesma da sua constituicio. podaria ser, em extreme, um eveite produside ndependentenante de usa posigée enunciativa. 8 Nao 6. pois. 9 contetide do enunciado que determina a constit consbitulok “ efeito_da existéncia de um aujeito”, 0 que equivale a dizer finalmente que esse sujeito pode se constituir mesmo na re= produgcko (0 que nfo quer dizer aue ele se define por constituir-se na reproducde). Por essa vaz&o digemos que para a A.D. a repeticao significativa e 0 sujeito do discurso n&o se confunde com esse que deixe uma marca enuncietive, resultado de uma operacto de negactio da alienac&o de si. Pare terminar esta secko, quoremos reforgar a idéia de que quendo fazenos a diferenciacéo de um sujeito de enunciacdo, um sujeito do inconsciente, um sujeito do diccurse, nto estamos de maneira alguma propondo uma existéncla propria para cada vm desses sujeitos. Nem muito menos estamos ofirmando que eases sujeitos tenham existéncia empirica, ou independente, ou qualquer coisa deese género. Ao contrério, essas diferentes formas de sujeito sio o efeito de diferentes dimenstes de constituicéo de todo faisnte da.iingua e elas estéo interrelacionadas. No entanto, a identifiesacio e separacio de cada uma dessas dimenstes permite compreender melhor o funcianamento do sujeito, ¢ tal procedimento 6 fundamental para nossos propésitos de mostrar o funcionamente do sujeito do discurso quando ele esté na base da produgao de efeito AUTOR. 8% tendo visto que 0 sujeito do discurse neo se define nem pelo inconsciente, nem pela enunciag&o, reafirmamos, entéo, que esse sujeito em A.D. se define por ser interpelado em sujeito: "os individues sdo interpelados em sujeitos- falantes (em sujeitos de seu discurso) pelas formagtes dizcursivas que representam na_linguagen as formacdes ideolégicas que Ihe so correspondentes.” — (P&cheux/1988, trad.bras., pg 161) No nese caso analisaremcs a interpelactio do sujeito no discurso radiofénico. Nossa anélise procuraré deixar mais visivel o trabalho cdercitivo dae determinagdes desee discurso sobre 0 sujeito. Finalmente veremos, através do aprofundamento da nogto de TEXTUALIZAGKO, em que conjuntura o sujeite do discurse produz 0 efeito-AUTOR. A experiéncia pedagdeica RADIO CARTABLE se oferece cono um exemplo de trabalho de TEXTUALIZAGA0 das productes dos alunos que ce conclui fora dos limites da instituictio Hscola. Assim & que ele torna rosaivel uma emergéncie constituinte de posictes discursivas que desembocam no efeito AUTOR. Tomamos, ent&> essa experiénoia como exemplo para uma andlise de como se dé a TEXTUALIZAQAQ. Poderiamos ter tomado tantas outras experiéncias, e até mesmo aquela descrita em nosso trabalho anterior (Discurso da Escrita e Ensino), que da mesma maneira s&io experiéncias onde hé a pratica da TEXTUALIZAGAO. Eecolhemos, no entante, “Radio Cartable", j4 que foi através do acompanhamento dessa experiéncia que as nogtes propostas reste trabalho tomaram corpo. APRESENTAGAO DA KXPERINNCIA Em vez de fazermos n6s mesmos uma apresentiagio do projeto, née optamos por fazé-lo eer apresentado por um professor que trabalha atualmente no projeto, M. Philippe Colomine, e que permitiu a gravagao de seu testemunho. (1) Houve um projeto de criar a escola aberta(...)// en torno do projeto/ convidaran-se profeasores que trabalhavam ja de certa manetra/ na escola de Ivry/ que tinha como diretor Pierre Laborie// e ew seguida foram convidados os pais dos alunos/ os funciondrios dessa escola/ a minicipalidade/ @ os agentes da Educac&o Nacionai// entdo/ a partir dai eles tentaram refletir sobre como fazer a escola ideel// ent& cada um levou seu pequeno/ sua peguena gota d‘dgua para fazer correr 0 riof// (1) Nés pte precedemos & tma transcrigao rigorosa em termos fonéticas. Coma na verwan original (apresentada ho fing] da tredugse) aqui tanhem nus simplesmente estabelecemas que as pequenas pausas Seriam marcadas por uma Sara simples @ as grandes pausas por uma barra dupla. 88 entag eles eriaram esta escola com esta arquitetura/ elaro que houve wy arquiteto que tinha também suas idéias/ grandes idéjas e/ nesse momento ai/ un pai de aluno/ M, Merlot/ teve uma idéia/ ele disse: "gerd legal fazer uma padio"// Eles j& tinkam um método porque jd na escole Makarenko aconteciam coisas/ oficinas/ bastante coisa onde a molecada trabalhava de uma maneira auténoma também/e entao foi um pai que disse: “vai ser legal fazer uma rédio"// entdo a escola foi construida com um estiidio de gravacko// e ent&o a inspetora/ Madame Lotroicq nessa época/ disse/ "é uma excelente idéia"/ ela fez realmente muito para que isso se realizasse/ ela realmente ajudou a formalizar o projet pedagsaico/ ela fez tudo o que ela podia para ter a autorizacao (...)/ em todo caso/ para n&o colocarem enbraves/ mas ela disse ‘9 que gerd legal seré nao ter uma radio 96 da escola’ & necessério abpiro projeto a seu distrito"// a escola Einstein ja tinha um bon conceito e ela nao queria que tudo ficasse no mesmo local// ent&o ela encontrou um local na escola Maurice Thorea// (2) Agora vejamos a resposta de Philippe para a questo: "De acordo com o ponto de vista dos professores que conceberam 0 projeto, o que a rddio poderia representar nequilo que concerne o ensino da lingua materna?’ eu ecreio que era a procura de uma situecdo verdadeira/ onde aa eriangas teriam que produzir uma linguagem correta/ uma lingua materna correta// € a utilizagao da linguagem nessas condicbes/ com essa coerpio/ mas numa situacdo verdadeira// (2) Atyalmente Radio Gartable @ transmitida na FM B7.4, na frequencia da Radio Libertaire, todas as sextasé feiras das oneitimin. 45 1OhsiSmin.., em Pars 60 isso quer dizer condigves de coerpao que néo sé0 impostas pelo professor/ mas que sto impostas pelo/ ...bem/ por um acordo técito/ pois que néo hd escolhe// e@ além disso também se podia dizer’ “voces ja tém uma conduta pedagégica/ esse poderia ser um instrumento que corresponde mito bem a sua pedagogla/ a sua ideologia// tendo em vista o que vocés jd fazem\\ opedes que temos de leitura/ ou de ciénetas/ de matemétlea/ em que nés tentamos privilegiar a aquisigéo do saber/ mas pela crianca/ que ela seja questionadore/ que ela seja ativa// ‘TRANSCRIGAO ORIGINAL DA ENTREVISTA: I y a eum projet de créer 1 "Boole owverts(...)// autour du projet/ ont été Jnvités des enseignante qui travalliaient deja d'une certaine manidre/ 4 I"éeole d'Ivry/ qui avait come directeur Pierre Laborie // et ensuite ont été conviés les parents dos éléves/ le persomel de service de cette école/ la smunicipalité/ et Jes agents de 1“Kducation Nationale // donc 4 partir de Id ils ant essayé de réfléchir sur coment faire ue Scole idéale // 64 done chagu’un a apporté son petit/ sa petite golte d’eau pour faire couler la riviére// done/ 11 a été oréé cette école avec cette architecture/ bien entendu qu°#] a eu un architecte qui avalt aussi ses idées/ des grandes 1dées et/ en ce moment 14/ um pére wéléve/ "iM. Merlot/ a eu une idée/ ila dit “ca sera bien de faire de la Radio” // ils avaient déja une méthode parce que déjé 4 1"Foole Makarenko se passaient des choses/ des ateliers/ pas mal de choses of les gvsses travaillaient d'une fagon autonome aussi/ et donc c'est wi pare qui a dit: "ca serait bien de faire de la Radio // done j’écoole a été construite avec un studio denregistrenent// et puis l”inspoctrice/ the. Lotroica 4 cette époque/ a dit/ ‘c'est une trés