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Os Projetos de Trabalho: um mapa para navegantes em mares de incertezas Fernando Hernandez Professor titar da Universidade de Barclona Suas pin pas reas de interesse 30 0 desenvolvimento de aternat- ‘as para repensar a educaco, a construcdo da identidade docentee aformacio ea pedagogia cultural. Foi profes- sor convidado pela Graduacdo da Universidade Federal de Minas Gerais, E autor ou co-autor de mais de uma cen- tena deartigos e colaboracées em publicagbescoetivas, Alguns de seus livros editados no Brasil sS0: A organiza ‘0 do cucu por projetos de trabalho (1998), Trans {aressS0 e mudanca na educagso ~ 0s projets de traba ho (1998), Cutura Visual, Mudanca Educatva Proeto de Trabalho e Aprendendo com as inovacdes nas escolas (2000) UNIVERSITAT DE BARCELONA Divisio | de Cincies Humanes | Socials ‘Departament de Dibuix. Unitat drt | Educacié ‘C/ Pau Gargello, 4 ~ 08028 ~ Barcelona/Espafa Tel: (34) 93-3333466 ext 3725) Fax: (34) 93-3345112 Os primordios de uma historia Na metade dos anos citenta, comecamos a esbocar a necessi_l dade de organizar 0 curricula (aquilo que pode ser importante aprender na escola para dar sentido as diferentes “e@alidades” — em que vivemos) de uma maneira alternativa & rmatérias, que se baseia nas disciplinas académias,I80 nc a tracar um curriculo centrado em rot cutee do que estivessem relacionados cor s dos alunos (no sentido de que fossem interessalt hes ajudava a dar sentido ao mundo em que ess Buscd- vamos esse propésito levandoém conta. educativas que haviam tido éxito anteflormente e os debates, ehtdo inci- pientes, que sugeriam a necessidade de repensar 0 curfculo e a fungao da escola paraique todos 0s alunos encontrassem nela um “lugar” para apr 1984; Galton, Simon e Croll, 1980; Popkewitz, 1987; Stenhouse, 1984; Tann, 1987). Quando digo que feet uma série de propostas educativas, me'refiro a algumas experiéntias que, como recor- da Goodson (2000), nao se enraizaram na escola, nao porque no fossem, lias e N30 tivessem éxito (pois o tiveram), mas sim porque ante (ou melhor, dominador) - que era o de uma regida por um enfoque behaviorsta e tecnologico ( os objetivos de conduta de Bloom) e ‘por uma iso de escola que considerava (e considera) que esta instituicdo 1 ‘papel flindamental na distribuicéo social os inch considerava convenientes. tanciado tanto da idéia da existéncia de Jo como da ingenuidade de pensar que quem de tomar decises sobre a Escola deixaré de lado 0s interesses das instancias de poder as quais serve. Por isso @que levamos em conta as experiéncias de sucesso realiza- 12 Kilpatrick:nosvanosivinteouras de Stenhouse ropostas que ajudaram muitos alunos a , Seu lugar para aprender. Entre outras Ye mostraram, por exemplo, que os pobres, os has da dasse operaria, nao eram problematicos no n conta seus referenciais; nem eram menos les que faziam parte das classes favo- 10s um curriculo que considerasse sua S'SUas preocupacbes (Heméndez, 9 podemos esquecer, quando nos apro- 0 de escola e de curriculo que est pre- Sobre 0s projetos de trabalho. ximamos eSsores com 0 quais trabalhamos, eS ox¢omo uma técnica picia de passos partindo do ‘que se diz serem 0s int rmeninos e das meninas ou dos adolescentes. Nad ite do nosso propésito e de nossa forma de vated ps de trabalho. Por iso minha surpresa, minha estada no Brasil, em 1997, como cr ont pels Secéo de Pés-Graduacdo em Educacéo da Universidade Federal de Minas Gerais, constatel, a partirdos encontros que tive com diferentes 35-de docentes e forradores, que a traducdo para o por- | do livro La org I curriculum por proyectos de trabajo (Hernandez e Ventura, 1992) estava sens do utiizada (como também havia acontecido na Espanha) para transformar uma proposta, que prétendia ser um convite 3 ruptura com certas praticas escolares, em uma série de ativida- des de aula mais, ou menos rotineiras, impregnadas, isso sim, de um halo de progresso e de atualizacéo pedagdgica Isso acontecia sob alamparo da influéncia da reforma espanho- la na educacgo brasileira. E num contexto no qual o que vinha la Espanha era sinel de qualidade e atualizacéo pedagégica Por isso, no deveria ten estranhado em defrontar-me com o fato de que se uma escola queria se definir como “atualizada” ‘ou que acompanhavae reforma brasileira, ter 2 apresen- tar como construtivista, ter uma sala de informatica e. rar projetos de trabalho, Tal fato me preocupou, pois estaba longe da reflexdo e da pré- tica que desenvolviamos com diferentes grupos de trabalho sobre a fundamentagao € a pratica dos projetos de trabalho. | inquigtava-me que a concepcso educativa (e politica) presente nos projétos de trabalho acabasse se convertendo numa receita didatica. Rebeita que reduzia o patencial transgressor dos prod jetos de trabalho (abordando uma concencéo do conhecimento nao fragmentadapdelineando um abrrculo integrado, a partir de temas e problemas emergentes, resgatando 0 sujelto bio- agrético, revalorizando @ funcdo politica da instituigSo escolar e © papel de intelectual plblico do dotente).4 uma série de passos que acabavam sendo um resgate dos centros de inte- resse (com outro nome) ou uma reconverséo das unidades i- daticas que-mentinham uma viséo fragmentada e hierérquica do curficulo, que toma come referencia as dscplinas acadé- micas, E por isso que, com afinaidade de situar esses quests, vou