boune idée"/ elle a vrainent beaucoup fait pour gue ase matte en place/ elle a vraiment ajdé a la mise en place du projet pédagogique/ elle a fait tout ce qu’elle pouvait pour avoir we autorisation (...J/ en tout cas/ pour ne pas mettre dea batons dans les rowes// nais elle a dit/ “ce gui serait bien c’est dene pas avoir la Radio de 1"école/ 11 faut essayer d’owrir le projet 4 sa circonscription” // I’école Finstein étatt déja trés bien concue et elle ne voulait pas que tout se trouve au aéae endroit// done on a trouvé wn local 4 1"école Maurice Thorez // Jecrois que “était la recherche dune situation vraie/ ot Jes enfants auralent a produire un langage correct/ un Jangage maternel correct // evest l'utilisation du langage avec ces conditions/ ces contraintes/ mais dans une situation vraie // cest-d-dire dea situations de contrainte qui ne sont pas inposées par J"instituteur/ mais qui seraient imposées par/... bien/ par un accord tacite/ puisqu il a’y a pas de choix // et puis cétalt aussi de dire/ “vous avez déjd une démarche pédagogique/ a peut étre un outil gut correspondrait trés bien 4 votre pédagogie/ 4 votre idéologie // vis-d-vie de ce que vous faites d&ja"// des options en lecture/ ou en sciences/ en mathématique qu'on a/ o on essaie de privilégier l’acquieition du savoir mais par lenfant/ qu'il soit demandeur/ qu“il soit actilys A DETERMINACAQ DO SUJEITO DO DISCURSO NA EXPBRIENCTA DA RADIO Nossa hipétese inicial 6 2 de que o professor e as eriangas que participam do projeto Radio Cartable aseimilan as determinactes do cujeito desse discurso como sendo isso que esta designado pela expressio “as coercées" citadas opalmente (e aqui transcritos em negrito) pelo professor pelos alunos durante uma avaliagéo do projeto Radio Cartable. 1. em uma hora // e 6 preciso preparar isso que se diz/ gravar todas as idéias que nés temos e no tempo que resta/ prepata-se 0 direto."// (aluno) x Estar dentro do espace de uma hora (o tempo reservado para cada emissio). 2. para que o outro (o locutor) se interesse por ler é necessério que a folha esteja bem escrita, limpa, bem apresentada; também oralmente é necessério falar bem, se exprimir. bem, apresentar-se bem para que o outro ( o ouvinte) compreenda bem." (o professor) mas meus alunos/ uma vez que eles tenham terminado o trabalho/ eu espero que-cle esteja bem rico/ rico como se fosse escrito// (© professor) preciso fazer como os artistas/ no teatro eles exageram quando falam/ eles abrem mais a boca/ Eu posso afirmar que eu mesmo e os outros professores/ durante o dia todo nés fazemos isso// (0 professor} isso nfo parece radiof6nico// (o professor) como na TV/ ler sem olhar// (aluno) ele fez um super progresso/ com seis pontos (seis paiavras de referéncia) na ficha ele foi capaz de fazer um texto oral// (0 professor) 6a a ficha nao precisa comportar todas as frases// (professor) nfo € -bonita a emissio deles/ eles léem palavra por palavra// (aluno) * Seguir modelos: a. o texto escrito b. as representactes teatrais, da TV, da radio e mesmo os professores 3. ele vai fazer uma lista e refletir bem em todas as possibilidades, tudo o que se pode dizer// (o professor) * Encadear Aqui “as possibilidades" s&éo as possibilidades de resposta no caso em que o ouvinte intervem na emiss&o através de uma chamada telefénica no ar. Nesse caso “tudo o que ge pode dizer" deve ser listado e previsto de maneira a controlar o sentido e a gerantir uma “homogeneidade relativa”. 49 4. née podemos falar em portugués na emiss&o?/ em um sentido n&o/ em outro sentido sim// n&io porque ninguém vai compreender/ mas sim se a gente traduzir/ ou explicar/ ou se a gente encaixar dentro de um Jogo/ por exemplo// (aluna) % Justificar o que se diz (porque dizemos o que dizemos) Todos esse pontos citados mostram que durante os ensaios, as determinacdes do sujeito do discurso vo sendo concebidas para o professor e para os alunos como sendo anélogas As "coerctes" em quest&o: elas determinam em que posic&o o sujeito vai se constituir. Ai estao listadas as determinactes mais genéricas desse sujeito. Elas so velativas a forma dos enunciados (produzides segundo um modelo; produzidas dentro de um espaco limitado de tempo), ¢ também séo relativas ao encadeamento sintético geal dos enunciados (tudo o que se pode dizer ¢ listado para garantir um efeito de homogene idade)- 66 Havera outras determinacees mais especificas para cada uma das emisstes. Todas essas determinactes constituem o quadro dentro do gual o sujeito assume uma posic&o. N&o hd, como podemos ver, anterloridade nesse proceso (ou seja, uma tomada de posicho antes da producto): ma verdade o sujeito lida com essag determinagtes no momento mesmo de sua constituicéo e é isso justamente que constitui sua posicdo. Quanto ao papel da Escola e do professor nessa experiéncia, poderiamos identificdé-los, por exemplo, no seguinte trecho: “eu ereio qué” era a procura de uma situacdo verdadetra/ onde as criangas teriam que produzir uma linguagem correta/ uma lingua = materna correta//" (0 professor) Aqui fica evidente a presenca também determinante do discurso pedagégico e, portanto, de posictes sujeito desse discurso (o professor, os alunos etc.) 67 O que vamos cbservar na sequéncia da nossa anélise 6 0 fato de que a determinacio do discurso pedagbgico se exercerd na sentido de fazer da prética da TEXTUALIOZACKO ambém uma ocasido de se “aprender” formas gréficas ¢ fonéticas satisfatérias (uma linguagem correta/ uma lingua materna correta), dentro dos critérios avalistives desse discurso. Porém, essas determinacées nie impedirio as determinactes do discurso radiofénico de exercerem igualmente seu poder. Esses Zatos nos mostran que a TEKTUALIZAGAO pode ser uma pratica da Escola porque as determinactes do disourso pedagégico ntio aio a6 tnicas determinantes do eujeito at inscrito. A diferenca que tentamos aqui exemplificar com a andélise da experiéncia Radio Cartable (mas que poderia ser observada om tantas outras experiéncias) é que as outras determinactes do sujeito, também determinado pelo discurso pedagégico, so agui evidenciadas e mobilizadas de forma radical(pra valer). 68 4 assim que entendemos @ fela do professor ao fazer referéncia a “yma situacto verdadeira”. B claro que a instituicke Escola falhe, assim como ha, em todo ritual, a falha (PECHEUX), o que explica a fuga do aujeito, que apesar de todaa casas coercbes, escara. 0 lapsus 6 uma marca dessa fuga deixada pelo sujeito, come veremos na sequéncia do trabalho. Ainda na mesma fale, pudemos observar a seguinte afirmacio do professor: "condipées de coerce que nao sdo impostas pelo professor/ was que s&o inpostas pelo/ ...bem/ por um acorde tdcito/ pols n&o ha escolha// ‘ferminaremos a se¢io reforgando a idéia de que 66 n&o haveria eecolha se niio houveese inconsciente, mas que & justamente porque hé inconsciente que torna-se possivel inclusive a propria linguagem, pois 6 através do inconsciente que o sujeito se deixa afetar pela Linguagem pelo discurso. Isso tudo esclarece, mais uma vez, sobre os ganhos pedagbgicos desta rroposta; ou seJa, a valorizagao dos processos en que 93 alimos sho afetadae pelo sfaito da ‘Unguagen_edo disoursa, (muitas vezes conseguidos apesar. da figura do professor e do discurso didético-pedagégico). 69 © FUNCIONAMENTO DO SUJEI'TO DO DISCURSO NA EXPERIENCIA DA RADIO Comegaremos esta seco reforgando a distingfo que J4 fizemos anteriomente entre o sujeito do discurso e as marcas de um “eu", ov outros tracos de um enunciador. Nos ensaios para preparer uma emiss&o da Radio Cartable, ha dois tipos de productes alternadas e independentes. Nés chamaremos “produgtio de fundo" eese tipo de produto gue se constitul a principio em fragmentos eacolhidos a partir de ui material de pesquisa dieponivel na escola, relacionado com o assunto da emiseao (livros, catélogos, revistas etc.). Esses fragmentos funcionam como “textos” ao produgirem um efeito de “fechamento” quando sao lidos como um todo, ou geja, tomados por inteiros, mesmo que provisoriamente, até que volten a produzir outros efeitos auendo estiveren encaixados no conjunto da emissto. Mesmo quando n&> so gravados na classe, cesses fragmentos serio lidoe no ar, pois trata-se de porodes definidas que podem funcionar ou come relatérios, ou como relatos, ou como historias etc., e diferem daguilo que 6 produzido “ao vivo". Esse outro tipo de produgio (ao vivo) é justamente o que chamamos de “encadeamento". Ela reorganiza os diversas “producbee de fundo” como um todo e presentifica a emisséo. Assim, durante os ensaios, as producées chamadas “de fundo" podem propor, por exemplo, um didlogo entre perconagens, consequentemente constituide por marcas enunclativas. Porém, dentro da emissfo como um todo, esses sujeitos enuneiadores esto, por assim dizer, sobredeterminados pela posi¢éio do sujeito do discurso comprometide com a emissio. Nessa posicto ele occupa vm lugar especifico, que difere desses sujeitos enunciativos, e que difere inclusive do lugar do narrador. & 0 que veremos na passage eeguinte. 7 ‘OKO NO BANDEJRO (3) as Linhas He locutor 5) Como na transerigs anterior, tami Yocés se lembram que na Ultima vez Toko salvou a profeasora// hoje/ esta manhi/ ele a encontrou na rua e ela o eonvidou para -almocar no novo bandej&éo instalado na escola este ano// Fros que passava por acaso pela caleada em frente escutou toda a conversa/HBB/ ah! ah! ah! eu vou ines pregar uma peca/ eu vou fazer desaparecer uma mulher do servigo para substitui-la/ para faz6-la desaparecer eu vou amarrd~la/ BBB/ e eu vou prendé-la dentro de um armirio// nesta tradugao horizontais correspendem a6 midancas de vor Ag maisculas @ O8 pontes nae io utilizades. As parras obliquas correspondem as pausias mani festas (misica, grite, et 0s dialoy: BEB correspond ) aettia em neurite, Q wn barulho proposital e Fros “se virou” papa trancd-la e depois se disfarcou em uma funcionérias/ Zoko por sua ves diz legal eu vou ao bandejao e entrevisto as criancas chega 0 momento da refeicao// as criangoas chegam ao bandejéo e cada uma deve Pegar sua bandeja/ seus talheres/ seu guarda-napo/ seu pao/ sua entrada’ seu gueijo/ sua sobremesa/ e@ seu prato principal// as criancas percebem que hé uma malher de servico que tem un ar estranho// eh! Mirsada’ vocé viu a funcionéria? oh/aim como ela se maquilou!/ ela & estranka parece que ela tem uma peruca @ que ela esta um pouco nervosa eda 6 ma ela 6 cafona ela esta um pouco nervosa ela tem baton espalhado por toda bochecha digamos que ela-no sabe se maquilar ela tem risco de l4pis em baixo do olho como se fossem grandes olheiras eu / eu prefiro a outra mulher de servico @ vocés? eu também essa dai/ ela 6 cafona ela pés minhocas no meu puré @ no meu um sapo/ isso me dd nojo @ no meu uma cobra eu adorava vagem @ ela me deu 36 um tiquinho eu adoro bife e ela sé me deu uma metade @ além do mais sabe 0 que eu encontrei? vai/ conta maquilagem enquanto isso Toko faz sua entrevista para saber se as criancas estay felizes no bandejéo bom dia criancas eu estou fazendo uma entrevista para o meu jornal/ vocés est&o contentes com o bandejio? eu nfo gostei da nova cozinha/ a nova funciondria nos coloca sapos nos pratos ee eu também nao porque eu adoro vageme ela 36 me deu um tigquinho @ eu adoro meu bife e ela sé me deu a metade e depois eu encontrei maquilagem no canto do meu prato © eu encontrei minhocas no meu prato alguns minutos mais tarde uma mulher de servigo suplementar é chamada para lavar a louga// Fros ficou chateado mas ele foi obrigado a ir/ porque foi ele que a chefe chamou// de repente/ BEB// 76 Toke entra na cozinha para ver o que se passe’ um horror a estranha funoiondria estd estendida no ah&e/ seus longos cabelos encaracolados estdo a um metro dela// ela tinha a cabega raspada coma um militar 6 quase careca// no lugar dos seus grandes peitos ela era reta como um massa de penqueca// dois farrapos de bixiga estourada ssem de seu outlays essa funciondria que quebrou a cara 6 na verdade un homem// : Toko veconhece Fros// MUSICA// nesse momento escuta-se un barulho vindo do anmdrio/ BEB// as funciondrias reconhecem a vos da sua colega trancada dentro do armdério// ent&o Toko salta sobre Fros para arrancar-lhe @ chave das mios/ BBH/ foi necessdrio mais de un minuto para que Toko conseguisse triunfar sobre Fros/mas ele € o wencedon// a funciondria pode ser enfim libertada/ e Fros foi dogado para fora/ BEB// MOSICA// VERSAQ ORIGINAL DA TRANSCRICAO: souvenez-vous la derniére fois Toko a sauvé la naTtresse/aujourd Iii/ ce matin/ elle Ia rencontré dans Ja rue elle ui a proposé de venir manger au nouveau self fustallé dans 1"école cette année// Fros qui passait sur le trottoir den face par hasard entendit toute 1a conversation/BBB/ ahlahlah! jo vais Jeur jouer un mauvais tour je veux (vais) faire disparaitre une dame de service pour la remplacer / pour Ia faire disparaitre Je veux (vais) Ja ‘ligoter /UBB/ ct je vais I’enfermer dans un placard. et Froo ae debroullia pow 1enfermer /BEB/ puis il oe deguisa en feame de service// foko de son cété se dit// Ghouette je vaia aller au self et interviewer les enfanta arrive le moment di repas// Jes enfants arrivent au self chacun doit prendre son plateau / ses couverts / sa serviette / ses pains / son entrée / son Fromage / son dessert / et je plat principal// les enfants remarquent qu“il y a une dane de service qui a l’air wn peu bisarre// oh! Mireada (?) tas vu la dame de service? oh ouais ‘coumant elle sest maguillée?! / elle est bizarre! on dirait quelle a une perruque ouais quelle est un peu nerveuse elle est méchante elle est moche elle est nerveuse un p tit peu elie a I’air méchante ‘elle a du rouge 4 lévres partout sur les joues disons quelle aait pao a maguiller elle a du crayon comme ca en dessous des yeux comme gros cernes noi J ‘préfére Taut “deme de service et vous? mol aussi celle 1d elle est mocke elle a mis des vers de terre dans ma purée et moi une grenouille / ca me dégoiite moi et moi et moi un serpent de noi Jadorais les-a-haricots verts elle men a mis qu‘un tout petit peu 79 Jvaimais beaucoup le steak et elle mén amis que Ja moitié et puis d coté tu sais c"que J ‘ben dis douc du maquillage pendant ce temps Toko fait son Interview pour savoir si Jes enfants sont contents du self bonjour Ies enfants je viens faire une interview pour mon Journal / est-ce que vous étes contents du self? ij 1eime pas la nowelle cuisine la nouvelle dame de service nous donne des greuovilles dans nos plats moi non plus parce que j-aimais Jes-z-haricots verts et puis elle m’en“a donné un tout petit peu Fadorais mou steak elle men a donné que 1a moitié ‘et puis Jai trouvé da maquillege 4 cbté de mon assictte ‘et mol j'ai trouvé des vera de terre / sur mon assiette quelques minutes plus tard on appelle ue dane de