tratar de assinalar 0 eypago no qual transita a concepcao || ‘educativa presente nos projetos de trabalho | Um mapa pard orientar-se nos projetos de trabalho 0s projetos de trabalho nao sao um método, uma pedagogia, ou uma férmula didatica baseada numa série de passos: expo- sigao,d0 tema, perguntas sobre o que @§ alunds sabem e 0 que querem saber, fazer o indice, trazer diferentes fontes de infor- magao e copiar 0 que se refere aos topieds do indi¢e... Nao vol- | tarei a diz ‘0 que jé fiz em outros lugares, ea explicar 0 que pe 05 piojetos de trabalho'@.2 ave concepcoes sobre a fungao da escola, 0 sentido do curtieulo, 4 €onstrucdo da identidade e @ atuacao docente estéo vincillados (Hemandez, 1997, 1998, 1998a, 1998b). Procurarei avancama partirdo que j8 tornei publico, e abordar uma série de aspects que me pa- recem fundamentais para situar os projetos dé trabalho em telacdo ao debate sobre o papel da escola nestes tempos de Ss questdes na forma de proposicées, EZ Revista de Educacéo | susctar reflexbes parapque redes de docentes (e de outros membros da comunidade educativa) coloquem e ‘temas na agenda de suas discussbes, e outros 1. Um projeto de trabalho supe uma cofncepcéo do aprender que leva em conta algumas das vozes que’nos tm assina- lado como se aprende melhor a dar sentido (0.construtvis- mo, a aprendizagem para 2 eompreenséo, @ coghiicso loca lizada. sm vincular-se'@ somente uma delas, pois ‘cada uma assinala aspectos relevartes a se tet em conta,na hora de ajudar os alunos a aprender melhor. N3o podemos dizer que exista uma concepcZo que responde de maneira ‘global a toda a complexidadefque supde que um ser humano aprenda a dar sentido de modo individual e com 05 outros. ae va sobre 0 aprender, que esté presente na nossa cconcepcao dos projetos de trabalho, levamos em canta que té elacionado & elaboracéo de umaiconversae «Bo cultural, na qual se trata de dar sentido (na medida em {que se conecte com as pergumtas que deram origem aos problemas que abordamos e com as indagagdes que os su jeitos se colocam sobre si mesmos e o mundo) e de trans- +10 para outras situacdes. Conversacéo que serv identidades dos aprendizes, 0 ent zagem e 2 conexéo que se estabelece com o que se aprende; isso, aprender é, também, uma pré somente uma questo cognitiva e comportamental . A aprendizagem realiza-se de maneira situada, 0 que quer dizer que a situacio na qual uma pessoa aprende tem um papel fundamental naquilo que se aprende (Cobb e Bo. 1999). Enquanto a viséo tradicional da cogniéo centra-se nosindividuo.como unidade bésica de andlise, a perspec. \a situada se localiza nos sistemas de interacao, incluindo 0s individuos como participantes, interagindo uns com os Outros, assim como com os materias e 0s sistemas de re- presentacéo. A perspectva situada da cognicéo sugere a importancia de colocar “atividades auténticas" na sala de ula, Atividades que se definem como “as préticas comuns de uma cultura” (Brown et al, 1989: 34) e que so similares {8s que realizam 0s "préticos” de um campo de estudo Ou de um tema, As atividades auténticas favorecem o tipo de habilidad to e de resolucéo de problemas Srios fora da escola, sejam ou vidades, espelho do que os “préticos” fazem, i850 que nos projetos de trabalho pretende-se que os alunos tenham atividades auténticas de aprendizagem, no, sentido aqui apontado. |. Um projeto de trabalho poderia ser considerado comaum formato aberto (ndo rigido e estvel) para a indagagS0, de maneira que permita estruturar e contar uma hist6ria, Uma histéria que tenha a ver conosco, os adultos, 0s professores, as familias, no somente com,os meninos,.a$ meninas @ 05 adolescentes. Esse “ter a ver" Wefere-se.a0 que gira em Revista de Eaucacso RTE toro de um tema, um problema que nos preocupa e nos afeta. E a0 qual nos aproximamos (nds e eles), buscando formas alternativas de investigar as verses que foram sen- {do construidas sobre os fendmenos, objetos de nosso inte resse. Nesse sentido, vale a pena recordar 0 que nos diz Bruner (1998: 15): "(..) a narragéo como forma de pensa- ‘mento e como uma expressdo da visio do mundo de cult ra. E principalmente através de nossas prOprias narrativas ue construimas uma verséo de nés mesmos no mundo, e 6 através de suas narrativas que uma cultura oferece, 2 seus ‘membros, os modelos de identidade e de aco. A apreciacéo da relevancia da narrativa néo vem de uma disciplina em particular, mas da confluéncia de muitas: Iiterérias, séciod antropolégicas, linguistcas, histéricas, psicol6gicas, include ve computacionais. E cheguei a entender essa confiuégele como um fato vital, ndo somente em nossos estudos reff tivos, como também nos estudos educativos em gefal” € Por isso que mediante 05 projetos de trabalho bugeamos formas alternativas de representar 0 conhecimento € os jaif nerérios de investigacéo que os estudantes realizam. Num projeto de trabalho nao importa de onde sai o tema ou a circunsténcia que inicia o projeto, pois nunca se comeca do zero, & sempre um prossequir, que se vincula a outras historias presentes ou silenciadas. O tema estd vinculado a0 emergente, 2 uma concepcéo transdisciplinar do conhe- cimento, a uma redefinicéo do sujeito pedagégico e a um recolocar-se a educacéo na escola e sua fungéo social e po. litica. A partir dessa perspectiva, abordam-se as vsdes emer:

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