service supplénentaire pour faire la vaisselle// Feps est trds embété maie il est obligé d’y aller / car cvest ini que la chef vient de designer tout 4 coup /BEB// Toko rentre dans ja cuisine pour voir ce qui 5° passe / horreur 1-étrange dame de service est affalse par terre/ ses longs cheveux bouclés sont 4 un nétre d’elie// elie @ Je crane rasé come un militaire et presque chauve// 4 Ja place de 2a grosse poitrine elle est plate conm2 une” crépes// deux morceaux de ballon de baudruche éelaté sortent de son corsage// cette femme de service qui s“est cassé Ja figure est un fait un honme Toko reconnait Fros// 80 msigue// ‘au méne monent on entend un bruit venu du placard /BBR// Jes dames de service reconnaissent le voix de leur collégue enfernée dans leur placard// alors Toko bondit sur Fros pour Iui arracher la clé des + mains /BBB// i] faut plus d’une minute pour que Toko viewne 4 bout de Fros// ais il est vainqueur// entin la femme de service peut étre délivrée/ et Pros se falt jeter dehors/ BBE// musique// Desde o principio em “yooas se lembram?” na ultima vez Toko salvoun a professora/ hoje esta manhi ele a encontrou...”, © pronome_vacés faz uma referéncia explicita a um owvinte (destinatario) j4 conatituido antes, que jé tinha ouyido o programa “na witima vez"; “hoje” € a atualizacéo desse destinatario. Essa primeira parte funciona como representac&o do heréi. Ela pode “historicizar” o texto no momento da emissio. # o funcionamento do sujeito do discurso que finalizaré no AUTOR, desde que “hoje” seja saturado. No enunciado “eu vou lhes pregar uma pega” essa marca enunciativa “eu” n&o tem o mesmo funcionamento que o “yacés" (destinatasio de um "nés" enunciador) do comego da producéo. Eeee outro nivel de constituic&o (vocés/nés) € do sujeito do discursc, que neste caso tem wma marca enunciativa porque seu espace de constituic&o coincide com o espace de constituic&o da posicéo sujeito-narrador (nae que poderia nfo coincidir), enquanto que o “eu” do primeiro nivel 6 @ marca de um sujeito exclusivamente enunciativo. A__materi ac ieito 4 através de uma marca enuncieative, mes. através de uma operacSo sintdtica aue define as pardfrases possiveis..ns relacio como enunciado. 28. .esaa a diferenca entre determinactes enunciativas e determinacies discuraivas. Essa operac&o, que pode historicizar “o texto" como um todo, no momento da emissto através do efeito "TEXTO”, como veremos, pode estar marcade (por uma marca enunciativa) como no caso presente (vocés/nds), ou ela pode n&o ter marcas. ez Essa sequéncia que acabamos de ver se constitul finalmente em uma demonstracag do fato de que durante os ensaios, as produgdes de encedeamento como: "vocés se lembram..« sobredeterminam 0 sentido das “produgSes de fundo” porque essas primeiras atualizam "ad infinitum" as segundas, ou seja, * Bs asde “fundo”. Embora se tenha a conjugactio explicita de dois tipos diferentes de producdes, _no momento meamo da emissio a somo tal(como unol.. Mais a frente estaremos mostrando gue o “TRXTO", nease caso, € um efeito produzido no evento discursivo. Antes diseo, porém, observaremos como 0 sujeito do discurso esté articulado na prétiea da TEXTUALIZAGAQ. Bs SEGUNDA PARLE QUANDO TIQUEI ADULTO © MUNDO PASSOU A EXIST'IR SEM MIM. Ba SOBRE A____TEXTUALIZACAg Por estarmos convencidos de que tomar o "TEXTO enavanto objeto é sempre enganoso, nés insistiremos em consideré-jo um efelto da TEXTUALIZAGAg Neste concepetio, nfo hé "“TEXTO enquanto. um objeto aue tenha uma existéncia independente da prética de sua producto (cw de sua reprodugio), Na verdade, € a pratica de TEXTUALTZAGKO que produz 0 ‘TEKTO. Bese pratica pode ser re mobilizada indefinidas vezes em que o TRKTO serd re- produzido em novas leituras. 0 TEXTIO é definido, enttio, pela sua inserigio, pela sua escritura (1) Nés veforeamos, ainda, que nessa perspectiva quedesenvolvemos aqui, escritae grafismo se descolam. Ae formas graficas nfo so consideradas como “representacto” de palavras, mas ao contréric, no nosso ponto de vista é 0 grafismo pode ser uma manifestagte (gréfica) da escrita e do TEXTO. - Ha “TEXTOS", no entanto, cujo trabalho de TEXTUALIZAGAO n&o se vealiza em uma matéria grdéfica. un efeite de (i) Congideranda, antsa, TEXTO comp send TEXTUALTZAGAG, stamps mais & frente nos valendoy ainda, des termas "texto" (com mintisculas} tazendo retereneia ae objste mimpirico, # enquante tal canpletamente epaco @ intratavels @ clo termo "fragmento", fazenda retgréncia A matéria textual. 86 Propomos ents o conceito de TEXTUALIZAGAO que deve ser compreendide enquanto prética de fixacdo, de “escrituracto” de um fragmento. Nessa perspectiva n&o se tem Jamais um TEXTO em si (como objeto). O que se tem 6 um fragmento definido, estabilizado, resultado de um trabalho, um funcionamento: a prética de sua producto. Essa pratica € anéloga a da escrita e grafia, como veremos a seguir. TEXTUALIZAGA Em velacko ao trabalho que a TEXTUALIZACAO realiza, podemos comparé-lo so trabalho da propria eserita. Observando as diferentes veretes da hiatéria da escrita propostas desde 0 final do século passado até nossos dias, notamos que esses trabalhos tém em comum uma cronologia, menos ou mais precisa, mas sempre uma cronologia que permite localizar no tempo (e no espaco) diferentes fases de produgio da eserita pela humanidade. Apresentaremos a seguir um resumo da histéria da escrita proposto por FEVRIER (2), um autor cléssico eontemporaneo, e que tomaremos como exemplo desse tipo de organizacto cronolégica a qual nos referimos, em relacio & escrita. Embora tantas outras publicagées sobre o assunto tenhan alterado bastante esse quadro que segue, essas alteractes, que inciden sobre os dados (de ano, local, fasee etc.) nfo nos interessam aqui, j4 que o principio de uma cronologia se conserva, e é sobre ele que investiremos em nossa reflextio. Se quisermos resumiry em aigumas palavras o desenvolvimento da eserita, é necessério distinguir varias etapas easenciais. 1a” 0 homem primitivo dispde de ume multiplicidadé de meios de expreselo, indo da Jinguagem oral ao desenho passando pelo gesto, os né2, 08 entalhes sobre natéria dura ete. Desses meios de expressdo, uns séo momenténeos, os outros 340 duraveis. EVRIEK, d-G. ~ Histoire de 1’ Geriture. 1959, yot. Paras. 36 subsisterag os que so suscetiveis de um maior aprimoramento, a@ saber, entre os primeipos, @ Jinguagem, sob a forma da linguagem articulada, e entre os segundos, a escrita propriamente dita. Nesse primeiro estado as formas embriondrios de escrita podem ser ditas auténonas. 24 Durante um segundo reriodo a escrita tende a eoincidir com a linguagem articulada, mas trate-" se, ainda, de uma correspondéncia aproximativa: um signo de escrite, ou un grupo de signos visan sugerir -nds n&o dizemos que visam notar- toda uma frase. Isso resulta gue o sistema grdfico, por mais engenhosamente gue ele seja concebido, fica eternamente em falta, pois o numero de pensamentos © por consequéncia de frases possiveis $ infinito. Os esbogos de~ escrita desse tipo podem ser classsificados de sintéticog. 0s alendes dizem Ideenachift, "escrita de idéias”. 8? 38 Nesse momento um novo progresso se realiza: o signo néo eveca mais a frase, ele nota wna palavra. Progresso de uma importancia inealoulével. Dai em diante a elaboregio dos signos da escrita escanam a0 arbitrdrio: sendo o mimeros de palavras finito, ede palavras usuais restrito, podia~se ter um 986 signo e sempre o mesmo para cada palavra. Assim se constitul um estoque de signos de valor constante. Por outro lado, 0 texto exato da frase 6 conservado, pois essa frase 6 decompesta em..seus elementos constitutives, a saber, as palavras, ¢@ que cada uma delas tem sua notacao propria, De sintética a escrita torna-se analitica ou jdeosrdfica. Os alemfes dizem nesse caso Wortschrift, “escrita de palavras". 44 Enfim, vma nova simplificac&o intervem, decisiva. Assim como ha menos palavras que frases, © ntimero de sons ov de elementos fonéticos contides dentro das palavras & bem mener que o das palavras elas mesmas. 90 Entao, quando se nota n&o mais essas palavras mas as silabas ou as letras, é sufioiente uma bagagem Ancomparevelmente mais restrita do que quando se recorria ao procedimento precedente. A escrita seré dita dai por diante fenética, pois ela registra oa sons. Fla poderd ser classificada de sildbica ou alfabética, conforme o trabalho de andlise que ela impiica tiver ido menos ou mais Jonge. Essa exposicéo 6 voluntariemente esquemdtica. Na verdade a linha desse desenvolvimento nao é nem uma, nem peta. Ela tem marcas, por um lado, de uma série de progressos sobre os quais 6 indtll insistir, pois eles sao visiveis denais, mas por outro lado uma seguéncia de degradacées: de um meio de expresso auténome, a eserita caiu para o posto de simples substituta da fala. (pg.10/11) ot Uma primeira observacdo que podemos fazer 6 de que uma apresentacto cronelégica da evolucio da escrita pode prescindir, de. certa maneira, de uma anélise materialista onde tal “evolucdo" seria observada no interior da propria matéria eserite, através do seu funcionamento. Igso poque nesse caso, a propria semporalizacto (un fiato depois do outro) acaba por ocupar o espaco do snexplicével(como se dé) e ocultd-lo. Em outras palevras diriamos Que uma possivel andlise da escrita, que poderia mostrar @ hietorieidade em sua propria matéria, acebs sendo eubstituida pela “histéria da escrita", que apotando-se em una cronologia, constré1 uma nistéria que lhe 6 externa. Assim, quando se firma que em uma primeira fase a escrita € autonoma, e que em uma fase posterior ela Jé uma representactio aproximativa da linguagem articulada e que finalmente ela passa 4 notar as palavras, silabas e letras dessa linguagem articulada; todas essas afirmagtes, mecmo quando desenvolvidsas de forma n&o esquemética, produzem algumas (falsas) evidénciae: 18 - © trajeto natural da escrita (sua vocac&o) conduz a uma representactio cada vez mais fiel da oralidade; 28 - as palavras, silabas ¢ letras ja existem (enquanto teis) na linguagem articulada ¢ a escrita aos poucos val aprimorando as formas de representd-las; 84 - escrita e grafismo sfo a mesma coisa. No entanto, quando procedemos a uma anélise discuraiva desses textos evolucionistas, encontramos indicios de que tais evidéncias sto forjadas pele prépria estrutura do discurso onde elas so cbfistruidas. Se aceltdéssemos, por exemplo, o argumento de que a eserita analisa naturalmente a linguagem articulada até chegar a elementos minimos (as letras), como explicariamos, onto, escritas orientais, por exemplo, que congervan até hoje seus pictogramas? Nesse caso a natureza analitica da eserita teria falhado? Acreditamos que o que esté em jogo ai € a confusto entre escrita e grafismo, que a nosso ver sto coisas distintas. A eserita pode existir em um eixo que vai de mais pictograéfica a mais graéfica, e sua posic&o dentro desase eixo varia no tempo e no espaco. Quanto maie grdéfica, porém, mais fragmentada ela 6. Ser mais fragmentada n&o significa. no entanto, ser uma representagto fiel da linguagem articulada. 0 desenho, assim como a letra, nio faz sentido porque representa algo, mas sim pelo seu papel discursivo. Dentro do universe escrito, para os egipelos o desenho Ge um péssaro 6 um deue sol e nlo uma representiacho do animal péeearc, enquanto que og olhos vredondos de um erocodilo é um sol nascente, por exemplo. Para os sunérios, o asterisco corresponde também a um deus, enguanto que para os chinesee o desenho de un pequeno quadrado com um pingo no centro é um sol, e assim por diante. # importante observar ainda aqui, que o péssaro, pare 08 egipcios nfo cignifica a “notacko” de um deus, encontrével em algun lugar, mas sim ele (re) presenta eose deus no sentido de que é 8 forma de existéncia material desse deus. 9a Na verdade isso nos remete as raizes da eserita ideograéfica, no periodo pré-histérico em que 8 escrita tinha valor m4gico. No Novo México, para obter a chuva, temos noticia de que ainda hoje certos padres desenham no chao de santudrios sagrados, nuvens, serpentes em forma de vaics e tragoe pretos simbolizando a chuva. Marcas desse tipo de ritual sto encontradas sinalizando uma época bem anterior ao aparecimento da escrita. NSo se trata de uma simples manifestacio artistica, mas o desenho tem valor mégico, ou performativo. Seu valor transcende seu significado. 0 desenho é um evento € o que faz sentido € 0 evento do desenho e n&o 26 © desenho em si. Q que nos faz concluir que a diferenca entre pictograma © letra nto 6 determinada pela forma (desenho ou srafismo), mas pela forma de circulagéo dessas escritas. Existem muitos enunciados compostos graficamente e que em determinados casos tém valor performative ("eu jure", por exemplo, dito em um tribunal), assim como existem ideogramas sem valor performativo. 98 Da mesma forma que o signo "*" n&o é menos ou mais “auténomo"(sem ligagio com a linguagem articulada) se tomado enauanto pketograma ou enguanto sinal grafico. # © caso, por exemplo, do desenho do péssaro, que tinhs, nos templos egipcios, um valor sublime e compunha com uma escrita toda ela mais elaborada do ponto de vista da arte pictogréfica: os hlerégiifos, Fora dos templos, usando o papiro como base, os egipcios produziam uma escritea mais simplificada, a escrita hierética, praticads pelos padres, ou a eserita demdtica, ainda mais simples e popular cujo valor deixa de ser sagredo (ou performatiive) como nos templos, e torna-se menos pictogrdfica (e consequentemente mais grafica), mas nem por Asso pode ser tomada como representagao fiel da linguagem articulada. Seu sentido continua a ser efeito de um discurso, que n&o & mais o religioso (onde a performatividade ¢ muito forte), mas que pode ser o duridico ete. gue o trajeto da eearita em direofio ao grafiemo, apesar de ser_um_caso importante (que ocorreu, por exemplo, em relacHo A lingua dos fenicios que precedev os aifabetos grego © latino), nfo 6 uma condicto intrinsecn A escrita. Em relagdo & producdo das palavras, silabas e letras, isso realmente parece ser um trabaiho da escrita sobre a iinguagem, mas exclusivamente nos casos em que 4 escrita realiza-se através de um grafismo. Poderiamos dizer que 6 o grafismo, e nao a escrita que acaba por realizar materialmente palavras, silabas e letras. Portanto, fica entendido aque em nosso ponto de vista nf&o hé palevres, silabas ¢ letras naturalmente na linguagem articulada, sen&o quando essa lingua 6 analisada por uma forma grdfica. Acreditames, entéo, que, por exemplo, no caso da escrita fenicia, ela produz uma “oralidade” ligada @ grafia (e n&o o .contrério}). Tanto 6 assim que vemos essa mesma escrita gréfica incidir sobre outras linguas orais produzindo uma versio escrita dessas linguas, como no caso da lingua dos sumérios e dos acadianos, “grafadas" pelos Inesmos Signos, e@ cuja “oralidade” produzida 6 outra. Se a grafia representasse a linguagem articulada, duas linguas orais diferentes jamais teriam a mesma grafia. Concluimes, entto, que a_escrita eréfica, na. sua constituiciio. nobiliza os sons da linguagen articulada, mas ndo_¢ uma_representacko dessa Linguscen. Os efeitos de sentido dessa produg&o (escrita grafica) sio especificos e préprios dela unicamente. Isso 6 consequéncia de sua constituicéo material e histérica também especifica, bem diferente daquela da linguagem articulada. A’ eserita grdéfica produz uma versio de lingua oral, com forma _e sentido especificos, impossiveis fora dela_ Em Gltima insténcia, acreditamos que, da mesma maneira que os ideogramas, a eserita alfabética também guarda uma dietfncia intranaponivel da Linguagem articulada. 98 A diferenca aqui 6 que a eserita ideogrdfica evidencia essa distancia, uma vez que lgnora os sons da lingua por ela “eserdtos”, enquanto ave a escrita grdfica fonética constréi-se a partir deles, No entanto, ao menciond~ios, silencia-os. Assim, como of ideogramas, a eserita gréfica fonética n&o representa a lingua oral. Pelo feto dessa escrita relacionar sons, ela produz a iluséo de estar representando a lingua oral, no entanto esses signos tém o mesmo valor de ideogramas. Sua unica e salutar vantagem sobre os ideogramas 6 a facilidade que se tem para decifré— los, uma vez que ao serem sonorizados remetem a lingua oral. De toda maneira a escrita gréfica, na relacto coma lingua oral, produz e enquadra "significados", listando palavras e eatabelecendo os limites de wm idioma. Ease enquadramenta esté sempre determinado pela discursividade. Nela os sentidos se filiem e se compartimentalizem através de inameros mecanismos de sedimentacto —_(imprensa, editoracéo, scripts, documentacio e tantos cutros enquadramentos produzidos pela escrita). oF Assim, chegamos A TEXTUALIZAGAO e a comparag&o que faziamos no inicio desta sec& entre o trabalho da escrita e © trabalho da TEXTUALIZAGAO. Para bem situar essa relagio 6 preciso recolocar a questdo da eseritae da grafia em outras palavras. Diziamos que €a grafia que acaba por determinar a producéio de palavras, silabas, letras etc. Mas 6 importante dizer que tal realizacéo néo se daria pela grafia ela mesma. Ne verdade, € @ escrita que dé a suestentac’o ao trabalho grafico. Sem essa sustentagdo a grafia seria um jogo de tracos sem limites e sem sentido. A escrita contém esses tracos e dé a eles sentido, pois € da eserita a capacidade de eecrituracio, de inseric&o, de delimitacfo, de cunho. A egcrita, entéo. trabalha.sobreasrafia, dando a ela limites e sentido, ds mesma maneinaque,_amoutre plang a TEXTUALIZAGAQ trabalha sobre frasmentos dando a eles limites 2 reorganizande seus sentides. 100 Assim, como escrita néo se confunde com grafia, como wimos, também TEXTUALIZAGAO néo se confunde com producae de texto grafado. O gue nio quer dizer que grafia e fragmento n&io estejam relacionados a eacrita e TEXTUALIZAGAQ- Nossa preocupacio aqui @ a de evidenciar a dimenséo discursiva dessas nogdes (escrita e¢ TEXTUALIZACAO) e, conseauentemente, ao produzir esse conhecimento, acabamos por reorganizar outras-nogées como a de grafia, texto, fragmento ete. soa ‘TEXTUALLZACKO/DISPERSKO fxiste, ainda, um movimento na linguasem, que @iferentemente dessa tendSncia estabilizadora que desemboca no TEXTO, tem a tendéncia & dispersio por exceléncia. Dispersdo do sentido e do sujeito que ai se constitui. Por isso o Discurso nfo 6 linear. Ele tem uma profundidade que se forma simultaneamente e através de pardfrases em relacio a tudo o que é “construid © jogo entre o “Gnico” € 0 “outro” no interior mesmo do nivel discursivo da linguagem n&o cessa jamais de existir. A iransparénoia eo fechamento na linguagem € um efeito ave se chama TEXTO, produto da prética de TEXTUALIZAGAG Consequentemente, no Discurso, o momento mesmo da producto dos sentides & também o momento de uma decalagem, de um estranhamento do sujeito em relacfo so sentido “construide”. 402 Se na dimensao textual da linguagem a materialidade € A LETRA, na dimensio discursiva a materialidade sko AS LETRAS, as letras resultantes de uma substituicso significante constitutive e¢ de uma multiplicidade significativa permanente. Se o TEXT0 fosse realmente esse produto plano que fazem parecer as teorias do texto, nfo se poderia falar, a rigor em “intertextualidade", pois o TEXTO comegaria e terminaria nele mesmo (2). 0 'TEXTO encontra sentido porque nto é "um". Boa dimenséo do discurso que trabaiha sobre o sentido. A superficie do TEXTO dissimula a profundidade do discurso. Para compreender melhor como essa dimens&o discursiva do sujeito pode aparecer em uma productio escolar ¢ quais sto as conseguéncias que gepode tirar, nés descreveremos um episédio onde aparece essa questo. (3) Eataans entendo intertextualidade sequnde a fermulacas de ORLANDI, E., in. @ Linguagem e seu Euncionamenia", 2a.eu, 1967, (pg. 160)2 "A intertextualidade pode Vista Sob dois aspectos: primeira, porque se pede relacionar um texta com outros nos quais ele nasce @ outres pare os guais ele aponta; segunda porque se pede relaciond-lo cam suas pardtrases {seus fantasmas), pols semp: ao canjunte de kextos possiveis naqueles condighe producan. A intertextualidada @, pois, um das fates que constituom a unidade do texto." se pode referir um texte de Em uma sala de aula de lingua materna a professora pediu aos alunos (de uma 5.a série) para produzirem yma historia escrita. Entao, Eduardo produziu sua histéria em que o personagem chamava-se também Eduardo. Esse personagem, depois de ter vivido alavmas aventures, € designado como “eu” (ou eventualmente “mim"). A passagem de “Eduardo” a "eu n&ce tem nenbuma explicacdo na histéria e ela poderia ser considerada como um momento de falta de co-referéncia, ou de coeréncia: um personagem (Eduardo) desaparece e um outro (eu) entra na historia sem que essa “passagem” de um a outro tenha sido tecida. Esse exemplo nos mostra o surgimento de uma FORMA inesperada dentro da linearidade da escrita, Essas FORMAS sé consideradas normalmente como “erros” pelos gue ensinam a produgtio da eserita. Porém, de acordo com nossa percepgfo nés diremos diferentemente, que essas FORMAS trabalham (a0 mesmo tempo que elas mostram) o aspecto da incompletude constitutiva da linguagem. Uma forma de se pensar essa incompletude é enquanto produto da decalagem constante entre a dimensao textual ee dimens&o discursive da linguagem. a Portanto, em relacd) aos dois tipos de producto de RADIO CARTABLE, para melhor compreender a tese da existéncia desse jogo constitutivo de TEXTUVALIZAQAQ e dispersio, é necessdrio antes considerar que nem essas que nos chamamos de “productes de fundo". nem essas outras gue nos chamamos de “encadeamento”, s&o produgtes concebidas isoladamente e nem de maneira abscluta. Assim, antes do momento da emisstio radiofénica, hé toda uma série de ensaios. Durante esses ensaics, o trabalho do professor e dos alunos se desenvolve em duas diregtes: de um lado eles produziréo justificativas , momentos ideais e formas ideais para que as “productes de fundo" (normalmente apresentadas através de uma leitura) sejam recebidas “naturalmente” pelos ouvintes, como fazendo parte de um todo. Essa & uma prética de abertura dos sentidos: a mobilizagio das ambiguidades latentes de uma porc&o fechada, ou seja, a mobilizacdéo de suas pardéfrases. 0 resultado desse trabalho sio as “produgdes de encadeamento”. 105; De um outro lado, © trabalho do professor ¢ dos alunos se daré na directo de conter a dispersio de sentidos, limitands .e produzindo um “fechamento” que rematard finalmente no efeito TEXTO (aquilo que resulta na emissio como um todo). Hesa prética € a que nés chamamos TEXTUALIZAGKO. Finalmente nés diremos que se de um lado se mobilizam diversos sentidos possiveis.naprAtica discursiva, de outro lado esses sentidos serio “scbredeterminados” na prética da TEXTUALIZAGAO Desta perspectiva nés diremos que trabalhos como esse realizado pelo projeto Radio Carteble constituem uma experiéncia diferente das experiéncias tradicionais de ensinc de lingua materna, no sentido de que eles permitem essa TEXTUALIZAGAQ. isso se explica pelo fato de que as determinactes do sujeito do discurso radiofénico, como mostra o caso “Radio Cartable", se acresocentam as determinagtes do discurso diddtico-pedagogico que nesse caso nie sio dominantes. 106 No discurco radiofénico, que um discureo nag circular, a produg&o Linguistica do aluno nao é tomada unicamente- para fine avaliativos como nas situactes tradicionais de ensina, em que ae, determinagées discursivas 280 exclusivamente internas a um “discurso didético- pedagégico" (as produgSes para a Escola e para o professor) e og textos funcionam como instrumentos pedagogicos. Nés mostramos em seguida como se desenvolve a prética da TRXTUALIZAGRO durante 0 ensaio de uma emisséo radiof6nica, observands que o “fechamento” dessa prdtica 56 se dé no momento mesmo da emiasio. (4) MUSICA (marcagtio da entrada do programa no ar) ah/ enfim/ depois de todos esses contra tempos eu wespiro/ vamos/ chega de besteiras/ passemos as coisas sérias// (Hrantine) (4) Gomo nas autres tradugtms de transcrigtes, aqua seguimes os menos princépios: barra simples para pausas curtas,barra dupla pare pauses longas, barra grand hoprizantal pars separer as falas de diferentes losuteres, Nao ha pontwag 107 péndulo pequeno péndule/ que horas s@o na Radio Cartable 89.424/ so exatamente 3 horas e 45 minutos na mais bela das ridios// (dulie) a gente j& péra aqui?// (o professor) mude de voz porque voc8 dis “péndulo peguenc Péndulo” © depois 6 necessério bah o péndulo respond? com @ mesma vos que voc® Ihe deu// (Adrian) @ gente 6 tem que pegar o Yan porque ele n&o esta com muita coisa prd dizer// (um outre aluno) eu nao entendiZ/ (o professor) Yan/ como ele n&o diz mtita coisa ele pode fazer o péndulo// ( mesmo aluno) 108 vocé entendeu?/ sim ou n&o7/ voeé 6 um péndulo// Yan temo papel/ ent&o/ vocé & um péndulo magico hein?/ ent&o 6 necessério que vocé faca uma voz de péndulo mégico// quem tem uma proposta para que Yan possa fazer o Péndulo mégico?// (o professor) Sao exatamente/ espera...// (Sabine) isso 6 mais uma voz de Sabine do que ade um péndulo mégico// (o professor) dom...dom....8&0 dez pr°as 4 // dai se vocé quiser cologue um eco. ?.// (Charlane) mas yoo’ mesmo pode fazer ?/ vamés/ quen tem ainda uma sugest&o para dar ao Yan?/ vamos/ néo tenham medo/ 6 super bom que a emiss&o seja melhor’ quanto mais vocés tentarem ser criativos melhor serd a sua emisséo// (o professor) ae 0 péndulo responde: oh minha bela princesa/ sfo 3 horas e 45 minutos// (um outro aluno) enfim isso & um pouco pessoal// (o professor) é// (0 mesmo aluno) 6/ Yan nfo estd a fim de dizer minha bela Princesa’ Yan/ vocS estd afim de fazer esse papel?// (o professor) sim// (Yen) té/ entdo tente fazer pra gente o péndulo mégico/ vai/ yan/ vocé n@o tem nenhuma outra idéia? tentem enté dar idéias a ele os outros/ vai// (0 professor) seré de manh& ou néo?/ voeé pode dizer “oh/ vocé me acordou/ sdo exatamente 9 e 45"// (Julie) sim/ mas com uma voz mégica// (um 3.0 aluno) 410 ele n&o ouviu/ vocé repete?// (o professor) @ gente pode dizer por exemplo/ como serd de manhé que a gente vai fazer / vooé pode?/ enfim/ vocé pode dizer ah/ oh/ vocé me acordou/ sfo exatamente 9 horas e 45// (Julie) sim/ mas ele néo esta com ar muito animado/ entéo/ a gente ouve o Lée// (o professor) eu posso fazer tic tao? (Yan) por exemplo/ v6 14/ 6 uma boa idéia/ va la// bom ent&o/ vocé quer talves fazer tic tac/ isso sera talvez mais féc1] eh/ mas// vamos/ vocé refas a pergunta Julie’ e depois a gente vai ouvir Yan que dé e@ vreaposta// (oO professor) péndulo pequeno péndulo/ que horas s& na Radio Cartable 89.6 FM ? “/ (Julie) eu acho que nosso colega esta com um problema...// ¢o 3.0 aluno) n€o/ eu creio bah...// (o professor) eu ereio que © pequeno péndulo teve um probleminha com seus horérios// (o 8.0 aluno) ele deveria trocar as pilhas// (9 2.0 aluno) entéo/ répido// (0 professor) entéo pequeno péndulo“/ (0 3.0 aluno) ah/ yvoo8 me acordou/ $8 4 horas e 51 na Radio cartable// (Yan) n&iof vocé & um péndulo// (o professor) sua vos néo 6...// (o 3.0 aluno n ela na, 6 magica hah// vai Yen/ vocé tem uma vos magica a nos proper? // (o professor) 4/ (Yan) eu posso faser ag intervencdes// (Adrian) veeé vai se reservar para as intervencdes?// entdo...Adpian/ vocé ouviu?// (0 professor) as intervencdes sio feitas pelo Adrian// (0 2.0 aluno) Adrian 3e propoe a nos salvar caso a gente tenhe problemas’ entéo isso supGe que ele prepare bastante bastante bastante intervencdes hein? // (professor) 2 guanto ao p8ndulo eu acho que...//(Sabvine) HS bom/ entao/ talves o que nés possamos fazer é deixar Yan refletir sobre isso com os seus colegas ]@...na préxima vez porgue ai eu acho que ele néo estd muito espontdneo han/ precisa de un pouguinho de tempo / espontaneo significa yue ele ainda n4o esta sendo capas de ...na hora assim...// (0 professor ) faser como se fosse de verdade// (Julie) Versio Ori i MUSIQUE (marquage de ia rentrée du programme) ah’ enflm/ aprés tous ceg petits problémes je respire/ allex/ finiss Jes betises/passons aux choses sérieuses// (Rrantine) pondule petite fendule/ quelle heure esti] sur Radio Cartable 69.4 2// ( Julie) dl est exactanent 3 heures 45 sur la plus belle des radios// (dulie} on arrete la déja?// ( 1"instituteur) 11g change de voix parce que tu dis "pendule petite vendule” et puis i] faut bak/ Ja pendule te répond de Ia méae voix que tu li as donné// (Adrian) ona qu prendre Yan parce qu“il ne dit pas beaucoup de choses// ( 1“éleve 1) de nai pas entendu// ( 1 instituteur) Yau/ come il ne dit pas beaucoup de choses/ 11 pourra prendre Ja pendule// (1°éléve 1) tu a entenda?/ oui ou non?// tu es la pendule// alles Yan a le réle/ alors/ tu es we pendule magique bah?// alors Gl faut que tu prennea une voix de pendule magique// qui est-ce qui 4 ime proposition pour que Yen puisse faire 1a Fendule magiqe?// ( 1"instituteur) U1 est exactement/ attend...// ( Sabine} ca cvest plus une voix de Sabine qu ‘ue pendale magique// Cinstituteur) dom...dom...i1 est 4 heures moins 10// puis si tu veux aettre un écho?// (Gharléne} mais tu peux le faire toi méme?// allez/ qui est-ce qui a un avis encore 4 domer 4 Yan? // allez/nayez pas peur// c'est trés bien que l“émissien allait mieux/ plus vous essayes d’étre Imaginatifs et meilleure est votre émission// (1 inetituteur) Ja pendile répond: oh ma belie princesse/ 11 est 3 heures 45// (1 lave 2) enfin lé eest un petit peu persomel// (1 “instituteur} oui// (1éleve 2) oui// Yan il na pas envie de dire ma belle princesse// Yan/ ta as envie de faire ce réle?// (1 “instituteur} oui// (Yan) oui/ alors essaiez de nous faire la pendule magique/ vas y// A18 Yan / tu n’as plus d“tuées?// essayea de lui donner des idées alors les autres/ vas y// (1 instituteur) ea sera le matin ou quoi?/ tu peux dire “oh/ tu me reveilles/ jl est exactement 9 heures 48// (Julie) oui/ mais dune voix nagique// ( 1 éléve 3) Gl na pas entendu/ tu repétes?// (1 insti tuteur) on peut dire par exemple/ come ga sera le aatin qu‘on le fera/ tu peux/ enfin/ tu peux dire ah/ oh tu me reveilles/ 41 est exactenent 9 heures 45// (Julie) oui/ mais i] na pas lair trés embalié/ alors// on écoute Lé0// (1 "instituteur} est-ce que Je peut fatre tic tac?// (Yan) par exeuple/ vas y/o est wne bonne idée/ vas ¥// bon alors/ tu veux peut-étre faire tic tao/ pa sera peut-stre plus facile eh/mais// allez/ tu lui reposes la question Julie/ et puis on va écouter Yan gui fait la réponse// (1 insti tuteur) pendile petite pendile/ quelle heure est-i) sur Radio Cartable 89.4 AM 2// (Julie) Ge crols que notre camarade a un probléae...// (1éléve 3) nnon/ je crois bah.../ (1 insti tuteur) Je crois que Ja petite pendule a ew un petit probléme dans aes horaires// (1“éléve 3) Al devrait changer les piles// (1éléve 2) alors/ vite// (1 instituteur} alors la petite pendule// (1 élave 3) ah/ time reveilles/ il est 4 heures moins 9 sur Kadio Cartable// (Yan) non/ tu est une pendule// (1 “inst ltuteur) aie ta voix nest pas...// (1 éléve 3) elle nest pas magique hai// alles Yan/ tu awrais we voix magique a nous proposer?// (1 “institutewr) w2e/ (Yan) moi je peux faire les interventions// (Adrian) tol tu te reserves les interventions?/ alors... Adrian /vous avez entenda? (1“instituteur) Jes interventions il fait Adrian// (1 -éléve 2) arian se propose de faire les sauvetages si jamais on a des problémes/ done ga suppose qu‘il prépare beaucoup beaucoup beaucoup d“interventions bah? // (1“instituteur) et quant a la pendule Je crois que ...// (Sabine) bon/ alors/ peut &tre ce qu’on peut faire c’est Jaisser Yan PSflechir 4 ya avec ses camarades et ...pour la prochaine fois parce que 1d je crois que c‘est pas... il nest pas trés spontané hah/ il faut un petit peu de temps/ spontand oa vent dire qui] nest pas encore capable de ... tout de suite conme ca...// (1 “instituteur) faire comme ai o“Stalt veaie// (Julie) uly Aqui née temos uma prdtica onde se trabalha e dispersto de sentidos ligados & “produgéo de fundo”, apresentada no comego, ou seja: “péndulo pequeno péndulo/ que horas s&io na Rédio Cartable 89.4?// sflo exatamente 3 horas e 45 na mais bela das rédios” //(Sulie) © trabelho se desenvolve na directo de produzir TEXTO,0 que se daré através da pratica de TEXTUALIZACAO. A producto do efeito TEXIO dependerd inicialmente de uma adaptago desse “fragmento original” a situacso de enunciagde onde deve ter lugar “uma voz magica”. Essa situacto de enunciacto est “sobredeterminada” pelo sujeito do discurso radiofénico, engajado na pratica de TEXTUALIZAGA. Mas essa prética 6 se “fecha” no momento mesmo da emissio, quando o efeito TEXTO produz os fragmentos como um todo e quando o efeito-AUTOR faz com que a voz se produza como sendo realmente a de um péndulo. Esses dois efeitos (0 AUTOR © 0 TRXTO) s6 sto produzidos dentro de um evento discursive, e a forma como isso se dé nos veremos nos capitulos eubsequentes. 448 Adiantamos, entretanto, que, dentro do todo que 60 programa no ar, aguilo que serd a re-presentacto do péndulo durante os ensaios (producto de um sujeito do discurso vadiof6nido), torna-se presentificacéo de um péndulo (produg&io do mesmo sujeito jd capturado pelo efeito AUTOR), e aquile que é um fragmento, torna-se parte de um todo (ja capturadd pelo efeito “TEXTS). 2 também importante aqui compreender que a pratica de TEXTUALIZAGAO pasea necessariamente pela dispersio, © nesse projeto ela é bem trabalhada dessa forma, enquanto que esse néo 6 de mancira alguma o caso do ensino tradicional de Lingua materna. Assim como é igualmente importante observar que a prdtica de TEXTUALIZAGAO. 6 4 efetivada nos casos onde houver um momento de fechamento, de conclusio dessa pratica. necessariamente fora (da Escola 2) do discurso didético~ pedagégico. Af torna-se possivel, como j4 vimos, a assungko de posictes digcursivas em discursos n&o circulares ou auto~ avalistivos, neste caso, por exemplo, a de “reporter de radio". Uma cubra observagio a respeito do diélogo observado 6 que nele a prética da TEXTUALIZAGAO e a dispersiio sio simultdneas e interdependentes e elas de desenrolem sobre 0 mesmo enunciado. ~ Nessa passagem, a producio de uma voz mégica faz parte de uma prética de TEXTUALIZACAO, ao meamo tempo que o trabalho para chesar ai (desenvolvide pelos alunos @ pelo professor) constréi-se através de uma dispersio dos centidos. Assim também, o horépio preciso dentro do estidio, aue © ouvinte deverd conhecer, representa, durante 0 ensaics, uum “buraco” no TEXTO, sustentado pela incompletude posaivel (@ necessdria) nessa pratica. & justamente esse "buraco atemporal” no_momento da emissio para que se faca evento, para aue hade_o Techamento da TEATUALIZACAO, que sera saturado A vocacto da Escola 6 a fragmentagaio (ensina-se através de fragmentos), entretanto quando a TEXTUALIZAGAO 6 ai praticada ela torna-se uma possibilidade de acesso ao AUTOR dentro da Escola. Para issoa Escola deve abrir-se em direcay a seu exterior onde as posictes diccursivas que podem produzir o efeito-AUTOR n&o sic recalcadas. Reforcamos, entdo, 0 fato de que nem a prética de TRETUALIZAGAO, nem o efeito AUTOR, © nem o efeito TEXTO sto depentes da Escola ou da grefia para acontecerem. Ao contrério, eles serio produzides mesmo onde n&o se produa uma escrita grafada. Assim, esperamos que tenha ficado igualmente claro que a experiéncia “Radio Cartable" ¢ apenas um exemplo de experiéneia onde a TEXTUALIZAQAO 6 praticada e onde se produz finalmente os efeitos de TEXTO e AUTOR. Na verdade, essa prdtica pode acontecer em quaiquer outro tipo de experiéncia, escolar ou nfo escolar. A diferenca que exlate entre a TEXTUALIZAGAO praticada na Escola ou fora dela, 4 0 possibilidade que tem a Escola de sistematizar esse trabalho tornando-o até certo ponto planejaével, e consequentemente a possibilidade de exploragio de diferentes dimensdes que a praética oferece. ADL Citamos aqui como exemplo nosso trabalho anterior (Discurso da Escrita e Ensino/9Z) onde hé a descric#o de uma experiéncia+ na Escola em que se pratica a TEXTUALIZACAG através da produgio de livros, e portanto, bem diferente da produgéo de um programa radiofénico. Assim também tantas outras experiéncias podem contar com a prética de TEXTUALIZAGAO. Essas experiéncias mostram, ainda, que se @ pratica de TEXTUALIZACAO se dA na Escola, € evidente que hd af uma inscricto do sujeito no discurso pedagégice. No entanto essa insericéo néo deve funcionar como fechamento para qualquer outra posicio em outros discursos, mas ao contrario, deve lidar com egsas outras posictes. A TEXTUALIZACAO depends, entéo, como vimos até aqui, de que © oujeito se reconhega como cujeito do discurso onde ele se inscreve (seja eie da radio, da imprensa, da editoracto, do teatro, ete.), sendo esse discurso nfo circular nem auto avaliativo, como €0 caso do discurso psdagégico (onde a producéo 6 um pretexto para avaliacao).

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